INTRODUÇÃO



CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM SOCIEDADE, DESENVOLVIMENTO E AGRICULTURA – CPDA / UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO(UFRRJ).

NOME : RODRIGO DE SOUZA PAIN – MESTRADO – Estudos Internacionais Comparados.

ORIENTADOR : Dr. HÉCTOR ALIMONDA.

Dissertação de Mestrado.

Título : “A inserção do Brasil no processo de independência e desenvolvimento da República Popular de Angola(1975-1986) na perspectiva da cooperação entre os países em desenvolvimento”.

1- INTRODUÇÃO :

“Fazer política externa é assumir atitudes condizentes com o interesse nacional a curto, médio e longo prazos, afrontar riscos se preciso for”. Com essas palavras, o Representante Especial do Brasil perante o Governo de transição que precedeu à independência da República Popular de Angola1, o Embaixador Ovídio de Melo definiu um conceito de política externa que será importante para o entendimento da conjuntura de que trata a dissertação.

Inicialmente, o trabalho enfocará os desdobramentos iniciais do conturbado processo de independência em Angola. Com a Revolução dos Cravos no país colonizador, e a queda da ditadura Salazarista, Angola ficou a mercê da própria sorte, pela guerra civil e a intervenção estrangeira que se seguiu abruptamente deixando o país sem quadros técnicos, já que a produção e a administração dado o colonialismo português não tinha produzido sequer um número significativo de técnicos durante o período colonial. Nesse contexto, os três reconhecidos movimentos de libertação angolana reivindicaram o poder no país, desencadeando uma sangrenta guerra, apesar dos tratados de paz estabelecidos entre si e a potência colonizadora. Ainda dentro dessa abordagem inicial, a frágil situação econômica do novo país durante a década seguinte também será investigada.

No ponto que se segue, a pesquisa irá se situar na relação do Brasil à luz do diálogo entre os países em desenvolvimento e a inserção do nosso país no processo sócio -econômico de independência de Angola. Será apresentada uma abordagem histórica, desde as primeiras reais aproximações com os países em desenvolvimento da África e da Ásia com a Política Externa Independente de Quadros e Goulart, passando pela mudança de paradigma introduzida pelos governos militares, e pela nova abordagem do pragmatismo responsável de Geisel, até o primeiro governo civil depois do período militar, incluído o papel do Brasil com relação à Angola no pré independência, e também a participação do Brasil nas novas relações entre os países do Terceiro Mundo que aconteciam naquele momento.

No seguinte capítulo, mostrarei alguns aspectos das relações comerciais entre Brasil e Angola, a partir da independência desse país. Esperava-se muito da participação brasileira no desenvolvimento de Angola, justamente por o Brasil ser o primeiro país ocidental de júri a reconhecer o governo socializante do MPLA em Angola, um fato que desagradou a uma parcela da elite conservadora do Brasil e também aos Estados Unidos(Saraiva;1996:181), como afirma Henry Kissinger em seu livro “Anos de renovação” e Robert Stockwell, funcionário graduado da CIA, no seu livro “In search of enemies”. Tentarei abordar ainda uma análise de alguns papéis que empresas brasileiras desempenharam em Angola no período estudado.

Apresento a seguir, a teoria da cooperação Sul-Sul, muito debatida, analisada, por vezes questionada. Utilizo-me da cooperação entre os países em desenvolvimento como uma espécie de “pano de fundo” para situar as relações políticas e comerciais entre Brasil e Angola, por considerar essas relações, como diz Cunha, “nos moldes da estrutura entre centro e periferia, de um lado o Brasil exportando quase que na totalidade produtos industrializados, e recebendo em contrapartida petróleo e hidrocarbonetos”(1991:163).

Por fim, abordarei a aprovação na ONU da proposta brasileira de criação da Zona de Paz e Cooperação no Atlântico Sul(ZPCAS) como um ponto significativo nas relações Brasil e Angola. A justificativa para considerar a proposta de 1986 como término da pesquisa está referida ao contexto de guerra fria, na situação de uma rivalidade Leste Oeste, onde o Brasil buscou apoio na Angola socialista entre outros países aliados africanos para formalizar a proposta(Decuadra;1991:166-167). Este fato desagradou novamente aos Estados Unidos, que foi o único país a votar contra a proposta.

Diante desse breve quadro apresentado aqui, será colocado de forma quase paralela aos assuntos relacionados na relação Brasil e Angola, o contexto das relações internacionais naquele momento. Os dois países viveram o processo de guerra fria, portanto, as análises aqui acordadas se situarão diante da situação mundial do momento.

A participação do Brasil no processo de independência, no reconhecimento e no desenvolvimento da República Popular de Angola é uma das razões da relevância do tema e da importância de seu estudo. Angola é uma das nossas matrizes históricas culturais, compartilhamos da mesma língua e constitui, economicamente, um parceiro respeitável, apesar de algumas limitações de acordo com o período estudado.

Celso Lafer, atual Ministro do Estado das Relações Exteriores afirmou que “nossas relações com África não se limitam às expectativas fundadas na afinidade natural entre legatários de uma herança comum (...).A valorização do diálogo interregional, por meio da presença brasileira na Zona de Paz e de Cooperação no Atlântico Sul e, especialmente, na Comunidade de Países de Língua Portuguesa, demonstra a existência de um amplo universo de interesses comuns”2. Diante dessa afirmação, percebe-se o quão relevante é no momento o debruçar no estudo dessa temática.

Essa dissertação não pretende esgotar todos os aspectos que envolvem as relações políticas e comerciais entre Brasil e Angola, por se tratar de um amplo período analisado e com grandes complexidades que envolvem outros atores em questão. O que se pretende apresentar é uma forte revisão bibliográfica, enfocando análises de pesquisadores, especialistas, fontes oficiais e dados relevantes e trazendo esse debate à luz da discussão acadêmica sobre os temas aqui propostos. Essa será uma boa aproximação das idéias aqui inseridas que espero poder dar continuidade.

DESDOBRAMENTOS DO PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA EM ANGOLA.

O 25 de abril de 1974 foi um dia de extrema importância para a independência dos países de língua portuguesa em África. Em Lisboa, neste momento, acontecia a “Revolução dos Cravos”, onde o Movimento das Forças Armadas, um grupo dentro do exército, derrubava a ditadura Salazarista3 em Portugal. A idéia de liberdade que Portugal pretendia alcançar, atingiria também as colônias, que lutavam pela independência.

Com a saída de grande parte dos colonos e do exército português, Angola, assim como as outras colônias, passou por problemas na administração do novo Estado que se criava. Instalou-se a disputa pelo poder entre os três movimentos de libertação nacional, o MPLA(Movimento Popular de Libertação de Angola), a FNLA(Frente Nacional de Libertação de Angola) e a UNITA(União Nacional de Independência Total de Angola).

Durante os anos de luta pela independência, os movimentos estiveram sempre em oposição4, cada movimento se considerava legítimo representante do povo angolano; em comum apenas a idéia de um país livre. Dombe diz que "... as divergências étnicas, ideológicas e regionais, bem como a polarização derivada das fontes de apoio externo contribuíram para aumentar as diferenças entre os três movimentos"(Dombe;1995:55-56). Esses apoios externos pode-se dizer que o MPLA liderado por Agostinho Neto, recebeu apoio de Cuba e URSS, além do importante apoio interno na capital, principalmente nos musseques(favelas em Luanda), considerado por muitos como o “poder popular” do MPLA; a FNLA liderado por Holden Roberto, composto basicamente pelos Bacongos, grupo étnico no Norte de Angola, recebia desde o início da luta, auxílio norte- americano; durante 1973-74 apoio de formação militar chinês; e do Zaire(hoje República Democrática do Congo). A UNITA liderada por Jonas Savimbi(esse inicialmente era o Ministro das Relações Exteriores da FNLA), com forte apoio na província de Huambo(sul do país), sua ação militar altamente potencializada com a África do Sul nas vésperas da independência. Cabe lembrar também da existência da FLEC( Frente de Libertação do Enclave de Cabinda) - apoiada pelo Congo Democrático - defensora da autonomia de Cabinda, região muito rica em petróleo que não sentou à mesa das negociações que vieram a acontecer por se tratar de um movimento que visava a separação de uma parte do território nacional angolano.

Portanto, com a Revolução dos Cravos, houve em seguida ,a saída do exército português em Angola. Entre os dias 3 e 6 de janeiro de 1975 aconteceu a cimeira da cidade de Mombaça na República do Quênia, onde os três movimentos de libertação se reuniram para que se pudesse a seguir realizar um encontro com o novo governo português. Nesse encontro ficaram acordados alguns pontos, entre os quais :

“Reafirmam a sua determinação de salvaguardar a integridade territorial de Angola(...) Nesse contexto a Região de Cabinda é parte integrante e inalienável do território angolano”.

“Os três movimentos de Libertação comprometem-se a edificar a nação angolana sobre bases justas e democráticas, eliminando por isso todas as formas de discriminação étnica, social, religiosa ou de qualquer outro tipo”.

“Igualmente as três organizações políticas angolanas manifestam veementemente a sua decisão de, perante a deteriorização da economia do país, exigir do Governo Português a adoção de medidas urgentes e eficazes, de acordo com os Movimentos de Libertação que salvaguardem os interesses sociais das massas trabalhadoras, estimulem o desenvolvimento econômico do território e o processo de reconstrução nacional” (Freitas;1975:178)

Entre os dias 10 a 15 de janeiro de 1975, é assinado em Alvor, Portugal, um acordo sobre a independência de Angola, entre os representantes dos três grandes movimentos (MPLA, FNLA e a UNITA) e o governo português. Nesse acordo o Estado Português reconhecia os três movimentos de libertação como representantes legítimos do povo angolano, além de concluir as negociações do processo e o calendário do acesso de Angola à independência. Seguem abaixo, alguns artigos do tratado:

"A plena independência e a soberania de Angola serão solenemente proclamadas a 11 de novembro de 1975 em Angola pelo presidente da República Portuguesa..."(artº2)

"Depois do cessar- fogo as forças armadas do FNLA, MPLA e da UNITA ficarão nas regiões nos locais correspondentes à sua posição presente..."(artª7)

"Os ministros do governo de transição nomeados em número igual pela FNLA, MPLA e UNITA e pelo Presidente da República Portuguesa, prestam juramento perante o Alto - Comissário".(artº20) ( Lazitch e Rigoulot;1988:42). Ou seja, um governo semi autônomo.

A intenção do Acordo era a melhor possível, pois conciliava o interesse de todas as partes, com um representante de cada movimento dentro do governo de transição. Apesar disso, continuavam os conflitos entre os movimentos em Angola, principalmente após a quinzena de julho de 1975, data prevista para começar este governo de transição angolano5 e quando o MPLA passa a controlar Luanda. O governo de transição proposto pelo Acordo de Alvor não consegue prevalecer no país após julho de 1975. Pouco antes da independência começaram a desembarcar tropas estratégicas cubanas e material bélico da URSS em Angola. Segundo Marcelo Bittencourt, professor e pesquisador do CEAA(Centro de Estudos Afro Asiáticos – UCAM) em entrevista realizada em fevereiro de 2002, afirmou que inicialmente o material e as tropas chegaram em número pequeno, cerca de 400 a 600 homens e que depois esses números cresceram rapidamente. A África do Sul, que iniciara em agosto de 1974 uma intervenção militar no extremo sul de Angola, sobre o pretexto de financiar barrangens, desencadeia a partir de outubro uma ofensiva com cerca de 2000 homens com blindados a caminho de Luanda com o apoio da UNITA e da FNLA.

Lazithc e Rigoulot apontaram alguns fatores importantes para a vitória do MPLA, além da presença cubana e armas soviéticas. Segundo eles, a ajuda do Partido Comunista Português, do Movimento das Forças Armadas e do movimento de esquerda portuguesa foram importantes para o êxito inicial do movimento de Agostinho Neto. A data não fez cessar os conflitos, ao contrário, aumentou a internacionalização que se traduziu como a entrada definitiva do continente africano no cenário da guerra fria.

No dia 11 de novembro de 1975 a guerra em Angola explodiu com a criação de dois "Estados" : a República Popular de Angola, com capital em Luanda e dirigido pelo MPLA; e a República Democrática de Angola, com capital em Huambo e proclamada à revelia pelo governo encabeçados pela FNLA e UNITA. Observadores da cena política local concordam em que o MPLA tem o apoio da maioria da população, a UNITA e a FNLA são mais fortes no interior(Acosta;1976:11). A “República Democrática” não foi reconhecida por nenhum país estrangeiro ou comunidade internacional(Bento;2001:142).

O conflito armado no pós 11 de novembro de 75, já com a participação cubana e soviética ao lado do MPLA, que avança fortemente ao interior do país, levando as tropas sul africanas a abandonarem Angola em março de 1976, deixa a UNITA enfraquecida, concentrado-se numa segunda fase a uma pequena parte do interior de Angola6. A FNLA afunda-se em termos militares7. O MPLA pode, então reivindicar a totalidade do poder, controlando militarmente doze, das então dezesseis províncias do país(Pereira;1999:14).

ECONOMIA ANGOLANA NO PÓS INDEPENDÊNCIA.

A economia angolana não estava em condições favoráveis para a prosperidade, haja visto as condições para o desenvolvimento no pós independência. Nesse período, a República Popular de Angola, governado pelo MPLA demonstra a vontade de apoiar a industrialização do país. O governo marxista opta por uma alternativa socialista de Estado. Do ponto de vista político, Pereira afirma que a oposição da grande maioria dos países do Ocidente ao MPLA, iniciada desde o desencadear da guerra de independência teve duas motivações básicas : o apoio do Ocidente à Portugal e a filiação a OTAN, e a opção inicial americana ao FNLA. Além disso, os países socialistas(URSS e Cuba – principais), eram vistos, segundo Pereira, de modo geral, pela maioria dos pan- africanistas(ver mais sobre o termo em Outhwaite, W e Bottomore, T. in Dicionário do pensamento social do Século XX, Jorge Zahar Editor, 1993, pp.545-548), como não portadores de um passado colonizador. Pelo contrário: além de um forte discurso e posições anticolonialistas, eles ofereceram apoio logístico e militar a vários movimentos de libertação africanos. Alguns dirigentes africanos chegavam a considerar o capitalismo como sinônimo de colonialismo(1999:117).

Especialistas em economia apontam o ano de 1973, como o auge da prosperidade econômica em Angola. Naquele momento, Angola era o quarto produtor mundial de diamantes, produção que superava a dois milhões de quilates, em uma exploração realizada pela Diamang – consórcio entre o Estado e investidores estrangeiros; e o quarto maior exportador mundial de café, produzindo cerca de 270 milhões de toneladas, liderando a captação de moeda cambial em benefício da colônia até 1973(Bento;2001:92).

Entre os anos de 1975-85, intensificou à estruturação do setor industrial estatal efetuado a partir de políticas de confisco e nacionalizações, e da criação das unidades econômicas estatais. Essas nacionalizações(muitas ocorridas entre maio e junho de 1976) eram fruto do abandono das empresas por parte dos colonos portugueses, ou seja, não havia quadros técnicos que pudessem assumir o comando de tais empresas. Pereira aborda a questão das nacionalizações se referindo à situação caótica da economia no imediato pós independência, onde foi promulgada a Lei 3/76, de 3 de março de 1976, em que, em nome da “política econômica de resistência” autoriza as “nacionalizações e confiscos de empresas e outros bens”. Pereira lembra que essa lei não atingiu as multinacionais(1999:138 – ver mais no capítulo o Paradoxo Angolano in Pereira:1999). (Com relação a setores nacionalizados - do português do Brasil : estatizados - ver mais em Maia;1977:74-75 - ).

Segundo Ennes Ferreira, em um primeiro momento(1975-1981), o governo angolano teve a intenção de promover uma industrialização socialista baseada na indústria pesada, mas não havia condições para promover tal estratégia de desenvolvimento. Entre os anos de 1981-85, o governo mudou sua postura com relação à industrialização, apostando no modelo de substituições de importações( que curiosamente muitos países africanos adotaram no pós independência, provavelmente fruto do nacionalismo naquele momento), talvez inspirado na CEPAL que propunha para a promoção dos países subdesenvolvidos um forte protecionismo com a orientação da economia para dentro(Torres in Ferreira;1999:XXXII).

O setor agrícola foi atingido pela estatização, embora o partido tenha estimulado um mínimo esforço de cooperação, ele foi menos beneficiado em termos de investimento, o partido desestimulou as cooperativas. A crise na agricultura foi apontada por Pereira por dois fatores, a crescente instabilidade militar e a consquente dificuldade de circulação de pessoas e bens; redução na importação de matérias primas para a indústria nacional, privando os camponeses de produtos essenciais(1999:142 e 159).

O setor dos petróleos foi eleito o domínio estratégico para o desenvolvimento econômico e social do país dadas as características específicas no conjunto da economia angolana. Uma utilização racional das reservas desse recurso não renovável foi considerada necessária para manter a produção por muitos anos e assegurar, pelas exportações, a obtenção de fundos necessários ao financiamento do desenvolvimento econômico, com vista à criação de material indispensável a construção de uma sociedade socialista(Bhagwati in Ferreira;1999:49). O fortalecimento do setor econômico privado não aconteceu, devido a idéia que cujo “desenvolvimento e consolidação constitui um perigo eminente para a Revolução”(Ferreira;1999:40).

Entre as várias crises que marcaram a economia angolana, pode-se afirmar que a queda dos preços do petróleo e do café(a partir de 1981), além da queda das receitas do diamante, deixaram a economia mais frágil. Além disso, a tentativa de golpe de Fito Alves(com o discreto apoio soviético) em 1977, os crescentes ataques sul africanos em Angola( Maio de 1978, agosto de 1980 e 1981), haja visto o apoio angolano a SWAPO e também o ANC – African Nations Congress -, contrária ao regime do apartheid8 da África do Sul, além da presença da UNITA em diversas áreas do país, afetaram a instabilidade de Angola, inclusive no campo econômico, já que grande parte da arrecadação do Estado iria diretamente para a área militar( ver mais sobre as invasões sul africanas no período – operações Reinder, Protea e Askari in Pereira;1999:168).

O BRASIL NA RELAÇÃO SUL-SUL E O PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA DE ANGOLA.

Governos Jânio Quadros/ João Goulart.

Pode-se afirmar que as primeiras políticas significativas de aproximação com os países do Sul foram dadas no curto governo de Jânio Quadros(Janeiro-1961/Setembro1961). O governo anterior, de Juscelino Kubitscheck, caracterizou-se pelo alinhamento direto aos países colonialistas e pelo distanciamento do processo de independência que ocorria em África. Embora tivesse reconhecido um número significativo de países independentes no continente africano, o governo brasileiro naquele período votou contra a independência da Argélia, além do forte apoio ao colonialismo português.

Portanto, nos oito meses na Presidência, Jânio Quadros orientou uma política externa independente( para demostrar a diferença de política de alinhamento de governos anteriores), formulada de dentro para fora e não de fora para dentro, de acordo com interesses nacionais, tomando iniciativas que marcaram sua curta administração. San Thiago Dantas, principal formulador da política de Quadros, aponta alguns pontos importantes dessa política, como a contribuição à preservação da paz, através da prática da coexistência e do apoio ao desarmamento geral e progressivo; reafirmação e fortalecimento dos princípios de não –intervenção e autodeterminação dos povos; ampliação do mercado externo brasileiro e apoio á emancipação dos territórios não autônomos, seja qual for a forma jurídica utilizada para sua sujeição à metrópole(1962:07). Cervo e Bueno apontam também como característica significativa desse período de Política Externa Independente de Tiago Dantas, a atuação isenta de compromissos ideológicos, não obstante a afirmação que o Brasil é ocidental e a segmentação do mundo entre Norte e Sul, e não Leste- Oeste. A posição de independência entre os blocos desinibia o governo brasileiro na procura do que ele mesmo designava por normalização das relações diplomáticas e comerciais com todos os países(1992:280e296). Vieira citando as teses do Embaixador Araújo Castro, afirma que de certo modo existia um “quase-neutralismo” na política de Jânio Quadros no privilégio de dar ênfase na denúncia das disparidades entre o Norte e o Sul ( 2001:95). Além disso, o próprio Presidente Quadros, conforme mostram Cervo e Bueno, pouco antes da sua renúncia, redigiu um artigo para o Foreign Affairs sobre o encaminhamento da sua política externa, coerente com a mensagem que enviou ao Congresso Nacional em 15 de março de 1961. Entre os pontos relevantes estavam o apoio decisivo ao anticolonialismo e o estabelecimento e estreitamento de relações com os Estados africanos. Com relação a questão anti colonial, cabe mencionar o envio do Ministro Araújo Castro como observador, à Reunião Preliminar e Conferência de Chefes de Estado e de Governo dos Países Não Alinhados realizada no Cairo, de 5 a 13 de julho de 1961(1992:281e292).

