Resenha



RESENHA CRÍTICA À DISSERTAÇÃO DE MESTRADO: CASSACOS E CORUMBAS - MUDANÇAS DAS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO E MIGRAÇÃO INTERNAS (1)

Dissertação Apresentada no Programa Integrado de Mestrado em Economia e Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco.

Autora: Maria Teresa Sales de Melo Suarez (1974)

Prof. Dr. José Santino de Assis*

Pesquisador do Laboratório de Fitogeografia Aplicada (LABFIT)

Maceió-Alagoas, 2017

Introdução

O trabalho acima intitulado foi produto de uma pesquisa realizada no município de Ribeirão, localizado na "Zona da Mata", ao sul do Estado de Pernambuco.

O plano geral da obra obedece à seguinte esquematização: em primeiro lugar vêm os clássicos agradecimentos aos colaboradores; em segundo, é transcrito um poema de João Cabral de Melo Neto, que nos parece ter sido a fonte principal de inspiração para a escolha de seu trabalho. Pois a ideia central da pesquisa está fundamentada no que objetiva o poema; em terceiro lugar vem a introdução, que trata quase exclusivamente das teorias e das metodologias aplicadas. Sendo também computada como o primeiro capítulo duma série de três que, juntos, constituem o desenvolvimento de todo o trabalho; em quarto lugar vem a conclusão, que é completada com as considerações a respeito dos tipos de amostragens aplicados e dos questionários utilizados; finalmente, e em quinto lugar, consta a bibliografia que, por sua vez, se apresenta bastante extensa. No que revela uma boa erudição por parte da autora.

No que se refere às "notas", elas não foram dispostas nos rodapés de cada página, mas no final de cada capítulo. As mesmas, assim como o restante de todo o trabalho, foram datilografadas em espaço bastante ampliado. Tal como se houvesse uma preocupação maior com o número de páginas, que propriamente com o conteúdo.

Para o plano de amostragem a unidade de análise foi o Chefe de Família. E para o tamanho da amostra foi adotado o universo. Ou seja, a totalidade dos estabelecimentos agrícolas e de domicílios da cidade de Ribeirão. Como nível de confiança foi tomado 95%, e a diferença entre o valor do parâmetro e de seu estimador, não foi maior que 10%. Os tipos de amostra foram os de "aleatórias simples" para a zona urbana e de "estratificada" para a zona rural. Esta que, inicialmente, seria em função do tamanho das propriedades. Prevalecendo, depois, os tipos de propriedades. Por ser mais representativo, o nível de confiança foi de 90%, a fim de facilitar o tamanho de campo. E assim, reduzir o número de amostras, segundo a autora. Os instrumentos utilizados para a coleta dos dados foram: os questionários e a matriz de história de vida.

Para a elaboração do trabalho a autora serviu-se, além dos dados da pesquisa de campo in loco, também os dados dos Censos Demográfico e Agrícola. Bem como de suas próprias interpretações sobre os problemas da região que escolheu. A contribuição exercida pelos dados da pesquisa foi apenas como exemplificação para ilustrar a proletarização do trabalhador rural e do "sistema de empreiteiros", dentre outros. Conforme salienta.

Quanto à corrente ideológica seguida, ela é baseada no chamado "modelo classista", ou "marxista". Ou seja, dentro da concepção ideológica de Marx. Posição que, se não nos parece nítida logo de princípio, pelo menos no capítulo que trata das mudanças se nos apresenta com muito maior clareza. Mormente quando ela vincula o termo: "mudança" às forças comandadas pelo que denominou de "Capitalismo Internacional". Ou, ainda, pelos mecanismos impostos pela expansão da área canavieira que, consequentemente, expulsa o morador sitiante. Uma vez se tratar, em parte, dos interesses de uma classe exclusiva: os proprietários das terras, ou os usineiros. Ou aqueles preocupados em produzir mais por área de cultivo, a chamada: ¨produtividade¨; ou em desobrigando-se socialmente dos trabalhadores, segundo a concepção de muitos. Trata-se de uma explicação "pluralista" para a mudança que estudou, portanto.

