FACULDADES INTEGRADAS CURITIBA



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Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em

Direito Médico

Disciplina

O Direito Civil e a Responsabilidade Civil na Área da Saúde - I

17 e 18 de abril de 2010

Professor: Dr. Clayton Reis

Ex-Juiz de Direito do Estado do Paraná;

Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR);

Mestre e Doutora em Direito das Rel. Sociais com Tese defendida na área da Resp. Médica;

Professor Universitário;

Autor de obras na área do Direito Médico.

MATERIAL DIDÁTICO

CENBRAP – CENTRO BRASILEIRO DE PÓS-GRADUAÇÕES

Curso de Atualização em Direito Médico

Disciplina: Responsabilidade Civil na Área da Saúde – Danos Morais e Materiais - Prof. Dr. Clayton Reis.

Goiânia/GO

2010

PROGRAMA DO CURSO EM DIREITO MÉDICO

EMENTA.

1. Históricos e fundamentos da Responsabilidade Civil. 2. Conteúdo, noção e conceito sobre Responsabilidade Civil. 3. A conduta humana como fundamento da Responsabilidade Civil. 4. Os fundamentos jurídicos da culpa. 5. Responsabilidade Civil do Médico. 6. A teoria do risco na perspectiva do Código Civil de 2002. 7. Do dano e sua reparação.

OBJETIVOS DA DISCIPLINA

Propiciar aos cursistas o conhecimento a respeito dos fundamentos, origens e elementos essenciais acerca da responsabilidade civil. O estudo deverá abranger com destaque, as questões alusivas aos princípios que norteiam a responsabilidade civil dos profissionais na área da saúde, em particular os médicos. Nesse caso, serão abordadas as questões alusivas à responsabilidade civil desses profissionais com destaque em relação as recentes decisões prolatadas pelos Tribunais. O estudo deverá assinalar os principais aspectos legais a respeito do tema, bem como, a evolução doutrinária, legislativa e jurisprudencial sobre a responsabilidade dos médicos. Serão igualmente abordados os novos parâmetros e discussões alusivas à reparação dos danos materiais e morais.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO.

O conteúdo programático será apresentado através de módulos diversificados, de acordo com o esquema abaixo relacionado nos Módulos I, II, III, IV, V, VI e VII:

MÓDULO DIDÁTICO I

HISTÓRICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL.

1.1. Os primeiros conceitos de Responsabilidade Civil. 1.2. Estudos do Código de Manu, Hamurabi, Código de Justiniano e Lei das XII Tábuas. 1.3. A construção da Moderna Teoria da Responsabilidade Civil em face dos Códigos antigos.

MÓDULO DIDÁTICO II

CONTEÚDO, NOÇÃO E CONCEITO SOBRE RESPONSABILIDADE CIVIL.

2.1. Conceito de responsabilidade civil. 2.2. Responsabilidade civil e conceito de ato ilícito. 2.3. Responsabilidade civil e o Neminem Laedere e as cláusulas gerais. 2.4. O termo Responsabilidade Civil e suas significações.

MÓDULO DIDÁTICO III

A CONDUTA HUMANA COMO FUNDAMENTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL.

3.1. A violação do direito prescrito pelo artigo 186 do CC. 3.2. O Bônus pater familiae do direito romano. 3.3. O Dever-Ser segundo a Teoria das Normas de Hans Kelsen. 3.4. As normas de Direito e o proceder das pessoas. 3.5. Relevância jurídica da omissão. 3.6. Fato próprio, de outrem e da coisa.

MÓDULO DIDÁTICO IV

OS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA CULPA.

4.1. Definição e conceito de culpa. 4.2. Dolo e culpa. 4.3. Modalidades de culpas. 4.4. Culpa contratual e extracontratual. 4.5. Culpa concorrente ou concorrência de culpas. 4.6. Culpa solidária e culpa subsidiária. 4.7. Culpa grave, leve e levíssima (graus de culpa). 4.8. Prova da culpa.

MÓDULO DIDÁTICO V.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO.

6.1. Fundamentos Jurídicos da Responsabilidade do Médico. 6.2. O Erro Médico. 6.3. Porque os médicos erram? 6.4. Ato médico: obrigação de meio ou de resultado? 6.5. O risco de dano do ato médico. 6.6. A natureza jurídica do contrato médico. 6.7. Responsabilidade penal e civil do médico. 6.8. A teoria do consentimento informado. 6.9. A responsabilidade Civil dos Hospitais e Planos de Saúde. 6.10. A orientação predominante das decisões dos Tribunais. 6.11. Estudos de casos concretos.

MÓDULO DIDÁTICO VI.

A TEORIA DO RISCO NA PERSPECTIVA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.

5.1. Modalidade de riscos. 5.2. O risco-proveito. 5.3. O risco profissional. 5.4. O risco excepcional. 5.5. O risco criado. 5.6. O risco integral. 5.7. Críticas à teoria do risco e o posicionamento do nosso direito positivo.

MÓDULO DIDÁTICO VII – TEXTO COMPLEMENTAR.

DO DANO E SUA REPARAÇÃO.

5.1. Modos de reparação. 5.2. O dever de indenizar. 5.3. O dano emergente e o lucro cessante. 5.4. Dano patrimonial direto e indireto. 5.5. Direito de personalidade. 5.6. Dano ao corpo. 5.7. Dano estético. 5.8. Lesão à integridade intelectual e moral. 5.9. Dano Moral. Conceitos, natureza jurídica. indenização do Dano Moral. Orientação da doutrina e da jurisprudência brasileira

QUESTÕES PARA DEBATES

1. Por que os médicos erram? Ato médico: obrigação de meios ou de resultados? 2. Uma questão crucial: como avaliar os deveres de conduta do médico? 3. Como proceder diante da alegação de erro médico? 4. Quem salva vidas, respeita a vida.

BIBLIOGRAFIA.

ANDRADE, André Gustavo Corrêa de, Dano Moral e Indenização Punitiva, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2005.

BITTAR, Carlos Alberto, Reparação Civil por Dano Moral, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, 1993.

BUARQUE, Sidney Hartung, Da Demanda por Dano Moral na Inexecução das Obrigações, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2005.

CAHALI, Yussef Said, Dano Moral, 3ª Edição, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, 2005.

CARNEIRO, Maria Francisca, Avaliação do Dano Moral e Discurso Jurídico, Porto Alegre/Rio Grande do Sul, 1998.

CASILLO, João, Dano à Pessoa e sua Indenização, 2ª Edição, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, 1994.

CAVALIERI FILHO, Sérgio, Programa de Responsabilidade Civil, São Paulo/SP, Editora Atlas, 2007.

CHAVES, Antônio, Tratado de Direito Civil – Responsabilidade Civil, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, 1985.

CÓDIGO de Hamurabi – Código de Manu – Lei das XII Tábuas, 1ª Edição, Bauru/São Paulo, EDIPRO – Edições Profissionais Ltda., 1994.

DIAS, José de Aguiar, Da Responsabilidade Civil, XI edição, São Paulo, Editora Renovar, 2007.

DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil – Responsabilidade Civil 21ª edição, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 2007.

DIREITO/CAVALIERI FILHO, Carlos Alberto Menezes e Sérgio, Comentários ao Novo Código Civil – Da Responsabilidade Civil. Das Preferências e Privilégios Creditórios, vol. XIII, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2004.

FISCHER, Hans Albrecht, A reparação dos Danos no Direito Civil, São Paulo/SP, Saraiva Editores, 1938.

GAGLIANO/PAMPLONA FILHO, Pablo Stolze e Rodolfo, Novo Curso de Direito Civil – Responsabilidade Civil, vol. III, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 2004.

GOMES, José Jairo, Responsabilidade Civil e Eticidade, Belo Horizonte, Editora Del Rey, 2005.

GIOSTRI, Hildegard Taggesell, Erro Médico À Luz da Jurisprudência Comentada, 2ª. Edição, Curitiba, Editora Juruá, 2005.

GIOSTRI, Hildegard Taggesell, Responsabilidade Médica – As obrigações de meio e de resultado: avaliação, uso e adequação, Curitiba, Editora Juruá, 2004.

GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade Civil, 5ª Edição, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 2003.

KFOURI NETO, Miguel, Responsabilidade Civil do Médico, 5ª. edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2003.

KFOURI NETO, Miguel, Culpa Médica e Ônus da Prova, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2002.

LISBOA, Roberto Senise, Manual de Direito Civil, Obrigações e Responsabilidade Civil, 4ª. edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2009.

MORAES, Maria Celina Bodin de, Danos à Pessoa Humana – Uma leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais, Rio de Janeiro, Editora Renovar, 2003.

NUNES/ CALDEIRA, Luiz Antônio Rizzatto, Mirella D’Angelo, Dano Moral e sua Interpretação Jurisprudencial, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 1999.

OLIVEIRA, Marcius Geraldo Porto de, Dano Moral Proteção Jurídica da Consciência, Leme/SP, LED- Editora de Direito Ltda, 1999.

OLTRAMARI, Vitor Ugo, O dano Moral na Ruptura da Sociedade Conjugal, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2005.

PEREIRA, Caio Mário da Silva, Contratos - Responsabilidade Civil, vol. III, Rio de Janeiro/RJ, Editora Forense S.A, 2004.

PINTO, Carlos Alberto da Mota, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª Edição Actualizada, Coimbra/Portugal, Coimbra Editora, 1996.

PRADO, Luiz Regis, Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, 2001.

REPRESAS/MESA, Felix A. Trigo e Marcelo J. Lopes, Tratado de la Responsabilidad Civil, Buenos Aires, Editorial La Ley, 2004.

REIS, Clayton, Avaliação do Dano Moral, 2ª Edição, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1998.

REIS, Clayton, Dano Moral, 5a ed., Rio de Janeiro, Editora Forense, 2010.

REIS, Clayton, Novos Rumos da Indenização dos Danos Morais, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2002.

REIS, Clayton, Temas da Atualidade – Dano Moral, obra coordenada por Eduardo de Oliveira Leite, sob o tema, “Sentido dos Danos Morais”, Rio de Janeiro/RJ, Editora Forense,

2002.

RIZZARDO, Arnaldo, Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2005.

RODRIGUES, Silvio, Direito Civil Responsabilidade Civil, 14ª Edição, São Paulo/SP, Editora Saraiva S.A 2002.

SANTOS, Antônio Jeová, Dano Moral Indenizável, São Paulo/SP, Editora Lejus, 1997.

SANTOS, J.M. de Carvalho, Código Civil Interpretado, vol. III e XX, 5ª Edição, São Paulo/Livraria Freitas Bastos, 1952.

SEVERO, Sérgio, Os Danos Extrapatrimoniais São Paulo/SP, Editora Saraiva S. A, 1996.

SHARP JUNIOR, Ronald A., Dano Moral, Rio de Janeiro/RJ, Editora Destaque, 1998.

SILVA, Américo Luís Martins da, Dano Moral e a sua Reparação Civil, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, 1999.

SCLIAR, Moacyr, Enigmas da Culpa. Rio de Janeiro, Editora Objetiva, 2007.

STOCO, Rui, Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, 2ª Edição, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, 1995.

STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil, 7ª edição, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, 2007.

TEPEDINO, Gustavo (Coordenador) A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro/RJ, Editora Renovar, 2002.

THEODORO JUNIOR, Humberto, Responsabilidade Civil – Doutrina e Jurisprudência, 4ª Edição, Rio de Janeiro/RJ, Editora Aide, 1977.

VALLE, Christiano Almeida do, Dano Moral – Doutrina, Modelos e Jurisprudência, Rio de Janeiro/RJ, Editora Aide, 1994.

VENOSA, Silvio de Salvo, Direito Civil – Responsabilidade Civil, vol. IV, São Paulo/SP, Editora Atlas, 2003.

Prof. Dr. CLAYTON REIS

Claytonreis2003@.br

CENBRAP – CENTRO EDUCACIONAL BRASILEIRO DE PÓS-GRADUAÇÕES

Curso de atualização em Responsabilidade Civil Médica.

Prof. Dr. Clayton Reis.

Goiânia/GO

2010

MÓDULO DIDÁTICO I

HISTÓRICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL.

1.1. Os primeiros conceitos de Responsabilidade Civil. 1.2. Estudos do Código de Manu, Hamurabi, Código de Justiniano e Lei das XII Tábuas. 1.3. A construção da Moderna Teoria da Responsabilidade Civil em face dos Códigos antigos.

1. OS PRIMEIROS CONCEITOS SOBRE A TEORIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL. A reação Humana em face do dano. Todo e qualquer dano causado ao homem primitivo sempre acarretava o desencadeamento de um espírito de vingança na pessoa da vítima. Tratava-se de um natural sentimento revolta em face da dor sofrida pela agressão de terceiro. Segundo RUDOLFO VON IHERING[1],

“A dor governa soberanamente o sentimento jurídico do homem primitivo. A justiça é apreciada não segundo sua causa, senão segundo seu efeito, no segundo as circunstâncias relativas à pessoa do autor senão desde o ângulo da vítima. A paixão impõe a expiação ainda que seja do inocente.”

O sentimento passional dominante faz o lesionado perder de vista a culpabilidade. Interessa mais ao lesionado obter um castigo no ofensor, em virtude da predominância do seu espírito vingativo, do que obter a reparação pela agressão sofrida. Nesse período da histórica, pode-se afirmar que a reparação do dano se encontrava à margem do processo da responsabilidade civil.

Na realidade o que era afetado era substancialmente o patrimônio pessoal da vítima e a esta interessava apenas não o seu ressarcimento, mas tão somente o seu sentimento pessoal. É o império da força. A lei de Talião – olho por olho, dente por dente. A vingança era, dessa forma, o sentimento mais repreensivo da injustiça.

Da vingança à composição. A partir de um determinado período da história, o sentimento passional passa a ser mais brando – a reflexão sobre o instinto selvagem da vítima poderia ser aplacada mediante a entrega a esta de uma soma em dinheiro capaz de aplacar o seu espírito de vingança. Era uma forma de o lesionador evitar a ofensa da vítima sobre o seu próprio corpo e, o montante pago pelo ofensor era considerado como sendo uma pena pela produção do evento lesivo.

Através da consolidação política do Estado, a autoridade fixou valores correspondente aos danos, em que o ofensor era obrigado a pagar à vítima à título de reparação do prejuízo sofrido.

FUNÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL. Para SAVATIER - obrigação de reparar o prejuízo causado a outra pessoa pôr fato próprio, de pessoa ou coisa que dela dependa. Na realidade, quem infringe um dever jurídico lato sensu, causando dano a outrem fica obrigado a ressarcir o prejuízo decorrente. A regra principal assenta-se no vetusto princípio romano ALTERUM NON LAEDERE/NEMINEM LAEDERE - a outro não prejudicar/a ninguém ofender.

Para Judith Martins-Costa[2], “versar a responsabilidade civil significa ingressar num vasto e fascinante universo, talvez o mais fascinante de todo o Direito Civil, no qual se emaranham aspectos do mais profundo significado é tico atinente à própria condição humana, com aspectos práticos que perfazem imensa gama das questões cotidianamente tratadas na vida do foro”.

Segundo preleciona Rui Stoco[3], “Pode-se dizer que a responsabilidade civil traduz a obrigação da pessoa física ou jurídica ofensora de reparar o dano causado por conduta que viola um dever jurídico preexistente de não lesionar – neminem laedere – implícito ou expresso na lei”.

Segundo ainda preleciona Judith Martins-Costa[4], “o termo RESP0NSABILIDADE CIVIL recobre duas formas principais, a reparação e a indenização. Segundo uma fórmula habitualmente utilizada, a função da responsabilidade é a de recolocar a vítima do dano na situação que estaria se o ato danoso não tivesse sido produzido”.

Essa fórmula traduz uma das tantas ficções sobre as quais o Direito se apóia, pois, existem danos verdadeiramente irreparáveis, embora indenizáveis. O próprio termo INDENIZAÇÃO não deve ser tomado, rigorosamente, em seu sentido etimológico, isto é, o tornar in demne, sem dano. O seu significado é, pois, aproximativo ou conjectural, expressando-se pela restituição in natura do bem danificado, ou pela dação do seu equivalente em dinheiro.

A restauração in natura dita específica significa a reposição das coisas ao estado anterior do dano; a indenização em sentido estrito é a restituição pelo equivalente pecuniário. A idéia de equivalência se encontra presente no Código Civil, consoante se deflui do mens legis contido no artigo.

Nessa ótica, “a prática também demonstra que atualmente, quantitativa e qualitativamente, é a indenização em dinheiro, e não a restituição in natura que está a ocupar o papel central nas modalidades de reparação” aponta a autora citada[5].

CONCEITO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. “Em recente obra, na França, Philippe Le Tourneau e Loic Cadiet expõem que a responsabilidade é a obrigação de reparar o prejuízo causado a outrem por um ato contrário à ordem jurídica. Ela procura apagar as conseqüências do fato perturbador desta desordem”, ensinam Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieiri Filho[6].

Ainda, no dizer de Rui Stoco[7], “aqueles que vivem em sociedade e aceitaram as regras sociais, as obrigações anímicas impostas pela moral e pela ética, enquanto compromissos supra legais, e pelo regramento institucional imposto pelo tegumento social, expresso no Direito Positivo, assumem o dever de não ofender, nem de lesar, causar dano ou prejuízo sem que tenham justificativa ou eximente, expressamente prevista na legislação de regência”.

A responsabilidade é, dessa forma, uma atividade da vida social, porque ela é o efeito da causa decorrente do comportamento da pessoa no meio social. Assim, não se poderá entender responsabilidade sem ação ou omissão (AQUELE QUE POR AÇÃO OU OMISSÃO) da pessoa humana, que agindo em desconformidade com os regramentos prescritos pela ordem social (VIOLAR DIREITO), viola a esfera material ou imaterial de outrem, lesionando-o em seus direitos tutelados pela ordem jurídica (E CAUSAR DANO).

NOÇÃO DE ANTIJURIDICIDADE. Sempre que alguém age em desconformidade com uma determinada regra, se manifesta uma infração - exemplo: o descumprimento de uma obrigação da fazer culposa. Nesse caso, caberão perdas e danos, consoante prescrição contida no artigo 389 e 402 do CCB.

O ato ilícito subjetivo sempre é conseqüência de ato voluntário - ação humana em que ocorreu violação de uma conduta imposta pela ordem jurídica e social – VIOLAR DIREITO – art. 186 do CCB.

ART. 186 CC: “AQUELE QUE, POR AÇÃO OU OMISSÃO, VOLUNTÁRIA, NEGLIGÊNCIA OU IMPRUDÊNCIA VIOLAR DIREITO, E CAUSAR DANO A OUTREM, AINDA QUE EXCLUSIVAMENTE MORAL, COMETE ATO ILICITO”.

O MENS LEGISLATORI foi direcionado na necessidade do cumprimento de um dever de agir, de forma a NÃO VIOLAR DIREITO, ou seja, agir de conformidade com o ordenamento legal.

Art. 42. “Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça (A VIOLAÇÃO DESTE DIREITO IMPLICA NO COMETIMENTO DE ATO ILÍCITO).

Segundo o valioso magistério de Rui Stoco[8] poderemos concluir: “A responsabilidade é, portanto, resultado da ação pela qual o homem expressa o seu comportamento, em face desse dever ou obrigação. Se atua na forma indicada pelos cânones, não há vantagem, porque supérfluo em indagar da responsabilidade daí decorrente”.

Nessa linha de raciocínio, o ato ilícito é fonte de obrigação - quem causa dano tem o dever de indenizar (art. 186, c/c o caput do art. 927 do CCB) - é a superação da fase primitiva da vingança – lei de Talião: “olho por olho, dente por dente”. Iniciou a partir da LEX AQUILIA, com fundamento na regra DAMMUN INJURIA DATUM, conseqüência de quem causasse dano ao patrimônio de alguém.

Na época romana a Lex Aquilia introduziu o conceito da culpa - in lex Aquilia et levíssima culpa venit – na Lei Aquiliana se cogita da culpa levíssima. Todavia, os romanos não desenvolveram uma teoria geral de responsabilidade. Essa regra básica foi introduzida através do artigo 1.382 do Código Civil francês.

Essa noção de antijuridicidade implica em um conceito de culpa sctricto sensu, ou seja, se encontra associada à idéia de uma falta de conduta desejada no agente – um desvio de comportamento. Essas regras de conduta humana se encontram presentes no Direito comparado:

Segundo os italianos – un diffeto de la inteligentia. Interpretação errônea do fato na ordem social, em decorrência da ausência de correta capacidade de discernimento.

Art. 483, 1 do CCPortuguês: “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.

Art. 483, 2 do CCPortuguês: “só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa dos casos especificados na

lei.”

Art. 1.902 do CCEspanhol: “El que por acción u omisión causa daño a otro interviniendo culpa o negligencia, está obligado a reparar el daño causado”.

Art. 2043 do CC Italiano: “(Risarcimento per fatto illecito). Qualunque fatto doloso o colposo, Che cagiona ad altri um danno ingiusto (1438), obbliga colui che ha commesso Il fatto a risarcire il danno (2947, 185, 198 c.p.)”.

Art. 1136 do CC Peruano: “Cualquiera que por sus hechos, descuido o imprudência, cause dano a outro, está obligado a indemnizarlo”.

NOTA DO PROFESSOR: O que nos chama a atenção nos textos apontados dos Códigos Civis alienígenas é o fato da NEGLIGÊNCIA AO DEVER DE CONDUTA DO AGENTE. Isto significa que o DESCUIDO, IMPRUDÊNCIA OU A FALTA DE CONDUTA NECESSÁRIA, que ocasiona dano a outrem, é causa fundamental de indenização.

O Código Italiano é mais preciso ao determinar que o ato que ocasiona o dano a outrem, terá que ser necessariamente decorrente de um prejuízo INJUSTO. Portanto, é imprescindível que a lesão seja resultado da ação contrária à lei. Isto porque, se o dano for decorrente de legítima defesa ou exercício regular de um direito reconhecido (art. 188, I CC) não haverá ilicitude.

Assim, a questão da culpa está íntimamente asociada à questão da previsibilidade – culpa stricto sensu. Segundo anota Sérgio Cavalieiri Filho[9], “Não sendo previsto, o resultado terá que, ser previsible. Este é o limite mínimo da culpa – a previsivilidade, entendo-se como tal a possibilidade de previsto. Embora não previsto, não antevisto, não representa mentalmente, o resultado poderia ter sido previsto e, consequentemenete, evitado”.

Por essa razão Carlos Roberto Gonçalves[10] leciona:

“É consenso geral que não se pode prescindir, para a correta conceituação de culpa, dos elementos PREVISIBILIDADE E COMPORTAMENTO DO HOMO MEDIUS. Só pode, com efeito, cogitar de culpa quando o evento é previsível. Se, ao contrário é imprevisível, não há cogitar de culpa. O artigo 159 do CCB pressupõe sempre a existência de culpa lato sensu, que abrange o dolo (pleno conhecimento do mal e perfeita intenção de praticá-lo), e a culpa sctrito sensu ou aquiliana (violação de um dever que o agente podia conhecer e observar, segundo os padrões de comportamento médio)”.

1.2. ESTUDOS DOS CÓDIGOS DE MANU – HAMURABI – JUSTINIANO – LEI DAS XII TÁBUAS. Raízes da Responsabilidade Civil. A idéia de reparação a um dano sempre foi inerente ao ser humano. No Código de HAMURABI encontra-se presente o sentido de punir o ofensor, instituindo contra o causador do dano um sofrimento igual. Na mesma linha de conduta o Código de MANU e o Código HEBREU sinalizam um sentido punitivo.

A CONDUTA DA PESSOA, sempre foi a questio facti do ordenamento jurídico – exatamente porque o que se mede no ser humano é a sua intencionalidade ou a sua ausência de capacidade de prever os acontecimentos dos fatos que ocorrem na vida humana. Quem não mede seu comportamento não se encontra preparado para viver em sociedade, posto que este modus vivendi impõe ao agente medir suas ações em face dos direitos do próximo – NEMINEM LAEDERE.

Na civilização helênica se encontra o conceito de reparação do dano causado, com a idéia estritamente objetiva. Mas, foi o direito romano que, certamente, outorgou conceitos mais precisos sobre responsabilidade civil.

Todavia, não obstante esta realidade, os romanos não construíram uma teoria sistematizada sobre RESPONSABILIDADE CIVIL.

O Código de HAMURABI, nos seus Parágrafos 196, 200, 204 e 205, a título de ilustração proclamava:

• Par. 196. “Se um AWILUM destruiu o olho de um outro AWILUM: destruirão seu olho”.



• Par. 200. “Se um AWILUM arrancou um dente de um AWILUM igual a ele: arrancarão o seu dente”.

• Par. 204. “Se um homem vulgar agrediu a face de outro que lhe é igual, pesará dez siclos de prata”.

• Par. 205. “Se um escravo de um homem agrediu a face do filho de um homem; cortarão sua orelha”.

• Par. 282. “Se um escravo disse ao seu proprietário: “Tu não és meu senhor”, ele comprovará que é o seu escravo e o seu proprietário cortar-lhe-á a orelha”.

“Nos dias a virem por todo tempo futuro, possa o rei que estiver no trono observar as palavras de justiça que eu tracei em meu monumento”. (Texto inscrito no final do Código, declarado pelo Rei Hamurabi).

CÓDIGO DE HAMURABI – Museu do Louvre PARIS. Compunha-se de 282 artigos, 33 dos quais se perderam devido à deterioração da coluna de pedra basáltica onde estavam inscritos em caracteres cuneiformes gravados em uma estela de diorito negro com 2,25 m de altura, 1,60 de circunferência e 2,00 m de base, achada na cidade de Susa, na Pérsia, por uma expedição francesa chefiada pelo arqueólogo Jaques Morgan.

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A parte superior apresenta um baixo-relevo, que mostra o deus Sol (Shamash), protetor da justiça, entregando as tábuas da lei a Hamurabi, seguida de um Proêmio que justificava a origem divina daquelas leis; na parte inferior, as 46 colunas dos 18 capítulos, 282 artigos com 3.600 linhas.

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A pedra basáltica contendo o Código de Hamurabi, foi encontrada em estado desgastado em virtude do tempo. O rei Hamurabi (2067-2025 a.C.) reinou o império Babilônico, de forma despótica e centralizada, religiosa, lingüística e juridicamente.

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Álvaro Villaça de Azevedo, a esse respeito, proclama, “embora não eliminando o caráter de vingança privada, trouxe esta lei um sentido de igualdade de direitos, que se representava pelo enunciado – OLHO POR OLHO DENTE POR DENTE”.