Ricúpero diz que Quadros desenvolveu uma política externa intuitiva e inovadora, às vezes desnecessariamente provocadora como no episódio de Che Guevara( uma condecoração oficial com a Ordem Cruzeiro do Sul ao então Ministro da Economia de Cuba; para a maioria dos autores - e aí enquadro Ricúpero - Che seria a legítima expressão do comunismo mundial ). Não se pode negar, segue Ricúpero, que a política de Quadros, antecipou muitos temas e posturas que iriam definir o futuro do paradigma diplomático brasileiro. Além da atitude crítica em relação à política norte-americana de isolamento de Cuba, a simpatia pela descolonização na "África portuguesa", a preparação do reatamento com a URSS e a aproximação com a China e o "namoro" com o Movimento Não- Alinhado(1993:338). Esse termo "namoro" não representaria a realidade do governo de Quadros, conforme mostra Saraiva, analisando uma mensagem de Quadros ao Congresso Nacional onde o Brasil tinha uma posição a favor da descolonização africana, mas não possuía nenhum tipo de aliança automática com blocos terceiro mundistas, particularmente o grupo dos Não Alinhados. Quadros argumentava que a nova política africana no Brasil, seria uma "modesta recompensa" pelo imenso débito que o Brasil tinha com o povo africano(1996:63).

Oliveira aponta a intenção de Quadros quando esse solicitava providências ao Itamaraty no sentido de constituir um grupo de trabalho com o objetivo de preparar a representação diplomática brasileira em novos Estados africanos e a elaboração de uma política brasileira para aquele continente, que deveria ser reexaminada em todos os aspectos, sobretudo no político, no econômico e no cultural(Rodrigues in Oliveira;1990:269). Esse grupo de trabalho9, transformou-se no Instituto Brasileiro de Estudos Afro- Asiáticos, onde sua principal ênfase, segue Oliveira, estava no sentido de que qualquer relacionamento comercial com o continente africano seria um projeto do futuro, haja visto que naquele momento praticamente não havia comércio com África. Para ele, a crítica mais importante desse período é de José Honório Rodrigues, pois segundo esse autor, houve na realidade apenas um impulso inicial, um apaixonado interesse pela África, mas política africana propriamente nunca chegou a ser formulada.

Outro ponto importante que Oliveira aborda sobre o período é que a tentativa de relacionamento comercial com África naquele momento podia ser considerado como resultado de uma tomada de consciência inicial das desigualdades no plano internacional e da necessidade e a conveniência de um relacionamento entre países em desenvolvimento que não fosse intermediado pelas grandes potências do Norte industrializado(1990:275-278). Dentro desse aspecto econômico de aproximação com o continente africano no governo Quadros, pode-se destacar que a exposição flutuante do navio escola “Custódio de Melo”, que durante vários meses no ano de 1961 navegou por portos africanos da costa atlântica, inclusive por Luanda. O objeto desse navio era apresentar produtos brasileiros que pudessem ser exportados para os países africanos. O navio levava desde diplomatas, passando por jornalistas, além de representantes da Confederação Nacional da Indústria e do Instituto Nacional do Café. Dombe afirma que a viagem do Custódio de Melo foi considerada um sucesso econômico e político, pois despertou curiosidade e interesse nos interlocutores africanos. Nos anos seguintes, várias missões especiais africanas visitaram o Brasil para estabelecerem entendimentos sobre os produtos a serem intercambiados(1996:16)

No curto período do governo de Quadros, os conflitos em Angola se intensificaram, principalmente após o nascimento dos movimentos de libertação como o MPLA(1956) e do FNLA(1962). Saraiva acompanha a trajetória da política independente para a Angola do governo de Quadros e sua continuidade com João Goulart(Setembro-1961/Março-1964). Durante o período dos dois governos o Brasil teve uma política confusa no que diz respeito ao caso angolano. Após a intensificação dos conflitos em Angola no período de 1961-1964, as pressões internacionais sobre Portugal vieram à tona. Durante as votações nas Nações Unidas no que diz respeito a independência angolana, o Brasil ora tinha uma postura de abstenção nas votações, ora tinha uma postura de votação a favor da causa angolana - como exemplos em Junho de 1963, quando o governo brasileiro condena o colonialismo português, aprovando a Resolução 180 do Conselho de Segurança da ONU, e retrocedendo, quando absteve-se durante a votação da Resolução 1913 da XVIII Assembléia da ONU, que solicitava reformas urgentes para os territórios sob a administração de Portugal(Cunha;1991:82).

Saraiva aponta quatro razões para esses "ziguezagues" da política externa independente. O primeiro fator representa a própria instabilidade do governo Goulart, com pressões de setores mais pró – ocidentais do governo de um lado, e de grupos que queriam uma perspectiva mais independente da política exterior do Brasil. Um segundo fator, foi o papel da diplomacia portuguesa nesse período, ela desenvolveu um papel muito significativo, procurando entrelaçar o acordo que Brasil fez com Portugal no Tratado de Amizade e Consulta de 1953. Outro fator foi a tentativa americana de envolver o Brasil no caso angolano, mas os acordos econômicos entre os países não estavam numa boa fase, o que fez com a instabilidade dessa relação estivesse no âmago da política brasileira. E finalmente o quarto fator, refere-se as duas políticas africanas que o Brasil possuía. Uma política geral, especialmente para a África negra Atlântica, sustentada pela abertura comercial e na solidariedade política à descolonização. E a outra, mais específica, de admissibilidade da continuação do colonialismo para o caso das colônias portuguesas na África(1996:85-86).

O Tratado de Paz e Consulta foi uma vitória portuguesa, segundo José Honório Rodrigues, já que deu ao conceito de “comunidade” um ar caricatural, pois a comunidade é a livre associação de Estados independentes e não só com herança comum, ou similaridade jurídica, mas com cooperação técnica e, especialmente fundamento econômico. O tratado arrastava o Brasil para a órbita portuguesa, visando a dispor o apoio do Brasil nas dificuldades internacionais de Portugal. Por ele nos obrigamos a consultar Portugal - com suas dependências coloniais sobre matéria internacional, tirando-nos, dessa forma, ou pelo menos dificultando, todo nosso jogo diplomático(1961:314). Ou seja, apesar da ênfase que a P.E.I emprestava à linha do anti colonialismo, a tradicional amizade com Portugal inibia a chancelaria brasileira na tomada de posição mais contundente na questão angolana(Cervo e Bueno;1992:310).

O que ficou marcado no inovador, mas não concluído período Quadros/Goulart na Política Externa Independente foi a contradição no posicionamento do governo brasileiro com relação à independência dos países africanos. O Brasil apoiava o processo de independência desses países, mas no caso dos países africanos que eram administrados por Portugal, a política brasileira era de permanência ao colonialismo.

San Tiago Dantas sobre o ponto referente a emancipação dos territórios não autônomos, explica que a posição anticolonialista sempre esteve implícita na conduta internacional por motivos éticos e econômicos. Os primeiros resultam da autenticidade de nossa política de emancipação e auto determinação dos povos; os segundos da necessidade de que os países competidores do nosso em produtos tropicais produzam em regime de trabalho verdadeiramente livre e com os mesmos propósitos de assegurar às suas populações níveis elevados de bem-estar(1962:12). Ou seja, um discurso tradicional na política externa brasileira. Oliveira afirma que com o desenvolvimento econômico do governo anterior (Juscelino Kubitchek), o Brasil já procurava diversificar seus parceiros econômicos, porém não se pode afirmar que o continente africano teve uma participação efetiva na economia brasileira – Cervo e Bueno apontam a ampliação do mercado externo para os produtos brasileiros como uma das preocupações básicas da P.E.I(1992:295). Existia até uma significativa disputa pelo mercado do café, o que dificultava as tentativas de cooperação do Brasil com África(1990:272-273). Adriano Moreira considerava que o governo brasileiro queria desempenhar um papel intermediário entre o Terceiro Mundo e as democracias estabilizadas(Moreira in Oliveira, 1990:271). Voltando a San Tiago Dantas, no que diz respeito a postura no caso das colônias portuguesas, ele afirma que “na linha anticolonialista do Brasil houve pequenos desvios de atitude apenas pelo desejo de dar as nações tradicionalmente amigas do nosso país ( vide : Tratado de Amizade e Consulta entre Brasil e Portugal em 1953, grifo meu) oportunidades para que definissem, por movimento próprio, uma posição evolutiva em relação a territórios não autônomos confiados a sua administração (...) No caso de Angola, jamais o Brasil esqueceu os laços de solidariedade histórica que o unem a Portugal. Pelo contrário, o que tememos, ainda hoje(1962 – ano da publicação), é que uma posição política demasiado rígida comprometa o papel que a cultura portuguesa pode representar na África a longo prazo, e tornar difícil, se não impossível, a transformação dos vínculos atuais em outros, de caráter comunitário, cuja preservação seria útil a todos os povos de língua portuguesa e manteria Angola e Moçambique no quadro cultural político do Ocidente”(1962:12-13).

Com relação a política de apartheid da África do Sul, o governo brasileiro negava as sanções aquele país, mas não concordava com essa política de segregação racial. Oliveira afirma que havia rumores que Portugal poderia sofrer sanções por sua política em África, por isso o Brasil não apoiava qualquer tipo de sanção contra a África do Sul(1990:271). Do ponto de vista estratégico- militar, o Brasil soube resistir às pressões no sentido da criação de um Pacto do Atlântico Sul(Alberto Costa e Silva in Mourão:1992;137) (sobre esse assunto, falaremos mais adiante).

Fim da Política Externa independente, início do governo militar no Brasil.

Governo Marechal Castelo Branco

Com a tomada do poder pelos militares(“golpe militar”, na visão dos derrotados e “revolução” na visão dos vencedores) em 1º de abril de 1964(para os derrotados) ou 31 de março(para os vencedores), o país assistiu a uma reviravolta nos conceitos que vinham do governo, antes civil, agora militar. Na questão da política externa, o que se viu foi o forte alinhamento diplomático com os EUA marcando assim a volta do paradigma Rio Branco10(Nkosi;643:2000) no início do governo militar brasileiro. Tal paradigma não é compartilhado autores, pois o termo é recente e não condiz com a realidade. Esse alinhamento passava também por uma intensa relação econômica entre os países nesse período, além de grandes declarações de "fidelidade irrestrita" ao bloco ocidental, de reconhecimento da insubstituível hegemonia norte americana e de condenação a todo e qualquer tipo de abordagem soviética aos países do continente americano(Gonçalves e Miyamoto;1993:216)

Essa política mostrava uma clara abordagem ideológica. A política brasileira abandonou a perspectiva multipolar de Quadros e Goulart em favor de uma visão bipolar do sistema internacional, dando ênfase à interdependência(Oliveira e Mourão;1991:16-17) O Brasil temia uma ameaça comunista, e se propunha a lutar diante dessa força, já que o governo brasileiro tinha feito a opção de ficar ao lado dos países ocidentais.

Dentro dessa linha política, o primeiro governo militar brasileiro de Castelo Branco (abril/1964-março/1967) é marcado pela total ruptura diplomática com Cuba, em 13 de maio de 1963, que segundo o governo brasileiro vinha tentando desenvolver o comunismo na América Latina. Este foi Um duro golpe aos defensores da política externa independente do governo anterior. Com relação aos países vizinhos da América do Sul, o governo buscou valorizar as potencialidades da ALALC (Gonçalves e Miyamoto;1993:218).

Dentro desse contexto, o governo Castelo Branco, que situava sua política bipolar no conflito Leste - Oeste, considerava e posicionava o capitalismo associado à ciência, ao desenvolvimento e ao cristianismo, em contrapartida o comunismo estava associado ao atraso, ao totalitarismo e ao ateísmo.

Diante dessa conjuntura, "o lugar da África para os novos governantes passou a ser o do objeto que assistia passivamente à substituição da sujeição colonial, por outra ainda pior : a do comunismo"(Saraiva;1996:97). Se nos governos Quadros/Goulart ainda havia uma retórica terceiromundista, agora desaparece quase por completo. Cunha dá como exemplo a participação brasileira na invasão da República Dominicana em 1965 que caracterizou a posição o distanciamento das teses terceiromundistas(1991:83).

Na visão do governo militar brasileiro, o único país do continente africano estável e extremamente ligado ao bloco ocidental, sem a possibilidade de aderir ao comunismo, seria a África do Sul. Mesmo assim, conforme mostram Oliveira e Mourão, apesar das boas relações(econômicas inclusive) entre o Brasil e a África do Sul, o Brasil vota a favor da Resolução 2202 A (XIX Assembléia Geral da ONU), que previa o desencorajamento do estabelecimento de relações econômicas com aquele país(1991:19). No caso de Portugal, o governo brasileiro, voltou a reatar, agora diretamente, as condições privilegiadas de diálogos, no sentindo de continuar o colonialismo português em África, assim sendo, tais colônias ficariam livre da ameaça comunista.

Nesse período, a inserção do pensamento geopolítico do Atlântico Sul começa a ganhar força entre os militares brasileiros que temiam a influência soviética nessa área, considerada peça importante de influência nos jovens países africanos ligados ao Atlântico. E nesse caso, o colonialismo português manteria as bases de Cabo Verde, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe e Angola livre dessa influência comunista.

Para Saraiva, Portugal Salazarista era considerado instrumento seguro para a constituição das vantagens econômicas para o Brasil, que as regras do jogo colonial ainda permitiam, na eventualidade da formação de uma comunidade afro –luso- brasileira(1996:116-123). Castelo Branco chega a defender a idéia de uma constituição dessa comunidade, conforme Oliveira e Mourão apontam: "talvez a solução residisse na formação gradual de uma comunidade Afro -Luso -Brasileira, em que a presença brasileira fortificasse economicamente o sistema(...) Qualquer política realista de descolonização não pode desconhecer nem o problema específico de Portugal, nem os perigos de um desengajamento prematuro com o Ocidente"(Castelo Branco in Oliveira e Mourão;1991:18). Nesse sentido, durante o mandato do Marechal Castelo Branco foram feitas duas missões de promoção comercial com África entre 1965 e 1966.

Voltando à comunidade afro- luso- brasileira, essa proposta dada pelo próprio Castelo Branco, permitiria realizar alguns objetivos, entre os quais, o acesso a mercados garantidos na África em condições privilegiadas, investimentos e fornecimento de materiais energéticos e combustíveis, obtenção de pontos de acesso aos mercados do sul da África e realização de objetivos de segurança nacional(Alencastre in Dombe;1996:20).

Governo General Arthur da Costa e Silva

No governo seguinte de Costa e Silva (março/1967-agosto/1969), a política externa brasileira começa a dar sinais de mudança na sua conduta. A política da "diplomacia da prosperidade", insere o Brasil no contexto internacional processando a assimilar as teses da UNCTAD( United Nations Conference on Trade and Development), como por exemplo a configuração de uma problemática mais ou menos própria dos países em via de desenvolvimento em função de garantir preços para os principais produtos desses países, a necessidade de importação de tecnologia, de capitais, tentando modificar a política global de assuntos de ordem econômica e financeira (ver mais no ponto referente a cooperação Sul-Sul). Gonçalves e Miyamoto afirmam que tal política diplomática pautou-se por uma linha de conduta, cuja essência era constituída pela busca de afirmação da soberania e pela promoção do desenvolvimento(1993:222). Um ponto marcante dessa política foi a recusa de assinar o Tratado de Não Proliferação Nuclear, onde o Brasil poderia ficar de fora do contexto da tecnologia nuclear. Tal fato desagradou muitos países do Norte, em especial aos Estados Unidos.

O Embaixador Carlos Augusto Proença Rosa em Conferência pronunciada na Escola Superior de Guerra em 1981, afirmou que o grande desafio no governo Costa e Silva era criar normas para o relacionamento econômico entre as nações. Essa é a grande tese da década de 60, segundo o Embaixador, em que se procurava provar que havia uma relação de trocas desfavorável às ex-colônias, ou seja, aos países em desenvolvimento e que esse estado de coisas precisava ser alterado. É o momento que muitos chamam de "época heróica ou normativa" porque se procura através de inúmeras conferências estabelecer normas, e todo esse movimento que surgiu na década de 60 foi criando um espírito de solidariedade entre os países(1991:04-05). Nesse sentido, começa-se o esfriamento da ênfase no conflito Leste- Oeste, começando-se assim a um olhar voltado para o desequilíbrio do Norte desenvolvido, e o Sul subdesenvolvido. Assim pensam também Oliveira e Mourão, segundo eles, no Governo Costa e Silva a perspectiva do bipolarismo, graças à evolução do sistema internacional, é muito atenuada e o tema do desenvolvimento, junto ao da segurança, passa a ser importante, e nesse sentido as relações Sul -Sul passam igualmente a fazer parte dos projetos (1991:20).

Com relação à Portugal, a postura do governo brasileiro foi de "esfriamento". O primeiro ministro de Portugal, Marcelo Caetano visita o Brasil(julho de 1969) e propõe a antiga idéia de um Pacto de Defesa do Atlântico Sul.

O Brasil continuou a respaldar as posições portuguesas nos fóruns multilaterais. A diplomacia brasileira caminhou na direção de uma defesa não violenta dos conflitos em territórios coloniais portugueses em África, que se expressou na idéia da realização de um plebiscito como a melhor forma para que os habitantes pudessem definir seu futuro(Decuadra;1991:71). Penso que seria uma alternativa interessante, porém essa idéia democrática seria incoerente vindo de um país como o Brasil, que no momento passava por um governo militar ditatorial.

Com relação ao continente africano e o crescimento da economia brasileira(início do milagre econômico), começam algumas missões visando cooperação entre os países, já que as relações comerciais do Brasil com o continente africano eram até então praticamente insignificantes. Costa e Silva manteve o relacionamento diplomático com as jovens nações africanas, mesmo com desconfianças, dando maior ênfase à África Austral.

Em 8 de dezembro de 1969 foi criado, numa reforma dos órgãos de administração do Itamaraty, o Secretariado Geral Adjunto para Assuntos da África e Oriente Próximo, com divisão de África e Oriente Próximo, desdobrada da antiga Secretaria Geral Adjunta para Assuntos da Europa Ocidental e da África(Castro in Oliveira e Mourão;1991:22). Os principais interesses do Brasil no restabelecimento das relações com África dentro de outros pontos menos importantes eram : aumento nas relações, envolvendo preferencialmente troca de produtos manufaturados por matérias primas, a serem utilizadas nas novas indústrias do Brasil ou a expansão geral de todos os tipos de vendas para novos mercados; encorajamento da solidariedade entre os países em desenvolvimento para negociar com países desenvolvidos para reversão dos termos desfavoráveis do comércio internacional; preservação da língua portuguesa na África como símbolo da herança portuguesa e vínculo de ligação cultural com territórios portugueses, que eventualmente, conquistariam sua independência; crescimento da idéia nacional de líder entre os países em desenvolvimento, um Estado emergente médio, mostrando a imagem projetada de uma sociedade pacífica, multirracial e de industrialização tropical; trocas de conhecimentos técnicos no campo nuclear, agricultura e medicina tropical, arquitetura, aviação civil e construção de estadas(Selcher in Dombe;1996:26).

Governo General Emílio Garrastazu Médici

No governo que se segue, Médici (outubro-1969/março-1974), o Brasil experimenta um grande crescimento na economia, com um aumento extraordinário do Produto Interno Bruto, atingindo 10% a.a. no triênio 1968-70, com a diversificação da economia e com o fortalecimento do setor industrial, principalmente o setor de bens de consumo. Surge a idéia do Brasil se tornar uma "grande potência".

Nesse contexto, Médici procurou fazer uma política internacional do Brasil, enfrentando os desafios do projeto de desenvolvimento nacional. Para Gonçalves e Miyamoto, se no governo Costa e Silva, com a "diplomacia da prosperidade", divisava a luta conjunta dos países subdesenvolvidos como o meio mais eficaz de resistir e superar obstáculos de que lhes opunham os países desenvolvidos do Norte, a política de interesse nacional de Médici passou a priorizar as relações bilaterais como as mais convenientes para se alcançar o mesmo fim (1993:225). Sílvio Cunha mostra que os mercados das economias centrais já demonstravam sinais de retração naquele momento, apesar das taxas de crescimento manterem-se relativamente altas. Então, diante dessa nova conjuntura, dentro do contexto de uma economia do porte que se tornou a economia brasileira, não se podia depender para a realização dos seus produtos de um único mercado. É vital para seu crescimento o acesso a novas fontes de matérias primas, a tecnologia e a busca de novos parceiros. Nessa linha é que deve ser entendida a reaproximação com África. O autor faz críticas negativas aqueles que associam a aproximação brasileira com a África simplesmente devido ao primeiro choque do petróleo em 1973(1991:85-86).

Entre os pontos que o Ministro Gibson Barbosa resumia a política de Médici estavam: a mudança de regras de convivência internacional e contra a cristalização de posições de poder; o aumento dos interesses externos a medida em que o Brasil crescia; a ativa solidariedade e cooperação com os países em desenvolvimento, sendo função da diplomacia nacional estreitar o entendimento com os povos que travam a luta rumo ao progresso e essa política externa deveria ser globalista, com intenso diálogo com os países do Norte(Oliveira e Mourão;1991:25-27).