Esta nossa resenha crítica, apesar de iniciar-se tecendo esse pequeno comentário a respeito do título, obedece sistematicamente à ordem dos três capítulos, pelo fato de entendermos que cada um deles trate de assunto isolado. Não implicando com isso, porém, em desorganização na composição da obra.

"Cassacos e Corumbas - ..."

Apesar dos termos terem sido muito bem colocados, em se tratando de uma problemática na qual se encontrem envolvidos personagens dos dois grandes grupos, de acordo com as definições dadas para cada um deles, o primeiro: "CASSACOS", merece uma ressalva. Merece pelo fato de que na região da Zona da Mata nordestina, a canavieira – pelo menos entre os protagonistas – o termo é mais utilizado quando referente aos trabalhadores construtores das estradas de ferro ou de rodagem. Localmente tratava-se de uma das várias denominações tais como: "cambiteiro", "carreiro", "cocheiro", dentre outros, e cujo termo genérico ao qual todos, indistintamente, se cognominavam era: "trabaiadô braçá" (uma forma apocopada de: "trabalhador braçal"), segundo sua própria linguagem. De qualquer modo aquele seria o mais representativo, principalmente por ser utilizado nos meios científicos. Seria o mesmo caso se, ao invés disso, a autora tivesse chamado de "Matutos". Pois, localmente, refere-se àqueles sitiantes, ou intermediários, que transportavam ao lombo de animais, a farinha de mandioca para os mercados das cidades nos dias de feira (hoje praticamente extintos). Mas que deveria ser aplicado a todos os habitantes nordestinos da Zona da Mata. Assim como: "agrestinos" para os do Agreste, "sertanejos" para os do Sertão e "brejeiros" para os dos Brejos pernambucanos.

Quanto aos "Corumbas", a terminologia utilizada para esta mesma Zona da Mata referia-se àqueles trabalhadores que, sazonalmente, sobretudo nos períodos de estiagens na Zona Sertaneja, se deslocavam aos campos canavieiros para executarem seus trabalhos no "plantio" ou na "limpa" da cana. Já que não sabiam "cortar" a mesma cana para a moagem ou para o fabrico do açúcar.

"Introdução"

Tendo subintitulado este capítulo como "Perspectiva Teórico-metodológica", a autora inicia-o por colocar o objetivo do seu trabalho. Como sendo o "estudo das migrações internas em função do Desenvolvimento das Atividades Básicas da região". E definiu as migrações internas como "um dos elementos do processo de mudança social como resultado de transformações estruturais da sociedade e um dos fatores determinantes destas novas transformações". Não esclarecendo, portanto, a que se referia com a expressão: "atividades básicas". A não ser que signifique todo um processo quer seja interno quer seja externo, de uma estrutura um tanto ou quanto complexa. Cuja evolução tenha provocado esses movimentos internos da população. Não apenas da área estudada, como da Zona da Mata canavieira como um todo. Ou então, esteja se referindo às atividades do setor primário como um dos setores produtivos diretos. Caso em que estariam esquecendo as funções desempenhadas pelos demais setores. Fato que ficou bastante indefinido. O que não ocorreu com a definição das migrações internas em si.

Em seguida tratou especificamente das "perspectivas" propriamente ditas que, depois de enumerá-las com as respectivas explicações, não as utilizou. Tudo em virtude do caso particular da área estudada não se adequar a nenhuma delas. O que levou a redefiniu o conceito do fluxo migratório como sendo "aquele onde se deram transformações sócio-econômicas que levaram um ou vários grupos sociais a migrar, desde que tais transformações já não sejam o resultado de outros movimentos migratórios concomitantes ou anteriores".

A nosso ver, o amontoado de perspectivas propostas para a orientação do seu trabalho serviu mais para confundir o leitor do que propriamente para explicar sua verdadeira orientação, ou linha de pesquisa seguida. Uma vez que foram deixadas de lado para seguir uma terceira bastante diferenciada. Assim, acreditamos se tornarem desnecessárias todas as propostas anteriores que, no caso, acabaram se constituindo em textos inúteis. Embora não estando isenta a necessidade de se efetuar todas as leituras possíveis para se tomar uma linha de orientação adequadamente explicitada. Mas, entre localizar uma linha ao se ler bastante ou ter que colocá-las como explicação por não precisar ou não utilizar-se delas, deve ser uma preocupação particular do pesquisador. E somente a ele deve dizer respeito.

