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GRUPO I - CLASSE I - Primeira Câmara

TC 019.238/2013-4

Natureza: Recurso de Reconsideração (em Tomada de Contas Especial)

Recorrente: Jorge José de Melo, Sócio-Administrador

Unidade: Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME

Sumário: RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. PROGRAMA NACIONAL DE APOIO À CULTURA. RECURSOS CAPTADOS PARA A REALIZAÇÃO DO PROJETO "ROTEIRO CULTURAL DA CACHAÇA". OMISSÃO NO DEVER DE PRESTAR CONTAS. IRREGULARIDADE DAS CONTAS. DÉBITO. MULTA. ACÓRDÃO 995/2014 - 1ª CÂMARA. CONHECIMENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE OS RECURSOS CAPTADOS E AS DESPESAS REALIZADAS. NEGADO PROVIMENTO.

RELATÓRIO

Cuidam os autos de tomada de contas especial em que se examina, nesta fase, recurso de reconsideração interposto por Jorge José de Melo, Sócio Administrador da empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda., contra o Acórdão 995/2014 - 1ª Câmara, que, no que interessa ao deslinde do processo, deliberou o seguinte:

“9.1. julgar irregulares as contas do Sr. Jorge José de Melo e da empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME, condenando-os, solidariamente, ao pagamento da quantia abaixo relacionada, com a incidência dos devidos encargos legais, calculados a partir da data correspondente até o efetivo recolhimento, na forma da legislação em vigor, nos termos dos arts. 1°, inciso I, 16, inciso III, alínea “a”, 19 e 23, inciso III, da Lei 8.443/1992:

|Valor original (R$) |Data da ocorrência |

|364.019,00 |23/12/2005 |

(...)

9.3. aplicar ao Sr. Jorge Jose de Melo e à empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME, individualmente, a pena de multa prevista no art. 57 da Lei 8.443/1992, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais); (...).”

2. Preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso, o auditor da Serur providenciou a instrução de mérito, concluindo por dar-lhe provimento parcial com redução do débito, para 104.567,68, e das multas, na devida proporcionalidade, conforme o parecer transcrito a seguir (peça 47):

“(...)

2. Trata-se, originariamente, de tomada de contas especial - TCE, instaurada pela Coordenação de Contabilidade do Ministério da Cultura - MinC, em razão da omissão no dever de prestar contas dos recursos captados pela proponente Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME, com sede em São Paulo/SP, destinados à execução do Projeto ‘Roteiro Cultural da Cachaça’, que consistia na edição de livro bilíngue sobre a cachaça e respectiva cadeia produtiva.

2.1. A empresa e seu proprietário, Sr. Jorge José de Melo, não apresentaram os elementos previstos no termo de compromisso firmado, como prestação de contas, apesar de devidamente notificados. No Tribunal, após a citação, o recorrente restringiu-se a apresentar pedido de prorrogação de prazo, contendo alegação de que o livro houvera sido escrito e publicado, sem qualquer documentação comprobatória.

2.2. Após análise dos elementos apresentados, o Tribunal, por meio do Acórdão 995/2014 – Primeira Câmara (peça 26), julgou-lhe irregulares as contas, condenou-o em débito e aplicou-lhe multa, na forma descrita na introdução acima.

2.3. Irresignado, Jorge José de Melo interpôs o presente recurso de reconsideração (peça 38) contra o referido julgado, requerendo o provimento do pedido, para reformar a deliberação guerreada.

ADMISSIBILIDADE

3. Reitera-se o exame preliminar de admissibilidade (peças 42-43), ratificado pelo Exmo. Sr. Ministro-Relator, na peça 46, que concluiu pelo conhecimento do recurso, suspendendo-se os efeitos dos subitens 9.1, 9.2, 9.3, 9.4 e 9.5 do Acórdão 995/2014 – Primeira Câmara, eis que preenchidos os requisitos processuais aplicáveis à espécie. Destaque-se que o comprovante de notificação da deliberação recorrida ao representante legal da empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME já se encontra nos autos (peça 45).

MÉRITO

4. Delimitação

4.1. Constituem objetos do recurso as seguintes questões:

a) se subsistem o débito e as irregularidades diante da entrega de exemplar do livro ‘Cachaça – cultura e prazer do Brasil’, objeto do incentivo fiscal; e de documentos comprobatórios (peça 24) – (peça 38, p. 3-7);

b) se seria possível a aplicação de multa individualizada à empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME e ao respectivo sócio administrador, ora recorrente (peça 38, p. 6);

5. Manutenção do débito diante da entrega do objeto e dos documentos comprobatórios presentes nos autos (peça 38, p. 3-7)

5.1. O recorrente defende a insubsistência do débito e da multa imputados aos responsáveis, impondo-se a exclusão ou a redução das penalidades, reformando-se integralmente o julgado recorrido, com base nos seguintes argumentos:

‘a) o objeto do projeto foi produzido. Trata-se do livro ‘Cachaça - cultura e prazer do Brasil’, Editora: Damara; Autores: Sandra Ventura e Ricardo Giraldez; Categoria: Gastronomia/Bebidas, juntado aos autos e deixado exemplar em original para apreciação;

b) já se havia esclarecido, em defesa prévia nestes autos, acerca da impossibilidade de apresentação das contas, por conta da dificuldade de encontrar pessoas com participação ativa no processo de produção do livro, razão pela qual se houvera pedido prorrogação do prazo;

c) a documentação pertinente às contas estaria com as contadoras responsáveis pelo projeto, que deveriam ser intimadas a prestar esclarecimentos, como se nota em partes do processo;

d) o Acórdão não acolheu as alegações do recorrente ou apreciou os documentos fiscais juntados aos autos, incluindo-se o exemplar do livro produzido (peça 24); logo, impõe-se a reconsideração do julgado;

e) o recorrente é titular da empresa responsável pela produção literária, mas participou da empreitada apenas para cumprimento dos trâmites legais, por conta de convite realizado por Sandra Ventura e Ricardo Giraldez, autores do livro. Por conta disso, ajuizou ação cível contra os consortes, em razão da deslealdade por eles praticada e por ter que arcar com as obrigações ora em debate;

f) não cabe culpa objetiva ao recorrente, devendo ser considerados os documentos fiscais juntados aos autos, sendo que, após a apreciação, caso haja diferença entre o valor do incentivo e os gastos efetivamente realizados, que se cobre. Obrigar às partes à devolução integral constitui punição em excesso;

g) a multa aplicada individualmente aos responsáveis é excessiva, por ter sido cumprida a obrigação e prestadas as contas, além da impossibilidade demonstrada de apresentação da documentação pertinente, em razão da ação de terceiros, que suprimiram as provas;

h) no máximo, houve atraso na prestação de contas, mas não descumprimento dessa obrigação, como fixado no acórdão, pois os documentos fiscais foram juntados e não foram apreciados por esta Corte. Logo, exige-se a exoneração ou a diminuição da multa aplicada.’

