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Índice

A CIÊNCIA CONSTRÓI ATLETAS 3

OBJETIVO 4

Celafiscs 4

Características Corporais 4

Falta de Fôlego 5

Decompondo Combustíveis 5

Ácido Lático 5

SANGUE E OXIGÊNIO 6

Evolução do Preparo Físico 6

Enzimas 7

A Estratégia Corporal 7

Biomecânica 8

1. ANTROPOMETRIA 8

2. Eletromiografia 8

3. Dinamometria 8

4. Cinemetria 8

Características Psicofisiológicas 8

COMENTÁRIOS 9

AS DIFERENÇAS ENTRE UM BRASILEIRO COMUM, UM MARATONISTA E UM VELOCISTA 9

Americanos 9

Brasileiros 9

Maratonista 10

Velocista 10

Ao alcance dos mortais 10

100 METROS 10

SALTO EM ALTURA 11

SALTO EM DISTÂNCIA 11

400 METROS NADO LIVRE FEMININO 11

SALTO COM VARA 11

Futebol 12

A CIÊNCIA DO TETRA 12

PARA TER SAÚDE DE ATLETA 12

A hora certa, para entrar no campo 12

Cada um na sua 13

Correndo mais do que antes 13

A luta contra o tempo 13

Quem se machucar, vai para a piscina 13

Vamos suar a camisa 13

Microfibra 14

Fibra de poliéster 15

Cabeça de estrategista 15

Técnico da Seleção 15

1860 15

1930 16

1954 16

1962 16

1974 16

1994 16

A sorte está lançada 16

Da lousa para o computador 17

A CIÊNCIA MANDA PEGAR LEVE 18

UM BRASIL DE MIL FORMAS E VAIDOSO 18

DERRETENDO A GORDURA 19

Os aparelhos definem os músculos 19

Quando a Genética é o limite 19

Vem aí o Wellness 20

Comentários 20

SUOR ATÉ DEBAIXO D’ÁGUA 20

Uma olhada no corpo submerso 21

Os músculos das coxas fazem mais força do que na corrida fora da água. 21

Basta se mexer no dia-a-dia 21

A força que vem das massas 21

Ficar parado é mesmo o maior perigo 22

Infarto 22

Câncer 22

Derrame 22

A MÁQUINA DO ETERNO MOVIMENTO 23

VIVER É MESMO UMA GINÁSTICA 23

FORMA E O TAMANHO DO MÚSCULO 23

Ordem Dada ao Músculo 25

Adenosina trifosfato (ATP) 25

Ossos 26

Comentários 26

O MELHOR DA MALHAÇÃO 26

Bibliografia 27

PARA SABER MAIS: 27

Esportes e Alimentação

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A CIÊNCIA CONSTRÓI ATLETAS

Por Fátima Cardoso e Lúcia Helena de Oliveira - revista SuperInteressante

A corrida atrás de medalhas leva esportistas aos laboratórios. Fisiologia do esforço, biomecânica, psicologia, tudo vale na luta por centímetros ou décimos de segundo.

A garota espevitada com jeito de moleque só queria saber de jogar handebol, pois adorava marcar gols. Nem mesmo o grupo de pesquisadores que apareceu em seu colégio, e descobriu uma força fenomenal nas suas pernas de 12 anos, a fez mudar de idéia. Handebol, diziam eles, era um desperdício de talento, já que a potência privilegiada daquelas pernas faria da garota uma ótima velocista ou jogadora de basquete. A paixão por marcar gols, no entanto, falava mais alto do que uma cesta. Foram necessários muitos conselhos de uma grande jogadora de basquete da época, Norma de Oliveira, a Norminha, para que a menina enfim resolvesse se aventurar em jumps e bandejas. O basquete brasileiro ganhou assim Hortência, uma das maiores jogadoras que já pisaram quadras em todo o mundo.

Assim como pode descobrir, entre meninos e meninas aparentemente iguais, quem deles tem corpo e jeito para se transformar num grande atleta, a ciência do esporte evolui a cada dia na arte de lapidá-los. Se o extraordinário negro americano Jesse Owens conquistou quatro medalhas na Olimpíada de Berlim, em 1936, na casa e na cara de Adolf Hitler, o fez simplesmente graças a seus músculos e talento. Às vésperas do Pan-Americano em Cuba e das Olimpíadas de Barcelona 92, os atletas, para subir ao podium, não dependiam apenas de exaustivos treinamentos dirigidos por seus técnicos, mas de minuciosos testes conduzidos por cientistas. É um trabalho requintado, a ponto de se prever como as fibras musculares irão conseguir energia em cada etapa de uma prova, ou em que segundo exato o atleta ficará cansado.

Objetivo

O objetivo é sempre um só — rendimento máximo. Antes de se construir um ganhador de medalhas, porém, é preciso saber garimpar a melhor matéria-prima.O Brasil, um país de poucos campeões olímpicos ao longo de sua história, tem um trabalho um tanto artesanal para detectar talentos para o esporte. Um deles foi elaborado pela equipe do Centro de Estudos e Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul (SP), o Celafiscs.

Celafiscs

Há dezesseis anos, o Celafiscs vem aplicando a estratégia Z, um modelo matemático que compara os dados de 15 000 pessoas de ambos os sexos e diversas faixas etárias aos de atletas de elite. É possível perceber, assim, o que um atleta tem que nós não temos. Com base nesses números, sabe-se por exemplo quanto um jogador de vôlei como Xandó salta acima da média da população. "Se um garoto de 14 anos tiver uma impulsão proporcionalmente tão boa, em relação aos outros da sua idade, é provável que se torne um bom jogador de vôlei", diz o médico esportivo Victor Matsudo, diretor do Celafiscs. É claro que boas pernas não bastam para prever que um garoto será um atleta de alto nível. Outras variáveis pesam, como coordenação motora, velocidade e até vontade treinar.

Características Corporais

As características corporais são tão importantes que, conhecendo-se quais são elas, é possível farejar um campeão. Foi o caso do judoca Aurélio Miguel, medalha de ouro na Olimpíada de Seul em 88. Aurélio possui não só uma circunferência de braço excepcional, como parece óbvio para um judoca, mas também um ótimo fôlego, que fez a diferença não tão óbvia a seu favor na final. "Esse é o segredo de Aurélio Miguel", revela Victor Matsudo. "Embora as lutas de judô durem só cinco minutos, ele lutou quatro vezes naquela noite em que ganhou a medalha. Vence a final quem tem resistência para chegar à última luta em condições físicas quase tão boas quanto as da primeira"Detalhes como esse são a diferença entre o campeão e o vice. Para poder conhecer o organismo de um atleta e saber onde ele deve ser trabalhado, fisiologistas se valem de uma parafernália de laboratório com a qual desvendam a intimidade de um corpo em movimento. Um organismo nunca está em estado normal quando corre, pula, luta ou salta, já que todo exercício físico é uma sobrecarga ao corpo, provocando alterações bioquímicas, cardiorrespiratórias e musculares. Essas alterações fisiológicas indicam que a questão prioritária do corpo é obter energia para conseguir se manter em esforço.

Falta de Fôlego

Se um atleta se cansa antes de a prova ou de o jogo terminar, os fisiologistas do esforço, analisando tais alterações, determinam com alto grau de precisão a causa da fadiga em hora imprópria. O corpo vai buscar essa energia em três fontes. A primeira é usada apenas em casos de emergência, porque dura pouco e vem das moléculas de ATP armazenadas nas células. O ATP é uma espécie de bateria que está ali justamente para liberar energia rapidinho. Todo mundo usa ATP quando, sentado, levanta-se e começa a andar. Nos primeiros dois ou três segundos, o corpo usa o ATP armazenado, depois parte para a segunda forma de obtenção de energia, a transformação da glicose presente no sangue e nos músculos em mais ATP. Um velocista como Carl Lewis, na competição dos 100 metros rasos, que dura menos de 10 segundos para quem chega na frente, não tem tempo sequer para transformar a glicose.Se em lugar de Carl Lewis estiver na pista o brasileiro Joaquim Cruz, especialista na prova dos 800 metros, seu corpo vai, depois dos momentos iniciais, entrar no terceiro jeito de conseguir força para continuar correndo. O método agora é decompor combustíveis energéticos, como gorduras, carboidratos e proteínas, para ter como resultado gás carbônico, água e principalmente energia. Para que esse processo aconteça, é necessária a presença do oxigênio, que vai "queimar" os combustíveis.

