Monografia:



UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

Tharsila Dantas Prates

O dia-a-dia de trabalho dos profissionais recém-formados nas redações dos jornais A Tarde e Correio da Bahia.

Monografia apresentada na versão

final para a conclusão do curso

de graduação em Comunicação-Jornalismo

pela Universidade Federal da Bahia.

SALVADOR-BAHIA

2003

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

Tharsila Dantas Prates

O dia-a-dia de trabalho dos profissionais recém-formados nas redações dos jornais A Tarde e Correio da Bahia.

Monografia apresentada na versão

final para a conclusão do curso

de graduação em Comunicação-Jornalismo

pela Universidade Federal da Bahia

Professor Orientador: Giovandro Marcus Ferreira

Banca Examinadora: Elias Machado e Lia Seixas

SALVADOR-BAHIA

2003

FICHA CATALOGRÁFICA

|PRATES, Tharsila Dantas. |

|O dia-a-dia de trabalho de um foca. A prática jornalística dos profissionais recém-formados nos jornais impressos de Salvador: |

|UFBA/FACOM, 2003, 00p |

|Monografia de conclusão de curso – Universidade Federal da Bahia, FACOM |

|1.Jornalismo. 2. Prática. 3. Recém-formado |

RESUMO

Tharsila Dantas Prates. O dia-a-dia de trabalho de um foca. A prática jornalística dos profissionais recém-formados nos jornais impressos de Salvador. Giovandro Marcus Ferreira. Salvador. UFBA, FACOM, 2003. Monografia de conclusão de curso

O objetivo desta monografia foi responder a duas questões que aparecem durante a jornada de trabalho de um jornalista, neste caso, o profissional recém-formado. Quais são as maiores dificuldades enfrentadas pelo profissional recém-saído da faculdade ao ter que produzir o texto jornalístico? Quais são as estratégias usadas pelo jornalista para superar essas dificuldades? Para dar suporte à pesquisa, foi usado o referencial teórico do newsmaking, que permite estar dentro das rotinas produtivas através da observação participante. Além do método de trabalho, foram recuperados, dentro dessa teoria, conceitos como o de gatekeeper, valores-notícia e o conceito de notícia, a principal matéria-prima do jornalista. Nove repórteres foram acompanhados durante a sua jornada de trabalho, sendo duas repórteres do jornal A Tarde e sete repórteres do jornal Correio da Bahia. Todos saídos da faculdade no ano de 2002. Problemas com as fontes, com o tempo apertado, a tensão do dia-a-dia, e pautas mal produzidas foram alguns dos problemas detectados. Para ultrapassá-los, vale aproveitar informações anteriores, redigir a matéria mesmo sem o depoimento de uma fonte ou “enrolar um pouco”, como os próprios repórteres disseram.

Sumário

1. Introdução .........................................................................................................................6

2. Capítulo I – Os estudos do newsmaking: o conceito de gatekeeper, as necessidades organizacionais e os valores-notícia...................................................................................10

2.1 A notícia: matéria-prima do jornalista.......................................................................15

2.2 Notícia x reportagem: características e principais diferenças..................................18

3. Capítulo II – O ambiente de trabalho e as relações entre os profissionais. A redação.................................................................................................................................21

3.1 As relações na redação..................................................................................................24

4. Capítulo III – Principais dificuldades encontradas pelos recém-formados na apuração da notícia.............................................................................................................26

4.1 A tensão e os imprevistos da atividade........................................................................28

4.2 O tempo: um dos principais inimigos do jornalista...................................................31

4.3 Dificuldades na hora de escrever a matéria................................................................34

4.4 Outras dificuldades operacionais e as estratégias usadas pelos repórteres para driblá-las..............................................................................................................................39

4.5 O repórter é um “faz tudo”..........................................................................................42

5. Capítulo IV – Conclusão.................................................................................................45

6. Bibliografia......................................................................................................................50

7. Anexo: Registro da atividade diária de nove jornalistas recém-formados que trabalham no A Tarde e no Correio da Bahia..................................................................51

Introdução

Quando o assunto era o trabalho de conclusão de curso, dois pontos já estavam definidos. Seria uma monografia que tratasse de algum aspecto do jornalismo impresso, que foi o tema mais freqüente das minhas leituras, para onde direcionei os meus trabalhos durante a graduação e a área em que sempre quis trabalhar. Além disso, fiquei um ano como bolsista do CNPq e por isso escolhi fazer uma monografia. Esta é uma oportunidade também para eu começar um caminho de pesquisa visando ao mestrado.

Faltava decidir sobre o tema. Algumas leituras me despertaram a curiosidade para estudar o cotidiano do jornalista: O mundo dos jornalistas, de Isabel Siqueira Travancas, Nos bastidores da notícia, de Alexandre Garcia, Vale a pena ser jornalista?, de Clóvis Rossi, e outras. Essas são obras que partem do profissional jornalista que a partir de um certo período na carreira escreve a sua história ou decide fazer mestrado ou doutorado usando a própria prática e a dos colegas jornalistas como tema de pesquisa.

Então, eu adeqüei o grande tema à minha realidade, ou seja, eu estudaria o cotidiano dos profissionais dos jornais impressos de Salvador, mas não seriam todos os profissionais. Para reduzir o meu objeto de estudo, pensei em pesquisar o dia-a-dia de trabalho daqueles profissionais que tinham vivido há pouco tempo o que eu já estava vivendo: me preparando para sair da universidade. Como é o dia-a-dia dos jornalistas recém-formados? O que eles passam para escrever as matérias?

O cotidiano profissional de um jornalista abarca muitos aspectos, entre os quais as técnicas de produção da notícia, a relação entre os jornalistas e os seus superiores, a relação dos jornalistas entre si, a forma de organização de trabalho da empresa jornalística – e, no caso desta pesquisa, os repórteres pertencem a dois jornais de linhas editoriais diferentes – e até a influência da formação acadêmica do profissional no enfrentamento das questões próprias do dia-a-dia, exigidas pelo mercado de trabalho. Pela questão do tempo que tive e da escolha metodológica para realizar esta pesquisa, que me forneceu o método da observação participante, me restringi a identificar as dificuldades enfrentadas pelos recém-formados para apurar uma matéria. Ao identificar essas dificuldades, veria ainda como os repórteres faziam para ultrapassar as mesmas e escrever um texto de qualidade.

Com a ajuda da lista de colação de grau da Facom, cheguei a nove formandos do ano de 2002 que atualmente trabalham nos jornais A Tarde e Correio da Bahia. No outro jornal diário de Salvador, a Tribuna da Bahia, nenhum estudante dessa lista de 2002 trabalhava no momento em que realizei a pesquisa, em junho de 2003. Os repórteres acompanhados foram Daniel Freitas, Érico Monte, Fernanda Carvalho, Iansã Negrão, Jane Fernandes, Marcos Casé, Patrick Brock, Regina Bochicchio e Renata Matos, num total de nove jornalistas. Todos concordaram em ser acompanhados durante um dia de trabalho. Constituem o universo da minha pesquisa.

Apesar de terem saído na mesma época, esses jornalistas formam um grupo heterogêneo. Com relação à experiência de trabalho numa redação de jornal, há os que possuem mais tempo em contato com a prática jornalística. Não é o caso dos repórteres Patrick Brock e Jane Fernandes, que em junho de 2003, estavam apenas há alguns meses trabalhando para o jornal Correio da Bahia. Eles fazem parte do meu universo de pesquisa, porque também se formaram junto com os outros. O critério escolhido para recortar o objeto de estudo deste trabalho, que é o da recém-formação, poderia ser cruzado com o dado da experiência, mas como o tempo foi curto, essa relação ficará para um próximo trabalho.

Ainda falando sobre as diferenças dentro do grupo de jornalistas, há o fato de nem todos trabalharem para as editorias locais de cada jornal. Há repórteres trabalhando para o caderno Correio Repórter, do Correio da Bahia, há uma editora do Caderno Dez, do A Tarde, há um repórter trabalhando para o caderno Folha da Bahia, do Correio, e um outro que faz matérias para a editoria de Esporte, também do Correio. Os demais fazem matérias para o Aqui Salvador, do Correio da Bahia, e para a editoria Local, do jornal A Tarde. As dificuldades encontradas por cada repórter, como a questão do tempo, podem ser amenizadas ou resolvidas justamente pelas características próprias de cada editoria. Quem faz matérias para a Local, o Aqui Salvador e o Esporte têm um prazo de um dia para entregá-las. Já quem faz matérias para o Caderno Dez têm uma semana de prazo. Quem faz reportagens para o Correio Repórter tem um mês para entregá-las. O prazo do caderno Folha da Bahia varia de acordo com a pauta. O prazo pode ser de um dia, dois dias ou uma semana. Mesmo assim, os repórteres acompanhados nesta pesquisa estão sempre preocupados com o tempo, com o prazo das matérias e isso está muito presente no dia-a-dia de cada um.

Apesar das concordâncias em participar do estudo, a maioria dos repórteres se mostrou curiosa quanto aos objetivos do estudo. Quando eu dizia que queria acompanhá-los durante um dia de trabalho, todos disseram algo assim: “Mas tem dia que eu nem saio da redação, fico apurando tudo por telefone. Assim vale?”. Eu explicava que sim, quanto mais diferente um do outro melhor. Eu teria uma visão de quem sai da redação (como é sair, quais são os problemas, etc) e de quem apura somente por telefone. Neste caso, são pautas que não precisam da presença física do repórter, basta uns dois ou três telefonemas e se resolve o assunto. Isto é, quando se consegue falar com as fontes. Com o acompanhamento, vi que é muito difícil conseguir essa façanha de primeira.

O método de acompanhar os repórteres por um dia me rendeu um apelido, que considero justo para o meu trabalho de pesquisa: a sombra. Quem fez a brincadeira foi o repórter Marcos Casé, do Correio da Bahia. No dia em que o acompanhei, ele me apresentava assim, para quem encontrasse. Daniel Freitas, também do Correio, depois que eu encerrei o meu trabalho, me confirmou que um dia eles estavam comentando isso. Fiquei como “a sombra”. Jane Fernandes, do Correio, um dia falou: “Se bobear, ela vai até no banheiro com a gente”. E o pior é que eu ia mesmo, pelo menos até próximo à porta. Tudo isso para saber com viviam no trabalho os nove repórteres escolhidos.

São duas as perguntas que eu pretendo responder ao longo deste trabalho: quais são as maiores dificuldades enfrentadas pelo profissional recém-saído da faculdade ao ter que produzir o texto jornalístico? Quais são as estratégias usadas pelo jornalista para ultrapassar essas dificuldades? Para identificar as dificuldades e as estratégias encontradas pelos recém-formados no dia-a-dia da profissão, foi usada a técnica da observação participante, extraída da teoria do newsmaking, que é a opção metodológica que norteia esta pesquisa. O método de trabalho usado para observar a prática jornalística in loco é freqüentemente utilizado pelos pesquisadores que desejam conhecer a prática jornalística e a produção das notícias. A observação participante estabelece uma relação face a face entre o pesquisador e seus observados. Otávio Cruz Neto afirma que a importância dessa técnica reside no fato de podermos captar uma variedade de situações ou fenômenos que não são obtidos por meio de perguntas, uma vez que, observados diretamente na própria realidade, transmitem o que há de mais imponderável e evasivo na vida real.[1]

Este é um trabalho com características etnográficas. É um relato feito através do acompanhamento dos profissionais e de eventuais questionamentos sobre as razões de algumas atitudes. Este trabalho fica ancorado numa perspectiva descritiva, que é o que marca os estudos de caráter etnográfico pela observação direta dos profissionais. O método da observação participante, porém, é questionado dentro da academia por alguns pesquisadores, que ressaltam o fato de que o observador pode interferir de alguma forma naquilo que ele se propõe a observar. No caso da minha experiência dentro das redações do Correio da Bahia e do A Tarde, não notei nenhuma modificação no comportamento dos repórteres em função da minha presença. Cada um realizou o trabalho do jeito que sabe fazer, inclusive, expondo maneiras de trabalhar que podem ser questionadas por professores dos cursos de Jornalismo. Daí, a necessidade de aprofundar este estudo e fazer uma relação entre a prática no mercado e a formação acadêmica do profissional. Durante a observação, foi inevitável também extrair depoimentos de todos os repórteres e saber o que eles pensam sobre as pautas mal produzidas e as dificuldades de acesso com relação às fontes, por exemplo.

Este trabalho está dividido em duas partes, além da conclusão. Na primeira, procuro evidenciar alguns pontos da teoria do newsmaking, usada para orientar o desenvolvimento desta pesquisa. Na segunda parte, identifico as dificuldades mais comuns encontradas durante a realização do trabalho dos repórteres. Irei descrevendo uma a uma e, posteriormente, mostrarei as estratégias usadas pelos jornalistas observados para superar os problemas. Em anexo, está o dia-a-dia que passei com cada repórter observado, do momento em que ele chega até o momento em que ele sai e encerra o trabalho do dia.

Achei interessante anexar ao trabalho a descrição de todos os dias em que acompanhei os repórteres para compartilhar com o leitor tudo o que vivi, a respeito das rotinas de produção da notícia. Assim, resolvi tornar público o material com o qual dispus para desenvolver a pesquisa.

Capítulo I

Os estudos do newsmaking: o conceito de gatekeeper, as necessidades organizacionais e os valores-notícia

Quando se fala em rotinas produtivas e como elas influenciam o trabalho final dos jornalistas, muitos autores acreditam que o referencial teórico para embasar as pesquisas nesta área é o newsmaking – produção das notícias. “Se a notícia é um produto gerado por um processo historicamente condicionado – o contexto social da produção e suas relações organizacionais, econômicas e culturais –, somente a análise desse processo vai permitir uma maior compreensão da realidade social do processo.”[2]

Segundo Alfredo Pereira Júnior, as pesquisas do newsmaking procuram descrever o trabalho comunicativo dos emissores como um processo no qual acontece de tudo: rotinas cansativas, distorções intrínsecas e estereótipos funcionais. O autor baseia-se em Mauro Wolf, no livro Teorias da comunicação, e em Nelson Traquina, no livro Jornalismo: questões, teorias e estórias, que foram tentativas de organização e sistematização dos estudos que vêm sendo desenvolvidos a partir do newsmaking.

Dentro desse referencial teórico, vale a pena recuperar alguns conceitos que nos ajudam a entender o percurso de pesquisa em jornalismo, tendo em vista nossa problemática. O conceito de gatekeeper é um deles. É um conceito que veio da psicologia e foi usado para as pesquisas em jornalismo pela primeira vez por David Manning White, num estudo de 1950. O autor demonstra que as notícias passam por diversos portões. O repórter forma o primeiro gate (portão) no processo de comunicação, sendo que o editor, que é o objeto de estudo de White, constitui o último gate.[3] O autor conclui que, pelas razões da rejeição das notícias, a comunicação de notícias é extremamente subjetiva e dependente de juízos de valor baseados na experiência, atitudes e expectativas do gatekeeper. São razões, portanto, subjetivas.

Este foi um estudo de caso, onde White observou o dia a dia de trabalho de um editor (Mr. Gates). As pesquisas que se seguiram mostraram que, mais do que preferências pessoais, a seleção e a filtragem das notícias são influenciadas também pelas normas ocupacionais, o que Gaye Tuchman chama de necessidades organizacionais (organizational needs). Uma dessas pesquisas foi a de Warren Breed, que alargou a perspectiva do gatekeeper. Breed mostra como a orientação editorial é mantida e quando ela é ultrapassada pelo jornalista, num estudo sobre o controle social nas redações, onde analisa os mecanismos de manutenção da linha editorial e política dos jornais. Mauro Wolf explica que os estudos posteriores a Breed evidenciaram a necessidade de integrar a análise do papel do gatekeeper na análise dos papéis produtivos e da organização burocrática da qual ele faz parte. Aí entram as conclusões sobre as distorções inconscientes que acontecem na cobertura jornalística e que abarcam o exercício profissional, as rotinas de produção e os valores compartilhados sobre o modo de desempenhar a função de informar.[4]

Ou seja, as notícias e o modo como elas chegam aos leitores não são determinados somente pela subjetividade dos profissionais. As exigências e a estrutura das organizações influenciam fortemente na seleção e no enquadramento dado à notícia. Por isso, os estudiosos que pretendem cercar a definição de notícia pesquisam primeiro as rotinas de produção das mesmas. Uma autora que é referência nas pesquisas de produção das notícias é Gaye Tuchman, que antes mesmo de se graduar, começou a estudar as causas que explicam como os trabalhadores da notícia (newsworkers) decidem o que é notícia e quais notícias entram ou não na pauta do dia. Um dos seus objetivos é saber como esses profissionais determinam os fatos e enquadramentos a serem discutidos pela sociedade.[5]

Para isso, a autora esteve em jornais impressos e em estações de TV dos Estados Unidos observando e entrevistando os profissionais – desde os repórteres até os editores-chefe, passando por assistentes e fotógrafos – durante dez anos. Gaye Tuchman afirma que as necessidades organizacionais influenciam nas decisões dos profissionais da notícia. “A ênfase do estudo se dá nas maneiras como o profissionalismo e as decisões dos profissionais são o resultado das necessidades organizacionais.”[6] Para ela, a negociação está presente na produção das notícias. Os repórteres e editores negociam entre si – às vezes, provocando conflitos – e estes negociam com outras instituições sociais, fontes dos acontecimentos a serem cobertos.

A abordagem do newsmaking se dá dentro do contexto da cultura profissional dos jornalistas (o que Tuchman está chamando de profissionalismo) e a organização do trabalho e os processos produtivos. A cultura profissional e as restrições ligadas à organização do trabalho compõem a produção da notícia (newsmaking).[7]

Para identificar as dificuldades que os jornalistas, neste caso os recém-formados, enfrentam e as estratégias usadas por eles para contorná-las, é preciso mergulhar na atividade profissional exercida a partir do trabalho nas redações. As dificuldades e as estratégias usadas pelos profissionais fazem parte de como a notícia é produzida. Para Wolf, a observação participante, técnica usada nas pesquisas de newsmaking, permite ao pesquisador estar no ambiente de trabalho do seu objeto de pesquisa, observando tudo o que se passa na produção das notícias.

Os estudos do newsmaking, além de fornecer o método de pesquisa, elucidam outro ponto presente na produção das notícias: os valores-notícia – que são os componentes da noticiabilidade de um fato. Segundo Wolf, esses valores são a resposta para a pergunta “quais os acontecimentos que são considerados suficientemente interessantes, significativos e relevantes para serem transformados em notícias?” E, segundo Wolf, os valores-notícia estão espalhados ao longo de todo o processo de produção e não somente na fase de seleção da notícia. “Participam também nas operações posteriores, embora com um relevo diferente.”[8] Segundo Golding-Elliott, citado em Wolf, os valores-notícia funcionam também como linhas-guia para a apresentação do material recolhido, sugerindo o que deve ser realçado, o que deve ser omitido, o que deve ser prioritário na preparação das notícias a apresentar ao público.

