O ensaio do professor Renato Mendonça sobre A influência ...



|O ensaio do professor Renato Mendonça sobre A influência africana |— E’bó é um ex-voto, distinguindo-se, por isso mesmo, do despacho. |

|no português do Brasil é, no assunto, o que de melhor possuímos. Os| |

|capítulos dedicados à fonética e morfologia do quimbundo e as |— Mocotó, na Bahia, além de significar mãos e pés de animais como o|

|transformações do português no Brasil sob a influência negra são |boi, o porco, etc., ou de gente mesmo, é ainda o nome de uma |

|alguma coisa de sério, possível apenas nos homens em quem o |comedoria muito afamada da culinária baiana. |

|espírito científico é como uma segunda natureza. Outros capítulos, | |

|como os dedicados à linguística africana e ao tráfico negreiro, |— Ilu, em nagô, significa terra. |

|atestam a probidade científica do autor. Pena que o professor | |

|Renato Mendonça, que dá o quimbundo como língua dos povos bantus no|— Nagô não foi um nome dado pelos baianos aos negros de yorubá, mas|

|Brasil, nada diga sobre o nagô (ou yorubá), língua geral entre os |pelos franceses, na África. |

|povos sudaneses. | |

| |— Obá, não é príncipe, mas rei, em nagô, havendo ainda uma orixá, |

|Mas o professor Renato Mendonça às vezes se arrisca a aformações |Obá, mulher de Xangô, que não possui nenhum culto organizado no |

|ousadas. Diz ele, por exemplo, que já não se fala mais africano nas|Brasil. |

|macumbas. E se o professor Renato Mendonça viesse à Bahia? Aqui o | |

|nagô se usa mesmo na conversação comum... |— Oku, morrer, tem um homógrafo-homófono que entra no bom-dia dos |

| |nagôs (oku assan). |

|Há no capítulo dedicado à influência africana no português, uma | |

|alusão ao "s prospectico, nascido da ligação na frase" e a |— Opelê (e não opelé, como está no vocabulário) é o rosário de Ifá,|

|afirmação de que, dos negros, nada — ou quase nada — ficou no modo |usado pelos babalaôs. |

|de falar do brasileiro, que mereça especial atenção. Sobre o | |

|primeiro, tenho a notar que, pelo menos na Bahia, há um plural de |— Quenga, não só na Bahia, como no norte do Brasil, significa |

|que, sempre que o substantivo que o acompanha nas frases |mulher pública, rameira, dessas de baixa cotação. |

|exclamativas indica plural, embora este se conserve invariável, | |

|como na exclamação seguinte: |Entre aquelas que, ao meu ver, precisam de uma revisão séria, anoto|

| |as seguintes: |

|— Ques galinha! | |

| |— Agogô, relógio, e não sino, tem uma significação ampla, todos os |

|Também, não será negro o costume de fazer desaparecer o artigo em |instrumentos de metal que produzam som, podendo levar esse nome. O |

|certas frases? Por exemplo, nesta: |termo é, aliás, corruptela de akokô. |

| | |

|— Polícia apareceu, negro se pregou... |— Desbundar, desandar, dar embarulho, nada tem a ver com a |

| |significação que lhe dá o autor. |

|Em nagô, e suponho que nas línguas a ele aparentadas, no singular | |

|os substantivos não levam artigo. No português de Portugal também |— Yawô é a pretendente a filha-de-santo, a noviça, e é termo nagô, |

|há disso, mas não se trata do artigo definido (E aqui "negro", que |onde significa noiva e esposa ao mesmo tempo. |

|evidente está no plural, ou pelo menos banca o substantivo | |

|coletivo, também não leva artigo...). Em todo caso, cabe aos |— Mugunzá (munguzá, mucunzá) não se pode confundir com a canjica, |

|técnicos resolver a questão... |nem é somente mssa de milho cozido, mas também líquido, de milho |

| |branco cozido em água, sal e coco. Ainda tem o nome popular de |

|Adiante, o professor Renato Mendonça modifica as lendas africanas |chá-de-burro. |

|sobre o nascimento dos orixás, fazendo Xangô brotar do seio de | |

|Olorum... descuido? |— Ogan, e não ougan, não é nem chefe, nem sacerdote graduado, mas |

| |apenas sócio do candomblé. |

|Já no vocabulário, o professor Renato Mendonça garante que, "em | |

|yorubá, o s corresponde a um fonema chiante equivalente ao nosso |— Haverá alguém, no Brasil, que prefira a forma africana puíta à |

