Como vive Sean Bianchi Goldman



Como vive Sean Bianchi Goldman

ÉPOCA visitou o menino pivô de uma disputa judicial entre Brasil e Estados Unidos, que pode envolver até Lula e Barack Obama

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BRASILEIRO

Sean posa com uma réplica da taça da Copa do Mundo, com o padrasto e a mãe, em foto da época do mundial de futebol de 2006

Sean Bianchi é um menino bonito, esperto e amoroso, com quase nove anos de idade e dupla nacionalidade: brasileira e americana. Nasceu em Nova Jersey, EUA, mas vive desde os quatro anos no Rio de Janeiro. Não desgruda da nonna (avó, em italiano), anda enganchado nela. Ambos são bronzeados, de cabelos e olhos castanhos. Orgulha-se de ser craque no basquete e "bamba" em Matemática e redação. Não gosta de estudar História. Quando consegue ficar parado, tem mania de mexer nas medalhinhas de seu cordão: uma tem a imagem de Iemanjá; outra, a inscrição Agnus Dei ("cordeiro de Deus" em latim); a terceira, um trevo de quatro folhas; e a maior, fina e delicada, o rosto da mãe.

Sean perdeu a mãe tragicamente, em agosto do ano passado: Bruna, estilista carioca, morreu aos 33 anos, ao dar à luz Chiara. Desde então, Sean consulta uma psicóloga uma vez por semana. Vive em um apartamento de 250 metros quadrados em um condomínio de luxo no Jardim Botânico, junto à Lagoa, no Rio de Janeiro, com varandão, plantas, obras de arte e tapetes antigos. Mora com uma grande família: os avós maternos, Silvana e Raimundo, um tio que é quase um irmão mais velho, Luca Bianchi – ator, surfista e peso-pena faixa-preta de jiu-jitsu. Divide o quarto com o padrasto, a quem chama de pai, João Paulo Lins e Silva. Na verdade, Sean começa seu sono toda noite na cama de casal da avó, e depois João Paulo o encaminha, quase sonâmbulo, para o quarto colorido, com painéis de elefantes e outros bichos na parede. Não dá mais para carregá-lo nos braços, como antes. Jogos medievais no computador e vários esportes, conjugados com o surfe de fim de semana na Praia Rasa em Búzios, compõem a vida de Sean. Além das broncas que leva quando deixa roupas no chão do quarto, Sean é acompanhado nos deveres de casa por uma família que diz querer, acima de tudo, seu bem-estar. Tem sorte. É evidente, para quem passa o dia na casa, que ele se sente amparado mas não mimado, e que preferiria continuar anônimo. Até a mãe morrer, ele era apenas "Shan", "Sam", "Shon", um garoto popular entre os amigos, mas com nome esquisito.

Se tivesse de superar apenas a perda prematura da mãe, Sean Richard Bianchi Carneiro Ribeiro Goldman (seu nome completo) seria um menino privilegiado. Mas ele está no centro de uma disputa judicial rancorosa entre duas famílias – e entre dois países, o Brasil e os Estados Unidos. Uma briga que transcendeu as paredes do lar e se tornou um imbróglio diplomático, um circo internacional, com o rosto de Sean e imagens de seu passado estampados na internet pelo pai biológico, o ex-modelo David Goldman, hoje sócio de uma empresa náutica que organiza passeios.

A família de Sean no Rio só abriu a casa com exclusividade para a ÉPOCA depois de muito relutar, porque o caso adquiriu dimensões políticas e de mídia lá fora. E porque, segundo a versão do padrasto, dos avós e do tio de Sean, o pai biológico, David Goldman, se empenhou, desde a morte de Bruna, numa "campanha de calúnias" contra a família brasileira.

À reportagem de ÉPOCA, a família disse que Bruna não premeditou a vinda definitiva dela para o Brasil. Em férias, no Rio de Janeiro, com o filho, em 2004, ela teria se dado conta de que era tão infeliz no casamento que não adiantava voltar para Nova Jersey. O casamento teria desmoronado, segundo Bruna, por um conjunto de razões: o sexo tinha praticamente acabado, era ela quem sustentava a casa, trabalhava demais, não tinha como crescer profissionalmente, se sentia sozinha. E também porque as brigas eram constantes com o marido - de acordo com o relato de Bruna aos parentes, ele às vezes esmurrava móveis e paredes. Por tudo isso, Bruna teria telefonado pedindo o divórcio. Ela teria pedido também a Goldman que viesse ao Brasil para que discutissem e chegassem a um acordo amigável sobre Sean.