Os valores mais usados na hora de apresentar a notícia, ou seja, no momento de redigi-la, e que foram observados durante o acompanhamento dos repórteres no Correio da Bahia e no A Tarde são: 1) a importância e o interesse que a notícia possa causar no leitor, que não sai da cabeça da maioria dos repórteres observados, principalmente, no momento de elaborar o lead, quando o profissional procura começar o texto de forma a captar o leitor e fazê-lo ter interesse para ler a notícia completa; 2) a disponibilidade de materiais, quando o repórter se preocupa em saber se o acontecimento já é estruturado de modo a ser facilmente coberto – e o que não estiver ao alcance do repórter é rapidamente descartado – e se o acontecimento requer grande dispêndio de meios para o cobrir, preocupação também presente nos chefes de reportagem; 3) a qualidade da história, preocupação que acompanha, principalmente, os repórteres que precisam cumprir uma pauta para o caderno Correio Repórter, do Correio da Bahia.

Mauro Wolf classifica o valor importância/interesse da notícia como um valor-notícia ligado a critérios substantivos. Já a disponibilidade de materiais e a qualidade da história são critérios relativos ao produto.[9] “O elemento fundamental das rotinas produtivas, isto é, a substancial escassez de tempo e de meios, acentua a importância dos valores-notícia, que se encontram, assim, profundamente enraizados em todo o processo informativo (e não somente na fase de seleção das notícias).”[10]

Para Wolf, a recolha, a seleção e a apresentação das notícias compõem as principais fases da produção informativa cotidiana. A fase de recolha constitui as estratégias que todo órgão de informação possui para conseguir as notícias: ter repórteres fixos fazendo a cobertura de determinados setores que produzem acontecimentos que são notícia e a relação do órgão informativo com as fontes – institucionais, oficiosas, estáveis, provisórias, ativas, passivas, centrais, territoriais e de base – e com as agências de notícias. “Esta forma de organizar a recolha dos materiais noticiáveis está intrinsecamente ligada à necessidade de rotinizar o trabalho, o que provoca uma limitação substancial e uma redução – atenuadas, porém, pela estabilidade e pela produtividade – dos possíveis canais de recolha.”[11]

A partir do material recolhido, os órgãos de informação passam para a fase da seleção das notícias definida por Mauro Wolf como “um processo complexo que se desenrola ao longo de todo o ciclo de trabalho, realizado a instâncias diferentes – desde as fontes até o simples redator – e com motivações que não são todas imediatamente imputáveis à necessidade direta de escolher as notícias a transmitir”[12]. O autor explica que a necessidade de ser eficiente e a escolha de procedimentos que permitam essa eficiência dominam as fases de seleção e de produção das notícias. Ser eficiente para Mauro Wolf é permitir o rendimento de três recursos que são escassos num órgão informativo: o pessoal, o formato e o tempo de produção.

Mauro Wolf escreveu que a fase de preparação e edição das notícias – e a fase de preparação é para onde se volta este trabalho – consiste em anular os efeitos das limitações provocadas pela organização produtiva para “restituir” à informação o seu aspecto de espelho do que acontece na realidade exterior, independentemente do órgão informativo. Se um repórter não consegue falar com uma fonte, ele procura outra para substituir ou preenche a lacuna com informações utilizadas em outra ocasião; se não deu para falar pessoalmente, corre-se para o telefone; se a pauta não está direcionada, redige-se uma matéria mais geral; e assim os profissionais vão tentando passar pelas dificuldades, tendo em mente que isso não pode afetar com gravidade a matéria que será publicada, ou seja, os imprevistos não podem ser percebidos pelos leitores do jornal.

No momento de escrever o texto, enfatizam-se os aspectos que são imprevistos, importantes, novos e dramáticos. O jornalista não gosta de escrever aquilo que o leitor já sabe ou, pelo menos, aquilo que já foi dito muitas vezes. E é aí que entram de novo os valores/notícia, que, como afirma Mauro Wolf, estão presentes em todas as fases da rotina produtiva: na recolha, na seleção e na apresentação – edição da notícia.

2.1 A notícia: matéria-prima do jornalista

Nilson Lage em Ideologia e Técnica da Notícia relembra as várias tentativas feitas para definir a notícia. É interessante transcrevê-las:

“a) ‘se um cachorro morde um homem, não é notícia; mas se um homem morde um cachorro, aí, então, a notícia é sensacional’ (Amus Cummings);

b) ‘É algo que não se sabia ontem’ (Turner Catledge);

c) ‘É um pedaço do social que volta ao social’ (Bernard Voyenne);

d) ‘É uma compilação de fatos e eventos de interesse ou importância para os leitores do jornal que a publica’ (Neil Mac Neil);

e) ‘É tudo o que o público necessita saber; tudo aquilo que o público deseja falar; quanto mais comentário suscite, maior é o seu valor; é a inteligência exata e oportuna dos acontecimentos, descobrimentos, opiniões e assuntos de todas as categorias que interessam aos leitores; são os fatos essenciais de tudo o que aconteceu, acontecimento ou idéia que tem interesse humano’ (Colliers Weekly);[13]

f) ‘Informação atual, verdadeira, carregada de interesse humano e capaz de despertar a atenção e a curiosidade de grande número de pessoas’ (Luiz Amaral).”

O autor ainda traz outras duas definições. De John Hohemberg, que diz que “os fatos que são ou não notícias variam de um dia para o outro, de país a país, de cidade a cidade e, sem dúvida, de jornal a jornal.” E a definição de Ivã Tomasov, um autor marxista, que diz que “a força motriz do processo de monopolização da comunicação de massa no mundo imperialista deve ser buscada tanto nos fatos políticos quanto econômicos.”

Para Nilson Lage, nenhum desses conceitos define realmente o que é notícia. Baseando-se neles, ninguém conseguirá, segundo o autor, distinguir uma notícia. Lage afirma que o conceito deve abarcar a aparência, o aspecto ou a forma da notícia no jornalismo contemporâneo. E define: “notícia é o relato de uma série de fatos a partir do fato mais importante, e este, de seu aspecto mais importante.”[14] A partir da observação das jornadas de trabalho dos repórteres, nota-se que este conceito ainda está presente no modo de os profissionais lidarem com a notícia. A preocupação inicial no texto, para muitos deles, é escrever logo aquilo que é o objetivo do texto, a razão de ser da matéria. Nos parágrafos seguintes, é que o repórter vai explicando com mais detalhes como se deu o acontecimento e acrescentando os depoimentos das fontes ouvidas. A fórmula da pirâmide invertida ainda ajuda na elaboração dos textos, sendo descartada, porém, quando a matéria é fria ou se trata de uma reportagem ou um texto especial.

Com o conceito do mais importante para o menos importante, Nilson Lage acredita que se reduz a área de discussão ao que venha a ser importante, tornando mais fácil a identificação de um texto qualquer como uma notícia. Mais adiante, Lage detalha que a notícia se constitui de dois componentes: “a) uma organização relativamente estável, ou componente lógico, e b) elementos escolhidos segundo critérios de valor essencialmente cambiáveis, que se organizam na notícia – o componente ideológico.”

Faz-se importante explicar o que é notícia, pois esta representa a matéria-prima básica usada pelo jornalista no seu dia-a-dia. “É o produto essencial do trabalho do jornalista”, para Isabel Siqueira Travancas.[15] A autora ressalta, porém, que alguns componentes básicos da notícia, como interesse e comunicabilidade, nem sempre constituem a razão de um fato estar nas páginas de um jornal. O Correio da Bahia, por ter um direcionamento político evidente e ser de uma família poderosa no estado, traz, muitas vezes, notícias que só são notícias porque o fato envolvido contou com a presença de autoridades “ilustres”.

Para Gaye Tuchman, notícia é uma janela no mundo. “Através de seu enquadramento, os americanos aprendem de si mesmos e dos outros, de suas próprias instituições, líderes, e estilos de vida, e sobre outras nações e seus povos.”[16] A autora ainda afirma que a notícia é o produto de uma instituição social e é embasada nas relações com outras instituições. “É o produto do profissionalismo e reivindica o direito de interpretar os fatos do dia-a-dia para os cidadãos e outros profissionais.”[17]

Este trabalho não pretende entender por que certas notícias são classificadas como tal e outras não são, que é o principal objetivo da pesquisa de Gaye Tuchman, realizada entre as décadas de 60 e 70. O que interessa aqui é mostrar tudo por que passa o jornalista recém-formado até transformar a pauta que recebeu em uma matéria.

2.2 Notícia x Reportagem: características e principais diferenças

Na observação que fiz dos profissionais que trabalham no Correio da Bahia, um aspecto deve ser discutido nesta monografia. Dos sete repórteres formados em 2002 que acompanhei no Correio, dois estavam trabalhando para o caderno Correio Repórter, um caderno publicado no jornal aos domingos. Tive a oportunidade de observar uma repórter, que iria fazer a capa do caderno pela primeira vez, recebendo as instruções iniciais da editora de como era fazer uma reportagem para o Repórter.

Logo ao chegar, a repórter Jane Fernandes me disse que a condição sine qua non para trabalhar no Repórter é estar apaixonado pelo tema, estar envolvido e gostar muito daquilo que vai escrever, daí a escolha quase subjetiva do tema a ser explorado e o caderno dá essa liberdade. Eu acompanhei o trabalho dela numa segunda-feira. Ela tinha recebido na sexta quatro pautas da editora do caderno para escolher uma no final de semana e elas se reuniriam na segunda para discutir a pauta escolhida. Eram quatro sugestões: uma reportagem sobre o café, outra sobre os normalistas, uma sobre Amélia Rodrigues e outra sobre a lepra. A repórter descartou a lepra, por ser um tema muito árido, e os normalistas, por não ter lhe atraído. Sobraram o café e Amélia Rodrigues. Em casa, no final de semana, e na redação, na segunda, ela pesquisou os temas na Internet e, por não ter achado nada interessante sobre Amélia Rodrigues, escolheu fazer sobre o café.

Na reunião entre a repórter e a editora do caderno, esta pergunta se Jane se decidiu pelo tema. A editora aprova a escolha da repórter e explica que uma reportagem de capa do caderno Repórter deve ter fôlego, cunho histórico e ligação com a Bahia. Fôlego, porque o tema tem que preencher 19 laudas, no mínimo. É composto por uma abertura (de três ou quatro laudas) e quatro matérias, com quatro ou cinco laudas cada uma. Ou seja, só pode escolher um tema se ele puder ser subdividido em assuntos, em subtemas. Na abertura, o repórter tem que explanar o tema de forma a fisgar o leitor. Sobre o lead, a editora explica que ele não precisa ser objetivo. Deve ser escrito com mais liberdade para se tornar um lead forte.

O repórter que recebe a tarefa de fazer uma reportagem para o Repórter fica de segunda a sexta-feira dedicado somente a isso, ou seja, deixa de fazer matérias para o Aqui Salvador. Só nas escalas de sábado ou domingo é que o repórter recebe pautas do Aqui Salvador, independente de estar trabalhando para o Repórter. Fora a dedicação em tempo quase integral – durante as horas de trabalho, é claro –, a pauta do Repórter deve ser cumprida em um mês. O repórter tem que ouvir pessoas, pesquisar na Internet e conversar com estudiosos do tema. “Por isso, não dou menos do que 30 dias”, explica a editora Linda Bezerra. Durante o trabalho, o repórter tem que ser o conhecedor do tema, procurando curiosidades sobre o assunto que dêem vigor ao texto.

A editora explica que o repórter deve ter um olhar no homem. A aproximação dos personagens pelo jornalista ao fazer uma reportagem veio com o novo jornalismo, que apareceu nos Estados Unidos na década de 60 e trouxe elementos literários da novela norte-americana, como explica Adelmo Genro Filho.[18] O autor lembra que os criadores do novo jornalismo passavam dias inteiros, durante semanas, com as pessoas sobre as quais estavam escrevendo. “Queriam estar presentes durante os acontecimentos, em intimidade com os fatos, para captar diálogos, expressões faciais e outros detalhes do ambiente. Além de fornecer uma descrição objetiva completa, pretendiam oferecer algo que os leitores encontravam apenas na literatura: uma vivência subjetiva e emocional junto aos personagens”, escreveu em seguida Adelmo Genro Filho, se baseando em Tom Wolf.

Para o autor, a reportagem se localiza na confluência de dois gêneros relativamente autônomos, o jornalismo e a literatura, e por isso é muito difícil produzi-la, “pois exige uma superposição do talento literário e de apuradas técnicas de investigação e redação jornalística, uma vez que o resultado deve articular harmonicamente os efeitos estéticos e jornalísticos, sem que um supere o outro.”[19] ([20])

O repórter que precisa cumprir uma pauta do caderno Correio Repórter deve usar também uma linguagem leve, poética, informativa e analítica. Para isso, o repórter tem tempo: de 20 a 25 dias de pesquisa, para analisar o material colhido. “Mas não é opinião”, diz a editora. Ela ainda afirma que os textos do Repórter devem conter muito poucas citações. “O repórter tem que dar vazão aos sentidos”, pede Linda. Com dez dias de pesquisa, o repórter tem outra reunião com a editora para decidirem qual vai ser a divisão do tema e fazer um balanço de quem já foi ouvido e quem ainda falta para ser ouvido. A reunião entre Jane Fernandes e a editora do Repórter durou um pouco mais de trinta minutos e a repórter pôde ter uma noção do que é fazer uma reportagem para o caderno.

Nilson Lage explica que uma reportagem trata de assuntos, não necessariamente novos, e que nela importam mais as relações que reatualizam os fatos, ou seja, fazem os acontecimentos virarem o assunto do dia. Fazer uma reportagem, escreve Lage, é compilar fatos já emitidos, investigar causas e antecedentes mais ou menos remotos, interpretar e produzir versões da realidade.[21] Para Lage, a reportagem pode ser considerada de três tipos: do tipo investigação, “em que se parte de um fato para revelar outros mais ou menos ocultados, e através deles, um perfil de uma situação de interesse jornalístico”; do tipo interpretação, “em que o conjunto de fatos é observado da perspectiva metodológica de uma dada ciência (as interpretações mais freqüentes são sociológicas e econômicas); e as que, investindo justamente na revelação de uma práxis humana não teorizada, busca apreender a essência do fenômeno aplicando técnicas literárias na construção de situações e episódios narrados.” [22]

Capítulo II

O ambiente de trabalho e as relações entre os profissionais. A redação

Alfredo Viseu Pereira Júnior, em Discutindo o que é notícia, afirma que uma das primeiras descrições sobre a atividade dos jornalistas e seu ambiente de trabalho foi dada pelo escritor Lima Barreto em Recordações do escrivão Isaías Caminha: “Era uma sala pequena, mais comprida que larga, com duas filas paralelas de minúsculas mesas, em que se sentavam os redatores e repórteres, escrevendo em mangas de camisa. Parava no ar um forte cheiro de tabaco; os bicos de gás queimavam baixo e eram muitos.”[23]

No jornal A Tarde, a presente pesquisa se resumiu a duas jornalistas – Regina Bochicchio e Iansã Negrão. Eram os únicos repórteres que saíram da Facom em 2002 e que trabalhavam para a edição impressa do jornal. Só estive na redação do A Tarde por dois dias, sendo que em um deles passei a tarde toda acompanhando a repórter numa apuração de rua. Os dois dias só deram para eu conhecer alguns setores da redação: a editoria do caderno Dez!, o CDI (Centro de Informação), a editoria de fotografia, a sala do diretor de redação, o setor de arquivos, o lugar do cafezinho e o espaço onde os profissionais redigem as notícias, que são dois separados pela sala do diretor de redação. Apesar do pouco tempo, dá para perceber que a redação de um grande jornal hoje já não se parece com a descrita por Lima Barreto.

A descrição do ambiente de trabalho no Correio da Bahia ficará mais completa, porque foram sete dias acompanhando os repórteres, na parte da manhã e na parte da tarde, diferentemente do que aconteceu no A Tarde, onde passei apenas dois dias. Como foram mais dias em contato com a redação do Correio, a descrição aqui pode ficar mais detalhada e dar uma noção mais precisa do lugar onde o jornalista de jornal impresso trabalha. Ninguém de fora entra no Correio sem apresentar a carteira de identidade. Além da apresentação do documento, temos também que esperar o segurança saber se a pessoa com quem a gente quer falar está na redação. Até aqui, o procedimento é idêntico ao jornal A Tarde.

Assim que a gente entra no pátio, temos à frente um prédio, onde funciona a área administrativa do jornal e uma parte da Gráfica Santa Helena, que roda o jornal. À direita, fica o prédio onde estão as salas de redação: uma primeira que os profissionais chamam de anexo e uma outra maior no primeiro andar. O anexo é uma sala menor do que a redação, com terminais de computador, telefones e uma televisão, onde alguns repórteres preferem ficar. Em determinadas horas do dia, a sala fica quase vazia e os repórteres têm tranqüilidade para escrever as matérias.

Subindo dois vãos de escadas, vamos dar numa porta de vidro com um nome bem grande: Redação. À esquerda, fica a mesa da secretária do diretor de redação, que tem uma sala só para ele, um pouco mais a frente, à direita. Quando o diretor de redação não está supervisionando o trabalho dos repórteres, conversando com uma ou outra pessoa, ele fica em sua sala, cujas janelas são fechadas com cortinas que impedem visualizar lá dentro com nitidez. A redação é repleta de terminais de computador – em torno de 30 aparelhos – e cadeiras. Quase no fundo da sala, à direita, está o lugar da chefia de reportagem, que no Correio são duas: uma à tarde e a outra pela manhã. Vizinho à mesa da chefia de reportagem, onde os repórteres pegam as pautas do dia, está a mesa da editora do caderno Correio Repórter. Em frente a ela, está a mesa da produtora, responsável pelas pautas do jornal. Olhando para a frente, a partir da mesa da produtora, está a mesa do editor de moda e os computadores dos jornalistas que trabalham para o caderno Folha da Bahia, que estão na redação preferencialmente pela manhã. (Eles são cerca de sete pela manhã, entre repórteres, editores e subeditores. A lista de pessoal do Correio contabiliza dezesseis profissionais que trabalham para o caderno, incluindo os colunistas.) A quantidade de repórteres pela manhã do caderno Aqui Salvador é menor do que à tarde, e os que trabalham de manhã poucas vezes ficam na redação. Na maioria das vezes, estão na rua apurando suas matérias.

