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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR DE UMA DAS CÂMARAS CRIMINAIS DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Paciente: XXXXX

Impetrantes: XXXXX

Autoridade Coatora: Comandante Geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo

XXXXX, Defensores Públicos do Estado de São Paulo, integrantes do Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo E do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, todos com domicílio para intimação na Rua Boa Vista, nº 103, 11º andar, vêm, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência com fundamento no art. 5º, inciso LXVIII da Constituição Federal, e nos artigos 647 a 667 do Código de Processo Penal, impetrar o presente pedido de ordem de

HABEAS CORPUS PREVENTIVO com pedido de ordem liminar

em favor de NOME (qualificação), residente e domiciliado na _______________________, pelos argumentos de fato e de direito a seguir apresentados, em face do Comando Geral da Polícia Militar de Estado de São Paulo, na pessoa do Coronel Benedito Roberto Meira, situado na Praça Coronel Fernando Prestes nº 115, Bom Retiro, São Paulo, SP, CEP: 01124-060

1. DOS FATOS

Como é do conhecimento público, a aumento nas passagens de ônibus, metrô e trem no início deste mês causou grande revolta em grande parte da população, sobretudo nas camadas mais pobres da sociedade.

Diante deste clima de revolta, manifestantes organizaram-se com o objetivo de protestar de maneira pacífica contra a abusividade das taxas, bem como contra as péssimas condições do transporte público urbano em todo o país.

Em São Paulo, o movimento foi capitaneado pelo Movimento do Passe Livre – MPL, grupo de cidadãos que busca um transporte de melhor qualidade, possuindo como objetivo futuro que não seja cobrada tarifa para fruição do serviço.

O grupo mobilizou-se e passou a marcar manifestações na capital de São Paulo. A cada uma delas, mais simpatizantes das ideias compareciam aos atos.

Na útlima quinta-feira, dia 13 de junho de 2013, foi realizada a quarta manifestação do grupo, atraindo, segundo dados estimados da Polícia Militar, mais de 5.000 (cinco mil pessoas).

Outrossim, durante a tarde da quinta-feira, este Núcleo Especializado foi procurado por uma das lideranças do Movimento do Passe Livre solicitando apoio da Defensoria Pública, eis que havia chegado a eles informações que a Polícia Militar utilizaria de todos os meios para reprimir a manifestação.

Imediatamente entramos em contato telefônico com o Major Genivaldo, comandante do Batalhão corresponde a área central da cidade, local da manifestação, para tentarmos estabelecer um diálogo, com o objetivo de evitar a utilização de violência durante o ato.

O comandante, então, passou o contato do comandante da operação, Tenente Coronel Ben-Hur Junqueira Neto. Em conversa com este, ficou combinado que os Defensores Públicos se dirigissem ao local da manifestação para conversa pessoal entre ele, os Defensores e as lideranças do Movimento.

Em razão disso, um grupo de Defensores Públicos foi até o local marcado para o início das manifestações, onde presenciaram diversas violações a direitos.

Logo na chegada, notamos a presença de um grande efetivo policial, divididos em vários grupos, andando a pé pelas ruas, abordando e revistando a esmo transeuntes. Tal fato foi amplamente noticiado pela imprensa. (doc. 01)

Aparentemente não havia qualquer motivo para que a grande maioria daquelas pessoas fossem abordadas.

Fomos relatar o fato ao Comandante da operação, Tenente Coronel Ben-Hur (doc. 02), tendo ele dito expressamente que a ordem para que os policiais abordassem todos aqueles que tivessem “cara de manifestante”, como idade, trajes, se portavam ou não mochilas.

O fato é que, contrariamente ao que determina o Código de Processo Penal, o qual autoriza busca pessoal somente nos casos em que houver FUNDADA SUSPEITA de portarem armas ou bens ilícitos[1], os policiais militares estavam abordando indistintamente todas as pessoas que dirigiam-se à manifestação.

Diversas destas pessoas abordadas foram detidas pelos policiais e levadas até um ponto operacional da Polícia Militar na Praça do Patriarca, onde, na rua, ficaram perfiladas em uma parede por horas aguardando a chegada de um ônibus da Polícia para levarem-no ao Distrito Policial.

Isso pode ser confirmado, Excelência, em um dos vídeos em anexo, onde o “paredão” formado pelos presos é mostrado, bem como pela reportagem também em anexo da Carta Capital onde o próprio subscritor do texto era um dos indivíduos que formavam o “paredão” de detidos (docs.03-05) Também vale a menção feita em várias reportagens (doc. 06-09), em especial a menção testemunhal do fato narrada na Revista IstoÉ publicada, edição número 2274 de junho de 2013 (doc.10):

“…a polícia dava uma demonstração de desenvoltura excessiva ao realizar 40 prisões “para averiguações”, eufemismo clássico para atos abusivos. “Quando fui perguntar por que dois conhecidos estavam detidos, me advertiram: “Não faz muitas perguntas se não levamos você também”, conta o professor Lucas Oliveira (…)

Como havia um grande número de detidos, número o qual aumentava a cada minuto, eis que a todo instante policiais chegavam com mais um indivíduo detido, os impetrantes decidiram indagar ao comandante da operação por qual motivo cada um daqueles indivíduos estava preso.

