Castro, Paulo Rabello



Castro, Paulo Rabello. “Respostas ao terror”. São Paulo: Folha de São Paulo, 19 de setembro de 2001. Jel: F

Respostas ao terror

Paulo Rabello de Castro

Ainda chocado pela brutalidade e a surpresa do ataque terrorista aos Estados Unidos, o mundo busca culpados, explicações e tenta se recompor dos efeitos paralisantes do atentado que marcará, com certeza, a virada do milênio.

Passados oito dias do ataque, começa a ficar claro que os efeitos defasados do atentado serão, possivelmente, mais danosos que os prejuízos materiais imediatos, ressalvado o aspecto irreparável da perda de tantas vidas humanas.

A "blitzkrieg" terrorista ceifará negócios, patrimônios, empregos e oportunidades ao longo dos próximos meses, em ondas sucessivas, que se espalharão a partir do epicentro da abalada capital econômica mundial -Nova York. O Brasil, sua economia e suas empresas, já começa a fazer as contas do seu próprio prejuízo. O impacto imediato já se sente pela restrição à disponibilidade de recursos, tanto de empréstimos externos como de capital de risco. O reflexo disso é a alta da cotação do dólar, em relação ao real. Tudo indica que a pressão altista deverá se manter ao longo das próximas semanas.

Mas é, sobretudo, no ritmo dos investimentos que o impacto maior do terror estabelece seu efeito paralisante.

Uma visão otimista -e potencialmente correta- elabora seu raciocínio em torno de áreas ou países "ao abrigo" do furor terrorista. Um desses países seria o Brasil. Nosso país desenvolveu uma etnia miscigenada e uma cultura de tolerância religiosa e, até certo ponto, política. Todos esses aspectos agora passam a contar mais positivamente, pesando na decisão de investidores externos e nacionais, quando avaliam o risco político de suas inversões.

Mas esse cenário positivo para o Brasil, que deve ser ressaltado ao se diferenciar para melhor este lado de cá do mundo, fica nublado pela vulnerabilidade extrema do nosso frágil mercado de capitais. Falando sem rodeios, a poupança interna do país se dispersa pela quase absoluta carência de instrumentos de acumulação das economias de famílias e empresas brasileiras, ou seja, alternativas de capitalização lastreadas em bons e diversificados projetos de investimentos.

O mercado acionário brasileiro está murcho como uma laranja seca, perdendo sumo para Nova York. Revigorá-lo é um projeto que depende de que se adote uma atitude radicalmente reformista dos mecanismos de acumulação previdenciária. Como resposta aos efeitos do atentado, esta é a hora de avançar nos processos de transformação das contribuições dos trabalhadores à Previdência Social e ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço em mecanismos de efetiva acumulação individual de poupança. Hoje esses recursos são vertidos para o gasto público corrente.

Até mesmo a crise de energia pode ser invocada como resposta aos dilemas atuais. A necessidade de inversões maciças no setor -estima-se algo na ordem de US$ 90 bilhões dos próximos cinco anos- está sendo "desperdiçada" pela falta de aproveitamento do potencial de poupanças populares para projetos altamente rentáveis.

Poucas semanas após a constatação da crise energética, veio uma resposta criativa do governador Dante de Oliveira (PSDB), do Estado de Mato Grosso, ao propor uma forma de poupança acumulada em kW instalados. Por meio de um mecanismo engenhoso de poupança programada, qualquer cidadão poderia adquirir, ao longo de um certo período de investimento (três, cinco ou dez anos), uma certa quantidade de kW em projetos novos de hidreletricidade.

Essa solução, bem próxima da compreensão de qualquer um, seria estimulada pela idéia de um fornecimento garantido de energia para qualquer consumidor residencial ou comercial. Mesmo que o projeto da usina, captador do investimento financeiro, estivesse a milhares de quilômetros de distância, no norte do país, por exemplo, ainda assim não haveria nenhum problema em garantir a entrega de energia a esse pequeno investidor, no centro-sul ou onde estivesse, mediante simples trocas de posição no mercado atacadista de energia.

Pela alternativa sugerida por Dante de Oliveira às autoridades setoriais e ao presidente da República, uma grande mobilização de interesses populares se juntaria a grandes grupos para financiar o esforço investidor em pequenas unidades de geração (PCH's) ou até em megaprojetos, como o de Belo Monte, no rio Xingu.

Esse último tem tudo para ser um investimento de grande poder de resposta ao atual problema de suprimento hídrico. São 11.000 MW, ou seja, mais de 15% de acréscimo ao atual parque de geração brasileiro.

Projetos como esse poderiam sair do papel com a volumosa participação de poupadores de pequeno porte, "comprando as debêntures de Dante", tornando nosso mercado de capitais mais vivo, mais capitalizado, mais legítimo, ajudando a formar o pecúlio de milhões de indivíduos.

O atentado terrorista teve o efeito de paralisar negócios e escancarar a face do medo. Mas também abre janelões de oportunidades para os que oferecem à crise e ao medo um adequado arsenal de respostas criativas.

Não podemos deixar o terror ficar falando sozinho. Depende de nós.

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