Decompondo Combustíveis

O cenário dessa reação é a mitocôndria, uma organela em formato de feijão que existe às centenas em cada célula e faz o papel de uma usina. Enquanto o atleta respira fundo e suas células consomem oxigênio, ele está na chamada atividade física aeróbia. "Essa é a forma mais eficiente de um corpo conseguir energia, pois os músculos trabalham melhor e durante mais tempo", conta Carlos Eduardo Negrão, fisiologista da Escola de Educação Física da Universidade de São Paulo e integrante da Seleção brasileira de vôlei no inicio dos anos 70. O único inconveniente desse sistema é a semelhança com o carro a álcool: demora a esquentar. As usininhas celulares só começam a produzir energia a pleno vapor depois de alguns minutos do corpo em esforço.Porém, se por algum motivo o oxigênio inspirado pelo atleta não é suficiente para permitir a queima dos combustíveis, seu organismo apelará para a atividade anaeróbia. É a repetição do segundo estágio, quando a glicose é transformada em ATP, e é aqui que começam os problemas. Embora tenha a vantagem de proporcionar energia rapidamente, o que se torna necessário quando o corpo precisa de mais força do que as mitocôndrias são capazes de gerar, a atividade anaeróbia tem um efeito colateral — o ácido lático.

Ácido Lático

Temida por atletas, técnicos e preparadores físicos, essa substância, sobra da decomposição da glicose, impede a contração muscular, provoca dores e, o que é pior, deixa o sangue ácido.Atrapalhando a produção de elementos bioquímicos que fazem cada fibra muscular se dobrar (por troca de cargas elétricas), e além disso irritando sensores nervosos da dor, o ácido lático leva o troco do corpo. O contra-ataque vem na forma de uma série de bicarbonatos, que o transformam em água e gás carbônico. Isso resolve o problema dos músculos, mas não o do sangue. Acontece que o gás carbônico continua a aumentar a acidez sanguínea, um verdadeiro desastre para o bom funcionamento das células, especialmente as nervosas. Tamanho seria o estrago provocado pelo sangue ácido, que existem células na carótida e na aorta, as duas maiores artérias do corpo humano, encarregadas exclusivamente de vigiar o seu pH (indicador de acidez). Assim, quando o sangue se torna ácido, essas sentinelas nervosas advertem o cérebro para tomar as devidas providências. "A respiração torna se então acelerada e o atleta fica ofegante", diz Negrão. "Mas isso não ocorre porque seus músculos pedem mais oxigênio, como pode parecer à primeira vista, e sim porque é necessário expulsar o excesso de gás carbônico", explica. Esse momento é flagrado em laboratório quando um atleta, pedalando ou correndo numa esteira rolante, é ligado a um aparelho computadorizado que desenha gráficos coloridos. Neles, Negrão acompanha alterações, como freqüência cardíaca, volume de ar respirado, consumo de oxigênio e volume de gás carbônico expirado. Esse aparelho — só existem dois no Brasil — revela particularidades fisiológicas impossíveis de ser detectadas sem ele. Às vezes, um atleta tem uma ventilação adequada, ou seja, respira um volume ideal de ar. "No entanto, ao calcular a pressão dentro dos pulmões, o aparelho indica se aquele atleta está levando para o sangue todo o oxigênio que inspirou", avalia Negrão.

Sangue e Oxigênio

Mesmo que seu sangue receba montes de oxigênio, ele tem ainda outro limite, conhecido como VO2, que determina o volume máximo desse gás que suas células conseguem transformar em energia.Em outro exame importante, uma única gota de sangue do atleta retirada do lóbulo da orelha ou da ponta do dedo, é colocada num aparelho que indica a quantidade de ácido lático. Somada essa informação aos dados do gráfico, sabe-se em que momento o atleta passou a recorrer ao processo anaeróbio, ou seja, cansou — e isso costuma acontecer um pouco antes de seu organismo alcançar o chamado limiar aeróbio, o consumo máximo de oxigênio. É nesse ponto do esforço que o atleta deve trabalhar durante os treinamentos. Se passar desse limite, seu corpo não agüentará; se ficar abaixo dele, pode gastar horas correndo nos treinos, mas sua condição física não sairá do lugar.

Evolução do Preparo Físico

No caminho que leva uma promessa de campeão até o podium, contudo, a evolução do preparo físico chega na melhor das hipóteses a 20%. Por isso, é inútil preparar um maratonista para disputar uma Olimpíada se o seu consumo máximo de oxigênio é 60 mililitros por quilo por minuto. O fisiologista Antonio Carlos Silva, da Escola Paulista de Medicina, que há quinze anos se dedica à avaliação de atletas, deparou com esse caso. "Um treinamento de êxito condicionaria aquele maratonista a consumir 72 mililitros por quilo por minuto, quando sabemos que um maratonista de nível internacional supera 75", lembra Silva. O brasileiro em questão estaria derrotado antes mesmo do tiro de largada.

Nem sempre, porém, a capacidade de consumir oxigênio é o fator limitante da performance. Um atleta pode consumir mais oxigênio do que outro, mas. seu adversário talvez demore mais tempo para fabricar ácido lático, um freio para os músculos, que começa a ser liberado antes de o organismo esgotar suas possibilidades de buscar energia no oxigênio. Na arrancada final embora tenha menor capacidade aeróbia, o adversário tem menos acidez no sangue e está menos cansado— o que pode se traduzir em vitória. Por isso, o objetivo do treinamento pode ser empurrar o início da produção de ácido lático cada vez mais para perto da linha de chegada, se possível para além dela.Vários motivos podem atrasar a entrada do ácido lático na jogada.

Enzimas

Parte do ácido é transformada nos próprios músculos em substâncias inofensivas. Esse processo pode ser acelerado por algumas enzimas, cuja produção será tanto maior quanto mais o músculo for requisitado. "Existem evidências, porém, de que a capacidade de gerar enzimas também é determinada geneticamente", observa Antonio Carlos Silva. Portanto, já do berço, algumas pessoas trazem essa marca de atleta. No treinamento, a repetição interminável de movimentos em determinados músculos tem no retardamento da produção de ácido lático a razão de ser. Numa tentativa de atender à demanda implacável, as mitocôndrias das células se multiplicam.

Resultado: a capacidade de gerar energia com oxigênio aumenta. Como se não bastasse, doses cada vez maiores desse gás são servidas aos músculos. Isso porque o desenvolvimento muscular é acompanhado pelo crescimento de minúsculos vasos capilares, que levam sangue oxigenado a domicílio. Na comparação do fisiologista Silva, "é como se as fibras musculares ganhassem um sistema de transporte de entrega rápida". Além disso, o exercício constante amplia as câmaras do coração do esportista. Isso aumenta o que os cientistas chamam de déficit cardíaco, o volume de sangue bombeado pelo coração em cada batimento. No auge do esforço, a freqüência cardíaca de um atleta em relação a uma pessoa sedentária, do mesmo sexo e idade, deve ser muito parecida, mas o coração bem treinado empurra muito mais sangue de uma só vez.

Moral da história: o músculo do atleta aproveita mais o oxigênio, que chega em quantidades maiores e num tempo menor.

A Estratégia Corporal

Retardar a produção do ácido lático, porém, não é a estratégia ideal para todas as modalidades esportivas. Isso é muito bem adequado às atividades que exigem resistência, chamadas aeróbicas, como as provas de fundo em atletismo, natação ou ciclismo, e as partidas de basquete, vôlei ou futebol. Nos músculos desses atletas predominam as fibras lentas, que se contraem sem muita força, mas agüentam um trabalho prolongado. Já provas anaeróbicas, como os 100 metros rasos e saltos e arremessos no atletismo, ou ainda levantamento de peso, que exigem mais força do que movimento, dependem da capacidade dos músculos de estocar energia na forma de glicose. E ela o combustível preferido pelas fibras musculares rápidas, que se contraem com muita força, mas se cansam facilmente.