Surpreendentemente, contudo, o comandante afirmou textualmente que não poderia dizer naquele momento a razão da prisão de cada um deles, narrando genericamente que havia presos por estarem com tinta (!), com vinagre (!), com facas, ou simplesmente por já ter sido identificados nas manifestações anteriores.

Mas não é só. Nesta conversa, o comandante da operação disse textualmente que a estavam presos para averiguação.

Dois trechos da filmagem do diálogo entre Defensores e Comandante da Operação na área Tenente Coronel Ben-Hur são reveladores e por isso aqui destacados (doc.11 e 12):

00064

Policial: Tinta; saquinhos de tinta, que foram jogados…vários saquinhos de tinta…

Defensoria: Mas tá prendendo?

Policial: O cara ta com tinta, não tá? Nas outras manifestações foram presas pessoas que depredaram. Essas pessoas que depredaram foram todas qualificadas e fichadas dentro do distrito, certo? Pra eu saber se esses que estão aqui já foram qualificados (initeligível) eu só posso levar pro distrito.

Defensoria: O senhor está confessando uma prisão por averiguação?

Policial: Tudo bem.

Defensoria: Você gravou?

Policial: Tudo bem. Você pode até colocar a responsabilidade pra mim. Vai ser preso por averiguação. Tudo bem. Vocês querem fazer isso…

Defensoria: Então eles vão ser presos para averiguação?

Policial: Eles estão indo pro distrito e vai ser checado se todos eles têm alguma ficha.

SAM 0116

(imagem com conversa entre Policial Militar e grupo)

00:02

Daniela Skromov: É.. eu preciso individualizar e saber o nome de cada um e saber a conduta de cada pessoa que vai ser conduzida...

Policial: 78º DP...

00:08

Daniela Skromov: Não... a minha pergunta é: é possível eu saber a conduta de cada pessoa que motivou a condução...

Policial: Aqui não... (celular do policial toca), é a terceira vez eu vou lhe responder, aqui não. No 78...

00:19

Daniela Skromov: É averiguação?

Policial: Até eles entrarem no Distrito ninguém tá preso. Eu expliquei...

00:25

Daniela Skromov: Então isso não é uma prisão?

Policial: (....) pra gente fazer uma triagem, certo?

Prova cabal é a fala do comandante da Polícia Militar, eis que claramente estávamos diante de prisões arbitrárias por parte da Polícia Militar, a famosa e vedada pelo ordenamento jurídico prisão para averiguação.

Outra prova de que ocorreram prisões para simples averiguação antes e durante a manifestação foi que mais de duzentas pessoas foram detidas pela Polícia Militar, sendo a grande maioria liberada pela Polícia Civil quando da chegada na Delegacia (docs 13). Segundo reportagem da R7, foram 242 detidos e somente 4 que foram de fato autuados em flagrante na Delegacia (doc.14).

O paciente foi um destes indivíduos presos para averiguação e liberado na Delegacia. Veja, Excelência, que foi lavrado boletim de ocorrência de natureza não criminal em face do paciente, o que demonstra cabalmente de que não havia motivos para ele ser conduzido, preso/detido, à delegacia. Vejamos o histórico que consta do B.O.:

78º DP

Boletim nº 5161/2013

Espécie: Outros –não criminal Data: 13/06/2013 Hora de Emissão: 23:30hs

Histórico:

Informa o Policial Militar que a pessoa de NOME, se encontrava na “manifestação do Passe Livre” (sic) onde foi conduzido até esta unidade policial para averiguação, ocorre que NOME foi averiguado e dispensado nesta unidade, onde ao sair para o corredor desta unidade veio a desmaiar, sendo socorrido pelo cabo PM Esteves para o Hospital das Clínicas onde foi medicado e liberado.

O presente boletim de ocorrência tem a finalidade de registrar o fato. Nada mais.

E não se tratou de caso isolado. Conforme boletins de ocorrência em anexo, com histórico consolidado de todos (doc. 15 e 16), dezenas de pessoas estavam na mesma situação do paciente, qual seja, presos para averiguação pela Polícia Militar sem que tivesse qualquer indício da prática de crime, tanto que foram liberados pela autoridade policial e lavrado boletim de ocorrência de natureza não criminal. Pessoas presas até então por portar, por exemplo, bandeira, mega-fone, guache, máscara, rolinho de tinta, vinagre –usado para amenizar os efeitos do gás lacrimogênio -, mas a maioria presa por portar NADA, simplesmente por aparentar ser manifestante. Exemplificamos o afirmado com dois outros históricos de ocorrência:

01º DP

Boletim nº 4798/2013

Espécie: Outros – não criminal Data: 14/06/2013 Hora de Emissão: 00:44hs

Histórico:

Comparece o condutor acima qualificado noticiando que ao realizar suas atividades institucionais abordou o grupo de pessoas em tela, o qual fazia parte de uma manifestação no local dos fatos, todavia, segundo se apurou, não foi atribuída a prática de qualquer ato de vandalismo ou violência. Com eles nada de ilícito foi encontrado.