A idéia primitiva de punição violenta foi inclusive inserida na Bíblia. Assim, já no Antigo Testamento, em Levíticos, 24, 17-20, observa-se a seguinte orientação de Deus aos Israelistas, por intermédio de Moisés, aplicável aos nacionais e aos estrangeiros:

“QUEM MATAR ALGUÉM SERÁ MORTO; MAS QUEM MATAR UM ANIMAL O RESTITUIRÁ; IGUAL POR IGUAL; SE ALGUÉM CAUSAR DEFEITO EM SEU PRÓXIMO COMO ELE FEZ, ASSIM SE LHE SERÁ FEITO; FRATURA POR FRATURA, OLHO POR OLHO, DENTE POR DENTE; COMO SE ELE TIVER DESFIGURADO A ALGUM HOMEM, ASSIM SE LHE FARÁ”.

A evolução do conceito de vingança foi lenta e gradual. Na realidade, representou gradual processo de conscientização das ações praticadas pela pessoa humana no curso da história, em que o Cristianismo exerceu importantíssimo papel no abrandamento dos sentimentos de vingança inatos nas pessoas.

Nesse sentido, Mazeaud e André Tunc proclamavam que,“Desaparece o orgulho primeiro do homem, seu sentido brutal de honra se suaviza; a vítima pensa que, em lugar de vingar-se na pessoa de seu adversário, será mais proveitoso cobrar parte de seu patrimônio”.

É O OURO SUBSTITUINDO O SANGUE – frase que se tornou célebre e que, se iniciou na Lei das XII Tábuas.

Na LEX TABULARUM se encontra vestígios de vingança, com a marca do poder público, objetivando disciplinar a referida vingança (Tabula VIII, item II: SI MEMBRUM RUPSIT, NI CUM EO PACIT, TALIO EST) – nessa frase não há diferença entre a responsabilidade civil e penal.

Segundo preleciona CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA[11] “aí se apresenta uma composição voluntária inserida na solução transacional. A vítima, ao invés de imposição de igual sofrimento ao agente, recebia, a título de poena, uma importância em dinheiro ou outros bens”.

Dessa forma, no transcurso do tempo, a reparação passa a consistir em uma importância de dinheiro – quando a punição do corpo assume um caráter de indenização.

Todavia, os romanos não conseguiram separar a idéia de punição da de reparação. O que estava na mira dos jurisconsultos assemelhava-se o que se encontrava no direito germânico consistente na vingança de sangue (WEHRGELD), movido pelo sentimento de solidariedade social e familiar.

Na realidade, seu maior valor consiste em substituir as multas fixas por uma pena proporcional ao dano causado em face do DAMNUN INIURIA DATUM, que consistia em dano a qualquer coisa alheia, animada ou inanimada.

Fustel de Coulanges, a esse respeito, assinala que, “a idéia de culpa ou de ação intencional pela qual se experimenta uma lesão, leva ao desprezo da pena de forma quase automática, DANO PRODUZIDO = PENA APLICADA, verdadeiro remédio privado, desprovido de caracteres cruentos”.

Dessa forma, poderemos concluir que ao direito romano interessava, primitivamente, apurar a existência do damnum, ou seja, o dano que não causava prejuízo não dava lugar à indenização.

Todavia, se o dano fosse causado por um louco ou menor, foi necessário introduzir no conceito de responsabilidade um novo fator – a palavra iniuria tornou-se sinônimo de culpa.

Não obstante a controvérsia em relação ao fato de que na Lex Aquilia não se inseria o elemento anímico da culpa, as Institutas de Gaio (GAIUS, INSTITUTIONES, III, P. 211) apontavam:

“IS INIURIA AUTEM OCCIDERE INTELLEGITUR CUIUS DOLO AUT CULPA OCCIDERIT; NEC ULLA LEGE DAMNUM QUOD SINE INIURIA DATUR REPREHENDITUR; ITAQUE IMPUNITUS EST QUI CULPA AUT DOLO MALU CASU QUODAM DAMNUM COMMMITTIT”

TRADUÇÃO DO TEXTO ANTERIOR:

“MATAR INJUSTAMENTE SIGNIFICA MATAR COM DOLO OU CULPA; NENHUMA OUTRA LEI PUNE O DANO CAUSADO SEM INJUSTIÇA; RESTA ENTÃO SEM PUNIÇÃO QUEM, SEM CULPA NEM DOLO MAU, COMETE UM DANO”.

Destacando a parte final do texto –“IMPUNITUS EST QUI SINE CULPA ET DOLO MALU CASU QUODAM DAMNUM COMMITTIT” – significa que o elemento subjetivo da culpa foi introduzido contra o objetivismo do direito primitivo.

Assim, a idéia de culpa foi Introduzida no direito costumeiro, a partir do direito romano, e ingressou no direito moderno através de dois grandes civilistas nas pessoas de DOMAT E POTHIER (Les Loix Civiles Dans leur Ordre Naturel, Paris, 1776, Livro II, Tit. VIII, Sect. IV, p. 153), indicados por Napoleão Bonaparte para propor o monumental Código Civil Francês .

Considerando a sua influência na construção da doutrina francesa, pode-se dizer que a teoria da responsabilidade civil nos Códigos modernos deve muito ao Código de Napoleão de 1804, que foi buscar no artigo 1.382 o conceito de responsabilidade civil no século passado.

RESPONSABILIDADE CIVIL E PENAL. No caso de responsabilidade penal, o agente ofende uma norma de direito público. Nessa situação o interesse lesado é da sociedade, cabendo ao Estado promover de forma obrigatória, a necessária ação objetivando defender o patrimônio do Estado ou o interesse violado do cidadão. Predomina o principio da legalidade – nulla pena sine lege.

“Enquanto a responsabilidade criminal é pessoal, intransferível, respondendo o réu com a privação de sua liberdade, a responsabilidade civil é patrimonial: é o patrimônio do devedor que responde por suas obrigações”, segundo preleciona Carlos Roberto Gonçalves[12].

Por sua vez, a responsabilidade moral resultada das regras de conduta ética que toda pessoa deve praticar perante a sociedade. Segundo se extrai do conceito de HANS KELSEN[13], “O dever-ser - a norma - é o sentido de um querer, de um ato de vontade, se a norma constitui uma prescrição, um mandamento - é o sentido de um ato dirigido à conduta de outrem, de um ato, cujo sentido é que outro (ou outros) deve (ou devem) conduzir-se de determinado modo”.

A função da responsabilidade civil possui caráter social, segundo JOSÉ DE AGUIAR DIAS[14] ao apontar PONTES DE MIRANDA, “o direito é social, o maior interessado na mantença das situações é a sociedade, e não o indivíduo”. Por isso, a indenização tem uma dupla função: penal (repreensão) e indenizatória.

1.3. A CONSTRUÇÃO DA MODERNA TEORIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DIANTE DOS CÓDIGOS ANTIGOS. A moderna teoria da responsabilidade se encontra assentada na construção lenta e gradual das influências recebidas das legislações antigas, que transmitiram uma idéia de que todo procedimento culposo que causasse dano deveria ser reprimido. Na realidade, o centro gravitacional desse sistema era a PUNIÇÃO DO AGENTE. A função do mens legis era a de assegurar uma reprimenda privada, inerente ao sentimento de vingança inato na pessoa da vítima.

O principio fundamental de respeitar o patrimônio alheio foi traduzido e corretamente interpretado pelos romanos, que produziram o principio neminem laedere. Todavia, o grande debate que se inscreveu no transato da história foi marcado pela influência da culpa na produção do dano. Sempre deverá ser associado o dano ao comportamento inadequado do agente – um nexo de causalidade. O objetivo era o de restaurar o patrimônio da vítima, bem como, exigir do agente comportamento devido.

Os antigos sempre associaram a idéia de dano como sendo uma questão essencialmente de culpa – o mais importante era punir o agente ofensor. A indenização não era tão marcante como a pena corporal – Lei de Talião.

Nesse processo, haveria ainda, uma questão importante. Qual o dano que deverá ser indenizado e como será indenizado? A Lei de Talião trouxe uma sugestão importante – “olho por olho, dente por dente” – ou seja, uma equivalência entre o dano e a indenização. Essa fórmula foi acolhida no caput do artigo 944 do Código Civil brasileiro de 2002 c/c o artigo 945.

RESPONSABILIDADE PROPORCIONAL. “A responsabilidade pelos danos decorrentes de acidente de trânsito, em caso de culpa concorrente, deve ser proporcional ao grau de culpa de cada um dos agentes causadores do sinistro”. (In RT 773/364).

Portanto, desloca-se a questão da culpa para se estabelecer uma equivalência com o dano produzido. A pessoa responde, pelos atos praticados em face da sua culpa. O dano causado será proporcional ao seu grau de culpa. Isto significa que o legislador estabelece um tipo de responsabilidade comportamental do agente no ambiente social.

Para Rui Stoco[15], “Os princípios do neminem laedere (não lesar ninguém) e do alterum non laedere (não lesar outrem), dão a exata dimensão do sentido de responsabilidade. A ninguém se permite lesar outra pessoa, se a conseqüência de imposição de sanção. No âmbito penal a sanção atende a um anseio da sociedade e busca resguardá-la. No âmbito civil o dever de reparar assegura que o estado tenha o seu patrimônio – material ou moral – reconstituído ao statu quo ante, mediante a restitutio in integrum”.

Todavia, como poderemos concluir os romanos não desenvolveram uma teoria geral de responsabilidade. Essa regra básica foi introduzida através do artigo 1.382 do Código Civil francês.

Art. 1.382 do CCF: “tout fait quelconque de l’homme, qui cause à autrui un dommage, oblige celui par la faute duquel il est arrivé, à le réparer”.

Art. 1.383 do CCF: “chacun est responsable du dommage qu’il a causé no seulement par son fait, mais encore par as négligence ou par son imprudence”.

Por essa razão CARLOS ROBERTO GONÇALVES ensina que, “É consenso geral que não se pode prescindir, para a correta conceituação de culpa, dos elementos PREVISIBILIDADE E COMPORTAMENTO DO HOMO MEDIUS. Só pode, com efeito, cogitar de culpa quando o evento é previsível. Se, ao contrário é imprevisível, não há cogitar de culpa. O artigo 159 do CCB (artigo 186 CCB-2002) pressupõe sempre a existência de culpa lato sensu, que abrange o dolo (pleno conhecimento do mal e perfeita intenção de praticá-lo), e a culpa sctrito sensu ou aquiliana (violação de um dever que o agente podia conhecer e observar, segundo os padrões de comportamento médio)”.

Portanto, concluiremos que a idéia de conduta retratada pelo legislador, traduz a preocupação do legislador contemporâneo, na direção de que o ponto essencial da responsabilidade deverá ser a conduta adequada do agente – DEVER-SER – em face da ordem social.

O famoso cri du coeur de Rousseau: “o homem nasce livre; mas por toda a parte está acorrentado”, sintetiza toda idéia de responsabilidade.

As normas de uma ordem jurídica regulam a conduta humana. É certo que, aparentemente, isto só se aplica às ordens sociais dos povos civilizados, pois nas sociedades primitivas também o comportamento dos animais, das plantas e mesmo das coisas mortas é regulado da mesma maneira que o dos homens”. (Hans Kelsen – Teoria Pura do Direito, 1984, p. 57).

MÓDULO DIDÁTICO II

CONTEÚDO, NOÇÃO E CONCEITO SOBRE RESPONSABILIDADE CIVIL.

2.1. Conceito de responsabilidade civil. 2.2. Responsabilidade civil e conceito de ato ilícito. 2.3. Responsabilidade civil e o Neminem Laedere e as cláusulas gerais. 2.4. O termo Responsabilidade Civil e suas significações.

2.1. CONCEITO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. “Em recente obra, na França, Philippe Le Tourneau e Loic Cadiet expõem que a responsabilidade é a obrigação de reparar o prejuízo causado a outrem por um ato contrário à ordem jurídica. Ela procura apagar as conseqüências do fato perturbador desta desordem”, segundo proclamam Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieiri Filho[16].

Segundo Rui Stoco[17], “voltando ao estudo, a noção de responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém por seus atos danosos”.

Ainda, no dizer de Rui Stoco[18], “aqueles que vivem em sociedade e aceitaram as regras sociais, as obrigações anímicas impostas pela moral e pela ética, enquanto compromissos supralegais, e pelo regramento institucional imposto pelo tegumento social, expresso no Direito Positivo, assumem o dever de não ofender, nem de lesar, causar dano ou prejuízo sem que tenham justificativa ou eximente, expressamente prevista na legislação de regência”.

A responsabilidade é, dessa forma, uma atividade da vida social, porque ela é o efeito da causa decorrente do comportamento da pessoa no meio social. Assim, não se poderá entender responsabilidade sem ação ou omissão da pessoa humana, que agindo em desconformidade com os regramentos prescritos pela ordem social, viola a esfera material ou imaterial de outrem, lesionando-o em seus direitos tutelados pela ordem jurídica.

Segundo o valioso magistério de Rui Stoco[19] poderemos concluir: “A responsabilidade é, portanto, resultado da ação pela qual o homem expressa o seu comportamento, em face desse dever ou obrigação. Se atua na forma indicada pelos cânones, não há vantagem, porque supérfluo em indagar da responsabilidade daí decorrente”.

Essa noção de antijuridicidade, determinante na responsabilidade civil, implica em um conceito de culpa sctricto sensu, ou seja, se encontra associada a uma idéia de uma falta de conduta desejada no agente – um desvio de comportamento. Essas regras de conduta humana se encontram presentes no Direito comparado:

Segundo os italianos – un diffeto de la inteligentia. Interpretação errônea do fato na ordem social, em decorrência da ausência de correta capacidade de discernimento.

Por essa razão Carlos Roberto Gonçalves[20] leciona:

“É consenso geral que não se pode prescindir, para a correta conceituação de culpa, dos elementos PREVISIBILIDADE E COMPORTAMENTO DO HOMO MEDIUS. Só pode, com efeito, cogitar de culpa quando o evento é previsível. Se, ao contrário é imprevisível, não há cogitar de culpa. O artigo 159 do CCB pressupõe sempre a existência de culpa lato sensu, que abrange o dolo (pleno conhecimento do mal e perfeita intenção de praticá-lo), e a culpa sctrito sensu ou aquiliana (violação de um dever que o agente podia conhecer e observar, segundo os padrões de comportamento médio)”.

Segundo Rui Stoco[21], “Toda vez que alguém sofrer um detrimento qualquer, que for ofendido física ou moralmente que for desrespeitado em seus direitos, que não obtiver tanto quanto foi avençando, certamente lançará mão da responsabilidade civil para ver-se ressarcido. A responsabilidade civil é, portanto, a retratação de um conflito”.

Portanto, poderemos concluir que a violação de qualquer direito, por ação ou omissão do agente, que causar dano a outrem, implicará na obrigação de reconstituir o direito material ou imaterial violado.

2.2. RESPONSABILIDADE CIVIL E A INTERPRETAÇÃO DE ATO ILICITO. O artigo 186 se refere ao ato ilícito como aquele que, ou seja, VIOLAR DIREITO E OCASIONAR DANO A OUTREM, uma conduta do agente que na cumprindo dever de se comportar adequadamente acaba ocasionando danos materiais e imateriais a terceiros.

Assim, a idéia de ATO ILICITO que obriga a indenizar, se encontra associada à de ILEGALIDADE (antijuridicidade). Quem violar direito alheio tutelado pela ordem jurídica – NEMINEM LAEDERE – se encontra obrigado a indenizar, no caso de produzir dano a outrem.

Todavia, a ilicitude admite exclusão do dever de indenizar em face das previsões contidas no artigo 188, I e II do Código Civil.

Por sua vez, segundo leciona Humberto Theodoro Junior[22], “o direito se constitui como um projeto de convivência, dentro de uma comunidade civilizada (o estado), no qual se estabelecem padrões de comportamento necessário. A ilicitude ocorre quando in concreto a pessoa se comporta fora desses padrões. Em sentido lato, sempre que alguém se afasta do programa de comportamento idealizado pelo direito positivo, seus atos voluntários correspondem, genericamente, a atos ilícitos (fatos do homem atritantes com a lei)”.

E, nessa linha, Humberto Theodoro Junior[23] conclui, “Fala-se, então em ato ilícito em sentido estrito, ou simplesmente ato ilícito, como se faz no artigo 186 do atual Código civil. Nesse aspecto, a ilicitude não se contentaria com a ilegalidade do comportamento humano no, mas se localizaria sobretudo, no dano injusto a que o agente fez a vítima submeter”.

Portanto, somente o dano injusto será objeto de indenização posto que, o dano justo significa que o agente atuou dentro dos princípios estabelecidos pelo ordenamento jurídico, não merecendo, destarte, ser ressarcido. A conclusão é lógica, na medida em que o dano produzido por ação ou omissão do agente contrária à lei resulta na intervenção do Estado para assegurar a indenização da vítima, contra a pessoa que descumpriu a norma de conduta ditada pelo Estado.

De acordo com Carlos Roberto Gonçalves[24], “O elemento objetivo da culpa é o dever violado. Para Savatier, Culpa é a inexecução de um dever que o agente podia conhecer e observar”.

Na ótica de Rui Stoco[25], “é, pois, o ato ilícito manifestação livre do agente, de conformidade com essa vontade, isento de qualquer ameaça ou coação e informado pela boa-fé. O Código Civil de 2002 não conceituou expressamente o ato jurídico, embora tenha conceituado o ato ilícito no artigo 186, significando que o teria feito a contrario sensu, técnica pouco recomendada quando se cuida do tema de extrema importância. Da prática do ato ilícito decorre a responsabilidade do agente”.

O que se observa nessa construção jurídica é a de que a pratica de um ato ilícito – violação de um dever jurídico que causa dano – impõe ao agente o dever de indenizar, segundo prescrito no caput do artigo 186 combinado com o artigo 927 do Código Civil.

Para Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery[26], “CULPA. É a ação (ato comissivo) ou omissão (ato omissivo) de que resulta o advento de conseqüências que prejudicam outrem, conseqüências essas imprevistas, mas previsíveis. “Culpam autem esse, quod cum diligente provideri poterit, non est provistum” (D 31,9,2). Culpa é omissão de diligência, segundo Carvalho de Mendonça”.

Para Maria Helena Diniz[27], “o ato ilícito é o praticado culposamente em desacordo com a norma jurídica, destinada a proteger interesses alheios; é o que viola direito subjetivo individual, causando prejuízo a outrem, criando o dever de reparar tal lesão. Para que se configure o ilícito será imprescindível um dano oriundo de atividade culposa”,

E, na seqüência a mesma autora, na mesma página, assinala que, “Fácil é denotar que a ilicitude e a culpa são conceitos distintos, embora em certo sentido complementar do comportamento do agente. Enquanto, como pontifica Antunes Varela, a ilicitude considera a conduta do autor do dano, em sua objetividade, como negação dos valores tutelados pela norma jurídica, a culpa atém-se aos aspectos individuais ou subjetivos daquele comportamento e às circunstâncias concretas que levaram à sua efetivação”.

Portanto, o ato ilícito pode ser considerado como a violação de um dever jurídico decorrente da ausência de providências do agente, direcionada no sentido de evitar que o fato delituoso ocorresse, em face de sua diligência e os cuidados necessários na prática do referido ato.

2.3. RESPONSABILIDADE E O NEMINEM LAEDERE, E AS CLÁUSULAS GERAIS. O termo responsabilidade, segundo observado, envolve um conceito de conduta, ou seja, uma formar de comportar-se de acordo com determinadas regras que não causem danos a outrem.

Por sua vez, a expressão neminem laedere traduz uma idéia de comportamento direcionado no sentido de realizar atos, que possam resultar em prejuízos ao patrimônio de outrem.

Segundo Rui Stoco[28], “Os princípios do neminem laedere (não lesar ninguém) e do alterum non laedere (não lesar outrem), dão a exata dimensão do sentido de responsabilidade. A ninguém se permite lesar outra pessoa sem a conseqüência imposição de sanção. No âmbito penal a sanção atende a um anseio da sociedade e busca resguardá-la. No âmbito civil o dever de reparar assegura que o lesado tenha o seu patrimônio – material ou moral – reconstituído ao statu quo ante, mediante a restitutio in integrum”.

O Estado sempre esteve preocupado com a ordem social. Para tanto, impõe uma norma de conduta com o objetivo de determinar que as pessoas se conduzam de forma adequada, medindo sempre os limites de seus atos, evitando lesionar os direitos dos outros.

“Do que se infere que a responsabilidade é o meio e modo de exteriorização da própria justiça, e a responsabilidade é a tradução para o sistema jurídico do dever moral de não prejudicar outra pessoa, ou seja, o neminem laedere. A ninguém é permitido lesar o seu semelhante. O sistema de Direito positivo estabelecido repugna tanto a ofensa ou agressão física como moral, seja impondo sanção de natureza penal ou de natureza civil, também sancionatória, mas de caráter pecuniário, ainda que se cuide de ofensa moral. A primeira visa à pacificação social e à defesa da sociedade; a segunda tem caráter individual ou unitário e tem por escopo a proteção da pessoa”.

A expressão romana neminem laedere, indica uma cláusula geral de responsabilidade posto que não traduza idéia de especificidade. Na realidade, a amplitude da expressão é imensa, na medida em que não indica a origem do agente do ato comissivo ou omissivo. Da mesma forma, não discrimina a quem será assegurado o direito de promover ação indenizatória.

O comando de NÃO LESAR NINGUÉM traduz uma idéia precisa no sentido de que: QUALQUER PESSOA deverá promover ações para medir a extensão de seus atos comissivos ou omissivos, com o propósito de evitar que possam ocasionar danos a OUTRA PESSOA. A linguagem do Código Civil é assim clara, genérica e ampla. Não se trata de normas hermeticamente fechadas e com interpretações restritivas.

“O que se constata é que a linguagem do atual Código Civil, diferentemente do que ocorre com os códigos penais, não está submetida à rígida descrição da fattispecie cerrada (ou tipos descritivos penais fechados), com proposições casuísticas especialmente identificadas e estabelecidas. Não há submissão ao principio da anterioridade, ou imposição de estabelecimentos de enunciados específicos e fechados. São normas de exegese aberta e ampliada”.

Estas “janelas abertas para a mobilidade da vida”, citado por Judith Martins Costa, retratam a realidade da responsabilidade civil, que assimila tipos de condutas ditadas pela modernidade científica e tecnológica presente na modernidade.

Dentre essas realidades pode-se citar a adoção da TEORIA DO RISCO indicada pelo artigo 927, parágrafo único do Código Civil, conseqüência dos inúmeros riscos criados pelos extraordinários avanços científicos presentes no século XXI.

2.4. O TERMO RESPONSABILIDADE E SEU SIGNIFICADO. Já observamos que o termo responsabilidade, significa responder por algo que se praticou de forma errônea – violação de um dever jurídico.

“M. G. MARTON estabeleceu com muita lucidez a boa solução, quando define responsabilidade como a situação de quem, tendo violado uma norma qualquer, se vê exposto às conseqüências desagradáveis decorrentes dessa violação, traduzidas em medidas que a autoridade encarregada de velar pela observância do preceito lhe imponha, providências essas que podem ou não, estar previstas”, segundo José de Aguiar Dias[29]

O termo responsabilidade, diferente do termo utilizado pelo Código Civil francês no artigo 1.382 – FAUTE (falta) – possui um significado semelhante. Falta significa a ausência de uma conduta desejada ou seja, a quebra de uma norma de comportamento desejada para evitar a responsabilidade.

Nesse caso, a orientação francesa direciona-se no seguinte sentido: “sur le príncipe que toute faute, même no intentionnelle engage la responsabilité”. E, ainda, “La faute prévue par les articles 1382 e 1383 peut consister aussi bien dans une abstention que dans um acte positif[30]”.

TRADUÇÃO: “Sobre o princípio que toda falta, mesmo não intencional, compromete a responsabilidade do seu autor”. “A falta prevista pelos artigos 1382 e 1383 pode consistir igualmente numa abstenção do que num ato positivo”.

No Código Civil brasileiro de 2002, a FAUTE presente no art. 186 significa VIOLAR DIREITO, ou seja, não conduzir-se de acordo com a determinação inserta no preceito jurídico, que impõe ao agente ofensor o dever de reparar, indenizar, satisfazer a pretensão indenizatória de quem foi vítima dessa conduta irregular.

Preleciona Humberto Theodoro Junior[31] que, “explica PONTES DE MIRANDA, com argúcia, que a fonte mais freqüente do dever de reparar é a falta cometida pelo autor do dano, e, então se entende como falta a culpa cometida pelo autor do dano. No entanto, essa fonte não é a única e muitos deveres de indenização surgem que não supõem culpa, nem, sequer, ato. Quando tal se passa, ou o ato entra no mundo jurídico como ato fato, ou apenas fato que entra no mundo jurídico e se faz fato ilícito stricto sensu, embora se estabeleça vínculo entre duas ou mais pessoas”.

Rui Stoco[32], retrata esse tema afirmando, “se resumir for possível, pode-se dizer que a responsabilidade civil traduz a obrigação da pessoa física ou jurídica ofensora de reparar o dano causado por conduta que viola um dever jurídico preexistente de não lesionar (neminem laedere) implícito ou expresso na lei”.

Na mesma linha de raciocínio se inscreve Serpa Lopes para quem “a responsabilidade civil significa o dever de reparar o prejuízo”. Assim, poderemos concluir que não se cogita de responsabilidade sem que haja a ofensa ao ordenamento normativo ou a eclosão de um prejuízo.

Todavia, não basta apenas assegurar à vítima o direito de ser indenizada senão, a de ser indenizado pelo equivalente do prejuízo, fato que confere contornos precisos ao termo responsabilidade, ou seja, ser integralmente responsável pelos danos ocasionados a outrem em face de procedimento ilícito.

Nesse sentido, Rui Stoco[33] proclama, “Em conferência que proferiu na Universidade de Pádua, o notável George Ripert vaticinou que o direito progride a medida que as leis impedem o danos ao próximo e garantem a cada o que lhe é devido”.

Atualmente, o grau de culpa é determinante para aferir o grau de responsabilidade das pessoas envolvidas no processo indenizatório. Segundo Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery[34], “É a partir da dosagem da culpa que se mede a responsabilidade do autor do dano e a extensão da indenização devida pelos danos causados. O comando do CC 945 não se aplica às hipóteses regidas pelo sistema da responsabilidade objetiva, porquanto, nessas hipóteses não se cogita do exame da culpa para a fixação do dever de indenizar”.

No entanto, ocorre no direito brasileiro uma construção na direção da TEORIA OBJETIVA OU TEORIA DOS RISCOS, segundo se deflui da regra contida no artigo 927, parágrafo único do CCB-2002. Segundo leciona Judith Martins-Costa[35], “no substrato dessa norma está a noção de estrutura social, tão cara a Miguel Reale, entendendo-se por esta um todo de valoração, determinado pela polarização de uma valoração-matriz incompreensível em termos de mera causalidade, ou de puras relações formais”.

MÓDULO DIDÁTICO III

A CONDUTA HUMANA COMO FUNDAMENTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL.