"Mudança das relações de produção na Zona da Mata e suas consequências para os movimentos de população".

Entendendo que só a partir de uma análise a respeito das relações de produção poderia se compreender as causas e as consequências das migrações na região estudada, a autora resolveu desenvolver, em primeiro lugar, este assunto. E começa por fazer um balanço histórico da formação agrícola no Brasil.

Inicialmente, além dos comentários sobre a posse da terra, a autora lembra a adoção do sistema de morador e do trabalho escravo. Duas importantes formas através das quais as propriedades poderiam se autossustentarem nas épocas de crises ou concorrências de outras regiões produtoras. Afirma, com isso, que escravos e moradores também se autossustentavam através de lavouras de subsistência.

Um dos traços bastante elucidativos ressaltados pela autora foi o de que os movimentos da população se deram, inicialmente, da Zona da Mata em direção ao Agreste e ao Sertão. Sendo que esses movimentos coincidiam exatamente com as épocas de maior demanda do produto açucareiro. Em virtude da necessidade de animais de tração, cuja criação não se compatibilizava com a cana numa mesma propriedade. Sem dispor de elementos que corrobore ou não esta coincidência. Entretanto lhes achamos um pouco estranha, pelo fato de que ela se dá exatamente nas épocas de maior expansão do produto. Que, logicamente, há uma exigência quase obrigatória de maior número de braços. Assim, esta afirmativa carece, a nosso ver, de uma melhor reflexão. Pelo que se faz a seguinte indagação: teriam sido realmente os trabalhadores das fazendas canavieiras que se dirigiram para além das suas origens a fim de criar gado em terras não canavieiras? Ou teriam sido os novos trabalhadores recrutados como novos escravos adquiridos diretamente para aquele fim, sem serem retirados de suas atividades no engenho, quando obviamente dele mais se precisava? E isso nos parece confirmado quando observamos adiante a sua afirmação. Inclusive com muita propriedade, que a concentração fundiária teve um duplo efeito: o de conceder ao empreendimento agro-mercantil terras suficientes para seus objetivos e o de manter uma mão-de-obra sempre à sua disposição. Como se explicaria uma evasão de mão-de-obra nessas condições?

Outro ponto assinalado é o de que: "à medida que o Capitalismo Mercantil mundial evoluía para o industrial, também no nordeste houvera necessidade de aperfeiçoamento das técnicas produtivas, passando dos Banguês para os Engenhos Centrais e logo em seguida para as Usinas, a fim de que pudesse competir no mercado" (sic). Nesta última fase assinala ainda: "o trabalho escravo se tornaria inviável pelo fato de que a Usina imobilizaria grande quantidade de capital". Mas que, a abolição só viera acontecer por força de pressões externas exercidas pela Inglaterra. E internas, pelos inovadores sociais. Supomos que essa inviabilidade se refira aos preços dos escravos em relação aos investimentos da nova unidade de produção. De modo que o proprietário não pudesse arcar com as duas despesas ao mesmo tempo. Ou então, que a manutenção com os escravos superasse os custos de produção baseados em salários. O que se torna bastante discutível, ao que parece. Achamos que, se alguns dos proprietários da época já produziam através do sistema salarial, não era, com certeza, por bondade sua. Nem tampouco por reduzir os custos por meio desse procedimento. Mas talvez porque não dispunha de condições para investir em escravos. A não ser que ele próprio fosse um defensor da abolição. E tanto é verdade que o proprietário evitava remuneração aos seus trabalhadores. Mesmo para os considerados livres, Aqueles que lhes cedia partes das extensas áreas ociosas das suas terras para o cultivo de lavouras de subsistência. Tudo por conta de uns poucos dias de trabalho na lavoura canavieira. Razão pela qual, não podia remunerar os empregados, pois assim, estaria distribuindo uma grande parcela das suas rendas pessoais. Ele estaria, sim, apenas interessado em produzir mais. E agora com a obrigatoriedade de produzir com maior qualidade.