Fica patente que os atletas são feitos sob medida para seu esporte. Enquanto os que precisam de resistência são preparados para chegar ao fim da prova ou do jogo antes que o cansaço os alcance, os que dependem da força são treinados para ganhar massa muscular, a fim de ter maior reserva de energia. Mas no esporte de alta performance, onde centímetros ou centésimos de segundo valem a vitória, os talentos naturais pouco valem se não forem levados ao limite pela ciência do esporte. Nem adianta apenas treinar, o que na opinião de Valdir Barbanti, professor da USP e preparador físico da Seleção brasileira de basquete, é simplesmente uma repetição dos movimentos certos. Se o atleta os fizer de forma errada, não evolui.

Biomecânica

É por esse motivo que há cerca de trinta anos se desenvolve outra forma de trabalhar esportistas de alto nível, a biomecânica. Ao contrário da fisiologia, que investiga as mudanças por dentro do corpo, a biomecânica se preocupa com os aspectos externos, ou os movimentos e comportamento dos músculos durante uma competição.

1. Antropometria

O ponto de partida é a antropometria, um cálculo da massa corporal segundo um modelo matemático que serve para determinar, entre outros parâmetros, o centro de gravidade do corpo — um dado fundamental quando se estuda movimento.

2. Eletromiografia

Mais complicada é a eletromiografia, uma técnica que permite ao pesquisador da biomecânica saber quais os músculos ativos em cada passo de um atleta. Como o músculo se contrai por troca de cargas elétricas, é possível saber se ele está em repouso ou fazendo força com o eletromiógrafo, um aparelho ligado ao corpo que capta a freqüência desse sinal elétrico. O eletromiógrafo envia o sinal a um computador e tem-se como resultado um gráfico com linhas semelhantes ao de um eletrocardiograma.Fundador do recém-criado laboratório de biomecânica da Educação Física da USP, o professor Alberto Carlos Amadio exemplifica a aplicação da eletromiografia ao estudo do salto triplo: "Sabendo quais músculos das pernas um triplista ganhador de medalhas usa em cada fase do salto, e quais ele deixa inativos, temos um modelo da ação dos músculos num salto ideal". Um atleta que aparentemente faz o movimento certo, mas deixa contraídos músculos que deveria relaxar, ou vice-versa, é flagrado em erro por esse método.

3. Dinamometria

A terceira área da biomecânica é a dinamometria, o estudo das forças de reação do solo ao impacto do corpo. Ela é medida pela plataforma de força, uma placa de aço sustentada por quatro pequenos aparelhos sensíveis a pressão. Ligada também a um computador, a plataforma dá os gráficos de três forças toda vez que alguém pisa ali: vertical, para baixo; horizontal, no sentido do movimento; transversal, lateralmente ao movimento.

4. Cinemetria

Por fim, a cinemetria analisa a posição das partes do corpo no espaço. Isso é feito com câmaras de vídeo ou filme, que registram imagens posteriormente digitalizadas e passadas a um computador.

Características Psicofisiológicas

A rotina de treinos e competições sobrecarrega não só o físico de um atleta, mas também sua cabeça. O preparo psicológico, por isso, cada vez mais decide o jogo a favor de quem o tem. Ele se resume a características psicofisiológicas treináveis como músculos:

atenção,

concentração,

percepção,

memória,

pensamento,

sentimentos e

emoção.

As técnicas são variadas, desde pedir a um jogador de tênis que fixe o olhar numa bolinha por cinco minutos, até criar num jogador o hábito de visualizar a partida desde o dia anterior para entrar na quadra psicologicamente "aquecido"."A preparação psicológica é tão importante quanto a física", garante a psicóloga Regina Brandão, coordenadora do setor de psicologia do Celafiscs. "Nenhum atleta perde condicionamento físico de repente - somente a variável psicológica afeta a performance de um dia para o outro", constata. Numa Olimpíada, em que os competidores disputam várias provas eliminatórias e depois as finais, a cabeça precisa estar em ordem todo o tempo, por vários dias. Não é à toa que a normalmente inabalável frieza dos atletas soviéticos e dos países do Leste europeu os levou muitas vezes ao topo do podium - a tradição da psicologia aplicada ao esporte, na União Soviética. é centenária.Nenhum adversário conseguiu derrotar os gélidos atletas da antiga Cortina de Ferro como seu próprio destino histérico, o fim dos governos socialistas. "Quando ruiu o sistema político, ruiu o sistema científico-esportivo sustentado por ele", analisa Alberto Carlos Amadio, que estudou por cinco anos na Universidade de Colônia, na Alemanha. O modelo mais eficiente de fabricação de medalhistas de ouro foi levado a cabo pela ex-Alemanha Oriental com o Instituto de Leipzig, uma fábrica de esportistas finamente talhados por mais de 600 pesquisadores, que hoje está às moscas. "Com o fim da guerra fria entre Ocidente e Oriente, as perguntas que se fazem agora são: para onde vai o esporte de alto nÍvel, e para que somar medalhas numa Olimpíada?", especula Amadio.

Comentários

As diferenças entre um brasileiro comum, um maratonista e um velocista

Apresentaremos o perfil de aptidão física de brasileiros do sexo masculino entre 20 e 22 anos de idade. Se fossem atletas dos Estados Unidos, tudo seria diferente.

Americanos

Os americanos pesam em média 72,62 quilos;

A balança chega a apontar 83,97 quilos no caso dos velocistas, e isso pode ser uma vantagem, pois a modalidade exige uma grande massa muscular.

Já o maratonista americano pesa apenas 61,27 quilos em média, quase dois quilos a menos que o brasileiro. Outro ponto para os corredores dos Estados Unidos: na maratona, os mais leves costumam chegar primeiro.

Brasileiros

peso: 63,74 quilos

altura: 1,70 metro

média das dobras cutâneas (gordura): 7,61 centímetros

consumo máximo de oxigênio 44,58 ml/kg/min

potência anaeróbia: 261,97 metros

potência das pernas (impulsão vertical): 33,13 centímetros

pressão manual: 73,73 quilos

velocidade (50 metros): 7s64

volume máximo de sangue bombeado: 20 litros por minuto

freqüência cardíaca no repouso: 70 batimentos por minuto

Maratonista

peso: 63,05 quilos

altura: 1,74 metro

média das dobras cutâneas 5,61

consumo máximo de oxigênio: 77,26 ml/kg/min

potência anaeróbia: 304,08 metros

potência das pernas: 37 centímetros

pressão manual 46,43 quilos

velocidade (50 metros): 7s26

volume máximo sangue bombeado: 35 litros por minuto

freqüência cardíaca no repouso: 45 batimentos por minuto

Velocista

peso: 67.64 quilos

altura: 1,75 metro

media das dobras cutâneas: 5,79 centímetros

consumo máximo de oxigênio: 59,41 ml/kg/ min

potência anaeróbia: 324,11 metros

potência das pernas: 37,65 centímetros

pressão manual: 50 quilos

velocidade (50 metros): 6s64

volume máximo de sangue bombeado: 25 litros por minuto

freqüência cardíaca no repouso: 55 batimentos por minuto

Ao alcance dos mortais

Fabricar superatletas não é a única missão dos laboratórios de fisiologia do esforço. Ao trabalhar também com quem só se mexe por esporte os cientistas estabelecem parâmetros de atividade física para pessoas tão diferentes como crianças, idosos, mulheres grávidas, diabéticos. "Ginástica não faz bem da mesma maneira para todo mundo", adverte o fisiologista Antonio Carlos Silva. Assim como os atletas, cidadãos comuns, quando treinam menos do que o ideal, não têm benefício algum.

Porém, ao fazer esforço demais, o atleta costuma parar por causa do cansaço, que literalmente trava seus músculos. "Quem não tem o mesmo preparo físico talvez não sinta nada ao cometer excessos, mas seu organismo sempre sofre algum dano", comenta Silva. Por isso, os mesmos exames realizados nos superatletas são repetidos em gente normal, para também se conhecer entre essas pessoas os limites individuais de esforço. Isso fornece subsídios a médicos e professores de educação física para que não exijam de cada pessoa mais — ou menos — do que seu organismo pode suportar.