Diante dos fatos, a Autoridade Policial deliberou pelo presente registro a título não criminal e após as verificações de praxe pela equipe de investigadores desta Distrital, foram liberados.

78º DP

Boletim nº 5154/2013

Espécie: Outros – não criminal Data: 13/06/2013 Hora de Emissão: 23:47hs

Histórico:

VTR M 18380- Componentes CB Ricardo RE 965590-5 e CB PM Edilberto RE 889596-1. 3 CIA do 18 Batalhão.

Presentes os Policiais Militares supra, apresentando ocorrência atendida por policiais da base localizada no bairro da Liberdade.

Consta que a parte Fernando dos Santos Braga estava andando em via pública na posse de uma bandeira do PCB e com um pano embebido em vinagre e foi abordado por policiais de referida base, que solicitaram encaminhamento até esta Distrital para averiguação.

Os milicianos que apresentam a ocorrência nada sabem informar sobre os fatos. A parte Fernando explica que estava na Faculdade fazendo vista de prova e recebeu uma ligação onde o informavam que uma garota do Partido teria sido machucada na manifestação Passe Livre. Diante disto se deslocou até a sede do Partido com a bandeira em suas mãos enrolada e com um pano contendo vinagre para se proteger, caso necessário, dos gases lacrimogênios usados pela Polícia Militar.

Pesquisa via Prodesp e nada mais havendo, deliberou a autoridade policial pela elaboração da ocorrência em tela.

Por fim, vale frisar que a Polícia Militar impedia o acesso dos Defensores Públicos com aos detidos que estavam no “paredão”, violando-se direito do preso a ser assistido por profissional habilitado. Os videos que acompanham este writ comprovam esse fato.

Todo o relatado demonstra que ocorreu na última quinta-feira e certamente se repertirá nas futuras manifestações, a próxima marcada para amanhã (17 de junho) (doc.17) dia em que está prevista um contigente maior de policiais militares (doc 18), constrangimento ao direito constitucional ao direito de ir, vir e estar em logradouros públicos, bem como flagrante violação ao direito constitucional de livre manifestação, eis que as abordagens indiscriminadas e prisões para simples averiguações mitigam de maneira drástica o direito constitucional assegurado.

Tais constrangimentos estão comprovados pelos vídeos que acompanham esta inicial, bem como por diversas reportagens publicadas entre a noite de quinta-feira e a manhã da sexta-feira seguinte à manifestação.

2. DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS PREVENTIVO

Dispõe o artigo 5º, inciso LXVIII da Constituição Federal que “conceder-se-á Habeas Corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder” (g.n.).

A própria redação do dispositivo deixa clara a ampla abrangência do remédio constitucional, passível de ajuizamento sempre que houver qualquer ameaça ao direito fundamental e imanente a todo ser humano de ir, vir e ficar.

Consoante assevera José Afonso da Silva, a liberdade de locomoção, garantida no artigo 5º, XV, da Constituição Federal, “constitui o cerne da liberdade da pessoa física no sistema jurídico” (Curso de direito constitucional positivo, 32ª Ed., São Paulo: Malheiros, 2008, p. 237).

O direito à circulação, corolário da liberdade de locomoção, inclui, nos dizeres do mesmo autor, o direito de ir, vir, ficar, parar, estacionar (idem, p. 239).

É certo que os direitos fundamentais não são admitidos pela doutrina como absolutos, podendo-se restringi-los em função de outros direitos fundamentais, respeitado o critério de proporcionalidade, desde que haja determinação legal ou judicial para tanto.

No caso do paciente, contudo, foi detido por policiais militares sem que estivesse cometendo qualquer infração, tanto que foi liberado, depois de horas de aprisionamento ilegal, sem que houvesse qualquer encaminhamento tomado pelo d. Delegado acerca da apuração de algum crime, mas apenas a lavratura de um Boletim de Ocorrência não-criminal.

Ademais, como vem sendo a praxe da Polícia Militar, estas condutas ilegais de realização de abordagens sem fundado motivo, de prender para averiguação e de impossibilitar o contato de profissional jurídico habilitado com o detido, certamente na manifestação marcada para hoje e nas próximas que ocorrerão tais condutas ilegais serão repetidas.