Análise

5.2. Os argumentos do recorrente estão parcialmente corretos. O livro, objeto do termo de compromisso firmado pela empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME (peça 1, p. 98), foi produzido, o que não afasta a irregularidade das contas, em razão da intempestividade, bem como a totalidade do débito, como se demonstrará abaixo.

5.3. O objeto do Projeto 057766 tinha a seguinte conformação (peça 1, p. 98):

‘O projeto tem por objetivo editar um livro bilíngue, português/inglês, sobre a cachaça e respectiva cadeia produtiva. O livro destina-se a apreciadores da bebida, interessados e estudiosos sobre o assunto e bibliotecas. Especificações técnicas: 200 páginas, com cerca de 300 fotos coloridas e texto, e será apresentado em formato coffe table book. O formato aberto será de 57 x 29 cm, e fechado de 28,5 x 29 cm, o acabamento será de capa dura com laminação fosca (frente) e verniz UV na sobrecapa. O papel será couche de 150g e 39 laminas em couche 115g.’

5.4. O orçamento, com o detalhamento das despesas a serem executadas para consecução do objetivo, com os respectivos prazos de execução, constava do projeto (peça 1, p. 10-19). A Comissão Nacional de Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura analisou detalhadamente o proposto e realizou diversos ajustes para adequá-lo aos objetivos do ente e aos valores de mercado (peça 1, p. 80-82 e 92):

‘Itens reduzidos:

Pesquisa Documental: de R$ 9.200,00 para R$ 4.600,00 [2 meses são suficientes para a tarefa]

Pesquisa Iconográfica: de R$ 4.400,00 para R$ 2.200,00 [2 meses são suficientes para a tarefa].

Coordenação Editorial Produção Editorial e Geral e Acompanhamento Gráfico de R$ 48.300,00 para R$ 34.500,00, valores acima dos preços de mercado.

Escaneamento: de R$ 21.000,00 para R$ 15.000,00, valor acima dos preços de mercado;

Fotolitos: de R$ 120.000 00 para R$ 36.000,00, valor muito acima dos preços de mercado. Produção de Texto Histórico, Produção de Textos específicos, Produção de Texto sobre os locais a serem visitados e Produção de Texto projeção: de R$ 43.500,00 para R$ 20.000,00, valores acima dos preços de mercado.

Embalagem para remessa para as bibliotecas: de R$ 15.000,00 para R$ 4.500,00, subitem corresponde a remessa da contrapartida, 10% da tiragem as bibliotecas indicadas pelo MinC: 300 x R$ 5,00 = R$ 4.500,00]; e Passagens aéreas SP/MG/SP: de R$ 5.600,00 para R$ 4.000,00, valor acima dos preços de mercado.

Passagens aéreas SP/RJ/SP: de R$ 2.976,00 para R$ 1.200,00, valor acima dos preços de mercado.

Assessoria Jurídica: de R$ 9.000,00 para R$ 8.000,00, valor acima dos preços de mercado. Contador: de R$ 9.000,00 para R$ 3.600,00, 6 meses a R$ 600,00 por mês.

Material de Consumo: de R$ 2.400,00 para R$ 1.200,00, [6 meses a R$ 200,00 por mês] e redução dos Correios: de R$ 1.500,00 para R$ 600,00 [6 meses a R$ 100,00 por mês].

Auxiliar Administrativo: R$ 16.800,00, não se justifica para o projeto.

Autenticações e Motoboy: R$ 2.400,00, não se justificam para o projeto.

Elaboração e Agenciamento: de R$ 56.570,20 para R$ 32.967,00, adequação para 10% do valor total do projeto.

Itens retirados:

Texto Introdutório: R$ 880,00, não se justifica; a pesquisa fornece o texto e já está previsto todo o texto na Produção.

Copy-Desk: RS 6.000,00, já prevista revisão de texto.

Laboratório fotográfico: R$ 1.100,00, já incluso em Imagens-foto.

Revisão Gráfica e Análise de Print: R$ 2.479,00, já inclusas na coordenação, produção e acompanhamento gráfico.

Despesas com transporte e alimentação: R$ 1.220,00, sob a responsabilidade dos profissionais respectivos.’

5.5. De acordo com o art. 35 da Portaria/MinC 46/1998, que regulava a matéria à época, na realização das despesas vinculadas aos recursos oriundos de incentivos do Pronac, os comprovantes deverão discriminar os produtos adquiridos e/ou serviços prestados em conformidade com o orçamento analítico aprovado.

5.6. O orçamento (peça 1, p. 12-18), com os ajustes empreendidos pela análise técnica no Ministério da Cultura - MinC (peça 1, p. 80-82 e 92), integraram o termo de compromisso, conforme orientação no item I das condições inscritas no próprio documento (peça 1, p. 98). As mudanças realizadas no projeto pelo ente foram, inclusive, informadas à empresa Damara (peça 1, p. 108-110), sem qualquer contestação da beneficiária. Com isso, o valor a ser executado perfazia R$ 364.019,00.

5.7. Em que pese o recorrente afirme em diversas oportunidades ter juntado cópia do livro ‘Cachaça – cultura e prazer do Brasil’, editora: Damara; Autores: Sandra Ventura e Ricardo Giraldez; ao se consultar todas as peças dos autos, não foi possível localizar essa obra.