100 METROS

Recorde atual: 9s92 (Seul, 24/9/88)

Limite estimado: 9s58

Recordista: Carl Lewis (Estados Unidos)

Avanços tecnológicos, como tênis mais leves, contribuem para superar marcas em modalidades que exigem velocidade. Apesar disso, a grande responsabilidade de recordes está nas pernas dos atletas. Além de possuírem uma proporção maior de fibras musculares rápidas, velocistas devem ter passada larga. Atletas pernaltas devem quebrar o recorde atual em alguns décimos de segundo.

SALTO EM ALTURA

Recorde atual: 2,44 m (San Juan, 29/7/89)

Limite estimado: 2,72 m

Recordista: Javier Soto Mayor (Cuba)

Um excelente salto em altura é uma mistura de força, destreza e estatura. Vários recordes têm sido quebrados porque os atletas são cada vez mais técnicos e mais altos. No entanto, a força das pernas não tem acompanhado esse crescimento. Se os futuros atletas, além de mais altos, também tiverem pernas mais robustas, o recorde atual poderá ser superado em até 13 centímetros.

SALTO EM DISTÂNCIA

Recorde atual: 8,90 m (Cidade do México, 18/10/68)

Limite estimado:10,32 m

Recordista: Bob Beamon (EUA)

No salto em distância, quanto mais alto você salta, mais tempo você fica no ar; quanto mais veloz é a decolagem, maior é a distância que se percorre antes de tocar o pé no solo. Atletas mais velozes terão mais facilidade para combinar esses fatores e conseguir ângulo ideal, repetindo — ou superando — o espetáculo de Bob Beamon.

400 METROS NADO LIVRE FEMININO

Recorde atual: 4min03s85 (Seul, 22/9/88)

Limite estimado: nenhum

Recordista: Janet Evans (EUA)

Poucas provas têm mostrado tanto progresso quanto as de natação feminina. O número de nadadoras de elite cresce, O treinamento é mais aperfeiçoado e surgem novidades, como piscinas que diminuem a formação de ondas. Pela performance das atuais nadadoras, há quem acredite que, no futuro, elas irão superar os recordes masculinos.

SALTO COM VARA

Recorde atual: 6,06 m (Nice, 10/7/88)

Limite estimado: 7,82 m

Recordista: Sergei Bubka (URSS)

O aparecimento de varas de fibra de vidro, substituindo as de alumínio e bambu, fez a curva de recordes ascender drasticamente. Afinal, a vara de fibra de vidro é como uma catapulta, que aproveita a energia do atleta, enquanto ele corre, e o impulsiona para cima. Mas alguma energia se perde em vibração - o atleta que evitar essa dispersão pulará mais alto.

Futebol

A CIÊNCIA DO TETRA

Por Lúcia Helena de Oliveira, Thereza Venturoli, Guilherme Cunha Pinto, Fátima Cardoso e Flávio Dieguez

No condicionamento, testes físicos ultraprecisos. No uniforme, fibras de alta tecnologia. Na tática, esquemas computadorizados. O Brasil faz do futebol-arte o futebol-ciência e aumenta suas chances na Copa.

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No dia 20 deste mês, o Brasil estréia na Copa do Mundo. Começa a escalada para o tetra, e ela não será construída só com talento e raça. No novo mundo cibernético do esporte, o condicionamento físico é feito individualmente com a ajuda de sonares e câmeras de vídeo. Os músculos são modelados para dar máxima eficiência em velocidade e força, e o metabolismo, preparado para aproveitar toda a energia do corpo. Hoje, uma camisa consegue aumentar em 15% o desempenho do atleta. O rendimento do jogador em cada décimo de segundo é analisado e depois potencializado pelos treinadores. No campo da tática, os computadores ajudam a antecipar os movimentos do adversário. Mais do que nunca, a ciência vai entrar em campo. E vai fazer gols.

Para ter saúde de atleta

Em busca da máxima performance, os treinos são baseados nos resultados dos mais modernos testes físicos.

Como nenhum outro técnico da Seleção Brasileira, Carlos Alberto Parreira pode dizer que conhece exatamente o que é capaz de render cada jogador de sua equipe. Ele não acha — sabe. Pela primeira vez, a CBF autorizou a realização de testes para mapear o funcionamento do organismo de cada atleta, durante o esforço da partida. Basicamente, está se monitorando o que os leigos chamam de fôlego, velocidade e força. "Todo jogador deve estar em excelente forma nesses três aspectos", explica o professor Turíbio Leite, do Centro de Medicina da Atividade Física e do Esporte, na Escola Paulista de Medicina. "Mas uma dessas qualidades deve ser preponderante, conforme a posição no time."

Um atacante, por exemplo, precisa chutar a bola com força. "O Parreira poderá fazer a escalação em cima dos resultados dos exames", especula o médico Osmar de Oliveira, vibrando de entusiasmo. "Do ponto de vista físico, será possível escolher quem estiver melhor entre os atacantes. Mas, claro, a parte técnica também conta." Os exames não apontam apenas os que têm mais fôlego — mostram também se o jogador estará em sua melhor forma aos 20 ou aos 30 minutos de partida. É uma referência para analisar o desempenho em certo instante do jogo — uma grande novidade em termos de preparação física. Mas há, ainda, outras estratégias para se chegar ao tetra.

A hora certa, para entrar no campo

A batelada de testes não mostra somente a quantas anda o fôlego ou a força do atleta. Acusa, ainda, durante quanto tempo ele consegue manter o máximo desempenho em cada um dos três aspectos. Pode ser que um jogador com excelente condição técnica não consiga dar tudo de si por mais de quarenta minutos. Sabendo disso, Parreira poderá programar substituições, sem esperar que ele comece a cometer falhas — algumas fatais — para retirá-lo do campo. É bom lembrar que as regras do jogo mudaram: agora, serão permitidas três substituições por partida, em vez de duas, como no passado.

Cada um na sua

"Condicionamento em grupo está fora de moda", decreta o preparador físico da Seleção, Moraci Sant'Anna. Os treinos de táticas continuam em equipe, lógico. Mas o treinamento físico deve ser individual, respeitando as diferenças de cada organismo. Em outras copas, nas quais foi preparador, Moraci pedia ao grupo para correr 15 quilômetros diariamente. Hoje, tem jogador na concentração brasileira correndo 12 quilômetros por dia e jogador que chega a correr 17. "Na verdade, ambos estão treinando na mesma intensidade", diz o médico Turíbio Leite, da Escola Paulista de Medicina. "Simplesmente, para aquela pessoa que está correndo menos, os 15 quilômetros estipulados no passado eram um enorme esforço. Então, em vez de condicioná-lo, o treino deixava o seu corpo cansado. E esse cansaço aparecia no dia do jogo." Quanto ao jogador que atualmente corre 17 quilômetros, antes ele treinava menos do que sua capacidade. Portanto, não atingia seu melhor desempenho.

Correndo mais do que antes

Calcula-se que, na Copa de 70, os jogadores percorriam de 5 a 6 quilômetros durante uma partida. Hoje, essa distância dobrou. O futebol, sem dúvida, é muito mais veloz do que no passado. A fim de conhecer a velocidade dos jogadores, Moraci Sant'Anna está usando uma câmara de vídeo para gravar o atleta percorrendo 60 metros. O filme é analisado por computador, que faz a leitura quadro a quadro para ver quantos metros o jogador avança, em cada segundo.

A luta contra o tempo

Muito torcedor está aflito — afinal, a Seleção só tem cerca de trinta dias para treinar. "Isso é menos do que em outras copas, quando tivemos em média 45 dias", lamenta Moraci Sant'Anna. Dentro dos limites, no entanto, é possível se fazer muita coisa. O atacante Müller, por exemplo, pode aumentar a sua velocidade em 1 décimo de segundo. Será que isso faz diferença? Faz muita diferença. Müller está correndo 10 metros por segundo. Feitas as contas, em 1 décimo de segundo, ele corre 1 metro — talvez a distância entre o atacante e o adversário, dando à Seleção a chance do gol.