3.1. A violação do direito prescrito pelo artigo 186 do CC. 3.2. O bonus pater familiae do direito romano. 3.3. O Dever-Ser segundo a Teoria das Normas de Hans Kelsen. 3.4. As normas de Direito e o proceder das pessoas. 3.5. Relevância jurídica da omissão. 3.6. Fato próprio, de outrem e da coisa.

3.1. A VIOLAÇÃO DE DIREITO PRESCRITO PELO ARTIGO 186. A expressão VIOLAR DIREITO, constante no artigo 186 do Código Civil e considerada como pressuposto do ato ilícito retrata uma conduta desviante ou antijurídica. O agente procede de forma contrária à ordem determinada pela norma jurídica.

Para Maria Helena Diniz[36], “A prática de ato ilícito, infringindo preceito normativo de tutela de interesse privado, produzindo dano a um bem jurídico, lesando direitos pessoais ou reais, dá origem ao ressarcimento do prejuízo. É de ordem pública o principio que obriga o autor do ato ilícito a se responsabilizar pelo prejuízo que causou, indenizando-o”.

A prática de ilicitudes sem conseqüências implicaria em graves transtornos para a ordem pública – o Estado não permite que o caos se instaure na sociedade, sob pena de desagregação da ordem social. Assim, reprime esse comportamento antijurídico determinando que os danos causados pelos violadores da ordem jurídica, sejam devidamente indenizados, objetivando recompor o patrimônio da vítima e desestimular o ofensor a praticar novos atos contrários à Lei.

Segundo Judith Martins Costa[37], “O ordenamento contempla, cada vez mais, hipóteses de responsabilidade civil por ato ilícito, mesmo assim, no comum dos casos requer-se este pressuposto como fato constitutivo da responsabilidade. Ilicitude significa a contrariedade ao Direito e não apenas à lei, abrangendo, portanto, também a violação de princípios fundamentais do Ordenamento. A ilicitude, conquanto muitas vezes confundida com a culpa, significa, como acentua Cavalieiri filho, a conduta humana antijurídica, contrária ao Direito, sem qualquer referência ao elemento subjetivo ou psicológico”.

“O que se exige é a contrariedade ao Direito, e não, exclusivamente, à lei (ilegalidade). Assim, configurará ilicitude a lesão de direitos da personalidade, ou direitos reais, bem como a violação de preceitos legais e contratuais de tutela dos direitos privados. Em termos estrito o termo ilicitude designa os delitos, seja de direito civil ou penal”, assinala a mesma autora, na página 125.

(AÇÃO) - Para Sérgio Cavalieiri Filho[38], “A ação é a forma mais comum de exteriorização da conduta, porque, fora do domínio contratual, as pessoas estão obrigadas a abster-se da prática de atos que possam lesar o seu semelhante, de sorte que a violação desse dever geral de abstenção se obtém através de um fazer”.

(OMISSÃO) – Segundo Sérgio Cavalieiri Filho[39], “A omissão adquire relevância jurídica, e torna o omitente responsável, quando este tem dever jurídico de agir, de praticar um ato para impedir o resultado, dever, esse, que pode advir da lei, do negócio jurídico ou de uma conduta anterior do próprio omitente, criando o risco da ocorrência do resultado, devendo, por isso, agir para impedi-lo”.

Rui Stoco[40] assinala, “Parafraseando o grande FREDERICO MARQUES, a conduta humana relevante para essa responsabilização apresenta-se como ação ou como omissão. Viola-se a norma jurídica, ou através de um FACERE (ação), ou de um NON FACERE (omissão). Uma e outra conduta se situam no campo naturalístico do comportamento humano, isto é, no mundo exterior, por serem um trecho da realidade que o Direito submete, ulteriormente, a juízo de valor, no campo normativo”.

CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO – Lei número 9.503/97. Artigo 161: “Constitui infração de trânsito a inobservância (OMISSÃO) de qualquer preceito deste Código, da legislação complementar ou das Resoluções do CONTRAN, sendo o infrator sujeito às penalidades e medidas administrativas indicadas em cada artigo, além das punições previstas no Capitulo XIX”.

“O delito, no estágio atual do Estado de Direito Democrático, encerra sempre a CONDUTA. Ação ou omissão, pouco importa. Fundamentalmente indispensável, porém, o comportamento do homem. Além disso, reclama-se para o efeito de tipicidade, configurar o evento. O dano pode ser material ou moral. O perigo, por sua vez, probabilidade (não se confunda com possibilidade) de dano. Não obedecido esse esquema, o raciocínio passa a ser próprio do mundo da natureza, que não se coaduna , na espécie, com os requisitos jurídicos. O Direito tem seu método. Senão observado, a conclusão, com certeza, será equivocada” (In STJ – REsp. 150.908-SP – Relator: Min. Vicente Cernicchiaro – 6ª. Turma – julgado em 18.08.1998).

“Comete crime comissivo por omissão o agente que se omite no dever jurídico de impedir o resultado que configura o fato punível”. (In RT 811/691).

“A causalidade, nos crimes comissivos por omissão, não é fática, mas jurídica, consistente em não impedir o resultado. A violação desse dever é erigida pelo direito em causa do resultado”. (In STF – Min. Carlos Madeira – RTJ 116/177).

Para Humberto Theodoro Junior[41], “Todo ato ilícito absoluto (ato ilícito stricto sensu, ou delito civil) consiste, portanto, num fato do homem, isto é, num comportamento voluntário de alguém, pouco importando, porém, o que, de fato, quis o agente alcançar, desde que dito comportamento tenha contrariado ao padrão exigível e tenha acarretado prejuízo a alguém”.

Todavia, o autor na mesma página, estabelece uma nítida e clara observação quanto aos resultados da ilicitude que implicará no dever de indenizar.

“Voluntariedade e injuridicidade, nessa ordem de idéias são os pressupostos do comportamento do agente que o tornam responsável pelo dever de indenizar o prejuízo derivado de seu ato ilícito. Não há ato ilícito stricto sensu se não houver prejuízo para a vítima, mas também não haverá o dever de indenizar se o dano sofrido pelo ofendido não estiver conectado a um comportamento voluntário do agente”.

Mediante a observação desses conceitos, será determinante concluirmos, segundo Humberto Theodoro Junior[42], “o elemento nuclear do ato ilícito, em suma, é a conduta humana voluntária, contrária ao direito. Como todo comportamento voluntário do homem, essa conduta tem aspecto físico (ou objetivo) e psicológico (Ou subjetivo)”.

3.2. O BONUS PATER FAMÍLIA DO DIREITO ROMANO. A culpa é o fundamento da responsabilidade, posto que traduz a ausência de conduta desejada do agente imposta pela ordem jurídica, que resulta no dever de indenizar o dano produzido por decorrência da má conduta.

Caio Mário da Silva Pereira, doutrinador civil de escol, ensina que um erro de conduta é que induz culpa. Ora, o erro de conduta ou diffeto de la inteligenzia dos italianos, significa errônea interpretação de uma determinada norma de comportamento.

De acordo com Humberto Theodoro Junior[43], “A vontade do homem, outrossim, pode orientar sua conduta para a conformidade com os padrões comportamentais traçados pela lei, gerando atos jurídicos lícitos, ou para a desconformidade com aqueles padrões, o que acarretará os atos jurídicos ilícitos”.

Segundo Sérgio Cavalieiri Filho[44], “De se destacar, ainda, que no grau de diligência ou cautela exigível deve ser levado em conta não só o esforço da vontade para avaliar e determinar a conduta adequada ao cumprimento do dever, mas também os conhecimentos e a capacidade ou aptidão exigíveis das pessoas. O padrão que se toma para apreciar a conduta do agente não é só do homem diligente, cuidadoso e zeloso, mas também do homem medianamente sensato, razoável e capaz”.

Carlos Roberto Gonçalves[45] nessa direção assinala que, “Os irmãos Mazeaud, adotam o critério objetivo na definição da culpa, comparando o comportamento do agente a um tipo abstrato, o bonus paterfamilias. Se, da comparação entre a conduta da agente causador do dano e o comportamento de um homem médio, fixado como padrão (que seria normal), resultar que o dano derivou de uma imprudência, imperícia ou negligência do primeiro – nos quais não incorreria o homem-padrão, criado in abstrato pelo julgador – caracteriza-se culpa”.

Essa modalidade de homem-padrão ou modelo de comportamento com que a pessoa deverá adaptar seu comportamento no ambiente social, foi criação in abstrato do julgador romano – capaz de sugerir uma pessoa padrão que pudesse ser copiado pelos demais cidadãos comuns.

Maria Helena Diniz[46] no mesmo sentido proclama, “considerar-se-á in concreto a culpa quando, no caso sub judice, se atém ao exame da imprudência ou negligência do agente, e in abstracto, quando se faz uma análise comparativa da conduta do agente com a do home médio ou da pessoa normal, ou seja, do diligens pater famílias dos romanos”.

Alguns Códigos, a exemplo do Português e Espanhol, se utilizaram dessa figura padrão de comportamento da pessoa como fundamento de uma norma de conduta das pessoas no ambiente social.

Art. 487 do CCPOrtuguês:

“1. É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa”.

2. “A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso”.

Segundo o entendimento de Pires de Lima e Antunes Varela[47], “Agir com culpa significa actuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito: o lesado, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo”.

Por sua vez, Abílio Neto[48] aponta que, “Com a expressão BOM PAI DE FAMILIA, quer-se visar o homem de diligência normal, encarado não apenas no âmbito das relações familiares, mas nos vários campos de actuação. A referência a circunstâncias de cada caso, significa que o próprio padrão a ter em conta varia em função de acondicionalismo da hipótese e designadamente do tipo de actividade em causa, para concluir, se houve ou não culpa, se deve conjecturar como o homem padrão teria agido dentro do condicionalismo concreto da hipótese (Galvão Telles, Obrigações, 3ª. Edição, 302)”.

Nessa mesma linha, o Código Civil Espanhol proclama:

“Artigo 1.104: La culpa o negligencia del deudor consiste en la omissión de aquella diligencia que exija la naturaleza de la obligación y corresponda a las circunstancias de las personas, del tiempo y del lugar.

Cuando la obligación no exprese la diligencia que há de prestarse en su cuplimiento, se exigirá la que corresponderia a un buen padre de família”.

Por tais motivos, a conclusão de Maria Helena Diniz[49] é precisa ao pontificar, “O homem normal cuida razoavelmente de sua pessoa e de suas coisas e respeita os interesses alheios, por isso a doutrina, principalmente no campo extracontratual, vem aceitando a tese da medição da culpa in abstracto entendendo que a cada indivíduo será lícito exigir que os demais sejam medianamente diligentes e prudentes, para que não esteja exposto ao risco de sofrer danos perfeitamente evitáveis. Por prevalecer o critério da culpa in abstracto, dever-se-á aferir o comportamento do agente pelo padrão admitido, dando-se flexibilidade à apreciação do órgão judicante”.

Na conclusão do texto, Carlos Roberto Gonçalves[50] assinala: “o previsível da culpa se mede pelo grau de atenção exigível do homo medius. A obligatio ad diligentium é aferida pelo padrão médio de comportamento; um grau de diligência considerado normal, de acordo com a sensibilidade ético-social”.

3.3. O DEVER-SER SEGUNDO A TEORIA DAS NORMAS DE HANS KELSEN. O Dever-ser é uma conduta ditada pela ordem jurídica. Não há escolha. Cada pessoa deve se conduzir de conformidade com os ditames prescritos pelo ordenamento jurídico.

Segundo Hans Kelsen[51], “A palavra DEVER (Pflicht) está ligada na língua alemã – especialmente depois da Ética de Kant – a idéia de um valor moral absoluto. O principio segundo o qual o homem deva cumprir sempre o seu DEVER ou os seus DEVERES pressupõe evidentemente que haja deveres absolutos, inteligíveis para todos”.

Na seqüência na página 176 Hans Kelsen ainda ensina: “Quem está juridicamente obrigado a uma determinada conduta DEVE, por força do Direito conduzir-se do modo prescrito, o que com isso se exprime é o ser-devido – ou seja, o ser positivamente permitido, o ser autorizado e o ser prescrito – do acto coercitivo que funciona como sanção e é estatuído como conseqüência da conduta oposta”.

Por seu turno, Miguel Reale[52] pontifica, “A nossa vida não é espiritualmente senão uma vivência perene de valores. Viver é tomar posição perante valores e integrá-los em nosso mundo, aperfeiçoando nossa personalidade na medida em que damos valor às coisas, aos outros homens e a nós mesmos. Só o homem é capaz de valores, e somente em razão do homem a realidade axiológica é possível”.

Nessa linha de conduta Miguel Reale[53] assinala, “Os valores representam, por conseguinte, o mundo do dever ser, das normas ideais segundo as quais se realiza a existência humana, refletindo-s em atos e obras, em formas de comportamento e em realização de civilização e de cultura, ou seja, em bens que representam o objeto das ciências culturais”.

As Normas, o Direito, o conteúdo das regras foram estabelecidas com o propósito de estabelecer modo de conduta das pessoas – um modus operandi, ou seja, uma forma de determinar o comportamento das pessoas na sociedade. Este é um primado dos seres civilizados.

Nesse particular aspecto Hans Kelsen leciona que, “O Direito, que constitui o objecto deste conhecimento, é uma ordem normativa da conduta humana, ou seja, um sistema de normas que regulam o comportamento humano. Com o termo NORMAS quer-se significar que algo deve ser ou acontecer, especialmente que um homem se deve conduzir de determinada maneira”.

E, na seqüência o Hans Kelsen[54] ainda expõe: “As normas através das quais uma conduta é determinada como obrigatória (como devendo ser) podem ser estabelecidas por actos que constituem o facto do costume. Quando os indivíduos que vivem juntamente em sociedade se conduzem durante certo tempo, em iguais condições, de uma maneira igual, surge em cada indivíduo a vontade se conduzir da mesma maneira por que os membros da comunidade habitualmente se conduzem”.

E, quando se fala em dever de indenização, Hans Kelsen[55] esclarece de forma pontual: “Muitas vezes o dever jurídico em que se constitui um indivíduo de ressarcir os prejuízos materiais ou morais causados por ele ou por outrem é interpretado como sanção e, por isso, também este dever é designado como responsabilidade. Esta construção confunde os conceitos de dever jurídico, de responsabilidade e de sanção. A sanção não é em si mesma um dever – ela pode ser estatuída como tal, porém, não tem necessariamente de o ser – mas é o acto coercitivo que uma norma liga a uma determinada conduta cuja conduta oposta é, desse modo, juridicamente prescrita, constituindo conteúdo de um dever jurídico”.

Diante dessas considerações, o artigo 186 do CCB estabelece um dever de conduta – NÃO VIOLAR DIREITO – sob pena de não sendo cumprido e causar dano a outrem – COMETER UM ATO ILÍCITO. E, na seqüência – artigo 927 do CCB – FICAR OBRIGADO A REPARÁ-LO.

3.4. AS NORMAS DE DIREITO E O PROCEDER DAS PESSOAS. A ordem jurídica é a que dita as normas de comportamento da pessoa. Na realidade, somos prisioneiros dessas formas de condutas em face da organização social.

Para Hans Kelsen[56], “As normas de uma ordem jurídica regulam a conduta humana. É certo que, aparentemente, isto só se aplica às ordens sociais dos povos civilizados, pois nas sociedades primitivas também o comportamento dos animais, das plantas e mesmo das coisas mortas é regulado da mesma maneira que o dos homens”.

“Esta conduta pode consistir numa ação positiva ou numa omissão. Na medida, porém, em que a ordem jurídica é uma ordem social, ela somente regular, de uma maneira positiva, a conduta de um individuo enquanto esta se refere – imediata ou mediatamente – a outro indivíduo. É a conduta de um indivíduo em face de um, vários, ou todos os outros indivíduos, a conduta recíproca dos indivíduos, que constitui o objeto desta regulamentação”, assinala Hans Kelsen[57].

“A conduta que é regulada por uma norma que obriga ao serviço militar não é a conduta de um indivíduo em face do outro indivíduo determinado – como no caso da norma que proíbe o homicídio -, mas a conduta desse indivíduo em face da comunidade jurídica, isto é, em face de todos os subordinados à ordem jurídica, de todas as pessoas pertencentes à comunidade jurídica”, segundo leciona Hans Kelsen[58].

Nessa linha de conduta, Miguel Reale[59] clarifica com suas idéias assinalando que, “Toda regra jurídica traduz um imperativo de conduta, a obrigatoriedade de um comportamento, de uma exigência de ação ou de omissão, quando se fala em lei jurídica, fala-se na obrigatoriedade de um comportamento possível”.

E, finalmente, o jurista[60] finaliza, “Para o jurista, ao contrário, os modelos de comportamento, isto é, os institutos jurídicos concebidos como estruturas normativas de uma classe de ações, não constituem meras previsões de fatos futuros possível no âmbito e em função de dados pressupostos, mas traduzem antes o reconhecimento de que certos fins são social e eticamente necessários; os modelos jurídicos não são, pois, esquemas ou sínteses de ordem lógico operacional ou técnica, mas sim ordenações deontológicas de caráter ético, muito embora fundadas na análise objetiva de dadas situações sociais e históricas”.

A ordem jurídica, no curso de séculos, estabeleceu uma forma de comportamento do ser humano. Segundo Alexandre de Morais[61], “Esse dever configura-se pela exigência de o indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a Constituição Federal exige que lhe respeitem a própria. A concepção dessa noção de dever fundamental resume-se a três princípios do Direito Romano: HONESTE VIVERE (Viver honestamente), ALTERUM NON LAEDERE (Não prejudique ninguém) e SUUM CUIQUE TRIBUERE (Dê a cada um o que é seu)”.

3.5. RELEVÂNCIA JURÍDICA DA OMISSÃO. A omissão é um ato negativo. É a inatividade do agente, falta ou abstenção de atitude que deveria ter sido intentada pela pessoa.

Segundo Rui Stoco[62], “omissão é uma conduta negativa. Surge por que alguém não realizou determinada ação quando deveria fazê-lo. A sua essência está propriamente em não ter agido de determinada forma”.

“Quem por omissão voluntária causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”. (In RT 549/203).

Para Maria Helena Diniz[63], “A omissão é a não-observância de um dever de agir ou da prática de certo ato que deveria realizar-se. A omissão é, em regra, mais freqüente no âmbito da inexecução das obrigações contratuais” (In RT 452/245).

Segundo Sérgio Cavalieiri Filho[64], “Em suma, só pode ser responsabilizado por omissão quem tiver o dever jurídico de agir, vale dizer, estiver numa situação jurídica que o obrigue a impedir a ocorrência do resultado. Se assim não fosse, toda e qualquer omissão seria relevante e, consequentemente, todos teria contas a prestar à Justiça”.

Nessa ordem de idéias, Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieiri Filho[65] ensinam que, “A omissão, todavia, como pura inércia, a rigor, não pode gerar, física ou materialmente, ou mesmo moralmente, o dano sofrido pelo lesado, porquanto do nada, nada provém. Mas, a omissão adquire relevância jurídica, e torna o omisso responsável, quando este tem dever jurídico de agir, de praticar um ato para impedir o resultado; dever que pode advir da lei, do negócio jurídico ou de uma conduta anterior do próprio omisso, criando o risco da ocorrência do resultado, devendo, por isso, agir para impedi-lo. Em tais casos, não impedir o resultado significa permitir que a causa atue. O omisso coopera na realização do evento com sua inércia, deixando de se movimentar, não impedindo que o resultado se concretize”.

Código de Trânsito Brasileiro.

OMISSÃO DE SOCORRO A VÍTIMAS DE ACIDENTES.

Artigo 177: “Deixar o condutor de prestar socorro à vítima de acidente de trânsito quando solicitado pela autoridade e seus agentes”.

OMISSÃO EM REMOVER O VEÍCULO DO LOCAL EM ACIDENTE SEM VÍTIMA.

Art. 178: “Deixar o condutor, envolvido em acidente sem vítima, de adotar providências para remover o veículo do local, quando necessário tal medida para assegurar a segurança e a fluidez do trânsito”.

Portanto, a omissão deverá configurar responsabilidade, quando o agente tenha o DEVER DE AGIR, não podendo abster-se de praticar o ato determinado pela ordem jurídica.

OMISSÃO DE SOCORRO (art.135 CPB):

“Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada, extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública”.

“O dever de prestar socorro a quem se acha especialmente afetado em sua incolumidade física ou fisiológica nasce da situação de fato e fundamenta-se no valor ético-social da solidariedade humana, não necessitando, portanto, ter fonte em um negócio jurídico”. (In RT 601/350).

3.6. FATO PRÓPRIO, DE OUTREM E DA COISA. A responsabilidade por fato próprio decorre por fato praticado pela própria pessoa que, nesse caso, desencadeia prejuízo por sua ação ou omissão. A responsabilidade poderá ser contratual ou extracontratual.

Para Arnaldo Rizzardo[66], “O ponto básico ou inicial está n a infração de um dever que o agente podia e devia conhecer, observar ou abster-se de violá-lo. Assim, incidem os pressupostos comuns da ação ou omissão, da culpa, do nexo causal e do dano para desencadear a responsabilidade. Ou depara-se a pessoa com o dever de indenizar pela ocorrência do próprio fato em si, em especial nas atividades perigosas ou de risco, e nas previsões expressas na lei”.

Quando se tratar de FATO DE OUTREM, o artigo 932 consagrou cinco situações distintas previstas nos incisos I a V do Código Civil. A inovação em nosso sistema jurídico é a culpa objetiva consagrada no artigo 933 do CC. Trata-se de uma evolução em relação ao CC de 1916 que previa a culpa presumida.

E, quando se refere FATO DA COISA (ANIMADA OU INANIMADA) o CC em seus artigos 936, 937 e 938 consagrou a TEORIA DA CULPA OBJETIVA, em virtude dos riscos oferecidos na guarda dessas coisas – imóveis e animais.

O CCB-2002 adotou o primado ubi commodo, ibi onus.

MÓDULO DIDÁTICO IV

OS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA CULPA (MDIV).

4.1. Definição e conceito de culpa. 4.2. Dolo e culpa. 4.3. Modalidades de culpas. 4.4. Culpa contratual e extracontratual. 4.5. Culpa concorrente ou concorrência de culpas. 4.6. Culpa solidária e culpa subsidiária. 4.7. Culpa grave, leve e levíssima (graus de culpa). 4.8. Prova da culpa.

4.1. DEFINIÇÃO E CONCEITO DE CULPA. A culpa, segundo Humberto Theodoro Junior entende a culpa como “a conduta voluntária contrária ao dever de cuidado imposto pelo direito, com a produção de um evento danoso involuntário, porém, previsto ou previsível”.

“Em se tratando de vida humana, não há lugar para culpas pequenas[67]”, leciona Miguel Kfouri Neto.

Para Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieiri Filho[68], “A culpa tem sido definida como a conduta contrária à diligência e comumente usada. Por diligência entende-se o zelo, a cautela, o cuidado para cumprir o dever; o esforço da vontade exigível para determinar e executar a conduta necessária ao cumprimento de determinado dever”.

A dificuldade da teoria da culpa está justamente na determinação do grau desse dever de diligência, cautela ou cuidado para que a conduta se apresente socialmente adequada.

CULPA É OMISSÃO DE DILIGÊNCIAS.

Nesta razão assenta o brocardo jurídico: CULPA NON POTEST IMPUTARI EI, QUI NON FACIT, QUOD FACERE NON TENEBATUR – Não se pode imputar culpa a quem não fez o que não era de sua obrigação.

Segundo leciona Rui Stoco[69], “O conceito de culpa, que era unitário, dicotomizou-se, pois, a doutrina que estuda o Direito Penal evolui e deu-lhe outra conotação e passou a abandonar a teoria psicológica da culpabilidade para abraçar a teoria normativa da culpabilidade”.

Toda e qualquer pessoa de mediana inteligência deve observar os meios necessários para evitar causar danos a terceiros. Nessa linha de pensamento, Humberto Theodoro Junior[70] afirma: “Não se tem como culpado, por isso, aquele que provocou dano que só uma diligência extremada e incomum no meio social conseguiria evitar”.

Na ótica de Miguel Kfouri Neto[71], “É difícil definir o que seja um médico prudente. Há casos que requerem um médico audacioso, sem ser ignorante, nem imprudente. Não raro, a timidez, hesitação, a prudência, revelam imperícia, contribuem para o agravamento do mal, constituem culpa”.

Segundo a doutrina penal, “A culpa levíssima, que se configura quando a previsibilidade somente é possível mediante atenção extraordinária e excepcional, não é punível no Juízo Criminal, dando margem, tão somente a eventual ressarcimento civil”. (In TACRIM/SP – Ap. 89.771 – Rel. Juiz Lauro Malheiros – j.18.07.74).

A afirmativa de HUMBERTO THEODORO JUNIOR se amolda

ao conceito de culpabilidade na esfera civil, especialmente em sede de RESPONSABILIDADE CIVIL?

Para Rui Stoco[72], “Advirta-se, contudo, que a chamada culpa levíssima, que encontra justificação plausível e se torna escusável, não apresenta relevância para o Direito”. Nesse sentido o TJSP decidiu: “não sendo infalível a ciência médica, o erro desculpável do facultativo poderia ser invocado como fundamento da responsabilidade”. (In RJTJSP 76/202).

Nesta linha de idéias, segundo Delton Croce e Delton Croce Junior[73] assinalam: “Somente a inobservância do dever de cuidado não constitui conduta típica porque, para a caracterização do delito culposo denominado responsabilidade médica, são necessários outros dois elementos do crime: a previsibilidade e o resultado”.

4.2. DOLO E CULPA. O dolo se diferencia da culpa em face da intencionalidade do agente presente no primeiro caso, direcionada na obtenção de um resultado lesivo pretendido pelo ofensor.

“No mundo da culpabilidade, assinala Rui Stoco[74], “o dolo, é a consciência e a vontade dirigidas a um fim ou resultado sempre ilícito e desconforme com o Direito”. É a ofensa a um dever preexistente de forma consciente e desejada”.

“O ilícito civil se caracteriza pelo inadimplemento sem justa causa de uma obrigação e não se confunde com o penal que reclama conduta dolosa”. (In STF – HC 75.500/RJ – 1ª. Turma).

Carlos Alberto Menezes Direito e Sergio Cavalieiri Filho[75], alegam que, “Com efeito, no crime, a regra é a punição a título de dolo; condutas culposas são puníveis apenas excepcionalmente, nas hipóteses expressamente previsíveis na lei penal, e com penas muito mais brandas. Ali a pena é sempre proporcional ao elemento subjetivo, dolo ou intensidade da culpa”.

Nessa perspectiva pode-se estabelecer que há uma contradição entre os artigos 403 e 945 do Código Civil brasileiro? Será possível que o grau de culpabilidade seja determinante na fixação do quantum indenizatório? O que justifica essa postura?

Artigo 403: “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos e os lucros cessantes por efeito dela direito e imediato”.

Artigo 945: “Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”.