5.8. Entretanto, em visita a diversos sítios de venda de livros, verifica-se que a obra, de fato, existe e foi editada no final de 2006, portanto, um ano após a transferência dos recursos à empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. Inclusive, a ficha técnica do livro comercializado é praticamente idêntica à apresentada pelo proponente (peça 1, p. 32). O objeto do projeto 057766 foi concluído.

5.9. Entretanto, é pacífica na jurisprudência desta Casa que a realização do objeto não é suficiente para comprovar a boa e regular aplicação dos recursos governamentais. Faz-se necessário estabelecer, com clareza, o nexo de causalidade entre os valores empregados e a conclusão do ajustado. É por conta disso que se exigem relatórios de execução físico-financeira, relação de pagamentos, além dos extratos bancários e documentos comprobatórios, dentre outros.

5.10. O recorrente apresentou, no âmbito desta Corte, apenas os documentos comprobatórios de parte das despesas realizadas para consecução do objeto (peça 24). Sequer constam os extratos bancários da conta específica aberta para o projeto (peça 1, p. 106 e 156).

5.11. Destaque-se que a responsabilidade pela adequada prestação de contas dos recursos governamentais empregados é do gestor, conforme expressa determinação do art. 70, parágrafo único, da Constituição Federal.

5.12. De todo modo, deve-se considerar, no presente caso, que a parte juntou documentos, em parte, confiáveis, antes do julgamento pelo Tribunal a quo. A Corte desconsiderou as provas juntadas aos autos (peça 24). Restringiu-se a enfrentar manifestação anterior do responsável (peça 11).

5.13. Os documentos apresentados pelo recorrente não afastam a irregularidade das contas dos responsáveis, mas têm o condão de reavaliar o débito e a multa imputados às partes, devendo ser considerados na presente análise, como medida de justiça.

5.14. É oportuno consignar que a conta corrente destinada à consecução do objeto foi aberta pelo MinC no extinto Banco Unibanco (peça 1, p. 106 e 156). Em razão disso, torna-se dificultosa a tarefa de trazer aos autos os extratos de movimentação bancária dos valores. Excepcionalmente, no presente caso, vislumbra-se possível, diante da documentação apresentada, estabelecer razoável nexo de causalidade entre parte dos recursos governamentais e a realização do objeto pactuado.

5.15. Nesse sentido, cotejou-se um a um os documentos juntados aos autos (peça 24) com o projeto apresentado pelo recorrente (peça 1, p. 12-18), com os ajustes realizados pelo Minc (peça 1, p. 80-82 e 92), conforme se nota na tabela em anexo à presente instrução. Verificou-se a pertinência dos gastos com o pactuado e a legislação de regência dos incentivos.

5.16. Cabe assinalar que, na análise empreendida nesta instrução, foram verificadas as datas dos gastos realizados, consultados dados das empresas envolvidas no sistema CNPJ da Receita Federal do Brasil e verificada a coerência lógica das despesas realizadas. Não se identificou fraude aparente na documentação.

5.17. Verifica-se que o recorrente trouxe gastos com pertinência ao projeto, que devem ser recebidos como prestação de contas dos recursos do incentivo. Mas, por outro lado, na documentação apresentada, há elementos que não foram aceitos no orçamento analítico, além de despesas sem identificação ou com valores excessivos.

5.18. As despesas com serviços fotográficos, imagens, revelações especiais e montagens, filmes para fotografia e assistente fotográfico (peça 24, p. 55-60; 77-79; 86-88; 120-123; 132-134; 167-170 e 230-231), por exemplo, têm cobertura parcial nos itens ‘Imagens – Fotografia’ e ‘Tratamento de imagens’, previstas no orçamento aprovado (peça 1, p. 12-19).

5.19. Nota-se, com a observância da tabela em anexo, que esses gastos somam R$ 69.080,00, superando qualquer perspectiva do projeto, que previa máximo de R$ 39.800,00 para esses custos, montante apresentado pelo proponente e sequer contestado pelo ministério. Por conta disso, serão aproveitados nesta instrução, apenas os valores projetados pela empresa e aceitos pelo MinC.

5.20. Os gastos com revisão de textos, no montante de R$ 5.550,00 (peça 24, p. 109-111 e 202), por sua vez, encontram respaldo no projeto no item de mesmo nome e na rubrica ‘Consultoria e Revisão para os textos específicos’, com pequena diferença. Logo, merecem ser recebidos.

5.21. De igual sorte, os gastos com passagens áreas e rodoviárias tiveram como destino Minas Gerais, como previsto no projeto, bem como locais tradicionais de produção de cachaça ou próximos, como Montes Claros/MG e Franca/SP (peça 24, p. 18, 24-25, 38, 46-47, 83 e 146-150), no valor de R$ 4.564,32. Estão respaldados no projeto, não obstante não tenham sido previstas viagens de ônibus.

5.22. De outro lado, as despesas com hospedagem, constantes da documentação apresentada (peça 24, p. 19, 21, 23, 26, 29, 36, 40, 97-98, 143-145, 158-161, 171-173, 188-193 e 222), totalizando R$ 6.576,30, superam os gastos previstos no projeto, de R$ 330,00 (peça 1, p. 12-19). Entretanto, o montante envolvido não é excessivo e os recursos foram realizados nos locais de pesquisa para o livro, devendo ser aproveitados, por razoabilidade.

5.23. Do mesmo modo, não obstante a rubrica alimentação tenha sido retirada do orçamento analítico pelo MinC (peça 1, p. 80-82 e 92), opta-se por receber os respectivos documentos nesta instrução, tendo em vista a realização das despesas nos locais destinados à pesquisa e a baixa materialidade dos valores envolvidos, os quais somam R$ 2.133,50 (peça 24, p. 17, 22, 49 e 139, por exemplo).

5.24. Os gastos para impressão do livro (peça 24, p. 229), no montante de R$ 75.000,00, estão acobertados pelos itens ‘Papel capa’, ‘Papel Miolo’, ‘Impressão Miolo Versão Português/Inglês Formato 66x96’ e ‘Impressão Capa Versão Português/Inglês’, devendo ser recepcionados na íntegra.