No âmbito dos países vizinhos, militares brasileiros foram acusados de participarem da derrubada do governo de Allende no Chile em 1973. Numa demonstração que a "ameaça vermelha" do comunismo tinha que ser combatida, principalmente no âmbito dos países vizinhos, diziam os autores da teoria do dominó.

Com relação a África, o continente continuava a ser visto como uma importante ligação estratégica, associada à questão do Atlântico Sul. Os bons relacionamentos com Portugal e África do Sul permaneceram durante o governo Médici. Oliveira e Mourão afirmam que as relações privilegiadas com Portugal foram mantidas, assim como os fluxos comerciais em relação à África do Sul, embora o Brasil tenha continuado a posicionar-se contra o apartheid – aliás, essa sempre foi a postura da diplomacia brasileira sobre a questão. Para o chanceler Gibson Barbosa, seguem os autores, a suspensão do comércio com a África do Sul iria contribuir para o agravamento e endurecimento do regime sul africano(1991:22).

Martins no mesmo trabalho de Oliveira e Mourão aponta que houve alguns obstáculos internos que dificultaram a aproximação com África. Segundo o autor, o Ministério da Fazenda inclinava seus interesses pela África portuguesa, enquanto o Itamaraty, cujas as teses acabaram a prevalecer pelos países independentes da região(Martins in Oliveira e Mourão;1991:23). Esse apoio do Ministério da fazenda estava associado principalmente alguns fatos, entre os quais os acordos assinados pelo Ministro Gibson Barbosa com Portugal para investimentos nas colônias portuguesas em África. Outro ponto importante, foi a assinatura em setembro de 1971 de uma convenção alargando os direitos civis e políticos, em termos de igualdade, dos cidadãos brasileiros e portugueses. Ainda em 1972, na XXVII Sessão de Assembléia Geral das Nações Unidas, o Brasil apoia Portugal votando contra a resolução que declarava os movimentos de libertação de Angola, Moçambique e Guiné - Bissau como representantes desses países. Na XXXVIII Assembléia Geral, o Brasil adota a mesma postura no que diz respeito a independência de Guiné Bissau e sua entrada na Organização.

No aspecto comercial, inúmeras visitas de autoridades brasileiras são feitas em territórios africanos, acordos bilaterais são assinados e nessas visitas estadistas africanos pressionam para o Brasil abandonar a sua tradicional posição de privilegiar as relações com Portugal no caso das colônias daquele país na região(Oliveira e Mourão;1991:24-29 e Cunha;1991:86). Entre as visitas importantes, a viagem do chanceler Gibson Barbosa a nove Estados africanos( Camarões, Costa do Marfim, Daomé – hoje Benin, Gabão, Gana, Nigéria, Senegal, Togo e Congo Democrático) foi extremamente significativa. A escolha desses países demonstrou a clara intenção de privilegiar os países ribeirinhos do Atlântico Sul. Anglarill e Kerz dizem que o oceano é valorizado geopoliticamente como zona de contato entre as comunidades distintas, deixando de ser considerado como limite intransponível, para converter-se em vínculo de vizinhança política. Além dos laços políticos conquistados com a visita, depois da viagem, o Brasil decidiu participar da criação do Fundo Africano para o Desenvolvimento- FAD ( 1982:233).

Apesar de intensificar os diálogos com os países africanos ribeirinhos, o Brasil continuava a se situar a favor de Portugal com relação as colônias em África, o que gerava um certo mal estar na própria diplomacia nessas visitas oficiais; além disso, o Brasil, apesar de condenar a política sul africana de segregação racial, também possuía uma significativa relação econômica e política com aquele país, o que gerava um descontentamento daqueles países africanos.

O governo Geisel e a política externa pragmática, responsável e ecumênica.

Em 15 de março de 1974, assume a Presidência da República, o General Ernesto Geisel( permanecendo até março de 1979), no meio de grandes dificuldades econômicas e políticas que anunciaram o fim do período do "milagre brasileiro" e que ameaçaram o regime militar. Dentro do contexto econômico, o governo brasileiro sofreu com a crise do petróleo de 1973, sentida na economia brasileira no ano seguinte, onde o preço do barril quadriplicou, afetando assim o país, extremamente dependente do produto. Com o objetivo de ampliar as fontes alternativas de energia para fazer frente a crise do petróleo, os investimentos se estenderam para o setor energético, iniciaram-se programas como o Proálcool, Procarvão e o Programa Nuclear Brasileiro, que visavam diminuir a dependência do petróleo na economia nacional.

Dentro do contexto internacional, o choque do petróleo e a crise do sistema internacional financeiro, que passava por um período de grande recessão, fizeram com que o governo brasileiro optasse pela ampliação do mercado, com a continuação da política de substituição de importações que perdurou até o final do governo Geisel, sendo o Brasil o primeiro país a começar esse modelo na América Latina e o último a terminar.

No política externa, essa visão fica mais clara, quando o próprio presidente chama sua linha de política exterior como pragmática, responsável e ecumênica. Pelo conceito de "pragmática" entendia-se uma política descomprometida com quaisquer princípios ideológicos que pudessem dificultar o atendimento dos interesses nacionais. Por "ecumênica", pretendia-se uma política externa de caráter universalista que levaria em conta todas as possibilidades de relações internacionais do país. Nessa linha, a opção por incentivar um maior diálogo Sul- Sul fica bastante presente. E finalmente "responsável" constituía uma palavra-chave e era particularmente dirigido às bases de sustentação do regime ( Pinheiro;1993:249-250). Para Gonçalves e Miyamoto, o efeito dessas mudanças internacionais forçou o governo brasileiro a uma profunda revisão de sua estratégia político - diplomática. Necessitava, portanto, substituir o individualismo típico do período Médici por uma aproximação com o Terceiro Mundo. Uma política que poderia proporcionar o Brasil uma exploração mais ampla das possibilidades oferecidas pelo mercado mundial, e simultaneamente, engrossar o coro ( grupo dos 77) que exigia a estruturação de uma nova ordem econômica internacional, de modo mais justo e equitativa na distribuição e usufruto da riqueza mundial(1993:230). O próprio presidente Ernesto Geisel em mensagem ao Congresso nacional em 1976, ao pronunciar sobre a crise econômica mundial afirmava que podia-se falar numa interdependência horizontal, que substituísse o conceito vertical, originário de estruturas coloniais, ou seja, abordando uma idéia de perspectiva de um diálogo entre os países do sul(p.152).

Dentro dessa nova perspectiva no cenário nacional e internacional, o Brasil restabelece as relações diplomáticas com a República Popular da China em abril de 1974. Pinheiro alerta que essa atitude não se tratava de um projeto essencialmente terceiro mundista. Pretendia-se igualmente incrementar as relações Sul -Sul de forma a fortalecer um diálogo Norte-Sul em bases bilaterais(1993:255).

Outro fato digno de nota com relação a mudança de política externa brasileira foi o reconhecimento da independência de Guiné- Bissau em 16 julho de 1974. Tal fato mereceu atenção pois Portugal ainda não havia formalizado o reconhecimento de independência, ou seja, a antecipação brasileira de reconhecimento da independência daquele país, feria o Tratado de Amizade e Consulta que naquele momento estava em vigor, causando um certo mal estar nas relações diplomáticas do Brasil com Portugal. Ainda em julho de 1974, portanto após a Revolução dos Cravos em Portugal, o chanceler brasileiro, Azeredo da Silveira em mensagem à Reunião de Chefes de Estado da Organização da Unidade Africana(OUA), esclarece o posicionamento brasileiro quanto à questão da colônias de Portugal em África. Segundo o chanceler, “os especiais laços de amizade que unem o Brasil a Portugal e todas as nações africanas, e, de um modo especial, o natural interesse do povo brasileiro no destino dos povos irmãos dos territórios sob administração portuguesa na África, claramente colocam a obrigação do governo brasileiro em colaborar para encontrar uma solução que assegure o destino que estes povos têm direito na comunidade das nações; O Brasil condena todas as formas de políticas colonialistas ou racistas. Por isso, ele sempre repudiou soluções deste tipo, altamente condenada nos fóruns internacionais, com o apoio do Brasil; o governo brasileiro não deseja mediar e da mesma forma não está se oferecendo para mediar. Está, entretanto, preparado para emprestar toda colaboração no que lhe possa a ser solicitado pelas partes interessadas, às quais o Brasil se sente unido pela história, raça e cultura”( Selcher in Dombe;1996:34).

Porém, foi no reconhecimento da independência da República Popular de Angola em 11 de novembro de 1975, com o governo do MPLA de cunho ideológico socializante, que surpreendeu o mundo, haja visto a proximidade cultural entre os países, Angola sendo um país mais atrativo economicamente que Guiné Bissau e levando-se em conta também o fato do governo brasileiro ser militar, contrário a ideologia do movimento angolano. O reconhecimento brasileiro ocorreu em um momento onde a repressão com a caça aos comunistas e a suspensão das liberdades democráticas ainda estavam em questão. O Brasil foi o primeiro país a reconhecer o governo do MPLA proclamada à zero hora do dia 11 de novembro de 1975 – O Brasil reconheceu oficialmente às 8 da noite(horário de Brasília) de 10 de novembro de 1975, portanto com o fuso de quatro horas a mais que Luanda, o país reconheceu no exato instante da posse do MPLA. Além disso, o Brasil também foi o primeiro país a ter uma embaixada na capital angolana.

Saraiva coloca três pontos interessantes de análise no que diz respeito a essa postura diante do reconhecimento de um movimento marxista em Angola. Segundo o autor, essas posições brasileiras na década de 1970 mudaram significativamente com relação a períodos anteriores, porém não foram feitas de forma abrupta. O primeiro ponto que deve-se levar em consideração no caso do reconhecimento do MPLA em Angola é o fato de que em 24 de novembro de 1973, dezessete países da África, capitaniados pelos exportadores de petróleo, ameaçaram incluir o Brasil(juntamente com mais cinco países), com sanções econômicas, como o embargo do petróleo, por conta das suas posições na África Austral. Levando-se em conta o momento de crise do petróleo nesse período, podemos imaginar o quanto esse embargo afetaria a economia nacional.

O segundo ponto colocado por Saraiva, diz respeito ao receio dos formuladores de política externa no Brasil, de que os países da África negra votassem contra o Brasil nas Nações Unidas na questão levantada pela Argentina com relação ao projeto de construção de Itaipú e Corpus traria ao Rio Paraná.

Em terceiro lugar, além da diversidade de parceiro que o Brasil procurava no momento, o autor leva em consideração o péssimo momento das relações do Brasil com os EUA, propiciando assim a perda gradativa da importância dos EUA nas relações econômicas e políticas do Brasil. Principalmente por dois episódios marcantes, o primeiro em março de 1970, quando o Brasil estendeu seu mar territorial para o limite de duzentos milhas e expulsou barcos americanos encontrados no litoral brasileiro sem autorização. Vale lembrar que no contexto de independência de Angola, os EUA apoiavam o FNLA. Esse episódio dos barcos americanos causou medidas protecionistas contra produtos brasileiros, Gonçalves e Miyamoto indicam que essa situação de ampliação do limite do mar territorial foi fruto de políticas que viam o Atlântico Sul como parte integrante de seu sistema de defesa, ou seja, havia uma preocupação com a questão do Atlântico Sul nesse momento(1993:228); já para o governo brasileiro as razões eram estritamente comerciais. Além disso, o projeto de Acordo Nuclear do Brasil com a Alemanha Federal, em 25 de junho de 1975, outro fato que desagradava também aos EUA(1996:165-183).

Outro ponto importante no que diz respeito ao reconhecimento do governo do MPLA foi o fato de que seus líderes faziam questão de se expressar em português, o que era importante do ponto de vista da manutenção da língua portuguesa. Oliveira e Mourão abordam a viagem do ministro Ovídio de Melo(Representante Especial do Brasil perante o governo de transição que precedeu à independência de Angola) dentro do contexto do processo de independência angolana, onde o ministro manteve contatos com os três movimentos(MPLA, FNLA e UNITA), segundo Ovídio de Melo, as instruções que o governo brasileiro lhe dera e que ele colocou para os três movimentos, pressupunha absoluta isenção de ânimo, absoluta igualdade, isto é, sem favorecimentos para qualquer movimento, pois o Brasil tão somente queria ter relações com Angola independente a partir do dia 11 de novembro de 1975, dia que estava previsto a independência do país segundo o Acordo de Alvor. Continuando o ministro caracterizando os três partidos, abordava que o MPLA era um movimento amplíssimo, que abrangia correntes ideológicas do mais variado matiz, os outros eram fundados em tribos, em tradições africanas11(Oliveira e Mourão;1991:33-35).

Ovídio de Melo escreveu um texto(sem data de publicação) abordando as questões que envolveram o processo de independência de Angola. Segundo Ovídio, o chanceler Antônio Azeredo da Silveira pretendia antecipar o relacionamento político do Brasil com as colônias portuguesas que se encaminhavam para a independência. Para isso, ainda durante o período de transição, pensava em abrir em Lourenço Marques (hoje : Maputo- capital de Moçambique) e Luanda uma espécie de embrião da Embaixada(Representação Especial) para tratar com os movimentos que Portugal qualificasse como candidatos ao poder. Como Moçambique possuía apenas um movimento de libertação nacional(FRELIMO), o governo brasileiro, através de Ovídio de Melo tratou de iniciar os diálogos para a Representação Especial com maior facilidade. Porém, não houve aceitação por parte dos dirigentes da FRELIMO, conforme afirma o dirigente do movimento Marcelino dos Santos “ a FRELIMO não poderia aceitar a proposta brasileira, concedendo ao Brasil um status especial na criação antecipada de relações diplomáticas com Moçambique, porque as mentes e corações moçambicanos, depois de sofrerem 14 anos de guerra, depois de verem todo esse tempo o Brasil apoiando Portugal – não estavam acostumadas a ver o Brasil como um país amigo”(Santos in Melo; p.26). Portanto, o Brasil deveria esperar que Moçambique se tornar-se independente para pensar na possibilidade de um diálogo diplomático.

Para Ovídio, a posição de mágoa e pouco coerente de Moçambique era eminentemente política : a FRELIMO queria ver primeiro como o Brasil iria se comportar em Angola, pois lá iria abrir uma Representação Especial(p.30). As relações políticas entre MPLA e FRELIMO eram extremamente amigáveis desde a CONCP – Conferência das Organizações Nacionalistas das Colônias Portuguesas, fundada em Casablanca (Marrocos) e, 18 de abril de 1961, onde além desses dois movimentos, também participava o PAIGC(Guiné Bissau e Cabo Verde), onde a intenção era o estabelecimento de uma estratégia de luta comum contra o colonialismo português(Maia;1977:67).

Ovídio aborda que o caso angolano era especial, e ele compara com a guerra civil libanesa, mais ou menos naquele momento. No Líbano, o Brasil não tinha política alguma, nada de especial a fazer. Nem as forças libanesas em combate esperavam algo do Brasil, qualquer definição, qualquer ajuda. A Embaixada em Beirute poderia parar suas atividades. Mas no caso de Angola, o Brasil iria para permanecer, em todas as partes do conflito, portugueses e angolanos, esperavam algo do Brasil, seja apoio moral, econômico, político ou até militar(p.39).

Então, com o fracasso do Acordo de Alvor, e com a situação de guerra civil instalada no país, o governo brasileiro tratou de dialogar com os movimentos e aguardar o fim do conflito. Após a vitória, o MPLA passou a ter preocupações administrativas; enfrentava as tropas do FNLA no interior, e também mobilizava a população de Luanda a promover a limpeza da cidade. Inclusive, naquele momento, segundo Ovídio, foi à Angola uma missão da Organização da Unidade Africana(OUA), para verificar qual dos partidos angolanos tinha de fato a popularidade e as condições para governar o país que se tornaria independente(p44).

O Brasil naquele momento continuava com sua política de total isenção e igualdade entre os três movimentos. Porém, o Governo do MPLA já se preparava para a festa de independência no dia 11 de novembro, e o Itamaraty não tinha ainda afirmado se reconheceria ou não a independência de Angola com o MPLA no poder. Para Ovídio, era essencial reconhecer. Se desde março de 1975, o Brasil esteve presente em Angola; se o Brasil antecipou as relações com os três movimentos angolanos quando foi criada a Representação Especial; se durante todo aquele momento o Brasil havia declarado isenção e prometido ter boas relações com qualquer partido que no fim predominasse – como poderia naquele momento recuar, num momento que o MPLA já era o vencedor e se via ameaçado apenas por invasão estrangeira – a África do Sul, e justamente o país do apartheid que revoltava a África inteira. Então a saída ou era reconhecer ou sair imediatamente de Luanda. E ao sair de Luanda, para Ovídio, o MPLA não perdoaria o Brasil as falhadas promessas de isenção e durante muito tempo, o Itamaraty poderia esquecer as relações com Angola, com Moçambique, e provavelmente com toda África Negra. Seria um fiasco de proporções continentais(p49-51).

Nesse contexto, o Brasil reconheceu o Governo de Luanda por declaração dada à imprensa de Brasília, às oito horas do dia 10 de novembro, dado que, pela diferença de fusos horários(Angola mais quatro horas), naquele mesmo momento seria meia noite, exatamente quando o MPLA estaria assumindo o poder, e os representantes coloniais partindo para sempre(p.51). Ovídio diz que o reconhecimento pelo Brasil, em meio a trinta e poucos reconhecimentos outros, de países socialistas e de Terceiro Mundo, causaria verdadeiro estupor aos setores mais conservadores do Brasil(p.55). Naquele momento foi dado um dos episódios mais marcantes na política externa brasileira em todos os tempos.

Sílvio Cunha em sua dissertação de mestrado, distingue o "ato de reconhecimento" e a "velocidade do ato" dentro da estratégia brasileira de ocupação de espaços na economia mundial. Segundo o autor, o Brasil tinha a estratégia de se colocar como país - ponte entre os interesses do primeiro mundo e terceiro mundo, ao mesmo tempo visando garantir algum poder de barganha junto às nações desenvolvidas. É nesse sentido, continua Cunha, é que a velocidade do ato assume seu caráter estratégico. A habilidade e a rapidez com que o Brasil reconheceu o governo do MPLA deu-lhe o suporte necessário para atuar como país - ponte, na medida que apagou o seu passado de apoio ao colonialismo português e, ao mesmo tempo deu prova de relativa autonomia frente aos países do Norte(1991:147). Dentro dessa mesma linha de raciocínio, Decuadra aponta a posição da Argentina diante do reconhecimento brasileiro ao governo do MPLA em Angola. Para ele, essa política brasileira guardaria desígnios imperialistas, e seria levada a efeito com uma dose de “oportunismo”(no caso angolano), cujo objetivo era se aproveitar do “vazio” produzido pela retirada de Portugal daquele continente(1991:21). Portanto, existia uma sensação do nosso maior vizinho, que o Brasil se aproveitava da questão angolana para se projetar no campo da diplomacia internacional como uma voz presente e significante no âmbito dos países subdesenvolvidos.

Em entrevista a Maria Celina D'Araújo e Celso Castro, o general Geisel ao ser perguntado sobre a mudança da política de colonização portuguesa, afirmou "embora eu procurasse ter boas relações com Portugal, dentro de um certo limite, por causa da Revolução portuguesa dos Cravos - no caso da África achávamos que o colonialismo português estava acabado, ultrapassado"12(1994:343-344). Para Ricúpero, a política externa independente de Quadros, foi retomada com Geisel e Figueiredo com o pragmatismo responsável. Porém, o emblema dessa política, ao invés de ser Cuba, no caso de Quadros, passa a ser o abandono do colonialismo português e o reconhecimento do MPLA em Angola(1993:343). Embora o autor não cite esse fato, acredito que os formuladores do pragmatismo responsável de Geisel, como Ítalo Zappa, Saraiva Guerreiro, entre outros, já eram jovens diplomatas no período Quadros/Goulart na Política Externa Independente, ou seja, no governo Geisel, eles já tinham atingido maior maturidade no campo da política externa.

Portanto, o Brasil passou a demostrar que tinha política própria com o reconhecimento do MPLA. Segundo o relatório do Ministério das Relações Exteriores de 1975, "ao reconhecer em 11 de novembro de 1975 - e portanto na data de sua independência - o Governo instalado em Luanda, o Brasil o fazia de conformidade com os princípios de sua política de não- intervenção e de respeito a auto determinação"(1975:112). Durante o período em que permaneceu o Acordo de Alvor(que sucedeu a Cimeira de Mombaça), o Brasil sentou à mesa com os três movimentos para decidir o futuro democrático de Angola, que acabou não acontecendo, haja visto o fracasso do acordo e a guerra civil instalada no país. Acredito que essa política de não intervenção colocada pelo governo brasileiro, acabou jogando numa "intervenção indireta", já que colocou o mundo numa situação de surpresa, pois um país ligado à Angola por raízes históricas reconheceu o governo do MPLA em condições ideológicas contrárias as suas, portanto dando credibilidade e “respaldo internacional” a esse movimento em Angola. Vale lembrar que recentes descobertas apontam para um apoio secreto no SNI, onde mandavam armas para o MPLA para combater contra a UNITA13.