Quem trabalha de manhã, costuma chegar a partir das oito horas. O término do trabalho se dá entre 13 e 14 horas, um horário que varia muito, dependendo do tipo de pauta que o repórter tem para apurar, da quantidade e dos imprevistos que encontra na rua. Os repórteres que trabalham à tarde chegam a partir das 13 horas e ficam até às 18, 19 horas, dependendo também de como fora o trabalho realizado ao longo da jornada. Eu acompanhei nove repórteres: dois que trabalham à tarde e os outros sete pela manhã.

Dando continuidade à descrição da sala de redação do Correio, temos os computadores usados pelos repórteres no meio da sala e, à esquerda de quem entra na redação, estão os computadores dos diagramadores. Perto dos sanitários e da sala do cafezinho, está um computador usado por um profissional que trata das imagens e mais alguns computadores usados pelos jornalistas do Folha. Toda essa descrição foi feita somente com base na observação e nos dias que eu passei no Correio. Acredito ser suficiente para dar uma noção do ambiente onde trabalham os jornalistas recém-formados que foram observados nesta pesquisa.

Pela descrição, falamos das seguintes funções dentro de uma redação: diretor de redação, secretária da redação (além de ser secretária do diretor, ela dá suporte à redação, entregando correspondência, atendendo telefones e outras atividades que também dizem respeito aos demais componentes da redação), editores, subeditores (presentes no caderno Folha da Bahia), chefe de reportagem, produtor, diagramador, fotógrafo e repórteres. A função de redator/copydesk não existe mais numa redação de jornal. O repórter redige o texto pensando no editor, que é quem vai corrigi-lo. Não há mais intermediário entre quem escreve e quem edita a matéria.

3.1 As relações na redação

Apesar do desejo de agradar aos superiores[24], como todo assalariado, os repórteres observados durante a pesquisa não mantêm hostilidades com os seus colegas, pelo menos, no sentido profissional. Ou seja, sempre ajudam um ao outro quando são solicitados. Um exemplo foi quando acompanhei a repórter Fernanda Carvalho, do Correio da Bahia. Saímos com outra repórter, Adriana Jacob, que estava fazendo uma matéria para o Correio Repórter assim como Fernanda. O assunto a ser tratado na matéria de Adriana era o bairro do Bomfim. No caminho, Fernanda conta que já morou no bairro durante muito tempo e dá sugestões de enfoque e fontes para a matéria de Adriana, que começa a anotar. Depois, Fernanda começa: “Estou fazendo uma matéria sobre casamentos. Estou adorando!”, disse ela, narrando alguns fatos curiosos que achou sobre o tema. Adriana pergunta se a matéria é capa do Repórter. Fernanda responde que sim e continua dizendo que seu receio é que ela já recolheu muitas informações e ainda “tem muita coisa para se falar.” Fernanda está confusa sobre quais aspectos abordar, o que enfocar direito. Ela conta a Adriana que recebeu a pauta no dia 16 de junho, “mas não foram 15 dias de trabalho até aqui por causa do feriado de São João. Estou preocupada com isso. Não foram 15 dias de trabalho.”

A conversa tomou um rumo mais pessoal quando Fernanda começa a contar sobre sua saída da TV Aratu, onde trabalhava à tarde. “Estava muito puxado. Lá eu exercia a função de pauteiro, que é muito ingrata”, e Adriana concorda: “Tudo é culpa do pauteiro. Se a matéria sai boa, os elogios vão para o repórter. Se a matéria sai ruim, a culpa é do pauteiro”, disse ela. Fernanda fala ainda que não se arrependeu de ter saído da TV Aratu, onde já era contratada, apesar de ganhar mais. Aí Adriana quis saber por que ela optou pelo Correio. “Porque prefiro o trabalho de repórter, mas adorava fazer pautas também, mas tive que escolher um.” Fernanda tem 25 anos, é casada e está esperando o primeiro filho, por isso precisava de mais tempo para a vida pessoal.

“Pois, é, Adriana. Se você souber de algum casamento interessante, você me fala. Estou adorando este trabalho.” Quando estávamos perto de chegar à Fundação Clemente Mariano, no Comércio, para onde ia Adriana, eu perguntei como era o esquema de trabalho quando se fazia reportagem para o Repórter. Elas me disseram que o repórter fica trabalhando de segunda a sexta-feira para a matéria especial do caderno. Nas escalas de sábado ou domingo, é que se voltava a fazer matérias para o Aqui Salvador. Fernanda aproveitou para comentar que gosta muito de trabalhar no sábado, mas detesta trabalhar no domingo. “Quando sei que vou trabalhar domingo, chego ficar triste.” Fernanda perguntou a Adriana sobre o trabalho dela numa rádio, à tarde. Adriana disse que o serviço é mais light, mais burocrático, que ela só reclama do horário, que é fixo. “No Correio, a gente tem mais flexibilidade de horários.”

Para Jorge Cláudio Ribeiro, em Sempre Alerta, os laços de sociabilidade operacional (grifo do autor) mantidos entre os jornalistas duram somente enquanto eles trabalham juntos. Durante a pesquisa, observei que existe um clima de cordialidade entre os jornalistas de um mesmo jornal, mas não presenciei a relação dos repórteres de jornais diferentes. O autor afirma que os profissionais valorizam situações informais, como uma carona ou um papo num bar da esquina, para manter a relação de cordialidade.

Isabel Siqueira Travancas, em O mundo dos jornalistas, avança também nesta direção onde a competição entre os repórteres – mesmo de órgãos diferentes – não é tão radical. De acordo com os depoimentos colhidos pela autora, na rua a competição se dilui ainda mais, sendo expressivo o intercâmbio entre os colegas.[25] Apesar disso, o estudo mostrou que a proximidade tende a ser maior e mais íntima entre os profissionais que trabalham para os mesmos órgãos de informação: TV, jornal ou rádio. Por isso, quando vários profissionais se encontram numa coletiva, por exemplo, a pergunta mais ouvida é: “Você está cobrindo para onde? Você é de onde?”

Capítulo III

Principais dificuldades encontradas pelos recém-formados na apuração da notícia

Dentro do universo pesquisado – de jornalistas recém-formados –, foi possível identificar algumas dificuldades que surgem ao longo do processo de produção da notícia – momento classificado por Mauro Wolf como a fase de apresentação. As dificuldades mais comuns aparecem para todos os profissionais pesquisados, não importando se alguns deles já possuem mais tempo de experiência na prática jornalística do que outros. Vale observar que dois dos nove repórteres pesquisados já tinham mais de dois anos trabalhando em jornal impresso, mas o tempo apertado, as fontes não acessíveis e a elaboração da matéria são problemas ou dificuldades que atrapalham a todos.

Josenildo Luiz Guerra identifica três aspectos que caracterizam a atividade jornalística: 1) o aspecto normativo, constituído pelos princípios éticos e determinações legais que regem a prática, 2) o aspecto técnico, que se divide em dois: o aspecto procedimental, que determina a atuação do jornalista para satisfazer os princípios éticos, e o aspecto metodológico, que corresponde às técnicas usadas na produção da notícia, 3) e o terceiro aspecto que é o organizacional, que se refere ao modo como o trabalho é estruturado para racionalizar a captação, o tratamento, a apresentação e a disponibilização da informação para o público.[26]

Neste trabalho, pretende-se identificar as dificuldades encontradas no dia a dia de trabalho dos profissionais recém-formados no que diz respeito ao que Josenildo Guerra está chamando de aspecto técnico-metodológico, que é o que orienta a ação do repórter na elaboração do produto. O objetivo não é elencar quais são as características que fazem parte desta técnica, mas observar as dificuldades que permeiam a fase de produção da notícia. A partir da observação participante, foi possível também perceber algumas regras que caracterizam o aspecto organizacional de uma empresa jornalística, ou seja, o que elas fazem para realizar mais em menos tempo e com menos custo.

4.1 A tensão e os imprevistos da atividade

Um aspecto do ritmo de trabalho de um jornalista é a tensão do dia-a-dia. Mais de um repórter evidenciou o mesmo exemplo para ilustrar os imprevistos que acontecem no cotidiano das redações. Marcos Casé, do Correio da Bahia, comentou que é normal terminar de fazer as duas pautas do dia e aparecer outra para cumprir, principalmente em dia de chuva. “Se estiver chovendo, pode saber que vai aparecer uma pauta de última hora, para cobrir um deslizamento, por exemplo. Quando a gente pensa que vai embora, aparece outra pauta”, afirma Casé.

Jorge Cláudio Ribeiro escreveu: “Imprevista por natureza, a notícia exige do jornalista estar sempre alerta, à espera do que poderá acontecer e em condições de responder com agilidade. Superficialmente qualificado de alucinante, o ritmo de trabalho (e de vida) do jornalista é, pelo contrário, descontínuo e concentrado, oscilando entre fases de marasmo e de aceleração.”[27] A tensão existe, mas a idéia de ritmo alucinante é mito e foi comprovada com comentários de alguns dos repórteres observados que disseram que há dias em que aparecem fatos importantes para cobrir e há dias em que é só bobó.

A tensão, segundo alguns autores, ajuda o repórter a estar atento ao que acontece a sua volta. A explicação que o autor Jorge Cláudio Ribeiro dá para a escolha do título do seu livro – Sempre Alerta – casa com um comentário que foi feito pela repórter Fernanda Carvalho, do Correio da Bahia, quando ela apurava uma matéria para o Correio Repórter. Ela me disse que o repórter tem que estar sempre alerta para não desperdiçar as informações que for encontrando, como no caso da suboficial com quem Fernanda conversou que disse que o assunto não era com ela, mas indicou uma fonte e passou algumas informações importantes. Isso porque a repórter se dispôs a conversar um pouco com a funcionária. O autor de Sempre Alerta escreveu:

“Para o conjunto da sociedade o jornalista, assim como os escoteiros, deve estar sempre alerta e disposto a realizar uma missão voluntária comprometida com o Bem e que faça uma boa ação todos os dias. Dentro da mística da profissão, cabe ao jornalista estar atento, onde quer que esteja, à possibilidade de irrupção de uma fato noticiável. Durante a jornada de trabalho, a tensão o obriga a estar constantemente alerta para evitar erros.” (p.14)

Para ser um bom repórter, é preciso mesmo ter sorte? Alguns profissionais acham que sim. Quando Regina Bochicchio, do A Tarde, estava apurando uma matéria sobre a conversão de carros particulares para o motor a gás, ela encontrou uma mulher que estava abastecendo o carro a gás e tinha convertido o motor há apenas uma semana. Regina disse: “Repórter tem que ter sorte.” Foi mesmo por acaso que encontramos a mulher abastecendo, mas há um detalhe que não pode ser esquecido. A repórter estava no lugar certo: um posto que era revendedor e convertedor de gás natural. Mas podia ser também que o posto estivesse vazio e a repórter não encontrasse ninguém interessante para ser personagem da matéria, já que o posto é mais freqüentado por taxistas, como a própria repórter pôde constatar.

Essa segunda situação – a de não encontrar o fato ou os personagens para a matéria – foi o que aconteceu com a repórter Fernanda Carvalho, do Correio da Bahia, que também tinha saído sem marcar nada, como Regina. Fernanda foi ao fórum num dia de sexta-feira para conversar com juízes e assistir a algum casamento, motivo da matéria para o Correio Repórter. Assim que o carro de reportagem chegou ao fórum, Fernanda falou: “Tomara que eu encontre muitos casamentos acontecendo aqui.” Não viu nenhum. Com uma suboficial ficou sabendo que os casamentos acontecem de terça a sexta-feira, às 8h30. Naquela sexta-feira, informou a suboficial, as cerimônias tinham se encerrado às 9h30. Chegamos no fórum às 10 horas. Fernanda contou que no dia anterior tinha ligado para o fórum e a funcionária que atendeu disse que ela poderia vir de manhã – sem especificar a hora – para ver os casamentos. O jeito foi Fernanda marcar em sua agenda para voltar com oito dias, só que mais cedo. O fato de não ter encontrado nenhum casamento foi um imprevisto para Fernanda, que pôde contornar o problema do tempo pelo prazo que tinha para entregar a reportagem.

A diferença entre Fernanda e Regina é que esta tinha uma matéria para fazer que deveria sair no máximo com dois dias e Fernanda estava com mais de 15 dias de prazo para terminar a sua matéria. Não teve sorte de ver casamentos quando foi ao fórum, mas pôde marcar para depois, e muito depois, sem problemas. Enquanto isso, ela faria outras entrevistas que já estavam agendadas. O fator tempo, no caso de Fernanda Carvalho, foi amenizado pelas características do caderno para o qual iria a reportagem, que é o Correio Repórter.

4.2 O tempo: um dos principais inimigos do jornalista

O tempo é fator determinante no dia-a-dia dos jornalistas observados. As tarefas são ordenadas levando em consideração o tempo que vão tomar e a disponibilidade de tempo do repórter. “Pressionadas pelo fantasma do tempo, as empresas jornalísticas são ainda mais obrigadas a elaborar estratégias para tornar o processo produtivo o mais ágil possível”, escreve Alfredo Vizeu Pereira Júnior.[28] Cremilda Medina, em Profissão jornalista: responsabilidade social, afirma que em nenhuma profissão, como no jornalismo, o dia-a-dia tem mais peso. “O ritmo de trabalho do jornalista é regulado pelo prazo exíguo de 24 horas, com algumas variáveis para mais ou para menos. A pressão do tempo é constante.” [29] A autora afirma que a consequência mais séria da periodicidade dos meios jornalísticos é a impossibilidade de se ter qualquer forma de perfeccionismo científico nos textos produzidos.

Josenildo Guerra concorda: “Um cientista procura se garantir de que todas as condições metodológicas estão satisfeitas para então dar um parecer. Um jornalista precisa, a cada edição do noticiário, independente das condições, ter uma pauta cumprida, pelo menos. O rigor científico pode exigir tempo e paciência, o rigor da informação jornalística não pode prescindir de rapidez.”[30]

Os fotógrafos, muitas vezes, não saem com os repórteres porque ou já fizeram a foto mais cedo ou vão passar primeiro em outro lugar, de acordo com as orientações recebidas pelo chefe de reportagem, que é quem resolve este tipo de situação. Alfredo Pereira Júnior cita Nelson Traquina quando este diz que o fator tempo constitui o eixo do campo jornalístico.[31] As coisas são ordenadas de acordo com o tempo disponível e o chefe de reportagem, bem como os repórteres, estão sempre preocupados com o tempo, independente se o prazo para cumprir a pauta é de um dia ou de um mês. No dia em que acompanhei Iansã Negrão, do A Tarde, ela estava editando algumas matérias para o Caderno Dez! e teve que pedir a ajuda do arquivo de fotografias do jornal para ilustrar um dos textos. Era ainda início da manhã quando ela requisitou as fotos, que só chegaram “500 anos depois”, como ela disse, depois das 11 horas, quando Iansã já tinha pego a foto na Internet, que é creditada como divulgação.

“O ritmo de trabalho é marcado por uma tarefa movida a solavancos e arranques, entremeados de fases de marasmo; o tempo natural é rearranjado pelo fato de o jornalista fazer hoje o jornal que sai amanhã, que fala no tempo presente de fatos passados”, escreveu Jorge Cláudio Ribeiro, se referindo à adaptação que o profissional precisa ter da realidade do trabalho em um jornal diário.[32] Daniel Freitas, do Correio da Bahia, falou que os repórteres precisam estar atentos aos advérbios de tempo. “Se estamos falando de alguma coisa que aconteceu hoje, então é ontem; se é alguma coisa que vai acontecer amanhã, então é hoje. É preciso estar atento a isso”, diz Daniel. O autor de Sempre Alerta cita o fator tempo/espaço para explicar o isolamento do jornalista recém-chegado a redação. A repórter Jane Fernandes, do Correio da Bahia, me disse que, como estava somente há um mês no jornal, ainda não tinha se adaptado ao ritmo de trabalho direito. Ficava até tarde para terminar as matérias e, nos primeiros dias de trabalho, se perguntava como os outros repórteres conseguiam terminar duas ou três pautas até às 13, 13h30.

A repórter Regina Bochicchio tinha feito um roteiro para a sua pauta que incluía seis lugares, mas na metade deles teve que voltar para a redação: “Ir para o Sinditáxi hoje não dá mais. A essa hora o trânsito fica muito ruim e temos que voltar para a redação. Os táxis não são o foco da minha matéria. Tudo que eu precisar agora será por telefone.” Ao sair do fórum, Fernanda Carvalho disse que não passaria mais na biblioteca do Garcia: “Está em cima da hora para pegar Adriana (Jacob), no Comércio. Na entrevista que eu tenho na segunda-feira no Garcia, aproveito e pego o livro.” Com Daniel Freitas, o telefone do Memorial das Baianas estava dando tanto ocupado, que ele achou que devia estar quebrado. “Vou escrever a matéria com o que eu tenho mesmo. Não dá mais tempo”, disse o repórter, que escreveu a matéria sobre as novidades do memorial sem pegar o depoimento de um antropólogo indicado no release do evento.