5.25. Além dos gastos discutidos acima e outros também recebidos nesta instrução, como se apresentará em tabela a seguir, o recorrente juntou documentos com rubricas não aceitas no projeto, como transporte, telefone e até excesso de bagagem, estacionamento e pedágio. Traz, também, elevadas despesas com gasolina e locação de veículos, além de comprovantes com descrições genéricas, como ‘despesas’ e ‘serviços prestados’, sem qualquer especificação (peça 24, p. 30, 50-52, 116-119, 124-131 e 220). Logo, esses itens não poderão ser aceitos como prestação de contas.

5.26. Destaque-se que o recorrente não comprovou a contrapartida de responsabilidade da empresa, relacionada ao envio de exemplares a bibliotecas indicadas pelo MinC, bem como os gastos com divulgação da obra, mesmo com custeio a cargo dos recursos governamentais. Essa atitude revela a feição estritamente comercial do proponente, sem responsabilidade com os preceitos da Lei Rouanet. Inclusive, o livro é vendido nas livrarias ao elevado preço de R$ 160,00, mesmo com a quase ausência de custos de produção.

5.27. Com isso, após detalhada análise da documentação apresentada pelo recorrente, conclui-se que apenas parcela dos gastos pode ser recebida a título de prestação de contas dos recursos do Projeto 057766, nos moldes descritos na tabela abaixo:

Tabela I: Gastos recebidos

|Atividades |Valor (R$) |

|Pesquisa documental |2.300,00 |

|Pesquisa iconográfica |1.100,00 |

|Imagens - Fotografias e Tratamento de imagens |39.800,00 |

|Revisão de tradução |1.500,00 |

|Revisão de texto |5.550,00 |

|Coordenação editorial |8.000,00 |

|Escaneamento |15.000,00 |

|Produção editorial e geral |18.375,00 |

|Produção de texto histórico |3.200,00 |

|Preparação de texto em português |5.000,00 |

|Produção de textos sobre os locais a serem |11.250,00 |

|visitados | |

|Produção do texto projeção internacional da cachaça|1.750,00 |

|Versão para inglês e preparação de texto em inglês |6.400,00 |

|Diagramação em inglês |10.760,00 |

|Passagens |4.564,32 |

|Hospedagem |6.576,30 |

|Assessoria jurídica |8.000,00 |

|Material de consumo |225,20 |

|Elaboração e agenciamento |32.967,00 |

|Gastos com impressão do livro |75.000,00 |

|Alimentação |2.133,50 |

|Total |259.451,32 |

Fonte: elaboração própria a partir da peça 24 dos autos e da tabela em anexo à instrução.

5.28. Portanto, a documentação apresentada pelo recorrente ainda antes do julgamento a quo tem aptidão para afastar do débito imputado às partes o montante de R$ 259.451,32, restando pendente de comprovação, contudo, a quantia de R$ 104.567,68.

5.29. Além disso, conforme pacífica jurisprudência desta Casa, a apresentação intempestiva dos elementos que comprovam a aplicação dos recursos constitui prova capaz apenas de afastar o débito ou parte dele, como no presente caso. A omissão no dever de prestar contas representa falta grave, que afronta a norma constitucional inserida no art. 70, parágrafo único, da Carta Magna, ensejando a irregularidade das contas do gestor, com incidência de multa.

5.30. Assim, uma vez comprovada, ainda que em grau de recurso, a aplicação de parte dos recursos governamentais encaminhados aos responsáveis, impõe-se a redução do débito imputado às partes e das multas dele decorrentes. Mantém-se, contudo, o saldo devedor, a penalidade prevista no art. 57 da Lei 8.443/1992 e a irregularidade das contas omitidas inicialmente.

6. Aplicação de multa individualizada à empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME e ao respectivo sócio administrador, ora recorrente (peça 38, p. 6)

6.1. O recorrente afirma não ter sentido aplicar multas individuais a ele e à empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME, da qual é sócio administrador, tendo em vista que ambos fazem parte de uma única pessoa jurídica com único objetivo.

Análise

6.2. Não assiste razão ao responsável. O recorrente busca afastar a responsabilidade dele sob o véu da personalidade jurídica da empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME, que responde por ter sido a signatária do termo de compromisso firmado com o MinC (peça 1, p. 98).

6.3. No presente caso, contudo, isso não é possível. A Portaria/MinC 46/1998, que disciplinava a análise e prestação de contas dos projetos cobertos pela Lei Rouanet, na época, previa, em seu artigo 39, in verbis:

‘Art. 39. O proponente do projeto apresentará a prestação de contas à Secretaria responsável nas condições e prazos previstos no Capítulo VIII da Instrução Normativa STN n° 1/97, tanto para os recursos financeiros liberados pelo MinC, como pela captação direta de recursos no mercado, a título de investimentos, patrocínios e/ou doações.’

6.4. No caso ora em análise, não obstante o compromisso tenha sido firmado com a empresa Damara e o nome dela conste na proposta original do projeto (peça 1, p. 4), ao final, quem assume a responsabilidade como proponente do projeto é Jorge José de Melo (peça 1, p. 22), sem referência à pessoa jurídica. Então, a pessoa jurídica e a pessoa física do ora recorrente teriam obrigação solidária de comprovar a boa e regular aplicação dos recursos públicos.

6.5. Também, ao contrário do que afirma o recorrente, o envolvimento dele no projeto não se relacionou apenas a emprestar a empresa a terceiros. Ele, além de sócio-administrador e majoritário da Damara Produções, esteve diretamente ligado à produção do livro, como assistente editorial e revisor de texto (peça 1, p. 32). Em outro momento, inclusive, ele se declara responsável editorial, com participação integral na produção de textos relativos ao projeto (peça 1, p. 60).