Daí a extrema necessidade de concessão da ordem preventiva para que o paciente, antes, durante e depois da manifestação marcada para hoje, bem como para as futuras, não tenha seu direito de ir e vir cerceado ilegalmente por Políciais Militares.

A ordem, portanto, busca que os arbítrios praticados na última manifestação não mais se repitam, evitando-se novas violações aos direitos do paciente.

Sobre o cabimento do Habeas Corpus preventivo quando alguém for ameaçado em seu direito de ir, vir e ficar, manifesta-se Aury Lopes Júnior:

“Como explica CALAMANDREI, na tutela jurisdicional preventiva, o interesse não surge do dano, senão dal pericolo di um danno giuridico. A tutela não atua a posteriori do dano, como produto da lesão ao direito, senão que se opera a priori, para evitar o dano que possa derivar da lesão a um direito, quando existe uma ameaça ainda não realizada. Existe, portanto, interesse juridicamente tutelável antes da lesão ao direito, pelo simples fato de que a lesão seja previsível, próxima e provável. Para isso está o habeas corpus preventivo” (Direito processual penal e sua conformidade constitucional, vol. 2, 6ª Ed., Rio de Janeiro: Lumen, 2011, p. 645).

Assim, havendo demonstração clara e inequívoca de que o paciente se encontra na iminência ou em risco de sofrer coação em sua liberdade de locomoção, é dever do Poder Judiciário antecipar-se à lesão, cumprindo o mandamento constitucional que dispõe explicitamente que, pela relevância do direito atingido, não é facultado ao julgador esperar que a lesão ocorra para que, apenas então, faça cumprir a lei.

Quanto ao grau de cognição exigido para a concessão de habeas corpus preventivo, é certo que, por haver ameaça de lesão, o juiz deverá avaliar a situação por sua verossimilhança, não exigindo certeza da ocorrência do evento futuro.

Nesse sentido:

“A iminência do constrangimento ilegal deve ser valorada em grau de probabilidade, um juízo de verossimilhança, não se podendo exigir ‘certeza’, pois esta somente será possível com a consumação do ato que se pretende evitar” (idem, ibidem, g.n.).

Aliás, ao tratar de habeas corpus preventivo, o Colendo Supremo Tribunal Federal já decidiu que, quando a ameaça à liberdade de locomoção for notória, veiculada pela mídia, dispensa-se qualquer comprovação processual de que o indivíduo sofre acosso à sua liberdade de ir, vir e ficar.

Em precedente célebre, o C. STF concedeu habeas corpus para garantir o direito de prostitutas de ficarem na via pública, conquanto não houvesse nenhuma norma ou ordem judicial que as impedisse de ali estar e exercer seu ofício:

“Habeas Corpus preventivo. “Trottoir”. Prostitutas ameaçadas de prisão pela polícia paulista. Fato notório. Recurso provido” (STF – HC 58.974 – São Paulo – Rel. Soares Muñoz – j. 29.09.1981, g.n.)

Nesse sentido, também o colendo Superior Tribunal de Justiça decidiu pela concessão da ordem de habeas corpus (HC 207720), considerando ilegal o “toque de recolher” estipulado por municípios paulistas, reconhecendo que crianças e adolescentes tinham o direito de permanecer nas ruas em qualquer horário do dia ou da noite. Julgou-se, ainda, que, por ser o fato notório, a constatação da ameaça de lesão ao direito de locomoção não necessitava de qualquer aprofundamento probatório.

Outrossim, além de notório o abuso praticado pela Polícia Militar durante o último ato da manifestação, as provas aqui carreados demonstram claramente a ameaça aos direito de ir e vir do paciente, especialmente pelo grande número de boletins de ocorrência em anexo de natureza não criminal lavrados contra presos pela Polícia Militar, evidenciado, assim, prisões para averiguação.

A possibilidade, neste caso concreto, de concessão da ordem preventiva, portanto, é jurídica e legítima.

3. DO MÉRITO: ILEGALIDADE E ARBITRARIEDADE DE BUSCAS PESSOAIS INDISTINTAMENTE, INEXISTÊNCIA EM NOSSO ORDENAMENTO JURÍDICO DA PRISÃO PARA AVERIGUAÇÃO E IMPOSSIBILIDADE DE NÃO PERMITIR O CONTATO DO PRESO COM O PROFISSIONAL HABILITADO PARA SUA DEFESA

Embora já tenhamos discorrido longamente acerca das violações praticados, alguns pontos devem ser destacados neste momento.

Um primeiro ponto que merece atenção é a a abordagem indistinta de pessoas.

O ordenamento jurídico veda este comportamento.

A abordagem e revista pessoal, em razão de sua invasividade à intimidade pessoal, está disciplinada no Código de Processo Penal.

Vale a transcrição do dispositivo legal:

Art. 240.  A busca será domiciliar ou pessoal.

