Motéis e Hospitalidade A Identidade Preservada

Mot?is e Hospitalidade A Identidade Preservada

In?s Machado Przybylski*1

Resumo: Mot?is s?o um tipo de meio de hospedagem que apresentam peculiaridades em sua forma de ser e estar no mercado tur?stico/hoteleiro. Tanto nos Estados Unidos, quanto no Brasil, apresentam caracter?sticas que os diferenciam dos demais, pois desde o estudo e a defini??o de seu plano de negocio, at? a finaliza??o em termos de decora??o, estrat?gias delimitar?o diferenciais em compara??o n?o somente a outros equipamentos do mesmo tipo, mas em compara??o tamb?m aos outros meios de hospedagem: hot?is, pousadas, flats, etc. Considerando a aus?ncia de investiga??o sobre o tema, parte-se de uma pesquisa explorat?ria que busca caracterizar as origens da atividade e analisar como se processa o ritual da hospitalidade, levando em considera??o as especificidades dos espa?os e dos profissionais que os operacionalizam.

Palavras-chave: Turismo; Hotelaria; Hospitalidade; Hospede; Motel.

1 INTRODU??O A palavra motel costuma mexer com o imagin?rio das pessoas, sejam ou n?o

usu?rios de seus servi?os. Talvez seja por isso, que o tema ainda seja visto como tabu, como se guardasse em si segredos n?o revelados. Segredos pessoais, n?o revelados nem aos amigos. Segredos coletivos que levam a inibir a orat?ria e a escrita.

A presente pesquisa explorat?ria, parte de uma revis?o bibliogr?fica que envolveu cerca de 100 t?tulos, brasileiros e estrangeiros, nos mais variados campos do conhecimento humano. Abordaram-se as obras buscando aportes que pudessem pautar a

1 Mestre em Turismo pela Universidade de Caxias do Sul e Tecn?loga em Hotelaria, pela mesma Universidade. Docente do Curso de Turismo da Universidade de Santa Cruz do Sul. inmapr@.br

constru??o do estudo. Na falta de dados, frutos de pesquisa emp?rica e de campo, buscouse refer?ncias que arremetessem o pensamento e auxiliassem a escrita. Dos t?tulos pesquisados, apenas quatro mencionam a palavra Motel e o fazem para mencionar como surgiram, junto as estradas dos estados unidos, por volta de 1920, para atender aos viajantes em traslado. Nenhum deles aborda o tema motelaria da forma como ela ? percebida e utilizada no Brasil. Nenhum aborda o tema pela ?tica da Opera??o Hoteleira, da Administra??o de Empresas, do Treinamento de Profissionais, da Sociologia, da Antropologia, da Psicologia. Enfim, o silencio parece envolver a quest?o.

A aus?ncia de refer?ncias, estudos e pesquisas sobre um meio hospedagem t?o presente nas cidades brasileiras, instiga a que este sil?ncio seja visto com maior vagar, por ser significativo. Baldisserra (2002, P.165) escreveu que "expor ideias ? tamb?m expor-se; tentar apreender algo, concreto ou abstrato, ? ser apreendido por ele". E disse, ainda, que "experimentar o real parece sempre ser essa dial?tica que materializa rela??es, atra??es, permanentes influencias que implicam em transforma??es na e da complexidade dos elementos envolvidos no processo". (ibdem, P.165). A quest?o dos mot?is pode induzir nesse sentido, ou seja, ao enfoque clandestino associado a atividade e aqueles que utilizem seus servi?os, assim como ao seu tratamento acad?mico.

No Brasil, os servi?os prestados pelos mot?is estariam ligados ao exerc?cio da sexualidade humana. O tipo de utiliza??o n?o anula o fato de o motel ser uma empresa hoteleira, um meio de hospedagem com caracter?sticas comuns ao ramo hoteleiro, embora com alguma especificidades. A quest?o primeira que se coloca, portanto, para o acad?mico interessado no tema, ser? a de como encaminhar, tanto sua revis?o bibliogr?fica e como construir a metodologia de pesquisa. Se pautado em t?tulos sobre o fazer hoteleiro, centrados nas unidades tradicionais para depois, por compara??o e exclus?o de m?todos, aplic?-los ao novo objeto? A abordagem explorat?ria inicial da presente pesquisa, incluiu entrevistas informais com docentes de cursos de turismo e hotelaria, e mostrou que os mesmos n?o abordam a quest?o em seus planos de ensino ou nas aulas ministradas, corroborando o sil?ncio sobre a atividade.

