Folha de São Paulo | Cotidiano | SP



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13 de setembro de 2009

Governadores usam R$ 3,6bi da saúde em outros gastos

Governadores deixaram de aplicar R$ 3, 6 bilhões em hospitais e remédios em 2007, informa Ricardo Westin. Relatório do Ministério da Saúde revela que, devido a brechas da lei, foram contabilizados como gastos em saúde pública desde compra de uniformes militares à despoluição da baía de Guanabara. Dos 27 governadores, 16 não destinaram à saúde o mínimo de 12% determinados pela Constituição. O Rio Grande do Sul investiu 3, 75%, enquanto o Amazonas gastou 23, 8%. Estados que "maquiaram" gastos suficientes para construir 70 hospitais dizem que a legislação não é clara.

Verba da saúde paga almoço de preso e farda

RICARDO WESTIN

DA REPORTAGEM LOCAL

Por causa de uma brecha na lei, 16 Estados deixaram de aplicar R$ 3,6 bilhões em hospitais, remédios, exames e outras ações de saúde em 2007.

A Constituição determina que os Estados devem destinar à saúde no mínimo 12% de suas receitas próprias. Para atingir o percentual, a maioria dos governadores, porém, "maquiou" seus balanços contabilizando gastos que não foram propriamente com saúde pública.

O Rio, por exemplo, contabilizou como gasto em saúde os restaurantes populares e a

despoluição da baía de Guanabara. O Paraná incluiu o uniforme de policiais militares e a merenda das escolas. Minas Gerais calculou um programa de financiamento da casa própria. Goiás, a ampliação da rádio, da TV e da gráfica estadual.

O Ministério da Saúde passou um pente-fino nas prestações de contas, eliminou tudo aquilo que não era ligado ao Sistema Único de Saúde e constatou que, na realidade, a maioria dos Estados não cumpre a Constituição. Dos 27 governadores, segundo o relatório recém-concluído, 16 aplicaram menos que os 12% obrigatórios. Incluíram nas contas da saúde, para citar mais exemplos, tratamento de esgoto, plano de saúde dos funcionários estaduais, aposentadoria dos servidores da saúde, alimentação de presidiários e programas sociais do estilo Bolsa-Família.

Os subterfúgios tiraram da saúde em 2007 dinheiro suficiente para sustentar o programa brasileiro de Aids por quase três anos. Com esses mesmos R$ 3,6 bilhões poderiam ser construídos 70 hospitais de médio porte (200 leitos).

Sem punição Os governos que ficaram mais longe dos 12% foram os do Rio Grande do Sul (3,75%) e de Minas Gerais (7,09%). São Paulo investiu 11,75%, segundo a auditoria. O Estado protestou dizendo que o Viva Leite, programa que dá leite a famílias pobres, é ação de saúde. O ministério aceitou o argumento, e SP chegou aos 12%.

Os governadores que desrespeitam a norma, porém, jamais são punidos. O mínimo de 12% entrou na Constituição no ano 2000, pela emenda constitucional 29. O problema é que o texto é genérico e deixa margem para que Estados e seus Tribunais de Contas façam interpretações subjetivas.

Com a baía de Guanabara limpa, por exemplo, argumenta o Rio, menos pessoas adoecem.

Um projeto de lei que diz exatamente o que é investimento em saúde e também o que não é está em análise no Congresso Nacional. A tramitação se arrasta desde 2002.

Com o objetivo de orientar os governantes, o Conselho Nacional de Saúde, ligado ao Ministério da Saúde, aprovou uma resolução com os mesmos termos do projeto de lei. O texto, porém, não tem força de lei.

Com o projeto de lei aprovado e a ambiguidade resolvida, os Estados poderão deixar de receber verbas da União e até sofrer intervenção federal; e os governadores, ser processados por crime de responsabilidade. O problema é que o mau exemplo vem de cima. O próprio Ministério da Saúde, que também tem investimentos em saúde pública fixados pela Constituição, deixou de aplicar R$ 5,48 bilhões entre 2001 e 2008, segundo o Ministério Público Federal.

O presidente do Conselho Nacional de Saúde, Francisco Batista Júnior, diz que os Estados têm "deliberadamente" deixado de cumprir o mínimo fixado pela Constituição. "Sempre ouvimos os diversos atores [governo e congressistas] dizendo que são a favor da aprovação da regulamentação da emenda 29, mas isso nunca acontece. É constrangedor."

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