        § 1o  Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para:

        a) prender criminosos;

        b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;

        c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos;

        d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso;

        e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;

        f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato;

        g) apreender pessoas vítimas de crimes;

        h) colher qualquer elemento de convicção.

        § 2o  Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e letra h do parágrafo anterior.

Vejam, Excelências, que o dispositivo legal permite a busca pessoal somente quando houver fundada suspeita de que o indivíduo oculte arma ou objetos relacionados a crimes.

Não é lícito abordar todos os indivíduos que estão encaminhando-se a uma manifestação, sem que haja uma fundada suspeita de que estejam portando arma ou algum objeto ilícito ou criminosos. É necessário que haja uma FUNDADA SUSPEITA de que o cidadão esteja portando algum destes objetos, sob pena de clara ilegalidade.

A propósito, este Eg. Tribunal já definiu a fundada suspeita em termos estritos, em acórdão magistral da lavra do Des. Dr. Marcio Bartoli, conforme excertos que seguem:

(…) em nosso sistema legal, a abordagem e a busca pessoal só podem ser realizadas quando houver fundada suspeita de que o indivíduo traga consigo arma proibida objetos ou papéis que constituam corpo de delito ou qualquer outro elemento de convicção (art. 240, §2o, e art. 44 do Código de Processo Penal). No caso dos autos, porém, verifica-se que as diligências policiais não seguem qualquer tipo de critério, sendo aleatórias e discriminatórias, o que contraria frontalmente as informações de fls. 174/84. Não se pode crer que estão presentes os requisitos legais acima elencados quando há notícias de abordagem de pessoas pelo simples fato de estarem dormindo na rua, ou quando há dispersão de pessoas, com uso de spray de pimenta quando elas estão simplesmente transitando pela via pública (fls. 161/2).

Se a liberdade de ir e vir não é absoluta, devendo ceder espaço à necessidade da preservação da segurança pública, como bem ressaltado pela autoridade coatora, da mesma forma, sob a escusa de garantir a segurança da população, não se pode justificar a atuação desrespeitosa, sem preparo e arbitrária de policiais que estão sob o comando dessa mesma autoridade. (TJ-SP, Habeas Corpus no 0039710- 13.2012.8.26.0000, 1a. Câmara Criminal, julgado em 23/04/2012)

O paciente passou por este constrangimento no quarto ato da manifestação e vem pedir a concessão da ordem preventiva para que somente seja procedida busca pessoal nele caso os policiais indiquem a fundada suspeita.

O segundo ponto é ainda mais grave.

O paciente, bem como dezenas de pessoas, foram presos pela Polícia Militar e encaminhados para Delegacia. Lá chegando, porém, foi liberado, eis que não havia qualquer ilicitude em seu comportamento, tanto que foi leavrado boletim de ocorrência de natureza não criminal (anexo).

Ora, estávamos diante da velha e arbitrária prisão para averiguação, completamente vedada pelo nosso ordenamento jurídico, e que nos faz lembrar dos anos de chumbo que vivemos durante o período de governo dos militares.

A Constituição Federal é clara no sentido de que uma pessoa somente pode ser presa se estiver em flagrante delito ou houver ordem escrita e fundamentada de autoridade judicial. In verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

O Código de Processo Penal, como não poderia ser diferente, traz dispositivo neste mesmo sentido:

Art. 283.  Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva

Ou seja, não há exceção para prisão de civil. Somente poderá ser detido se estiver em flagrante ou houver decisão judicial determinando a custódia.

Muito se discute acerca da possibilidade de conduzir alguém à Delegacia para prestar depoimento acerca de fatos investigados pela autoridade policial.

Não adentraremos nesta discussão pois não é relevante para o caso concreto.

Veja-se que não havia qualquer expediente investigatório contra o paciente, de modo que não poderiam os policiais militares invocarem esta justificativa para legitimarem seu ato.

Embora não concordemos com aqueles que defendem a possibilidade de condução de investigado à delegacia para tomada de depoimento, mesmo aqueles que concordam com esta postura não entenderiam como legítima o comportamento dos policiais militares em detrimento do paciente, já que ele não era investigado por nenhum fato.

E é bom que fique bem claro, neste ponto, a diferença das situações. Houvesse algum tipo de investigação na Delegacia em face do paciente, seria possível, segundo entendimento de parte da doutrina e da jurisprudência, a condução do investigado ao distrito policial para tomada de depoimento.

Contudo, não havendo investigação alguma, jamais o paciente poderia ser detido e levado para delegacia para tomada de depoimento. A grande diferença é que no primeiro caso há uma investigação em curso e um crime investigado e, no segundo, não há nada contra o cidadão, de modo que a decisão de detê-lo e levá-lo para Delegacia consubstancia a odiosa figura da prisão por averiguação.

Uma das práticas abjetas que caracterizou a ditadura brasileira foi a chamada prisão para averiguação. A prisão para averiguação é a privação momentânea da liberdade, fora das hipóteses de flagrante e sem ordem descrita do juiz competente, para investigação ou averiguação em ambiente policial. Exatamente como narrado acima.