A obrigação de a notícia ficar pronta em um espaço curto de tempo tem conseqüências. Uma delas, para Giovandro Marcus Ferreira, é o repórter acabar apelando para as mesmas fontes nos mesmos lugares. “Em geral, são as elites dos campos sociais, por conseguinte do campo de poder, sobretudo econômico e cultural, que são as mais solicitadas para ‘explicar’, ‘esclarecer’ os temas em relevo.”[33] Para se ter agilidade na apuração das pautas, os jornais sempre mantêm repórteres nos palácios do governo, nas secretarias e nas bolsas de valores. Isso faz com que, muitas vezes, a matéria acabe saindo com o enfoque e a visão dada somente pelas fontes dos lugares mais freqüentados. Para o autor, quando as outras fontes são utilizadas pelos meios de comunicação, como por exemplo, os sindicalistas durante uma negociação ou paralisação, eles são chamados, sobretudo, para ‘se explicarem’. “Se a lógica do campo jornalístico não permite ‘perder’ tempo, este campo será constantemente prisioneiro da utilização de estereótipos que se encontram sempre à disposição e são compreensíveis por um grande número de pessoas.” [34]

4.3 Dificuldades na hora de escrever a matéria

Começar a matéria, ou seja, escrever o lead – primeiro parágrafo do texto, técnica desenvolvida pelos jornalistas norte-americanos e introduzida no Brasil na década de 50 pelo jornalista Pompeu de Sousa, que trabalhava na época no Diário Carioca – é a parte mais difícil da redação de um texto, para a grande maioria dos profissionais. Durante a observação feita nos jornais A Tarde e Correio da Bahia, isso pôde ser constatado. Para Jorge Cláudio Ribeiro, em Sempre Alerta, o lead tem uma importância estratégica no texto, daí tanta preocupação com ele. “(...) se não agradar ou informar confusamente, o leitor abandonará o texto. O lead consiste na apresentação, no primeiro parágrafo da matéria, de uma síntese dos fatos, através de dados objetivos (grifo do autor), reforçando a impressão de imparcialidade do noticiário.”[35] Nilson Lage, em A ideologia e técnica da notícia, alerta para o fato de que o lead é um relato sumário e ordenado do fato mais interessante de uma série e não do resumo da notícia toda, “como aparece em algumas descrições.”[36]

Jorge Ribeiro afirma ser a imparcialidade uma impressão, porque, para ele, “mesmo quando se proclama imparcial, o jornalismo é uma forma de construção da realidade e não mera reprodução dos acontecimentos. O autor afirma ainda que a objetividade é necessária, mas não é tudo. A intervenção da subjetividade, segundo ele, é necessária para a composição dos fatos. “O juízo ético, a ideologia, a opinião são pré-condições da abordagem dos fenômenos.”[37] A falta de objetividade plena para Adelmo Genro Filho não é uma limitação, mas um sinal da potência subjetiva do homem diante da objetividade. “O material do qual os fatos são constituídos é objetivo, pois existe independente do sujeito. O conceito de fato, porém, implica a percepção social dessa objetividade, ou seja, na significação dessa objetividade pelos sujeitos.”[38]

Além de toda essa preocupação na hora de escrever o texto, o jornalista se depara com as informações colhidas – suficientes ou não – para ordená-las no texto. O repórter Daniel Freitas, do Correio, comentou que começar uma matéria é sempre difícil. “Ficamos na dúvida para escolher com que informação devemos abrir o texto.” Para não se confundir, ele vai riscando as anotações que já usou na matéria.

O repórter Patrick Brock, do Correio da Bahia, também não acha nada fácil começar uma matéria. Durante a redação de um texto sobre os quadrinhos do personagem Hulk, ele refez as primeiras frases umas três ou quatro vezes. Patrick, que trabalha para o caderno Folha da Bahia, costuma sugerir um título e um subtítulo para a matéria que está escrevendo. O repórter ainda possui o hábito de sempre reler o texto que está escrevendo desde o começo e, muitas vezes, em voz alta. Quando Patrick termina o texto e lê novamente para fazer algumas alterações, é a vez de imprimir a matéria para lê-la no papel. Patrick fez isso no dia em que eu o acompanhei e, quando estava com outro repórter, num outro dia, também vi Patrick fazer a mesma coisa: lendo o texto no papel para saber se ele está mesmo no ponto. Aproveitei para perguntar a ele – e perguntei também a outros repórteres - sobre o número de linhas que uma matéria deve ter. Patrick me respondeu: “Geralmente, o número de linhas é dado pelo editor ao entregar a pauta ao repórter.” Mas isso não é uma constante. Outros repórteres não recebem essa orientação e escrevem a matéria de acordo com as informações que colhem. Daniel Freitas me explica que, quando ele enche mais de quatro páginas do bloco de anotações, é porque a matéria dá 40 linhas, “o que é suficiente”.

Escrevendo uma das matérias do dia, o repórter Marcos Casé deixou o lead por último. A pauta era sobre um evento de São João promovido pelo detergente em pó Ala nos bairros carentes de Salvador. Casé classificou a pauta como bobó. Essa e a outra que ele recebeu no mesmo dia sobre um seminário de Farmácia. “Não é todo dia que a gente faz uma coisa importante”, disse ele. No carro, enquanto íamos para o bairro de Santa Mônica ver o forró do Ala, ele comentou com o motorista, num clima de brincadeira e descontração: “É uma pauta assim que vai mudar o mundo.” Sobre o número de linhas, Casé me disse que a matéria do São João nos bairros deveria ter cerca de 30 linhas. “Não tem muita coisa para falar.” Dito e certo. Casé escreveu 34 linhas.

A repórter do A Tarde, Regina Bochicchio, prefere começar um texto de forma mais leve. Estava animada para começar a escrever uma matéria sobre pirataria, que, segundo ela, iria permitir uma linguagem mais leve e descontraída. Já para a matéria da conversão dos veículos – que era a pauta do dia –, ela disse que teria que seguir a orientação do jornal, que é a de fazer um lead objetivo, que responda as perguntas O que, quem, como, onde, porque e quando. Quando chegou na redação, Regina já tinha na cabeça como ela iria começar o lead da matéria sobre a conversão de carros particulares a gás. Isso demonstra uma preocupação do repórter que busca sempre começar o texto de uma forma que atinja o leitor, e se livrar do mal de ficar olhando para a tela do computador sem saber como começar.

Muitos repórteres não gostam de ver as suas matérias cortadas ou, no mínimo, ficam curiosos para saber como os textos do dia anterior saíram no jornal. Por isso, é prática recorrente de todos os repórteres observados durante a pesquisa olhar o jornal do dia e ver como as suas matérias saíram. No dia em que eu acompanhei o repórter Daniel Freitas, do Correio, ele não gostou como a sua matéria tinha saído no jornal. Achou a diagramação ruim, com dois anúncios na página – coisa que não acontece com freqüência, porque é a contracapa do caderno Aqui Salvador. Um dos anúncios ficou colado com a lateral do texto, e isso desagradou Daniel. Depois, quando ele reparou bem na matéria, viu que o editor tinha cortado umas dez linhas de seu texto. Daniel acessou a matéria para contar quantas linhas tinham sido cortadas.

Jorge Cláudio Ribeiro, em Sempre Alerta, escreve que em torno da ocupação dos espaços dentro das edições, desenvolve-se uma luta pelo poder e, segundo ele, não há dúvidas sobre quem tem levado a melhor.[39] O autor também explica que o primeiro a garantir o seu espaço diário é o setor de publicidade, que envia à redação o espelho de cada página, com o desenho das áreas ocupadas pelos anúncios; o restante fica para cada editor colocar as matérias. A pesquisa de Jorge Ribeiro foi com os jornais O Estado de São Paulo e Folha de São Paulo, mas sobre este assunto as coisas acontecem de forma mais ou menos parecida com os jornais baianos, a exemplo do que foi visto com o repórter Daniel. Jorge Cláudio Ribeiro afirma que “(...) é muito freqüente o editor precisar encurtar ou até suprimir notícias importantes e que demandaram trabalho, porque o espaço que sobrou dos anúncios para as notícias era pequeno.”[40]

No dia em que acompanhei o repórter Daniel Freitas, uma discussão entre os repórteres, travada no correio eletrônico interno, me chamou a atenção. Era sobre os critérios de assinatura de uma matéria, discutidos também por inúmeros autores. Uma repórter tinha recebido uma pauta que não tinha gostado muito. Mesmo assim, fez a matéria, como era obrigação, mas não queria que a matéria tivesse sido assinada. Como viu seu nome no jornal no dia seguinte, resolveu perguntar a chefia de reportagem, via rede, quais eram os critérios do Correio para assinar as matérias.

Uma das chefes de reportagem explicou que a matéria sempre saía assinada quando o editor não fazia grandes alterações no texto. Quando era preciso arrumar muita coisa, o texto ficava sem assinatura. Daniel Freitas foi me contando que um dia recebeu uma pauta da Editoria de Polícia que ele fez, mas pediu que não assinassem. A matéria saiu sem assinatura. Depois que leu as mensagens sobre a “polêmica”, Daniel resolveu participar para discordar da explicação da chefe de reportagem. Segundo ele, aquilo não acontecia na prática. “Existem textos que não são mudados e mesmo assim saem sem assinatura.” Só que, logo depois, Daniel desistiu de enviar a mensagem para rede. “Não vou ficar alimentando essa polêmica, que já passou. A repórter fez uma pergunta e obteve a resposta, concordemos ou não.”

Sempre Alerta traz depoimentos de jornalistas que acham que ver o próprio nome no jornal é pura vaidade. Ter a matéria assinada, segundo Jorge Cláudio Ribeiro, é uma possibilidade para o jornalista de se tornar conhecido diante do público e de receber convites para trabalhar em outros jornais ou ocupar cargos mais importantes dentro de um mesmo jornal. “Assinar matérias é uma forma de acumular capital de prestígio, capaz de elevar o valor do jornalista no ranking profissional (...)”[41] Fica claro que assinar as matérias é uma forma de se expor, seja para os leitores, seja para os colegas. Isso explica porque, em certas situações, o repórter não deseja ver seu nome atrelado a um determinado texto. Com essa atitude, alguns podem pensar que o repórter está querendo fugir da responsabilidade pela matéria que fez. E isso é um risco. No caso de uma matéria importante, que ouve depoimentos de fontes importantes, por exemplo, o repórter quer ter o reconhecimento do trabalho e isso ele tem através da assinatura. A vaidade, nesse caso, fala mais alto. Já quando o pensamento é “elevar-se no ranking profissional”, a questão vai além da vaidade. O repórter pode querer trabalhar em um jornal maior ou ser promovido e aí desejar ver seu nome atrelado a matérias ditas importantes, que podem agradar aos superiores (o que pode gerar a tão sonhada promoção) ou chamar a atenção de profissionais de outros jornais, o que pode gerar ofertas de emprego.

Tratando sobre aliciamento dos profissionais, Jorge Cláudio Ribeiro observa que a função de editor possui grande peso e a carreira e o êxito profissional de quem está submetido a ele depende de sua figura. Por isso, ele escreve que repórteres e redatores procuram direcionar seus textos de acordo com o enfoque dos editores.[42] Quando escrevia a matéria sobre a programação de Corpus Christi, o repórter Daniel Freitas, do Correio, começou a frase com No domingo,... e aí comentei que ele poderia colocar a data para não deixar dúvidas no leitor. Apesar de ter acatado a minha sugestão, ele me disse que, com certeza, o editor iria cortar a data, deixando o texto como ele tinha escrito mesmo. O editor realmente cortou a data. Ou seja, o repórter faz o texto já pensando nas correções que o editor, que acaba sendo também um leitor, fará e aproveitando os “erros” de outros textos para não repeti-los.

Cremilda Medina avalia que a “angulação da empresa entra pelos poros do repórter, como necessidade de ascensão.”[43] O repórter Daniel Freitas estava pesquisando algumas informações em uma matéria que tinha feito, quando me explicou que a causa da matéria foi as autoridades (prefeito, governador e senador) estarem presentes. “Quando eles estão, têm que cobrir o evento na certa para o jornal”, afirma Daniel. Ou “quando a matéria é assunto do Bahia Meio Dia, é preciso pautá-la para o jornal também”, complementa o repórter. Neste caso, a interiorização da política do jornal não é seguida por motivos de ascensão profissional, mas pode ser entendida pelo fato de o repórter querer continuar no emprego e fazer bem o trabalho aos olhos dos superiores.

4.4 Outras dificuldades operacionais e as estratégias usadas pelos repórteres para driblá-las

Telefones ocupados, que chamam e não atendem, celulares na caixa postal, fontes que não dão retorno, pautas que não estão produzidas e releases que não ajudam em quase nada são outras preocupações dos repórteres. Como cada um deles tem um tempo para terminar a matéria, que varia de acordo com a editoria para a qual o repórter trabalha, o que não se consegue até lá acaba ficando sem ser feito. O problema dos telefones ocupados aconteceu com Daniel; as fontes sem retorno, com Regina; os celulares na caixa postal, com Casé e Renata.

Todos tentam dar um jeito para driblar os imprevistos: Daniel ficou sem o depoimento do antropólogo, mas pesquisou em uma matéria anterior algumas informações sobre o memorial que complementaram o texto: “Até que rendeu. Pensei que esta matéria não fosse render nada”, disse Daniel, que escreveu 42 linhas sobre a inauguração de novidades no Memorial das Baianas. Regina insistiu com o professor da Ufba, que não tinha respondido aos recados na caixa postal e nem aos e-mails. Recorreu a um contato de matérias anteriores que acabou dando o celular do professor, que atendeu e marcou uma entrevista por telefone às 21 horas do mesmo dia. Quanto aos lugares que não deu tempo passar, Regina disse que ia resolver tudo por telefone. Renata, que também reclamou de um assessor de um órgão púbico que não tinha chegado às 9 horas e estava com o celular desligado, insistiu também até que o assessor atendeu. Enquanto isso, ela foi escrevendo a outra pauta do dia que já estava apurada. Casé também encontrou o celular de um assessor desligado. O repórter do Correio queria mais informações sobre o seminário de Farmácia. Já que o celular do assessor estava desligado, ele disse “Vamos passar lá depois da outra pauta.”

Não é sempre que o repórter recebe uma pauta produzida, ou seja, com os nomes das fontes e o enfoque da matéria detalhado. No caso de Casé, foi isso que aconteceu, segundo ele. A pauta sobre o evento de Farmácia não estava produzida. Quando chegamos ao Centro de Convenções – depois de ter passado no Centro de Saúde pensando que a matéria fosse lá –, Casé disse: “O pior é que não me deram direcionamento específico para essa matéria. Então, esta vai ser mais geral que a outra do São João.” Josenildo Luiz Guerra afirma em seu texto que a pauta deve conter perguntas que façam com que o jornalista se abra para o fato em busca de respostas. “A pergunta realiza um duplo movimento: coloca o problema, portanto, desarma o repórter de suas respostas prontas e o impulsiona, o abre para o fato; ao mesmo tempo traça o percurso que ele deverá trilhar em busca das respostas a que procura.”[44]

Ressaltar a importância da pauta produzida não quer dizer que o repórter não tenha que decidir sobre o que é notícia. Tanto isso é verdade que a maioria dos profissionais e professores de Jornalismo já disse algum dia que a pauta não deve servir como uma “camisa de força” para o repórter. Se o profissional chega ao lugar da apuração e percebe outro ângulo para explorar o problema, ele deve fazê-lo, independente da sua pauta ter previsto aquela situação. É bem verdade que a liberdade para o repórter fazer isso depende do jornal em que ele trabalha e dos seus superiores. Certamente, existem profissionais que irão “torcer o nariz” se o repórter trouxer da rua uma apuração diferente daquela que foi pedida na pauta. Nesses casos, a pauta bem produzida passa a ser mais importante ainda, porque ela servirá como uma orientação para o repórter buscar a notícia pretendida por quem lhe passou a pauta. Quando a pauta é geral, fica a impressão de que é o repórter que deve descobrir a deixa para o assunto. E não há nenhum mal nisso, só que foi motivo de reclamação para alguns repórteres acompanhados, justamente porque essa situação exige que o profissional reflita sobre o tema, preste mais atenção ao que está acontecendo a sua volta e explore o assunto sobre vários aspectos até achar a notícia, o que significa mais trabalho para o repórter.

No dia em que acompanhei Renata Matos, Daniel estava fazendo uma matéria sobre a migração dentro do estado. A pauta pediu que ele procurasse pessoas que tinham deixado sua cidade natal para virem estudar ou trabalhar em Salvador. Pedia ainda que procurasse entender este fenômeno com algum estudioso da Ufba, mas Daniel disse que não ia fazer isso porque a pauta não estava produzida. Ela não trazia sequer a unidade da Ufba que pudesse desenvolver este tipo de estudo. Não deu outra: a matéria saiu com as informações do material entregue pela chefia de reportagem e que era dados do IBGE sobre o assunto, sem depoimentos de estudiosos sobre o caso. O repórter também teve que dar um jeito para encontrar os personagens para a matéria, não especificados na pauta.

Falando de material entregue pela chefia de reportagem, a maior parte dele é de releases. Nem sempre eles ajudam na formulação da matéria. Um colega de Regina Bochicchio, do A Tarde, reclamou que os releases são muitas páginas que não dão informação substancial quase nenhuma. Ao invés de números precisos, eles trazem expressões como centenas, milhares, muitas, etc. Esta é a visão dele se baseando no release que ele tinha na mão naquele momento. Mas Daniel Freitas, do Correio, também concorda: “Tem release que só tem letra, mas não se consegue tirar nada.”

E na hora de entrevistar a própria fonte, quando as perguntas são feitas e não se consegue tirar muita informação? Aconteceu isso com Daniel e também com Érico Monte, da Editoria de Esporte do Correio. Com Érico, nem foi a fonte que falou pouco, mas o evento que se resumia a pouquíssima coisa. A pauta era no Parque da Cidade sobre um projeto da jogadora de vôlei Ana Moser e da Prefeitura de São Paulo. Érico comentou: “Eu pensei que fosse ter mais coisa, mas é só uma demonstração.” Isso reflete na matéria em duas coisas: na hora de escrever, quando o repórter diz que vai ter que enrolar um pouco e, conseqüentemente, no número de linhas a serem escritas, que diminui.

Voltando a questão dos releases, uma coisa percebida no Correio, mas ouve-se falar que acontece em todos os jornais, é a publicação do mesmo na íntegra, e pior, em substituição a uma matéria. Um dos repórteres acompanhados viveu isso, mas não foi no dia em que eu o acompanhei. Quando passei a manhã com Daniel Freitas, eu almocei com um repórter, que me contou que no dia anterior tinha ficado até às 15 horas fazendo três pautas, que não saíram. Todas as três matérias foram substituídas pelos respectivos releases. Essa situação não foi encontrada no jornal A Tarde.

4.5 O repórter é um “faz tudo”

Há duas ou três décadas, o repórter apurava a pauta e escrevia sem tanto compromisso, pois a forma do texto era dada pelo redator, figura que hoje definitivamente não se encontra mais nas redações de jornal impresso. A função do redator é agora mais uma tarefa que deve ser exercida pelo editor. Por isso, é cada vez mais freqüente a expressão “Estou editando a matéria”, que não se refere somente à arrumação dela na página, mas à correção mesmo. O repórter precisa escrever a matéria já pensando em como o editor gostaria que ela estivesse. Quanto à correção dos textos, não há mais mediação entre repórter e editor.

Além de escrever a matéria, os repórteres hoje sugerem imagens para o texto que estão produzindo, sugerem títulos e pautas. Num ou noutro jornal, isso se mostra mais ou menos sistemático e depende também do profissional, mas de uma maneira geral, fica evidente que os empregadores querem cada vez mais que os repórteres participem de tudo, inclusive, da diagramação do texto na página. Todos os repórteres observados podem exemplificar o que foi dito acima.