Quem se machucar, vai para a piscina

Não será folga e, sim, hidroginástica. Esta é outra nova arma da Seleção. "Antes, o jogador machucado ficava dez a vinte dias parado", lembra Sant'Anna. "E, com isso, perdia a forma." Nesta Copa, se um dos jogadores distender um músculo, ele ficará sem treino durante dois ou três dias no máximo — tempo suficiente para desaparecerem os hematomas. Então, cairá numa piscina com mais de 2 metros de profundidade (para não tocar os pés no chão), usando uma cinta flutuadora. Daí, dentro da água, poderá correr e fazer os exercícios de costume, mantendo-se preparado para voltar ao campo. Mas tomara que nenhum jogador precise dar esse mergulho.

Vamos suar a camisa

Na era high tech, nem a transpiração do atleta escapa ao controle. E novos tecidos revolucionários podem pesar no placar final

O suor é um dos principais mecanismos do corpo para manter o equilíbrio térmico. Ao executar um grande esforço, o coração acelera, bombeando mais sangue e, assim, oxigenando mais os músculos. A energia gerada provoca um superaquecimento que pode chegar a 39,5oC. Para manter seus 36oC ou 37oC normais, o corpo aciona a transpiração. Na pele, em contato com o ar, o suor rouba calor do organismo para a evaporação, regulando a temperatura.

A roupa usada para a prática de esportes é peça importante nessa engrenagem de controle de calor. Um uniforme de tecido pesado, que dificulta a evaporação do suor, super-aquece o organismo e causa o chamado desconforto térmico. Mais do que no bem-estar do atleta, o conforto influi no desperdício ou no bom aproveitamento de energia. Sem exagero: a escolha de fibras e tecidos pode ser decisiva para a conquista da Copa.

"Quanto menor a pulsação do jogador, maior a energia canalizada para melhorar seu desempenho", explica o fisiologista Turíbio Leite, do Centro de Medicina da Atividade Física e do Esporte, da Escola Paulista de Medicina. Turíbio coordenou o teste que comparou três tipos de camisa — de algodão, de poliéster convencional e de microfibra de poliéster. Por três dias, em março passado, oito jogadores correram 6 quilômetros em 36 minutos, vestindo alternadamente os três tipos. Resultado: com a microfibra, a pulsação média caiu 3,5%. "Isso representa um aumento da ordem de 15% na potência do atleta", completa o fisiologista. Comparando: enquanto o jogador com camisa de poliéster convencional desperdiça energia pelo suor, outro, com a de microfibra, tem 15% de energia a mais para correr atrás da vitória.

O funcionamento desse tecido revolucionário é fácil de entender. A transpiração é absorvida pelas fibras mais grossas do avesso e passa para o direito. "Do lado de fora, estão as microfibras, que aumentam a área de contato do suor com o ar, facilitando a evaporação", diz José da Conceição Padeiro, da área de fibras têxteis da Rhodia, fabricante da microfibra Setila.

Microfibra

Difícil é entender por que a Confederação Brasileira de Futebol não providenciou um uniforme com essa microfibra. Na verdade, e infelizmente, a Seleção deve entrar em campo, pelo menos na primeira fase, com as camisas de poliéster tradicional. "Não haveria tempo de confeccionar uma nova coleção", explica Hélio Batista de Castro, presidente da Umbro, fornecedora de uniformes para a CBF. Esta não é a opinião do preparador físico da Seleção, Moraci Sant'Anna: "É um absurdo que não tenhamos em 1994 um material que outras seleções já usam desde 1986." Enquanto até o Palmeiras já tem a camisa high tech, a Seleção tem de se contentar com a convencional, que, ao menos, é 14% mais leve do que a de outras copas.

Da cintura para baixo, pelo menos, os brasileiros vão transpirar com toda a tecnologia, usando as bermudas térmicas. Segundo estudos feitos no Instituto de Biomecânica de Zurique, na Suíça, um aumento de apenas 0,5oC na temperatura de um músculo provoca uma melhora de desempenho da ordem de 3%. Outro teste, do Centro de Medicina Esportiva da Universidade do Estado da Pensilvânia, nos Estados Unidos, demonstra que as bermudas térmicas funcionam como verdadeiras molas nas pernas, aumentando, em média, de 5% a 8% a força de um salto.

Fibra de poliéster

O segredo da bermuda está na estrutura da fibra de poliéster. Com formato irregular, ela tem uma área 20% maior do que a das fibras convencionais circulares e deixa pequenos vãos livres no tecido. "Esses vãos funcionam como canais que "chupam" o suor para fora da roupa e fazem com que evapore muito mais rapidamente", esclarece Silvana Haisser, da área de poliéster da Du Pont, fabricante da fibra Dacron. Nesta Copa do Mundo, só a fibra do atleta não vai bastar. A fibra da roupa vai influir muito mais do que influía antes.

Cabeça de estrategista

Em uma aula do técnico Carlos Alberto Parreira, 134 anos de evolução da tática no gramado

Foi-se o tempo em que o técnico dos sonhos da torcida dormia o tempo todo. Era a imagem que se tinha de Vicente Feola, da Seleção de 1958, ou de Lula, do Santos da década de 60 — dois bonachões que, aos olhos da multidão, distribuíam as camisas no vestiário e iam cochilar na beira do campo, enquanto os craques enlouqueciam os adversários com seu talento natural. Os cultores do "futebol arte" lembram tudo com uma certa nostalgia, mas hoje estamos no tempo do futebol ciência.

A imagem de inocência do "futebol arte" pode ser boa, mas a verdade é que nunca foi assim. Ao lado da habilidade dos craques, futebol sempre dependeu de esquemas, do know-how de bem distribuir os jogadores em campo. A evolução tática foi acelerada pela preparação física, que explodiu nos últimos 30 anos. O esporte passou a ser mais coletivo, menos individualizado — e cresceu a importância dos técnicos, que puderam armar as equipes com mais variações, numa dinâmica de jogo cada vez maior.

Técnico da Seleção

Carlos Alberto Parreira, técnico da Seleção Brasileira, é o que se pode chamar de um cientista da tática. Faz parte da geração de treinadores-cientistas formados em escolas de Educação Física a partir do meio da década de 60, época em que o futebol tornou-se mais prático e menos romântico. Muitos criticam Parreira dizendo que, na prática, toda a teoria que ele tem na cabeça não funciona muito bem — de sua parte, ele se irrita quando é chamado de "teórico". Lembra os 20 anos de experiência acumulada e garante que, para definir o esquema adotado pela Seleção, se baseou em dois pontos fundamentais: em primeiro lugar, as características históricas, tradicionais do futebol brasileiro; em segundo, a evolução tática do futebol no mundo. A seguir, Parreira — que tem como principal interlocutor o diretor técnico Mário Lobo Zagalo, técnico da Seleção em 70 e outro mestre na tática — dá uma aula de como foi essa evolução e mostra onde está querendo chegar. Com a palavra, o professor Parreira:

1860

"Em 1860, quando era praticado na Inglaterra, o futebol não tinha esquemas. Eram oito atacantes, um jogador no meio de campo e outro na defesa — mais ou menos como se vê nos recreios dos jardins de infância, quando as crianças vão jogar bola. Depois, no início do século, com uma nova lei de impedimento — que exigiu a presença de pelo menos dois adversários entre o atacante e o gol, quando a bola fosse passada para ele — começaram a surgir os esquemas táticos. O sistema mais adotado, então, passou a ser o 2—3—5."

1930

"No começo da década de 30, um time inglês chamado Arsenal passou a ganhar tudo graças a uma tática diferente. O treinador da equipe, Herbert Chapman, puxou um dos médios para a zaga, abrindo em alas os dois beques originais. A defesa e o meio de campo ganharam mais consistência, porque dois dos cinco atacantes — aqueles que eram usados desde o início do século e que permaneceram por três décadas sem grandes alterações — começaram a voltar para armar os lances. O desenho tático do Arsenal ficou conhecido como WM e seria adotado por mais de 20 anos no mundo todo."