6.6. O Tribunal de Contas da União, em transferências de recursos federais como a que ora se analisa, tem se manifestado no sentido da responsabilização solidária tanto da entidade pactuante quanto do dirigente, inclusive em incidente de uniformização de jurisprudência (Acórdão 2.763/2011 – Plenário), no sentido de:

‘9.2. firmar o seguinte entendimento quanto à responsabilização das pessoas que devem responder por danos ao erário ocorridos na aplicação de transferências voluntárias de recursos federais a entidades privadas, com vistas à consecução de uma finalidade pública:

9.2.1. na hipótese em que a pessoa jurídica de direito privado e seus administradores derem causa a dano ao erário na execução de avença celebrada com o poder público federal com vistas à realização de uma finalidade pública, incide sobre ambos a responsabilidade solidária pelo dano;’

6.7. No caso em análise, mostrou-se correto o posicionamento do Tribunal de citar, desde o princípio, tanto a pessoa jurídica Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME, quanto a pessoa física do sócio administrador ora recorrente (peças 7-10).

6.8. Destaque-se, inclusive, que essa postura será sobremaneira importante na recuperação dos valores desviados, pois a empresa Damara, com capital social de apenas R$ 2.000,00 (peça 1, p. 36), não terá qualquer condição de ressarcir sozinha o erário. Essa preocupação em tornar efetivas as deliberações do Tribunal tem sido externada em diversos julgados emanados dos colegiados do TCU (Acórdão 298/2008 – Segunda Câmara):

‘Conforme pode ser observado no contrato social às fls. 68/70, a Gomes e Magdalena Produções Artísticas Ltda. é uma empresa minúscula, cujo valor atualizado do seu capital social não atinge R$ 400,00. Assim, considero que seria praticamente inócua a tentativa de ressarcimento do débito por parte exclusiva de uma empresa de tal porte. Também considero correta a citação de ambos os sócios da empresa, ainda que seja o Sr. Fernando da Silva Gomes quem atuou como dirigente da empresa em todos os atos relacionados a este processo. Conforme também consta do contrato social da empresa, os dois sócios têm igual participação no seu capital social e ambos respondem pela sua administração e gerência.’

6.9. Assim, todos os que concorrem para o dano, ainda que de forma culposa e independentemente de locupletarem-se com os recursos públicos, devem ser condenados a ressarcir o erário. A pessoa jurídica de direito privado, ao celebrar avença com o poder público federal, objetivando alcançar uma finalidade pública, assume o papel de gestora pública naquele ato e, em consequência, está sujeita ao cumprimento da obrigação pessoal de prestar contas ao poder público. Da mesma forma, recai responsabilidade sobre a pessoa física, na condição de dirigente de entidades privadas, visto que, de fato, é quem determina a destinação a ser dada aos recursos públicos transferidos.

6.10. Por fim, as condutas da pessoa jurídica, como signatária da avença com o poder público; e do dirigente, gestor responsável pela destinação dos valores transferidos, individualizam-se e podem ser apenadas separadamente pelo Tribunal de Contas da União.

CONCLUSÃO

7. Das análises anteriores, conclui-se que:

a) Uma vez comprovada, ainda que em grau de recurso, a aplicação de parte dos recursos governamentais encaminhados aos responsáveis, impõe-se a redução do débito imputado às partes e das multas dele decorrentes. Mantém-se, contudo, o saldo devedor, a penalidade prevista no art. 57 da Lei 8.443/1992 e a irregularidade das contas omitidas inicialmente;

b) Todos os que concorrem para o dano, ainda que de forma culposa e independentemente de locupletarem-se com os recursos públicos, devem ser condenados a ressarcir o erário. A pessoa jurídica de direito privado, ao celebrar avença com o poder público federal, objetivando alcançar uma finalidade pública, assume o papel de gestora pública naquele ato e, em consequência, está sujeita ao cumprimento da obrigação pessoal de prestar contas ao poder público. Da mesma forma, recai responsabilidade sobre a pessoa física, na condição de dirigente de entidades privadas, visto que, de fato, é quem determina a destinação a ser dada aos recursos públicos transferidos;

c) As condutas da pessoa jurídica, como signatária da avença com o poder público; e do dirigente, gestor responsável pela destinação dos valores transferidos, individualizam-se e podem ser apenadas separadamente pelo Tribunal de Contas da União;

7.1. Com isso, a comprovação parcial dos gastos realizados com recursos vinculados ao Projeto 057766 exige a redução do débito imputado ao recorrente e à empresa Damara Produções, bem como da multa aplicada com base no art. 57 da Lei 8.443/1992. Mas, como demonstrado acima, restou pendente de comprovação parte dos recursos transferidos, o que implica na manutenção do saldo devedor e da multa dele decorrente.

7.2. As penalidades imputadas individualmente ao recorrente e à empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME decorrem de responsabilidade de cada uma das respectivas pessoas, podendo, portanto, ser imputadas separadamente.

PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

8. Diante do exposto, com fundamento nos artigos. 32, I, e 33, da Lei 8.443/1992, submetem-se os autos à consideração superior, com posterior encaminhamento ao Ministério Público junto ao TCU e ao Gabinete do Relator, propondo:

a) conhecer do recurso e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para:

I - excluir do débito de que trata o item 9.1 do acórdão recorrido as despesas comprovadas na fase recursal, indicadas na fundamentação, atribuindo-se a seguinte composição à dívida remanescente:

|Valor original (R$) |Data da ocorrência |

|104.567,68 |23/12/2005 |

II – reduzir o valor da multa aplicada aos responsáveis pelo item 9.3 do acórdão recorrido;

comunicar ao recorrente, à Procuradoria da República no Estado de São Paulo e aos demais interessados a deliberação que vier a ser proferida por esta Corte.”

3. O titular da Serur dissentiu desse entendimento, conforme o seguinte pronunciamento (peça 49):

“(...)

2. O auditor federal, acompanhado pelo diretor, propõe provimento parcial ao presente recurso, com vistas a reduzir o débito e consequentemente a multa, ante as seguintes conclusões: (i) execução do objeto pactuado; e (ii) comprovação da aplicação de parcela dos recursos questionados por meio da documentação apresentada a título de prestação de contas.

3. Divirjo da proposta por entender que a documentação constante dos autos não permite que se estabeleça nexo causal entre os recursos federais transferidos e a realização do objeto, não obstante a comprovação de que este tenha sido, de fato, executado.