Na realidade, trata-se de culpas concorrentes. “A concorrência de culpas, mesmo sem dispositivo expresso, já estava consagrada na jurisprudência e na doutrina brasileiras. O que importa em tal situação é a correta identificação do nexo causal entre a conduta do agente e o ato e a verificação da participação do lesado para que o dano se produzisse”, como ensinam Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieiri Filho[76].

Portanto, o que se observa ao exame das disposições previstas nos artigos 944, parágrafo único e 945 do CC, é que ambos se referem a CONCORRÊNCIA DE CULPAS ou CONTRIBUTORY NEGLIGENCE da doutrina inglesa.

4.3. MODALIDADES DE CULPA. Na sua essência a culpa civil sempre será a mesma e consiste na violação de um dever de cuidado. Todavia, poderá ser desdobrada em vários tipos de culpa, cada qual, definindo uma determinação função. Para tanto, poderemos estabelecer modalidades diferentes:

• CULPA PRESUMIDA. Nesse caso, consiste na admissão de um tipo de culpa para favorecer a posição da vítima diante da sua dificuldade para obter a sua comprovação em juízo.

• CULPA GRAVE, LEVE E LEVÍSSIMA. Que poderá ser definida em face do grau de ação do agente lesionador. Nesse caso, a leve se refere a um bônus pater famílias; a levíssima a uma pessoa de habilidade especial e a grave, quando o agente atua com falta de cuidado injustificável ao homem normal, impróprio ao comum dos homens.

• CULPA CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL (Ex Declicto, Delitual ou Aquiliana) – quando a natureza do dever violado for de cunho contratual ou extracontratual.

• CULPA IN ELEGENDO, IN VIGILANDO, IN CUSTODIENDO, IN COMMITTENDO, IN OMITTENDO E IN CONTRAHENDO. (A primeira se refere à culpa decorrente da má escolha; a segunda corresponde ao dever de vigilância sobre as pessoas (pais-filhos, empregador-empregado, animal-proprietário); a terceira decorrente de quem detém a guarda provisória de coisas e pessoas); a quarta, quando o agente pratica o ato positivo (imprudência); a quinta, quando decorre da omissão (negligência); a sexta, ocorre quando o agente contrato com o propósito de lesar a outra parte.

• CULPA CONTRA A LEGALIDADE. Refere-se à culpa decorrente de ato do agente que contraria ordem jurídica que determina um tipo de comportamento – não fume!.

• CULPA CONCORRENTE. Nesse caso, a vítima contribui com o seu grau de culpa para a ocorrência do evento – artigo 945.

• CULPA IN CONCRETO E IN ABSTRATO. No primeiro caso, se trata de culpa de dever comum e, a segunda, quando se refere a uma conduta de pessoa que emprega atenção especial na prática do negócio jurídico.

4.4. CULPA CONTRATUAL E CULPA EXTRACONTRATUAL. A responsabilidade contratual, disciplinada pelo artigo 389 difere substancialmente da extracontratual prevista no artigo 186 e 927, todos do Código Civil.

Na ótica de Rui Stoco[77], “a responsabilidade extracontratual é o encargo imputado pelo ordenamento jurídico ao autor do fato, ou daquele eleito pela lei como responsável pelo fato de terceiro, de compor o dano originado do ato ilícito, ou seja, da obrigação daquele que por ação ou omissão voluntária, violar direito e causar dano a outrem”.

“A responsabilidade contratual é a inexecução previsível e evitável, por uma parte ou seus sucessores, de obrigação nascida de contrato, prejudicial à outra parte ou seus sucessores”.

Há inúmeras discussões sobre os matizes distintos que se conferem à responsabilidade contratual e extracontratual, inclusive quanto à CULPA. Nesse caso, PONTES DE MIRANDA pontificou que se tratam de culpas iguais, não havendo diferenças entre elas.

Segundo Rui Stoco[78], “Mas não se pode negar que, enquanto a relação contratual é informada pela boa-fé das partes e as obrigações são cumpridas, guarda-se a distinção da lei. Contudo, quando o descumprimento da avença expressa no contrato (escrito ou verbal) ocorre por força do inadimplemento, então nasce o ilícito e as responsabilidade contratual e delitual se aproximam e assumem características únicas”.

“A responsabilidade contratual e extracontratual regulam-se racionalmente pelos mesmos princípios, porque a idéia de responsabilidade é una; tanto que, por força disso, a tendência das legislações modernas inclina-se à unificação, abandonando a distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual, de sorte que no inadimplemento de contrato no qual se assumiu obrigação de resultado, sem demonstração de qualquer causa excludente dessa responsabilidade, o dano moral se apresenta in re ipsa, restando evidente a suficiência para sua admissão, do padecimento como a repercussão, angústia, sofrimento, aflição e, por fim, frustração pela não conclusão do empreendimento, esperada ansiosamente durante quase uma década”. (In 2º. TACSP – 12ª. Cam. – Apel. 672.523-0/0 – Rel. Rui Stoco – j. 02.09.2004).

Portanto, resta inquestionável que se tratam de responsabilidade onde predomina o principio unitário, ou seja, não se pode fazer distinção entre as duas modalidades de responsabilidade que estão situadas em planos jurídicos distintos.

4.5. CULPA CONCORRENTE OU CONCORRÊNCIA DE CULPAS. O artigo 945 do Código Civil rompeu com o Código anterior para inovar e introduzir a culpa concorrente, ou seja, não mais de adota o principio da repartição dos danos nos casos de concorrência de culpas.

Para Rui Stoco[79], “Adota-se no artigo 945, critério dúctil, lógico e juridicamente correto, ou seja, cada qual responderá na medida de sua culpa. Restaura-se o principio da gradação da culpa no que tem de bom e de serventia, ou seja, para encontra o valor justo da reparação e estabelecer a repartição desse prejuízo segundo a gravidade da culpa de cada um”.

“Ao que parece também nossa legislação civil codificada em vigor adotou a TEORIA DA CULPA DECISIVA ou da PREPONDERÂNCIA DA CULPA EFICIENTE, na medida em que reparte o prejuízo entre o ofensor e o ofendido proporcionalmente, segundo a obrigação culposa de cada um”.

“Se a vítima não age com a cautela necessária para atravessar a rua em local apropriado, vindo a ser atropelada, justificável a redução, proporcional do valor indenizatório, em razão da culpa concorrente”. (In RT 609/112)

Portanto, as questões dessa natureza dependerão, doravante, da precisa aferição do magistrado na fixação do quantum indenizatório.

4.6. CULPA SOLIDÁRIA E CULPA SUBSIDIÁRIA. O mesmo principio que se aplica às obrigações solidárias, deverão ser considerados nos casos de responsabilidade civil solidária. Nesse caso, o artigo 942, parágrafo único do Código Civil, prescreve de forma precisa a solidariedade das pessoas elencadas no artigo 932 do Codex.

Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieiri Filho[80]aduzem que, “Perante o direito civil a responsabilidade será igual autores e co-autores ou participes acham-se em pé de igualdade”.

Todavia, a responsabilidade subsidiária somente ocorrerá no caso em que a pessoa somente responderá no caso da primeira responsável não puder fazê-lo, segundo a previsão contida no artigo 928. Nesse caso, o incapaz não é solidariamente responsável em face do seu representante legal. Todavia, poderá sê-lo de forma subsidiária.

Para os autores supracitados, na mesma página, afirmam que: “A contrário senso, o incapaz não responde se as pessoas por ele responsáveis puderem responder. Logo, não será com elas solidário. O incapaz só responderá sozinho e subsidiariamente se as pessoas por ele responsáveis (artigo 932, I e II) não puderem responder”.

Por conseqüência, o legislador estabelece uma correta e necessária separação entre a responsabilidade civil solidária e subsidiária, que representam situações distintas.

4.7. CULPA GRAVE, LEVE E LEVÍSSIMA (GRAUS DE CULPA). A Lex Aquilia prescreveu que, IN LEX AQUILIA ET LEVISSIMA CULPA VENIT, ou seja, na Lei Aquiliana também se responsabiliza pela culpa levíssima. O sentido que se pretende aferir ao citado texto legal, é o que de qualquer culpa será motivo para a indenização.

O grau de culpa – grave, leve ou levíssima – será apenas considerado para o propósito de conferir a responsabilidade do agente lesionador por ocasião da prática do ato ofensivo. Nesse caso, o julgador estará identificando o nível de responsabilidade do agente que operou o efeito lesivo ao patrimônio de outrem.

Na expressão de Rui Stoco[81], “Cumpre lembrar que nosso Direito desprezou a gradação da culpa, embora não a tenha abandonado por inteiro, pois é invocada pelo artigo 944”.

Dessa forma, o Código Civil de 2002 tratou a presente questão com o cuidado necessário, para não fugir da tradição consiste no exame do grau de culpa da vítima, para aferir a sua responsabilidade – fato que não ocorreria no caso da culpa absoluta ou objetiva.

4.8. PROVA DE CULPA. A culpa exige prova em se tratando de culpa subjetiva, em que predomina o principio processual de que o ônus da prova depende de quem alega – principio adotado pelo nosso Código Civil. Todavia, não será necessário nos casos de culpa objetiva ou, nas hipóteses da teoria do risco, como prescrito pelo parágrafo único do artigo 927 do Código Civil.

Há casos, todavia, como nas situações de danos morais, em que a culpa decorre do fato – danumn in re ipsa, que prescinde da sua demonstração.

Há situações em que ocorre a CULPA VIRTUAL, ou seja, aquela em que os fatos se demonstram pela própria evidência dos acontecimentos ou como eles se desencadearam.

Rui Stoco[82] nesse sentido ensina que, “Com fundamento na jurisprudência dos tribunais franceses MALAURIE E AYNÉS, aludem a um tipo de culpa virtual, ou seja, na idéia de culpa que resulta do próprio dano – in res ipsa loquitur – a coisa fala por si mesma. São situações em que a responsabilidade prescinde da culpa, e é substituída pela teoria do risco. São lembrados como exemplos de culpa virtual a do transportador benévolo, a do médico”.

No caso do médico, em face da relação paciente-médico disciplinada pelo CDC, o artigo 6º, inciso VIII admite a inversão do ônus da prova que, neste caso, milita em favor do paciente diante da dificuldade da produção da prova técnica. Portanto, o ônus da prova se inverte cabendo ao profissional da medicina fazer prova da sua não culpa.

“Improcede ação de indenização fundada em responsabilidade por ato ilícito na falta de prova da culpa, que constitui um dos pressupostos do dever de indenizar”.

(In RT 565/214).

Portanto, pode-se concluir de forma precisa, que em face da teoria do risco, o novo Código Civil avançou de forma extraordinária na direção da culpa objetiva, para excluir a dificuldade na demonstração da sua ocorrência. O que, certamente, beneficiou de forma profunda as vítimas, em virtude da dispensa da referida prova.

MÓDULO DIDÁTICO V

A TEORIA DO RISCO NA PERSPECTIVA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.

5.1. Modalidade de riscos. 5.2. O risco-proveito. 5.3. O risco profissional. 5.4. O risco excepcional. 5.5. O risco criado.5.6. O risco integral. 5.7. Críticas à teoria do risco e o posicionamento do nosso direito positivo.

5.1. MODALIDADES DE RISCO. O extraordinário desenvolvimento da ciência e da tecnologia no século XX possibilitou o surgimento de uma imensa gama de produtos científicos no mercado de consumo. Esses novos produtos criaram fatores de riscos, em razão das técnicas inovadoras cujo domínio ainda não foi suficientemente controlado pelas indústrias. A maior prova dessa realidade é demonstrada pelos contínuos recalls realizados pelas referidas indústrias – exemplo atual da TOYOTA. No mesmo sentido, poderosas organizações na área farmacológica vêm retirando do mercado consumerista produtos com efeitos nocivos no organismo humano, cujos resultados colaterais ainda são desconhecidos dos pesquisadores – situação da TALIDOMIDA.

Por decorrência dessa situação, a preocupação do Estado é assume proporções maiores em face dos riscos a que ficam expostos os usuários e consumidores destes produtos. Nesse sentido, a doutrina desenvolveu uma nova teoria denominada RISCO DO DESENVOLVIMENTO.

RISCO DO DESENVOLVIMENTO – “É defeito que, em face do estado da ciência e da técnica à época da colocação do produto ou serviço em circulação, era desconhecido e imprevisível”, segundo anota Sérgio Cavalieri Filho[83].

“Em nosso entender, os riscos do desenvolvimento devem ser enquadrados como fortuito interno – risco integrante da atividade do fornecedor, pelo que não exonerativo da sua responsabilidade. Nesse sentido, o enunciado 43 do STJ/Jornada de Direito Civil”, assinala Sérgio Cavalieri Filho[84].

ENUNCIADO 43/STJ: “A responsabilidade civil pelo fato do produto, prevista no artigo 931 do novo Código Civil, também inclui os riscos do desenvolvimento”.

Dessa forma, a sociedade procura se “proteger” dos perigos oferecidos pelos produtos desenvolvidos pela tecnologia moderna. A exposição das pessoas ao “perigo de dano” confirma os novos comandos inseridos na Teoria da Responsabilidade Civil, com o propósito de salvaguardar a incolumidade física e psíquica das pessoas.

RESPONSABILIDADE CIVIL. “Teoria do risco (presunção de culpa). Atividade perigosa (transportador de valores). Acidente de trânsito (Atropelamento de terceiro). Inexistência de culpa da vítima (Indenização). Ultimamente vem conquistando espaço o principio que se assenta na teoria do risco ou do exercício de atividade perigosa, daí há de se entender que aquele que desenvolve tal atividade responderá pelo dano causado (In STJ – REsp.185.659/SP – 3ª Turma – Relator: Min. Nilson Naves)”.

Nessa linha de conduta, o STJ ainda proclamou: “A atividade de transporte de valores cria um risco para terceiros. Neste quadro, conforme acórdão estadual não parece razoável mandar a família do pedestre atropelado reclamar dos autores não identificados do latrocínio a indenização devida, quando a vítima foi morta pelo veículo da ré, que explora atividade sabidamente perigosa, com o fim de lucro. Inexistência de caso fortuito ou força maior”.

Portanto, justifica-se plenamente a preocupação do legislador em face dessas novas situações de riscos desenvolvidas e criadas pela tecnologia do século XXI, para estabelecer novos comandos legislativos – com o previsto no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil.

Artigo 927: Aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a indenizar.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem.

O nosso ordenamento civil consagrou dessa forma, a adoção da TEORIA DO RISCO, seja no plano da pessoa jurídica de direito privado, como especialmente no da pessoa jurídica de direito público.

Direito processual civil e do consumidor. Recurso especial. Roubo de talonário de cheques durante transporte. Empresa terceirizada. Uso indevido dos cheques por terceiros posteriormente. Inscrição do correntista nos registros de proteção ao crédito. Responsabilidade do banco. Teoria do risco profissional. Excludentes da responsabilidade do fornecedor de serviços. art. 14, § 3º, do CDC. Ônus da prova. I. Segundo a doutrina e a jurisprudência do STJ, o fato de terceiro só atua como excludente da responsabilidade quando tal fato for inevitável e imprevisível. II. O roubo do talonário de cheques durante o transporte por empresa contratada pelo banco não constituiu causa excludente da sua responsabilidade, pois se trata de caso fortuito interno. III. Se o banco envia talões de cheques para seus clientes, por intermédio de empresa terceirizada, deve assumir todos os riscos com tal atividade. IV. O ônus da prova das excludentes da responsabilidade do fornecedor de serviços, previstas no art. 14, § 3º, do CDC, é do fornecedor, por força do art. 12, § 3º, também do CDC. V. Recurso especial provido. (in STJ - REsp 685662 / RJ - 3ª. Turma – Relator: Min. Nancy Andrigh – julgado em 10.11.2005 – DJU 05.12.2005, p. 323).

PLANO ECONÔMICO. PLANO COLLOR. CRUZADOS NOVOS BLOQUEADOS. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS EM FACE DA TEORIA DO RISCO PROFISSIONAL. LEGITIMIDADE DE PARTE PASSIVA AD CAUSAM. É o Banco depositário parte legítima passiva ad causam, quando o pedido inicial visa à reparação de danos decorrente de alegada falta o dever de guarda e vigilância (teoria do risco profissional) em relação ao numerário depositado. Recurso especial não conhecido. (STJ – REsp.142.189/SP – 4ª. Turma – Relator: Min. Barros Monteiro – Julgado em 16.09.2003 – DJU 17.11.2003, p. 327)

As referidas decisões comprovam, quantum satis, a importância da TEORIA DO RISCO na vida moderna, como verdadeira protetora dos direitos da pessoa – um instrumento relevante na modernidade, universalmente consagrada nos demais países democráticos. Afinal, RISCO é perigo, probabilidade de dano, importando, isso, dizer que aquele que exerce uma atividade perigosa deve-lhe assumir os riscos e reparar o dano decorrente.

De acordo com Sérgio Cavalieri Filho[85], “enquanto a culpa é vinculada ao homem, o risco é ligado ao serviço, à empresa, à coisa, ao aparelhamento. A culpa é pessoal, subjetiva,; pressupõe o complexo de operações do espírito humano, de ações e reações, de iniciativas e inibições, de providências e inércias. O risco ultrapassa o círculo das possibilidades humanas para filiar-se ao engenho, à máquina, à coisa, pelo caráter impessoal e objetivo que o caracteriza”.

A consagração da TEORIA DO RISCO se amolda aos novos tempos, mediante a utilização do princípio de que toda atividade exercida no meio social, cria um determinado tipo de risco de perigo, de dano, de possibilidade de ofender a integridade física ou psíquica de outrem, daí o axioma: UBI COMMODO – IBI ONUS.

A expressão constante no texto legislativo (art. 927, par. Único CC) ATIVIDADE DESENVOLVIDA, segundo assinala Sérgio Cavalieiri Filho[86], “Parece-nos lógico concluir que o objetivo do legislador foi estabelecer uma cláusula geral de responsabilidade objetiva que abrangesse toda essa vasta área dos serviços, mormente se tivermos em conta que o Projeto do novo Código Civil foi elaborado muito antes do Código do Consumidor, que posteriormente tratou da matéria no seu artigo 14 que concerne às relações de consumo”.

Por sua vez, a expressão POR SUA NATUREZA IMPLICAR RISCO é imprecisa, não traduzindo com certeza absoluta um determinado tipo de atividade que resulta na possibilidade de danos a outrem. “Fala-se de risco adquirido quando bens e serviços não apresentam riscos superiores àqueles legitimamente esperados, mas tornam-se perigosos por apresentarem algum defeito. Imprevisibilidade e anormalidade são as características do risco adquirido”, assinala Sérgio Cavalieiri Filho[87]. E, adiante conclui, “Em nosso entender, quando a natureza do serviço (atividade desenvolvida) gerar para o fornecedor uma obrigação de resultado, e não apenas de meio, sua responsabilidade será sempre objetiva”.

A expressão RISCO foi corretamente delineada pelo legislador, ao prescrever no artigo 927, parágrafo único: “... ou quando a atividade normalmente desenvolvido pelo autor do dano implicar por sua natureza, RISCOS PARA OS DIREITOS DE OUTREM”.

Para Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieiri Filho[88], “há riscos que são inerentes a certos serviços, intrinsecamente atados à sua própria natureza de modo de funcionamento, como, por exemplo, os serviços médicos-hospitalares. A cirurgia de pessoa idosa, ou mesmo outro tipos de cirurgia ou tratamentos, ou nos setores de emergência com o atendimento de vítimas de múltiplos traumatismos, por si só representam riscos que não podem ser evitados, ainda que o serviço seja prestado com toda técnica e segurança”.

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – FAZENDA PÚBLICA – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS – BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS – CABIMENTO – ART. 461, § 5º, E ART. 461-A DO CPC – DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.

1. A negativa de fornecimento de um medicamento de uso imprescindível, cuja ausência gera risco à vida ou grave risco à saúde, é ato que, per se, viola a Constituição Federal, pois vida e saúde são bens jurídicos constitucionalmente tutelados em primeiro plano. 2. O bloqueio da conta bancária da Fazenda Pública possui características semelhantes ao seqüestro e encontra respaldo no art. 461, § 5º, do CPC, uma vez tratar-se não de norma taxativa, mas exemplificativa, autorizando o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a determinar as medidas assecuratórias para o cumprimento da tutela específica. 3. O direito à saúde deve prevalecer sobre o princípio da impenhorabilidade dos recursos públicos. Nas bem lançadas palavras do Ministro Teori Albino Zavascki, pode-se ter por legítima, ante a omissão do agente estatal responsável pelo fornecimento do medicamento, a determinação judicial do bloqueio de verbas públicas como meio de efetivação do direito prevalente. (REsp 840.912/RS, Primeira Turma, julgado em 15.2.2007, DJ 23.4.2007) Agravo regimental improvido. (In STJ - REsp 851797 / RS – 2ª TURMA – RELATOR: HUMBERTO MARTINS –JULGADO EM 22.05.2007 – DJU 04.06.2007, P. 330).

A decisão narra um DEVER DE SEGURANÇA assegurado e garantido pelo Estado – o direito à saúde. Nesse caso, estamos diante do esquema que assegura direito à saúde do cidadão, do qual o Estado não pode se desonerar.

Todavia, surge um questionamento a esse respeito. Qual o significado do dever de segurança, ou como deve ele ser entendido na perspectiva da teoria do risco?

Segundo Sérgio Cavalieiri Filho[89], “Que dever é esse? Quando se fala em risco o que se tem em mente é a idéia de segurança. A vida moderna é cada vez mais arriscada, vivemos perigosamente – de sorte que quanto mais o homem fica exposto a perigo, mais experimenta a necessidade de segurança. Logo, o dever jurídico que se contrapõe ao risco é O DEVER DE SEGURANÇA.”

A incidência da norma é ampla, se considerarmos a multiplicidade de riscos criados por inúmeras atividades, cabendo destacá-las em face desses riscos que gera, por sua vez, O DEVER DE SEGURANÇA de quem oferece o serviço ou coloca o produto no mercado.

“O condomínio terá responsabilidade direta, objetiva, com base no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil. A guarda e vigilância de coisas perigosas – com piscinas, elevadores e estações de esgoto – podem e devem ser consideradas atividades perigosas de que trata o referido dispositivo, q eu gera para o condomínio o dever de segurança, cuja violação enseja a obrigação de indenizar”, aponta Sérgio Cavalieiri Filho[90].

Esse risco de dano gerado em situação específica deve oferecer, em contrapartida, O DEVER DE SEGURANÇA, ou seja, a obrigação para quem cria o potencial de dano não permitir a sua ocorrência. E, a insegurança somente existe quando ultrapassar o patamar da NORMALIDADE E DA PREVISIBILIDADE.

Para Sérgio Cavalieiri Filho[91], “Fala-se em risco adquirido quando produtos tornam-se perigosos em decorrência de um defeito. São bens que sem o defeito não seriam perigosos; não apresentam riscos superiores àqueles legitimamente esperados pelo usuário. Imprevisibilidade e anormalidade são as características do risco adquirido”.

E, na seqüência, o autor complementa: “E assim é – repita-se – porque o fabricante ou produtor é o sujeito mais importante das relações de consumo. É ele que domina o processo de produção e introduz a coisa perigosa no mercado. Através dele os produtos chegaram às mãos dos distribuidores já preparados, embalados, etc., para o consumo. Cabe-lhe, portanto, assumir os riscos de todo o processo de produção e do ciclo de consumo”.

5.2. O RISCO-PROVEITO. Através da teoria do risco-proveito considera toda pessoa que tira proveito da coisa danosa, sob o fundamento de que onde está o ganho aí está o encargo – ubi emolumentum, ibi onus.

Portanto, será indispensável que seja demonstrada a vantagem auferida por aquele que explora atividade mercantil ou industrial, auferindo lucro com essa atividade. E, o que significa proveito?

Para Sérgio Cavalieri Filho[92], “Se proveito tem sentido de lucro, vantagem econômica, a responsabilidade fundada no risco-proveito ficará restrita aos comerciantes e industriais, não sendo aplicável aos casos em que a coisa causadora do dano não é fonte de ganho. Ademais, a vítima teria o ônus de provar a obtenção desse proveito, o que importaria o retorno ao complexo problema da prova”.

Uma das modalidades mais usuais na vida moderna são os estacionamentos oferecidos por múltiplas empresas privadas – bancos, supermercados, lojas de comércio e outras semelhantes – risco do empreendimento (vide Súmula 130 do STJ). Nesse caso, as cláusulas de não indenizar afixadas nesses locais são inoperantes.

5.3. O RISCO PROFISSIONAL. Em toda atividade profissional se encontra presente o risco do seu exercício. A criação desse instituto se deve a uma proteção do consumidor – sempre a vítima fragilizada nas relações de consumo. A culpa subjetiva sufragada no artigo 14, parágrafo 4º do CDC quase sempre dava lugar à improcedência da ação indenizatória, em razão da dificuldade da produção da prova – a maioria sedimentada em LAUDO PERICIAL.

Por isso, Sérgio Cavalieri Filho[93] proclama, “A desigualdade econômica, a fora da pressão do empregador, a dificuldade do empregado de produzir provas, sem se falar nos casos em que o acidente decorria das próprias condições físicas do trabalhador, que pela sua exaustão, que pela monotonia da atividade, tudo isso acabava por dar lugar a um grande numero de acidentes não indenizados, de sorte que a teoria do risco profissional veio para afastar esses inconvenientes”.

5.4. O RISCO EXCEPCIONAL. Essa modalidade de risco se refere àqueles de natureza excepcional, ou que oferecem riscos de dano de grande natureza – trabalho em minas, trabalho em redes de alta tensão, trabalho em usinas nucleares, trabalhos em clínicas radiológicas, trabalho em fábrica de explosivos e outras atividades semelhantes.

Nesses casos, a exposição a danos é imensa, em virtude das grandes possibilidades de ocorrência de lesões que essas atividades geram. Nesse caso, pode-se enumerar um dos exemplos marcantes que ocorreu na usina de Chernobyl na antiga URSS.

Segundo Sérgio Cavalieri Filho[94], “Para os adeptos da teoria do risco excepcional, a reparação é devida sempre que o dano é conseqüência de um risco excepcional, que escapa à atividade comum da vítima ainda que estranho ao trabalho que normalmente exerça”.

Nestes casos, o dano é conseqüência de um risco que escapa à atividade comum da vítima, ainda que estranho ao trabalho que normalmente exerça. Atualmente é considerado de alto risco o transporte de valores – atividade que submete a quem nela trabalha, bem como, aos terceiros que prescindem desse serviço, como sendo de alto risco – risco excepcional. No mesmo sentido, os hospitais oferecem risco de infecções, que se disseminam rapidamente caso não ocorra um controle imediato e direto da instituição. Os riscos de contaminação de profissionais e usuários são enormes.