No caso de Regina, do A Tarde, jornal que sofreu uma reformulação e acabou privilegiando esse tipo de comportamento, pode-se falar sobre a sugestão de fotos e de pautas. Antes de sair para apurar a sua matéria, ela foi conversar com o editor de fotografia do jornal, Saturnino Braga, para explicar por que estava saindo sem fotógrafo. Regina iria primeiro apurar a informação e ver se ela realmente daria uma matéria para depois o jornal poder providenciar a foto. Mesmo assim, já nessa conversa ela sugeriu que a foto fosse de alguém abastecendo ou convertendo seu motor a gás num posto de gasolina. Quando voltou para a redação e já sabia que o assunto daria uma matéria, Regina conversou de novo com Saturnino para lhe dar retorno e dizer que precisaria da foto. Sobre a sugestão de pautas, Regina não se descuidou. Enquanto ia entrevistando, sempre perguntava às fontes sobre quais assuntos dariam matéria para o jornal. Foi assim com o técnico do Detran e com os funcionários da SET.

Com Iansã Negrão, que trabalha para o Caderno Dez! do A Tarde, o processo já é mais automático. Como ela também edita o caderno, ela dá os títulos aos textos e providencia as fotos. Mas, mesmo assim, os colaboradores do caderno já sugerem títulos e fotos que são aprovados ou não por Iansã. Ela explica: “A diferença de quem está chegando é querer ter domínio de tudo que está fazendo. Por isso, ao fazer o texto, a pessoa sugere também título e foto. Não dá mais para esperar pela pauta para somente cumpri-la e entregar, sem saber como ela vai ser editada.”

No dia em que acompanhei Iansã, Ana Paula Boni, do Alô Redação, foi incorporada à equipe do Dez! Foi o dia também que ela tinha feito uma matéria para a capa do caderno e Iansã e a editora Nadja Vladi estavam corrigindo. Ao ver Ana Paula participando da diagramação da sua matéria, Nadja falou: “Que ótimo Ana estar participando da diagramação. Só não conseguimos dobrar Carla”, se referindo a outra repórter do caderno, Carla Bittencourt, que não costuma estar na diagramação. Com isso, a editora do Dez! deixa claro que o ideal é o repórter realmente participar de todas as etapas da produção de uma matéria, desde a pauta até a diagramação, passando pela sugestão de títulos e fotos.

No Correio da Bahia, existe um arquivo onde os repórteres redigem as sugestões de pauta. Além disso, percebi também a liberdade de os repórteres conversarem com os editores e subeditores sobre assuntos que podem ser matéria para o jornal. No dia em que acompanhei Patrick Brock, do Folha da Bahia, ele foi conversar com o subeditor para sugerir uma matéria sobre uma escritora dos Estados Unidos que estava fazendo sucesso com o livro que contava a história de quando ela foi estuprada. O subeditor pediu que ele pesquisasse sobre isso. Enquanto escreve, Patrick também sugere títulos e subtítulos.

Quando saí com o repórter Érico Monte, também do Correio, para cobrir uma competição de espadas, o fotógrafo perguntou se era para registrar a competição ou se só era para tirar fotos do campeão. Érico disse que podia ser uma foto geral do evento. Isso demonstra a sintonia com que repórter e fotógrafo devem trabalhar, pois o repórter que vai escrever precisa ter em mente a imagem que o jornal pode colocar para ilustrar a matéria e o fotógrafo também precisa estar ciente do enfoque que o repórter vai dar ao texto. Na segunda pauta do dia, no Parque da Cidade, Érico tinha que entrevistar Ana Moser. O jornal também tinha mandado ao evento uma repórter de Cidade e, por isso, o fotógrafo já sabia que tinha que registrar a atleta e o evento de uma forma geral. Apesar disso, os repórteres e fotógrafos recebem pautas separadas.

Enquanto esperava a editora do Correio Repórter chegar, Jane Fernandes redigiu três sugestões de pauta no arquivo destinado a isso no Correio, Pautas Aqui Salvador. “Estou para fazer isso há um tempo”, disse ela. Quem analisa as pautas desse arquivo é a produtora do Correio. Uma sugestão de pauta tem entre 8 e 10 linhas e deve trazer a sugestão de fontes a serem procuradas: nome, cargo e telefone.

Capítulo IV

Conclusão

A pesquisa objetivou responder a duas perguntas: quais são as maiores dificuldades enfrentadas pelo profissional recém-chegado à redação ao ter que produzir o texto jornalístico? Quais são as estratégias usadas pelo jornalista para ultrapassar essas dificuldades?

Quanto à primeira questão, a resposta é: a tensão do dia-a-dia, os imprevistos, o tempo apertado, as fontes não-acessíveis, as pautas sem produção, os releases não-informativos e a dificuldade de escrever a matéria, quando o assunto não rende ou o repórter não consegue levantar informações suficientes junto às fontes. Podem parecer pequenas coisas, mas nem é preciso reuni-las para que o repórter, por exemplo, sinta dificuldade. Uma simples fonte que não é encontrada, ou que não pode atender no momento, já gera complicações para a vida do jornalista. Sobre as condições de trabalho, deu para perceber que não há problemas quanto a carros, telefones e computadores disponíveis. A exceção foi o dia em que a repórter Jane Fernandes, do Correio da Bahia, não pôde ter acesso a Internet porque estava sem senha.

Há prazos a cumprir e o repórter não tem o dia todo para apurar determinada matéria. Quando a pauta era para o dia seguinte, as dificuldades encontradas foram superadas para que o texto ficasse pronto. Esses foram os exemplos de Daniel Freitas, Marcos Casé, Érico Monte e Renata Matos. Quando a matéria não era necessariamente para o dia seguinte, como nos casos de Regina Bochicchio e Patrick Brock, os repórteres deram um jeito de preencher as brechas de outras maneiras, usando o telefone, por exemplo. Já Fernanda Carvalho e Jane Fernandes, que preparavam matérias para o Correio Repórter, tinham 15 e 30 dias, respectivamente, para cumprir a pauta. Apesar de não estarem pressionadas pelo fechamento da edição, todas duas se preocuparam com o fator tempo. Apesar do maior prazo que os repórteres deste caderno possuem, a quantidade de informações que têm que ser levantadas também é muito maior, por isso a preocupação com o tempo. Fernanda estava angustiada pelo feriado que teve no meio do seu trabalho, o que inviabilizou a continuação da pesquisa durante determinados dias, e Jane já pensava na falta que iam fazer aquelas horas perdidas tentando acessar a Internet para começar a sua pesquisa. Durante os nove dias passados com os repórteres, ficou evidente a questão da pressão do tempo. Quando um dos repórteres escreveu uma das duas pautas apuradas no dia, o editor desceu ao anexo para perguntar sobre a outra matéria. Ele tinha pressa, porque havia um buraco na página e o editor precisava do texto. Já eram 19 horas.

Penso que a pressão do tempo não se confunde com o fato de o ritmo alucinante de trabalho não existir, de ser um mito. Os próprios repórteres afirmaram que há dias em que as pautas são quentes (jargão do jornalismo que indica um acontecimento importante, que vai mudar o rumo de determinado fato). Em outros dias, as pautas são simples bobós, em que eles não se sentem nem um pouco estimulados em cumprir a pauta. O que move o repórter, neste caso, é a necessidade de cumprir com a obrigação. Como esses dias de marasmo existem, fica claro que aquele ritmo alucinado de trabalho – visto, por exemplo, em filmes que são passados na universidade como o Caso Watergate e em Todos os Homens do Presidente – não é real.

No caso do caderno Correio Repórter, que achei que merecia um capítulo por esclarecer como o trabalho é realizado dentro do jornal, podem-se tirar algumas conclusões. A mais evidente delas é que a escolha do fato a ser desenvolvido na reportagem leva em conta critérios puramente subjetivos. A editora do caderno dá ao repórter opções de pauta que, geralmente, dizem respeito a assuntos frios, sem ligação com nada que esteja acontecendo no presente. Um exemplo disso foi a escolha do tema Café, que seria trabalhado por uma repórter que estava fazendo a matéria de capa pela primeira vez. Alguns valores-notícia, que são os componentes da noticiabilidade de um fato, aparecem durante a discussão da pauta, já escolhida. Ou seja, o tema a ser explorado deve ter ligação com a Bahia e trazer algo peculiar, possuir curiosidades. Mauro Wolf concluiu que os valores-notícia estão espalhados ao longo de todo o processo de produção da notícia, e não somente na fase de seleção. Foi o que se viu no caso do Correio Repórter.

Pelo trabalho realizado durante a pesquisa, é possível afirmar ainda que, quando não há condições de driblar as dificuldades, isso é refletido na matéria, ou seja, o texto acaba saindo sem a informação ou é preenchido de outras maneiras pelo repórter, a exemplo da recuperação de informações em matérias precedentes. Durante o acompanhamento dos nove repórteres pesquisados, não houve casos de a matéria ter sido deixada para outro dia em função de dificuldades encontradas pelo repórter.

Achamos que o recém-formado, que é alvo deste trabalho, não é o único entre os jornalistas que enfrenta dificuldade na hora de apurar ou escrever uma matéria. Logo no primeiro semestre do curso, ouvimos de um experiente jornalista que hoje exerce o mandato de deputado estadual pelo PT-BA, professor Emiliano José, que ele próprio, até o fim da vida, iria escrever o lead umas cinco vezes até acertar. Lendo o livro Olga, do jornalista Fernando Morais, me chamou a atenção o seguinte trecho: “Foi nessa época que eu me lembrei de uma frase de um antigo chefe de reportagem, que costumava dizer que ‘ao repórter, como ao goleiro, não basta trabalhar direito – é preciso ter sorte.’ Eu tive e muita”, se referindo à extensa pesquisa que fez para traçar a biografia de Olga Benario Prestes.

Como parte das dificuldades enfrentadas pelos repórteres, viu-se ainda a questão das pautas mal elaboradas que, na verdade, não deveriam nem ser chamadas de pauta. Algumas são pedaços pequenos de papel que informam o lugar do acontecimento, o horário e o nome do assessor de imprensa. Nestes casos, conclui-se que é o repórter que decide o que será a notícia, pela sua observação do fato e pelas conversas com as pessoas envolvidas. O fato de tal aspecto do acontecimento virar notícia vem justamente durante a construção da mesma.

Quanto à segunda questão – sobre as estratégias usadas para superar os problemas – os mecanismos são variados e aparentemente simples, até óbvios. Se o repórter não consegue falar com determinada fonte, busca um substituto, redige a matéria sem o depoimento ou procura “encher” as linhas com informações já usadas em outra ocasião. Há ainda outras alternativas: o repórter dribla o tempo tentando apurar a outra matéria do dia ou simplesmente “dá um tempo”. Se não foi possível falar pessoalmente, usa-se o telefone. Se o repórter saiu para apurar um fato que não aconteceu, é possível voltar outro dia, quando não se tem a pressão do fechamento. Quando, no meio de uma apuração, surge um fato interessante, o repórter apura e se torna o autor de uma pauta. Se o repórter tem nas mãos uma pauta que não está produzida, ou seja, não contém indicação de fontes, contatos nem direcionamento, é preciso correr atrás ou não cumprir a exigência.

Não há regras a serem cumpridas nos casos de dificuldades. Cada repórter acha a sua maneira de ultrapassá-las. Como os problemas são comuns a todos, as estratégias acabam sendo parecidas. Percebe-se, contudo, que essa questão das dificuldades leva a dois aspectos. O primeiro é que muitos repórteres vivem essas situações pela primeira vez, justamente por não terem estado em contato com a prática jornalística durante o período de graduação. O segundo aspecto é que as próprias empresas jornalísticas não treinam os seus repórteres antes de contratá-los. O que acontece é o profissional ficar um tempo por experiência, mas já produzindo para o jornal.

O dia-a-dia do profissional recém-formado nos dois maiores jornais impressos de Salvador é marcado por imprevistos e correria, intercalados por períodos de marasmo e pautas bobó. Chegar na redação, ler o jornal do dia e ver como saiu a sua matéria, discutir a pauta com o chefe de reportagem, sair para apurar a matéria, voltar à redação e redigir a matéria. Esta pode até ser uma descrição muito conhecida, romântica, ingênua, arcaica ou simples, mas é exatamente o que acontece no dia-a-dia de um repórter – e a pesquisa comprovou isso (veja anexo sobre a atividade dos nove jornalistas observados).

Se isso garante uma rotina, sabemos também que o repórter pode estar um dia com o prefeito, outro dia cobrindo uma manifestação, um dia cobrindo uma missa católica e no outro assistindo a um ritual de candomblé. Pode também chegar um dia para trabalhar e sair da redação com a tarefa de apurar as causas de um buraco na rua ou, simplesmente, não sair e apurar coisas banais, sem grande importância, pelo telefone mesmo. Pautas quentes ou bobó, não importa. O dever é se esforçar para escrever a matéria do dia. E os procedimentos são os mesmos: chegar na redação, conferir os jornais, discutir a pauta, sair, escrever...

Uma melhor e mais adequada formação acadêmica poderia ajudar no tratamento desse tipo de situação pelo repórter recém-saído da faculdade? Será que se a prática jornalística fosse colocada ao estudante com mais freqüência, se o estudante pudesse vivenciar mais de perto a profissão, o dia-a-dia não ficaria mais fácil? Esta é uma questão que merece uma análise posterior, assim como é importante saber até que ponto as estratégias usadas pelos repórteres interferem na qualidade do texto e na compreensão do mesmo pelo leitor. O texto fica mais pobre se trouxer algumas linhas com repetições do que já foi dito ou informações buscadas de outra maneira ao invés de um depoimento de uma fonte especialista no assunto, que não foi encontrada? Qual o papel da empresa jornalística para permitir que o prejuízo com relação ao texto seja o menor possível? Onde a organização e os superiores entram para não deixar que as dificuldades interfiram na matéria? Estes dois últimos questionamentos também podem render futuras pesquisas.

6.Bibliografia

FERREIRA, Giovandro Marcus. Apontamentos sobre as propriedades do campo de produção jornalístico.

GENRO, Adelmo Filho. O segredo da pirâmide. Para uma teoria marxista do jornalismo. Porto Alegre: Editora Ortiz, 1989 (2ª impressão).

GUERRA, Josenildo Luiz. Ensaio sobre o jornalismo: um contraponto ao ceticismo em relação à tese da mediação jornalística. Universidade Federal de Sergipe.

LAGE, Nilson. Ideologia e técnica da notícia. Petrópolis: Editora Vozes, 1979.

MEDINA, Cremilda. Profissão jornalista: responsabilidade social. Rio de Janeiro: Forense – Universitária, 1982.

MOTTA, Luís Gonzaga. O sentido histórico do termo “a produção da notícia”. Brasília, 1995. IN: : PEREIRA JR., Alfredo Eurico Vizeu. Discutindo o que é notícia. Os bastidores do telejornalismo. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000.

NETO, Otávio Cruz. O trabalho de campo como descoberta e criação. IN: MINAYO, Maria Cecília de Souza (org). Pesquisa social. Teoria, método e criatividade. Petrópolis: Editora Vozes, 1994.

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RIBEIRO, Jorge Cláudio. Sempre alerta. Condições e contradições do trabalho jornalístico. São Paulo: Brasiliense, 1994.

TRAVANCAS, Isabel Siqueira. O mundo dos jornalistas. São Paulo: Summus, 1993.

TUCHMAN, Gaye. Making News. A Study in the Construction of Reality. New York: The Free Press, 1978.

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WHITE, David Manning. O gatekeeper. Uma análise de caso na seleção de notícias. IN: TRAQUINA, Nelson (org). Jornalismo: questões, teorias e estórias. Lisboa: Vega, 1993.

WOLF, Mauro. Teorias da comunicação. Lisboa: Presença: 1994.

7. Anexo

Seguem as descrições feitas durante o acompanhamento dos nove repórteres pesquisados para este trabalho. A ordem respeitou o dia em que estive com cada profissional.

Registro da atividade diária de nove jornalistas recém-formados que trabalham nos jornais A Tarde e Correio da Bahia:

1)Regina Bochicchio – A Tarde (10 de junho de 2003, terça-feira)

Regina fez Jornalismo na Facom em sete anos. É da turma de 95. trabalhou quatro anos no jornal Correio da Bahia na reportagem e está há três meses no A Tarde. Trabalha sete horas por dia. No dia em que marcamos, chegou às 14h12 (bateu o ponto). Nos encontramos às 14h45 na ante-sala da Redação. Ela disse “Estamos atrasadas.” Regina ia para a rua apurar uma informação que tinha conseguido por acaso de um gerente de uma revendedora quando fazia uma matéria sobre a poluição do ar. “O cara me disse que 80% dos fregueses dele eram carros particulares que vinham abastecer com gás natural.” Regina queria confirmar a informação de que a conversão de gás natural em carros particulares está virando uma tendência. Ela foi me contando o que íamos fazer e por onde passaríamos enquanto íamos descendo para encontrar o motorista. No A Tarde, são 24 motoristas.

O roteiro era o seguinte: 1)Posto Mataripe (escolheu este porque era revendedor de gás natural, um convertedor, e ficava próximo ao jornal), 2)Detran, 3)Getax (da Prefeitura), 4)Sinditáxi, 5)Desenbahia, 6)outro posto revendedor e convertedor. Antes de sairmos, Regina conversou com Saturnino Braga, editor de fotografia, explicando por que ela não tinha requisitado um fotógrafo (estava saindo apenas para checar uma informação e só teria matéria se a informação se confirmasse). Aproveitou para discutir com Saturnino como seria a foto para ilustrar caso a matéria saísse.

Regina nunca tinha saído antes com Ubaldo (acho que era assim que o motorista se chamava). Ambos não gostavam da chuva que caía desde cedo. “Dia de chuva não é dia para se trabalhar”, brincou o motorista. Regina estava animada e torcia para confirmar a informação que tinha. Descemos no Posto Mataripe para falar com o gerente, que disse que aumentou significativamente o número de carros particulares que tinham convertido o motor para dupla combustão (gasolina e gás natural – GNV). Tudo que Regina queria era encontrar um cliente de carro particular convertendo o motor para gás. Achamos uma que estava abastecendo a gás e que havia convertido o motor há uma semana. Regina não escondeu da fonte a alegria de tê-la encontrado e me disse: “Repórter tem que ter sorte.” E realmente foi por acaso que encontramos a mulher abastecendo. Apesar de estarmos no lugar certo ( e isso é importante), podia ser que o posto estivesse vazio naquela hora, sem clientes com carro particular. Tinha muito táxi. Foi o que Regina percebeu.

Fomos para o Detran. Regina queria dados que atestassem a informação de que estava crescendo o número de conversões para gás nos carros particulares, de pessoas que não usam seus carros como instrumento de trabalho. Regina falou: “Vamos passar na assessoria de imprensa primeiro para não chatearmos nossos colegas”, ironizou Regina. O assessor conversou, fez contatos e nos levou para o técnico da vistoria. Regina quis saber dele sobre os procedimentos para o motorista que quer converter o motor de seu veículo. Depois, chegou o chefe de outro setor para finalmente fornecer os dados e falar sobre outras questões. Tudo isso assistido pelo assessor. Quando entramos no carro, Regina respirou e deu Graças a Deus por termos conseguido sair do Detran. “Meu Deus, como conversaram”, disse ela.