4. Os documentos apresentados a título de prestação de contas (peça 24) consistem em notas fiscais, recibos, faturas e bilhetes de passagens, os quais demonstram tão somente as despesas incorridas na execução do objeto. Os autos carecem, portanto, de documentos hábeis a comprovar que tais despesas foram custeadas pelos recursos federais, como extrato bancário, relação de pagamentos, conciliação bancária, entre outros.

5. A sociedade empresária, na pessoa de seu sócio-administrador, ao firmar o termo de compromisso para captação de recursos para execução de projeto com incentivo fiscal, se comprometeu a apresentar a prestação de contas nas condições estabelecidas pelo Ministério da Cultura. Dentre os documentos necessários para integrar a prestação de contas estão a relação de pagamentos, a conciliação bancária e os extratos bancários com as movimentações do início ao fim do projeto, conforme ofício emitido pela Coordenação-Geral de Prestação de Contas do Ministério da Cultura (peça 1, p. 188-189).

6. Os documentos supramencionados são essenciais para o estabelecimento do nexo entre os recursos repassados e as despesas efetuadas, razão por que, diante de sua ausência, entendo que o recorrente não logrou afastar o débito.

7. Por essas razões, proponho o conhecimento do presente recurso de reconsideração para, quanto ao mérito, negar-lhe provimento.”

4. Por sua vez, o representante do Ministério Público alinhou-se ao secretário da unidade técnica, nos termos do parecer que segue, no essencial, transcrito abaixo:

“(...).

5. Do acórdão recorrido, para melhor compreensão das questões tratadas neste processo, destaco o seguinte trecho do voto proferido pelo relator, Ministro Benjamin Zymler:

‘4. Devidamente citados, esses agentes não apresentaram a prestação de contas dos recursos em questão e, em essência, afirmaram que: ‘o livro foi produzido sob o nome ‘Cachaça - Cultura e Prazer do Brasil’ (conforme fotos em anexo) e editados 1.000 (mil) exemplares, no mês de dezembro de 2006, tendo sido cumprido o objeto do projeto em questão. (...)

5. Quanto à alegação de que o objeto foi executado, cabe destacar que a sua existência física, por si só, não constitui elemento apto a comprovar a aplicação dos recursos federais utilizados por terceiros. Isso porque, de acordo com a jurisprudência desta Corte, é necessária a comprovação do nexo de causalidade entre o objeto executado e os recursos federais a ele destinados, que deve ocorrer mediante a competente prestação de contas.’

6. As ponderações constantes do recurso de reconsideração foram analisadas pelo Auditor Federal de Controle Externo (AUFC) da Secretaria de Recursos deste Tribunal (Serur), por meio da instrução à peça 47, que concluiu pelo provimento parcial do recurso de reconsideração.

7. Para o AUFC, os documentos juntados pelo recorrente ao processo em 27/2/2014, conforme peça 24, um mês após a manifestação do Ministério Público de Contas (peça 23) e em momento que antecedeu o julgamento da TCE, comprovariam a regularidade de parte das despesas efetuadas na produção do livro ‘Cachaça - Cultura e Prazer do Brasil’. Destaco que tais elementos não foram levados em conta pelo Tribunal ao proferir o Acórdão 995/2014-TCU-Primeira Câmara.

8. Tais documentos referem-se a cópias de bilhetes de passagens, notas fiscais, faturas e recibos de gastos diversos, com itens como: alimentação, hospedagem, gasolina, transporte, locação de veículos, pesquisa documental, produção e coordenação editorial, serviços fotográficos, produção de texto e diagramação (vide relação de documentos, com a descrição do conteúdo e respectivos valores, no Anexo I da instrução à peça 47).

9. Cabe ressaltar que, na opinião do AUFC, tais gastos teriam sido efetuados na confecção do livro, cuja existência, apesar de não constar exemplar neste processo, foi por ele atestada do seguinte modo:

‘5.7. Em que pese o recorrente afirme em diversas oportunidades ter juntado cópia do livro Cachaça – cultura e prazer do Brasil, editora: Damara; Autores: Sandra Ventura e Ricardo Giraldez; ao se consultar todas as peças dos autos, não foi possível localizar essa obra.

5.8. Entretanto, em visita a diversos sítios de venda de livros, verifica-se que a obra, de fato, existe e foi editada no final de 2006, portanto, um ano após a transferência dos recursos à empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. Inclusive, a ficha técnica do livro comercializado é praticamente idêntica à apresentada pelo proponente (peça 1, p. 32). O objeto do projeto 057766 foi concluído.’ (instrução à peça 47 – grifos nossos)

10. Considerando que os elementos à peça 24 comprovariam, parcialmente, a realização de gastos com recursos vinculados ao projeto aprovado pelo MinC, o AUFC propôs, a partir do provimento parcial do recurso de reconsideração, a redução do débito originalmente imposto aos responsáveis, com a consequente diminuição da multa individual que lhes foi imposta com base no art. 57 da Lei Orgânica/TCU.

11. Tal proposta contou com o apoio do diretor da 1ª Diretoria Técnica (DT) da Serur, nos termos da manifestação à peça 48.

12. O titular da Serur, conforme pronunciamento à peça 49, discordou do encaminhamento sugerido pelo AUFC e pelo diretor da 1ª DT.

13. Para o secretário da referida unidade técnica, os documentos acostados à peça 24 dos autos representariam, tão somente, despesas ligadas à execução do objeto, mas não permitiriam o estabelecimento do nexo causal entre os recursos captados com autorização do MinC e a confecção do livro. Ademais, não estariam presentes nos autos elementos essenciais para se atestar a regularidade da aplicação dos recursos angariados com incentivo fiscal, ‘como extrato bancário, relação de pagamentos, conciliação bancária, entre outros’ (item 4 da manifestação à peça 49 – grifo nosso).

14. Alinho-me ao entendimento manifestado pelo titular da Serur.

15. O que se tem nos autos, conforme elementos anexados à peça 24, são documentos que podem ter relação com a confecção do livro ‘Cachaça - Cultura e Prazer do Brasil’, cuja existência pode ser verificada por meio de pesquisa na Internet (sites de livrarias).