Como assinalam Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho[95], “Trata-se aqui de proteger o cidadão na sua vida diária, impedindo que seja ele vitimado, sem oportunidade obter a reparação devida. Pode-se dizer que o risco excepcional está no elenco dos direitos do cidadão exposto aos sistemas de serviços urbanos e ao desenvolvimento científico e tecnológico da sociedade”.

5.5. O RISCO CRIADO. Segundo Caio Mário da Silva Pereira, “aquele que, em razão de sua atividade ou profissão cria um perigo, está sujeito à reparação do dano que causar, salvo prova de haver adotado todas as medidas idôneas a evitá-lo”. Portanto, nessa situação o risco deverá advir de uma situação criada pelo próprio agente do dano posto que, ao expô-lo, teve conhecimento do possível dano que poderia ocorrer ao tercerio.

“A teoria do risco-criado, conclui o Mestre, importa ampliação do conceito do risco-proveito. Aumenta os encargos do agente; é, porém, mais eqüitativa para a vítima, que não tem que provar que o dano resultou de uma vantagem ou de um benefício obtido pelo causador do dano. Deve este assumir as conseqüências de sua atividade”, assina Sérgio Cavalieri Filho[96].

5.6. O RISCO INTEGRAL. Trata-se de uma modalidade extremada da doutrina do risco, destinada a justificar o dever de indenizar, mesmo nos casos em que não ocorrer nexo causal. Nessas situações, as cláusulas excludentes da responsabilidade não incidem em tais circunstâncias. O lesionador será considerado culpado e responsável, pelo simples fato de haver gerado o dano que lesionou os interesses de outrem.

Segundo leciona Sérgio Cavalieri Filho[97]”, Pela teoria do risco integral, todavia, o dever de indenizar se faz presente tão-só em face do dano, ainda nos casos de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior. Dado o seu extremo, o nosso Direito só adotou essa teoria em casos excepcionais”.

Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho[98] proclamam que, “Todavia, como não temos segurança material, tenhamos ao menos a segurança jurídica, a certeza de obter oportunamente uma reparação. A evolução da responsabilidade é, assim, uma decorrência da insegurança e a fórmula ‘viver perigosamente’ atrai fatalmente outra que lhe constitui a réplica e a sanção: responder pelos nossos atos”.

Na verdade, o que se procura através desses institutos é estabelecer margens de segurança para as pessoas que sujeitam aos diversos tipos de danos, bem como, possibilitar que as vítimas sejam adequadamente ressarcidas nesses casos. Na modernidade, as pessoas não se contentam apenas com a segurança jurídica, querem e protestam por uma segurança material e imaterial – almejam proteção efetiva do Estado, diante dos avanços tecnológicos e conseqüentes riscos oferecidos por empresas e empresários.

Nessa perspectiva, CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO E SÉRGIO CAVALIERI FILHO[99] narram fatos que bem ilustram essa realidade, bem como, a justificada preocupação do legislador em oferecer maior segurança aos cidadãos, vítimas indefesas das práticas irresponsáveis e abusivas perpetradas por empresas irresponsáveis e preocupadas apenas com sua rentabilidade – demonstrando total ausência de responsabilidade social.

“Menciono, a título de exemplo, a TALIDOMIA, um medicamento largamente utilizado, principalmente por gestantes, entre 1958 e 1962, retirado do mercado, porque provocou deformidade em milhares de nascituros, em particular na Alemanha e na Inglaterra. Nos Estados Unidos, entre 1960 e 1962, um medicamento anticolesterol, chamado MER-29, ocasionou graves lesões virtuais, inclusive cegueira, em incontáveis pacientes, sendo igualmente retirado de circulação. Todos lembramos da vacina SALK, contra a poliomilite, que em razão de um defeito na concepção, acabou por desenvolver a própria doença em centenas de crianças na Califórnia. Na França, em 1972, o talco MORHANGE causou intoxicação a outras centenas de crianças, levando algumas à morte, também em decorrência de um defeito de concepção. No final do século XX, no caso da vacina contra a tuberculose, produzida a partir de estudos de Koch, as injeções de turberculina mataram inúmeros pacientes. SDÃO OS RISCOS DO DESENVOLVIMENTO, RISCOS EM MASSA, RISCOS COLETIVOS, RISCOS A QUE FICAM EXPOSTOS, INOCENTEMENTE, OS CIDADÃOS”.

5.7. CRÍTICAS À TEORIA DO RISCO E O POSICIONAMENTO DO NOSSO DIREITO POSITIVO. A teoria do risco tem sido alvo de inúmeras críticas, sob o fundamento de que, enquanto protege excessivamente as vítimas subtrai do julgador a possibilidade de apreciar a dimensão e o grau de culpabilidade do agente lesionador. Os irmãos Mazeaud foram considerados como ferrenhos opositores à teoria do risco, em razão de considerar unilateral as medidas adotadas em favor daqueles que sofrem o dano.

Todavia, segundo Sérgio Cavalieri Filho[100], “Mas as críticas não procedem. Se risco é perigo, é mera probabilidade de dano, não basta o risco para gerar a obrigação de indenizar. Ninguém responde por coisa alguma só porque exerce atividade de risco, muitas vezes até socialmente necessária. A responsabilidade surge quando a atividade perigosa causa dano a outrem, o que evidencia que também em sede de responsabilidade objetiva o dever de indenizar tem por fundamento a violação de um dever jurídico, qual seja, o dever de segurança, que contrapõe o risco”.

Para Maria Helena Diniz[101], “É preciso deixar bem claro que o perigo deve resultar do exercício da atividade e não do comportamento do agente. Como pontifica Marco Comporti, a atividade perigosa é a que contém notável potencialidade danosa, em relação ao critério da normalidade média, revelada por meio das estatísticas e elementos técnicos e da experiência comum. Logo, todo aquele que desenvolve atividade lícita que possa gerar perigo para outrem deverá responder pelo risco, exonerando-se o lesado da prova da culpa do lesante”.

É exatamente essa excessiva exoneração do lesante que tem sido objeto das críticas daqueles que negam a teoria do risco. O que a justifica, no entanto, é a ampla proteção do ser humano, uma função social do direito que não pode ser esquecida.

Sob esse fundamento, Sérgio Cavalieri Filho[102] pontifica, “Se, de um lado, a ordem jurídica garante a liberdade de ação, a livre iniciativa etc., de outro, garante também a plena e absoluta proteção do ser humano. Há um direito subjetivo à segurança cuja violação justifica a obrigação de reparar o dano se nenhum exame psíquico ou mental da conduta do seu autor. Na responsabilidade objetiva, portanto, a obrigação de indenizar parte da idéia de violação do direito de segurança da vítima”.

“A responsabilidade, fundada no risco, consiste, portanto, na obrigação de indenizar o dano produzido por atividade exercida no interesse do agente e sob seu controle, sem que haja qualquer indagação sobre o comportamento do lesante, fixando-se no elemento objetivo, isto é, na relação de causalidade entre o dano e a conduta do seu causador”.

A construção legislativa é o resultado da consciência dos nossos legisladores sobre fatos que colocam em risco a incolumidade do cidadão, que se utiliza frequentemente dos serviços fornecidos e concedidos pelo Estado. Veja-se a recente Lei número 10.744 de 09.10.2003 que confere responsabilidade objetiva ao Estado por danos causados por atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte público.

ASSALTO A BANCO. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. “Em face dos riscos inerentes à atividade bancária, a Lei número 7.102/83 criou para as instituições financeiras um dever de segurança em relação ao público em geral, razão pela qual, ocorrendo assalto dentro de agência bancária e vindo a ser um dos clientes atingido por projétil de arma de fogo, o banco tem a obrigação de indenizar o dano experimentado, mesmo em casos de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior, pois a responsabilidade do banco se funda na teoria do risco integral” (RT 781/366). Trata-se de responsabilidade objetiva pelo risco – artigo 927, par. Único do CC.

Por conseqüência, toda essa teoria foi criada com o propósito de oferecer proteção integral à pessoa humana em seu patrimonial material e imaterial. Na realidade, trata-se de uma tutela amplamente prescrita pelo artigo 5º da Constituição Federal de 1988, em face dos direitos e garantias fundamentais da pessoa – especialmente quando se trata do principio da dignidade humana, um dos pressupostos da ordem democrática brasileira.

É justo, portanto, que a ordem jurídica estabeleça mecanismos que possa tornar efetiva a referida proteção da pessoa humana, justificando por essa razão, que a análise do procedimento do agente culposo seja desconsiderado para o efeito da responsabilidade civil.

Todavia, como assinalado por Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho[103], assinalaram que: “Aos profissionais liberais que exercem atividade de risco no mercado de consumo não se aplica o parágrafo único do artigo 927 do novo Código Civil, por força do artigo 14, parágrafo 4º do CDC, que lhes estabelece responsabilidade subjetiva, norma que continua em vigor, não só por sua especialidade, mas também em razão de expressa ressalva feita pelo novo Código. O mesmo ocorre com os profissionais da área médica, uma vez que o artigo 951, se refere expressamente à negligência, à imprudência e à imperícia, que são elementos da culpa”.

MÓDULO DIDÁTICO VI.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO.

6.1. Fundamentos Jurídicos da Responsabilidade do Médico. 6.2. O Erro Médico. 6.3. Porque os médicos erram? 6.4. Ato médico: obrigação de meio ou de resultado? 6.5. O risco de dano do ato médico. 6.6. A natureza jurídica do contrato médico. 6.7. Responsabilidade penal e civil do médico. 6.8. A teoria do consentimento informado. 6.9. A responsabilidade Civil dos Hospitais e Planos de Saúde. 6.10. A orientação predominante das decisões dos Tribunais. 6.11. Estudos de casos concretos.

6.1. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS MÉDICOS. A responsabilidade civil dos médicos, segundo previsão no artigo 951 do CCB é subjetiva. Portanto, dependerá de prova de culpa – ação ou omissão.

Trata-se de uma responsabilidade de meio e não de resultado, inclusive há discussão a respeito das cirurgias de natureza estética. Assim, o médico não estará obrigado a curar. Todavia, se encontra obrigado ao dever de empregar todo o seu conhecimento técnico e científico na obtenção da cura do seu paciente.

Carlos Roberto Gonçalves assinala que, “o cirurgião plástico assume obrigação de resultado, porque o seu trabalho é, em geral, de natureza estética”. Para o Min. Ruy Rosado de Aguiar Junior, depois de reconhecer que, no Brasil, a maioria da doutrina e da jurisprudência defende a tese de que se trata de uma obrigação de resultado.

“MÉDICO. Reparação de danos na eventualidade da atuação do profissional da medicina não levar ao resultado objetivado, gerando, ao revés, prejuízo – Verba devida somente se demonstrada convincentemente sua culpa, seja na modalidade de imprudência, negligência ou imperícia – RT 782/253”.

Para Carlos Roberto Gonçalves[104], “...a responsabilidade desses profissionais é contratual”. Não se pode negar a formação de um autêntico contrato entre o cliente e o médico, quando este o atende. Embora muito já se tenha discutido a esse respeito, hoje já não pairam mais dúvidas sobre a natureza contratual da responsabilidade médica.

“A prova da negligência e da imperícia constitui, na prática, verdadeiro tormento para as vítimas. Sendo o médico, no entanto, prestador de serviço, a sua responsabilidade, embora subjetiva, está sujeita à disciplina do Código de Defesa do Consumidor, que permite ao juiz inverter o ônus da prova em favor do consumidor – artigo 6o, inciso VIII do CDC”, segundo preleciona Carlos Roberto Gonçalves[105].

Atualmente, prevalece o principio da TEORIA DO CONSENTIMENTO INFORMADO, segundo norma prescrita no artigo 15 do CCB-2002. O médico é obrigado a informar o seu paciente sobre os procedimentos que serão levados a efeito no tratamento, bem como, os riscos decorrentes desse fato.

Quanto à responsabilidade dos hospitais, se trata de culpa objetiva, segundo proclamado pelo artigo 927, parágrafo único combinado com o artigo 932, III e artigo 933 do CCB-2002.

No caso de infecção hospitalar quem responderá será o hospital e não o médico, salvo se restar demonstrado que a infecção se originou por culpa do esculápio.

Para o Min. Ruy Rosado de Aguiar Junior do STJ, “o hospital responde pelo dano produzido pelas coisas, tais como, instrumentos, aparelhos e outros utilizados na prestação dos seus serviços”.

Quanto aos planos de saúde, já se decidiu que, “a empresa locadora direta dos serviços médico-hospitalares, credenciando médicos e nosocômios para suprir as deficiências de seus próprios serviços, compartilha da responsabilidade civil dos profissionais e hospitais que seleciona”. Na hipótese, reconheceu-se a responsabilidade solidária da operadora plano de saúde e do hospital, ambos credenciados – TJSP – Ap. 67.929.4-SP – j.em. 16.03.1999.

“A responsabilidade médica, embora contratual, é subjetiva e com culpa provada, não de correndo de merco insucesso no diagnóstico ou no tratamento, seja clínico ou cirúrgico... apenas o erro grosseiro, que foge à normalidade, pode servir de fundamento ao dever de indenizar, exigindo-se não só a prova do mesmo, mas também da culpa em que incorreu o profissional” (In Ap. Cível 20016456 – 7ª Cam. Civ. – TJRJ – j, em 12.12.2000).

Antigamente somente era considerado culpado o médico que agia com culpa grave, para não inviabilizar o profissional de saúde.

Segundo leciona Arnaldo Rizzardo[106], “Mas, sem sombra de dúvida, atualmente a posição de nossos tribunais e de toda a doutrina é a de responsabilizar toda a falta que atente contra a integridade física ou a vida humana. Não se pode, nestes tempos modernos, com um desenvolvimento extraordinário da medicina, continuar tolerando a perda de vidas pela imperícia médica, muito menos pela negligência ou imprudência”.

Exemplo clássico de extrema negligência está no esquecimento de instrumento e outros materiais no interior do corpo, quando da cirúrgica: “cabe ação de indenização pelo grave erro médico, esquecendo-se compressa cirúrgica na cavidade abdominal mais tarde provocando a morte do paciente” (In Ap. Civ 23.256/2002 – TJRJ – 1ª Cam.Civ – DJE 03.04.2003).

RECURSO ESPECIAL. ERRO MÉDICO. CIRURGIÃO PLÁSTICO. PROFISSIONAL LIBERAL. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES. PRESCRIÇÃO CONSUMERISTA.

I - Conforme precedentes firmados pelas turmas que compõem a Segunda Sessão, é de se aplicar o Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados pelos profissionais liberais, com as ressalvas do § 4º do artigo 14 do CDC.

II - O fato de se exigir comprovação da culpa para poder responsabilizar o profissional liberal pelos serviços prestados de forma inadequada, não é motivo suficiente para afastar a regra de prescrição estabelecida no artigo 27 da legislação consumerista, que é especial em relação às normas contidas no Código Civil. Recurso especial não conhecido. (In STJ – REsp. 731078/SP – Registro 2005/0036043-2 - 3ª Turma - Relator: Min. Castro Filho – Julgado em 13.12.2005 – DJU 13.02.2006).

“Erro de diagnóstico. Comprovada a ocorrência de erro de interpretação de radiografias, visualizando uma lesão inexistente, independentemente da omissão em constatar a outra lesão existente, esta de difícil diagnóstico, configura-se conduta culposa e imperita, conducente à responsabilidade civil” (in RF 373/301- TJRJ – julgado em 03.02.2003).

6.2. ERRO DO MÉDICO.

DIREITO ROMANO.

“Sicut medico imputari eventus mortalitatis non debet, ita quod per imperitiam commisit imputari ei debe”.

(TEXTO DE ULPIANO, D.1, 18, 6, 7).

■ “Assim como não se deve imputar ao médico o evento morte, deve-se imputar-lhe o que cometeu por imperícia

ERRO MÉDICO (1)

“Nos últimos cinco anos, aumentaram em 51% o número de denúncias encaminhadas ao CRM de São Paulo. Dessas denúncias, 95% se referem a ERRO MÉDICOS. A quantidade dessas notícias, que se transformam em processos judiciais, também têm crescido. A demanda aumenta ano após ano”.

■ FOLHA DE SÃO PAULO, São Paulo, 22.08.98 – COTIDIANO, p. 3.

ERRO MÉDICO (2):

“A falta de condições de trabalho, a pouca ou nenhuma discussão sobre bioética nas faculdades, as precárias condições de trabalho, falta de residência médica (O Hospital ALBERT EINSTEIN, um dos modelos de qualidade no país, não contrata médico que não tenha feito residência ou especialização) tudo contribui para o aumento dessas denúncias”.

■ FOLHA DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, 22.08.98, COTIDIANO, p.3.

“Aquele que quiser adquirir um conhecimento exato da arte médica deverá possuir boa disposição para isso, freqüentar uma boa escola, receber instrução desde a infância, ter vontade de trabalhar e ter tempo para se dedicar aos estudos”.

HIPÓCRATES.

“Errar é um ato inerente à espécie humana e a prática médica não é exceção. Esse tipo de erro é chamado não-intencional, acidente imprevisível ou infelicitas facit. Ele deve ser diferenciado dos casos de imperícia, imprudência ou negligência. Eventualmente, o limite entre a imperícia e o erro não intencional não é muito bem estabelecido” (In Santos Neto – Brasília Médica/97).

“O problema maior, do ponto de vista de valoração ética do erro médico, surge no caso em que o médico é responsável e culpado pelos danos causados. O texto do Código de Ética Médica que mais procura explicar este caso é o artigo 29/1988, que veda ao médico – “praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência[107]”.

O dano previsível é o risco necessário e inerente às atividades médicas, o preço do custo, cabendo ao médico numa estimativa criteriosa de custo-benefício promover o ato comissivo em favor da cura, ou evitá-lo (ato omissivo) sob pena de agravamento – aí reside o savoir faire da medicina.

Segundo o Código de Hamurabi (Artigo ) “O médico que mata alguém livre do tratamento ou que cega um cidadão livre terá suas mãos cortadas: se morre o escravo paga seu preço; se ficar cego a metade do preço”.

Entre os Egípcios havia a tradição de punir o médico quando se afastava do cumprimento de normas e, ainda, que o doente se salvasse, estaria o médico sujeito a penas várias, inclusive a morte.

Na idade média a rainha Astrogilda exigiu do rei, seu marido, que fosse com ela enterrado os dois médicos que a trataram, aos quais atribuía o insucesso no tratamento.

“Cometer erros sai bastante caro para os médicos norte-americanos: passou a se rotina o profissional desembolsar cerca de 60 mil dólares por ano em seguro contra a má prática. Enquanto isso, alguns advogados insistem em afirmar que ações judiciais têm o objetivo de impedir que médicos e hospitais cometam erros. Certamente é difícil crer que o medo de uma disputa judicial seja o caminho eficaz para que médicos e profissionais da saúde possam cumprir os seus preceitos éticos”. (In Julio Cezar Meirelles Gomes e outros, Erro Médico, 2001, p.36).

“Avulta entre as infrações ao Código de Ética, aquela que configura a possibilidade moral do dano ao paciente conforme o artigo 29 do Código de Ética Médica. O artigo 29 do Código de Ética Médica proclama o dano ou prejuízo que ocorrem por contra do trabalho médico mal realizado, proveniente das três modalidades de culpa citadas e traduz inobservância de outros artigos do próprio Código. Pode ser considerado, portanto, como expressão típica do erro médico inscrito em nosso Código”. (Erro Médico, 2001, p. 76).

Art. 29 do Código de Ética Médica do Conselho Federal de Medicina: “Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como IMPERÍCIA, IMPRUDÊNCIA OU NEGLIGÊNCIA”.

“ERRO DE DIAGNÓSTICO. Comprovada a ocorrência de erro de interpretação de radiografias, visualizando uma lesão inexistente, independentemente da omissão em constatar a outra lesão existente essa de difícil diagnóstico, configura-se conduta culposa e imperita, conducente à Responsabilidade Civil”. (TJRJ – Revista Forense 373/301).

TEORIA DA RES IPSA LOQUITUR

“Nos Estados Unidos, ainda em tema de prova da culpa, aplica-se, em alguns Estados, a TEORIA DA RES IPSA LOQUITUR ou de que a coisa fala por si mesma. Ante a simples ocorrência de um fato – morte do doente, paralisia de um membro, amputação, etc – surge a presunção de negligência, contra o médico e a favor do paciente. Extrai-se a ilação de que o fato não teria ocorrido se não tivesse havido culpa do médico”. (Miguel Kfouri Neto, Responsabilidade Civil do Médico, 5ª. Edição, São Paulo, RT, 2003, p. 67)

6.3. PORQUE OS MÉDICOS ERRAM.

“Segundo Lucian Leape, em brilhante trabalho denominado ERRO EM MEDICINA, a maioria dos danos iatrogênicos (cerca de 65%) são potencialmente previsíveis e, portanto, evitáveis. Os danos podem ser considerados o topo do iceberg do problema do erro médico”.

Neste caso, a culpa se torna evidente, eis que o profissional responsável tem o dever de conhecer o resultado da sua atuação, já que tem conhecimento da lei de causa e efeito. Ademais, como restou demonstrado, a culpa corresponde a falta de conduta necessário no agente para evitar o dano, que ocorrerá em virtude da omissão da diligência necessária para evitar o evento danoso.

“A falibilidade do médico e da medicina é inquestionável.

É ela aceita, em parte, pela doutrina, pela lei e pela jurisprudência, principalmente sob o ângulo moral e penal. No entanto, quanto à responsabilidade civil, esta chega a ser quase ilimitada. Os tribunais passaram a entender que a reparação do dano é um feito indiscutível. Já afirmaram que, assim como é injusto o médico responder pela falibilidade da ciência ou por sua própria limitação, mais injusto seria deixar o paciente a sua própria sorte, quando, buscando um bem encontrou um mal. Ou que se deixe abater sobre a vítima todo o peso do seu infortúnio”(In Erro Médico, 2001, p. 99).

Na realidade, a responsabilidade civil analisada sob a ótica da Justiça depende substancialmente de três requisitos formais, a saber: O DANO, O NEXO CAUSAL E A CULPA. Sem a observância desses elementos formais não haverá o dever de indenizar. Em tais circunstâncias, impõe-se ao magistrado a obrigação de julgar improcedente a ação indenizatória pela ausência de fatores que determinam o dever de indenizar. Por outro lado, poderá ocorrer ainda, a incidência de fatores excludentes da responsabilidade, como por exemplo, culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou de força maior e ou outros previstos no artigo 188, I e II do Código Civil.

A responsabilização, portanto, somente ocorrerá nas hipóteses em que restar demonstrada que o profissional agiu com desvio de conduta, ou seja, o dano produzido em outrem decorreu inexoravelmente da sua conduta não condizente com aquela necessária, exigida pela ética e pelo conhecimento científico do profissional e, em desacordo com as normas legais que disciplina seu procedimento.

“O que efetivamente ninguém duvida é que o diploma de médico não significa passaporte para a impunidade. No início do século, um dos luminares da Medicina Legal brasileira, Souza Lima, já afirmava que no Brasil a condescendência quase ilimitada, para com os médicos poderia levar à grande inconveniência de ver firmado na opinião pública o errôneo e pernicioso preconceito de que o diploma de médico lhe confere o privilégio da irresponsabilidade”.

6.4. Ato médico: obrigação de meio ou de resultado?

Os médicos, como profissionais liberais e em razão das incertezas da ciência médica, não são obrigados a entregar resultado em suas intervenções. Mesmo nos casos de intervenções cirúrgicas de natureza estética não há o dever de resultado – a matéria é controvertida na doutrina e jurisprudência. Portanto, o ato médico é considerado como sendo obrigação de meio e não de resultado. O médico não é obrigado a curar o paciente enfermo, mas tão somente de intervir no tratamento deste, utilizando todo seu conhecimento científico e não omitindo os deveres inerentes ao procedimento profissional.

As circunstâncias de cada paciente são pessoais e paradoxais. Cada enfermidade se manifesta de forma diferenciada em pacientes distintos, em razão da sua diferenciada estrutura biológica, bioquímica, genéticas, comportamentais, psiquico-sociais e outras que interferem em seu modus-vivendi. Cada organismo é um universo em que se encontram presentes múltiplos e complexos fatores, cabendo ao médico desvendar essa gama de informações, para estabelecer a conduta mais adequada e compatível com o resultado almejado.

Nesse quadro complexo, a obrigação do médico – entre os demais profissionais – se sobreleva, em razão desse quadro “caótico” que é o paciente enfermo, é de meio, jamais de resultado.

“Pelo o que se entende do ato médico, na sua complexidade e no seu aspecto conjuntural, a responsabilidade civil do profissional só pode comportar uma obrigação de meio ou de diligência, onde o próprio empenho do médico é o objeto do contrato, sem compromisso de resultado. Isso, é claro, não desobriga o médico de dedicar-se da melhor maneira e usa de todos os recursos necessários e disponíveis em favor do seu paciente”. (In Erro Médico, 2001, p. 96).

Portanto, pode-se concluir que a obrigação do profissional médico é de meio, competindo apenas o dever de cuidado e diligência no trato do paciente – mesmo no caso de aconselhamento quanto à necessidade de procurar os recursos de outro médico especializado, quando os seus recursos estiverem esgotados.

■ “A obrigação médica se coloca como uma obrigação de meio em regra. Assim, a intervenção cirúrgica para cura de miopia ou outro problema na vista adere a esta idéia. Entretanto, quando o profissional induz o paciente a este tipo de intervenção, garantindo-lhe a cura, e por isso descumprindo o dever de informar adequadamente, acaba transmudando o tipo de obrigação que passa a ser de resultado”. (In TJRJ – ADCOAS 4/56, Janeiro de 2003).

“A responsabilidade médica, embora contratual, é subjetiva e com culpa provada, não decorrendo de mero insucesso no diagnóstico ou no tratamento, seja clínico ou cirúrgico... apenas o erro grosseiro, que foge à normalidade, pode servir de fundamento ao dever de indenizar, exigindo-se não só a prova do mesmo, mas também da culpa em que incorreu o profissional” (In Ap. Cível 20016456 – 7ª Cam. Civ. – TJRJ – j, em 12.12.2000).

6.5. O RISCO DE DANO DO ATO MÉDICO.

Os profissionais da medicina são os que se sujeitam com mais freqüência a riscos de danos a outrem, em virtude da complexidade do corpo humano e da falibilidade humana. Todavia, neste caso, o erro médico por imprudência e negligência é escusável, o mesmo não ocorrendo em relação a imperícia que, neste caso, é absolutamente inescusável. Por esta razão, a exigência do CFM em exigir destes profissionais contínua atualização, em face da crescente evolução do conhecimento científico das ciências médicas.

Os danos ocasionados aos pacientes podem ter conseqüências traumáticas, ocasionando resultados extremos como agravamento do estado patológico, traumas materiais e psicológicos irreversíveis, morte e outras situações que podem comprometer o projeto de vida da vítima.