Aquele senhor de engenho não tinha a mesma mentalidade empresarial, tal como ocorre hoje com os tantos usineiros. Acreditamos que a substituição daquele fator tenha sido produto das idéias de alguns que já pensavam modernamente, e que tirariam algum proveito com a mudança do sistema.

Ao defender a tese de que a proletarização não decorreu do processo de extinção dos sítios, mas ao vínculo que a economia nordestina mantinha com o "Sistema Capitalista Internacional", na qualidade de "região periférica" de produtores marginais. O que não isenta, entretanto, do que chamou de "mudança horizontal" (extinção dos sítios pela expansão da cana-de-açúcar). Muito além das influências da Legislação Trabalhista.

Todavia, a Legislação que mais afetou o problema da eliminação dos sítios foi a criada recentemente, já no período evolucionário. Pois o proprietário não iria correr o risco de perder partes das suas terras para os moradores ocupantes dos sítios improdutivos para ele. E mesmo assim, este mesmo proprietário, somente pôde ter condições de desvincular-se dos sitiantes, pela obtenção dos altos créditos adquiridos ao Governo para aumentar a capacidade produtiva de suas unidades fabris. Além de poder também ampliar a sua área de cultivo por sobre aqueles sítios. Isto significa que, no momento que o Governo pensou proteger o trabalhador rural com a Legislação por um lado, o desprotegeu por outro, através dos vultosos créditos concedidos aos usineiros.

Note-se que nenhum proprietário jamais esteve interessado em desfazer-se de seus moradores, pois se tratava de uma mão-de-obra sempre disponível e muito barata. O que não ocorre com o "exército agrícola" atribuído pela autora, disponível nas cidades. Eles continuam sendo uma mão-de-obra barata, mas disponível não. É um mercado incerto, que adquire mais e primeiro aquele que oferecer maior remuneração. Há uma verdadeira batalha entre proprietários, empreiteiros ou administradores de engenhos em obter primeiro aquela mão-de-obra nos períodos de maiores demandas. Os usineiros de hoje não forçaram a desvinculação com seus moradores, pelo contrário, eles perderam esses moradores. Apenas os trabalhadores se transformaram em vítimas de outra vítima: o usineiro. Ambos, vítimas da transformação de um sistema. Por exemplo: o rompimento das relações diplomáticas dos E.U.A. com Cuba, como preconiza a autora. De modo que o Brasil, por forças externas, decidiu ampliar sua produção de açúcar no Nordeste pelo aumento das superfícies de cultivo. Por conta disso, os usineiros foram forçados a absorverem as áreas ocupadas pelos sítios. Mas antes construíram aglomerados residenciais nas áreas reservadas às pastagens para o criatório seu e de seus moradores. Área que recebia o nome de "Cercado" Estes moradores, porém, uma vez condicionados a viverem agora sob os custos de salários, preferiram residir nas cidades mais próximas para serem assalariados de quem lhes oferecessem mais. No caso, eles foram os únicos vitimados que sofreram as maiores consequências do processo.

Por outro lado, ao afirmar que a Legislação Trabalhista contribuiu para o aumento de salários, a autora que revela muito apego à teoria afastou-se, um pouco, da realidade. O que não se constitui um erro, pois, em muitos casos ocorreu exatamente o contrário. De fato, muitos trabalhadores, mesmo na condição de "diaristas". Ou seja, todos aqueles moradores a quem não se determinava uma tarefa (retângulos, quadrados ou triângulos medidos em "braças" de 2,20m) a que se dava o nome de "conta". Mas, ao contrário, uma quantidade de horas que devia trabalhar por cada dia. Para estes, os salários eram superiores ao mínimo estabelecido, ou o da legislação. Tudo porque eles eram mais esforçados, mais dinâmicos e, portanto, mais trabalhadores. Casos em que o valor monetário do salário era medido pela quantidade produtiva de cada um deles. A estes, quase sempre lhes era permitido trabalhar por "produção". E eles poderiam ganhar o triplo. Com o sistema padronizado de salários, isto só acontece em algumas poucas atividades (como o cortador de cana, por exemplo, se for bom ganha mais). E assim, para aqueles bons trabalhadores a quem qualquer proprietário daria tudo para tê-lo como seu morador, teve seus salários reduzidos por força única da Legislação.