1954

"Em 1954 a Seleção da Hungria, que foi a sensacão da Copa, já havia mostrado um sistema muito mais moderno— com o recuo de um dos atacantes e o avanço de dois do meio campo com a bola, ocupando o espaço vazio. Mas a Hungria perdeu a Copa e a aposentadoria do WM só foi consagrada com o 4—2—4 adotado pelo Brasil na Suécia, em 58."

1962

"Em 1962 a Seleção Brasileira, que era praticamente a mesma de 58, quatro anos mais velha, adotou uma variação. O ponta-esquerda Zagalo radicalizou sua tendência de ajudar a defesa, mas não deixava de participar das jogadas de ataque — fez o primeiro gol brasileiro nesse mundial, contra o México, e foi à linha de fundo cruzar a bola para o gol de empate contra a Espanha, nossa partida mais difícil. Garrincha também começou a sair da ponta direita para atacar pelo meio e até pela esquerda. O futebol ficava cada vez mais cooperativo, exigindo mais movimentação."

1974

"Play and don't let play (jogue e não deixe jogar) era o lema dos ingleses campeões do mundo em 1966. O Brasil, campeão de 70, adotava um esquema em que todos os jogadores marcavam . A preparação física evoluiu tanto que, em 1974, a Holanda surgiria na Copa da Alemanha com um time praticamente sem posições fixas. O "carrossel holandês" rodava em campo e fazia algumas coisas assustadoras, como avançar todo mundo ao mesmo tempo para deixar os adversários em impedimento. Ou o time inteiro correr para tirar a bola de um adversário."

1994

"Hoje todos têm de se preocupar em defender e atacar. Os dois movimentos básicos são recuperar a posse de bola e partir para o gol, de preferência em bloco. Todo o mundo joga assim atualmente, mas há variações: há quem use um "líbero" na defesa, um jogador sobrando atrás ou na frente dos zagueiros, com função de cobri-los ou de se lançar para o ataque. O Brasil tentou algo assim na Copa de 90 e fracassou. Por isso, vamos agora aos Estados Unidos sem procurar inventar nada, jogando como os maiores times brasileiros."

A sorte está lançada

Cabeça fria, lápis na mão e muita Análise Combinatória para calcular a chance de o Brasil chegar à final

Não adianta chorar: futebol também é sorte. O Brasil dispõe de bons atletas e do que há de mais moderno em preparação física. Mas o anjo do acaso vai estar presente. Temos que contar com a sorte — e podemos também avaliar as chances da Seleção. É aí que entra a Teoria das Probabilidades. A idéia é simples, embora trabalhosa. Consiste em examinar a tabela oficial e verificar, antes de mais nada, quais são as chances de o Brasil passar por todas as fases até chegar à final.

"São cálculos que seguem o bom senso", explica o professor Flávio Wagner Rodrigues, que fez os cálculos para SUPERINTERESSANTE. "Procuramos colocar em números aquilo que as pessoas sentem intuitivamente sobre as equipes em disputa." Rodrigues, 58 anos, é considerado o mais competente profissional no tipo de cálculo usado aqui — a Análise Combinatória, um dos ramos da Teoria das Probabilidades. Já aposentado, continua orientando novos talentos no Departamento de Estatística do Instituto de Matemática da Universidade de São Paulo. Ao longo da carreira, ele não apenas ensinou alguns dos melhores pesquisadores da atualidade, como ainda ajudou a dar bases teóricas mais sólidas a essa área do conhecimento. "Além da inteligência fulgurante, ele tem dignidade como poucos", sintetiza o professor Luís Barco, titular da seção Dois mais Dois de SUPERINTERESSANTE.

Da lousa para o computador

O computador chegou ao campo de futebol no Brasil pelas mãos do preparador físico Moraci Sant'Anna, do São Paulo. Antes, ele fazia as anotações no papel e depois passava para o micro. Em 1993, conheceu o são-paulino Sérgio Vianna, gerente de marketing da Microsoft, que desenvolveu o programa Aperfeiçoamento tático e técnico no futebol. Desde então, em todos os jogos, lá está Moraci no banco com um notebook, anotando quem participa de cada lance, como passes certos e errados, desarmes, chutes a gol, etc.

O programa elabora gráficos e quadros com os desempenhos. Há também a ficha de cada jogador com as informações de todos os testes físicos que ele faz durante o ano, possibilitando avaliar a evolução do preparo físico — ou o desgaste. Para a Copa, Vianna está desenvolvendo uma nova versão, que inclui a tática. Assim, o computador substitui a velha lousa onde o técnico desenhava o esquema do time. No programa, bolinhas representando os jogadores serão distribuídas no campo. Clicando sobre um jogador, o treinador vê como ele se movimenta em campo.

O mais importante desse programa é a possibilidade de se arquivarem vários jogos do time e, principalmente, dos adversários. Num campeonato, o olheiro anota o desenho tático dos jogos dos outros times e passa as informações para o técnico. "Você pode perceber, jogo a jogo, como o treinador adversário arma o time em função da equipe que enfrenta", afirma Vianna. "Com isso, você descobre como o técnico adversário pensa."

A CIÊNCIA MANDA PEGAR LEVE

Por Lúcia Helena de Oliveira - Revista SuperInteressante

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Ninguém precisa se conformar com barriga flácida ou pernas finas. Mas, do jeito como a ginástica vem sendo praticada por aí, além de se machucar, seu corpo pode não entrar na melhor forma. Por isso, médicos e professores de Educação Física alertam: cuidado com as academias. A maioria ainda não entrou na era dos exercícios inteligentes.

As aparências enganam o 1 milhão de brasileiros que passam horas em cerca de 15 000 academias espalhadas pelo país. Em algumas delas, aparelhos gigantescos com luzes piscando fazem os mais franzinos se sentirem Rambos e dão a impressão de que ali está a mais alta tecnologia para atingir a boa forma física. Mas, atenção, os equipamentos de última geração são fantásticos desde que bem aplicados, o que nem sempre acontece. Prova disso é que muitos centros da boa forma endossam, quando não estimulam, que seus alunos passem mais de 3 horas malhando. Um erro da pesada.

Um Brasil de mil formas e vaidoso

“O Brasil é um dos maiores consumidores mundiais de aparelhagem de ginástica”, conta Marcos Paulo Reis, técnico da seleção brasileira de triatlo, acostumado a uma rapaziada fanática que corre, nada e pratica ciclismo com garra olímpica. “Era de se esperar que eu defendesse os treinos pesados. Mas sou contra”, diz. “O que já estraga o corpo do atleta só pode ser péssimo para gente comum.”

Reis é um dos coordenadores do Projeto Acqua, em São Paulo, academia especializada nos esportes aquáticos. A especialidade do técnico são os exercícios aeróbicos, aqueles que exigem mais resistência do que força e botam coração e pulmão em ordem. “Um executivo não precisa pedalar mais do que 40 minutos por dia em uma ergométrica”, garante. “Esse tempo já lhe dá um ótimo fôlego.”

Para o fisiologista Turíbio Leite, da Universidade Federal de São Paulo, todo erro está no programa de exercícios. “Além de não impor várias horas de dedicação, ele deve considerar a heterogeneidade dos brasileiros”, explica. “Diante da nossa mistura de raças, é irresponsável fazer uma média da população para estabelecer metas de peso, medidas e mesmo capacidade respiratória, pois a gente sabe que ela também varia de acordo com os genes. No Brasil, mais do que em qualquer outro canto, vale o ditado de que cada caso é um caso.”

Derretendo a gordura

Outro erro comum nos templos da vaidade é não dar exclusividade para os exercícios aeróbicos, como correr, nadar ou pedalar, em uma fase inicial do treinamento. “Começar com aparelhos pode ser perda de tempo”, afirma Turíbio. Ocorre que os chamados aeróbicos são muito mais eficientes em derreter as gordurinhas extras: meia hora de caminhada consome o dobro de calorias que meia hora fazendo os dolorosos abdominais. Ou seja, a barriga de quem anda vai embora mais depressa. “Eliminada a gordura é que se pode notar, depois, músculos bem definidos.”