Depois da separação do casal, Goldman abriu um processo contra a ex-mulher e os ex-sogros por sequestro e violação da Convenção de Haia – que dispõe sobre as crianças levadas de um país para outro. Durante quatro anos, o pai biológico abriu mão de ver o filho para sustentar suas acusações. A família brasileira afirma que se ofereceu para pagar a vinda de Goldman ao Brasil para visitar o filho. Segundo a família, essa nunca foi uma opção para Goldman. O pai seguiu a orientação de seus advogados de nunca visitar ou ver o filho, porque sua denúncia de sequestro seria enfraquecida e poderia ser contestada juridicamente. E assim foi por mais de quatro anos. Apenas depois da morte da mãe de Sean, no ano passado, Goldman decidiu ver Sean. E teria aparecido na porta do condomínio onde o filho vive, em companhia de agentes da Polícia Federal brasileira, funcionários do consulado americano e uma equipe da rede de televisão americana NBC. Os policiais revistaram o apartamento mas o menino não foi encontrado. Passava o feriado em Angra dos Reis com o padrasto e amigos. Mas no mês passado, Goldman e Sean se encontraram por dois dias seguidos, com o consentimento do padrasto e dos avós maternos.

Segundo a versão da família brasileira, o pai biológico de Sean teria pedido US$ 500 mil (R$ 1,2 milhão) – o que Goldman nega – para tirar o nome dos avós como "co-autores" do sequestro do menino. O acordo acabou sendo fechado em US$ 150 mil (R$ 360 mil).

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OBSTINAÇÃO

David Goldman no aeroporto. Ele pôde rever brevemente o filho no mês passado

A luta do modelo americano David Goldman para obter a custódia de seu filho, Sean Bianchi Goldman, de 8 anos, deverá estar na pauta do encontro entre os presidentes Lula e Barack Obama ainda neste mês, nos Estados Unidos. Goldman diz ter esperanças que os dois chefes de governo reconheçam que sua causa é justa e o ajudem a vencer a batalha judicial que trava contra a família da mãe de Sean, Bruna, que morreu de parto no ano passado. Nesta entrevista a ÉPOCA, por telefone, Goldman diz nunca ter entendido os motivos de a brasileira ter deixado os EUA e levado seu filho. Afirma que está cansado de tanto batalhar na Justiça, mas que vai até o fim. Goldman falou sobre o breve reencontro com o filho, no mês passado, e da esperança de recuperar seu “tesouro”.

ÉPOCA – No mês passado, o senhor se encontrou com seu filho, Sean, pela primeira vez depois de quatro anos. Como foi esse encontro?

David Goldman – Foi em um condomínio no Rio de Janeiro. Ele veio com uma psiquiatra e estava muito receptivo. Nós nos abraçamos e foi lindo. Eu segurei o choro; estava tão feliz em vê-lo. Vimos juntos as fotos de sua família nos Estados Unidos. Sean se lembra dos avós (americanos), das pescarias, da canoagem. É um menino maravilhoso. A conversa aconteceu em inglês. Depois de aprender a língua nos Estados Unidos, ele frequentou uma escola americana no Brasil. Em nenhum momento discutimos se ele gostaria de ficar comigo ou no Brasil. Evitei esse tipo de conversa. Só queria que meu filho soubesse quanto eu sinto saudade e quanto quero ficar com ele. Queria que soubesse que, durante quatro anos, tentei vê-lo e até trouxe comigo ao Brasil a avó dele e outras pessoas próximas. Cheguei a esperar duas semanas para vê-lo (mas sem resultados).

ÉPOCA – Por que Bruna o deixou? Como era sua relação com ela?

Goldman – Sinceramente, não sei os motivos que a levaram de volta ao Brasil. Eu nunca soube que ela tivesse outra pessoa no país. Eu a amava, amava a família dela e a minha família também gostava dela. Até onde eu sei, nós tínhamos uma relação como a de qualquer outro casal. Tirávamos férias juntos, saímos para namorar. No começo, em uma conversa por telefone, até os pais de Bruna disseram que não a estavam entendendo (Bruna pediu a guarda definitiva de Sean). Ela dizia que não voltaria mais a Nova Jersey. Dizia que era no Brasil que tinha família, amigos etc. Ela ainda disse que eu era um cara maravilhoso e um ótimo pai e que estava feliz por termos um filho, mas que queria morar no Brasil.