Quanto à institucionalização do "sistema empreiteiro" que culminou com a Legislação Trabalhista, quando a autora afirma que se trata de uma decorrência do longo processo de proletarização, ponderamos em alguns pontos. Principalmente a partir de 1963 quando o trabalhador assalariado de tornou de "empreitada", semelhantes aos conhecidos "Bóias-frias". O fato é que o empreiteiro não surgiu em função da Legislação, pois ele sempre existiu, mesmo antes do processo de proletarização. A mudança dá-se porque o empreiteiro, atualmente, recruta mais trabalhadores no próprio local de origem. Ou seja, nas cidades vizinhas do que no Agreste ou no Sertão, como antigamente. O empreiteiro sempre foi uma figura necessária, na medida em que ele era a pessoa indicada para adquirir braços (trabalhadores ambulantes) para satisfazer as necessidades dos períodos de maior exigência no campo e na fábrica das usinas. Mas se os proprietários pudessem congregar moradores o suficiente em suas fazendas, o empreiteiro seria dispensável. E isto seria possível não fosse a impossibilidade de criar infraestrutura para absorver toda a mão-de-obra necessária.

Eles, os proprietários, gostariam de ter todo aquele "exército" como seus moradores. E com toda certeza os teriam se lhes sobrassem terras além das cultivadas pelos canaviais. Assim, o empreiteiro tornou-se desde há tempos, como a tábua de salvação, em preenchendo aquela lacuna. Hoje, possuem muitos moradores (apesar da extinção dos sítios, mas são poucos os que proíbem o morador de "botar" o seu roçado). Somente aqueles que são considerados um bom patrão ou um bom administrador de engenho ou fazenda. Os administradores mais disputados pelos usineiros são exatamente aqueles que conseguem ocupar todas as casas disponíveis nos engenhos com moradores, por ser também um fator de organização das fazendas e de menores custos na produção. Além disso, os "trabalhadores de fora" são mal vistos pelos proprietários, pelos empregados e pelos próprios moradores. Se, com a evolução tecnológica que se observa aqui no Nordeste, pudessem os proprietários prescindir dos sítios ("grotas"), certamente que o velho sistema morador-sitiante ressurgiria. Não fossem, agora sim, as barreiras impostas pela Legislação. Mesmo assim, o sistema de empreiteiros não se extinguiria, pois não nasceu em função dela.

"Migrações internas e força de trabalho em Ribeirão"

Para o desenvolvimento deste capítulo a autora o subdividiu em dois subcapítulos: i) integração na atividade produtiva e distribuição espacial e, ii) caracterização dos principais movimentos migratórios.

No primeiro item, um dos aspectos interessantes foi o da pesquisa a respeito das ocupações e da origem dos pais dos chefes de família entrevistados. Demonstrando serem na sua maioria do Agreste e terem se dedicado à agricultura e à pecuária no seu lugar de origem. O que significa que nem todos os migrantes procedentes do Agreste ou do Sertão, o fizeram – ou ainda o fazem – apenas para "ganhar dinheiro" no período da safra e em seguida retornarem. Mesmo assim demonstra a autora que os descendentes daquelas regiões migram mais "interpropriedades" que os nativos dos canaviais.