Os aparelhos definem os músculos

Os músculos precisam que o coração mande mais sangue enquanto dão duro nos aparelhos. Suas fibras terminam a ginástica com microscópicas rupturas. Mas, passadas 24 a 48 horas de repouso, uma série de substâncias entram em ação para restaurar essas lesões. Elas tampam as rachaduras musculares com mais proteínas do que havia ali antes, prevendo outras sessões de esforços. Assim, a fibra reconstruída acaba sendo mais forte. “Os aparelhos modernos são projetados para isolar a porção do músculo onde a gente pretende que isso aconteça”, explica o treinador paulista José Carlos Altieri, que fortaleceu seu currículo com mais de vinte cursos de especialização em definição muscular. “Assim, conseguimos resultados melhores”.

Quando a Genética é o limite

Na nova era da boa forma, é possível moldar o corpo até os limites da Genética. “Quem nasceu com tendência a ter quadris largos poderá fortalecer a musculatura torácica”, exemplifica Altieri. “Assim, o peito ficará mais largo também, criando a impressão de um corpo mais proporcional e harmonioso.” Hoje, justamente porque os aparelhos isolam melhor os grupos musculares, o bom professor de ginástica olha para um aluno como um escultor, notando o que precisa aumentar e o que precisa diminuir para se aproximar dos contornos desejados.

Na maioria das grandes academias, porém, embora os alunos até façam testes de avaliação, eles ganham uma ficha com a mesma seqüência de exercícios do vizinho de sala de aula. “É um absurdo”, lamenta Altieri, que hoje se dedica a alunos particulares. Segundo o treinador, não existe corpo moldado sem levantar pesinhos. “A gente já está acostumado com o peso dos próprios braços e pernas. Por isso exercícios localizados sem sobrecarga não dão bons resultados.”

Nos últimos anos, porém, ficou claro que os efeitos são melhores quando essas cargas extras são pequenas. Pois, como mostrou um estudo realizado no início deste ano pela Universidade de Miami, nos Estados Unidos, o peso mais leve faz o indivíduo agüentar muitas repetições. Essa insistência, por sua vez, aumenta ainda mais o fluxo de sangue para a região trabalhada. Com nutriente e oxigênio à vontade carregados pela circulação, o desempenho muscular é melhor. As metas são atingidas mais depressa e, claro, o risco de lesões nas articulações despenca.

Vem aí o Wellness

Há quem aposte, contudo, que o chamado fitness, a mania de conquistar a boa forma nas academias, será soterrado pela onda do wellness, termo que pretende designar bem-estar físico. “A idéia é de que todos podem ter saúde mexendo o corpo meia hora por dia”, explica o professor Luís Carlos de Oliveira, da Universidade do ABC, em São Paulo, e do Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão Física São Caetano do Sul (Celafiscs), em São Paulo. Um dos maiores estudos a favor do wellness foi realizado por americanos da Universidade Harvard, chefiados pelo médico Ralph Paffenberguer.

O time de cientistas concluiu que o pulo do gato, capaz de diminuir em mais de 30% o risco de doenças ligadas ao sedentarismo, é sair da inércia e movimentar o corpo meia hora por dia. “Isso, em termos de saúde, é mais importante do que fazer aulas de ginástica três vezes por semana”, diz Oliveira. Segundo o médico do esporte Victor Matsudo, diretor do Celafiscs, essa meia hora diária não precisa ser ininterrupta. “Se alguém se exercita 10 minutos de manhã, mais 10 à tarde e 10 à noite”, exemplifica, “isso já basta.” Atividades mais pesadas exigem até menos tempo do que isso. “O melhor é que, diferente das academias, o wellness é acessível a todos, como crianças e idosos.”

Comentários

Suor até debaixo d’água

A corrida na piscina surgiu para reabilitar atletas lesados. Agora, ganha praticantes saudáveis que desejam entrar em forma sem correr riscos.

Para quem está de fora, parece moleza: no deep running (corrida na profundeza), sem uma expressão em português por enquanto, é como se os corpos andassem em câmara lenta na piscina funda. Mas quem corre 30 minutos desse jeito está queimando só 10% menos calorias do que aquele suado corredor de pista de cooper no mesmo período. “Para se deslocar contra a resistência da água, o corpo mobiliza muitos mais grupos musculares e, por isso, a diferença no gasto energético acaba sendo pequena”, explica a professora Eledir Busanello, da Projeto Acqua, em São Paulo.

O que ainda não se sabe é se o deep running propicia o mesmo condicionamento cardíaco da corrida normal. “Parece que o consumo de oxigênio é igual”, diz Eledir. “No entanto, a gente precisa de mais trabalhos científicos para confirmar esse dado e a dificuldade é monitorar o corpo submerso.”

Em todo caso, para o corredor, a piscina oferece vantagens em relação às pistas de atletismo. Ali, ele não força nenhuma de suas articulações e os movimentos na água o obrigam, quase sem querer, a corrigir a postura. “Algumas pessoas vêm treinar com dores nas costas e saem da piscina livres do mal-estar”, diz Eledir.

Uma olhada no corpo submerso

A modalidade exige uma bóia especial, feito um colete. Ela compensa as forças da água de modo que não é preciso fazer nenhum esforço para manter o corpo mergulhado totalmente ereto.

Os músculos das coxas fazem mais força do que na corrida fora da água.

Para o corpo se deslocar, os braços também se exercitam e, com isso, ganham firmeza.

As articulações, como o joelho, não sofrem nenhum impacto.

Basta se mexer no dia-a-dia

Atividades rotineiras que, praticadas por alguns minutos diariamente, diminuem o risco de doenças ligadas ao sedentarismo.

• 45 minutos de vôlei

• 40 a 60 minutos de faxina na casa

• 40 a 60 minutos lavando o carro

• 30 minutos de dança de salão

• 30 minutos de caminhada (andar cerca de 3 200 metros)

• 30 minutos de caminhada empurrando um carrinho de bebê ( só 2 400 metros)

• 10 a 15 minutos de caminhada com uma criança no colo

• 10 a 15 minutos de corrida (correr 2 400 metros)

• 15 minutos de bicicleta (pedalar em torno de 6 400 metros)

• 30 minutos de jardinagem

• 15 minutos subindo escada

• 15 minutos pulando corda

A força que vem das massas

Cortar carboidratos é uma idéia fora de forma.

Quem quer emagrecer não precisa recusar uma bela macarronada ou uma fatia de pão. “Os carboidratos desses alimentos, que eram considerados vilões do corpo esbelto, são a melhor fonte de energia para os músculos durante a ginástica”, explica a nutricionista Juliana Grazini, professora das Faculdades São Camilo. Sem eles, por incrível que pareça, o corpo demora mais para reagir aos exercícios. “O que ninguém precisa é comer gordura visível, aquela que a gente inclui na preparação dos pratos”, completa a médica especializada em adolescentes Maria Sylvia Vitalle, da Universidade Federal de São Paulo. “As carnes, o leite e outras fontes de proteína já contêm gordura para a nossa sobrevivência. Seu excesso é que engorda demais.”

Ficar parado é mesmo o maior perigo

Desde 1968, uma equipe de médicos americanos vem comparando pessoas sedentárias, indivíduos que se movimentam pelo menos meia hora por dia em atividades corriqueiras e gente que faz ginástica para valer.

As conclusões sobre fatores de risco de doenças estão nos gráficos ao lado. Nos voluntários que tiveram câncer, enfarte ou derrame, o estilo de vida, incluindo a dieta e a atividade física, pesou mais do que o ambiente, a assistência médica disponível ou mesmo a tendência genética.

Infarto

A atividade física também evita a formação de coágulos.

Câncer

Os exercícios ajudam o sistema de defesa a destruir células malignas antes de a doença aparecer

Derrame

A ginástica ajuda a manter a pressão normal.

O primeiro passo é o mais importante

Imagine que a fatia do estilo de vida nos gráficos à esquerda representem 100% do risco. Agora, dê uma olhada no gráfico à direita. Quem passa a se exercitar meia hora por dia corre apenas 60% de risco de doenças ligadas ao sedentarismo.