Tais aproxima??es podem induzir a pensar-se que a aus?ncia de informa??es pode significar tanto que os mot?is s?o considerados desimportantes sob o ponto de vista da

sua gest?o, ou que seriam t?o iguais aos demais meios de hospedagem, que as teorias e praticas de administra??o e opera??o consagradas para estes, serviriam para aquele.

O mais prov?vel, entretanto, ? que a aus?ncia nos t?tulos que abordam a administra??o de empresas hoteleiras, signifique que os mot?is n?o s?o reconhecidos como tal. A aus?ncia nas publica??es que abordam o turismo, significaria que tamb?m n?o seriam considerados como suporte a este tipo de fen?meno social total. Parece existir uma esp?cie de limbo, no qual propriet?rios de motel se escondem e escondem suas empresas, seus funcion?rios e suas historias, e pior, com o apoio da sociedade, assim como com a participa??o, pela aus?ncia, dos profissionais da administra??o hoteleira e do turismo; e da academia, que n?o pesquisa ou pensa o fen?meno moteleiro.

2 AS ORIGENS DOS MOT?IS Como um novo tipo de meio de hospedagem, o primeiro motel do qual se tem

not?cia teria sido constru?do nos Estados Unidos, mais precisamente no munic?pio de San Luiz Obispo, na Calif?rnia, no ano 1925. (Waker, P.78). Idealizado pelo arquiteto Arthur Hineman, o hoje denominado Motel Inn foi constru?do em estilo Renascentista espanhol, com uma torre de tr?s pavimentos e pilares brancos. Era um empreendimento bastante luxuoso para os padr?es dos anos 1920, tendo sua constru??o custado em torno de 80 mil d?lares. (ibdem, P. 78)

Na ?poca, o trajeto de 320 quil?metros entre San Francisco e Los Angeles, demandava um percurso de quase 24 horas de viagem; San Luiz Obispo ficava a meio do caminho, entre as duas cidades Californianas. O posicionamento era ideal para a constru??o de um meio de hospedagem que oferecesse padr?es de servi?o diferenciados aos seus usu?rios, neste caso, viajantes percorrendo a estrada em ve?culo pr?prio, em traslado entre uma cidade e outra. Hineman, ent?o, projetou 41 bangal?s em torno de um p?tio, de forma que os hospedes pudessem deixar seus autom?veis em frente aos mesmos ou em uma garagem muito pr?xima. (Walker, P.78) O Milestone, como foi chamado por ocasi?o de sua abertura, surge ent?o como uma nova op??o, simples, pr?tica e barata, para quem precisava se hospedar pagando para tal, pre?os m?dios e com maior conforto do que nos camping.

A situa??o pol?tica e econ?mica vigente no per?odo, levava a que os carros passassem a fazer parte da vida americana, pois eram oferecidos a pre?os acess?veis ? classe m?dia. De posse dos carros, os americanos passam a viajar mais. A op??o por passar a noite em alguns dos primeiros mot?is - um conjunto de cabines separadas horizontalmente e tamb?m denominadas auto courts ou cabines tur?sticas, se fazia pela praticidade dos servi?os, instala??es e valores das di?rias, embora n?o oferecesse o status dos hot?is mais suntuosos. A praticidade referida mantem-se at? os dias de hoje, ou seja, deixou de ser necess?rio adentrar aos centros urbanos, evitando-se preocupa??es como as de percorrer locais desconhecidos, transito complicado e a consequente perda de tempo. Tempo este, necess?rio ao descanso dos viajantes.