Ainda levando em consideração ao relatório do M.R.E brasileiro em 1975, ao comentar sobre a África de expressão portuguesa, que afirma: "É determinação do governo brasileiro explorar amplamente as avenidas que abrem para a cooperação com esses países em vários níveis. Essa cooperação estará fundamentada nos princípios de vantagem recíproca, do respeito mútuo e da não- ingerência nos negócios internos dos outros países"(p.16-17); O presidente Geisel em mensagem ao Congresso Nacional dois anos após afirma que "a América Latina e a África continuarão a receber atenção prioritária da diplomacia brasileira(...) no caso da África a cooperação será aprofundada e compreenderá não apenas os campos econômico e técnico, mas também o apoio político à causa da eliminação da discriminação racial"(p.210). Portanto, ao estabelecer um vínculo de reconhecimento desses países, a cooperação passa a ser vista como um caminho desejável do governo brasileiro. Continua Geisel " ... as relações com os países de expressão portuguesa, especialmente ligados ao Brasil, têm recebido conteúdo prático e importantes operações comerciais foram efetivadas, sobretudo com Angola e Moçambique(...) Os primeiros embaixadores do Brasil em Luanda e Maputo apresentaram credenciais, respectivamente, em maio e julho(1976).

Essa mudança do aspecto político com a África de expressão portuguesa, significou uma mudança de visão brasileira dentro do próprio continente africano. O "perigo comunista" perdeu a força. Isso deveu-se muito a mudança do pensamento da relação mundial bipolar para uma relação multipolar. Porém, as bases principais para o argumento de aproximação à África era o próprio desenvolvimento capitalista que se desenhara no Brasil, associado a vulnerabilidade energética vivida pelo país. Alguns autores como Lafer, apontam o Brasil num contexto de uma “potência intermediária”, tendo, portanto, condições de utilizar vários "graus de liberdade suplementar" no contexto internacional, assim afirmam Oliveira e Mourão, que também abordam a teoria do pentagrama de Kissinger, onde essa pode ser lida no sentido de que num mundo mais multipolar, podem surgir novas oportunidads para as chamadas potências intermediárias, desejosas de ter um papel mais ativo no contexto das relações internacionais(1991:39)(ver mais da Teoria do Pentagrama em, Sardenberg, Ronado Mota. Curso de Relações Internacionais – Unid.IV, Estudos de Relações Internacionais, Brasília, Ed.UnB, 1982, pp.44-49). Creio que a posição brasileira na situação do processo de independência de Angola pode refletir um pouco essa idéia.

Mas não só no campo político as relações entre o Brasil e os países do Sul ganharam novos aspectos. Na economia também, pois a diversificação de parceiros e a vontade de aumentar sua cooperação com os países em desenvolvimento, fizeram com que essas relações se traduzissem em números. As exportações brasileiras para o Terceiro Mundo cresceram cerca de 12% em 1967, para cerca de 25% no final da década de 1970 e início da década de 1980. E também as relações comerciais entre os países em desenvolvimento avançaram muito naquele momento, como mostra o anexo 2, sobre o crescimento do comércio entre esses países. Em 1981, o Brasil chegou a vender 51,7% dos seus produtos manufaturados para os países do Terceiro Mundo, apesar do "duro golpe" que foi o acordo de Lomé em fevereiro de 1975, onde os países africanos( com exceção de Angola, Argélia, Egito, Líbia, Sudão e Tunísia) firmaram compromissos de comércio preferenciais com a Europa, numa espécie de relações verticais. Mesmo assim, a participação africana nas exportações brasileiras subiu de 2,3%(1972) para 4,7(1977), enquanto as importações oriundas do continente africano passaram de 3,6(1972) para 4,6%(1977). Com relação à estrutura das exportações para África, percebeu-se um recuo de produtos primários e um forte aumento de manufaturados, com relação a importação brasileira, essa basicamente se constituem de produtos primários, principalmente o petróleo. Para Saraiva, a conseqüência mais significativa desse acordo em Lomé foi a dificuldade de escoar as exportações brasileiras por rotas de transporte que não tinham sido montadas para atender as trocas Sul-Sul. Os fretes, portanto, eram mais caros e difíceis ( Saraiva, 1996 e D'Almeida;1996:22).

No caso das trocas comerciais com Angola(ver mais no ponto adiante), o início do desenvolvimento das relações econômicas entre os países foi bastante tímido, sendo basicamente unilateral a favor do Brasil. Algumas empresas privadas nacionais como a Pão de Açúcar passam a atuar em território angolano, assim como a Volkswagem do Brasil. Para Cunha, a análise da estrutura da balança comercial Brasil - Angola revela a existência de semelhanças com a estrutura das relações tradicionais entre Centro e Periferia. De um lado o Brasil, exportando quase na totalidade produtos industrializados, e recebendo em contrapartida petróleo e hidro carbonetos(1991:163).

Do lado angolano, a crise da economia após a saída abrupta dos colonos portugueses no início do governo do MPLA e a tentativa de golpe de Nito Alves em 1977 são fatores políticos importantes para levar em consideração essa questão econômica. A guerra naquele país, que sofreu duramente com a força estrangeira(África do Sul) em seu território devido ao contexto de guerra fria, somente não se intensificou com a independência devido ao recuo dos Estados Unidos em Angola consequência do fracasso no Vietnã, além do expansionismo soviético na região(Kissinger,1994:924).

O governo Geisel se utilizou de muitos instrumentos para ampliar sua penetração no continente africano. Cunha aponta para a investida na abertura de embaixadas, linhas de créditos especiais, a participação como acionista em bancos de fomento ao desenvolvimento africano e por fim enfatiza as afinidades em âmbitos histórico e cultural. Segue Cunha que o Brasil mantém-se preso aos valores ocidentais14(e Geisel diz claramente isso na mensagem ao Congresso Nacional em 1976.p151), colocando-se como país ponte, dando a entender que a feição terceiromundista foi a fórmula encontrada para abrir novos espaços para a acumulação capitalista brasileira(1991:88). Nesse contexto, Oliveira e Mourão enfatizam que o Brasil de fato conseguiu maior autonomia no campo das relações internacionais com os países do Terceiro Mundo, especialmente com África. Porém, afirmam os dois, o Brasil jamais tomou uma posição terceiro mundista contra o Ocidente. A distinção entre uma política virada para o Terceiro Mundo e uma política terceiro mundista, com implicações várias, entre as quais a do não alinhamento, são fundamentais para os autores(1991:40).

Governo General João Figueiredo.

O governo Figueiredo(15 de março de 1979 até 15 de março de 1985) foi destinado a ser o último governo militar do país com a missão de promover o retorno gradual e lento ao estado democrático. Com mandato de seis anos, não apresentou nenhuma mudança significativa no curso da política externa brasileira. Segundo o chanceler Saraiva Guerreiro, a linha básica da política externa sob o seu comando seria o universalismo. Para Gonçalves e Miyamoto, por universalismo compreendia-se a adaptação da política externa brasileira à irrefreável tendência à mundialização do sistema internacional(1993:237). A situação mundial naquele momento era de crise, a ascensão nos países centrais de conservadores que adotam um elenco de medidas recessivas que culminam com a acentuação da retração nos mercados centrais, completando com o aumento elevado dos preços do petróleo. A economia brasileira sofre os reflexos dessa situação recessiva; a inflação, o déficit do balanço de pagamento e o endividamento externo aceleram esse ritmo. No setor externo, o país apresenta um bom desempenho, conseguindo equilibrar sua balança comercial, reduzindo as importações e intensificando as exportações(Cunha;1991:89-90).

Diante desse contexto, as relações econômicas com os países em desenvolvimento, que vinham crescendo, ganharam novos impulsos com a crise dos juros dos EUA e a segunda grande crise do petróleo em 1979. O comércio com África ganha um salto significativo com o countertrade (também conhecido como sistema de barter) - ver o ponto sobre cooperação Sul-Sul adiante), primeiramente com Nigéria em meados da década de 1970, servindo inclusive para alguns autores como um exemplo de cooperação bem sucedida em países do Sul, em seguida com Angola. Essas operações de countertrade foram o principal sustentáculo das relações entre Brasil e Angola a partir de 1984, pois são, na verdade, linhas de crédito abertas pelo governo brasileiro para a compra de produtos básicos e industriais brasileiros por Angola e que são pagos por petróleo( Dombe;1996:83). Dentro do âmbito da América do Sul, podemos dizer que houve um acordo entre Brasil e Bolívia(1974) onde os bolivianos forneceram gás natural ao Brasil e em troca receberiam maquinaria.

A mensagem do Presidente Figueiredo ao Congresso Nacional na abertura da Sessão Legislativa, em 1º de Março de 1980, diz que “o continente africano, está-se abrindo nova etapa de nossas relações(...). Agora, devemos rapidamente operacionalizar nosso relacionamento, especialmente com as Nações de língua comum como Angola, Cabo Verde, S.Tomé e Príncipe, Guiné Bissau e Moçambique - estamos passando a uma fase mais produtiva, como evidencia a aceleração de contatos, visitas, entendimentos, verificada nos últimos doze meses"(Figueiredo in Oliveira e Mourão;1991:41). A participação africana nas exportações brasileiras no período do governo Figueiredo mais que duplica se comparada ao Governo Médici. Basicamente os manufaturados dominam as exportações brasileiras para o continente africano, enquanto o petróleo mantém-se como a base das importações.

As visitas do chanceler Saraiva Guerreiro aos países africanos, no caso os países da linha de frente - Angola, Botswana, Tanzânia, Zâmbia, Moçambique e Zimbábue - que mais tarde(com a aceitação da África do Sul como membro) veio a se chamar SADC - Southern African Development Community - em 1980, foram importantes para o aprofundamento qualitativo das relações do Brasil com África, principalmente com Angola, onde o Brasil iniciava a procura de petróleo : a Petrobrás, por intermédio da Braspetro, assinou um contrato com a empresa estatal de exploração de petróleo angolana Sonangol para prospecção e exploração de petróleo na região de Cabinda em território angolano. No sentido de dar um incremento as relações entre os países, foram abertas duas linhas de crédito pelo Banco do Brasil no valor de trezentos e dez milhões de dólares americanos - uma para compra de manufaturados e outra para compra de serviços. Oliveira e Mourão em entrevista com o próprio Saraiva Guerreiro afirmam que a política exterior do governo Figueiredo foi uma continuação da política externa de Geisel, um "aprofundamento", uma "adaptação". As relações foram preponderantemente políticas e não econômicas, daí uma certa dificuldade de explicar as relações com África, afirma o chanceler(Oliveira e Mourão;1991:42-43). Cunha compreende o Brasil sem interesses hegemônicos, pois o país utiliza as relações com a África como forma de poder de barganha na economia mundial(1991:91).

O chanceler Saraiva Guerreiro deixa visíveis as intenções do Brasil na África em conferência à Câmara do Comércio Brasil -África em janeiro de 1982. Segundo ele "no plano econômico, os objetivos brasileiros são claros. Apesar da nossa condição comum aos países em desenvolvimento, os países africanos e nós possuímos economias até certo ponto complementares. Á África pode fornecer ao Brasil petróleo e outros produtos básicos de que carecemos, como metais não ferrosos, fosfato, certas madeiras tropicais, etc. Por sua vez, o continente vizinho constitui mercado interessante para nossas manufaturas e serviços diversos, adaptados que são às condições tropicais, além de certos alimentos. O grau de protecionismo que deveria tolher as nossas exportações para África é menor do que se verifica em outros continentes(...) existe, enfim, uma intenção política africana de diversificar suas relações anteriormente limitadas às ex metrópoles"(1982:50). Nesse discurso, o Chanceler nos mostra alguns pontos que são analisados por especialistas que poderiam ser úteis no incremento do diálogo Sul-Sul, como a "tecnologia tropicalizada" brasileira (Pereira;1985:81e88) e o protecionismo dos países do Norte (Mourão;1990:336).

Fragoso afirma que o próprio Itamaraty se empenhou em demonstrar aos países do Sul a eficácia da tecnologia brasileira, ele coloca que o Itamaraty propôs que o Sul absorvesse a tecnologia das economias que lhe são semelhantes do qual o Brasil é possuidor de experiência superior à média dos países do Terceiro Mundo e forte candidato à substituição dos países industrializados em certos setores (Fragoso;1982:07).

Nesse contexto de tecnologia brasileira voltada para os países africanos, o ex - embaixador da Nigéria Timothy A. Mgbokwere, afirma a esse respeito, com o exemplo de ônibus brasileiros com amplas janelas e suspensão reforçada, vem desbancando os ingleses por serem mais adequados à topografia e ao clima africano(1982:177).

Para Buarque, as tecnologias alternativas só têm sentido dispondo-se de produtos alternativos, logo com economias alternativas. Enquanto o objetivo central do desenvolvimento for a formação de economias do tipo das economias européias ou norte americanas, não tem sentido pensar em tecnologias alternativas. Segundo o autor, a própria concentração de renda, que tem sido executada como forma de criar mercado para bens de luxo, contribuem para dar base a tecnologias sofisticadas e intensivas de capital. A própria característica de produzir-se pouco, mas com mercado assegurado pela forte concentração de renda, impede para Buarque, a busca de formas tecnológicas alternativas(1992:26).

Voltando discurso de Saraiva Guerreiro, percebe-se uma certa visão do neo colonialismo, quando ele afirma sobre as necessidades brasileiras, basicamente de matérias primas. Portanto, indiretamente o Chanceler coloca que as operações de countertrade poderiam ser uma boa saída, haja visto as necessidades expostas.

O Presidente Figueiredo visita o continente africano em 1983, entre os dias 14 e 21 de novembro. O Presidente, primeiro chefe de governo brasileiro a pisar em solo africano, visitou países lusofones (Guiné Bissau e Cabo Verde), francófones(Senegal e Argélia) e anglofones(Nigéria). Apesar da crítica da imprensa naquele momento, Oliveira e Mourão afirmam que esse episódio constitui o "coroamento" de uma política para África. No período de João Figueiredo, foram assinados cerca de 25 tratados com países africanos, aprofundando, portanto, uma relação importante da diplomacia brasileira(1991:40-41).

Governo José Sarney

O presente trabalho não pretende se aprofundar na análise do primeiro governo civil brasileiro no pós regime militar. A idéia da pesquisa é mostrar apenas o início desse governo até o ano de 1986, onde o Brasil propôs na Resolução das Nações Unidas 41/11, de 27 de outubro de 1986, a criação da Zona de Paz e Cooperação no Atlântico Sul(ZPCAS).

A política para os países em desenvolvimento no início do governo Sarney não difere muito de Figueiredo. Embora o país atravessasse uma grande crise econômica, com problemas graves de dívida externa e inflação, a África continuava sendo considerada prioridade, mas foi na América Latina que a diplomacia teve uma atuação política mais destacada, principalmente no estreitamento de laços em prol de uma formação de um mercado comum(Cunha;1991:94).

O sério problema da dívida externa foi um entrave à política de cooperação que o Brasil desenvolvia. O país continuava a condenar a política da África do Sul na questão do apartheid e também na independência da região da Namíbia15(Oliveira e Mourão;1991:46). O presidente Sarney visita Cabo Verde em 1986, aprofundando os laços entre os dois países.

ALGUNS ASPECTOS DAS RELAÇÕES ECONÔMICAS ENTRE BRASIL E ANGOLA.

As formas dos diálogos comerciais entre Brasil e Angola datam de muitos séculos atrás, precisamente no século XVII, onde chegavam os primeiros escravos angolanos para trabalharem nas plantações de cana de açúcar em território brasileiro. Alencastro afirma que o trato(ação de tratar)negreiro não se reduz somente ao comércio de negros. De consequências decisivas, na formação da história brasileira, o tráfico extrapola o registro de operações de compra, transporte e vendas de africanos para moldar o conjunto da economia, da demografia, da sociedade e da política da América Portuguesa(2000:29). Entre outras coisas, negociantes sustentavam que o trato angolano era indispensável para captar a prata peruana. O governador geral do Brasil, Telles da Silva(1642-47) explicava que a perda de Angola(para os holandeses que ficaram sete anos na região 1641-1648) iria “desfabricar” os engenhos e a economia da América Portuguesa(Alencastro;2000:222).

Além disso, Alencastro afirma que as exportações brasileiras de cachaça e de fumo serviram para adquirir 48% dos 2.027.000 escravos chegados vivos à Am. Portuguesa nos anos de 1701- 1810. Adicionando as exportações de couros, cavalos, mandioca, milho, açúcar, carnes, peixes secos e salgados, e também o contrabando de ouro e diamantes para os portos negreiros, é possível estimar que mais da metade dos africanos introduzidos na Am. Portuguesa durante o século XVII foram diretamente adquiridos com mercadorias brasileiras. O autor ainda lembra que os dados devem ser postos em paralelo com o sistema de ventos e correntes dominantes no Atlântico Sul, o qual, favorece a navegação bilateral entre Brasil e Angola(2000:324). Essas relações basicamente duraram até o fim da escravatura no século XIX. A partir daí, as relações econômicas com Angola mudaram de aspectos, dando ênfase as trocas diretamente associadas à Portugal.

Com a independência Angolana em 1975, o governo no MPLA buscava no Brasil uma oportunidade para um grande diálogo de cooperação comercial, como foi claro nas palavras do Presidente Agostinho Neto ao receber o primeiro Embaixador brasileiro em Luanda, Rodolpho Godoy de Souza Dantas, “... esperamos, senhor Embaixador, que no domínio da economia, do comércio, da tecnologia, da cultura seja satisfeita a aspiração do nosso povo, de cooperar com o povo brasileiro através dos organismos competentes” (Neto in Dombe;1996:69).

Apesar desse contexto aparentemente favorável ao início de cooperação entre o Brasil e o jovem país, as relações comerciais no Governo Geisel se desenvolveram quase unilateralmente a favor do Brasil.

As bases do intercâmbio comercial entre os países foram lançadas com o envio da primeira missão comercial brasileira à Angola em 1976. Naquela oportunidade foi aberta uma linha de crédito no valor de 50 milhões de dólares americanos. O resultado, conforme aponta Cunha, foi um incremento nas relações comerciais, ainda que embora unilateralmente, as exportações do Brasil passaram de US$ 6 milhões em 1975, para US$ 22 milhões em 1976 e US$ 88 milhões em 1979. Em termos de acordos bilaterais, apenas um memorando de Transportes Aéreo foi assinado em 1977 e algumas empresas privadas brasileiras como o Pão de Açúcar16 passam a atuar em território angolano, assim como a Wolkswagem do Brasil.

A razão apontada para essa fraca participação angolana nas trocas comerciais é colocada por Dombe devido à guerra civil que assolava Angola(1996:70). Não vejo como de fato esse ser o grande motivo para a pequena participação comercial entre os países. Cunha vai mais além, afirmando que o fraco comércio se deveu aos problemas inerentes à fase de formalização das relações e da grave crise que atravessava a economia angolana(1991:150) em meados da década de 1970. É bem verdade que a economia angolana não passava por um bom momento, devido principalmente a saída dos colonos portugueses que ocupavam os cargos técnicos em Angola. No caso da guerra, conforme mostra Ovídio, “com a ajuda e o reforço trazido por Cuba, o MPLA agora iria gradualmente expulsando a FNLA para o Zaire(Rep. Dem. Congo) e os sul africanos para a Namíbia, de tal forma que a guerra já não era mais sua preocupação exclusiva. Os novos Ministérios começavam então a ativar-se, a formular seus primeiros planos de governo, e alguns deles requeriam desde o início colaboração externa”(p.60).

Dentro desse contexto, fico com a abordagem sempre lúcida de Ovídio de Melo pelo fato do comércio entre os países não ter se desenvolvido da forma mais interessante. Para Ovídio, enquanto o Brasil já montava sua Embaixada em Luanda, o Itamaraty parecia sem vontade de fazer comércio com Angola, pois o país precisava de tudo. Alimentos, remédios, equipamentos, oferecia-se para pagar à vista, em dólares, adiantadamente, mas as consultas feitas à Embaixada, encaminhadas ao Itamaraty, não obtinham resposta. Nem os pedidos de caráter humanitário recebiam resposta do Itamaraty. Nesse sentido, o Itamaraty julgava poder esperar, deixar passar o tempo, ver como ficava a situação do MPLA no governo de Angola, também com relação aos novos reconhecimentos desse governo, por parte da comunidade européia e também de países conservadores(p.60-61). Para Saraiva o comércio entre os dois países não floresceu como sugerido pela retórica diplomática, devido a problemas domésticos em Angola, como a tentativa de golpe de Nito Alves em 1977, e o dessaranjo econômico ainda proviniente da guerra civil(1996:182). Essa guerra, que sofreu duramente com as forças estrangeiras em seu território devido ao contexto da guerra fria, somente não se intensificou com a independência devido ao recuo dos Estados Unidos em Angola devido ao fracasso americano no Vietnã, além do expansionismo soviético na região(Kissinger;1994).