Estávamos indo para o Getáxi e Regina resolveu que não íamos mais para o Sinditáxi por causa da hora. Já eram 17 horas. E ela confirmou com o motorista: “Essa hora o trânsito fica muito ruim e temos que voltar para a Redação.” Regina ainda falou: “Ir para o Sinditáxi hoje não dá mais, embora os táxis não sejam o meu foco nesta matéria. Era só para cruzar os dados. Tudo que eu precisar agora será por telefone.”

Chegamos no Getáxi e vimos na porta que o expediente só ia até às 17 horas. “Aqui ninguém trabalha não, é?”. Quando Regina foi falar com um homem que estava em outra porta, ele disse que as pessoas do Getáxi tinham acabado de sair. Regina aproveitou para perguntar sobre a greve da SET. Por falar nisso, ainda no Detran ela perguntou ao técnico sobre o que a mídia deveria abordar sobre essa parte de vistoria de veículos e deu o e-mail ao assessor para eles sugerirem pautas para o jornal. No Getáxi, tentamos ainda o Inmetro (outra fonte para a matéria fornecida pelo técnico do Detran), mas não conseguimos. Não tinha ninguém. Antes de entrarmos no carro e voltar para a Redação, Regina já fazia um balanço da saída: “Prefiro mil vezes fazer matéria na rua. Matéria se faz na rua.”

Ao chegar na Redação, Regina foi chamada pelo secretário da Redação, Paixão Barbosa, para discutirem outra pauta, sobre pirataria. Além de Regina e Paixão, estavam o editor de fotografia e o diretor de imagem do jornal (com a reformulação no A Tarde, ele apareceu para cuidar da imagem do jornal, segundo me explicou Regina). Todos opinaram sobre o enfoque e a produção da matéria. Regina teria que fazer um orçamento para o dia seguinte. Ela disse que providenciava isso até antes do final da tarde, mas disse que a matéria não poderia ficar pronta no dia seguinte. “Pra amanhã, não dá.” Durante a conversa, Regina mencionou algumas vezes sobre a pesquisa que fez na Internet, tanto para a matéria do gás quanto para a da pirataria. Regina ainda foi falar com o editor de fotografia sobre a matéria do gás, para dar sugestões de fotografia.

Regina voltou para o CDI e fez um balanço do que tinha e achava que já tinha informações suficientes. Os depoimentos que tinha conseguido por telefone antes da saída e no dia anterior, os que tinha conseguido na rua e ainda os que ia pegar por telefone: o gerente da Bahia Gás, o professor da Ufba (que não tinha respondido aos telefonemas nem ao e-mail que Regina já tinha enviado), um economista, o Inmetro e o Sinditáxi – estes dois últimos Regina ia providenciar na manhã do dia seguinte. Enquanto ela ia fazendo esses cálculos, já pensava nas infografias, nos boxes e em como ia começar o lead. A essa hora, Regina já tinha também uma certeza: queria terminar logo essa matéria para poder ficar livre para a outra pauta, a da pirataria. “É melhor ficar até tarde para terminar uma matéria do que deixar para o dia seguinte. Perde-se o fio da meada.” Regina tinha que dar uns telefonemas e disse que ia começar a escrever aquilo que não era matéria: informações da Internet e informações frias.

Sobre o professor da Ufba, que não respondeu, ela disse “Isso é muito chato.” Mas, Regina conseguiu falar com ele no celular e marcou para telefoná-lo às 21 horas. Regina tem um porta-cartões onde guarda os contatos que as fontes lhe dão. A repórter disse ainda que iria pedir espaço para a matéria e foi o que conversou com Olenka, a editora. Olenka pediu que ela fizesse a matéria do tamanho que fosse e depois a mostrasse. A hora em que Regina sentou no computador (além de dar os telefonemas) foi o momento de descontrair com os colegas. Carla, do Dez! e Zezão, que disse uma coisa interessante: reclamava dos releases dos assessores de imprensa, que lotavam páginas de fax sem informar muita coisa: nada de números, só milhares, muita coisa, centenas, etc.

Fui embora às 19 horas e Regina ficou.

2)Iansã Negrão – A Tarde (13 de junho de 2003, sexta-feira)

Iansã marcou comigo na redação do jornal A Tarde entre 8h e 8h30. Quando cheguei, ela já estava lá. Perguntei se eu estava atrasada e ela disse que foi ela quem chegou mais cedo. Iansã estava editando as colunas do Caderno Dez! (textos enviados pelos colunistas do caderno que trabalham em casa). A televisão dentro do CDI (Central de Informações do A Tarde), onde ficam as duas mesas e os dois computadores disponíveis para o trabalho no Dez!, estava sintonizada na Globo News e a morte do canto Itamar Assunção chamou a atenção de Iansã.

Enquanto corrigia as colunas, Iansã reclamou que não tem jeito para os colunistas escreverem certo determinadas palavras, que já foram padronizadas pelo Caderno Dez! Ela também corrige erros de concordância. Outro problema é o do espaço: “Não adianta. Tem sempre que cortar alguma coisa no texto e este já está grande”, diz ela, se referindo ao texto que estava corrigindo. Como é uma coluna, Iansã me explica que na hora de colocá-la na página é que ela decide se põe uma imagem para ilustrar ou não. Neste caso, um trecho da coluna comparava artistas completamente diferentes e foi para este trecho que ela quis arranjar uma imagem para ilustrar (uma de cada artista – Martinho da Vila e uma banda internacional).

Corrigindo uma outra coluna que falava sobre moda e a vontade das jovens em se tornarem modelos, Iansã reclamou: “Às vezes, as pessoas querem escrever para os jovens e acham que devem fazer um texto cheio de gírias e não é bem assim.”. Enquanto falava, Iansã substituía algumas gírias por expressões mais tradicionais. O texto estava realmente cheio de gírias e eu concordei com ela.

Neste tempo, perguntei se Iansã dava os títulos nas matérias. Ela me respondeu que o ideal é que o jornalista que escreveu a matéria sugira título e fotos. Como a menina que redigiu o texto providenciou fotos para ilustrá-lo, Iansã levou-as à diagramadora do Dez! (e que diagrama também o caderno da TV), Ana, para ela fazer a marcação das fotos. Iansã ficou de levar as fotos marcadas para a editoria de fotografia, porque ia aproveitar para ver se achava uma foto de Chico Science para ilustrar aquela primeira coluna (ela ainda não tinha se decidido sobre Martinho da Vila). Iansã não achou a foto que procurava na editoria de fotografia. Foi ao arquivo do jornal, não achou a pessoa para procurar as fotos (agora de Martinho da Vila e da banda internacional) e deixou recado. Enquanto subíamos para a Redação novamente, Iansã disse que se não achasse as fotos, partiria para o plano B: Internet.

Iansã voltou para o computador e me explicou que sexta-feira é o dia mais corrido do fechamento do Caderno Dez!, que acaba na terça-feira, às 13 horas. Na quarta, Nadja Vladi (editora do caderno) dá a última olhada. Iansã começou a dizer enquanto procurava as fotos na Internet: “A grande diferença de quem está chegando é querer ter domínio de tudo que está fazendo. Escrever a matéria, sugerir título e fotos. E não esperar pela pauta. Não adianta receber a pauta, escrever e entregar a matéria, sem saber como ela vai ser editada, por exemplo.”

Abrindo parênteses: (Iansã é namorada do irmão de Regina Bochicchio e está no jornal há quase dois anos.)

Ao escolher algumas fotos de Martinho da Vila e da banda internacional, Iansã salvou-as e enviou pela Internet as fotos para a editoria de fotografia. Ela me explicou que era um trabalho de português: enviar as fotos para a editoria para eles imprimirem, aí ela vai pegar as fotos para marcá-las com a diagramadora e depois levar de volta para a editoria de fotografia. Dessa vez, quem levou as fotos para a editoria foi um rapaz (boy). Em algum momento (acho que no início do nosso encontro), Iansã me avisou que íamos ficar pra lá e pra cá: computador no CDI, diagramação e editoria de fotografia.

Iansã sentou com a diagramadora Ana para olhar a diagramação do resto do jornal (Caderno Shopping e primeira capa) e comentá-la. Ana estava falando alguma coisa de um diagramador, em tom de segredinho, que não deu para saber o que era. Nessa hora também, Ana mostra algumas páginas do Caderno de TV que ela já diagramou e Iansã gosta. Mostra também a capa e a contracapa do caderno e como resolveu a diagramação das páginas com os anúncios que tinha que entrar.

Iansã começa a corrigir outra coluna: Sexo Verbal e se depara com dificuldades. Iansã quebra a cabeça para corrigir o texto, que tem frases ruins. “Este é o menor dos textos do caderno, mas é o que dá mais trabalho.” Ela justifica isso dizendo que a linguagem médica, de saúde é complexa. Depois do Sexo Verbal, Iansã editou o guia semanal – um texto que foi enviado para Nadja Vladi por Nelson Pretto. Foi escrito por um estudante que falava sobre a difícil escolha da profissão. Iansã leu, deu título e enviou um e-mail a Nelson pedindo mais informações do estudante: idade, série e escola em que estuda. Disse que seria interessante publicar um texto sobre esse assunto no Dez! e melhor ainda porque foi feito por um estudante que está passando por isso.

Carla Bittencourt chegou e Iansã pediu que ela visse a matéria de capa.

Estávamos na diagramação com Ana e aquelas fotos pedidas no arquivo do jornal chegaram “500 anos depois”, como disse Iansã, que nem as olhou já que tinha resolvido o problema conseguindo as fotos na Internet (que são publicadas no Dez! como divulgação). Iansã ia fazendo ajustes e viu que o texto do guia semanal estava enorme. Iansã disse “É a eterna briga do conteúdo com a forma”. Passamos para escolher a foto para capa (Ana trocou a foto que estava), mas pulamos essa parte. Nadja Vladi chegou (eram umas 10h30).

Iansã estava esperando Nadja chegar para ver a matéria de capa. Ela, a editora e Ana Paula Boni (autora da matéria) foram vê-la.

Enquanto liam, Nadja se animou em fazer o passeio que Ana Paula descrevia na matéria. Iansã disse “Tomara que nossos leitores sintam a mesma coisa”, se referindo ao interesse que elas tiveram em fazer o que a matéria falava. Depois que Nadja corrigiu, Iansã sentou para dar título e fazer a chamada de capa que já estava pronta em sua agenda. Nadja tinha pedido para fazer uma chamada dizendo alguma coisa assim “Fuja do São João e faça algo legal, diferente” e Iansã fez.

Agora estamos com a diagramadora novamente para ver a matéria de Ana Paula. Iansã pegou uma das páginas do caderno para colocá-la no “setor” de Ilustração, em outra sala, para alguém fazer o desenho. Nadja chega e diz que tem uma ótima notícia: Ana Paula fará parte da equipe do Dez!, que ficará com três repórteres: Carla, Iansã e Ana Paula. Iansã chamou Ana Paula para identificar as fotos (feitas por ela) de acordo com os trechos do texto. Ela chega para participar da diagramação. Nadja encosta e diz: “Que ótimo Ana estar participando da diagramação. Só não conseguimos dobrar Carla”, mostrando que o ideal é o repórter realmente participar de todas as etapas.

Eu pergunto sobre como vai ser o trabalho dali para a frente e Iansã me diz que só vai terminar de ajeitar a matéria de Ana Paula na página para ir para casa. O resto da diagramação ficará para segunda. São 13 horas e eu vou embora.

3)Marcos Casé - Correio da Bahia (16 de junho de 2003, segunda-feira)

Cheguei na hora marcada: 13h15. Casé já tinha chegado e disse que eu não estava atrasada. Antes de participar da pequena reunião com a chefe de reportagem, Liana Rocha, ele me leva ao anexo para falar com Renata Matos, outra recém-formada que está na minha lista. Daniel Freitas, outro repórter do Correio, vai junto. Eu marco com Renata para quarta-feira, 18, às 8 horas.

Na reunião, onde estavam Casé e mais três repórteres, Liana queria uma sub para a matéria dos asilos feita no fim de semana e ela pergunta quem leu a matéria. Todos viram ou só deram uma olhada. O clima é de descontração. Casé recebeu duas pautas e deu uma lida para tirar com Liana algumas dúvidas: local de apuração, o que é para fazer e o horário de um dos eventos. Casé recebe a requisição para poder sair com um motorista. Para ele, não vai ter fotógrafo. Uma das fotos foi tirada de manhã (São João/Ala) e a outra um fotógrafo passaria pelo evento depois para registrar.

Casé me explica que a pauta do Ala não está produzida, ou seja, não tem nem o horário nem o bairro para podermos sair. Ele vai telefonar então para São Paulo (o telefone está na pauta). Já estamos no anexo, e antes de telefonar, Casé olha e limpa o e-mail para João Borges Bougê (da coluna do esporte amador). Enquanto telefona, Casé olha o Correio. Comenta: “Que pautas lenhadas essas duas hoje, viu!” Ele não gostou. Além do Correio, Casé olha o site do Estadão. O celular do assessor da pauta do seminário de Farmácia está na caixa. “Vamos passar lá depois que formos ao São João do Ala”.

Enquanto estamos saindo do prédio para pegar o carro, Casé vai reclamando das pautas. “Tudo bobó. Não é todo dia que a gente faz uma coisa importante”. Passamos na cantina.

Estamos indo para Santa Mônica (Casé conseguiu falar com o assessor do evento do ALA pelo celular para saber em que bairro o São João iria acontecer). Quero saber quantos motoristas o Correio tem. Josué, um dos motoristas, diz que são 14. Casé continua reclamando sobre a pauta, de bom humor, é claro. Diz ao motorista: “É uma pauta assim que vai mudar o mundo.” São 14h33.

Chegando em Santa Mônica, o São João do Ala já rolava solto. Casé quis saber da assessoria do evento quais eram os bairros que seriam visitados (confirmar), a programação e a proposta do evento. Ficamos olhando a festinha e ele diz que conversou com três moradores. Perguntei quantas linhas era a matéria e ele disse que eram umas 30 linhas, no máximo, porque não tinha muita coisa para falar.

Depois, fomos ao Centro de Saúde perto do Iguatemi, mas o seminário de Farmácia estava acontecendo no Centro de Convenções (descobrimos quando vimos um cartaz, porque ninguém no centro sabia de seminário nenhum). Casé ficou chateado. Segundo ele, ele tinha perguntado a Liana onde seria e ela tinha respondido que era para ir primeiro ao Centro de Saúde.

Confusão à parte, fomos para o Centro de Convenções. Quando chegamos, achamos o coordenador do seminário e, feitas as apresentações, ficamos esperando ele dá uma entrevista para a Rádio Metrópole. Casé reclama que a pauta falta informações e não diz o que ele deve fazer. Enquanto esperamos o coordenador, Casé lê um material dado por ele e elabora algumas perguntas. Nessa hora, Casé me diz que vai se atrasar para a aula do curso de Economia, que faz na Ufba. A aula é às 18 horas. “O pior de tudo é que não me deram direcionamento específico para esta pauta.”

Casé fez a entrevista com o coordenador, procurando saber basicamente sobre o que estava se discutindo no seminário e as outras perguntas vieram a partir do que o coordenador falava. Casé anotou pouco. Quando chegamos à Redação, comentei isso e ele diz que a maioria das coisas que ouviu ele já sabia.

Estávamos no elevador, descendo para ir embora, e eu comentei que seria difícil escrever aquela matéria, com tão pouco rumo. Casé disse: “Que nada. Essa matéria vai ser mais geral que a outra de São João.”

No carro, Casé falou de novo sobre as pautas fracas e começou a lembrar, junto com o motorista, de um dia de chuva em que saíram para o bairro de Fazenda Coutos. Para Casé, uma pauta com muito mais emoção. (Ele não usou esta expressão, mas falava todo animado, como se estivesse gostado e preferisse essa pauta às de hoje, por exemplo.) Casé comentou também que é normal, se estiver chovendo, aparecer outra pauta para cumprir além das pautas do dia. “Quando a gente pensa que vai embora, aparece outra pauta.”

Chegamos na redação às 17 horas e Casé levou até às 18h para escrever 34 linhas da matéria do São João (no anexo). Deixou o lead por último. Quando estava terminando, o editor desceu para falar que estava precisando de uma matéria de saúde para fechar uma página, que ele fizesse logo a outra. Tudo num clima de descontração.

4)Daniel Freitas – Correio da Bahia (18 de junho de 2003, quarta-feira)

Neste dia, eu tinha marcado com a repórter Renata Carvalho, com a ajuda de Marcos Casé. Assim que saltei do ônibus, me encontrei com Daniel Freitas, cujo dia de trabalho eu também precisava acompanhar. Fui com ele até o jornal. Ele bateu o ponto às 8h13. Disse que aquele não era o melhor dia para eu acompanhá-lo, porque ele estava fazendo teste na auto-escola e nos dias 16, 17 e 18 de junho tinha pedido a chefe de reportagem, Malu, para pegar pautas mais fáceis de fazer, mais leves, que não precisassem de apuração na rua. Só que Renata estava atrasada (só foi chegar às 9 horas) e durante este tempo pude conferir todos os passos de Daniel. Resultado: o dia ia ser mesmo com ele. O dia foi bastante chuvoso.

Com a chefe de reportagem, Malu, Daniel pegou duas pautas: uma sobre a programação da Arquidiocese de Salvador para o feriado de Corpus Christi ( no dia seguinte) e a outra sobre a inauguração de novidades (sinalização em inglês e português) do Memorial das Baianas. As duas seriam feitas por telefone. Antes de pegar as pautas, Daniel dá uma olhada no jornal do dia anterior e vê suas duas matérias. Uma ele não entendeu porque não saiu na parte de Saúde e a outra ele não gostou da diagramação da página (arrumação do texto com os dois anúncios). Depois que ele pegou o jornal de novo foi que ele viu que tinham cortado a sua matéria. O texto ficou com umas dez linhas a menos e ele achou muito, ficou chateado.