|ch". Não é totalmente exato. Em nagô, há dois s, um dos quais |brasileira cuíca? |

|corresponde ao nosso s (mais exatamente, ao nosso s duplo) e o | |

|outro ao nosso ch. |— Xexeré, e não xequerê, é o chocalho especial de Xangô, usado para|

| |invocá-lo nos candomblés. |

|Todas as vezes que o professor Renato Mendona procura refutar as | |

|afirmações de Nina Rodrigues, a gente acaba sempre por dar razão ao|— E mais, Zambi, com acutização, ou Zámbi? |

|velho professor de Medicina Legal... Taí no caso do totemismo entre| |

|os povos maometanos no Brasil. |Mais alguma coisa sobre o vocabulário. |

| | |

|* * * |— Anamburucu (Nanamburucu, Nanan), divindade das águas, não é |

|Vejamos agora o vocabulário de termos africanos que vem |exatamente a mãe-d’água, mas a mãe da mãe-d’água, a mais velha das |

|acompanhandoo texto. |mães-d’água, por isso identificada com a senhora Santana. |

| | |

|Entre as palavras das quais o professor Renato Mendonça nos dá uma |— Cambada, não é somente termo mineiro, mas baiano também. |

|explicação limitada, insuficiente, destaco as seguintes: | |

| |— Engambelar não tem somente por área geográfica Pernambuco, |

|— Aluá, na Bahia, faz-se com a casca do abacaxi, deixada dentro de |estendendo-se também à Bahia, sob a forma engabelar, o que também |

|uma garrafa ou outro vaso qualquer, com água, para fermentar. |acontece com gongolô (Maranhão), que, sob a forma gongôlo, |

| |significa, na Bahia, barulho, confusão, pandemônio. |

|— Ayê, em nagô vida, era usada, antigamente, na expressão ilu ayê, | |

|terra de vida, com a qual os escravos designavam a África. Para os |— Irocó não pode vir de "roco, árvore milagrosa", pelo simples fato|

|africanos, havia a expressão ará ilu ayê, gente da terra da vida. |de não existir essa palavra em nagô. Há Irôko, a gameleira branca, |

| |hoje adorada como deus, ou Lôko, como a chamam os jejes. A forma |

|— Babalaô, sacerdote de Ifá, é o adivinhador entre os negros, |Rôko (o r continua brando) existe na Bahia, corruptela de Irôko. |

|espécie de vidente, de ledor do futuro, e se serve de búzios, ôbi, | |

|orobô, pimenta da Costa (ataré) e rosário (opelê-ifá). |— Sacuê (por aqui se diz sacué) tem ainda, na Bahia, os nomes de |

| |tou-fraco (de origem onomatopaica), conquém, etc. |

|— Batuque, na Bahia, é um pequeno recipiente de rapé (cornimboque) | |

|e ainda, na gíria, o membro viril. |— Xaponan (ou, melhor, Saponan, em jeje) já é corruptela de |

| |Xampanan, havendo hoje, na Bahia, a forma Xapanan. |

|— Cacumbu, na Bahia, é também o resto da faca nova, ou inteira, às | |

|vezes. Chamam-se ainda cacumbus os homens pequenos. |Outras palavras africanas muito em voga não vem no vocabulário. Por|

| |exemplo, ekedi, feminino de ogan, bozó, feitiço (do termo tshi |

|— Calunga (ver Mário de Andrade, "A calunga dos maracatus", Boletim|bosum, santo?), cucumby, festa totemica dos negros bantus na Bahia,|

|de Ariel, dezembro de 1935, trecho de seu trabalho agora publicado |etc. etc. |

|nos Estudos afro-brasileiro, edição Ariel, 1935, e Artur Ramos, O | |

|negro brasileiro, p.84-85) pode ser tanta coisa, além de boneco... |* * * |

| |Apesar, porém, desses erros e dessas deficiências, o ensaio do |

|— Candomblé, hoje, muitas vezes significa o próprio terreiro, onde |professor Renato Mendonça, merece os mais calorosos elogios. |

|se realizam as práticas fetichistas dos negros. |Trata-se, sem dúvida nenhuma, de obra de indiscutível valor. |

| |Possivelmente, numa outra edição, corrigidos os defeitos atuais, |

| |aumentando o texto com um capítulo sobre o nagô, este A influência |

| |africana no português do Brasil se torne o livro número um, o livro|

| |indispensável a qualquer pesquisa semelhante. E, para falar a |

| |verdade, mesmo assim como está, falta-lhe muito pouco para isso. |

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