Segundo restou demonstrado, o risco de dano é na modernidade uma situação presente em todas as atividades humanas e, por conseqüência, o ordenamento jurídico adotou a TEORIA DO RISCO (Art. 927, par. Único CC) que neste caso se aplica ao Estado e as empresas jurídicas. Todavia, não é extensível aos profissionais liberais, segundo prescreve o par. 4º do artigo 14 do CDC.

A falibilidade do médico e da medicina é inquestionável. Os tribunais passaram a entender que a reparação civil do dano é feito indiscutível. Já afirmaram que, assim como é injusto o médico responder pela falibilidade da ciência ou por sua própria limitação, mais injusto seria deixar o paciente a sua própria sorte, quando, buscando um bem, encontrou um mal. Ou que se deixe abater sobre a vítima todo o peso do seu infortúnio”. (In Erro Médico 2001, p. 99).

Dessa forma, a prova técnica (PERICIAL) da culpabilidade do profissional médico torna-se imprescindível, em face do inadimplemento contratual do profissional. Todavia, em virtude das dificuldades na sua obtenção, os Tribunais invocam a culpa do médico em favor do paciente – hipossuficiente – o princípio da inversão desta prova – art. 6º, inciso VI do CDC.

DIREITO CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ERRO MÉDICO. OPERAÇÃO GINECOLÓGICA. MORTE DA PACIENTE. VERIFICAÇÃO DE CONDUTA CULPOSA DO MÉDICO-CIRURGIÃO. NECESSIDADE DE EXAME DE PROVA. SUMÚLA 7/STJ. DANOS MORAIS. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO. CONTROLE PELO STJ.

I – Dos elementos trazidos aos autos, concluiu o acórdão recorrido pela responsabilidade exclusiva do anestesista, que liberou, precocemente, a vítima para o quarto, antes de sua total recuperação, vindo ela a sofrer parada cardiorrespiratória no corredor do hospital, fato que a levou a óbito, após passar três anos em coma. A pretensão de responsabilizar, solidariamente, o médico cirurgião pelo ocorrido importa, necessariamente, em reexame do acervo fático-probatório da causa, o que é vedado em âmbito de

especial, a teor do enunciado 7 da Súmula desta Corte.

II – O arbitramento do valor indenizatório por dano moral se sujeita ao controle do Superior Tribunal de Justiça, podendo ser majorado quando se mostrar incapaz de punir adequadamente o autor do ato ilícito e de indenizar satisfatoriamente os prejuízos extrapatrimoniais sofridos. Recurso especial provido, em parte. (In STJ – REsp. 80.349/MG – Relator: Min.Castro Filho – Terceira Turma – julgado em 26.06.2007 – DOU de 24.09.2007, p. 297).

Na análise deste caso, resultou inequívoca a culpabilidade do anestesista em decorrência dos fatos narrados no acórdão. Todavia, o mesmo não se verificou em relação ao médico cirurgião – chefe da equipe. Neste caso, impunha-se comprovação da sua culpa – fato que não é permitido ao Tribunal recorrente analisar.

Em situações semelhantes em que se notabiliza a negligência do profissional, Miguel Kfouri Neto[108] narram evidências a demonstrar de forma inequívoca a responsabilidade do profissional médico: “É negligente o médico clínico que deixa de dar o devido encaminhamento a paciente que necessita de urgente intervenção cirúrgica. Há erro grosseiro quando o clínico, sem identificar os sintomas de apendicite aguda, desconsidera sintomas evidentes e revela absoluto descaso pelo doente, já internado. Outro médico, solicitado pela enfermagem, ao se deparar com o quadro desfavorável ao paciente, removeu o apendicite, já perfurado e supurado. Sobrevieram peritonite e a morte do paciente”.

6.6. A NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO MÉDICO.

A responsabilidade do médico é de natureza contratual – essa questão já se encontra atualmente pacificada na legislação, doutrina e jurisprudência.

Na ótica de Miguel Kfouri Neto[109], “A jurisprudência tem sufragado o entendimento de que, quando o médico atende a um paciente, estabelece-se entre ambos um verdadeiro contrato. A responsabilidade médica é de natureza contratual. Contudo, o fato de considerar como contratual a responsabilidade médica não tem, ao contrário do que poderia parecer, o resultado de presumir a culpa. O médico não se compromete a curar, mas a proceder de acordo com as regras e os métodos da profissão”.

A esse respeito, a lição de Analdo Rizzardo[110] é elucidadora quando dispõe: “O contrato entre o médico e o paciente possui, dentre outros, dois ingredientes especiais: o médico aceita a incumbência de tratar o paciente, e assume a responsabilidade pelo tratamento que administra, exigindo-se dele a aplicação e o conhecimento adequado das técnicas usuais disponíveis. De realce dois elementos necessários para inferir a responsabilidade: a aferição dos sintomas para chegar ao exato diagnóstico, e a adoção da terapêutica recomendada pela ciência médica”.

Nestas condições poderemos concluir que não é o contrato que gera a responsabilidade do profissional médico, senão o descumprimento de determinadas regras de condutas – INDISPENSÁVEIS DE SEREM EVITADAS, NESSA MODALIDADE DE RELAÇÃO OBRIGACIONAL

Nessa linha de idéias, Arnaldo Rizzardo[111] proclama: “Não está o médico proibido de errar. Nem sempre o erro acarreta a responsabilidade. Não pode, porém, errar por culpa, isto é, por açodamento, por ligeireza, por falta de estudo, por carência de exames, por despreparo técnico, dentre outros múltiplos fatores”.

O Código de Ética Médica de 1988, em seu artigo 28 veda ao médico: “Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência”.

O contrato médico, portanto, não obriga o médico a curar o paciente – mas a de empregar toda a sua diligência e conhecimento científico, na obtenção da cura.

Assim, na perspectiva de Arnaldo Rizzardo[112], “A inadimplência somente desponta se faltarem a atenção, a ciência própria para aquele ato realizado, o cuidado e a diligência que eram de se esperar, a capacidade exigida para o ato realizado”.

Exemplo clássico de extrema negligência está no esquecimento de instrumento e outros materiais no interior do corpo, quando da cirurgia: “Cabe ação de indenização pelo grave erro médico, esquecendo-se compressa cirurgia na cavidade abdominal, mais tarde provocando a morte do paciente”. (In TJRJ - ADCOAS 31/483 – 31.08.2003).

Portanto, sendo contrato de prestação de serviço em que se destaca a atividade meramente científica, somente poderá ocorrer inadimplemento nos casos em que restar comprovado o comportamento desidioso, imprudente ou imperito do profissional. Nesse caso, cumpre observar a lição de DIREITO/CAVALIERI FILHO[113] que assinalam: “Há quem mencione o erro profissional como insuscetível de acarretar a responsabilidade do médico. Esse seria quando a conduta médica é correta, mas a técnica empregada incorreta, havendo imperícia quando a técnica é correta, contudo, a conduta é incorreta, vinculando-se o primeiro à falibilidade humana, aquilo que um homem normal poderia cometer, considerando o caso concreto”.

O entendimento do STJ nesse caso haure-se no voto do relator do processo no seguinte caso: “EMENTA: Erro médico. Complicações resultantes de pós-operatório. Seqüelas irreparáveis que levaram a autora a ser indenizada pela incapacidade laborativa. Dano moral.

Não se concebe, muito menos se deve tolerar, no estágio atual da medicina, o descuido, a negligência ou a incompetência médica e hospitalar às regras da sua arte e finalidade, respectivamente, com isso comprometendo a vida ou a saúde dos pacientes. Tais condutas ou omissões geram, inequivocadamente, responsabilidade civil com a recomposição econômica, ainda que mínimo o grau de descúria ou culpa, dentro dos limites estabelecidos pela lei em face do dano causado aos pacientes”. (In STJ – REsp. 25.507/MG – 2ª Turma – julgado em 17.10.1994 – DJU 13.02.1995).

ERRO MÉDICO – DANOS MORAIS.

EMENTA: 1. A jurisprudência da 3ª Turma admite sejam indenizados, separadamente, os danos morais e os danos estéticos oriundos do mesmo fato. Ressalva do entendimento do relator.

2. As seqüelas físicas decorrentes do ato ilícito, mesmo que não sejam visíveis de ordinário e, por isso, não causem repercussão negativa na aparência da vítima, certamente provocam intenso sofrimento. Desta forma, as lesões não precisam estar expostas a terceiros para que sejam indenizáveis, pois o que se considera para os danos estéticos é a degradação da integridade física da vítima, decorrente do ato ilícito. Danos Morais – R$. 150.000,00. (STJ – REsp. 899.869/MG – 3ª. Turma – Relator: Min. Humberto Gomes de Barros – julgado em 13.02.2007 – DJU 26.03.2007, p. 242).

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ERRO MÉDICO. DIAGNÓSTICO DE GESTAÇÃO GEMELAR. EXISTÊNCIA DE UM ÚNICO NASCITURO. DANO MORAL CONFIGURADO. EXAME. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I - O exame ultrassonográfico para controle de gravidez implica em obrigação de resultado, caracterizada pela responsabilidade objetiva. II - O erro no diagnóstico de gestação gemelar, quando existente um único nascituro, resulta em danos morais passíveis de indenização. (In STJ - AgReg no Ag 744181/RN – RELATOR: Min. SIDNEI BENETTI – Julgado em 11.11.2008 – 3ª. Turma – DJU de 26.11.2008).

6.7. RESPONSABILIDADE PENAL E CIVIL DO MÉDICO.

FUNDAMENTOS JURÍDICOS. As responsabilidades civil e penal são independentes, conforme prescreve o artigo 935 do CCB. Para Afrânio Lyra, “a responsabilidade penal é perante a sociedade. A responsabilidade civil, conquanto fundada também no interesse social, é perante o lesado”.

Segundo preleciona Arnaldo Rizzardo[114], “o ilícito penal revela um teor ofensivo superior que o civil, derruindo de maior relevância, e impondo efeitos nefastos e de nocividade em nível mais elevado que as infrações civis”.

Uma conduta pode, portanto, acarretar violação tanto civil como penal, trazendo dessa forma uma dupla ilicitude – enquanto que a primeira se preocupa com a condenação pessoal do ofensor, a segunda com os danos produzidos, respondendo o patrimônio do lesionador pelos danos advindos dessa situação.

Todavia, para se evitar decisões contraditórias nas duas jurisdições, o legislador teve o cuidado de declarar a independência de ambas, com o propósito de assegurar decisões finais que guardem relação entre elas.

Para Carlos Roberto Gonçalves[115], “o Código estabeleceu, assim, na primeira parte do dispositivo (artigo 935) a independência da responsabilidade civil da responsabilidade criminal, pois diversos são os campos de ação da lei penal e da lei civil. Mas a segunda parte mostra que tal separação não é absoluta e que o sistema adotado é o da independência relativa”.

O artigo 91, inciso I do Código Penal, considera como um dos efeitos da condenação criminal, “TORNAR CERTA A OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR O DANO CAUSADO NO CRIME”.

Os artigos 63/67 e 93 do Código de Processo Penal assinalam que não mais poderá ser questionado na esfera cível quem seja o autor ou a existência do fato.

No mesmo sentido o artigo 63 do Código Penal e artigo 584, II do CPC consideram titulo exeqüível a sentença condenatória criminal de dano. Por sua vez, o artigo 64 parágrafo único do Código de Processo Penal, autoriza a suspensão da ação cível até decisão final da sentença condenatória criminal.

“Em ação de indenização decorrente de acidente de veículos em que o culpado foi condenado criminalmente, reconheceu-se a obrigação do proprietário de reparar o dano, afirmando-se expressamente que um dos efeitos da condenação é tornar certa a obrigação de indenizar, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato quanto esta já se acha decidida no crime – RT 513/265”.

Portanto, pode-se deduzir, segundo a lição de Carlos Roberto Gonçalves[116], “a parte interessada, se quiser, poderá promover a ação para a satisfação do dano apenas na sede civil. Se houver sentença penal condenatória com trânsito em julgado, em face da influência que tal decisão exerce no cível, será ela exeqüível na jurisdição civil, onde não mais se discutirá o an debeatur (se deve) e sim o quantum debeatur (quanto deve). Se proposta, a ação civil, estiver em curso a ação penal, deverá o juiz do cível sobrestar o andamento da primeira”.

Neste caso, o juiz cível não está obrigado a suspender, já que se trata de mera faculdade prevista no artigo 110 do Código de Processo Civil, segundo, aliás, orientação jurisprudencial nesse particular aspecto:

“A suspensão do feito civil, quando em curso ação penal versando sobre o mesmo substrato fático, encerra mera faculdade, segundo critério de conveniência, havendo meios processuais que asseguram a possibilidade de, caso proclamado, em sede criminal, juízo de certeza quanto à autoria e à materialidade, fazê-lo prevalecer sobre eventual pronunciamento decisório conflitante proferido na esfera cível”. (in REsp. 33200-SP/STJ – 4ª. Turma – DJU de 15.05.1995).

É possível, no entanto, a satisfação do dano na própria esfera penal, segundo previsão contida nos artigos 118 e seguintes do Código de Processo Penal. No mesmo sentido, é admissível a composição do delito perante o Juizado Especial Criminal.

De qualquer forma, poderemos considerar para os efeitos da aplicação da regra inserta no artigo 935 do Código Civil, as seguintes hipóteses relacionadas com a independência relativa das decisões proferidas na esfera criminal – a saber:

• A sentença criminal de condenação não permite discussão no juízo da reparação do dano;

• A sentença penal de absolvição, se fundada na negativa do fato ou na negativa de que o indigitado responsável foi o seu autor, tem eficácia absoluta no cível, trancando, aí, qualquer discussão a respeito;

• A sentença penal fundada em falta de prova, na circunstância de não constituir crime o fato de que resultou o dano, na de estar prescrita a condenação, enfim, em qualquer motivo peculiar à instância criminal quanto às condições de imposição de suas sanções, não exerce nenhuma influência no cível;

• A sentença penal, fundada em dirimente ou justificativa, não influi no juízo civil senão quando estabeleça a culpa do ofendido, que, nesse caso, sofre as conseqüências do seu procedimento. Não é, portanto, o ato do autor do dano em si, que, coberto por dirimente ou justificativa, desautoriza a obrigação de reparar; é a culpa do ofendido que, conjugada àquele, determina a irresponsabilidade.

De acordo com a regra prevista no artigo 386 do Código de Processo Penal: “o juiz absolverá o réu, mencionando a causa da parte dispositiva, desde que reconheça”:

I – estar provada a inexistência do fato;

II – não haver prova da existência do fato;

III – não constituir o fato infração penal;

IV – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal:

V – existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena (artigos 17, 18, 19, 22 e 24, par. 1º do CP).

VI – não existir prova suficiente para condenação.

Todavia, “conforme o fundamento da absolvição, a sentença criminal produzirá ou não efeitos de coisa julgada no cível, isto é, fechará ou não as portas do cível para o pedido de ressarcimento do dano. Toda vez que ela se basear em “falta de prova” (incisos II, IV e VI), nenhum efeito produzirá em juízo cível, porque a vítima poderá produzir no cível as provas que faltaram no processo-crime”, segundo ensina Rui Stoco[117].

Assim, as decisões de nossos Tribunais têm pautado pelas seguintes orientações, no caso de conflito entre decisões na esfera cível e penal.

“A culpa tanto pode ser civil como penal. A responsabilidade civil não depende da criminal. Conquanto haja condenação penal, tal não impede se reconheça, na ação civil, a culpa concorrente da vítima. O que o artigo 1.525 do Código Civil (atual 935) impede é que se questione sobre a existência do fato e de sua autoria”. (In STJ – REsp. – Rel. Min. Nilson Naves – Bol. STJ 4, p. 14).

A responsabilidade civil independe da responsabilidade penal consoante prescreve o artigo 935 do CC. Todavia, não se trata de responsabilidade absoluta e sim relativa.

“Na doutrina penal, quando se julga a responsabilidade do médico enquanto pessoa, tem prevalecido a teoria subjetiva da culpa, onde o agente não quer o resultado nem assume o risco de produzi-lo, tendo no entanto dado origem a um resultado atípico e indesejado por negligência, imprudência ou imperícia”(GOMES, Julio César Meirelles, ERRO MÉDICO, 2001, p. 145).

Os médicos, enquanto profissionais da saúde se enquadram nas regras gerais, a exemplo dos demais profissionais da área – dentistas, farmacêuticos e enfermeiros – do Código Penal, tais como, crime de lesões corporais (art. 129 CP), induzir ou instigar o suicídio (art. 122 CP), expor a vida ou a saúde de outrem a perigo (art. 132 CP), praticar aborto (art. 126/127 CP), dentre outros.

TIPOLOGIA DOS CRIMES PROFISSIONAIS – MÉDICOS, ENFERMEIROS, DENTISTAS E FARMACÊUTICOS.

• Deixar de denunciar doença de notificação compulsória.

• Fornecer atestado falso (de saúde, de doença e de óbito.

• Omitir socorro (não atender emergência ou urgência).

• Provocar aborto.

• Induzir ou auxiliar suicídio.

• Ofender a integridade corporal ou a saúde.

• Expor a vida ou a saúde a perigo direto ou indireto.

• Caluniar, difamar ou injuriar.

• Revelar segredo médico – sem justa causa.

• Causar epidemia pela propagração de germes patogênicos.

• Anunciar a cura por meio secreto e ou infalível.

• Fazer afirmação falsa – como perito.

• Usar meio fraudulento pare desviar cliente de outrem.

• Promover a concorrência desleal.

• Anunciar título ou distinção que não detém.

6.8. A TEORIA DO CONSENTIMENTO INFORMADO.

O artigo 15 do Código Civil de 2002 inovou sobre a TEORIA DO CONSENTIMENTO INFORMADO, situação anteriormente inexistente no Código anterior de 1916. Trata-se de uma situação que atende ao principio da autonomia ou da liberdade, onde todo individuo tem por consagrado o direito de ser autor do seu próprio destino e de optar pelo rumo que quer dar a sua vida.

■ Artigo 15º do CC/2002: “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”.

“É fundamental que o paciente seja informado pelos médicos sobre a necessidade de determinadas condutas ou intervenções e sobre os riscos ou suas conseqüências. Mesmo que o paciente seja menor de idade ou incapaz e que seus pais ou responsáveis tenham tal conhecimento, ele tem o direito de ser informado e esclarecido, principalmente a respeito das precauções essenciais. O ato médico não implica num poder excepcional sobre a vida ou a saúde do paciente. O dever de informar é imperativo como requisito prévio para o consentimento”. (In GOMES, Júlio César Meirelles, Erro Médico, 2001, p.164).

“Sempre que houver mudanças significativas nos procedimentos terapêuticos deve-se obter o consentimento continuado, pois a permissão dada anteriormente tinha tempo e atos definidos (principio da temporalidade). Admite-se também que em qualquer momento da relação profissional o paciente tem o direito de não mais consentir certa prática ou conduta, mesmo já consentida por escrito, revogando assim a permissão outorgada (principio da revogabilidade). O CONSENTIMENTO NÃO É UM ATO INEXORÁVEL E PERMANENTE”. (in GOMES, Júlio César Meirelles, Erro Médico, 2001, p.164).

■ “A obrigação médica se coloca como uma obrigação de meio em regra. Assim, a intervenção cirúrgica para cura de miopia ou outro problema na vista adere a esta idéia. Entretanto, quando o profissional induz o paciente a este tipo de intervenção, garantindo-lhe a cura, e por isso descumprindo o dever de informar adequadamente, acaba transmudando o tipo de obrigação que passa a ser de resultado”. (In TJRJ – ADCOAS 4/56, Janeiro de 2003).

■ EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO. CONSENTIMENTO INFORMADO. A despreocupação do facultativo em obter do paciente seu consentimento informado pode significar - nos casos mais graves - negligência no exercício profissional. As exigências do PRINCÍPIO DO CONSENTIMENTO INFORMADO devem ser atendidas com maior zelo na medida em que aumenta o risco, ou o dano. Recurso conhecido. (STJ - REsp 436827/SP – 4ª Turma – Relator: Min. Ruy Rosado de Aguiar - Julgado em 01.10.2002 – DJU de 18.11.2002, p. 228 – RSTJ 168/405)

COMENTÁRIO SOBRE O NOVO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA EDITADO PELO CFM.

“O consentimento informado (quando o paciente expressa por escrito a autorização para a realização de algum procedimento) adquire maior importância na relação médico-paciente e entra pela primeira vez no código. A autonomia prevalece, no entanto, somente quando o paciente não tem risco de morte iminente. ‘O médico privilegiará a escolha do paciente, mas o risco de morte tem uma interpretação subjetiva’, pondera Roberto D’Ávila, coordenador da comissão responsável pela revisão do Código”. (FOLHA DE SÃO PAULO – Caderno A16-Brasil – 30 de agosto de 2009 – Domingo).

EMENTA: CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CIRURGIA PLÁSTICA. DANO MORAL. O médico que deixa de informar o paciente acerca dos riscos da cirurgia incorre em negligência, e responde civilmente pelos danos resultantes da operação. Agravo regimental não provido. (In STJ – AgRg no AgI 818.144/SP – Relator: Min. Ari Pargendler – 3 Turma – Julg. Em 09.10.2007 – DJU de 05.11.2007, p. 264).

Todavia, é curial destacar que o simples fato do médico obter do paciente o consentimento depois de devidamente informado, não subtrai deste o direito a indenização desde que comprovada a negligência, a imperícia ou a imprudência do profissional no trato médico.

O que não poderá ocorrer, é o paciente ingressar com ação de responsabilidade civil do profissional de saúde, não obstante tenha sido informado dos riscos e conseqüências advindas da intervenção do médico, tais como seqüelas naturalmente advindas da intervenção cirúrgica, cicatrizes, restrições físicas, queloides, dentre outras, desde que devidamente cientificadas ao paciente.

6.9. A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS HOSPITAIS E PLANOS DE SAÚDE.

Quanto à responsabilidade dos hospitais, se trata de culpa objetiva, segundo proclamado pelo artigo 927, parágrafo único combinado com os artigos 931, 932, III e artigo 933 do CCB-2002. Unicamente pelos serviços prestados por médicos que o hospital contratou, ou que integra o seu corpo clínico na qualidade de funcionário ou empregado, incide a responsabilidade.

“O hospital é uma universalidade de fato, formado por um conjunto de instalações, aparelhos, instrumentos médicos e cirúrgicos destinados ao tratamento da saúde vinculada a uma pessoa jurídica, sua mantenedora, mas que não realiza ato médico. Quando se fala em hospital a referência é da pessoa jurídica que o mantém”. (Ruy Rosado de Aguiar Junior, Revista dos Tribunais, 718/33).

O hospital responderá pela infecção hospitalar em razão da LEI NÚMERO 9.431/97, que torna obrigatório ao hospital manter em sua estrutura o PROGRAMA DE CONTROLE DE INFECÇÃO HOSPITALAR – PCIH, pela deficiência de exames laboratoriais, pela farmácia hospitalar.

No caso de infecção hospitalar quem responderá será o hospital e não o médico, salvo se restar demonstrado que a infecção se originou por culpa do esculápio.

Para o Min. Ruy Rosado de Aguiar Junior do STJ, “o hospital responde pelo dano produzido pelas coisas, tais como, instrumentos, aparelhos e outros utilizados na prestação dos seus serviços”.

Quanto aos planos de saúde, já se decidiu que, “a empresa locadora direta dos serviços médico-hospitalares, credenciando médicos e nosocômios para suprir as deficiências de seus próprios serviços, compartilha da responsabilidade civil dos profissionais e hospitais que seleciona”. Na hipótese, reconheceu-se a responsabilidade solidária da operadora plano de saúde e do hospital, ambos credenciados – TJSP – Ap. 67.929.4-SP – j.em. 16.03.1999.

“Quem se compromete a prestar assistência médica por meios de profissionais que indica, é responsável pelos serviços que estes prestam”. (In STJ – REsp. 138.059/MG – 3ª Turma – DJU 11.06.2001).

“A deficiência dos serviços custeados pelo plano de saúde acarreta a responsabilidade dos patrocinadores ou titulares, juntamente com os que prestam os serviços ligados, à saúde, desde que obrigado o associado a escolher os profissionais, os hospitais, os ambulatórios e laboratórios que estão relacionados na lista da operadora, e que são os indicados ou credenciados para a realização do serviços ligados à saúde”. (In RIZZARDO, Arnaldo, Responsabilidade Civil, 2007, p. 631).

No caso dos planos de saúde, não há qualquer validade jurídica as cláusulas de prévia antecedência no pedido de internamento, bem como, aquelas que limitam internações e ou restrições nos procedimentos médicos e ou discriminações em tratamentos médico-hospitalares, em face do disposto na Lei número 9.656/98.

“A recusa de internação da apelada, que estava grávida e foi obrigada a procurar atendimento em hospital público, onde se constatou a ocorrência de aborto espontâneo, configura dano moral, que impõe o dever de indenizar”. (In TJRJ – 18ª Cam. Civ. – Ap. Civ. Número 3376/2002).

“Descabe a pretendida liberação da responsabilidade de indenizar, o autor, quando a empresa se compromete a prestar serviços do mais alto gabarito, deixando-o a mercê de profissional conveniado que não o atende em situação de urgência, obrigando-o a utilizar os préstimos de outro, não conveniado, para realização de cirurgia de emergência”. (In TAPR – Apel. Civ. 0151296-7 – 6ª Cam. Civ. – DJE 11.10.2001 ou ADCOAS 20/312).

Portanto, o PLANO DE SAÚDE responde integralmente pelos danos ocorridos com o paciente decorrentes da má prestação dos serviços de profissionais que indicou ou dos estabelecimentos hospitalares que atuaram negligentemente na prestação do serviço.

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|AGRAVO INTERNO - AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - ERRO MÉDICO - EMPRESA PRESTADORA DO PLANO |

|DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE LEGITIMIDADE PASSIVA. |

|A empresa prestadora do plano de assistência à saúde é parte legitimada passivamente para ação indenizatória proposta por associado |

|em decorrência de erro médico por profissional por ela credenciado. (In STJ – AgRg no Ag 682.875/RJ – Relator: Min. Paulo Furtado |

|(Desembargador convocado do TJBA – 3ª. Turma – julgado em 15.09.2000 – DJU 15.10.2009). |

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|AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA DE COOPERATIVA DE |

|TRABALHOS MÉDICOS. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO COM APLICAÇÃO DE |

|MULTA. |

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|1. A jurisprudência da Casa é tranqüila em reconhecer a legitimidade passiva da cooperativa médica em demanda que se discute |

|responsabilidade civil por suposto erro médico, pois a cooperativa tem por objeto a assistência médica e celebra contrato com seus |

|associados, regulamentando a prestação de seus serviços de maneira padronizada, por meio dos médicos e hospitais a ela filiados. |

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|Improvido o regimental, com aplicação de multa de 1%. (In STJ – REsp. 1.029.043/SP – 4ª Turma – Relator: Min. Luis Felipe Salomão - |

|Julg. Em. 12.05.2009 - DJU 08.06.2009). |

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O STJ deu provimento a recurso especial interposto pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra a cláusula de exclusividade dos profissionais cooperados na Unimed Santa Maria A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça Sociedade Cooperativa de Serviços Médicos. Para o STJ, que reformou decisão anterior do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), a exigência inviabilizava a livre concorrência na área de Medicina em 23 municípios da região Centro-Sul do Rio Grande do Sul – entre eles Santa Maria, Alegrete e Santana do Livramento.