Com as pautas na mão, Daniel senta no computador e checa o correio interno, onde os repórteres e demais jornalistas trocam idéias. No dia anterior, Amélia (repórter) questionou os critérios de assinatura de uma matéria no jornal. Daniel me explicou que ela recebeu uma pauta que não tinha gostado, fez a matéria, mas não queria que ela saísse assinada. Uma das chefes de reportagem explicou que a matéria sempre saía assinada quando o editor não fazia grandes alterações no texto. Quando era preciso arrumar muita coisa, o texto ficava sem assinatura. Daniel foi me contando que um dia recebeu uma pauta da Editoria de Polícia que ele fez, mas pediu que não assinassem. A matéria saiu sem assinatura. Enquanto ia lendo as mensagens sobre a “polêmica”, Daniel ia escrevendo uma para discordar da explicação da chefe de reportagem. Segundo ele, aquilo não acontecia na prática. “Existem textos que não são mudados e mesmo assim saem sem assinatura.” Só que Daniel desistiu de enviar a mensagem para rede. “Não vou ficar alimentando essa polêmica, que já passou. Amélia fez uma pergunta e obteve a sua resposta.”

Encerrada esta parte, Daniel lê as pautas para se inteirar dos assuntos. Depois, pega em sua pasta os telefones de Padre Manoel e da jornalista, ambos da Arquidiocese. Ele me diz que as matérias estão fáceis de fazer, pois tem contatos das fontes para as duas matérias. Essa foi a hora que Renata chegou.

Daniel me explica que vai tentar pegar a programação do feriado católico com o padre e algumas declarações dele, que ficarão entre aspas. Como não achou o padre na Arquidiocese, Daniel liga para o celular dele. Antes, Malu chega para pedir a Daniel que procure saber também sobre a abertura do ano jubilar. Daniel conversa com o padre Manoel pelo celular. Além das informações (programação e dados sobre o feriado de Corpus Christi), o padre dá também os nomes e telefones de outras pessoas com quem Daniel podia falar. A única informação que o padre não deu foi sobre o horário da missa na Basílica do Bonfim, mas Daniel foi perguntar a Malu que deu a informação. “Pronto. Uma pauta está apurada”, disse Daniel. Ele me explica que quando ele enche mais de quatro páginas do bloco – como foi o caso - é porque a matéria dá 40 linhas, o que é suficiente. Agora, ele vai apurar a outra. Ele me diz: “Não é todo dia que a gente tem matéria fácil assim não. Foi porque eu pedi, para depois não me enrolar e atrasar o meu teste na auto-escola.”

O telefone do memorial das baianas está ocupado e Daniel aproveitou para ver como estava o tempo. Segundo ele, tempo chuvoso só traz pepino para Redação. Daniel foi ver outro telefone da associação, porque aquele continuava ocupado. “Foi fácil falar com o padre porque ele só anda com o celular ligado.” Como o telefone do memorial ainda estava ocupado e Daniel não achou outro número, ele ligou para o celular da presidente da associação. A conversa com Clarissa, que estava doente e em casa e não ia participar da inauguração, rendeu apenas meia página de bloco. Daniel, então, tentou lembrar da data que fez uma matéria sobre o memorial para pegar mais informações para a matéria de hoje (preço dos badulaques vendidos no memorial). Ele achou a matéria: “Será um dado a mais para suprir a carência de informações que não foram conseguidas com a presidente da ABA.” Depois que Daniel falou com Clarissa, disse que só faltava falar com o antropólogo sugerido pelo release da ABA (fax) para fechar a matéria do memorial. Para a matéria da igreja, Daniel não tinha nenhum material, só a fala do padre.

Daniel conseguiu o telefone do antropólogo com Clarissa, mas ele não estava naquele telefone e não tinha celular. O telefone do memorial continuava ocupado. Daniel queria ver se achava o antropólogo lá. O repórter decidiu escrever a matéria da igreja, mas antes leu o material da ABA para ver o que iria aproveitar. E comentou: “Tem release que só tem letra, mas não se tira nada.” Daniel quer pegar no release quais são as novidades do memorial. “De vez em quando a gente se depara com essas coisas: telefone que não atende ou que só dá ocupado. Isso complica. Enquanto isso (tentando falar com o memorial – antropólogo), eu vou fazendo a outra matéria.”

Daniel vai falando que começar uma matéria é sempre difícil. “A gente fica na dúvida sobre com que informação devemos abrir o texto.” Ele se lembrou que durante a conversa com o padre ele esqueceu de perguntar sobre a festa e a tradição do Corpus Christi (o que é, essas coisas). Foi o padre que falou. “Ás vezes, a fonte alerta a gente para coisas que devemos perguntar.” Outra coisa que Daniel falou foi sobre os advérbios de tempo. Num jornal diário, os repórteres precisam estar atentos a isso, se falam de alguma coisa que aconteceu hoje, então é ontem; se é alguma coisa que vai acontecer amanhã, então é hoje. “É preciso estar atento a isso”, diz Daniel. Ele também conta que tem o hábito de ir riscando as anotações que já usou no texto. “Para não dar confusão.” Daniel vai lendo as anotações e escrevendo as matérias. O telefone do memorial continua ocupado. A gente acha que deve estar quebrado.

10h45. Daniel liga de novo para o Memorial e o telefone continua ocupado. “Vou escrever a matéria com o que eu tenho mesmo. Não tem jeito.” Daniel termina a matéria sobre o Corpus Christi (47 linhas) e diz que esta foi fácil de fazer, pois conseguiu matar tudo com um telefonema. Agora ele relê o que escreveu. Daniel vai ligar para o memorial. Ocupado de novo. Daniel está fazendo a matéria com o que tem, sem o depoimento do antropólogo. Depois de terminada (42 linhas), Daniel disse “Até que rendeu. Pensei que não fosse render nada.” Lembrando que ele usou informações de outra matéria que ele fez com o memorial.

5)Patrick Brock – Correio da Bahia (20 de junho de 2003, sexta-feira, véspera do final de semana de São João. Segunda não haveria expediente no jornal).

Patrick começa o dia lendo o jornal. “Dou uma carimbada.” O caderno que ele trabalha – o Folha da Bahia – sai todo dia. Isabela é a editora e têm os subeditores. No jornal de sexta, saiu uma matéria de Patrick (opinião sobre o filme “Por um fio”) e ele está com duas pautas para fazer: sobre a revista do Hulk e sobre um livro que conta a história de Santos Dumont. Patrick tem que entrevistar o autor do livro, que não é baiano, e ver com ele se dá para ele passar contatos de parentes de Santos Dumont. Patrick lê a sua matéria no jornal de sexta. Ele está no Correio há quase 15 dias. Ele me avisou que hoje o trabalho é light (“sexta, sabe como é”). Patrick, nessa hora, deu uma sumida. Ele me disse que foi tomar café e depois saiu de novo para fumar. Quando voltou, foi conversar com um dos subeditores, Edson. Parece que está sugerindo uma pauta e eu ouvi Edson dizer que achava que o Folha já tinha dado algo sobre o que ele sugeriu, e na capa. Quando perguntei, ele disse que foi sugerir pautas. Uma delas era sobre uma escritora dos Estados Unidos que “vendeu horrores” sobre a história de quando ela foi estuprada. Edson pediu que ele visse. Patrick foi logo ver na Internet informações sobre isso: o livro e a escritora. Antes disso, quando ele me falou das pautas que tinha que fazer, disse que a do Hulk talvez nem fizesse: “já fiz um monte de matérias sobre quadrinhos que nunca foram publicadas.”

Mas, Patrick começou a pesquisar na Internet sobre o filme Hulk. Patrick vê na Internet que a estréia do filme é na quinta, 26 de junho. Aí ele disse: “Melhor fazer essa matéria hoje.” Ele abre o arquivo de texto, onde colocou informações sobre Hulk que já tinha pesquisado antes na Internet e onde tinha começado o texto. Depois, dá uma olhada nos outros textos que já tinha feito sobre quadrinhos. Começou a escrever. Fez três ou quatro frases e apagou, depois recomeçou. Sandro, um outro subeditor, perguntou a Patrick como era o nome do pai da série de desenhos “Os Simpsons”. Patrick disse o nome e ainda falou que tinha feito uma matéria sobre isso, daquelas que não foram publicadas. Ana perguntou quando a matéria sairia. Sandro e Patrick deram a data de 5 de julho, quando o desenho recomeçaria a passar na Rede Globo.

Patrick ainda está procurando informações de Hulk na Internet (em sites em inglês também). Continua pesquisando na Internet e agora escreve. Patrick sugere um título e um subtítulo e sempre relê o texto do começo, às vezes, em voz alta. Pergunto sobre o número de linhas e Patrick responde: “Geralmente, o número de linhas é dado pelo editor ao entregar a pauta ao repórter.”

Patrick terminou de escrever e disse que eu poderia ler se quisesse. Acho que agora ele foi ao banheiro. Depois que voltou, Patrick conversou com Edson sobre o filme de Hulk (repercussão na imprensa e dos críticos). Patrick confirma as más críticas que viu no The New York Times e no Washington Post, que usou na matéria que escreveu. Quando senta novamente, Patrick relê o texto e faz algumas alterações. Agora entra no site do Washington Post para ver o que falam sobre o filme. “Usar as críticas de outros jornais pode, contanto que se dê o crédito”, explica ele. O repórter acrescenta a crítica do Post, corrige uma frase e relê o texto. A matéria do Hulk é para 27 de junho. Patrick imprimiu o texto e está lendo de novo no papel. (Quando eu acompanhei a repórter Jane Fernandes, olhei Patrick e ele estava lendo um texto no papel).

Patrick pegou o livro de Santos Dumont, uma caneta e foi telefonar (perto do banheiro que disse ser mais tranqüilo). Ligou para a assessora da editora no celular, que deu o contato do autor do livro: dois números de telefone e o e-mail. Depois de conversar com a assessora, que deu o número da casa do autor, Patrick disse que precisará ler o livro para depois poder conversar com o autor. O livro e o release foram enviados pela assessora da editora.

Voltamos para a cadeira que Patrick estava. Ele pesquisa na Internet o livro “Santos Dumont”. Abriu o livro e viu que Santos Dumont está aniversariando hoje, 20 de junho, e estaria completando 130 anos. Patrick ficou todo animado e achava que a matéria tinha que sair logo para pegar o gancho. Virou para mim e disse: “Vamos ligar para o autor?”

O autor atendeu. Patrick quis marcar um horário na quarta, 25, de manhã, inclusive, explicando ao autor que queria ler o livro primeiro antes de entrevistá-lo. (Ele disse ao autor que leria o livro neste fim de semana para fazer perguntas mais direcionadas.) Além de marcar, Patrick pediu ao autor um contato de um herdeiro do aviador: um sobrinho-bisneto em São Paulo e uma sobrinha-neta no Rio de Janeiro.

Na verdade, o aniversário de Santos Dumont é no dia 20 de julho. “Dá para fazer uma super matéria”, disse Patrick. A página na Internet sobre Santos Dumont abriu. Patrick está salvando as informações da pesquisa numa pasta – copiando os endereços eletrônicos. Nessa hora, peguei os telefones de Fernanda Carvalho, outra repórter que eu precisava acompanhar. Patrick está dando uma lidinha no livro. Parou. Vai almoçar. Dá mais uma pesquisada na Internet, lê um pouco o livro e diz que depois de almoçar vai embora. Ele me diz que no livro já viu coisas legais para colocar na matéria, como uma entrevista de Santos Dumont ao jornal Le Figaro, que o descrevia. Saí às 11h48.

6)Fernanda Carvalho – Correio da Bahia (27 de junho de 2003, sexta-feira)

Fernanda tinha marcado comigo às 9 horas (seu horário de trabalho). Chegou às 9h22. Ela me conta que faz hidroginástica de manhã cedo. Vamos para o fórum Ruy Barbosa, mas Fernanda me explica que não tem nada marcado. Ela está fazendo uma matéria especial para o Correio Repórter sobre casamentos. No fórum, ela quer entrevistar um juiz, os noivos e ver como acontecem os casamentos (a cerimônia presidida pelo juiz).

Saímos com outra repórter, Adriana Jacob, que também estava fazendo uma matéria para o Repórter sobre o bairro do Bomfim. Íamos deixar Adriana primeiro e depois seguiríamos para o fórum. No caminho, Fernanda conta que já morou no Bomfim durante muito tempo e dá sugestões de enfoque e fontes para a matéria de Adriana, que começa a anotar. Depois, Fernanda começa: “Estou fazendo uma matéria sobre casamentos. Estou adorando!”, disse ela, que narra alguns fatos curiosos que achou sobre o tema. Adriana pergunta se é capa. Fernanda responde que sim. O receio de Fernanda é que ela tem e ainda vai achar muitas informações, “tem muita coisa para se falar”, e aí está confusa sobre quais aspectos abordar, o que enfocar direito. A repórter conta ainda que já está certo para ir na Arquidiocese na terça e na quinta para ela ver documentos antigos sobre o tema. Ela já conversou com alguns historiadores também. Fernanda recebeu a pauta no dia 16 de junho, “mas não foram 15 dias de trabalho até aqui por causa do feriado de São João. Estou preocupada com isso. Não foram 15 dias de trabalho.”

A conversa tomou um rumo mais pessoal quando Fernanda começa a contar sobre sua saída da TV Aratu, onde trabalhava à tarde. “Estava muito puxado. Lá eu exercia a função de pauteiro, que é muito ingrata”, e Adriana concorda: “Tudo é culpa do pauteiro. Se a matéria sai boa, os elogios vão para o repórter. Se a matéria sai ruim, a culpa é do pauteiro”, disse ela. Fernanda fala ainda que não se arrependeu de ter saído da TV Aratu, onde já era contratada, apesar de ganhar mais. Aí Adriana quis saber por que ela optou pelo Correio. “Porque prefiro o trabalho de repórter, mas adorava fazer pautas também, mas tive que escolher um.” Fernanda tem 25 anos, é casada e está esperando o primeiro filho, um menino. Está no quarto mês de gravidez.

“Pois, é, Adriana. Se você souber de algum casamento interessante, você me fala. Estou adorando este trabalho.” Quando estávamos perto de chegar à Fundação Clemente Mariano, no Comércio, para onde ia Adriana, eu perguntei como era o esquema de trabalho quando se fazia reportagem para o Repórter. Elas me disseram que o repórter fica trabalhando de segunda a sexta para a matéria especial do caderno. Nas escala de sábado ou domingo, é que se voltava a fazer matérias para o Aqui Salvador. Fernanda aproveitou para comentar que gosta muito de trabalhar no sábado, mas detesta trabalhar no domingo. “Quando sei que vou trabalhar domingo, chego ficar triste.” Fernanda perguntou a Adriana sobre o trabalho dela numa rádio, à tarde. Adriana disse que o serviço é mais light, mais burocrático, que ela só reclama do horário, que é fixo. “No Correio, a gente tem mais flexibilidade de horários.” Adriana costuma sair da rádio às 19 horas.

Elas combinam os horários para o motorista vir buscar Adriana e comentam também sobre a possível reunião que terá com os repórteres que estão trabalhando no Correio Repórter. Saindo do Comércio, foi que eu perguntei a Fernanda de quantos meses de gravidez ela estava. E fiquei surpresa quando ela me disse que já sabe que é menino desde o terceiro mês de gravidez. Chegando ao fórum, Fernanda disse: “Tomara que eu encontre muitos casamentos acontecendo aqui.” São 10 horas.

Fernanda foi a um cartório e conversou com uma suboficial, que disse que ela precisava conversar com uma juíza da vara de família. Deu o nome. Informou também que os casamentos são realizados de terça a sexta-feira, às 8h30. Antes, tínhamos passado no salão de casamentos e já estava vazio.

Fernanda vai me explicando que o repórter tem que estar sempre alerta para não desperdiçar as informações que for encontrando, como no caso da suboficial que não era a fonte certa, mas indicou uma fonte e passou algumas informações importantes. “É muito gostoso ser repórter, porque a cada matéria você sente que aprendeu alguma coisa. Um dia você faz uma matéria de cunho político, ou econômico e depois uma de cunho social e vai aprendendo.” Subimos o elevador para procurar a juíza indicada pela sub-oficial.

A juíza estava em uma audiência. Disse que a pessoa mais indicada para falar seria o corregedor, mas Fernanda insistiu que queria também conversar com ela depois da audiência. Ficamos esperando. Fernanda anota que vai precisar voltar ao fórum na semana que vem para ver os casamentos. “Só que mais cedo.” Quando entramos novamente, Fernanda marcou com a juíza na sexta, 4 de julho, às 10 horas. A juíza ainda indicou quem seria a juíza de plantão naquela semana para coordenar os casamentos. Saindo para ir atrás dessa segunda juíza, perguntei se 4 de julho não estava muito longe e Fernanda me respondeu que não, porque já tinha entrevistas marcadas na segunda, na terça e na quinta, ou seja, estaria adiantando outras partes. Quando chegar na Redação, Fernanda disse que iria ligar para uma fonte no cartório para saber dela todos os detalhes “para chegar com mais conteúdo nas entrevistas com a juíza e com o corregedor.” Fomos ao outro cartório. Uma mulher nos recebeu e disse que a juíza estava em audiência. Estamos esperando. Fernanda me explica que fez o teste para o Correio e já entrou contratada em novembro de 2002. Na TV, ela era estagiária e depois foi contratada.

Antes disso ela quis comentar, espontaneamente, sobre a relação repórter – fonte. Que o repórter tem que conquistar a fonte. Ela conta que ouve muito as pessoas dizerem que não gostam de conversar com jornalistas. “Digo uma coisa e vocês escrevem outra.” Fernanda me diz que quando é assim ela tenta convencer a fonte de que ela não vai fazer isso. Ela ainda me diz que nunca recebeu reclamação de fonte sobre alguma matéria sua. Fernanda admite que a situação é delicada, pois, às vezes, a fonte está contando coisas pessoais, por isso, a relação de confiança. São 11 horas. Como a audiência da juíza está demorando muito, a gente segue para o Cartório de São Pedro, onde Fernanda diz que tem uma oficial que adora falar com a imprensa. Ela descobriu isso quando ligou para o cartório no dia anterior para saber com quem falar sobre o assunto de casamento. A matéria deve sair no final de julho. A oficial contou algumas coisas interessantes e deu informações sobre os procedimentos para se casar no cartório.

Vamos para a 6ª vara para falar com a segunda juíza. Fernanda vai tentar marcar com ela. A porta está fechada. Fernanda bate e entramos para perguntar como estava o andamento da audiência. A mulher continua dizendo que está de vento em popa. “Não dá mais para esperar. Vou pegar o telefone para marcar depois”. A mulher interrompeu a audiência para falar com a juíza, que pediu que esperasse um pouco. Enquanto isso, pergunto sobre quantas laudas deve ter a matéria de capa para o Repórter. Fernanda me explica que são 30 laudas: cinco matérias, sendo que uma é a abertura, com cinco, seis laudas cada uma. “Eu costumo utilizar todo o meu espaço.” Fernanda comenta também que achou a vinda no fórum hoje muito produtiva. Fernanda entrou para falar com a juíza. Está marcando para a semana que vem, sexta, 4 de julho. Fernanda antes tem que mandar um e-mail com as perguntas. Quando saímos, Fernanda me contou que uma promotora que estava na sala com a juíza é casada com o corregedor, com quem ela precisa falar. “Ela me deu o celular dele.”