No governo Figueiredo, o intercâmbio Brasil – Angola entrou em nova fase com assinatura de vários acordos de cooperação técnica, instalação de comissão mista bilateral, aberturas de linhas de crédito para o fornecimento de alimentos e serviços, utilização de operações especiais de comércio e ampliação das perspectivas para comércio recíproco. O anexo 3 analisa a estrutura das exportações do Brasil para Angola; o anexo 4 aborda os principais produtos exportados do Brasil para Angola, já o anexo 5 mostra as importações brasileiras de Angola e finalmente o anexo 6 analisa a balança comercial entre Brasil e Angola entre os anos de 1975 – 85.

Nesse mesmo governo foi criado um vôo da companhia brasileira da VARIG ligando à cidade do Rio de Janeiro até Luanda, sendo um aspecto importante na maior aproximação entre os dois países.

Durante a visita do chanceler brasileiro Saraiva Guerreiro à Angola em junho de 1980, vários acordos foram assinados entre eles de cooperação econômica, técnica, científica e cultural. O Brasil iniciava a procura de petróleo : a Petrobrás, por intermédio da Braspetro, assinou um contato com a Sonangol para pesquisa e exploração de petróleo no território angolano de Cabinda( ver Anexo 10). Para intensificar as relações, foram abertas duas linhas de crédito pelo Banco do Brasil no valor de US$ 310 milhões: um para a compra de manufaturados e a outra para compra de serviços(Cunha;1991:154). Em entrevista com o professor José Maria Nunes Pereira em novembro de 2001, o mesmo afirmou que a cooperação com Angola está em muitos os casos associada diretamente a prestação de serviços, ou seja, não relacionados ao investimento que induz ao comércio.

A partir de 1980, os saldos comerciais tornaram-se amplamente favoráveis a Angola. Vale lembrar a segunda crise do petróleo ocorrida em 1979. As exportações brasileiras caíram consideravelmente, passando de US$ 118 milhões(1980) para US$ 89 milhões(1984), queda de 23%. Em 1983, as exportações caíram 61%, constituindo-se na maior queda registrada naquele momento das relações comerciais Brasil – Angola. As importações vindas de Angola, em contrapartida, cresceram sensivelmente e o ano de 1983 foi destaque com a cifra de US$215 milhões, muito embora, em 1984, as importações tenham apresentado uma baixa de 41% em relação a 1983( Dados : Cunha;1991:155).

Em julho de 1982, foi firmado um convênio de cooperação técnica entre o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e o Ministério da Indústria de Angola para a formação e treinamento de quadros angolanos, intercâmbio de especialistas e outras formas de cooperação. Outras instituições como a Fundação Getúlio Vargas e a Marinha Mercante do Brasil também atuaram em Angola. Segundo crítica sobre o tema de José Maria Nunes Pereira “tudo que não foi muito adiante, mas que pelo menos começou”.

Objetivando a sua intensificação nos domínios econômicos e comerciais, os dois países celebraram um novo Acordo, dessa vez em abril de 1983, que estabelecia a cooperação para o fornecimento de bens alimentares, matérias – primas e outros produtos para Angola com o financiamento do Banco do Brasil, que abriu novamente uma linha de crédito de 100 milhões de dólares. O pagamento estipulado que ficou seria mediante moeda ou alternativamente com petróleo o juros de 8,5% ao ano(Cunha;1991:156 e Dombe:1996:80).

As operações de countertrade (sistema de barter) foram os principais sustentáculos das relações Brasil –Angola a partir de 1984, pois são na verdade linhas de crédito abertas pelo governo brasileiro para a compra de produtos básicos e industriais brasileiros em Angola e que são pagos por petróleo. Essa modalidade de comércio foi extremamente importante para o estabelecimento da construção da Hidrelétrica de Capanda, uma das maiores da África, onde o Brasil e União Soviética, depois de muitas negociações, desenvolveram, com a aprovação do Conselho de Defesa e Segurança de Angola, uma parceria para a instalação da hidrelétrica com o acordo assinado em novembro de 1984. A brasileira Fundação Emílio Odebrecht ficou com as obras civis de infra estruturas e outras complementares, enquanto a soviética Technopromexport, líder do consórcio, assumiu as funções de gerenciamento, com a construção de turbinas, geradores e projetos de engenharia.

Nos primeiros anos do governo Sarney, as relações comerciais Brasil - Angola foram bem intensas. Vale destaque a participação de Firmas Multinacionais no intercâmbio das principais empresas que exportaram para Angola em 1985, entre elas a Volvo do Brasil como a principal exportadora, além da MESBLA e também da Souza Cruz. O anexo 7 mostra as empresas brasileiras que estiveram presentes em Angola nos anos de 1984 e 1985, que foram o auge da atuação brasileira em Angola no período estudado. A presença dessas firmas reforça, para Cunha, não só a idéia de país ponte do Brasil, pois ao abrir espaço para a reprodução da acumulação brasileira, possibilitaria também, a valorização do capital internacional, como também demonstra os limites da visão acerca da cooperação Sul- Sul. No caso, o autor questiona com esse exemplo as relações Sul-Sul autônoma do Norte(1991:187-168). Em 1986, com base no Ajuste Complementar ao Acordo de Cooperação Econômica, Científica e Técnica, o Brasil concedeu à Angola uma linha de crédito para o abastecimento de bens e equipamentos.

Nas importações brasileiras com relação a Angola, verifica-se facilmente a presença do petróleo bruto que respondeu a 100% das compras efetuadas em Angola entre 1980 e 1982 – em 1983, Angola era o primeiro exportador africano desse produto ao Brasil – vale lembrar que antes da independência, o petróleo não fazia parte da pauta das relações entre o Brasil e Angola, conforme mostra o anexo 8 . A partir de 1982, surge também a participação da aquisição do gás liquefeito comprado de Angola. Em 1985, Angola foi o segundo fornecedor mundial desse gás ao Brasil.

MARCO TEÓRICO : A COOPERAÇÃO SUL – SUL SEGUNDO ALGUNS AUTORES.

As relações entre os países periféricos envolvem a história e a própria formação desses países. As relações afro-brasileiras de tráfico de escravos, também podem ser consideradas como diálogos de locais periféricos, em aproveitamento das nações colonialistas. Relações comerciais entre a Índia e o Oriente Médio, entre este e africanos, ou entre a América Latina foram comuns em séculos passados.

Brasil e Angola tem laços fortes de cooperação mesmo no período colonial. Alencastro em seu livro intitulado “O trato dos viventes”, nos mostra que a melhor forma de entender a história do Brasil não era somente olhar para os acontecimentos em Portugal e do mundo ocidental, e sim, incluir a história do continente africano e compreender a economia escravista. Dentro desse contexto, o autor afirma “ É no espaço mais amplo do Atlântico Sul que a história da América Portuguesa e a gênese do Império do Brasil tomam toda sua dimensão(...) Na verdade, os condicionantes atlânticos, africanos – distintos dos vínculos europeus – só desaparecem do horizonte do país após o término do tráfico negreiro e a ruptura da matriz espacial colonial, na segunda metade do século XIX”(2000:21).

Entre as cooperações no campo político entre as colônias do Brasil e de Angola, podemos colocar a participação da expedição luso – fluminense de Salvador de Sá(1648) para reconquistar Angola das mãos dos holandeses(Alencastro;2000:24 e 148)(ver mais em Alencastro nos tópicos : Luanda, a batalha estratégica do Atlântico e Quem reconquistou Angola – 218-238). A partir da saída dos holandeses se estabelece uma co – gestão brasílica e portuguesa no espaço do Atlântico Sul(Alencastro;2000:354). Nesse sentido, a cooperação Brasil e Angola passa a ser fundamentais para a manutenção da colônia portuguesa em África. Essa cooperação foi tão significativa que por volta de 1820, buscando dar continuidade ao tráfico de escravos, portugueses de Benguela organizaram um movimento desobediente para aderir ao Império do Brasil como província.

Em outros campos também a cooperação entre Brasil e Angola esteve presente. A etnolinguística Yeda Castro da Universidade da Bahia, nos traz uma polêmica. Para ela o idioma que se fala no Brasil não é europeu puro. Trata-se de um português africanizado. Para a pesquisadora, que não poupa filólogos e estudiosos acadêmicos para apontar que só o preconceito etnocêntrico fez com que palavras que garante ser banto(que também compreende a região que hoje é Angola), tenha atribuição indígenas nos dicionários17. E que só se estudou a cultura Iorubá ( na região da África Ocidental) porque era um povo que tinha escrita. “A academia sempre quis mostrar que o português no Brasil não é africanizado”, diz Yeda. Portanto, a cooperação entre Brasil e Angola alcança inúmeros elementos de formação cultural entre os povos.

Porém, o exercício que procuramos fazer no trabalho tem por objetivo analisar as relações entre os países em desenvolvimento a partir da Segunda Guerra Mundial, onde novas situações passam a fazer parte dos países em desenvolvimento. Abordo o sentido da independência, da descolonização, que é, sem dúvida, um dos maiores frutos colhidos no pós guerra. Portanto, como afirma Cunha, a análise histórica das relações entre os países subdesenvolvidos é problemático, principalmente falar antes da década de 50, onde as estatísticas não eram confiáveis, pois o colonialismo transformou o comércio Sul-Sul em comércio intra metrópoles ou inter metrópoles(...) No período pós guerra observou-se a evolução do padrão de comércio impulsionado pela redução de barreiras comerciais coloniais como consequência do surgimento de novos países desde o domínio colonialista, embora não totalmente desvinculados das antigas metrópoles, mas com relativa autonomia na escolha de seus parceiros comerciais. Nesse contexto, essa nova conjuntura influenciou diretamente os destinos das relações Sul - Sul(1991:11-12). No entanto, essa soberania nacional conquistada por muitos países no período Pós guerra é que tem que ser tratado como o marco inicial para os diálogos entre esses povos em desenvolvimento.

A concepção de cooperação está associada a ajuda, a colaboração, ao auxílio e ao trabalho comum como execução conjunta. Porém, dentro do contexto das relações internacionais, esse conceito perpassa esses substantivos, estando relacionados mais as questões das trocas comerciais e dos benefícios mútuos. Durante a história dos povos, a concepção de cooperação esteve presente, sendo colocado nas mais diferentes formas, com os mais diferentes atores, em variados contextos. Leakey e outros autores encaram a cooperação como um sinônimo de sociabilização e vêem na competição apenas desvios especiais de certos modos sociais, ou o resultado de escassez de recursos que obriga à luta pela sobrevivência, por parte do "grupo" ou mesmo do indivíduo. Esta posição, segundo Buarque, não é aceita de forma geral. Desde Hobbes, o conceito de que o conflito prevalece sobre a cooperação tem estado arraigado nas teorias com respeito à natureza do homem. Buarque segue afirmando que a cooperação é esporádica e sempre que ocorre é orientada por razões egoísticas individuais e não por um intrínseco desejo de cooperar(1982:02-003). No contexto das relações bilaterais, umas das premissas fundamentais está ligado ao fato de "não poder haver cooperação desinteressada pelas partes"(Steinbach in Mourão;1985:02-03).

Pinheiro nos traz uma nova abordagem na forma de diálogo, segundo ela, a visão de políticos diplomatas e analistas de relações internacionais supõe que cooperação entre Estados implica, necessariamente, algo bom ou para o bem. Isso se deve, continua a autora, em grande parte, ao fato de se entender por cooperação o movimento pelo qual os atores ajustam seus comportamentos às preferências de outros mediante um processo de coordenação política a fim de reduzir consequências negativas para ambos(Milner in Pinheiro;2000:305), levando, portanto, a que o observador suponha que a cooperação seja sempre benéfica para as partes envolvidas. Embora tal suposição possa estar correta, isso não significa dizer que o fim pelo qual se coopera seja necessariamente um bem para a coletividade, ainda que possam ser percebidos deste modo pelos que trabalham para sua realização. Então, isso não significa que a cooperação seja sempre espontânea(Pinheiro;2000:301-302).

A cooperação para Mourão, para ser válida e ter efetiva credibilidade, deve repousar num ato de vontade, firme em interesses comuns e objetivos, quer do país doador, quer do país tomador. Deve-se primar, portanto, pela objetividade de interesses cuidadosamente identificados pelos atores envolvidos, na perspetivação de um mundo real e não puramente ideal. A cooperação também padece da compartimentação do mundo em espaços econômicos, tal como ocorre na cooperação multilateral(1992:151). Marcovitch vai mais além, afirmando que a cooperação poderia ser um caminho para o fortalecimento da democracia. Para ele, toda cooperação internacional tem que se fundamentar numa percepção dos interesses do outro, assim como em iniciativas conjuntas de resultados simultâneos, homogeneamente distribuídos. É necessário, segue Marcovitch, compreender as razões do parceiro, sob pena de se tornar ilegítimo o exercício da cooperação. A cooperação usada como artifício para levar vantagem, é igual ao famoso “jogo de soma zero”(2000) 18.

COOPERAÇÃO NO PERÍODO PÓS GUERRA.

No período pós guerra, as relações entre os países ganharam novos elementos, principalmente com o maciço investimento estrangeiro para produção local. As transnacionais passam a investir em países subdesenvolvidos em busca de mão de obra mais barata e de incentivos fiscais. A CEPAL( que influenciou fortemente o pensamento dos intelectuais dos países da periferia), propõe um comércio internacional para os países em desenvolvimento através de associações comerciais que favorecessem a ampliação de cada um de seus mercados. Para a CEPAL naquele momento, os países não industrializados tendiam a sair perdendo no comércio e nas formas de cooperação internacional, então a solução seria um modelo protecionista que orientaria a economia de cada país "atrasado" para dentro de si, num modelo de substituições de importações. Dentro dessa linha, surgem na América Latina, a Associação Latino-Americana de Livre Comércio(ALALC) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento. Buarque mostra que os primeiros resultados foram satisfatórios para os países em desenvolvimento da América Latina, onde tiveram um crescimento rápido e sobretudo diversificado reorientado para o setor agrícola industrial(1982:11-12). Porém, as aspirações dessas duas instituições criadas eram de criar economias industriais, nos moldes dos países desenvolvidos.

A década de 60 foi uma década importante para a união entre os países do Terceiro Mundo. Houve cada vez mais uma relevância crescente dos países em desenvolvimento como atores na política internacional, principalmente na ordem mundial do pós Segunda Guerra mundial. Maria Regina Soares de Lima diz que tornou-se possível algo inédito na política mundial moderna, que os pequenos países obtiveram um espaço, em particular no âmbito da Assembléia Geral da ONU e de suas agências especializadas, para o exercício da capacidade de voto e voz ( Lima in Vieira;2001:72). A luta pelo desenvolvimento cabia também a ONU, cujas atividades, nesse aspecto, deveriam “atender a três áreas prioritárias : a industrialização, a mobilização do capital para o desenvolvimento e o comércio internacional”. Este estava de tal forma estruturado que não conseguia atender aos interesses das nações em desenvolvimento(Cervo e Bueno;1992:317).

A criação da UNCTAD(Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento), principal órgão da Assembléia Geral para deliberação e negociações sobre comércio internacional e cooperação econômica internacional tinha por objetivos a atuação na expansão e diversificação das exportações, na abertura de mercados e no ajuste de estruturas produtivas dos países em desenvolvimento. Além da criação do grupo 77, que também reunia os países em desenvolvimento para tratar de aspectos da própria condição de desenvolvimento, na tentativa de instaurar uma nova ordem econômica mundial levando-se em conta as necessidades de seus próprios países, foram fundamentais para o começo de conversa entre os países do Terceiro Mundo.

Sato afirma que a realização da primeira UNCTAD em Genebra no ano de 1964, foi fruto da perda de posição dos países em desenvolvimento no comércio internacional em decorrência das políticas comerciais dos países industrializados(1990:302). A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento viria no esforço de buscar uma alternativa ao GATT em negociações(Abreu;2001:91). O Brasil advogava a necessidade de uma revisão radical da estrutura institucional do comércio internacional. Na Assembléia Geral das Nações Unidas(1961-1962) o representante brasileiro, Afonso Arinos de Melo Franco afirmava "Somos favoráveis à reunião tão logo quanto for possível de uma conferência internacional de comércio, no caso surgiu a UNCTAD, na qual, fora as pressões da Guerra Fria, os problemas dos países exportadores dos produtos primários sejam corretamente equacionados e resolvidos em caráter definitivo"(Franco in Oliveira;1990:270). Entre as primeiras demandas políticas que surgiram na primeira conferência da UNCTAD estavam; o aumento de ajuda ao desenvolvimento através de instituições financeiras multilaterais, sistema preferencial generalizado para as exportações de bens manufaturados dos países em desenvolvimento e aceitação de acordos de comércio preferencial entre grupos de nações em desenvolvimento e proposta de ligação que uniria a criação de uma nova liquidez internacional com a redistribuição de novas reservas para os países em desenvolvimento. Também importante entre os estudos da UNCTAD foi o fato de ter apontado as formas de medidas protecionistas dos países industrializados como o aumento de tarifas, sobretaxas e depósitos sobre importações, restrições quantitativas como por exemplo quotas, ações e taxas compensatórias. Algumas dessas atitudes justificaram-se por considerações com respeito a balança de pagamentos. A maioria, no entanto, originou-se da proteção às indústrias locais, cujos produtos competem com as importações(Mantey e Brandt;1985:66).

Uma das consequências da Segunda Guerra Mundial foi a descolonização dos países africanos e asiáticos. Muito dessa conquista deve-se ao Movimento dos Não-Alinhados. Esse movimento(que também pode ser entendido como Neutralismo) se compreendia pela rejeição da guerra fria e da política dos blocos por parte dos países ex colonizados do Terceiro Mundo e dos que se situam à margem da esfera de influência política das grandes potências. Um dos critérios para cada país não alinhado era, com coerência e constância, apoiar e contribuir ativamente pela luta da independência nacional e pela completa libertação dos povos. O Não Alinhamento foi na sua primeira formulação a bandeira dos novos Estados independentes. Na Conferência de Bandung(Indonésia - abril de 1955) participaram países pertencentes aos dois blocos. Porém, pouco a pouco, foi-se atenuando o caráter de rígida oposição dos dois blocos da guerra fria, mudando também o conceito de Não Alinhamento e perdendo grande parte de seu primeiro conteúdo anticolonialista e racial. De simples negação, o Não Alinhamento assumiu a conotação de ideologia autônoma do Terceiro Mundo ( Ver mais em Bobbio, Matteucci e Pasquino:1983). Albuquerque acredita que mesmo os países Não Alinhados ou neutros, diante de um contexto de interesses contraditórios universais(vide: guerra fria), tinham sua posição geopolítica definida pelo eixo do conflito Leste Oeste 19(1992:160). Porém, em documento escrito pelo Ministro das Relações Exteriores do Brasil em 6 de junho1977, Azeredo da Silveira, o mesmo aborda sobre a tentativa de golpe em Angola(Nito Alves em 1977), onde segundo o Ministro, os alvos da rebelião eram justamente o não alinhamento de Agostinho Neto(Presidente angolano naquele momento), múltiplas vezes reiteirado durante a visita que tomou a iniciativa de fazer a Iuguslávia(um dos países fundadores do movimento dos não alinhados) em abril último, e a resistência do Presidente á adoção de medidas mais radicais no plano interno, como demonstra a boa relação com Portugal. O que os rebeldes de Nito Alves defenderiam seria a tese de prioridade absoluta da luta de classes e da instauração da ditadura da classe operária em Angola.

Ogwu diz que o movimento foi a coroação de uma tendência que apareceu no sistema internacional quando as idéias colonialistas e o colonialismo alcançaram seu auge. Essa tendência manifestou-se em várias formas de oposição e resistência ao colonialismo, à dominação e exploração de povos africanos e asiáticos pelas potências ocidentais. O movimento ganhou maturidade nos anos 70, quando programas de ação e posicionamentos concretos começaram a caracterizar proeminentemente seus países membros, apontando caminhos para que as metas fossem atingidas. Medidas como várias formas de cooperação econômica entre os países membros e certas ações de protecionismo econômico em relação as países desenvolvidos foram estabelecidas(1985:10-12).

Considero a criação dessas organizações, no âmbito da América Latina, o Banco Interamericano de Desenvolvimento, a ALALC e a Organização dos Estados Americanos e em âmbito mundial, o grupo 77 e o Movimento dos Não Alinhados, como os embriões do futuro diálogo na perspectiva de uma cooperação Sul -Sul. Também foi extremamente relevante a criação da UNCTAD, pois a partir daí, criaram-se condições reais de uma maior e mais intensa aproximação política e econômica entre os países em desenvolvimento.