Sua larga utilização durante o período de exceção brasileiro foi ressaltada por Tourinho Filho na seguinte passagem:

“No Governo Costa e Silva e no Governo Geisel (períodos de exceção) houve várias tentativas visando à criação da prisão para averiguações, coisa, aliás, que na prática existia e continua existindo. Contudo, aqueles que por ela propugnavam não lograram êxito...”

Como lembra o autor citado, a prática da prisão para averiguação era e ainda continua comum, motivo que justifica a necessidade de intervenção do Poder Judiciário para coibir essa prática odiosa.

Com o advento do período de democratização da sociedade brasileira, essa prática, por ser incompatível com o Estado Democrático de Direito, foi proscrita de forma expressa no art. 5º, LXI, da Constituição da República.

Além disso, Tratados Internacionais de Direitos Humanos dos quais o Brasil é signatário impõem garantias contra a prisão arbitrária. Nesse sentido, destacamos o disposto na Convenção Americana de Direito Humanos que impede expressamente a prisão para averiguação ao dispor sobre a detenção arbitrária:

Artigo 7º - Direito à liberdade pessoal

1. Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais.

2. Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas Constituições políticas dos Estados-partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas.

3. Ninguém pode ser submetido a detenção ou encarceramento arbitrários.

Assim, sem sombra de dúvidas, a ordem constitucional brasileira impede a odiosa prática da prisão por averiguação acima narrada, mas exercida de maneira arbitrária e, como se tem visto, disseminada, pela polícia paulista. Nesse sentido, Guilherme Nucci deixa claro, como se vê nas palavras abaixo:

“Não mais tem cabimento admitir-se que a polícia civil ou militar detenha pessoas na via pública, para ‘averiguá-las’, levando-as presas ao distrito policial, onde, como regra, verifica-se se são procuradas ou não. Trata-se de instrumento de arbítrio, que, uma vez fosse admitido, ampliaria os poderes da polícia em demasia, a ponto de cidadão algum ter garantia de evitar a humilhação do recolhimento ao cárcere.”[2]

Para além de sua inconstitucionalidade, a prática da prisão para averiguação constitui crime de abuso de autoridade, conforme tipificação no art. 3º da Lei 4898/95: “Constitui abuso de autoridade qualquer atentado: à liberdade de locomoção; à incolumidade física do indivíduo”.

A concessão da ordem preventiva, portanto, é de rigor, sob pena do paciente ser novamente preso para averiguação nas próximas manifestações, em atitude lamentável, arbitrária e ilegal da Polícia Militar.

E não se diga que a custódia determinada pela Polícia Militar do paciente, e de tantos outros, para encaminhamento compulsório à Delegacia não seria prisão e, por isso, não haveria desrespeito ao art, 5º inciso LXI da Contituição Federal e art. 283 do Código de Processo Penal.

Ora, dizer que não está preso quem é colocado defronte a uma parede, cercado por dezenas de policiais militares, sem poder sair dali, sem poder conversar com outras pessoas, inclusive com advogados e Defensores Públicos, sem poder ir ao banheiro, sem poder comer, é fazer pouco da inteligência alheia.

Depois da detenção, essas pessoas, sem qualquer justificativa juridicamente aceitável, conforme se vê dos Boletins de Ocorrência não criminais juntados, foram encaminhadas coativamente à Delegacia, onde ficaram detidas por várias horas, proibidas de sair, ocupando espaços da carceragens ou as “eclusas” (“corrós”) das celas, em estilo idêntico aos relatos de presos políticos e de outras prisões arbitrárias aterradoras da ditadura militar.

Nas fotos das reportagens em anexo e em alguns dos vídeos que estão na mídia digital anexa facilmente percebemos que aquelas pessoas estão presas.

Aliás, o vocábulo “preso” é assim definido no dicionário Michaelis[3]:

preso

pre.so

adj (part irreg de prender) 1 Amarrado, atado, ligado. 2 Fixo, pregado, seguro, atarraxado. 3 Recluso em prisão; encarcerado. 4 Que foi agarrado ou aprisionado; prisioneiro. 5 Recolhido a prisão; encarcerado. 6 Sem liberdade de ação. 7 Moralmente peado. 8 Impelido, tolhido. 9 Manietado. 10 pop Casado. Antôn (acepções 1 a 6): livre, solto. sm 1 Aquele que está recolhido a prisão; encarcerado, prisioneiro. 2 Indivíduo detido ou capturado por agentes da autoridade. Col: leva (em trânsito). Preso pelo beiço, gír: enamorado, encantado. Preso por mil, preso por dois mil: a ter de ser preso, que o seja logo por uma falta grande e não por uma pequena.