No segundo, utilizando-se da pesquisa amostral da "história de vida" mais que do questionário, a autora procurou localizar os tipos de migrações de Ribeirão. E assim foi que pode demonstrar que tem havido uma diminuição do contingente procedente do Agreste para a Zona da Mata. Ao que ela atribui ao "exército agrícola" disponível nas cidades atualmente em função da expulsão do campo (a esta população denominou de "urbana"). A nosso ver, este fenômeno não deve ser encarado apenas por fatores existentes na área de destino (Ribeirão), mas também no local de origem (Agreste ou Sertão). Ou ainda, nas novas áreas de destino (Centro-Sul e Sudeste, por exemplo). Pode ser que este novo destino esteja oferecendo melhores oportunidades que o antigo. Note-se que as migrações agrestinas e sertanejas apesar de terem sofrido redução, ainda assim continua muito intensa. Por outro lado, suponhamos que algum fator tenha contribuído para a retenção dos migrantes em seu lugar de origem, como por exemplo (hipótese), as fontes de trabalho criadas ultimamente pelo Governo nos períodos de estiagem mais longos. Assim, achamos a dedução um tanto ou quanto apressada.

As versões expressas pela autora para explicação das migrações interpropriedades, refletem apenas uma parte do problema. Explica que, para o proprietário os moradores fichados mudam-se com o objetivo de receberem indenizações e até mesmo por instinto. E onde, para o trabalhador a causa é a existência do empreiteiro, que ilude e vicia, com promessa de maiores salários. Deixando de lado o fator estrutural, ou seja, a própria evolução do sistema usineiro conforme indica a autora e que sem dúvida é onde estar a gênese do fenômeno lembramos outros possíveis motivos. Por exemplo: existem determinados administradores de engenhos que ao serem transferidos para outros, por motivos diversos, os moradores de quem ele gostava leva-os todos consigo. A recíproca também é verdadeira, determinados moradores se adaptam tanto com certos administradores que sempre os segue quando estes são transferidos. Assim, aonde aquele empregado chega o seu novo engenho, mesmo estando vazio, é de pronto ocupado. Isto também ocorre com alguns patrões. Existem os "ruins", a quem ninguém quer ser morador dele, motivo que leva as casas ficarem sempre vazias. E existem os "bons", que são de muito procurados. O que contribui para que eles possam selecionar apenas os também "bons" moradores.

Assim, Apesar das Leis, da automação, e porque não dizer, da "desumanização" e "desruralização" conforme Mário Lacerda de Melo (1975), ainda funcionam os laços de amizades, os valores morais e o caráter, no seio de cada uma daquelas comunidades. Achamos que estes aspectos também devem ser levados em consideração ao se querer explicar as "migrações interpropriedades".

Conclusão

Ao apresentar algumas ressalvas no transcorrer desta resenha sobre a Dissertação da autora sobre o problema das migrações no município de Ribeirão, não o fizemos com o fim precípuo de desvalorizar a importância que o trabalho oferece como objeto científico. Mas como uma tentativa de contribuir ainda mais para o que a própria autora citou na sua conclusão: "não como um trabalho final, uma pesquisa definitiva, sobre o assunto, mas a fim de descobrir novos horizontes que possam ser utilizados em pesquisas posteriores". Além de servir como uma espécie de complemento em algumas deduções, mas nunca por incapacidade ou pobreza de reflexão da autora. Mas talvez, por uma falta de convivência sua no contexto da problemática social da região.

De modo que reconhecemos plenamente a importância do trabalho, não só por ter se constituído num instrumento de análise e de reflexão por parte de quem o lê, como também dos conhecimentos que ele oferece além das determinadas abordagens que ainda não tinham sido lembradas em pesquisas outras. Como, por exemplo, as migrações interpropriedades, ou ainda, a fixação do agrestino na Zona da Mata, dentre vários outros. Demonstrando assim uma grande acuidade científica em sua pesquisa e revelando-se numa grande promessa para a divulgação e ensinamentos sobre os problemas crônicos que corroem a sociedade agrícola brasileira e particularmente a nordestina.

(1) Crítica sobre a Dissertação de Mestrado supra para as Disciplinas: "Geografia Agrária" e "Tópicos Especiais em Geografia Agrária do Nordeste", do Curso de Mestrado em Geografia da UFPE, em 1976.

*É Geógrafo Doutor em Organização do Espaço e Mestre em Estudos Ambientais. Atuante no Zoneamento e na Análise Geofitoambiental para o Planejamento Territorial.

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