O relator do recurso no STJ, ministro Humberto Martins, entendeu que o sistema de cooperativismo não escapa ao princípio constitucional de livre concorrência. Para o magistrado, a “cooptação de parte significativa da mão-de-obra” da região de Santa Maria feita pela Unimed não se respaldada pelas normas jurídicas concorrenciais.

Em seu voto, Humberto Martins afirmou que a exigência de exclusividade inviabiliza a entrada de concorrentes na área de atuação, “denotando uma dominação artificial de mercado”. Para o ministro, o caso trata da “relevância geográfica do mercado, uma vez que o impacto da lesão à livre concorrência abrange um ou alguns municípios com baixo índice populacional”.(In STJ – Resp. 1172603/RS – 2ªTurma – Relator: Min. Humberto Martins – julgado em 05.03.2010).

6.10. A ORIENTAÇÃO PREDOMINANTE DAS DECISÕES DOS TRIBUNAIS.

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|EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. CIRURGIA PLÁSTICA. ERRO MÉDICO. DEFEITO NO |

|SERVIÇO PRESTADO. CULPA MANIFESTA DO ANESTESISTA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO CHEFE DA EQUIPE E DA CLÍNICA. |

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|1. O Tribunal a quo manifestou-se acerca de todas as questões relevantes para a solução da controvérsia, tal como lhe fora posta |

|e submetida. Não cabe alegação de violação do artigo 535 do CPC, quando a Corte de origem aprecia a questão de maneira |

|fundamentada, apenas não adotando a tese da recorrente. Precedentes. |

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|2. Em regra, o cirurgião chefe dirige a equipe, estando os demais profissionais, que participam do ato cirúrgico, subordinados às|

|suas ordens, de modo que a intervenção se realize a contento. |

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|3. No caso ora em análise, restou incontroverso que o anestesista, escolhido pelo chefe da equipe, agiu com culpa, gerando danos |

|irreversíveis à autora, motivo pelo qual não há como afastar a responsabilidade solidária do cirurgião chefe, a quem estava o |

|anestesista diretamente subordinado. |

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|4. Uma vez caracterizada a culpa do médico que atua em determinado serviço disponibilizado por estabelecimento de saúde (art. 14,|

|§ 4º, CDC), responde a clínica de forma objetiva e solidária pelos danos decorrentes do defeito no serviço prestado, nos termos |

|do art. 14, § 1º, CDC. |

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|5. Face as peculiaridade do caso concreto e os critérios de fixação dos danos morais adotados por esta Corte, tem-se por razoável|

|a condenação da recorrida ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a título de danos morais. |

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|6. Recurso especial conhecido em parte e, nesta parte, provido. (In STJ – REsp. REsp 605.435/RJ – Relator: Min. João Otávio de |

|Noronha – 4ª Turma – j. em. 22.09.2009 – DJU 16.11.2009. |

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|EMENTA: RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS - ERRO MÉDICO - MORTE DE PACIENTE DECORRENTE DE COMPLICAÇÃO CIRÚRGICA –|

|OBRIGAÇÃO DE MEIO - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO MÉDICO - ACÓRDÃO RECORRIDO CONCLUSIVO NO SENTIDO DA AUSÊNCIA DE CULPA E DE NEXO DE|

|CAUSALIDADE - FUNDAMENTO SUFICIENTE PARA AFASTAR A CONDENAÇÃO DO PROFISSIONAL DA SAÚDE - TEORIA DA PERDA DA CHANCE - APLICAÇÃO NOS |

|CASOS DE PROBABILIDADE DE DANO REAL, ATUAL E CERTO, INOCORRENTE NO CASO DOS AUTOS, PAUTADO EM MERO JUÍZO DE POSSIBILIDADE - RECURSO |

|ESPECIAL PROVIDO. |

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|I - A relação entre médico e paciente é contratual e encerra, de modo geral (salvo cirurgias plásticas embelezadoras), obrigação de |

|meio, sendo imprescindível para a responsabilização do referido profissional a demonstração de culpa e de nexo de causalidade entre a|

|sua conduta e o dano causado, tratando-se de responsabilidade |

|subjetiva; |

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|II - O Tribunal de origem reconheceu a inexistência de culpa e de nexo de causalidade entre a conduta do médico e a morte da |

|paciente, o que constitui fundamento suficiente para o afastamento da condenação do profissional da saúde; |

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|III - A chamada "teoria da perda da chance", de inspiração francesa e citada em matéria de responsabilidade civil, aplica-se aos |

|casos em que o dano seja real, atual e certo, dentro de um juízo de probabilidade, e não de mera possibilidade, porquanto o dano |

|potencial ou incerto, no âmbito da responsabilidade civil, em regra, |

|não é indenizável; |

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|IV - In casu, o v. acórdão recorrido concluiu haver mera possibilidade de o resultado morte ter sido evitado caso a paciente tivesse |

|acompanhamento prévio e contínuo do médico no período pós-operatório, sendo inadmissível, pois, a responsabilização do |

|médico com base na aplicação da "teoria da perda da chance"; |

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|V - Recurso especial provido. (In STJ – REsp. 1.104.665/RS – 3ª Turma – Relator: Min. Massami Yueda – j. em. 09.06.2009 - DJU |

|04.09.2009 |

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|EMENTA: DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL - ERRO MÉDICO. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. ARTIGO 131 DO CÓDIGO CIVIL. |

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|1. O sistema processual civil abraça o princípio do livre convencimento motivado, que, inclusive está positivado no artigo 131 do |

|Código de Processo Civil, impondo ao julgador a indicação dos motivos de suas conclusões. Na hipótese em que a ação proposta tem |

|sustentação na existência de erro médico, uma vez que realizada perícia, deve o julgador indicar os motivos pelos quais resolve |

|concluir pela obrigação de indenizar, tomando posição oposta às conclusões do perito, mormente quando outras provas não existem nos |

|autos. |

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|2. A responsabilidade do médico pressupõe o estabelecimento do nexo causal entre causa e efeito da alegada falta médica, tendo em |

|vista que, embora se trate de responsabilidade contratual – cuja obrigação gerada é de meio -, é subjetiva, devendo ser comprovada |

|ainda a culpa do profissional. 3. Recurso especial provido. (In STJ – REsp. 1078057/MG – Turma – Relator: Min. João Otávio Noronha –|

|j. em. 10.02.2009 – DJU 26.02.2009 - RSTJ, 214/254). |

6.10. ESTUDOS DE CASOS CONCRETOS.

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|EMENTA: RECURSO ESPECIAL DE JPGB E OUTROS. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ERRO MÉDICO. HOSPITAL MUNICIPAL. |

|AMPUTAÇÃO DE BRAÇO DE RECÉM-NASCIDO. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM FAVOR |

|DOS PAIS E IRMÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. |

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|1. É possível a cumulação de indenização por danos estético e moral, ainda que derivados de um mesmo fato, desde que um dano e |

|outro possam ser reconhecidos autonomamente, ou seja, devem ser passíveis de identificação em separado. Precedentes. |

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|2. Na hipótese dos autos, em Hospital Municipal, recém-nascido teve um dos braços amputado em virtude de erro médico, decorrente |

|de punção axilar que resultou no rompimento de veia, criando um coágulo que bloqueou a passagem de sangue para o membro |

|superior. |

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|3. Ainda que derivada de um mesmo fato - erro médico de profissionais da rede municipal de saúde -, a amputação do braço direito |

|do recém-nascido ensejou duas formas diversas de dano, o moral e o estético. O primeiro, correspondente à violação do direito à |

|dignidade e à imagem da vítima, assim como ao sofrimento, à |

|aflição e à angústia a que seus pais e irmão foram submetidos, e o segundo, decorrente da modificação da estrutura corporal do |

|lesado, enfim, da deformidade a ele causada. |

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|4. Não merece prosperar o fundamento do acórdão recorrido no sentido de que o recém-nascido não é apto a sofrer o dano moral, por|

|não possui capacidade intelectiva para avaliá-lo e sofrer os prejuízos psíquicos dele decorrentes. Isso, porque o dano moral não |

|pode ser visto tão-somente como de ordem puramente psíquica - dependente das reações emocionais da vítima -, porquanto, na atual |

|ordem jurídico-constitucional, a dignidade é fundamento central dos direitos humanos, devendo ser protegida e, quando violada, |

|sujeita à devida reparação. (In STJ – REsp. 910.794/RJ – 1ª Turma – Relator: Min. Denise Arruda – j. em. 21.10.2008 – DJU |

|04.12.2008 – RSTJ 213/155). |

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|EMENTA: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NEGLIGÊNCIA. INDENIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. |

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|1. A doutrina tem afirmado que a responsabilidade médica empresarial, no |

|caso de hospitais, é objetiva, indicando o parágrafo primeiro do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor como a norma |

|sustentadora de tal entendimento. Contudo, a responsabilidade do hospital somente tem espaço quando o dano decorrer de falha de |

|serviços cuja atribuição é afeta única e exclusivamente ao hospital. Nas hipóteses de dano decorrente de falha técnica restrita |

|ao profissional médico, mormente quando este não tem nenhum vínculo com o hospital – seja de emprego ou de mera preposição –, não|

|cabe atribuir ao nosocômio a obrigação de indenizar. |

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|2. Na hipótese de prestação de serviços médicos, o ajuste contratual – vínculo estabelecido entre médico e paciente – refere-se |

|ao emprego da melhor técnica e diligência entre as possibilidades de que dispõe o profissional, no seu meio de atuação, para |

|auxiliar o paciente. Portanto, não pode o médico assumir compromisso com um resultado específico, fato que leva ao entendimento |

|de que, se ocorrer dano ao paciente, deve-se averiguar se houve culpa do profissional – teoria da responsabilidade subjetiva. No |

|entanto, se, na ocorrência de dano impõe-se ao hospital que responda objetivamente pelos erros cometidos pelo médico, estar-se-á |

|aceitando que o contrato firmado seja de resultado, pois se o médico não garante o resultado, o hospital garantirá. Isso leva ao |

|seguinte absurdo: na hipótese de intervenção cirúrgica, ou o paciente sai curado ou será indenizado – daí um contrato de |

|resultado firmado às avessas da legislação. |

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|3. O cadastro que os hospitais normalmente mantêm de médicos que utilizam suas instalações para a realização de cirurgias não é |

|suficiente para caracterizar relação de subordinação entre médico e hospital. Na verdade, tal procedimento representa um mínimo |

|de organização empresarial. |

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|4. Recurso especial do Hospital e Maternidade São Lourenço Ltda. provido. (In STJ – REsp. 908.359/SC – Relator: Min. Nancy |

|Andrighi e Relator do Acórdão: Min. João Otávio Noronha – 2ª Seção - jul. em. 27.08.2008 - DJU 17.12.2008). |

MÓDULO DIDÁTICO VI – TEXTO COMPLEMENTAR.

DO DANO E SUA REPARAÇÃO.

5.1. Modos de reparação. 5.2. O dever de indenizar. 5.3. O dano emergente e o lucro cessante. 5.4. Dano patrimonial direto e indireto. 5.5. Direito de personalidade. 5.6. Dano ao corpo. 5.7. Dano estético. 5.8. Lesão à integridade intelectual e moral. 5.9. Dano Moral. Conceitos, natureza jurídica. Reparabilidade do Dano Moral. Orientação da doutrina e da jurisprudência brasileira

5.1. DO DANO E SUA REPARAÇÃO – MODOS DE REPARAÇÃO. Dano, em sentido amplo, segundo preleciona Agostinho Alvim, vem a ser a lesão de qualquer bem jurídico, e aí se inclui o dano moral.

Para Jose de Aguiar Dias[118], “o dano é, dos elementos necessários à configuração da responsabilidade civil, o que suscita menos controvérsia. Com efeito, a unanimidade dos autores convém em que não pode haver responsabilidade sem a existência de um dano, resultando a responsabilidade civil na obrigação de ressarcir, logicamente não pode concretizar-se onde nada há que reparar”.

Segundo Henri Lalou – “não há responsabilidade onde não existe prejuízo”.

Indenizar significa reparar o dano causado à vítima, integralmente. Se possível, restaurando o statu quo ante, isto é, devolvendo-se ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito.

O dano, que merece ser indenizado, há que ser atual e certo, não sendo possível a indenização dos danos hipotéticos ou remotos. O que deve existir uma possibilidade objetiva que resulte do curso normal das coisas, como se refere o advérbio razoavelmente colocado no artigo 402 do CCB.

“Somente os danos diretos e efetivos, por efeito imediato do ato culposo, encontram no Código Civil suporte de ressarcimento. Se dano não houver, falta matéria para a indenização. Incerto e eventual é o dano quando resultaria de hipotético agravamento da lesão”. (In RT 612/44).

Os danos são patrimoniais e extrapatrimoniais – sendo que ambos admitem reparação. O que predomina no âmbito da responsabilidade civil é o dever de reparar integralmente – que atende ao principio da restitutio in integrum. Essa disposição se encontra presente no artigo 402 do CCB-2002, bem como, no artigo 944 e 954 do Código Civil.

A I JORNADA DE DIREITO CIVIL/STJ - ENUNCIADO NÚMERO 46: “a possibilidade de redução do montante da indenização em face do grau de culpa do agente, estabelecida no parágrafo único do artigo 944 do novo Código civil, deve ser interpretada restritivamente, por representar uma exceção ao principio da reparação integral do dano, não se aplicando às hipóteses de responsabilidade objetiva”.

Assim, a certeza do dano refere-se à sua existência, e não à sua atualidade ou ao seu montante. Assim, um crime de lesões corporais que culmine com a mutilação da perna de um jogador de futebol é dano certo, com repercussões no futuro do jogador.

Poderá ainda ocorrer o dano reflexo ou em ricochete. Segundo leciona Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho[119], “trata-se do dano reflexo ou em ricochete, cujo estudo desenvolveu-se largamente o direito Francês. Conceitualmente, consiste no prejuízo que atinge reflexamente pessoa próxima, ligada à vítima direita da atuação ilícita”.

Para Carlos Roberto Gonçalves[120], “na liquidação do dano apura-se o quantum da indenização. A estimativa do dano emergente se processa com mais facilidade, porque é possível estabelecer-se com precisão o desfalque do patrimônio. Em se tratando, porém, de lucros cessantes, atuais ou potenciais, a razão e o bom senso – assinala Georgi – nos dizem que os fatos ordinariamente, são insuscetíveis de prova direta e rigorosa, sendo, igualmente, de ponderar-se que não é possível traçar regras, a não ser muito gerais a este respeito, o que dá lugar ao arbítrio do juiz na apreciação dos casos”.

O DEVER DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. Todo ato ilícito (artigo 186) que acarreta danos a outrem, obriga o ofensor a indenizar o prejuízo causado.

Assim, segundo preleciona Carlos Roberto Gonçalves[121], “ato ilícito é, portanto, fonte de obrigação: a de indenizar ou ressarcir o prejuízo causado (CC, artigo 927). É praticado com infração a um dever de conduta, por meio de ações ou omissões culposas ou dolosas do agente, das quais resulta dano para outrem”.

Por sua vez, o artigo 2.050 do Código Civil Italiano assinala que: Art. 2.050 CCI:“Aquele que ocasionar prejuízo a outrem no exercício de uma atividade perigosa pela sua natureza ou pela natureza dos meios adotados, ficará obrigado à indenização se não provar ter adotado todas as medidas idôneas para evitar o prejuízo”.

O DANO EMERGENTE E LUCRO CESSANTE. O artigo 389 do CCB-2002 disciplina que não cumprido a obrigação, responde o devedor por perdas e danos - lucro cessante (o que deixou razoavelmente de ganhar) e dano emergente (o que efetivamente perdeu), em face da disposição prevista no artigo 402 do CCB.

Assim, preleciona Carlos Roberto Gonçalves[122], “o dano patrimonial, em toda a sua extensão, há de abranger aquilo que efetivamente se perdeu e aquilo que se deixou de lucrar: o dano emergente e o lucro cessante”.

De qualquer forma, o entendimento que prevalece é o da restitutio in integrum ou seja, a restituição integral. Na realidade, a pretensão do lesionado se resume no ressarcimento de TODO O PREJUÍZO ATUAL E FUTURO SOFRIDO PELA VÍTIMA. Não se admite, no campo da responsabilidade civil, que a pessoa seja indenizada em parte ou pela metade do seu prejuízo.

O DANO PATRIMONIAL DIRETO E INDIRETO. O dano há que ser direto e imediato do ato lesivo, ou seja, decorrente do ato ofensivo.

“Somente danos DIRETOS E EFETIVOS, por efeito imediato do ato culposo, encontra no Código Civil suporte de ressarcimento. Se dano não houver, falta matéria para a indenização. Incerto e eventual é o dano quando resultaria de hipotético agravamento da lesão”. (In RT 612/44).

O dano indireto atinge a vítima por vias transversais. Por exemplo, “A” é vítima de homicídio em face da ação de “B”, sendo que “A” era alimentante de “R”. Nesse caso, “R” sofreu um dano indireto por ação delituosa de “B”. Nesse caso, “R” faz jus a uma indenização pelo dano indireto sofrido.

DIREITO DE PERSONALIDADE. Os artigos 11 a 21 do Código Civil prescreveram os direitos da personalidade. O tema trata de disposições legais que autorizam a defesa dos direitos da intimidade das pessoas, definidas no artigo 5o, inciso X da Constituição Federal de 1988, como sendo direitos à INTIMIDADE, à VIDA PRIVADA, à HONRA, à IMAGEM.

Segundo obtempera Rui Stoco[123], “esses direitos subjetivos têm como objeto emanações, manifestações da personalidade do seu sujeito e não a personalidade em si, porque esta, segundo observado, é condição prévia da existência de qualquer direito ou obrigação na órbita jurídica”.

“O direito à imagem constitui um direito de personalidade, extrapatrimonial e de caráter personalíssimo, protegendo o interesse que tem a pessoa de opor-se à divulgação dessa imagem, em circunstâncias concernentes à sua vida privada”. (In STJ – 4a. Turma – REsp. 74.473 – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira – j. 23.02.1999 – RSTJ 122/303).

Atualmente, o STJ através da Súmula 227 estabeleceu que, “a pessoa jurídica pode sofrer dano moral”, aludindo ao fato de que esta pessoa é detentora da HONRA OBJETIVA, diferentemente das pessoas físicas que possuem a HONRA SUBJETIVA.

Rui Stoco[124] ainda ensina que, “a imagem humana, sendo componente co-natural da pessoa, é lhe, por evidência, dado essencial. E, por isso, pela estrutura e pelo conteúdo, o ius imaginis qualifica-se exatamente com um direito de personalidade”.

“O direito à imagem reveste-se de duplo conteúdo: moral, porque direito de personalidade, patrimonial, porque assentado no princípio segundo a qual a ninguém é lícito locupletar-se às custas alheia”. (In STJ – 4a. Turma – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira ).

E, ainda, a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de janeiro: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - PRISÃO ILEGAL - ART. 5 - INC. LXXV - CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - DANO MORAL - RESSARCIMENTO DOS DANOS - Embargos Infringentes. Responsabilidade civil do Estado. Excesso de prisão. Indenização por dano moral. Art. 5, LXXC, da C - Federal. Todos os cidadãos, mesmos os desonrados, infames ou depravados, são titulares dos direitos integrantes da personalidade. Ninguém fica deles privados, já que em todo o individuo haverá, pelo menos, uma coisa moral, ou seja, uma zona intacta de atos e princípios morais. Recurso improvido, para manter a indenização do dano moral ao condenado, que ficou preso além do tempo fixado na sentença. (TJRJ - EI-AC 108/97 - (Reg. 090398) - Cód. 97.005.00108 - RJ - I G.C.Cív. - Rel. Des. Marlan Marinho - J. 10.12.1997)

O Direito à privacidade é um dos apanágios do ser humano – direito ao recato, direito à reserva íntima. Ninguém gosta de ser exposto à consideração Pública, sujeito à execração pública. Todos nós temos um elevado temor, receio, pavor de sermos depreciados pelo julgamento popular.

Segundo Rui Stoco[125], “ser portador de cidadania é exercer esses direitos, dentre os quais, como expressão máxima do direito de liberdade, encontra-se a personalidade e sua projeção exterior através da imagem e do vultus. No plano interno da personalidade, como expressão e marca da individualidade, temos a intimidade”.

E, adiante, conclui, “E esta pertence ao patrimônio subjacente da pessoa. Ninguém pode ser compelido a exibir o seu próprio intimus. Santo Agostinho já salientava que – in inteiore hominis habitat veritas - . Esse direito, como regra (posto comportar exceções), opõe-se a todos e ao próprio Estado”.

Segundo leciona Yussef Said Cahali[126], “San Thiago Dantas considera que a saúde, a segurança e o sossego são bens jurídicos cuja proteção a lei visa, através do artigo 554 do CC (artigo 1.277 do CC/2002)”. Se há esse direito, o mesmo “deve ser direito absoluto, direito da personalidade”. Ora, a reparação do dano moral tende exatamente à proteção dos direitos da personalidade (Dano e indenização, n. 19, p. 100).

Por isso, o artigo 5o, inciso X da CF/88, combinado com o artigo 21 do Código Civil de 2002 primaram pela tutela ampla e irrestrita do direito à privacidade – um dos pontos marcantes da pessoa no século XXI.

“DANO MORAL. São indenizáveis os incômodos prejudiciais à saúde, tranqüilidade e convivência das pessoas, em decorrência do mau uso da propriedade vizinha”. Maioria. Ver. Direito Civil 7/264.

DANO AO CORPO. É toda e qualquer lesão corporal causado pela ação de terceiro, coisa ou animal à pessoa, que possa repercutir na sua atividade pessoal, laboral ou social.

Segundo preleciona Maria Helena Diniz[127], “na hipótese de lesão corporal, como já afirmamos, o ofensor deverá indenizar o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido – artigo 949.”

O CCB-2002 (artigo 950) eliminou o pagamento de multa, prevista no artigo 1.538 do CCB-1916, salvo na hipótese do artigo 129, Par. 5o. do CPB, porque a lei penal deixou de cominar penas pecuniárias para os delitos de lesão corporal, impondo apenas a pena privativa da liberdade.

No caso do dano estético, este poderá ser reparado através de novas cirurgias restauradoras, implicando essa verba na indenização patrimonial – posto que, se trata de tratamento devido pelo lesionador.

Maria Helena Diniz[128], ainda pontifica que, “observa, com argúcia, Silvio Rodrigues que uma é a indenização reparadora por dano moral e do dano estético, disciplinado pelo Código Civil no artigo 944, e outra a indenização reparadora do dano patrimonial, consistente na capacidade laborativa, de que cuida o artigo 950 do Código Civil. Se a vítima sofrer, concomitantemente, dano moral resultante de aleijão e dano patrimonial oriundo da diminuição de sua capacidade de trabalho, deverá receber dupla indenização: aquela fixada moderadamente e esta proporcional à deficiência experimentada – RT 367/137 – RTJ 57/786”.

Se houver homicídio, a indenização da vítima consistirá nas seguintes reparações previstas no artigo 948 do CCB:

• No pagamento das despesas com o tratamento da vítima, com o seu funeral e com o luto de família. A regra é omissa. Não inclui lucro cessante. Ainda há situações em que não se terá despesa com tratamento médico, como no caso da vítima falecer imediatamente, com o funeral se o cadáver desapareceu.

• Na prestação de alimentos às pessoas a quem o defunto os devia, à viúva, filhos menores ou parentes necessitados, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima (provável 65 – 70 anos).

• Danos Morais – Súmula 37 do STJ.

• Honorários de advogado em face do artigo 20 do CPC.

Súmula 491:

“É indenizável o acidente que causou morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado”.

Súmula 490 do STF:

“a pensão correspondente à indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada com base no salário mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á às variações ulteriores”.

Nos casos de lesão corporal, conforme previsão no artigo 949, o ofensor indenizará a vítima nas seguintes verbas:

• Despesas do tratamento médico-hospitalar.

• Lucros cessantes até o fim da convalescença.

• Além de algum outro prejuízo

Portanto, todas as despesas despendidas pela vítima para o seu tratamento integral, atento ao principio basilar da responsabilidade civil consistente na restitutio in integrum.

DANO ESTÉTICO. O dano estético não se confunde com o dano moral – devem ser avaliados de forma diferente, posto que, decorrem de situações diversas.

Nesse sentido, consagrou-se entendimento no Superior Tribunal de Justiça (REsp. 10.536 – DJU 19.08.1991), indenizando-se o dano material e o dano moral resultante de deformidade estética.

Na mesma linha de idéias, ROBERTO H. BREBIA, apontado por Rui Stoco[129], proclama que, “El daño moral, en casos de lesiones deformantes o mutilante, se halla caracterizado por el menoscabo espiritual que ocasiona a la víctima la alteración de su estética personal; detrimento o menoscabo éste que no es más que un caso especial y acentuado de la natural sensación biopsiquica desagradable que produce generalmente toda lesión en quien la sufre”.

Segundo Rui Stoco[130],”mas mostra-se impróprio pretender indenização por dano moral estético e por dano moral cumulativamente, pois haverá aí verdadeira contraditio in terminis, conduzindo à insuportável bis in idem”. Atualmente, no entanto, alterou-se essa orientação, sendo admissível a cumulação à títulos diferentes.

Todavia, a despeito da discussão a matéria se encontra atualmente consolidada, em face do advento da SÚMULA 387 DO STJ, ao determinar que: “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral”.

Para tanto, torna-se necessário que sejam identificados os elementos que acarretaram os diferenciados DANOS MORAIS E DANOS ESTÉTICOS, segundo a expressão utilizada pelo STJ: “Podem cumular-se danos estético e moral quando possível identificar claramente as condições justificadoras de cada espécie”. (in STJ – REsp. 711.720/SP – Relator: Min. Aldir Passarinho – 4ª Turma – j.em. 24.11.2009 – DJU 18.12.2009).

DANO MORAL. FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DO DANO MORAL. Segundo o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira do STJ, com o advento da Constituição de 1988, os danos morais se constitucionalizaram em virtude da previsão prescritas no artigo 5º, incisos V e X da Carta Magna.

Na realidade, o marco divisório da reparação dos danos morais se encontra fixada na Constituição de 1988 se considerarmos que anteriormente à citada Carta Magna os Tribunais – especialmente o Supremo Tribunal Federal – não concedia indenizações por danos morais em virtude, dentre outros motivos, da ausência específica de comando legislativo na ordem jurídica brasileira.