16. Ocorre, no entanto, que o responsável não trouxe ao processo, quer seja antes do julgamento da TCE (peça 24), quer seja em seu recurso (peça 38), entre outros documentos, cópia do extrato bancário que permitiria o estabelecimento do nexo causal entre os valores captados e os gastos relacionados à confecção do livro.

17. Ressalto que os elementos à peça 24 deste processo, que não foram levados em conta no juízo manifestado pelo Tribunal por meio do Acórdão 995/2014-TCU-Primeira Câmara, não trariam qualquer alteração às conclusões externadas por meio do acórdão recorrido.

18. Conforme entendimento constante do Acórdão 5.097/2014-TCU-1ª Câmara, é essencial para a aferição da regularidade da aplicação de recursos captados com base na Lei 8.313/1991 a existência, para fins de prestação de contas, do extrato bancário da conta específica da captação, de modo a restar evidenciada a vinculação entre tais recursos e os gastos realizados no projeto cultural.

19. Nesse sentido, assim destacou o Ministro Bruno Dantas no voto que fundamentou o referido acórdão:

‘24. Cabe esclarecer, em respeito ao direito de defesa que poderá ser exercido em sede de recurso, que a impugnação dos R$ 114.411,28 ora estipulados como débito a ser suportado pelo Sr. Fernando Antônio Jayme Guimarães decorre, basicamente, da inexistência de extrato bancário apto a estabelecer inequívoco nexo causal, em termos de datas e valores, entre as despesas alegadas e os comprovantes apresentados a título de prestação de contas.’ (grifo nosso)

20. Lembro que a existência de conta bancária específica relativa à captação é requisito expressamente previsto no Decreto 5.761/2006 para a movimentação dos recursos captados, além de representar mecanismo essencial para o acompanhamento do regular fluxo de recursos entre os incentivadores e seus beneficiários, nos termos dos seguintes dispositivos desse decreto:

‘Art. 36. As transferências financeiras dos incentivadores para os respectivos beneficiários serão efetuadas, direta e obrigatoriamente, em conta bancária específica, aberta em instituição financeira oficial, de abrangência nacional, credenciada pelo Ministério da Cultura.

Art. 37. O controle do fluxo financeiro entre os incentivadores e seus beneficiários estabelecer-se-á por meio do cruzamento das informações prestadas ao Ministério da Cultura, por parte de cada um deles, de modo independente.

(grifo nosso)

21. Embora parte das despesas indicadas pelo recorrente (cópias de comprovantes à peça 24) possam, supostamente, ter relação com o livro ‘Cachaça - Cultura e Prazer do Brasil’, não há como estabelecer o nexo de causalidade entre os recursos captados no Projeto 057766 e as despesas que viabilizaram a edição dessa obra.

22. A mera existência do objeto, conforme ressaltado pelo Ministro Benjamin Zymler no item 5 da deliberação recorrida, não implica que o projeto foi custeado com recursos de doações e/ou patrocínios angariados pela sociedade Damara por conta dos incentivos fiscais autorizados pelo MinC, via Lei de Incentivo à Cultura.

23. Ante o exposto, manifesto minha concordância com a proposta da Serur, na forma adotada pelo titular da unidade técnica (peça 49), pelo conhecimento e não provimento do recurso de reconsideração.”

É o relatório.

VOTO

Em exame recurso de reconsideração interposto por Jorge José de Melo, sócio majoritário e administrador da sociedade Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME, contra o Acórdão 995/2014 - Primeira Câmara, que julgou irregulares as contas do recorrente e da referida empresa, condenando-os, em solidariedade, a ressarcir aos cofres do Fundo Nacional de Cultura o montante de R$ 364.019,00, com data de ocorrência em 23/12/2005, e a recolher ao Tesouro Nacional multas individuais, decorrentes desse débito, no valor de R$ 30.000,00. O julgamento fundamentou-se na omissão no dever de apresentar as contas quanto aos recursos captados, a partir de termo de compromisso firmado com o Ministério da Cultura (MinC), para execução do Projeto “Roteiro Cultural da Cachaça”.

2. Tal projeto consistia na edição de livro bilíngue sobre a cachaça e respectiva cadeia produtiva, objetivando a captação de recursos financeiros na forma de doações ou patrocínios (Mecenato), conforme estipulado na Lei 8.313/1991 (Lei de Incentivo à Cultura).

3. O recurso pode ser conhecido, uma vez que preenche os requisitos de admissibilidade estabelecidos nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei Orgânica do Tribunal.

4. Quanto ao mérito, no âmbito da Serur, os pareceres foram divergentes.

5. O auditor, nos termos da instrução da peça 47, concluiu, com a anuência do diretor, que houve a execução do objeto pactuado, bem como a comprovação da aplicação de parcela dos recursos questionados por meio da documentação apresentada a título de prestação de contas. Em razão disso, propôs dar provimento parcial ao recurso, com redução do débito, para 104.567,68, e das multas, na devida proporcionalidade.

6. Por sua vez, o titular da Secretaria de Recursos, em posição diametralmente oposta, sugeriu negar provimento ao recurso, basicamente, pelas seguintes razões: “Os documentos apresentados a título de prestação de contas (peça 24) consistem em notas fiscais, recibos, faturas e bilhetes de passagens, os quais demonstram tão somente as despesas incorridas na execução do objeto; os autos carecem, portanto, de documentos hábeis a comprovar que tais despesas foram custeadas pelos recursos federais, como extrato bancário, relação de pagamentos, conciliação bancária, entre outros.”

7. Tal entendimento foi seguido pelo representante do MP/TCU, pois, segundo ele: “O responsável não trouxe ao processo, quer seja antes do julgamento da TCE (peça 24), quer seja em seu recurso (peça 38), entre outros documentos, cópia do extrato bancário que permitiria o estabelecimento do nexo causal entre os valores captados e os gastos relacionados à confecção do livro; embora parte das despesas indicadas pelo recorrente possam, supostamente, ter relação com o livro ‘Cachaça - Cultura e Prazer do Brasil’, não há como estabelecer o nexo de causalidade entre os recursos captados no Projeto 057766 e as despesas que viabilizaram a edição dessa obra”.