”Não sabia nada sobre a relação de Bruna com João Paulo. A família nem me avisou da morte dela”

ÉPOCA – Por que não tentou reatar a relação?

Goldman – Ela não me deu opções. Não me deixou voltar ao Brasil e tentar continuar a relação com ela.

ÉPOCA – Desde que seu filho partiu dos EUA, o senhor levou um ano para viajar para o Brasil para tentar encontrá-lo. Por quê?

Goldman – Desde o primeiro momento, eles não me deixariam ver Sean a não ser que eu assinasse papéis renunciando sua custódia. Fui aconselhado pelos meus dois advogados (o dos EUA e o do Brasil) a não vir porque cairia numa batalha judicial no Brasil. Qualquer acordo sobre a custódia de meu filho deveria ser realizado no país de origem, onde nós moramos, onde nos casamos e onde Sean nasceu, ou seja, nos Estados Unidos.

ÉPOCA – Se sua relação era tão boa com a família de Bruna, por que se tornou tão ruim? E por que o senhor os acusa de mentir?

Goldman – No momento em que passei a discordar deles, tornei-me um inimigo. Quando fui à Justiça dizer que queria meu filho de volta, então tudo se transformou. No primeiro ano, eles receberam os papéis dizendo que o que estavam fazendo era violação dos direitos da Convenção de Haia e que, segundo os juízes americanos, Sean deveria retornar aos Estados Unidos.

ÉPOCA – O senhor tinha conhecimento sobre a relação entre Bruna e o advogado João Paulo Lins e Silva? No processo consta que eles se conheciam havia quatro anos.

Goldman – O que eu sei é que ela ficou casada com ele por dez meses antes de morrer. Não sabia nada sobre a relação deles. A família de Bruna nem me avisou da morte dela.

ÉPOCA – A família de Bruna afirma que o senhor exigiu US$ 150 mil para interromper o processo de custódia de seu filho?

Goldman – É mentira! A verdade está na Justiça. O retorno de Sean aos Estados Unidos não tem nada a ver com isso. Os US$ 150 mil fizeram parte de um acordo realizado nos tribunais de Nova Jersey, onde dei entrada com o processo para obter a guarda da custódia de Sean. Esse dinheiro foi para pagar as despesas processuais e, em troca, os pais de Bruna, réus do processo, seriam excluídos (a corte americana considerou os avós maternos como réus do processo).

ÉPOCA – A que o senhor credita o fato de em agosto passado a Justiça brasileira ter dado a guarda provisória de Sean ao padrasto logo após a morte de Bruna? O senhor mencionou que a família do padrasto tem influência nos tribunais.

Goldman – Não sei explicar a razão de a corte brasileira ter tomado essa decisão. Pode ser porque a família dele (o advogado João Paulo Lins e Silva) seja influente. Pode ser, não sei.

ÉPOCA – A custódia de Sean deverá estar na pauta do encontro entre o presidente Lula e o presidente Barack Obama que acontecerá ainda neste mês. O que o senhor espera desse encontro?

Goldman – Espero que, pelo fato de serem os líderes dos dois países envolvidos, eles venham a reconhecer que o que está acontecendo está errado e, esperançosamente, vão me ajudar a ter o meu filho de volta.

ÉPOCA – Caso ganhe a custódia permanente, como o senhor pretende sustentar Sean?

Goldman – Tenho um emprego full time como professor de navegação e estou ainda trabalhando como modelo.

ÉPOCA – Qual é o próximo passo?

Goldman – O caso está nos tribunais federais e não sei quando sairá a decisão. Eu tenho de passar pela mesma briga judicial que já tive com Bruna (ele perdeu a custódia para ela). Tudo de novo. E agora esse cara novo que se casou com ela. Estou cansado, mas nunca vou desistir. Sean é meu sangue, minha carne. Ele é meu filho. Eu tenho saudade de tudo em relação a ele. De brincar de bola com ele, de andar de barco, fazer lição de casa, tudo me dá saudade. Ele é meu tesouro.

ÉPOCA – O senhor pensa em se casar novamente?

Goldman – Não. Meu foco está em trazer meu filho de volta e nós nos reencontrarmos e curarmos juntos essa ferida.