Chon e Sparrowe (2003) tamb?m abordam o tema praticidade, quando lembram que as pessoas precisavam de pouca coisa al?m de um local para tomar banho, dormir e comer. "Os Motor-Hotel ofereciam menos comodidades e possu?am custos de constru??o e opera??o menores que os hot?is centrais. As tarifas mais baixas, as acomoda??es b?sicas, a localiza??o perto de rodovias e a inexist?ncia de um sagu?o central eram adequadas ao novo viajante de carro que queria descansar durante a noite". (p.92). Os motor-hotel s?o menos formais que os hot?is, dizem os autores, "os h?spedes normalmente carregam sua pr?pria bagagem e o estacionamento ? gratuito, frequentemente pr?ximo ao quarto do hospede". (ibdem, p.92). Observe-se que os autores fazem referencia a inexist?ncia de sagu?o central que era, e ainda ? nos dias de hoje, o local de circula??o dos hospedes nos hot?is.

Geralmente situado em frente ao balc?o da recep??o, o sagu?o de um hotel ? passagem obrigat?ria para todos os que est?o hospedados, para os que participam de eventos em salas locadas e ainda para os demais clientes e fornecedores de servi?os. Precisa-se computar aqui tamb?m, que muitos dos funcion?rios do hotel s?o obrigados a percorrer ou permanecer no sagu?o no decorrer de suas atividades profissionais. Em suma, o sagu?o do hotel ? um local p?blico de passagem e local de espera. ? local de encontros e, se n?o a principal, uma das principais ?reas sociais dos meios de hospedagem. ? um local para ver e ser visto e, em decorr?ncia, ? o lugar dos rituais de hospitalidade.

Portanto, a inexist?ncia deste local nos mot?is, diz respeito n?o s? a praticidade, em termos de n?o precisar estar em trajes mais formais para apresentar-se. Mas tamb?m representa privacidade, para quem n?o desejar dispender o tempo necess?rio a socializarse. A n?o exist?ncia de sagu?o e a passagem do hospede direto para a unidade habitacional, o tornaria quase invis?vel aos olhos de todos que frequentam o sagu?o, o que pode sugerir tamb?m, a presen?a do anonimato. Walker (2002) pondera que, pelo fato de n?o existir realeza no Novo Mundo, os hot?is adquiriram o car?ter de "pal?cios para o povo":

Cada novo hotel que aparecia apresentava um novo desenho arquitet?nico, grandiosos sagu?es, sal?es de baile e outras comodidades para seus hospedes ? como elevadores, por exemplo, que apareceram pela primeira vez em 1859, no Fifth Avenue Hotel de Nova York. (WALKER 2002, p.79)

O mot?is surgem, ent?o, nas primeiras d?cadas dos s?culo XX, sem o contexto de pal?cio, como abordado por Walker, com o objetivo de atender aqueles que ou n?o desejassem o status advindo de uma estada em um hotel altamente requintado no centro urbano, ou n?o pudessem pagar por ela.

Apesar do desenvolvimento da ind?stria automobil?stica ter incrementado o setor de hospedagem nos anos 1920, a Grande Depress?o se fez presente, levando muitos hot?is ? fal?ncia. Institui??es financeiras passaram a negar atendimento ao setor, depois que os hot?is passaram a negligenciar o pagamento de suas hipotecas durante os anos 1930. A recupera??o s? se deu com a segunda grande guerra mundial, quando hot?is eram constru?dos para hospedar americanos que participavam do esfor?o da guerra. (CHON E SPARROWE, 2003, p.92)

Para Walker (2002, p. 79), o autom?vel provocou uma verdadeira onda de constru??o de hot?is e mot?is nos anos de 1940, 1950, e 1960 quando os norte americanos come?aram a percorrer as auto estradas e estes estabelecimentos se desenvolveram para atender a demanda por acomoda??es. Tamb?m segundo este autor, a primeira empresa a explorar o mercado de pre?o m?dio foi a Holiday Corporation, com seus mot?is (inns ou motor-hotels), constru?dos fora das caras zonas urbanas e perto de importante cruzamentos rodovi?rios nos sub?rbios. Nestes locais os custos de constru??o eram um tanto mais razo?veis.

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