8. Com efeito, há que se considerar que, conforme a Carta Circular de Aprovação de Projetos, de 19/12/2005 (peça 1, p. 108), a Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura do MinC, ao dar ciência ao recorrente da aprovação do projeto, também alertou-o sobre a necessidade de abertura de conta bancária específica e exclusiva, em nome do proponente, para movimentação de todos os recursos recebidos.

9. No entanto, o auditor que instruiu o recurso sopesou que: “a conta corrente destinada à consecução do objeto foi aberta pelo MinC no extinto Banco Unibanco (peça 1, p. 106 e 156); em razão disso, torna-se dificultosa a tarefa de trazer aos autos os extratos de movimentação bancária dos valores”. Acontece, porém, que, conforme suas próprias palavras: “O recorrente apresentou, no âmbito desta Corte, apenas os documentos comprobatórios de parte das despesas realizadas para consecução do objeto; sequer constam os extratos bancários da conta específica aberta para o projeto (peça 1, p. 106 e 156); entretanto, é pacífica na jurisprudência desta Casa que a realização do objeto não é suficiente para comprovar a boa e regular aplicação dos recursos governamentais; faz-se necessário estabelecer, com clareza, o nexo de causalidade entre os valores empregados e a conclusão do ajustado; é por conta disso que se exigem relatórios de execução físico-financeira, relação de pagamentos, além dos extratos bancários e documentos comprobatórios, dentre outros.”

10. Ora, independentemente da extinção da instituição bancária, fato que, aliás, nem foi mencionado pelo recorrente, era dever do responsável guardar cópia de todos os comprovantes bancários para cumprir a sua inexorável obrigação de prestar contas, na forma definida na lei e nos normativos pertinentes relacionados ao projeto, dos recursos que originalmente pertenciam à União e que lhe foram disponibilizados, sob a forma de incentivo cultural.

11. Sobre a questão dos comprovantes bancários, é pertinente transcrever o que a Coordenação-Geral de Prestação de Contas do Ministério da Cultura, na Nota Técnica 053/2010 (peça 1, fl. 251), assinalou a respeito, ao emitir seu parecer pela irregularidade da TCE e necessidade de devolução dos recursos:

“Conforme consta nos autos (...), conclui-se que restou prejudicada a verificação da movimentação bancária, tendo em vista que não foram localizados e/ou não foram carreados ao processo, cópias de extratos bancários em que evidenciassem os créditos e débitos. Diante da ausência dos extratos, não foi possível rastrear a movimentação dos recursos adquiridos para a realização do projeto supramencionado.”

12. Ainda nessa seara, em recente decisão desta 1ª Câmara (Acórdão 5.097/2014), ficou explicitado que, para a aferição da regularidade da aplicação de recursos captados com base na Lei 8.313/1991, a existência, para fins de prestação de contas, do extrato bancário da conta específica da captação é elemento essencial para que se possa evidenciar a vinculação entre as verbas angariadas e as despendidas na execução do projeto cultural.

13. A documentação que ora o responsável traz aos autos não é capaz de impactar a intelecção pela irregularidade das contas, pelas razões acima expostas.

14. Ademais, no voto que conduziu a decisão sob ataque, da mesma forma que no parecer do representante do Ministério Público, exarado nesta fase recursal, já se tinha expressado a convicção da impossibilidade de se fazer o nexo entre os recursos captados e o objeto. Nessa linha, é esclarecedora a transcrição do seguinte trecho do referido parecer: “A mera existência do objeto, conforme ressaltado pelo Ministro Benjamin Zymler, no item 5 da deliberação recorrida, não implica que o projeto foi custeado com recursos de doações e/ou patrocínios angariados pela sociedade Damara por conta dos incentivos fiscais autorizados pelo MinC, via Lei de Incentivo à Cultura”.

Por todo o exposto, voto por que o Tribunal adote o acórdão que ora submeto a este Colegiado.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 11 de novembro de 2014.

JOSÉ MÚCIO MONTEIRO

Relator

ACÓRDÃO Nº 7144/2014 – TCU – 1ª Câmara

1. Processo nº TC 019.238/2013-4

2. Grupo I - Classe I - Recurso de Reconsideração (em Tomada de Contas Especial)

3. Recorrente: Jorge José de Melo (CPF 357.859.937-91), Sócio-Administrador

4. Unidade: Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME (CNPJ 03.360.543/0001-08)

5. Relator: Ministro José Múcio Monteiro

5.1. Relator da deliberação recorrida: Ministro Benjamin Zymler

6. Representante do Ministério Público: Procurador Sergio Ricardo Costa Caribé

7. Unidades Técnicas: Secex/SP e Serur

8. Advogado constituído nos autos: Glecio Rogério Silva Mariano Alves (OAB 281.819/SP)

9. Acórdão:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de tomada de contas especial que tratam, nesta fase, de recurso de reconsideração interposto por Jorge José de Melo, sócio majoritário e administrador da empresa Damara Produções Jornalísticas e Culturais Ltda. ME, contra o Acórdão 995/2014 – 1ª Câmara, que julgou irregulares as contas do recorrente e da referida empresa, condenando-os em débito solidário e aplicando-lhes multas.

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da 1ª Câmara, ante as razões expostas pelo Relator, e com fundamento nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei 8.443/1992, em:

9.1. conhecer do recurso de reconsideração, para, no mérito, negar-lhe provimento;

9.2. notificar o recorrente.

10. Ata n° 41/2014 – 1ª Câmara.

11. Data da Sessão: 11/11/2014 – Ordinária.

12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-7144-41/14-1.

13. Especificação do quorum:

13.1. Ministros presentes: Walton Alencar Rodrigues (Presidente), Benjamin Zymler, José Múcio Monteiro (Relator) e Bruno Dantas.

13.2. Ministros-Substitutos presentes: Augusto Sherman Cavalcanti e Weder de Oliveira.

|(Assinado Eletronicamente) |(Assinado Eletronicamente) |

|WALTON ALENCAR RODRIGUES |JOSÉ MÚCIO MONTEIRO |

|Presidente |Relator |

Fui presente:

(Assinado Eletronicamente)

MARINUS EDUARDO DE VRIES MARSICO

Procurador

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