Conheça outros brasileiros envolvidos em disputas internacionais pela guarda dos filhos

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BATALHA JUDICIAL

Lucas, de 3 anos, no colo da mãe, Roberta. A Justiça sueca decretou a prisão da brasileira

Em sua casa em Houston, no Texas, o americano Robert Pate assiste na televisão à entrevista em que a secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, cobra do Brasil a devolução do menino americano Sean, de 8 anos. Hillary citou Sean como exemplo de um problema mundial e o comparou ao menino cubano Elián González, que retornou a Havana em junho de 2000, depois de uma longa batalha entre as cortes dos Estados Unidos e de Cuba – a mãe morreu tentando fugir da ilha e o pai, que ficou em Cuba, o queria de volta. Hillary contou na entrevista que existem outros 46 casos semelhantes de disputas por crianças entre os Estados Unidos e o Brasil.

Ao ouvir isso, Pate diz ter se emocionado: “É a minha Nicole”. O drama da batalha judicial entre as famílias Goldman e Bianchi ganhou visibilidade internacional. Mas é apenas um entre centenas que correm silenciosamente em tribunais do Brasil e do exterior. De acordo com pesquisa de 2003 a respeito da Convenção de Haia – o acordo internacional que trata casos do gênero –, os EUA entraram com 169 pedidos de repatriação, o maior número no mundo. Os Estados Unidos também receberam 286 pedidos de retorno a outros países, um aumento de 13% em relação à pesquisa anterior. Nas situações envolvendo países não signatários da convenção, como Arábia Saudita e Líbano, o imbróglio internacional ainda pode ser muito pior, porque as crianças são consideradas sequestradas e não há instrumentos jurídicos internacionais para que os pais possam reavê-las.

Sean e Nicole estão nessas estatísticas. ÉPOCA teve acesso a alguns processos internacionais que correm em sigilo. Nesta reportagem figuram apenas os processos em que teve acesso aos dois lados da questão, o do pai e o da mãe, e a documentos oficiais.

Nicole, de 7 anos, mora hoje em Manaus com a mãe, a amazonense Mônica Dutra, de 32 anos, gerente de compras. Mônica conheceu o pai de Nicole, o americano Robert Martin Pate, de 46, em Manaus. Os dois namoraram por algum tempo e Mônica engravidou. Nicole nasceu na capital do Amazonas. Quando ela tinha seis meses, em abril de 2001, os pais se mudaram para Houston, no Estado americano do Texas, onde se casaram. Três anos depois, os problemas conjugais se agravaram e Mônica pediu a separação. Segundo ela, Robert nunca aceitou essa solução. “Você vai pagar o preço do divórcio”, teria dito ele na ocasião. Robert, por sua vez, afirma que Mônica não se acostumou ao jeito americano de viver “sem empregada e sem babá”. Ela nega. Nos Estados Unidos, Nicole estava sob guarda compartilhada e recebia visitas regulares do pai. Mônica conta que, segundo a legislação do Texas (nos EUA a lei de guarda varia de Estado para Estado), ela estava obrigada a morar apenas na região metropolitana de Houston. Mônica diz que, depois da separação, sentia saudades da família e queria voltar ao Brasil. Quando seu pai teve um câncer, decidiu retornar por definitivo. Disse isso a Robert, mas ele não aceitou. Então, ela partiu com Nicole com uma autorização para que ela passasse alguns dias em Manaus.

As duas não voltaram mais a Houston. Robert entrou com um processo na Justiça americana, que considerou o caso como “sequestro de menor”. Mônica afirma que nunca recebeu notificações judiciais sobre processo algum. Também diz que nunca impediu Robert de ver Nicole e que os parentes dela até ofereceram apoio logístico e financeiro para visitar a menina. Robert entrou com uma ação na Justiça brasileira para obter a guarda da filha e perdeu. Hoje, ambos se dizem cansados com as disputas judiciais. Em abril, Mônica e Robert devem se encontrar no Brasil para tentar um acordo amigável.

As guerras pela custódia de um filho vão muito além dos números frios. Elas representam a dor de centenas de famílias, tanto do lado materno quanto do paterno, e podem afetar diretamente o estado emocional do principal envolvido, a criança. Isso sem falar na soma exorbitante que os pais e familiares gastam com honorários de advogados locais e internacionais. Quase todas as histórias desses brasileiros têm em comum romances que começam como contos de fadas e terminam em disputas ferrenhas nos tribunais internacionais, algumas chegando ao embate diplomático, como é o caso do menino Sean. As situações mais frequentes são as de brasileiras casadas com estrangeiros que vão morar fora do país e depois da separação, por diferentes motivos, querem retornar ao país com os filhos. Na hora de voltar, surge a questão: com quem deve ficar a criança? De acordo com a Convenção de Haia, da qual o Brasil é signatário, no que diz respeito a raptos de menores, uma criança só pode sair de um país ou permanecer nele com a autorização dos detentores do direito da guarda.