Ora, preso significa “sem liberdade de ação”, “indivíduo detido ou capturado por agentes da autoridade. E realmente o paciente esteve sem liberdade de ação, após ter sido capturado por agentes da autoridade.

Não se discute que o cerceamento da liberdade do paciente caracterizou uma prisão. E como não havia flagrante, nem ordem escrita judicial, tratou-se de prisão por averiguação, vedada em nosso país.

Acerca da ilegalidade da prisão por averiguação, a gerar inclusive responsabilidade civil ao Estado pelos danos morais e materiais causados ao cidade, este E. Tribunal de Justiça, como não poderia deixar de ser, já se pacificou:

“O nexo de causalidade entre o ato e o dano se mostra evidente. No caso era questão, a retenção do autor para averiguação se mostrou precipitada. O conjunto probatório demonstra que não havia necessidade alguma de retenção do apelado para averiguação. Ao apelado não foi creditado nenhum crime em especifico, pois conforme se vê pelos depoimentos constantes dos autos, a testemunha Sorayde Lima Gibertoni (fls. 93) que foi quem deu causa a ação dos policiais, não imputou crime algum ao apelado, se limitando a dizer que ele era semelhante a uma pessoa que havia visto em um ônibus e que lhe fez algumas perguntas sobre o onde ela trabalhava. (...)Desta forma, não havendo sido imputado nenhum fato delituoso ao apelado, sua retenção e encaminhamento à Delegacia de Polícia, algemado, lhe causou dano que merece ser indenizado. (Apelação 990.10.118605-5. TJ-SP. Rel LINEU PEINADO. Julg em 18/05/2010).

“Ainda que não tenha ficado comprovado qualquer ofensa direta ao autor, por parte dos policiais militares, o certo é que a conduta de conduzi-lo à repartição policial, sem qualquer elemento indicativo da prática de ilícito penal, revestiu-se de manifesta ilegalidade. Não se há falar, em absoluto, no cumprimento do dever legal, mas sim de abuso de autoridade por parte dos policiais militares. A prisão somente se permite em caso de flagrante delito ou mandado judicial. Não era o caso, evidentemente. A chamada "prisão para averiguações" viola o direito constitucional de ir e vir dos cidadãos. Nosso sistema legal somente admite a prisão por ordem judicial ou quando o agente é surpreendido em flagrante delito. (Apelação 0036279-07.2007.8.26.0562. TJ-SP. Rel. MARCIO FRANKLIN NOGUEIRA. Julg em 10/05/2011).

Por fim, o terceiro ponto que devemos destacar é a proibição da Polícia Militar de que os impetrantes tivessem contato com os detidos.

Ora, tanto a Constituição Federal, quanto o Código de Processo Penal determinam, como direito fundamental do preso, ter acesso a seu advogado.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

Art. 289-A.  O juiz competente providenciará o imediato registro do mandado de prisão em banco de dados mantido pelo Conselho Nacional de Justiça para essa finalidade.

§ 4o  O preso será informado de seus direitos, nos termos do inciso LXIII do art. 5o da Constituição Federal e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, será comunicado à Defensoria Pública. 

Assim, não há dúvidas de que o preso, desde o momento de sua prisão, pode ter o acompanhamento de seu advogado e, não havendo, do Defensor Público.

A proibição da Polícia Militar de os impetrantes terem contato com os presos remomora tempos da Ditadura Militar, em que a incomunicabilidade do preso era a regra.

Apenas para colocar a situação nos termos em que devem ser, inexiste no Brasil a incomunicabilidade do preso, haja vista que a Constituição Federal de 1988 a vedou até mesmo na vigência de estado de defesa[4]. Se em estado de defesa não há incomunicabilidade, com mais razão em tempos de normalidade não é permitido que o preso fique incomunicável.

Ademais, ao vedar que os impetrantes tivessem acesso ao paciente e aos demais “presos”, a Polícia Militar violou prerrogativa funcional da Defensoria Pública.

Art. 44. São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública da União:

VII – comunicar-se, pessoal e reservadamente, com seus assistidos, ainda quando esses se acharem presos ou detidos, mesmo incomunicáveis, tendo livre ingresso em estabelecimentos policiais, prisionais e de internação coletiva, independentemente de prévio agendamento

Artigo 162 - São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública do Estado, além daquelas definidas na legislação federal:

XII - ter acesso amplo e irrestrito a todas as dependências de estabelecimentos penais, de internação de adolescentes e aqueles destinados à custódia ou ao acolhimento de pessoas, independente de prévio agendamento ou autorização, bem como comunicar-se com tais pessoas, mesmo sem procuração, ainda que consideradas incomunicáveis.

Aqui, porém, a violação da prerrogativa é mero reforço argumentativo. O importante é que a Polícia Militar ao vedar o contato dos impetrantes com o paciente violou seu direito a manter contato, onde quer que seja, com o profissional habilitado para falar em sua defesa.