Diálogo entre os países do Norte e Sul.

As relações entre os países do Norte com o Sul são marcadas pela submissão e pela desigualdade econômica e social, assim afirmam inúmeros autores20. Sarmento analisa a forma de cooperação dos países ricos em relação aos países pobres como uma forma de "dar o mínimo e retirar o máximo possível". Assim qualquer política de "aliança para o progresso", que abranja, de um lado, nações metropolitanas e, de outro lado, países do Terceiro Mundo, pode ser inequivocadamente encarada como uma forma adicional de dominação. A ajuda ao desenvolvimento contribui na maioria dos países subdesenvolvidos para a elite exploradora se manter no poder. Para ele, a cooperação entre desenvolvidos e subdesenvolvidos não significa nenhuma solução para o problema do subdesenvolvimento, mas pelo contrário, é mais uma artimanha para a continuidade de tal situação. A cooperação tem que tomar outro caminho, para o autor mais de caráter interno, intramundo subdesenvolvido. Os países em desenvolvimento devem incrementar sempre mais relações econômicas entre si e cooperação em busca de desenvolvimento de tecnologias próprias em vários ramos de produção, tarefa que não se apresenta de modo simples(1990:262-264). Jaguaribe segue essa linha quando diz que o conflito Norte – Sul tem caráter estrutural, na medida em que o favorecimento, por razões históricas, das condições operativas dos países de Primeiro Mundo, relativamente as do Terceiro Mundo, tende a se auto agravar, suscitando, de parte dos países do Terceiro Mundo, esforços no sentido de modificar esse regime, em confrontação com esforços no sentido oposto, por parte dos beneficiários do regime(1988:15).Para Buarque, a ajuda ao desenvolvimento proposto pelos países do Norte, tem por finalidade, explicitamente clara, dinamizar a economia do país doador. Nesse quadro, para ele, se situam os Bancos Regionais(BIRD, BID,...), os programas de alimentos, a aliança para o progresso(1982:36).

Já Granguillome, vai mais além e vê como claras as intenções dos países do Norte de manter separados os países do Terceiro Mundo através de um tratamento bilateral, um tratamento individual, que é acompanhado de esforços para evitar qualquer união regional ou algum esboço de negociação coletiva dos países do Sul. Para esse autor, existe uma vontade de provocar a destabilização e a manutenção do atraso dos países do Sul. Nesse contexto, os países em desenvolvimento estariam condenados a continuarem atados ao carro dos países mais poderosos, cujos interesses são fortíssimos dentro dos países do Sul (1982:132-134). Creio que nessa perspectiva, Granguillome abre uma situação de conflito direto na conjuntura das relações Norte –Sul como também na própria aproximação dos países do Sul. O autor aborda alguns mecanismos que atuam diretamente na relação entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento, como por exemplo, a suspensão de empréstimos bilaterais, ou de instituições bancárias e financeiras multilaterais, as pressões dos países desenvolvidos na questão da gigantesca dívida externa dos países do Sul, a pressão também exercida sobre o movimento migratório de trabalhadores e a diminuição no fluxo comercial.

Para Mourão, a cooperação internacional reflete não só a política de afirmação dos Estados hegemônicos, mas também a vontade de interferir no plano internacional por parte dos intermediários. O autor cita uma entrevista do ex -presidente da Tanzânia, Julius Nyerere, onde afirma que enquanto os países industrializados lidam com problemas cíclicos, os países do terceiro mundo lidam com problemas estruturais, e segue dizendo que as nações do Sul são induzidas a fazerem concessões bilaterais às nações do Norte e que as organizações de cooperação internacional vêm desempenhando um papel mais político do que econômico, em benefício as nações do Norte(1987:57). O articulado presidente Nyerere afirma que para saber o preço de seus produtos tinha que escutar a BBC de Londres, para entender o que decidiram os especuladores nas bolsas de mercadoria em Londres e Chicago. Nestas condições o comércio entre países em desenvolvimento termina sendo realizado entre os agentes bolsistas dos países desenvolvidos, com grandes limitações e perdas(Buarque;1982:23).

D’adesky trabalha com a questão da determinação do peso da questão monetária e financeira no contexto das relações entre os países do Sul. O autor questiona-se sobre em que medida a existência de uma moeda universal(dólar americano), ligada aos países do Norte(naquele momento não existia o Euro) e ao FMI, além da penetração multiforme de capitais estrangeiros nos países do Sul constituem um obstáculo estrutural ao crescimento dos países em desenvolvimento. O próprio financiamento internacional, segundo o autor, demonstra que os países em desenvolvimento não podem contar na mesma medida que os países industrializados. Os circuitos financeiros são controlados pelo sistema bancário dos países industrializados (1982:178-181). Mesmo diante desses conflitos de interesses apontados entre os países do norte desenvolvido e do sul subdesenvolvido, Albuquerque afirma que esses conflitos não constituem risco para a paz mundial se comparável ao que representou a guerra fria(1993:160).

PLANO PEARSON E COMISSÃO BRANT.

Alguns planos e relatórios produzidos por determinadas instituições abordam questões associadas às diferenças conjunturais entre os países do Norte e do Sul. O plano Pearson foi a primeira tentativa de definir um quadro global de cooperação internacional. Partiu do Banco Mundial, no início da década de 70 com a recomendação do estudo direcionado ao ex ministro canadense Pearson. A idéia do plano era definir uma forma de cooperação entre países ricos e pobres, onde os primeiros poderiam ajudar os mais pobres. O plano caiu no vazio na medida que a realidade da economia do mundo mostrava que ele era idealista e não tinha qualquer possibilidade de realizar as diretrizes traçadas a que se propunha teoricamente. Para Buarque o relatório Pearson é elaborado atrasado, em um momento em que os países do terceiro mundo já se dividiam nos de desenvolvimento intermediário, ou os NIC - New Industrialized Cowntries - e os países mais atrasados, ou os LDS - Least Developed Cowntries- (1982:13-14).

Outro exemplo na tentativa de avaliar as contradições das relações entre os países do Norte e do Sul foi no início da década de 80, a Comissão Brandt(o Banco Mundial solicitou a W.Brant para coordenar uma missão que redefinisse o problema da cooperação internacional), que desenvolveu um significativo relatório(North-South : A programme for Survival, Pan 1980) que salientava que a reestruturação econômica é um processo contínuo em economias eficazes, sempre necessário quando os países mudam sua competitividade relativa, mas também exigido para a eficiência da economia interna. A Comissão Brant foi criticada em alguns lugares não só por assumir uma mutualidade entre o Norte e o Sul, mas com isso uma certa harmonia de interesses. O relatório aponta um forte protecionismo do Norte, nesse sentido, o acesso aos mercados dos países desenvolvidos é mais difícil para os parceiros comerciais mais fracos. Isso prejudica tanto a recuperação a curto prazo quanto o desenvolvimento a longo prazo. Também torna mais árduo para os países do Sul saldarem suas dívidas. Um ponto importante em termos da diferença entre as relações Norte-Sul que aponta o relatório, são as dividas que os países do Sul têm com os países desenvolvidos. Acumuladas na história, essas dívidas amarram os países do Sul dentro do contexto de negociação com os países do Norte conforme já foi citado.

A Relação Sul - Sul pós crise do Petróleo ganha novos contornos.

Em 1973, explode no mundo a crise do petróleo, trazendo novos elementos na configuração de economia mundial. Nesse ano é formado a OPEP(Organização dos Países Exportadores de Petróleo) integrado basicamente por países da periferia. Com a crise desse produto ficou uma sensação que os países em desenvolvimento, unidos e utilizando essa matéria prima, poderiam tomar determinadas decisões na área internacional ( Rosa:1981;06-07).

Além disso, nos países industrializados havia uma percepção amplamente difundida de que o que estava acontecendo no mercado de petróleo era apenas o início de uma escassez generalizada de matérias primas, exportadas basicamente por países subdesenvolvidos. Além do petróleo, outros produtos primários importantes que dentro do comércio internacional apresentaram significativa alta dos preços nos anos 1960 e 70 entre eles o café, o cobre e o estanho onde mais do que dobraram de preços, e o açúcar que nesse período aumentou seu valor em seis vezes (Sato;302e307;1990). Gonçalves e Miyiamoto afirmam que o Terceiro Mundo poderia manipular os preços das matérias primas sensíveis as grandes potências, sendo assim teriam um forte poder de barganha frente aos países desenvolvidos(1993:229). Mantey e Brant são defensores da idéia de que os países em desenvolvimento passaram a considerar a cooperação entre si como uma forma de "autoconfiança" coletiva, destinada não só a melhorar as oportunidades para os esforços locais no sentido do desenvolvimento, mas também a valorizar sua posição geral na economia mundial - grifo meu - ou seja, um comércio mútuo e vínculos financeiros mais íntimos poderiam gerar benefícios indiretos sob a forma de um maior poder de negociação com os governos dos países desenvolvidos e com as corporações transnacionais. Assim, seguem os autores, qualquer país em desenvolvimento envolvido em negociações comerciais multilaterais ou bilaterais teria estratégias comerciais alternativas, às quais poderia recorrer no caso de impossibilidade de chegada de algum acordo (1985:154).

A partir da crise do petróleo inúmeras reuniões são marcadas para a aproximação dos países em desenvolvimento21. Durante as décadas de 1970 e 80, as trocas econômicas entre os países do Sul aumentaram substancialmente. Os números comprovam. O crescimento global em termos de porcentagem anual médio do comércio entre os países em desenvolvimento passa de 4,3% entre 1960-70 para 11,5 % entre 1970-80 e supera em 5,3%, em média, as exportações para o mundo no mesmo período. Entre os produtos comercializados, o grande destaque são os produtos manufaturados, que já haviam obtido o maior crescimento entre 1960-70 (6.5%) e no período seguinte melhoram sua performance, passando para 22,8%, superando o ritmo de crescimento tanto das exportações quanto das importações para o resto do mundo – conforme mostra o anexo 2(Cunha;1991:17).

Apesar disso, muito se discute sobre a existência ou não de uma cooperação Sul- Sul, devido aos muitos obstáculos que enfrentam esses países. Almeida lista dois pontos que dificultam o desenvolvimento do comércio entre os países do Sul: o deficiente estado de transporte que eleva os custos a níveis impossíveis e a falta de conhecimento e de informações não permite explorar a fundo as possibilidades existentes(1985:22-23). Aliás, a falta de conhecimento mútuo é apontada por vários autores, entre eles Ogwu(1982:141). Selcher coloca que a cooperação é limitada pela capacidade africana de pagamento. Esta situação limita o Brasil, segundo o autor, na disposição da concessão de auxílio em projetos de natureza social. Em contrapartida à opinião de Selcher, o Ministro de Estado Saraiva Guerreiro em entrevista ao jornal da Tarde e à Folha de S. Paulo em 06 de maio de 1983, afirma claramente que “não é verdade que o Terceiro Mundo não paga suas dívidas”.

Alguns outros autores abordam algumas formas alternativas de trocas comerciais como uma provável saída para a melhoria das trocas econômicas, como a triangulação econômica ( J'Adesky:1985;66), ou o countertrade - sistema de barter - (Dombe;1996:83) como exemplos.

No caso da triangulação econômica, Mourão dá uma visão desse tipo de cooperação trilateral entre Brasil, Portugal e os países africanos de língua oficial portuguesa(PALOP). Portugal um espaço luso, ibérico e europeu; o Brasil, um espaço afro -luso- brasileiro, é latino americano; e, em África, entre os países de língua comum, Angola é um espaço luso -africano, situado na região da África Austral, Moçambique próximo a região articulado ao Índico e Pacífico e outros países com suas variadas potencialidades, como os arquipélagos de São Tomé e Príncipe e Cabo Verde(1992:147). Nesse contexto, vemos que a língua é um fator extremamente significativo de aproximação cultural entre esses povos. A integração com outros países, que não somente no âmbito regional, é importante, conforme diz o ex ministro das relações exteriores, Luís Felipe Lampreia, “é essencial ter presente, que a defesa de margens para escolhas próprias não se confunde mais, como ocorreu no passado, com a noção de auto-suficiência. Muito pelo contrário(...) a autonomia passa necessariamente pela integração com outros países, e não apenas no âmbito regional, mas também por parcerias internacionais cuidadosamente construídas e aprofundadas”22(Lampreia in Vaz;1999:68).

D’adesky coloca uma alternativa que seria a constituição de associações entre bancos árabes, brasileiros e africanos. Esta fórmula teria por objetivo soluções que melhor se adaptam às necessidades dos países e deveria funcionar no interesse recíproco dos três parceiros. O autor ainda lembra que o Brasil em diversas ocasiões, apresentou acordos triangulares em relação a África, incluindo países desenvolvidos(1982:186) Sendo assim, para compartilhar uma cooperação triangular, existe a necessidade de estabelecer um maior diálogo entre esses países, suas demandas, suas ofertas, sua inserção política econômica, em busca de uma possível articulação para desenvolver uma cooperação com outros atores dentro do contexto internacional de globalização econômica. Nesse contexto, a troca de informação e conhecimento é vital para o desenvolvimento dessa alternativa comercial.

Existem outros autores que trabalham com as possibilidades de uma melhor forma de cooperação dos países do Sul. Para Duarte, é indispensável a institucionalização de uma Associação Sul-Sul de Estados em via de desenvolvimento(1985:27). Já Buarque vê a criação de alternativas que fogem ao tipo de relacionamento de hierarquização dos países em desenvolvimento industrializado e os países em desenvolvimento mais pobres, segundo o autor, a cooperação Sul Sul deve procurar outro caminho, novas formas de desenvolvimento, mesmo respeitando os atuais sistemas econômicos. A cooperação entre os países em desenvolvimento tem que ser realizada, para ele, olhando para o próprio Sul, e não mirando num espelho inatingível do Norte. Há de se formular novos modelos e objetivos coerentes com as disponibilidades e potencialidades do Sul(1982:43). Mourão sugere que as operações de cooperação internacional entre os países do Terceiro Mundo deveriam levar em conta escolhas de áreas essenciais, numa perspectiva de interesse mútuo, de forma não só a concentrar recursos humanos e financeiros de implantação de projetos de cooperação, em que esses mesmos recursos possam ser otimizados por ambas as partes ao invés de se dispersarem no campo da ação pontual(1985:15). D’adesky aponta a criação de uma moeda supra nacional, pois a mediação das trocas entre os países do Terceiro Mundo fazem da moeda desses países apenas símbolos. Mesmo sabendo que o dólar não seria substituído a curto prazo, D’adesky analisa num primeiro momento a reorietação do fluxo financeiro segundo o eixo Sul -Sul sendo necessária e possível, fortalecendo os bancos brasileiros em África e o petróleo árabe nesse contexto. Para o autor, toda iniciativa visando à eliminação dos obstáculos inerentes aos movimentos de capitais entre os países do Sul deve ser apoiada, porque corresponde à estratégia de autonomia coletiva e concorre para a diminuição dos laços de dependência entre Norte -Sul, contribuindo assim para o real estabelecimento de uma nova ordem econômica internacional. A reorientação dos fluxos financeiros segundo o eixo dos países do Sul é fundamental para os países do Terceiro Mundo (1982:187).

O relatório do Comitê Internacional Socialista sobre Política Econômica de 1985, diz que para se fortalecer, a cooperação entre os países do Sul há a necessidade de uma transferência de tecnologia contínua desde os mais industrializados como Brasil e Índia(New Industrialized Cowntries), até os menos adiantados. Nos casos em que estivessem envolvidos o auxílio técnico e o conhecimento especializado, todos os países teriam algo a oferecer aos demais. A formação de um fundo comum com recursos financeiros para o financiamento de projetos, o amparo à balança de pagamentos e o financiamento ao comércio tem também uma importância considerável no futuro das relações entre os países em desenvolvimento. Nesse ponto, Buarque também propõe um banco de financiamento tecnológico(1982:26-27).

Zona de Paz e Cooperação no Atlântico Sul(ZPCAS) e a Organização do Tratado do Atlântico Sul (OTAS ).

Durante o governo Sarney, o Brasil propôs na Organização das Nações Unidas, a criação de uma Zona de Paz e Cooperação na parte Sul do Oceano Atlântico. Considero essa atitude como fruto de uma política de aproximação com os países africanos, que já vinha sido desenvolvida desde o início da década de 1970. Além disso, alguns episódios externos incentivaram o governo brasileiro a tomar tal atitude. Para compreender melhor essa proposta, acredito que deve ser feito um balanço histórico, abordando um tema que esteve presente na Política Externa Brasileira desde meados da década de 1960, ou seja, a possível criação de uma Organização do Tratado do Atlântico Sul(OTAS), um pacto militar baseado nos mesmos moldes da OTAN.

Durante o Governo Costa e Silva, começaram a surgir as primeiras propostas com relação à possível criação de uma área militarizada no Atlântico Sul. Depois do fechamento do Canal de Suez em 1967 e a importância crescente do volume de petróleo que começou a circular pela rota do Cabo, vindo do Oriente Médio, aquela região tornou um ponto chave para economia mundial. Além disso, a formação de um pacto militar do Atlântico Sul serviria para conter o "expansionismo soviético" na região. Nesse sentido, em 1969, o ministro das Relações Exteriores da África do Sul, Hilgard Müller, fez uma viagem à Argentina e ao Brasil, durante a qual manifestou a importância de uma aproximação comum para a defesa do Atlântico Sul em prol de uma crescente ameaça soviética. Além do Brasil, África do Sul e Argentina, também fariam parte do pacto, os Estados Unidos e o Uruguai(Decuadra;1991:75-77).

Em contrapartida, as inclinações contrárias a essa possível área militarizada, estavam com alguns países africanos, em especial a Nigéria, que liderava as pressões africanas contra a criação da OTAS. O Brasil nesse contexto, buscava ampliar seus mercados, intensificando os fluxos comerciais com os países africanos. Cabe lembrar que o regime do Apartheid vigorava na África do Sul, e que o Brasil e os países africanos se opunham de forma taxativa no campo da Política Externa a esse regime.

A delegação brasileira permanente junto às Nações Unidas enviou uma nota ao Presidente do Comitê Especial sobre o Apartheid, em julho de 1969, assinada pelo chefe da missão, embaixador José Augusto de Araújo Castro, desmentindo qualquer participação brasileira na OTAS. Pode-se concluir, para Daniel Decuadra que, mesmo no período de política "ambígua" em relação à África, o Brasil preferiu não fechar as opções políticas em torno da África do Sul, cujo custo político seria, pelo menos, a perda das opções no que se refere aos países da África Negra(1991:79).

No governo Médici, cresceu a participação econômica e política do Brasil com os países africanos, em especial com a Nigéria, país que liderava as críticas ao Brasil por sua postura colonialista no caso das colônias Portuguesas em África. No período Geisel foram abordadas as primeiras idéias com relação à proposta do Atlântico Sul como uma área de paz, com novos atores como Senegal e Nigéria(ver mais em Decuadra;1991:85-90). Porém, a formação da OTAS permaneceu na agenda de Argentina, África do Sul, Estados Unidos, Uruguai, Paraguai, Chile e Bolívia. Isto gerou necessidade do Brasil continuar negando sua participação no pacto(Decuadra;1991:82), muito em função do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca23(TIAR) assinado em 1947 - ver estrutura do TIAR no anexo 9 -, onde ficava claro que o poderio militar norte americano seria usado para proteger qualquer país membro contra agressões extra hemisféricas. A esse respeito se pronunciou o Diretor do Departamento de África, Ásia e Itamaraty, Embaixador Ítalo Zappa : “ O Tratado Internacional de Assistência Recíproca já nos é suficiente proteção no Atlântico Sul e autonomia para nos defendermos de qualquer tipo de agressão. Nós não vemos porque o Governo brasileiro teria alguma necessidade de estabelecer outro tipo de aliança militar no Atlântico Sul”(Anglarill e KERZ;1982:235).

Com a ampliação dos diálogos com os países africanos no Governo Geisel, o tema sobre o Atlântico Sul foi abordado com países que tinham interesses comuns como Angola e Argélia(Decuadra;1991:84). O governo angolano se mostrou extremamente contrário a questão do pacto militar naquela região, o Relatório do Comitê Central ao 1º Congresso do MPLA, realizado em Luanda, em 1977, afirmava a essa questão “o regime racista da África do Sul e com a projeção austral do pacto agressivo da OTAN, o imperialismo dos Estados Unidos tenciona criar uma aliança militar no Atlântico Sul, na qual se concede uma posição dominante ao regime fascista. Os planos de forjar uma aliança militar nessa parte do Atlântico são contra os interesses dos povos desta área e constituem um golpe severo ao Movimento dos Não Alinhados”.