A convenção, como qualquer outra peça legal, é bem-intencionada: visa ao bem-estar da criança. O problema é sua interpretação. Um dos itens mais polêmicos é o que diz que o detentor da guarda perde a custódia caso entre com o processo um ano após a “abdução”. Ao discutir-se a guarda, pairam outras questões. Como ficam as visitas quando é preciso pegar um avião para ver o filho? Como ficam as disputas por bens?

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IMBRÓGLIO

A amazonense Mônica Dutra, com a filha Nicole. Ela partiu dos EUA com permissão temporária. O pai, o americano Robert, quer que a filha retorne

Desde o início de 2008, o menino Lucas Aagesen está no centro de uma acirrada briga entre sua mãe brasileira, a psicóloga Roberta Santalucia, e seu pai, o economista e funcionário público dinamarquês Soren Aagesen. Enquanto brinca pela casa onde mora, em Atibaia (cidade a 65 quilômetros de São Paulo), o menino brasileiro de 3 anos é o centro de uma batalha judicial que inferniza a vida de seus pais. O casal decidiu romper de vez em maio de 2008, quando Roberta pegou Lucas e deixou a casa de Soren em Malmö, na Suécia, com destino ao Brasil. O que se seguiu à viagem foi uma enxurrada de ações movidas por Soren e uma decisão que deixou Roberta perplexa: a Justiça sueca classificou o retorno de Lucas como “crime grave” e decretou a prisão da brasileira. Ela agora faz parte de uma lista da Interpol e pode até ser presa se sair do Brasil.

Qual teria sido o crime cometido pela mãe de Lucas? A julgar pelas definições da Convenção de Haia, invocada pela promotoria sueca, Roberta sequestrou o próprio filho quando deixou a Suécia sem a autorização do pai do menino. Esse é o argumento de Soren. A mãe de Lucas tem outra versão. “Eu não deixaria a Suécia sem seguir todas as orientações da embaixada brasileira”, disse Roberta. Ela conta que só voltou ao Brasil porque o próprio Soren assinou um documento oficial da embaixada brasileira autorizando o retorno da criança. Ela também já havia obtido a guarda provisória de Lucas na Justiça brasileira. A defesa de Roberta diz que a Justiça sueca ignorou os documentos e que a decisão de prendê-la é uma afronta à soberania das leis brasileiras. O processo que definirá a guarda definitiva de Lucas corre em segredo de Justiça e se arrasta em várias frentes, no Brasil e na Suécia. Mas como no caso de Mônica e Bruna, essa história vive a mesma assimetria: dependendo do país, Roberta pode ser considerada culpada ou inocente. Na Suécia, sua prisão continua valendo. No Brasil, ela conseguiu a guarda provisória do filho e foi inocentada pelo crime de sequestro descrito na Convenção de Haia. Uma medida cautelar de busca e apreensão de Lucas chegou a ser autorizada, mas outra decisão da Justiça federal anulou a ação.

Uma questão importante considerada pelos juízes é como a criança está vivendo no momento da decisão judicial. Mesmo depois de anos de disputas, ela geralmente já está adaptada a um lar. Uma vez estabelecidos vínculos com uma família e um país, torna-se mais difícil retirá-la dali – ainda mais quando as visitas do outro pai são raras, o que é comum. As famílias brasileiras entrevistadas garantem que sempre deram acesso às crianças para que o ex-cônjuge as visitassem. Os americanos Goldman e Pate disseram a ÉPOCA que não vieram ao Brasil por terem sido orientados por seus advogados a não cair em uma “cilada judicial”. Isso significaria dizer que, se a presença paterna tivesse sido caracterizada como “constante”, talvez eles perdessem a chance de que seus processos fossem julgados em seus próprios países.

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ESPERA

Robert Pate em foto antiga com Nicole. Ele aguarda uma solução amigável para a disputa com Mônica

Mas o que, afinal, está em jogo? Não é o bem-estar desses meninos e meninas? Para complicar ainda mais, cada lado se apoia em diferentes resoluções dos tribunais de cada país. Na Europa, para amenizar esse conflito judicial, foi criada no Parlamento Europeu uma instância mediadora apenas para cuidar desses casos. A melhor solução, como já diz a Convenção de Haia, é aquela que contempla a criança, e não a vontade dos pais. Muitas vezes, nessa guerra raivosa, isso é esquecido.

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