12h12: saímos. Não vamos mais passar numa biblioteca no Garcia, onde um dos historiadores já entrevistados indicou um livro que Fernanda pudesse ler sobre o assunto. “Está em cima da hora para pegar Adriana – 12h30.” Antes, iríamos passar na Feira de São Joaquim, porque Fernanda estava com desejo de comer fato no feijão. Fernanda comenta que tem uma entrevista na segunda-feira no Garcia e aí ela aproveita para pegar o livro. Descemos no Correio e Fernanda só entrou para bater o ponto. Tinha que pegar a mãe no Iguatemi. Era quase uma hora da tarde.

7)Érico Monte, Correio da Bahia (29 de junho de 2003, domingo)

Érico chegou às 9h20. Disse que esperou a chuva passar um pouco para sair de casa. Renata Carvalho, repórter que está há cerca de dois anos no jornal, está substituindo a chefe de reportagem, Malu, até o dia 4 de julho. Subindo as escadas, Érico diz: “Não tem coisa pior do que vir para cá em dia de domingo”, mas falou isso tranqüilo, sem raiva, mais brincando, eu acho. Quando chegou lá em cima, Érico leu a parte de Esporte do dia e me disse que vamos cobrir um evento promovido pelo Rexona no Parque da Cidade, para onde foi enviada outra repórter para cobrir Cidade. Érico olha o A Tarde também.

Temos outro evento para ir: uma competição de espadas. O medo de Renata são as oficinas no Parque da Cidade se intensificarem só à tarde. Ela diz que a repórter de Cidade só está escalada para trabalhar de manhã. Érico comenta com o fotógrafo João Alvarez, que ia com a gente, que se não tivesse legal no Parque da Cidade, ia ver o outro evento e depois voltaria e faria a matéria com Ana Moser. São 9h40 - a Redação está quase vazia: o editor de moda, outro jornalista, acho que do Folha, Érico, Renata, o fotógrafo, eu e mais quatro homens fazendo o conserto de uma televisão.

Fui na cantina e todo mundo está reclamando de trabalhar domingo: do cantineiro ao editor de moda, passando por Érico, que tornou a falar. Ele reclama do evento no parque, que está sem horário. Já subindo para a Redação: “Você vai ver. A gente vai chegar lá e não vai ter ninguém.” Antes, na Redação, Renata conta que o assessor do evento esteve no Correio e disse que o evento ia ser o dia todo. Ana Moser ia estar lá o dia todo. Todo mundo discordou: “Como é que um evento com gente famosa não tem horário?”

Saímos da Redação às 10h05 e fomos para a Asbac, cobrir a competição de espadas (marcada para começar às 9 horas e terminar às 13 horas), e depois seguiríamos para o Parque.

Quando chegamos à Asbac, João pergunta se é para tirar fotos gerais, da competição, ou se iam publicar foto do campeão. Érico diz que é para tirar fotos gerais. Estamos assistindo à apresentação de espadas. O professor que tinha conversado com Érico por telefone fez a gente entrar e sentar. Depois ele apresenta a gente para o mestre. Érico o entrevista. Depois, Érico conversa com um aluno de Salvador, que foi indicado pelo professor, e depois com o próprio professor. Rapidinho, em pé mesmo. Só a entrevista com o mestre é que Érico sentou e demorou mais. Fomos embora às 12 horas.

No Parque, achamos logo Ana Moser e Érico começou a conversar com ela, querendo saber sobre o projeto desenvolvido em São Paulo e o que ela estava fazendo em Salvador. Quando terminou, Érico comentou: “Pensei que fosse ter mais coisa aqui, mas é só uma demonstração. É só com ela mesmo que eu tenho que conversar.” Esperamos João fotografar o evento no geral (ele já tinha tirado fotos de Ana Moser enquanto estávamos perto dela) e fomos embora. Chegamos no Correio às 12h45. Fomos para o anexo. Érico ia bater as duas matérias antes de ir embora. Era o tempo de o editor de Esportes chegar. Perguntei sobre o número de linhas e Érico me disse que costumava ser umas 40 linhas. A matéria com Ana Moser seria umas 30 linhas e um Box, com umas 20 linhas. Érico me disse que nessa matéria teria que enrolar um pouco, pois tinha pouca informação: “Ficar falando sobre o projeto desenvolvido em São Paulo não tem o menor interesse para a gente aqui na Bahia.” No Box, eu falo sobre ela. Já na matéria de espada, Érico disse que tinha informação suficiente. Teria que explicar o que é a competição de espada, porque “a maioria das pessoas nem conhece.” Érico começou a escrever.

8)Jane Fernandes (Correio da Bahia), 30 de junho de 2003, segunda-feira.

No dia em que acompanhei Jane, ela tinha um mês no jornal fazendo matérias para o caderno Aqui Salvador. Nesse dia, porém, ela estava com quatro sugestões de pauta para escolher uma e fazer a sua primeira reportagem de capa para o caderno Correio Repórter. Jane iria se reunir com a editora do caderno, Linda Bezerra, às 9h15.

A primeira coisa que Jane faz é ler o jornal do dia. Não havia matéria sua porque ela não tinha trabalhado no final de semana. Sobre o Correio Repórter, Jane me contou logo ao chegar (subindo as escadas para a Redação) que a editora do Repórter disse que estar apaixonada pelo tema é condição sine qua non para trabalhar para o caderno. “É preciso gostar muito, estar envolvido.” Jane lê a Tribuna da Bahia também, enquanto espera Linda chegar para definirem a pauta. As sugestões foram as seguintes (Jane me conta sentada ao computador): uma reportagem sobre o café, outra sobre os normalistas, uma sobre Amélia Rodrigues e uma última sobre a lepra. Jane aproveitou o final de semana para buscar informações sobre os temas e aí foi me explicando um a um. Sobre normalistas não queria falar; sobre Amélia Rodrigues tinha achado poucas informações na pesquisa que fez e sobre a lepra também não se interessou. Escolheu, então, falar sobre o café e iria discutir a sugestão com Linda. Depois disso, Jane pegou o jornal de sábado para dar uma olhada.

Ainda esperando Linda, Jane resolve digitar algumas pautas. “Estou para fazer isso há um tempo”, disse ela. Na pasta Editor, tem um arquivo Pautas Aqui Salvador, onde os repórteres sugerem pautas que são analisadas pela produtora Patrícia Borba. Jane abre este arquivo e digita duas pautas. Ainda faltam duas para digitar. Linda já chegou. Para uma dessas pautas que falta digitar, Jane foi primeiro fazer uma busca no arquivo de matérias do site do Correio para procurar se já tinha saído alguma coisa sobre o assunto, mas não achou. É sobre as mudanças na telefonia celular na hora de fazer interurbano. São 9h30.

Reunião com Linda: “E aí, se decidiu por algum tema?”, perguntou a editora. Jane responde: “Café.” Linda gostou e começou a procurar informações sobre o tema e vai explicar a Jane o que é uma reportagem de capa. “O tema tem que ter fôlego, de cunho histórico e ligação com a Bahia”, diz Linda. A reportagem de capa é subdividida em cinco subtemas e deve ter, no máximo. É uma abertura, de três ou quatro laudas, e mais quatro matérias, de quatro a cinco laudas. Linda vai explicando que a abertura da reportagem deve conter a explanação do tema para fisgar o leitor. O lead no Repórter não precisa ser objetivo. “Deve ser um lead forte, com mais liberdade”, diz a editora. Linda mostra a Jane a abertura de uma reportagem sobre o barroco na Bahia, já publicada. É preciso ainda ouvir pessoas, pesquisar através da Internet, faculdades e estudiosos sobre o tema, ler livros e teses. “Não dou menos do que 30 dias para fazer essa reportagem”, explica Linda. Além disso, o texto deve conter uma linguagem leve, poética, informativa e analítica. Para isso, o repórter tem tempo para fazê-la. São 20 a 22 dias dedicados somente à pesquisa. “No texto, dê vazão as sentidos”, pede a editora.

Com dez dias, Linda pediu que Jane subdividisse o tema. A editora ainda lista uma série de aspectos que podem ser tratados sobre o café e indica algumas fontes. Jane provavelmente terá que viajar. Pronto. Reunião encerrada às 10h30. Agora, Jane não precisa se preocupar com seminários, encontros, inaugurações, e matérias do dia-a-dia, porque ela foi escalada para fazer uma reportagem de capa para o Repórter. Isso significa não mais Aqui Salvador por 30 dias. Ela diz: “Hoje, é um dia atípico em minha rotina.” Fomos ao banco, dentro do Correio mesmo. Depois, Jane quis pesquisar na Internet e aí começou o problema. Jane ainda não possui uma senha para acessar a rede e não consegue iniciar a sua pesquisa. São 11h30 e ela nada de entrar na Internet. “A manhã vai passar e eu só vou ter conversado com Linda. Tudo que fiz sobre café hoje foi tomar um cafezinho”, brincou a repórter. Mas às 12 horas, ela conseguiu um computador para poder acessar a rede sem a senha. São 12 horas. Ela vai almoçar e ficar pesquisando até às 13 horas, quando dá a hora de ir para a assessoria onde trabalha também.

9)Renata Matos (Correio da Bahia), 7 de julho de 2003, segunda-feira.

Uma das primeiras coisas que Renata fez ao chegar na redação foi olhar o jornal. Depois, ela se dirigiu à chefia de reportagem e pegou as suas duas pautas do dia. Renata disse que prefere apurar e escrever as matérias no anexo e, por isso, passamos a manhã inteira lá. Ela começou o trabalho tentando apurar uma matéria, telefonando para o Ipac. Era sobre uma fábrica que desabou. A repórter comenta que esqueceu de entregar duas pautas a Malu, a chefe de reportagem do Correio pela manhã.

Como Renata não conseguiu falar com o assessor do Ipac (o celular estava desligado e ele não tinha chegado na assessoria ainda), Renata ligou para o presidente do programa Odara, assunto da segunda matéria do dia. O programa estava abrindo inscrições neste dia para cursos profissionalizantes e vai entregar também certificados para jovens que concluíram os cursos anteriores. Renata falou pelo telefone com o presidente da entidade sobre a trajetória da instituição, os recursos, as crises financeiras, quantos jovens o programa já capacitou e sobre quais são os cursos. A repórter falou ainda, na mesma ligação, com uma jovem de 20 anos que vai receber o certificado.

“Uma já foi”, disse Renata, quando terminou de apurar a matéria do programa Odara. Então, ela tenta de novo o Ipac. Não conseguiu e reclama: “Órgão público é um mangue. O assessor pode até se atrasar, mas pelo menos deveria deixar o celular ligado.” Depois disso, ela acessa o site do Correio para pesquisar a matéria do desabamento da fábrica têxtil em Plataforma, que saiu no Correio no sábado. A pauta que ela recebeu é para fazer uma relação de outros imóveis em Salvador que estão em situação parecida. Será uma suíte da matéria de sábado. Renata tenta de novo o assessor do Ipac. “Se eu não conseguir falar com esse assessor, eu digito a outra matéria”, disse ela.

Depois de umas quatro tentativas, desde o início da manhã, Renata conseguiu falar com o assessor, que disse que estava chegando ao Ipac. Enquanto esperava, Renata começou a digitar a outra matéria e teve que ligar para o presidente do Odara outra vez para saber até quando iriam as inscrições e quando começariam as aulas. Quando o assessor do Ipac ligou, Renata estava atendendo a uma ligação no celular, mas ligou de volta assim que terminou no celular. Renata explicou o que queria e o assessor do Ipac indicou uma pessoa para falar sobre o assunto. Essa pessoa disse que, sobre isso, só quem poderia falar era a diretora geral do Ipac, que, felizmente, estava lá.

Enquanto conversava com a diretora, Renata tentava conseguir dela alguns exemplos de prédios tombados e que estavam em situação parecida com a da fábrica têxtil que acabou desabando. A repórter insistiu até que conseguiu saber de um. “Eu juro que não foi a senhora que me contou”, disse ela à diretora do Ipac. Eram 10h44 quando Renata terminou de falar com a diretora do Ipac, que na verdade, não indicou nenhum prédio específico, mas falou de áreas onde existiam prédios tombados em péssimo estado de conservação. Como já tinha informações para fechar a matéria do desabamento, Renata e Malu, a chefe de reportagem, decidiram que não seria preciso sair para apurar mais coisa. A repórter tinha, então, que fazer uma matéria para sair no jornal do dia seguinte e outra pessoa faria a suíte desta matéria para o jornal do outro dia.

Renata teve que ligar de novo para o presidente do Odara para saber sobre os pré-requisitos para efetuar a inscrição nos cursos profissionalizantes. Ainda para a matéria do desabamento da fábrica, Renata quis falar com um dos proprietários do imóvel. Conseguiu o contato de um senhor pelo site da Telemar, mas não conseguiu encontrá-lo. Tentaria novamente antes de fechar de vez a matéria, às 12 horas.

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[1] NETO, Otávio Cruz. O trabalho de campo como descoberta e criação. IN: MINAYO, Maria Cecília de Souza (org). Pesquisa social. Teoria, método e criatividade. Petrópolis: Editora Vozes, 1994. p. 51.

[2] MOTTA, Luís Gonzaga. O sentido histórico do termo “a produção da notícia”. Brasília, 1995. IN: : PEREIRA JR., Alfredo Eurico Vizeu. Discutindo o que é notícia. Os bastidores do telejornalismo. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. p. 75.

[3] WHITE, David Manning. O gatekeeper. Uma análise de caso na seleção de notícias. IN: TRAQUINA, Nelson (org). Jornalismo: questões, teorias e estórias. Lisboa: Vega, 1993. p. 143.

[4]PEREIRA JR., Alfredo Eurico Vizeu. Discutindo o que é notícia. Os bastidores do telejornalismo. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. p. 78.

[5] TUCHMAN, Gaye. Making News. A Study in the Construction of Reality. New York: The Free Press, 1978. Prefácio.

[6] Idem, ibidem. Capítulo 1: News as frame. p. 2.

[7] WOLF, Mauro. Teorias da comunicação. Lisboa: Presença: 1994. p. 168.

[8] Idem, ibidem. p. 173.

[9] Idem, ibidem. p. 177.

[10] Idem, ibidem. p. 193.

[11] Idem, ibidem. p. 196.

[12] Idem, ibidem. p. 214.

[13] LAGE, Nilson. Ideologia e técnica da notícia. Petrópolis: Editora Vozes, 1979. p. 35 e 36.

[14] Idem, ibidem. p. 36.

[15] TRAVANCAS, Isabel Siqueira. O mundo dos jornalistas. São Paulo: Summus, 1993. p. 33.

[16] TUCHMAN, Gaye. Making News. A Study in the Construction of Reality. New York: The Free Press, 1978. p. 1.

[17] Idem, ibidem. p. 5.

[18] GENRO, Adelmo Filho. O segredo da pirâmide. Para uma teoria marxista do jornalismo. Porto Alegre: Editora Ortiz, 1989 (2ª impressão). p. 200.

[19] Idem, ibidem. p. 201.

[20] Como exemplo da articulação entre o jornalismo e a literatura, vale a pena assinalar a produção de Joel Silveira, entre outros. Ver: SILVEIRA, J., A milésima segunda noite da Avenida Paulista. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. 213 páginas.

[21] LAGE, Nilson. Ideologia e técnica da notícia. Petrópolis: Editora Vozes, 1979. p. 35.

[22] Idem, ibidem. p. 83.

[23] BARRETO, Lima. Recordações do escrivão Isaías Caminha. IN: PEREIRA JR., Alfredo Eurico Vizeu. Discutindo o que é notícia. Os bastidores do telejornalismo. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. p. 53.

[24] Este aspecto é explorado por Warren Breed, quando ele trata do controle exercido pelos proprietários dos meios de comunicação e as situações em que o jornalista pode ultrapassar a orientação editorial. Ver: BREED, Warren. Controle social na redação. Uma análise funcional. IN: TRAQUINA, Nelson (org). Jornalismo: questões, teorias e estórias. Lisboa: Vega, 1993.

[25] TRAVANCAS, Isabel Siqueira. O mundo dos jornalistas. São Paulo: Summus, 1993. p. 41.

[26] GUERRA, Josenildo Luiz. Ensaio sobre o jornalismo: um contraponto ao ceticismo em relação à tese da mediação jornalística. Universidade Federal de Sergipe. p. 3 a 6.

[27] RIBEIRO, Jorge Cláudio. Sempre alerta. Condições e contradições do trabalho jornalístico. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 158.

[28] PEREIRA JR., Alfredo Eurico Vizeu. Discutindo o que é notícia. Os bastidores do telejornalismo. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. p. 121.

[29] MEDINA, Cremilda. Profissão jornalista: responsabilidade social. Rio de Janeiro: Forense – Universitária, 1982. p. 21 e 22.

[30] GUERRA, Josenildo Luiz. Ensaio sobre o jornalismo: um contraponto ao ceticismo em relação à tese de mediação jornalística. p. 20.

[31] Idem, ibidem. p. 121

[32] RIBEIRO, Jorge Cláudio. Sempre alerta. Condições e contradições do trabalho jornalístico. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 136.

[33] FERREIRA, Giovandro Marcus. Apontamentos sobre as propriedades do campo de produção jornalístico. IN: Revista Pauta Geral, n° 4. Salvador: Calandra, 2002. p.254.

[34] Idem, ibidem. p. 17.

[35] RIBEIRO, Cláudio Jorge. Sempre Alerta. Condições e contradições do trabalho jornalístico. São Paulo: Brasiliense, 1994. Página 12.

[36] LAGE, Nilson. A ideologia e técnica da notícia. Petrópolis: Editora Vozes, 1979. p. 74

[37] RIBEIRO, Cláudio Jorge. Sempre Alerta. Condições e contradições do trabalho jornalístico. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 10.

[38] GENRO, Adelmo Filho. O segredo da pirâmide. Para uma teoria marxista do jornalismo. Porto Alegre: Edotira Ortiz, 1989 (2ª impressão). p. 186 e 187.

[39] Idem, ibidem. p. 93.

[40] Idem. p. 94.

[41] Idem, ibidem. p. 102

[42] Idem. Páginas 150 e 151

[43] Citado em Jorge Cláudio Ribeiro. p. 151.

[44] GUERRA, Josenildo Luiz. Ensaio sobre o jornalismo: um contraponto ao ceticismo em relação à tese de mediação jornalística. Universidade Federal de Sergipe. p. 17 e 18.

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