Porém, durante a década de 1970, o comunismo começa a ganhar forma em países africanos ligados ao Oceano Atlântico, basicamente Angola. Em junho de 1976, uma força naval soviética foi colocada na costa angolana, e em 1977, a URSS começou a basear uma força naval permanente a 12 embarcações em Luanda. Segundo José Maria Nunes Pereira, esses navios frequentavam a costa somente para reparos. Nos anos 1970, os navios soviéticos passaram para cerca de 200 navios- dia no Atlântico Sul e essa cifra vinha crescendo com os anos(Hurrel;1988:54). Ou seja, com a influência cada vez mais de militares soviéticos na Angola marxista a questão da OTAS ganhava mais força entre alguns países ocidentais.

Com a tomada do poder pelos militares na Argentina em Março de 1976, a questão da segurança do Atlântico contra a "ameaça comunista" ganha novo impulso. Diferentemente do Brasil, no caso argentino, não havia a existência de vínculos políticos fortes com a África Negra, o que levou a uma maior aproximação com a África do Sul. Além da Argentina, Chile de Pinochet e Paraguai de Stroessner também tinham fortes vínculos políticos e econômicos com a África do Sul e davam sinais de apoio a possível criação da OTAS(Decuadra;1991:93-94)

Os EUA começam a pressionar para a criação de uma área de segurança no Atlântico Sul(Gonçalves e Miyamoto, 1993). Antes não havia essa pressão devido a política dos "direitos humanos" do governo Carter em relação aos regimes militares latino-americanos que afastou a possibilidade de qualquer entendimento com esses governos, especialmente com vista a estruturação de um pacto militar(Hurrel, Miyamoto in Decuadra;1991:90).

Moura, Kramer e Wrobel apontam a viagem do secretário assistente do Estado americano, Thomas Enders e do vice presidente Bush ao Brasil em 1981como uma tentativa, entre outras coisas, de uma militarização do Atlântico Sul através de um pacto com o regime militar argentino e da África do Sul(1985:37). Decuadra afirma que a política externa brasileira teve que conviver, naqueles anos iniciais da década de 1980, com a tentativa renovada de formalização do pacto militar da OTAS, desta vez partindo da iniciativa dos EUA e acoplada ao esquema de segurança norte americano, que foi acompanhado pela Argentina, África do Sul, Uruguai, Bolívia e Chile. A reação brasileira, segue Decuadra, buscou neutralizar a ação americana, seja no plano do relacionamento Brasil-Argentina, seja no plano das relações bilaterais com os EUA(1991:98).

Mas, com a surpresa da intervenção nas Malvinas/Falklands por parte do governo militar argentino e a perspectiva de um conflito no Atlântico Sul, os principais atores dessa idéia de criação da OTAS modificaram sua postura. África do Sul e EUA apoiaram à Inglaterra no conflito, o Brasil diplomaticamente discursava em favor de uma autonomia da Argentina sobre Malvinas. Enfim, o acordo do TIAR que reunia os países da América não possuía mais valor, muito menos qualquer tipo de pacto militar na região do Atlântico Sul.

Para Decuadra, a política externa brasileira para o Atlântico Sul no período posterior à guerra das Malvinas pode ser caracterizada como uma "política ativa", no sentido de que o país mobilizou seus recursos diplomáticos e procurou manter uma presença internacional crescente, objetivando a legitimidade internacional para assumir responsabilidades próprias no Atlântico Sul, e dar a este mar uma identidade regional específica(Pericás in Decuadra:1991:163). A guerra terminaria por frustar, da maneira grave, as tentativas de constituição de um pacto na área. Isso ficou manifestado no conflito do Atlântico Sul travado entre dois Estados anticomunistas e ocidentais, como Grã-Bretanha e a Argentina. A preocupação do Brasil, coerente com seus interesses no Atlântico Sul, era manter a paz e a estabilidade regionais. Com relação à África do Sul, houve um grande aumento no tom contra o regime do apartheid, com manifestações contra o regime segregador, condenando também as invasões em Angola e Namíbia, além do incentivo a idéia de substituição do governo branco por um regime democrático(Decuadra;1991:166-167).

Com o final da guerra das Malvinas, ficou a sensação que essa área do Atlântico não estava protegida e ainda era sensível a novos acontecimentos que poderiam modificar o fluxo normal de comércio na região. Desse modo, o Brasil procurou e tomou a iniciativa de criar uma zona de paz e comércio. O consenso político articulado pelo Itamaraty para a aprovação da Área de Paz englobou, principalmente, segundo Decuadra, Argentina e Uruguai, na Ámerica Latina; Angola, Cabo Verde, Congo, Guiné, Guiné Bissau, Nigéria e Senegal, na África(1991:167). Georges Lamazière, analisando a ação brasileira no que diz respeito a criação da ZPCAS, onde procurou se criar uma geopolítica ao revés, concebida não como projeção do poder, mas como um vazio que se busca preservar da ameaça do poder, ou seja, citando o especialista chileno Augusto Veras, a criação de um vácuo de poder que pode transformar-se em um repelente de poder. Lamazière ainda aborda a criação preventiva de zonas de vazio ou de estratégia de interdição político- jurídica de proposta brasileira, como exemplo ele cita a criação em 1962 da Zona Livre de Armas Nucleares na América Latina e África24(2001:44). Como exemplo mais amplo, pode-se colocar como Zona de Paz, o Tratado Antártico de 1959, num acordo multilateral em torno da cooperação internacional para fins científicos. Brigagão diz que a primeira proposta de Zona de Paz foi adotada pelo Movimento dos Não Alinhados, exatamente fora da órbita do conflito bipolar da guerra fria, em 1971, para o Oceano Pacífico, ratificado pela ONU em 1972. Mesmo não sendo efetivado concretamente, em 1979, o Caribe também chegou a ser declarado Zona de Paz pela OEA(1990:343).

Brigagão considera a política internacional orientada para a criação e implementação da Zona de Paz, como uma forma de fortalecer um novo sistema de segurança mais amplo, não exclusivamente militar, através de esforços comuns diplomáticos e políticos de cooperação. Por um lado, com o intuito de reduzir gastos militares, em um processo de desarmamento e desmilitarização. Por outro lado, pôr fim às suas ideologias correspondentes e criar e defender um sistema com base nas leis internacionais e em instituições democráticas. Tal sistema, para Brigagão, tem como objetivo contrapor às ameaças dos conflitos estratégicos oriundas do período de guerra fria e percebidas como obstáculos aos interesses de cooperação e paz, nos níveis internacional e regional(1990:342-343). Lamazière aponta que uma das intenções brasileiras com relação aos países ribeirinhos era tranquilizar quanto às intenções plenamente pacíficas e não – hegemônicas da política externa brasileira(2001:46). Porém, conforme mostra Saraiva, cerca de 90% de todas as exportações brasileiras eram realizadas pelo mar, e quase todo petróleo importado pelo Brasil atravessa a rota do Cabo(1996:204). Uma situação de instabilidade na região poderia não ser bom para o Brasil, nem para países que participavam do comércio naquela região com o Brasil.

Angola, que viveu intensamente os dias de ameaça bipolar no Atlântico Sul, também apoiou e votou a favor da iniciativa do Brasil. O Ministro das Relações Exteriores Roberto de Abreu Sodré, em visita a Angola em 1986, afirmou " A firme vontade brasileira de colaborar para o estabelecimento de uma atmosfera de paz na África Austral contribuiu para fundamentar a iniciativa referente ao Atlântico Sul, aprovada por expressiva maioria na presente Assembléia Geral da ONU. O respaldo valioso do Governo de Angola(...) foi decisivo para o notável êxito alcançado pela proposta da criação de uma Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul", finaliza o ministro.

Finalmente, em 27 de outubro de 1986, a resolução 41/11 foi aprovada, por 124 votos a favor, 8 abstenções e um voto contrário(dos EUA – ver anexo 11), consagrando finalmente, dentro das Organizações das Nações Unidas a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul.

Considerações finais :

O reconhecimento do governo do MPLA em Angola por parte do governo militar brasileiro surpreendeu a muita gente. Essa atitude da política externa nacional contrariou a muitos interesses que viam a “ameaça comunista” muito presente na nossa sociedade. O processo histórico que envolvia a relação entre Brasil e Angola, além dos caminhos a posteriori que foram tomados são abordados nesse trabalho acadêmico.

Na pesquisa são enfatizados os caminhos do diálogo Sul- Sul a partir do reconhecimento do Brasil, sendo esse um ator de extrema importância. Foi com muito bons olhos que os governos dos países do Terceiro Mundo viram o reconhecimento por parte do Brasil ao governo do MPLA. Talvez, exceto, o governo do regime do apartheid da África do Sul, que naquele momento encabeçava a idéia da criação da OTAS, numa tentativa clara de aumentar a pressão do conflito bi polar no contexto do Atlântico Sul. Apesar do apoio do governo dos EUA, da Argentina, Uruguai, Chile e outros países, o Brasil soube resistir a pressão para a criação da OTAS, com apoio de países africanos como Nigéria, Senegal e Angola, e propor em 1986 com muito sucesso a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul.

Claro que a guerra das Malvinas/Falklands em 1982 serviu também como impulso para a iniciativa brasileira, mas o que tentei mostrar nessa pesquisa é que a partir do reconhecimento do governo angolano, os caminhos para um direcionamento político brasileiro foram abertos em prol do aumento do diálogo político e econômico com os países em desenvolvimento, principalmente ribeirinhos ao Atlântico Sul, facilitando o acordo para a aprovação da proposta brasileira de paz e cooperação na região. Ou seja, a cooperação Sul –Sul de meados da década de 70, até meados da década de 80, teve resultados concretos, não somente em âmbitos econômicos. À luz da política internacional, a proposta brasileira teve nos países ribeirinhos do Atlântico Sul seu apoio decisivo, tendo o papel de Angola sendo de extrema importância, haja visto a condição de guerra fria ainda presente naquele momento. Conforme mostra Saraiva, cerca de 90 % de todas as exportações brasileiras eram realizadas pelo mar, e quase todo petróleo importado pelo Brasil atravessa a rota do Cabo, no triângulo inferior da África do Sul(1996:206). Portanto, para o Brasil, a instabilidade na região poderia ter consequências extremamente desfavoráveis, principalmente na economia. Daí mais um impulso para a iniciativa. Nos casos de Angola e Nigéria, as relações privilegiadas com esses países dependiam do bom fluxo e de paz na região no Atlântico Sul. Então, a articulação política e econômica desenhada à luz da cooperação sul - sul desde meados da década de 70, foi extremamente importante para estimular e facilitar a proposta brasileira.

Dentro dessa idéia, o único voto contrário a essa Zona de Paz e Cooperação no Atlântico Sul foi dos Estados Unidos. Durante o tempo inserido na pesquisa, o Brasil demonstrou sua proximidade e afastamento com relação à política de Washington. E ficou notório perceber que quanto mais distante da política americana, no momento que o trabalho está inserido, maior a aproximação com os países em desenvolvimento. Isso ficou claro nos governos da Política Externa Independente de Quadros e Goulart, no governo do pragmatismo responsável de Geisel e no governos seguintes de Figueiredo e Sarney. A fuga da linha americanista favoreceu a possibilidade de incremento das relações entre o Brasil e os países subdesenvolvidos, trazendo à luz da reflexão acadêmica, possibilidades alternativas de trocas comerciais, acordos políticos, enfim, trazendo o saudável debate entre as possibilidade das relações Sul –Sul não como uma fuga das tradicionais e muitas vezes injustas relações Norte –Sul, mas colocando alternativas interessantes de pensar nos países do Sul como parceiros comerciais com relevante potencial.

A relação Brasil - Angola serviu muito bem para demonstrar alguns pontos positivos e negativos que envolvem esse diálogo que ainda hoje está em questão. Angola se tornou um parceiro estável na produção de petróleo com a concreta participação da Petrobrás através da Braspetro. O Brasil também esteve na vanguarda da criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa(CPLP) em 1992, aproximando os países de expressão portuguesa e também se manteve presente na força de paz da ONU em Angola, possuindo o maior contigente de homens em território angolano. Além disso se dialoga, através do MercoSul, com os países da SADC (Southern Africa Development Comunity) com Angola tendo um papel importante, conforme afirma Morais(1998:123).

As possibilidades econômicas e políticas entre esses dois países estão sempre em diálogo, merecendo um estudo mais aprofundado em outra oportunidade, principalmente nesse último período, com a morte de Jonas Savimbi, líder do grupo rebelde da UNITA no último dia 22 de fevereiro. O Itamaraty acredita em um “período de conciliação nacional”, a partir da morte de Savimbi, assinala Pedro da Motta Pinto Coelho, diretor – geral do Departamento da África e Oriente Próximo do Ministério25. Jornais africanos também acreditam em um momento mais próspero para Angola com a morte de Savimbi, até os periódicos do Togo(país acusado de apoiar a rebelião armada da Unita em Angola) apostam na nova perspectiva26

Os presidentes do Brasil e de Angola se encontraram em Brasília no início de março desse ano e discutiram questões de interesse bilateral e da atualidade internacional, em particular as questões regionais africanas27. Para o presidente brasileiro, a morte do líder rebelde amplia a oportunidade de buscar o fim de um conflito que se arrasta por muitos anos, “O Brasil sempre apoio o governo Eduardo dos Santos. Acho que agora é oportunidade de avançar mais28”

NOTAS :

1- O nome oficial República Popular de Angola(RPA) vigorou até à revisão da Lei Constitucional (Lei nº 23/92) de 16 de setembro de 1992. Após essa data o país passou a chamar simplesmente de República de Angola. Portanto, dentro do contexto do trabalho, a designação mais correta é o primeiro nome oficial do país.

2 - Lafer, Celso. Discurso do Ministro das Relações Exteriores por ocasião do Dia da África, Brasília 28 de maio de 2001.

3 - A manutenção das colônias, último baluarte do império português, fazia parte do programa de Antônio de Oliveira Salazar, professor de Coimbra que instituíra nos anos 20 um regime considerado fascista, batizado de Estado Novo. Os revoltosos, liderados por um grupo de 200 capitães e majores tinham como uma das principais motivações a oposição a guerra nas colônias africanas. O nome veio dos Cravos que os revoltosos usavam na lapela para se identificar, idéia que foi encampada pela população – os portugueses festejavam o fim da ditadura colocando flores nos canos dos fuzis dos soldados.

4- Diferente das outras colônias portuguesas, onde só havia um movimento de libertação como a FRELIMO em Moçambique, a PAIGC em Guiné Bissau e Cabo Verde e o MLST em São Tomé e Príncipe.

5 – Em junho daquele ano, Ovídio de Melo como observador do Instituto Rio Branco acompanhou um seminário da OTAN(NATO) realizado na Universidade de Oxford. Nesse seminário, todos os problemas políticos do mundo foram repassados, inclusive a questão angolana, onde os prognósticos que foram colocados era de que nada menos do que cinco anos seriam necessários para que aquela independência se concretizasse (p.7).

6- A UNITA viu-se obrigada a se retirar primeiro para a província de Bié e mais tarde para a província de Cuando Cubango, onde vai organizar a guerrilha contra o MPLA.

7 – O FLNA é praticamente destroçada e empurrada para o Zaire(hoje Congo Democrático), onde não consegue apoio e perde sua força.

8- Em língua afrikaans, Apartheid significa “separação”. Em uma concepção mais clara, significa “identidade separada” e designa a política oficial do governo sul – africano a partir de 1948. O Apartheid não pode ser traduzido simplesmente como “racismo”; constitui um sistema social, econômico e político – constitucional que se baseia em princípios teóricos e numa legislação ad hoc. Nesse sistema, a diferenciação corresponde à definição de grupos raciais diversos e ao seu desenvolvimento separado. Em termos políticos, significa a manutenção de supremacia de uma aristocracia branca, baseada numa rígida hierarquia de castas raciais, para as quais existe uma correlação direta entre a cor da pele e as possibilidades de acesso aos direitos e ao poder social e político(BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco;1983:48).

9- Antes do IBEAA, vale destacar a Fundação do Centro de Estudos Afro – Orientais (CEAO) junto à UFBA(Universidade Federal da Bahia). Depois do IBEAA vieram em 1963, o Centro de Estudos e Cultura Africana junto à FFLCH/USP(Univ. de São Paulo), hoje denominado Centro de Estudos Africanos(CEA), em 1973 surge o Centro de Estudos Afro Asiáticos(CEAA) da Universidade Cândido Mendes no Rio de Janeiro, e em 1985 é fundado o Núcleo de Estudos Afro Asiáticos da Universidade Estadual de Londrina no Paraná (ZAMPARONI, Valdemir D. “Os estudos africanos no Brasil : veredas” – Revista da Educação Pública, v.4, nº5, Cuiabá, 1995.

10- O paradigma Rio Branco está associado ao alinhamento automático com a Política dos Estados Unidos, segundo Nkosi. O Barão do Rio Branco chefiou o Itamaraty nos anos de 1902 até 1912 – durante os governos de Rodrigues Alves, Nilo Peçanha, Afonso Pena e Hermes da Fonseca. Entre as preocupações da gestão de Rio Branco estão a preparação técnica e intelectual do corpo profissional dos diplomatas e a ampliação da representação diplomática do Brasil no exterior. Mello e Silva aponta alguns componentes fundamentais e complementares nas percepções de Rio Branco. Primeiro, uma visão realista das Relações Internacionais(ver mais tal paradigma em : Barbé, Esther. Relaciones Internacionales. Madrid, Tecnos, 1995, p.60 - Keohane, Robert e Nye, Joseph. La política mundial en transición. Buenos Aires, GEL, 1998, pp.39 à 57 – Morgenthau, Hans J. Os seis princípios. In Philippe Braillard(org.), Teoria das Relações Internacionais. Lisboa, Fundação Calouste Gulbekian, 1990, pp.130-147 – Aron, Raymond. Estudos Políticos. Brasília. Ed. UnB, 1985, pp.375-396), segundo, sua clara percepção da emergência dos EUA como pólo de poder hemisférico e mundial, e das vantagens que se poderia retirar de um estreitamento das relações com a nova potência(Rio Branco era defensor da Doutrina Monroe de 1823, onde havia uma promessa militar americana de defesa do continente, com a idéia de América para os americanos). E no campo da política externa havendo traços de uma continuidade da época imperial (1995:96-100).

11 - Os contatos com os líderes dos movimentos africanos eram evitados desde 1964, pois eram considerados subversivos. Ovídio de Melo consultou os ministros dos movimentos : MPLA – Agostinho Neto, Lopo do Nascimento(Educação) e Saidy Mingas(Planejamento); FNLA – Holden Roberto, Pinnock Eduardo(Educação) e Samuel Abrigada(Saúde); UNITA – Jonas Savimbi, José N’dele e Jerônimo Wanga(Educação) – p.12-25.

12- Para Ovídio existia um medo na diplomacia brasileira devido ao fato do General Spínola assumir o governo de Portugal, já que esse general sempre foi a favor do colonialismo, mudando de pensamento de forma muito radical em pouco tempo.

13 – Ver Revista Isto é, 5 de junho de 1985. Ainda sobre a questão de armas. Apesar de alguns autores(como Brigagão, Clóvis e Junior, Proença;1988:90) apontarem as vendas de armas brasileiras para Angola serem de relativa importância nas relações entre Brasil e Angola e que não faz parte da pauta de importação –exportação oficial entre os países, José Nunes Pereira em entrevista afirmou que apenas a partir de 1992, depois da primeira eleição democrática em Angola, é que o Brasil passou a mandar armas de maneira mais significativa ao governo daquele país.

14- Um forte exemplo do reflexo da posição brasileira de reconhecimento do Governo do MPLA pode ser medida com a demissão do Ministro do Exército, Silvio Coelho Frota em 1978, onde o mesmo afirmava que o reconhecimento de Angola era indício da crescente “comunização” que via na política brasileira (Ovídio; pg.1).

15- Em discurso do Presidente na ONU em 25/09/85 – “No Brasil, a discriminação racial não é só ilegítima – é ilegal, é crime previsto nas leis penais(...) Reitero solenemente nossa total condenação ao apartheid e nosso apoio sem reservas à emancipação imediata da Namíbia, sob a égide das Nações Unidas”. Resenha de Política Exterior do Brasil – Edição Suplementar, dezembro/1986. Ministério das Relações Exteriores.

16 – E, 1975, o grupo Pão de Açúcar recebeu US$ 5 milhões do governo brasileiro para ajudar Angola a manter-se abastecida de produtos alimentícios. Revista da Fundação Eduardo dos Santos(FESA), nº1, ano1, Rio de Janeiro, pág.18, 2001.

17 – Jornal do Brasil, 20 de novembro de 2001.

18- Para o autor, a expressão “Jogo de Soma Zero” designa o sistema de dar notas escolares em base de curva, no qual para uma parte dos alunos tirar dez, outra parte terá que tirar zero. Marovitch lembra Lester Thurow, quando nas economias modernas as riquezas obtidas são agudamente desiguais. Também de certo modo acontecem jogos de soma zero.