Mais uma ilegalidade que certamente será repetida se a ordem preventiva não for concedida.

Diante do exposto, impõe-se a concessão da ordem de Habeas Corpus preventiva, a fim de que o paciente não veja tolhido novamente seu direitos constitucionais nas próximas manifestações, concedendo-lhe salvo-conduto para que i) não seja procedida busca pessoal em seus pertences no caso de não haver fundado receio de porte de arma ou de objetos criminosos ou ilícitos; ii) não seja preso simplesmente para ser encaminhado ao distrito policial para prestar depoimento (prisão para averiguação), mas tão somente no caso de haver flagrante delito ou ordem judicial, caso em que deverá lhe ser imediatamente informado qual é a conduta criminosa específica e individualizada que lhe é imputada e iii) caso seja detido em flagrante ou por ordem judicial, tenha acesso, ainda no local da detenção, a seu advogado ou ao Defensor Público que esteja no local

4. DA NECESSIDADE DE CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR

É imprescindível a concessão liminar da ordem, com a imediata expedição de salvo-conduto ao paciente, garantindo que ele i) não seja submetido à busca pessoal, desde que não haja fundado receio de estar portanto arma ou objetos ilícitos; ii) não seja preso para averiguação, mas somente em flagrante ou com ordem judicial e iii) caso seja detido, tenha o advogado ou Defensor Público livre acesso a ele, eis que presentes os pressupostos legais.

No presente caso, presente está o fumus boni iuris, diante de todo o relatado nesta inicial, bem como nos documentos anexos. Note-se que a verossimilhança entre as alegações dos impetrantes e as provas carreadas à esta inicial comprova a fumaça do bom direito.

Ademais, os fatos aqui narrados tornaram-se públicos e notórios. A repercussão que toda a imprensa deu ao quarto ato da manifestação, ocorrido na última quinta-feira, foi ampla, demonstrando os abusos cometidos pelos policiais militares, confirmando o alegado nesta ação constitucional.

Outrossim, os filmes anexos, gravados durante a manifestação, também comprovam grande parte de nossas alegações.

Ou seja, há inequívoca verossimilhança entre as alegações dos impetrantes e os fatos ocrridos em 13 de junho.

Por outro lado, o periculum in mora é ainda mais indiscutível.

O grupo de manifestantes marcou a próxima manifestação para a data de 17 de junho. Ademais, segundo informações dos líderes do Movimento, já há previsão de novas manifestações, a próxima, inclusive, ainda para esta semana.

Certamente, não haverá decisão do mérito desta ação constitucional em uma semana.

Sendo assim, para que não ocorra novas violações a direitos constitucionais do paciente, não há outra solução que não a concessão da ordem liminarmente, sob pena de completa ineficácia da medida jurisdicional.

Note-se, Excelência, que é necessária a prolação de uma decisão ainda hoje, de modo que o paciente possa participar da manifestação marcada para hoje tranquilamente, ou no máximo nos próximos dias, para que possa participar das manifestações que se seguirão.

Não sendo concedida a liminar, a prestação jurisdicional de nada servirá, eis que a decisão do mérito deve demorar algumas semanas, sendo possível, e até provável, que até lá as manifestações já tenham se encerrado.

Ou seja, o periculum in mora é evidente.

Presentes seus dois pressupostos, impõe-se a concessão da liminar.

5. PEDIDO

Por todo o exposto, requerem os impetrantes a concessão da ordem de habeas corpus liminarmente, eis que presentes seus pressupostos.

No mérito, requerem a confirmação da liminar, a fim que seja expedido salvo-conduto ao paciente, garantindo-se que i) não seja procedida busca pessoal em seus pertences, salvo no caso de haver fundado receio de porte de arma ou de objetos criminosos ou ilícitos; ii) não seja preso simplesmente para ser encaminhado ao distrito policial para prestar depoimento (prisão para averiguação), mas tão somente no caso de ser pego em flagrante delito ou haver ordem judicial escrita, caso em que deverá lhe ser imediatamente informado qual é a conduta criminosa específica e individualizada que lhe é imputada e iii) caso seja detido em flagrante ou por ordem judicial, tenha acesso, ainda no local da detenção, a seu advogado ou ao Defensor Público que esteja fazendo o atendimento no local.

Por fim, requer a extensão dos efeitos desta decisão a todos os cidadãos que se encontrem na mesma situação do paciente.

São Paulo, 17 de junho de 2013.

Defensor(a) Público(a)

Unidade de XXXXXXXXXXX

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[1] Art. 240 do CPP:  A busca será domiciliar ou pessoal.

§ 2o  Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e letra h do parágrafo anterior.”

[2] NUCCI, Guilherme de Sousa. Código de processo penal. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 585.

[3] Disponível em:

[4] Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

§ 3º - Na vigência do estado de defesa:

IV - é vedada a incomunicabilidade do preso

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