Yussef Said Cahali[131] nesse sentido proclama que, “Desse modo, se antes da Constituição de 1988 o tema da reparação dos danos morais ainda se prestava a controvérsias, já então juízes de todas as instâncias, em antecipação meritória, sensíveis aos reclamos da sociedade moderna recusavam a velha e desgastada parêmia da irreparabilidade do dano moral no pressuposto de que a dor não tem preço, proclamando a necessidade de serem revistos os antigos preceitos”.

“Terá sido apenas com a Constituição de 1988 que se explicitaram regras fundamentais, de caráter geral, de proteção à pessoa como ser humano na sua amplitude conceitual: dignidade, liberdade de manifestação de pensamento, inviolabilidade de intimidade, da vida privada, da honra e da imagem”, assinala Yussef Said Cahali[132].

O magistrado paulista Enio Santarelli Zuliani[133] ensina que, “verdade é que, somente a partir da Constituição de 1988, consagrando a indenização por dano moral diante de violação do direito de privacidade, da honra e da imagem das pessoas (artigo 5º, V e X da CF/88), é que a jurisprudência superou o dogma de que seria imoral compensar a dor com dinheiro, o qual se enraizou para ensombrar as perspectivas indenizatórias das vítimas que suportavam abalo íntimo por infrações generalizadas do cotidiano”.

E, Eduardo de Oliveira Leite[134] proclama que, “o advento da Constituição de 1988, através de sua célebre disposição inserta no inciso V, do artigo 5º “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”, colocou fim às vacilações relativas à reparação do dano moral”.

Sérgio Severo[135] em introdução metodológica aponta que, “deve-se acentuar que as modificações legislativas atingiram direita e indiretamente o tratamento dos danos extrapatrimoniais. Indiretamente, os incisos V e X do artigo 5º da CF/88 estabeleceram-lhes novos contornos”.

Na realidade, a idéia essencial da defesa do ser humano, em sua realidade axiológica, se encontra consagrado na Constituição Federal de 1988, através da proclamação constante em seu artigo 1º, inciso III como sendo um dos valores fundamentais da ordem democrática brasileira, consistente na DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. Trata-se de um valor maior, a merecer ampla e irrestrita tutela da ordem jurídica.

Segundo preleciona Alexandre de Moraes[136], “A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos”.

E, adiante o mesmo autor, na página 129 proclama que, “o direito à vida privada, à intimidade, à honra, à imagem, entre outros, aparece como conseqüência imediata da consagração da dignidade humana como fundamento da República Federativa do Brasil.”

Por sua vez, na perspectiva de J.J. Gomes Canotilho[137], “Os direitos da personalidade abarcam certamente os direitos de estado (por exemplo, direito de cidadania), os direitos sobre a própria pessoa (direito à vida, à integridade moral e física, direito à privacidade), os direitos distintivos da personalidade (direito à identidade pessoal, direito à informática) e muitos dos direitos de liberdade (liberdade de expressão)”.

A nova ordem Constitucional proclamada pela Constituição de 1988 proclamou um direito geral da personalidade como DIREITO À PESSOA SER E À PESSOA DEVIR. Cada vez mais, os direitos fundamentais tendem a ser direitos de personalidade.

Assim, a Constituição de 1988, veio de resto a autonomizar um direito ao desenvolvimento da personalidade, reconhecendo os direitos fundamentais às pessoas coletivas e organizações – uma nova ordem jurídica na defesa da pessoa, sendo essa o centro de uma realidade jurídica universal.

Com esteio nessa nova ordem jurídica em defesa da dignidade material e imaterial do ser humano, o Código Civil de 2002, institucionalizou em seus artigos 10 a 21 os direitos da personalidade, como forma de tutelar, particularmente, a integridade e os valores da pessoa.

Portanto, toda construção doutrinária e jurisprudencial no Brasil, relativa aos danos morais decorreram, como conseqüência da proclamação da dignidade da pessoa humana, como fundamento constitucional da ordem jurídica brasileira que conferiu nova dimensão à tutela da pessoa humana considerada em sua integridade psicossomática e existencial.

Nessa linha de conduta Judith Martins-Costa[138] preleciona que, “Por uma série de fatores que tivemos ocasião de assinalar – dentre os quais ressalta a maior consideração à pessoa e aos reflexos, no Direito Privado, do principio constitucional fundamental da dignidade da pessoa humana”.

Essa linha de pensamento é igualitária entre os maiores doutrinadores nacionais e, dentre eles, Humberto Theodoro Junior[139] que assim pontifica,

“Com a Constituição de 1988 veio, finalmente, o enunciado do principio geral que pôs fim às vacilações e resistências dos tribunais (artigo 5º, V e X). Hoje, então, está solidamente assentada a ampla e unitária teoria da reparação de todo e qualquer dano civil, ocorra ele no plano do patrimônio ou na esfera da personalidade da vítima. Há de indenizar o ofendido todo aquele que causa um mal injusto a outrem, pouco importando a natureza da lesão”.

Portanto, diante das opiniões de vários doutrinadores, podemos concluir que a inserção do principio da indenização dos danos morais na Ordem Constitucional a partir de 1988, consolidou-se, de forma derradeira, na doutrina e jurisprudência o princípio da ampla tutela dos direitos relativos à dignidade da pessoa humana.

Nesse particular aspecto, Judith Martins-Costa[140] ao ressaltar os limites impostos pela Lei ordinária na avaliação dos danos morais entendeu que, “o que importa é observar que o tratamento do dano extra patrimonial tem sede civil-constitucional, de modo que a norma infraconstitucional não pode limitar o que está assegurado na Constituição como direito fundamental”.

Aliás, essa postura, foi recentemente consagrada pelo Superior Tribunal de Justiça, ao proclamar através da Súmula 281 que a lei ordinária não pode estabelecer limites não prevista no texto Constitucional.

SÚMULA 281-STJ de 13.05.2004: “A indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na Lei de Imprensa”.

Portanto, toda e qualquer disposição normativa que tenha como objetivo estabelecer limites ao quantum indenizatório confronta, de forma visceral, com o principio da ampla e irrestrita reparação dos danos morais, posto que a Norma Constitucional (art. 5º, inciso V da CF/88) não admite parâmetros fechados.

Por todos esses motivos, podemos concluir que a Constituição Federal de 1988 constituiu, em nossa República, um marco fundamental no delineamento das novas idéias alusivas aos danos morais.

Portanto, é inequívoco a multiplicidade de efeitos gerados nos casos de lesões ou outras ofensas à saúde,“...além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido (artigo 949) “ ou, ainda, “se da ofensa resultar defeito...” que resulte em depreciação (artigo 950). A inclusão de verbas à título de dano moral, dano estético e dano patrimonial, por decorrência dos diversos efeitos, certamente poderá levar o julgador a incluir verbas à título de bis in idem, fato que certamente, não atendem aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. Ademais, o que se busca na interpretação dos dispositivos é a reparação integral. Subtrair do lesado o direito à justa indenização, por outro lado, não atendem ao principio da restitutio in integrum[141].

Nessa linha de raciocínio, Carlos Roberto Gonçalves[142] pondera que, “a jurisprudência não desconhece o conteúdo moral (ou também moral) do dano estético, no que busca fórmulas viáveis para a sua reparação, conforme lembra Yussef Said Cahali (Dano, cit., p. 72-3), encontrando, porém , dificuldade prática na fixação do provimento indenizatório, diante da unicidade do dano, como causa, e da duplicidade de suas repercussões, moral, patrimonial, como efeitos”.

Assim, a existência de verbas a serem identificadas em cada caso concreto, deverá ser realizada em conformidade com a prova da ofensa sofrida pelo lesado (artigo 949) , juntamente com a prova da depreciação sofrida pela vítima (art. 950).

Por essa razão, Rui Stoco[143] proclama que, “A advertência que se faz é no sentido de que a aplicação do disposto constante no artigo 949 ao caso concreto encontra dificuldades no momento de subsunção da regra ao fato, visando a fixação da verba indenizatória a esse título, tendo em vista a unidade do elemento causal e a duplicidade de seus efeitos, com repercussão de natureza patrimonial e moral”.

O montante devido à titulo de quantum debeatur, deve, nesse sentido, corresponder a uma ampla análise das circunstâncias que ensejaram a múltipla ocorrência dos fatores adversos. Não pode o julgador deixar de atender ao requisito formal da prova “...além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido”.

Os Tribunais estão sensíveis a essa realidade, como se infere: “Ação indenizatória. Danos moral e estético – cumulação admitida quando o estado de invalidez produz sofrimento moral, além do constrangimento decorrente do aleijão – verba que deve ser transmitida aos sucessores, libertando-se do enfoque personalíssimo da dor”. (In TJSP – Ap. 096.032-5/1-00 – 8ª Cam. – j. 25.04.2001 – Rel. Desa. Teresa Ramos Marques – RT 791/203).

Pelos motivos expostos, nas hipóteses aventadas e insertas nos artigos 949 e 950, deve haver um consenso que conduza o Tribunal a um consenso, com a adoção de regras unitárias.

PROPOSIÇÃO AO EQUACIONAMENTO DAS VERBAS CONSTANTES NAS DISPOSIÇÕES CONTIDAS NOS ARTIGOS 949/950 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002:

As perdas e danos (lucro cessante e danos emergentes), cumulado com o dano extra patrimonial (dano moral e dano estético) existentes na perspectiva dos artigos 949 e 950 devem ser unificados, mediante a adoção da seguinte proposta:

DANO MORAL. CONCEITO. NATUREZA JURÍDICA. REPARABILIDADE DA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA. Segundo ensina Humberto Theodoro Junior[144], “no convívio social, o homem conquista bens e valores que foram o acervo tutelado pela ordem jurídica. Alguns deles se referem ao patrimônio e outros à personalidade humana, como atributos essenciais e indisponíveis da pessoa. É direito seu, portanto, manter livre de ataques ou moléstia de outrem os bens que constituem seu patrimônio, assim como preservar a incolumidade de sua personalidade”.

O dano moral, segundo o mesmo autor, “traduzem-se em um sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida, capaz de gerar alterações psíquicas ou prejuízos à parte social ou afetiva do patrimônio do ofendido”.

O artigo 5o, inciso V e X da CF/88 consagrou essa idéia. Por sua vez, o artigo 186 do CCB-2002, da mesma forma, conferiu o direito à indenização pelos danos morais de forma precisa e cristalina.

Para Miguel Reale, “a Constituição Federal, ao tipificar o dano moral, não se refere ao aspecto físico da pessoa, mas à sua dimensão ética perante a sociedade. Implicando necessariamente um dano moral”.

José de Aguiar Dias assinala que, “quando um dano não corresponde às características de dano patrimonial, dizemos que estamos em presença do dano moral”.

Nessa orientação de idéias, os irmãos MAZEAUD ET MAZEAUD, afirmaram que, “a jurisprudência romana chegou à idéia de que, na vida humana, a noção de valor não consiste apenas em dinheiro, ao contrário existem, além do dinheiro, outros bens aos quais o homem civilizado atribuiu um valor e que devem ser protegido pelo direito”.

Trata-se de uma indenização que tem a função compensatória, bem como, serve como desestímulo ao ofensor na prática de novos atos ofensivos à sua integridade.

A Súmula 37 do STJ admite a cumulação com o dano material. Por sua vez, a Súmula 227 do STJ acolheu a indenização do dano moral da pessoa Jurídica porque se trata de honra objetiva dessa pessoa de natureza privada ou pública. A recente Súmula 281 do STJ, por sua vez, não admite a adoção de parâmetros fechados (Lei de Imprensa) para balizar o quantum indenizatório nos danos morais.

O processo indenizatório de nossos tribunais é aleatório, dependendo do caso concreto. O STJ assumiu o compromisso de disciplinar o processo indenizatório no que tangem ao QUANTUM INDENIZATÓRIO.

“A nova Carta Magna da República conferiu ao dano moral status constitucional ao assegurar, nos dispositivos sob referência, a sua indenização quando decorrente de agravo à honra e à imagem ou de violação à intimidade e à vida privada”. (STF – 1a. Turma – RE 192.593 – Rel, Min. Ilmar Galvão – j. em. 11.05.1999 –RTJ 170/964).

O quantum indenizatório fixado pelos nossos Tribunais é extremamente é complexo e de difícil avaliação, por isso, DE PAGE, assinalou que, “a dificuldade de avaliar não apaga a realidade do dano e, por conseguinte, não dispensa da obrigação de repará-la”.

No caso dos danos morais, não há necessidade de prova. Trata-se de dannum in re ipsa ou seja, decorrente da própria coisa.

Atualmente se encontra consagrado, no Brasil, a competência da Justiça do Trabalho para o processo de indenização dos danos morais, quando decorrer de atividade laboral, em face da previsão contida no artigo 114, VI da Emenda Constitucional N. 45/2004.

Os danos dos profissionais liberais dependem da prova da culpa, posto que se trata de culpa subjetiva, como consagrado no artigo 14, Par. 4º do CDC e no artigo 951 do Código Civil de 2002.

Os danos morais, possuem grande incidência nas relações de família, laborais, nas relações entre médicos e pacientes e outras que repercutem intensamente na intimidade das pessoas.

• “O direito possui valor permutativo, podendo-se, de alguma forma, lenir a dor com a perda de um ente querido pela indenização, que representa também punição e desestímulo do ato ilícito, o que também transparece nítido no caráter admonitório e circunstancial da carga indenizatória.” (In 1ª Cam. Do TJSP, Apel. N. 152.029-1, 19.01.1991).

• “O critério de fixação do valor indenizatório do dano moral levará em conta tanto a qualidade do atingido como a capacidade financeira do ofensor, de molde a inibi-lo a futuras reincidências, ensejando-lhe expressivo, mas suportável gravame patrimonial.” (In RJTJRS 176/250).

• “O valor da indenização do dano moral sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça, sendo certo que, na fixação da indenização a esse título, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível sócio-econômico do autor e, ao porte econômico do réu, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso”. (In REsp. N. 24.944/MG, j. em. 25.04.00, Relator: Min. Sálvio de Figueiredo, 4ª turma do STJ, pub. DOU 05.06.2.000, p. 172).

Por derradeiro, o IX ENCONTRO DOS TRIBUNAIS DE ALÇADA DO BRASIL, realizado nos dias 29/30 de agosto de 1997, nos salões do RENAISSANCE de São Paulo Hotel, dentre outros aspectos destacou conclusão alusiva dos danos morais enfatizando que: “1. DANO MORAL e o DANO ESTÉTICO não se acumulam porque ou o dano estético importa em dano material ou está compreendido no dano moral (Unânime); 2. A indenização por danos morais deve dar-se caráter exclusivamente compensatório (maioria); 3. Na fixação do dano moral, deverá o juiz, atendendo ao nexo de causalidade inscrito no art. 1.060 do Código Civil, levar em conta critérios de PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE na apuração do quantum, atendidas as condições ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado (unanimidade).”

Efeito pedagógico da reparação. É inevitável o resultado educativo da reparação do dano. Na medida em que repara educa. O sentido almejado pelo mens legis correspondente a uma idéia precisa de equilíbrio social e respeito entre as pessoas. Somente poderemos imaginar uma sociedade JUSTA E PERFEITA, se todos os cidadãos forem capazes de conviver em paz, respeitando os direitos do próximo de forma a satisfazer o preceito romano sedimentado no principio NEMINEM LAEDERE - a ninguém prejudicar.

Prof. Dr. Clayton Reis

Claytonreis2003@.br

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[1]. IHERING, Rudolfo von, Études Complémentaires de l’Espirit de Droit Romain. De la Faute em Droit, Paris, 1880, p. 10.

[2] MARTINS-COSTA, Judith, Comentários ao Novo Código Civil, vol. V, Tomo II, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2003, p. 92.

[3]. STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil, 6a. edição, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 2004, p.120.

[4] MARTINS-COSTA, Judith, obr. cit., p. 93.

[5] MARTINS-COSTA, Judith, op. cit., p. 96.

[6] DIREITO/CAVALIEIRI FILHO, Carlos Alberto Menezes e Sérgio, Comentários ao Novo Código Civil, volume XIII, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2004, p. 47.

[7] STOCO. Rui, obr. cit., p. 120.

[8].STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil, 6a. Edição, São Paulo/SP, Editora RT, 2004, p. 119.

[9] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, Programa de Responsabilidade Civil, São Paulo, Editora Atlas, 2007, p. 35,

[10].GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito das Obrigações, Parte Especial, Tomo II, Responsabilidade Civil, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 2001, p. 3.

[11]. PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade Civil, 9a ed., Rio de Janeiro/RJ, Editora Forense, 1999, p.2.

[12] GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade Civil, 8ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2003, p. 20.

[13] . KELSEN, Hans, Teoria Geral das Normas, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 1986, p. 3.

[14] DIAS, José de Aguiar, Responsabilidade Civil, 10ª Edição, Rio de Janeiro/RJ, Editora Forense, 1995, p,.8

[15] STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil, 7ª, edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 114.

[16] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, Comentários ao Novo Código Civil, volume XIII, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2004, p. 47.

[17] STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil, 7ª edição, São Paulo, Editora RT, 2007, p-. 114.

[18] STOCO. Rui, op. cit., p. 120.

[19].STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil, 6a. Edição, São Paulo/SP, Editora RT, 2004, p. 119.

[20].GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito das Obrigações, Parte Especial, Tomo II, Responsabilidade Civil, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 2001, p. 3.

[21] STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil, 7ª. Edição, São Paulo, Editora RT, 2007, p. 112.

[22] THEODORO JUNIOR, Humberto, Comentários ao Novo Código Civil, Volume III, Tomo II, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2003, p. 18.

[23] THEODOTO JUNIO, Humberto, op. cit., p. 18.

[24] GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit., p. 35.

[25] STOCO, Rui, op. cit., p. 115.

[26] NERY, Nelson e Rosa Maria de Andrade, Código Civil Comentado, 4ª. Edição, São Paulo, Editora RT, 2006, p. 289.

[27] DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro, 21ª Edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2007, p. 40.

[28] STOCO, Rui, op. cit., p. 114.

[29] DIAS, José de Aguiar, Responsabilidade Civil, Vol I, 6ª. Edição, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1979, p. 1 e 3.

[30] LUCAS, André, Code Civil, Paris, Litec, 1992, p. 645.

[31] THEODORO JUNIOR, Humberto, Comentários ao Novo Código Civil, vol. III, Tomo II, op. cit., p. 23.

[32] STOCO, Rui, op. cit., p. 116.

[33] STOCO, Rui, op. cit., p. 127.

[34] NERY JUNIOR/NERY, Nelson e Rosa Maria, Código Civil Comentado, 4ª. edição, São Paulo, RT, 2006, p. 634.

[35] MARTINS-COSTA, Judith, op. cit., p. 75.

[36] DINIZ, Maria Helena, op. cit., p. 40.

[37] COSTA, Judith Martins, Comentários ao Novo Código Civil, Volume V, Tomo II, op. cit., p. 124.

[38] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 24.

[39] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 24.

[40] STOCO, Rui, 7ª. Edição, op. cit., p. 129.

[41] THEODORO JUNIOR, Humberto, Comentários ao Novo Código Civil, Volume III, Tomo II, op. cit., p. 32.

[42] THEODORO JUNIOR, Humberto, op. cit., p. 33.

[43] THEODODO JUNIOR, Humberto, op. cit., p. 32.

[44] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 32.

[45] GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit., p. 9

[46] DINIZ, Maria Helena, op. cit., p. 43.

[47] LIMA, Pires de Lima e VARELA, Antunes, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª. Edição, Coimbra, Editora Coimbra, 1987, p. 474.

[48] NETO, Abílio, Código Civil Anotado, Lisboa, Editora Ediforum, 1997, p.

[49] DINIZ, Maria Helena, op. cit., p. 43.

[50] GONÇALVES, Carlos Roberto, op. ci., p. 11.

[51] KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito, 6ª. Edição, Coimbra, Editora Armênio Amado, 1984, p. 174.

[52] REALE, Miguel, Filosofia do Direito, 10ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 1983, p. 190.

[53] REALE, Miguel, op. cit., p. 191.

[54] KELSENS, Hans, op. cit., p. 27.

[55] KELSEN, Hans, op´. cit., p. 181.

[56] KELSEN, Hans, op. cit., p. 57.

[57] KELSEN, Hans, op. cit., p. 59.

[58] KELSEN, Hans, op. cit., p. 59.

[59] REALE, Miguel, op, cit., p. 324.

[60] REALE, Miguel, op. cit., p. 325.

[61] MORAIS, Alexandre de, Constituição do Brasil Interpretada, 2ª. Edição, São Paulo, Editora Atlas, 2003, p. 129.

[62] STOCO, Rui, op.,cit., p. 130.

[63] DINIZ, Maria Helena, op. cit., p. 39.

[64] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 25.

[65] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, Comentários ao Novo Código Civil, volume XIII, op. cit.,p .62;

[66] RIZZARDO, Arnaldo, op. cit., p. 36.

[67] KFOURI NETO, Miguel, Responsabilidade Civil do Médico, 5ª. Edição, São Paulo, Editora RT, 2003, p. 78.

[68] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, op. cit., p. 65.

[69] STOCO, Rui, op. cit., p. 130.

[70] THEODORO JUNIO, Humberto, op. cit., p. 103.

[71] KFOURI NETO, Miguel, op. cit., p. 85.

[72] STOCO, Rui, op. cit., p. 133.

[73] CROCE, Delton e CROCE JUNIOR, Delton, Erro Médico e o Direito, 2ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2002.

[74] STOCO, Rui, op., cit., p. 133.

[75] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 73.

[76] . DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op., cit., p. 367.

[77] STOCO, Rui, op. cit., p. 140.

[78] STOCO, Rui, op. cit.,p. 142.

[79] STOCO, Rui, op. cit., p. 143.

[80] DIREITO, Carlos Alberrto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 315.

[81] STOCO, Rui, op. cit., p. 135.

[82] STOCO, Rui, op. cit., p. 148.

[83] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op.cit.,ap. 168.

[84] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 168.

[85] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. Ci., p. 128.

[86] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. Cit., p. 156.

[87] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. Cit., p. 156.

[88] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 150.

[89] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. Cit., p. 158.

[90] Idem, ibidem, p. 161.

[91] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 165.

[92] Idem, ibidem, p. 129.

[93] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. Cit., p. 129.

[94] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 129.

[95] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. ci., p. 14.

[96] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op.cit., p. 130.

[97] CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op., cit., p. 130.

[98] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 16.

[99] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 17.

[100] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p.131.

[101] DINIZ, Maria Helena, op. cit., p. 51.

[102] CAVALIERI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 131.

[103] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 156.

[104]. GONÇALVES, Carlos Roberto, obr. cit., p.197

[105]. GONÇALVES, Carlos Roberto, obr. cit., p. 199.

[106] RIZZARDO, Arnaldo, Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2005, p. 329

[107] In Revista BIOÉTICA, SIMPOSIO: ERRO MÉDICO, vol. 2, número 2, 1994, p. 164.

[108] KFOURI NETO, Miguel, op. ci., p. 92

[109] KFOURI NETO, Miguel, op. cit., p. 71.

[110] RIZZARDO, Arnaldo, op. cit., p. 327.

[111] RIZZARDO, Arnaldo, op. cit., p. 327.

[112] Idem, ibidem, p. 328

[113] DIREITO, Carlos Alberto Menezes e CAVALIEIRI FILHO, Sérgio, op. cit., p. 437.

[114] RIZZARDO, Arnaldo, op. cit., p. 48.

[115] GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit., p. 482.

[116] GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit., p. 489.

[117] STOCO, Rui, op. cit., op. 261.

[118]. DIAS, José de Aguiar, Da Responsabilidade Civil, 10a. edição, Rio de Janeiro/RJ, Editora Forense, 1995, p. 713.

[119]. GAGLIANO/PAMPLONA FILHO, Pablo Stolze e Rodolfo, Novo Curso de Direito Civil – Responsabilidade Civil, Vol. III, São Paulo/SO, Editora Saraiava, 2003, p. 50.

[120] . GONÇALVES, Carlos Roberto, obr. cit., p. 322.

[121]. GONÇALVES, Carlos Roberto, obr. cit., p. 282.

[122]. GONÇALVES, Carlos Roberto, obr. cit., p. 276.

[123].STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil, 5a. Edição, São Paulo/SP, Editora RT, 2001, p. 1321.

[124]. STOCO, Rui, ibidem, idem, p. 1325.

[125]. STOCO, Rui, obr. cit., p. 1344.

[126] CAHALI, Yussef Said, Dano Moral, 3a. edição, São Paulo, Editora RT, 2005, p.632.

[127]. DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro, 16a. edição, São Paulo/SP, Editora Saraiva, 2002, p. 125.

[128]. DINIZ, Maria Helena, idem, ibidem, p. 126.

[129].STOCO, Rui, obr. cit., p. 943.

[130].STOCO, Rui, idem, ibidem, p. 943.

[131] CAHALI, Yussef Said, Dano Moral, 2ª edição, São Paulo, Editora RT, 1998, p. 18.

[132] CAHALI, Yussef, Said, Dano Moral, 3ª. Edição, São Paulo, Editora RT, 2005, p. 62.

[133] ZULIANI, Enio Santarelli, Grandes Temas da Atualidade – Dano Moral, obra coordenada por Eduardo de Oliveira Leite, sob o tema A era da jurisprudência, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2002, p. 202.

[134] LEITE, Eduardo de Oliveira, Grandes Temas da atualidade – Dano Moral, obra coordenada por Eduardo de Oliveira Leite, sob o título “reparação do dano moral na ruptura da sociedade conjugal”, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2002, p. 137.

[135] SEVERO, Sérgio, Os Danos Extrapatrimoniais, São Paulo, Editora Saraiva, 1996, p. XXI.

[136] MORAES, Alexandre de, Constituição Brasileira Interpretada, 2ª edição, São Paulo, 2003, p. 128.

[137] CANOTILHO, J.J. Gomes, Direito Constitucio9nal e Teoria da Constituição, 6ª edição, Coimbra, Livraria Almedina, 2002, p. 396.

[138] MARTINS-COST, Judith, Comentários ao Novo Código Civil, vol. V, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2003, p. 344.

[139] THEODORO JUNIOR, Humberto, Comentários ao Novo Código Civil, volume III, Tomo II, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2003, p. 41.

[140] MARTINS-COSTA, Judith, op. cit., p. 350.

[141] Segundo a opinião abalizada de Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieiri Filho, in op. cit., p. 422, “o que se deve considerar na interpretação do dispositivo é a busca da reparação integral, isto é, tudo aquilo que em decorrência da lesão a vítima tenha deixado de desfrutar”.

[142] GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit., p. 688.

[143] STOCO, Rui, op. cit., p. 1214.

[144].THEODORO JUNIOR, Humberto, obr. cit., p. 37.

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