19 – Essa idéia está muito presente no caso angolano, embora o país se declarasse ligado diretamente a orientação socialista, não deixava de apoiar de forma direta a política de não alinhamento aos blocos militares constituídos no mundo, “baseando nossa ação no seio do Movimento dos Países Não Alinhados no reforço da orientação anticolonialista e antiimperialista, pela paz, liberdade e independência dos povos e pelo progresso social”(MPLA, Relatório do Comitê Central ao I Congresso – Luanda, 1977).

20 – Dentro dos principais paradigmas das relações internacionais, pode-se afirmar que o estruturalismo atua diretamente diante dessa perspectiva. O estruturalismo pretende conhecer as origens, o caráter e as consequências do sistema capitalista mundial. Esse paradigma centra sua análise de relações internacionais nas desigualdades, nos domínios do desenvolvimento econômico observados no sistema capitalista mundial. Barbé afirma que o estruturalismo não vê o capitalismo como um fator que tende a integração e a cooperação a não ser a causa dos problemas de subdesenvolvimento existentes no planeta. Como característica, a autora aponta o contexto histórico da pós colonização; a unidade de análise do estruturalismo como o sistema econômico capitalista mundial; a problemática de seu estudo são para Barbé as relações do centro – periferia e os mecanismos geradores do subdesenvolvimento; e a imagem do mundo para esse paradigma como um polvo de várias cabeças alimentando-se por tentáculos(1995:68-69). Ver mais sobre estruturalismo em Braillard, Phillipe. “As ciências sociais e o estudos das relações internacionais”. In Teoria das Relações Internacionais, Lisboa, 1990.

21 – Conferência de Chefes de Estado e Governo – Argel, 1973; e também até 1982, encontros em Manila(1976), México(1976), Arusha(1979), Havana(1979), Nova Iorque(1980) e Caracas(1981) – Buarque;1982:16.

22 – Vaz retoma a questão dizendo que o reforço de parcerias internacionais é recontextualizado e retomado dentre as prioridades da política externa brasileira, não mais se restringindo a países individualmente, mas tendo por referências blocos econômicos que passaram a compor o panorama da economia mundial(1999:69).

23- O artigo número 3 do TIAR afirma “ Las altas partes contratantes convivem en que un ataque armado por parte de cualquier Estado contra un Estado Americano será considerado como un ataque contra todos los Estados Americanos, y en consecuencia, cada una de dichas Partes Contratantes se compromete a ayudar a hacer frente al ataque, en ejercicio del derecho inmanente de legítima defesa individual o colectiva que reconoce el Artículo 51 de la Carta de las Naciones Unidas”. Já no artigo número 9 do TIAR, mostra que “...caracterizarse como de agresíon, el ataque armado, no provocado, por un Estado, contra el territorio, la población o las fuerzas terrestres,. navales o aéreas de outro Estado, y la invasion, por fuerza armada de un Estado, del territorio de un Estado Americano, mediante el traspaso de las fronteras demarcadas de conformidad com un tratado, sentencia judicial, o laudo arbitral, o, a falta de fronteras así demarcadas, la invasión que afecte una región que este bajo la jurisdicción efectiva de outro Estado” ( Tratado Interamericano de Asistencia Reciproca)

24 – Ver mais em Correio da Manhã, 26 de outubro de 1962.

25 – Jornal Valor Econômico, 01 de março de 2002.

26 – Jornal de Angola, 02 de março de 2002.

27 – Jornal de Angola, 02 de março de 2002.

28 – Jornal O Globo, 24 de fevereiro de 2002.

BIBLIOGRAFIA :

ACOSTA, Daniel. "Um 'Vietname' africano. Revista da América, nº 11, Jan/1976 in A revolução angolana em debate, Lisboa, 1976.

ALBUQUERQUE, José A. Guilhon. "O fim da guerra fria e os novos conflitos internacionais". In O futuro do Brasil - a América Latina e o fim da guerra fria. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1992.

ALENCASTRO, Luiz Felipe. O trato dos viventes. A formação do Brasil no Atlântico Sul. Companhia das Letras, Rio de Janeiro, 2000.

ANGLARILL, Nilda Beatriz e KERZ, María Guadalupe. “A política externa brasileira para América Latina e África”. Estudos Afro-Asiáticos, nº6-7, Rio de Janeiro,1982.

ARON, Raymond. Paz e Guerra entre as nações. Brasília, Ed.UnB, 1986.

BAER, Monica. O rumo perdido : a crise fiscal e financeira do Estado brasileiro. Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1993.

BARBÉ, Esther. Relaciones Internacionales. Madrid, Tecnos, 1995.

BEATRIZ, Morais. A cooperação e a integração regionais da África Austral – a SADC. O papel de Angola. Centro de Estudos Africanos, Universidade de São Paulo, 1998.

BENTO, Andre Salazar. Direitos individuais na constituição angolana e a construção da cidadania. Dissertação de Mestrado. Departamento de Direito. Pontifícia Universidade Católica, Rio de Janeiro,2001.

BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política, Universidade de Brasília, 1983.

BRIGAGÃO, Clóvis. “Atlântico Sul : Zona de Paz e cooperação”. Política e Estratégia, Vol. VIII, nº2 a4, 1990.

BUARQUE, Cristóvam. " A cooperação Sul-Sul" - Fundação UnB, Brasília. Jul/1982.

CARNEIRO, Ricardo. Crise, ajustamento e estagnação. Economia e Sociedade, Campinas, n.2, ago. 1993.

CARR, Edward Hallett. Vinte anos de crise : 1919 – 1939. Brasília, Ed. UnB, 1981.

CERVO, Luiz Amado e BUENO, Clodoaldo. História da Política Exterior do Brasil. Ed. Ática, Rio de Janeiro, 1992.

CUNHA, Sílvio. As relações econômicas Brasil-Angola (1975-1988). Dissertação de Mestrado em Economia, Salvador, UFBA, 1991.

DANTAS, San Tiago. Política Externa Independente. Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1992.

D’ADESKY, Jacques. “A questão das divisas e do financiamento nas relações econômicas Brasil –África”. Estudos Afro Asiáticos, Rio de Janeiro, nº6-7, 1982.

__________________" As relações econômicas Brasil - África no contexto das relações internacionais", Estudos Afro Asiáticos, Rio de Janeiro, nº11, 1985.

D'ALMEIDA, Fidelis Cabral. "A nova ordem internacional e as perspectivas Sul-Sul"- Estudos Afro Asiáticos, Rio de Janeiro, nº 11, 1985.

D'ARAÚJO, Maria Celina e Castro, Celso(orgs.). Política Externa e pragmatismo responsável. Entrevista com o Presidente Geisel, FGV, 1994.

DECUADRA, Daniel Rotulo. "Geopolítica, política externa e pensamento militar brasileiro em relação ao Atlântico Sul(1964-1990)", dissertação de Mestrado, IRI - PUC-Rio, 1991.

DOMBE, Alfredo. As relações Angola-Brasil, no pós reconhecimento de Angola. Dissertação de Mestrado, Instituto de Relações Internacionais (IRI-PUC-RJ), Rio de Janeiro,1996.

FERREIRA, Manuel Ennes. "Performace económica em situação de guerra : o caso de Angola(1975-1992)". Revista do Centro de Estudos Africanos, Universidade de São Paulo, nº16-17, São Paulo, 1993-1994.

___________, A indústria em tempo de guerra ( Angola, 1975-91), Instituto de Desfesa Nacional, Ed. Cosmos, Lisboa, 1999.

FRAGOSO, João Luiz Ribeiro. Notas sobre a política externa brasileira dos anos 1950-1970, Estudos Afro Asiáticos, nº10, Rio de Janeiro, 1984.

FREITAS, Amadeu José de. Angola, o longo caminho da liberdade. Editores Moraes, Lisboa, 1975.

GEISEL, Ernesto. Mensagem ao Congresso Nacional, 1976.

_______, Ernesto. Mensagem ao Congresso Nacional, 1977.

GONÇALVES, Willians da Silva e MIYAMOTO, Shiguenoli. Os militares na política externa brasileira : 1964-1984. Estudos Históricos, nº12, FGV, 1993.

GRANGUILLOME, Jesus Contreras. Os obstáculos internos e externos para a cooperação Sul-Sul. Estudos Afro Asiáticos, nº 6-7, Rio de Janeiro, 1992.

GUERRA, Henrique. "Angola: estrutura econômica e classes sociais". União dos escritores angolanos, Luanda, 1988.

HURREL, Andrew. “Os EUA e a segurança no Atlântico Sul”. Contexto Internacional, IRI -PUC- Rio, vol.7, 1998.

JAGUARIBE, Hélio. "A América Latina no presente contexto internacional". Contexto Internacional, IRI, PUC-Rio, nº7, 1998

KISSINGER, Henry. Diplomacia, Ed. Francisco Alves, 1994.

LAMAZIÈRE, Georges. “O impacto dos processos de integração regional nas políticas de defesa e segurança: o Brasil e a cooperação político –militar na América do Sul”. Política Externa, vol.9, nº4, USP, São Paulo, 2001.

LAZITCH, Brancko e RIGOULOUT, Pierre. Angola 1974-1998, um fracasso do comunismo na África. Ed Referendo, Lisboa, 1998.

MAIA, José. “Angola : a revolução na encruzilhada”. Revista crítica marxista revolucionária. Lisboa, nov. 1977.

MANTEY, Michael e BRANDT, Willy. Desafio Global : da crise à cooperação . rompendo com o impasse Norte-Sul. Relatório do Comitê da Internacional Socialista sobre Política Econômica. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1985.

MARCOVITCH, Jacques. “Cooperação e valores democráticos na América do Sul”. Carta Internacional, Ano VII, nº90, agosto 2000, São Paulo.

MELLO E SILVA, Alexandra. “O Brasil no continente e no mundo: atores e imagens na política externa brasileira contemporânea” in Estudos Históricos, Fundação Getúlio Vargas, 1995, Rio de Janeiro.

MELO, Ovidio de Andrade. O reconhecimento de Angola pelo Brasil em 1975 s/d.

MERLE, Marcel. Sociologia das relações internacionais. Brasília, UnB, 1981.

MEYNS, Peter. "O desenvolvimento da economia angolana a partir da independência". Revista Internacional de Estudos Africanos, Lisboa, nº2, jun/dez, 1984.

MGBOKWERE, Timothy A. Estudos afro asiático nº6-7, Rio de Janeiro, 1982.

MPLA, Relatório do Comitê Central – 1º Congresso do MPLA, Luanda, 1977.

______, Linhas mestras do desenvolvimento econômico e social da República Popular de Angola para a década de oitenta e orientações fundamentais para o quinquênio 1981-1985. In Congresso Extraordinário do MPLA, 1, 1980, Luanda, 1980.

MOURA, Gerson, KRAMER, Paulo, WROBEL, Paulo. "Os caminhos(difíceis) da autonomia: as relações Brasil-EUA". Contexto Internacional - IRI-PUC-Rio, nº2, Rio de Janeiro, 1985.

MOURÃO, Fernando Augusto Albuquerque. O Atlântico Sul e novos vetores do sistema internacinal. Política e Estratégia, Vol.III, n.2 abr/dez, 1990.

___________, a cooperação internacional e as relações internacionais. IX ANPOCS, Águas de São Pedro, 1985.

_____________, A cooperação internacional e as relações entre países. Contexto Internacional, IRI-PUC-Rio, nº6, dez/1987.

_____________, Portugal, Brasil e África : os caminhos da convergência. Estudos Africanos, nº2 : África Cultural : o desafio do futuro, integração nacional, integração regional, Lisboa, 1992.

MRE, Relatório Oficial, Brasília, 1975.

_____, Discurso do Ministro das Relações Exteriores, Roberto Abreu Sodré. Resenha de Política Exterior do Brasil, nº51, Out/Nov/Dez, 1986.

NKOSI, José K. “O pragmatismo responsável e a questão angolana” – RIEP – Programa de Estudos Políticos, UERJ, 2000.

OGWU, U. Joy. "Cooperação Sul-Sul : problemas, possibilidades e perspectivas de relação emergente". Estudos Afro Asiáticos, Rio de Janeiro, nº11, 1985.

OLIVEIRA, Henrique Altemani de. Política Externa Independente : fundamentos da política africana do Brasil. Política e Estratégia, Vol. III,nº2a4, abr/dez, 1990.

_________, e MOURÃO, Fernando. Política Africana no Brasil, Centro de Estudos Africanos, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1991.

PEREIRA, José Maria Nunes. "Brasil- África no governo Figueiredo : um balanço". Contexto Internacional(IRI-PUC-Rio), 1985.

__________. Angola : uma política externa em contexto de crise(1975-1994). Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, 1999.

PINHEIRO, Letícia. Restabelecimento de relações diplomáticas com a Rep. Pop. da China: uma análise do processo de tomada de decisão. Estudos Históricos , FGV, Vol.6, nº12, 1993.

_____________. “Traídos pelo desejo: um ensaio sobre a teoria e a prática da política externa brasileira contemporânea” – Contexto Internacional, IRI, PUC- Rio, vol.22, 2000.

RICUPERO, Rubens. Visões do Brasil. Editora Record, Rio de Janeiro, 1993.

ROCHA, Alves da. "Angola : ensaio de um balanço crítico. Economia e Socialismo". Revista trimestral de Economia Política, v.10, nº69/70, 1986.

RODRIGUES, José Honório. Brasil e África : outro horizonte, Ed. Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1961.

ROSA, Carlos Augusto Proença. " Relações Sul-Sul. A cooperação entre países em desenvolvimento". Departamento de Estudos. Escola Superior de Guerra(ESG), Rio de Janeiro, 1981.

SANTOS, José Vicente Tavares dos. " A construção da viagem inversa,: ensaio sobre a investigação nas ciências sociais". Cadernos de Sociologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, v.3, nº3, Porto Alegre, 1991.

SARAIVA, José Flávio Sombra. O lugar da África. Universidade de Brasília, Brasília, 1996.

SARMENTO, Walney Moraes. Política externa no contexto do subdesenvolvimento. O exemplo do Brasil. Política e Estratégia, V.VIII, Nº 2 a 4, abr/dez, 1990.

SATO, Eitti. Os países periféricos na ordem econômica internacional: lições do passado. Política e Estratégia, V. VIII, nº 2 a 4, abr/dez, 1990.

SELCHER, Wayne A. Estudos Afro Asiáticos, Rio de Janeiro, nº6-7, 1982.

________________ "Dilemas políticos nas relações Brasil - África : comentários sobre alguns obstáculos políticos nas relações Sul - Sul". Estudos Afro - Asiáticos, nº10, Rio de Janeiro, 1984.

TOMASSINI, Luciano. Teoria y prática de la política internacional. Santiago, Ediciones Universidad Católica de Chile, 1989.

VAZ, Alcides Costa. “Parcerias estratégicas no contexto da política exterior brasileira: implicações para o MercoSul”. Revista Brasileira de Política Internacional, ano 42, nº2, IBRI, Brasília,1999.

VIEIRA, Marco Antônio Muxugata de Carvalho. Idéias e instituições: a Política Externa Brasileira no Pós Segunda Guerra Mundial e Pós Guerra Fria – Dissertação de Mestrado, Instituto de Relações Internacionais(IRI/PUC-RIO), 2001.

WALTZ, Kenneth N. Teoría de la política interncional. Buenos Aires, Grupo Editor Latinoamericano(GEL), 1998.

WHITE, Martin. A política do poder. Brasília, UnB, 1978.

CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM SOCIEDADE, DESENVOLVIMENTO E AGRICULTURA – CPDA / UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO(UFRRJ).

NOME : RODRIGO DE SOUZA PAIN – MESTRADO – Estudos Internacionais Comparados.

ORIENTADOR : Dr. HÉCTOR ALIMONDA.

Dissertação de Mestrado.

Título : “A inserção do Brasil no processo de independência e desenvolvimento da República Popular de Angola(1975-1986) na perspectiva da cooperação entre os países em desenvolvimento”.

ANEXO 11

Lista de países votantes da Resolução 41 / 11 / 86.

Votos a favor : Albânia, Argélia, Angola, Antígua e Bermuda, Argentina, Austrália, Bahamas, Barein, Bangladesh, Barbados, Benin, Butão, Bolívia, Botswana, Brasil, Brunei, Bulgária, Burkina Faso, Birmânia, Burundi, República Socialista Soviética da Bielorússia, Camarões, Canadá, Cabo Verde, Rep. Centro Africana, Chade, Checoslováquia, China, Chipre, Colômbia, Congo, Costa do Marfim, Cuba, Iemem Democrático, Dinamarca, Djibuti, Equador, Egito, Guiné Equatorial, Rep. Democrática da Alemanha, Gana, Grécia, Granada, Guiné, Guiné Bissau, Guiana, Haiti, Hungria, Islândia, Índia, Indonésia, Irã, Iraque, Irlanda, Israel, Jamaica, Jordânia, Quênia, Kwait, Laos, Líbano, Lesoto, Líbia, Madagascar, Malawi, Malásia, Maldivas, Mali, Malta, Mauritânia, Maurício, México, Mongólia, Marrocos, Nepal, Nova Zelândia, Nicaragua, Níger, Nigéria, Noruega, Omã, Paquistão, Panamá, Papua Nova Guiné, Paraguai, Peru, Filipinas, Polônia, Quatar, România, Ruanda, Santa Lúcia, S. Tomé e Príncipe, Arábia Saudita, Senegal, Serra Leoa, Singapura, Somália, Espanha, Sri Lanka, Suriname, Suécia, Tailândia, Togo, Trindade e Tobago, Tunísia, Turquia, Uganda, Rep. Socialista Soviética da Ucrânia, URSS, Emirados Árabes Unidos, Reino da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, Tanzânia, Venezuela, Vietnã, Iemem, Iuguslávia e Zimbábue.

Abstenção: Bélgica, França, Rep. Federativa daAlemanha, Itália, Japão, Luxemburgo, Países Baixos(Holanda) e Portugal.

Voto contra : Estados Unidos da América.

Aprovado o projeto resolução 41/11

Fonte : Resenha de Política Exterior do Brasil (1986, n.50:54).

ANEXO 1 :

REPÚBLICA DE ANGOLA :

População : 12,3 milhões de habitantes.

Nascimentos por mil habitantes: 50.

Mortes por mil habitantes : 25.

Crescimento natural anual em % : 2,4.

População projetada : 20,5 milhões(2025) e 29,6 milhões(2050)

Taxa de mortalidade infantil por mil : 198.

Taxa de fecundidade : 6,9.

Esperança de vida ao nascer : 37(homens), 39 (mulheres) –

Fonte : “2001 Cuadro de la población mundial del Population Reference Bureau (PRB)”. Washington, EE.UU.

Situação Geográfica : Angola se situa na região ocidental da África Austral, entre as latitudes 4º 22 e 18º 02 SE as longitudes 11º 41º 05 E. O território ocupa uma superfície de 1.246.700 quilômetros quadrados, com uma fronteira, a norte com a República do Congo e a República Democrática do Congo; a leste, com a Zâmbia e com o Congo Democrático; a sul com a Namíbia.

Superfície : 1.246.700 Quilômetros Quadrados – Fronteiras terrestres somam 5 . 198 quilômetros.

Principais cidades : Luanda(cerca de 4 milhões de habitantes), Huambo(210 mil), Lobito (155 mil) e Benguela(120 mil).

Principais grupos étnicos : Ovimbundos (37%), Kimbundos(25%), Kikongos(13%) e Quiocos(9%).

Idioma oficial : Português – cerca de 65% dos angolanos falam o idioma, sendo que 10% dos angolanos têm o português como língua materna, principalmente na capital do país.

Introdução..................................................................................1

1.0- Desdobramentos do processo de independência em Angola............4

1.2- Economia angolana pós independência...........................10

2.0- O Brasil na relação Sul –Sul e o processo de independência

de Angola..................................................................................14

2.1- Governos Jânio Quadros e Goulart...................................14

2.2- Governo Castelo Branco....................................................22

2.3- Governo Costa e Silva.......................................................26

2.4- Governo Medici..................................................................30

2.5- Governo Geisel..................................................................34

2.6- Governo Figueiredo...........................................................51

2.7- Governo Sarney.................................................................57

2.8- Alguns aspectos das relações econômicas entre Brasil e Angola.......................................................................................58

3.0- Cooperação Sul –Sul segundo alguns autores..................68

3.1- Cooperação no Pós Guerra...............................................73

3.2- Diálogo entre os países do Norte e do Sul........................79

3.3- Plano Pearson e Comissão Brent......................................82

3.4- Relação Sul – Sul no pós crise do petróleo.......................84

4.0- Zona de Paz e Cooperação no Atlântico Sul(ZPCAS) e Organização do Tratado do Atlântico Sul(OTAS)......................91

Considerações Finais...............................................................100

Notas .......................................................................................105

Bibliografia................................................................................110

Anexos......................................................................................119

................
................

In order to avoid copyright disputes, this page is only a partial summary.

Google Online Preview   Download

To fulfill the demand for quickly locating and searching documents.

It is intelligent file search solution for home and business.

Literature Lottery

Related searches