*Este é o benefício se alguém, além de fazer esporte, também se movimenta no dia-a-dia.

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A MÁQUINA DO ETERNO MOVIMENTO

Por Lúcia Helena de Oliveira

Os quase 650 músculos do corpo humano jamais param de trabalhar. Tudo o que fazemos são eles que fazem. E a ciência ensina como usá-los melhor.

Viver é mesmo uma ginástica

O coração se contorce para bombear o sangue que, por sua vez, corre o corpo inteiro. A respiração estica e encolhe os pulmões. O aparelho digestivo se dobra e desdobra com o alimento.Tudo na vida animal é movimento — músculos que se contraem, músculos que se estendem. Graças a cerca de 650 músculos o homem pode, além de viver, ficar em pé andar, dançar, falar, piscar os olhos, cair na gargalhada, prorromper em lágrimas, expressar no rosto suas emoções, escrever e ler este texto. Portanto, o desempenho da musculatura é muito mais forte que mera força bruta. Ao ver o movimento dos músculos do corpo, os antigos talvez tivessem a impressão de que existiam ratinhos caminhando sob a pele. Pois em latim musculus é o diminutivo de mus, ou camundongo. Na verdade, o músculo é um feixe com milhões de fibras capazes de se contrair. São 78 por cento água, 20 por cento proteína, 1 por cento carboidrato e, ainda, em quantidades mínimas, sais minerais e gordura.

As fibras podem ser milimétricas, como as dos músculos dos dedos, ou ter até 10 centímetros de comprimento, como as dos músculos da coxa; mas são sempre finíssimas, com um diâmetro nunca maior do que 1 décimo de milímetro.

As fibras musculares surgiram com os primeiros seres vivos que tinham de se deslocar em busca de água ou comida ou ainda para se reproduzir — portanto, animais pluricelulares, que apareceram na Terra há 570 milhões de anos. É a contração de músculos especiais que faz as lulas e águas-vivas expulsar os jatos de água que as impulsionam. Já com o aparecimento dos vertebrados, a musculatura passou também a cumprir uma tarefa essencial — sustentar o esqueleto.

Forma e o tamanho do músculo

A forma e o tamanho de um músculo variam conforme a sua função. A musculatura humana, que representa 40 por cento do peso do corpo, foi herdada dos outros mamíferos e precisou sofrer adaptações para manter o tronco em pé — essa tão envaidecedora peculiaridade humana. As mãos, livres do solo, tiveram de modificar os músculos típicos dos quadrúpedes, a fim de poder fazer movimentos complexos e elaborados.

No fundo, todo músculo faz o mesmíssimo movimento, que é contrair-se. Alguns músculos, porém, não obedecem à vontade de seus donos conscientes. São os músculos chamados lisos ou involuntários, que funcionam sob as ordens do sistema nervoso autônomo do organismo. São certos bizarros músculos involuntários, por exemplo, que deixam uma pessoa arrepiada de frio. Com apenas 1 milímetro de comprimento, ficam junto da raiz dos pêlos, que se eriçam quando ocorre a contração. Com os pêlos arrepiados como os de um gato em noite fria, o homem estaria mais protegido do clima. Essa função não faz mais sentido, pois no processo de evolução o homem deixou de ser um bicho peludo.

Mas quase todos os músculos involuntários são fundamentais, como os ciliares do olho. O olho humano pode ser comparado a uma máquina fotográfica que precisa focalizar um objeto de acordo com a distância em que se encontra dele. O dispositivo que usa para isso é uma estreita faixa de fibras musculares atrás da íris — o disco colorido do olho. Ao se contrair, aumenta a curvatura do cristalino, uma espécie de lente natural. A curvatura acentuada é necessária para se enxergar de perto. Por isso, certas atividades, como a leitura prolongada, podem “cansar” a vista, ou seja, cansar esses músculos que ficam contraídos por muito tempo. Eis também por que focalizar um ponto distante é um colírio para os olhos: a curvatura precisa diminuir e os músculos se estendem.

Apesar de toda a sua importância, os músculos involuntários são minoria. No corpo humano, predominam os quase 500 músculos voluntários que atendem aos comandos do sistema nervoso central. Como possuem estrias microscópicas, também são chamados estriados. Existe ainda um terceiro nome para eles: esqueléticos, porque terminam em forma de tendões, que são como cordas de fibras mais fortes, agarradas a ossos. O músculo cardíaco, o mais importante de todos, é considerado um tipo à parte porque, embora seja estriado, se contrai graças a um sistema nervoso próprio.

Qualquer que seja o músculo, suas fibras já estão formadas a partir da sexta semana de vida intra-uterina. A partir de então, cada fibra pode crescer isoladamente. Mas o número de fibras será sempre igual. Um atleta musculoso de 20 anos possui a mesma quantidade de fibras que tinha ao nascer. O que elas fizeram ao longo da vida e à custa de muito exercício foi desenvolver-se. Mesmo entre pessoas diferentes não há grandes diferenças: nos músculos de Maguila e nos equivalentes de Lucélia Santos, o número de fibras é praticamente igual — pode até ser que, em dado músculo, a suave Lucélia tenha mais fibra que o temível Maguila.

Músculos parecem gostar de trabalho, pois ficam mais ágeis e fortes à medida que são usados. Até quando se está dormindo, os músculos se mantêm num estado de pequena contração, mais conhecida como tônus muscular. Em pacientes de paralisia infantil, por exemplo, o músculo nem sequer sustenta essa ligeira contração — danificado, o nervo não consegue transmitir-lhe a ordem. Sem o exercício constante do tônus, o músculo acaba por se atrofiar.

Cada fibra muscular segue a lei do tudo-ou-nada: ou se contrai ao máximo ou se ignora o estímulo nervoso. Apesar disso, ninguém se movimenta aos trancos como uma caricatura de robô. Isso porque, em primeiro lugar, as fibras de um mesmo músculo se excitam em graus diferentes: algumas, mais sensíveis, iniciam a contração 4 milésimos de segundo após um estímulo; outras fibras respondem num período muito maior, caso o cérebro insista na ordem. Outro fator importante é o número de células nervosas motoras que o cérebro escalou para levar a ordem ao músculo, assim como o número de fibras que cada uma dessas células nervosas, por sua vez, controla.

As mínimas gradações de movimento dos dedos de um músico instrumentista, por exemplo, apenas são possíveis porque seus nervos motores controlam um número limitado de fibras. É claro que em situações muito especiais o cérebro pode perder temporariamente esse incessante controle sobre os movimentos. Quando a mão toca uma superfície quente, nervos sensitivos da pele e dos próprios músculos dão o alarme; diante disso, antes mesmo de verificar o que aconteceu — a mão encostou numa panela e se queimou —, o cérebro ordena uma contração súbita de todas as fibras daquela parte do corpo. O resultado será um movimento espasmódico.

Ordem Dada ao Músculo

Um músculo não precisa de duas ordens: basta que lhe mandem contrair-se. A extensão ocorre naturalmente quando cessa a ordem de contração. Assim, o popular bíceps — músculo da frente do braço — se contrai e diminui a distância entre os ossos, usando as articulações do cotovelo: essa é uma ação concêntrica, que qualquer pessoa executa no mero gesto de levar uma xícara aos lábios. Já para segurá-la na altura da boca é preciso uma ação isométrica, ou seja, capaz de manter a contração sem causar movimento. O cérebro consegue essa proeza bombardeando o músculo com cerca de 45 estímulos por segundo — uma ordem que deve se fundir com outra, sem dar tempo para o músculo se estender. Finalmente, a ação excêntrica é quando se abaixa a xícara. Mais uma vez o cérebro controla o movimento interrompendo gradualmente os estímulos às fibras.

Na realidade, um movimento qualquer nunca é obra de um único músculo. No exemplo de dobrar o braço, ao mesmo tempo em que o bíceps se contrai, um músculo oposto — o tríceps — se estende. E, quando o braço abaixa, é o tríceps que se contrai, puxando o antebraço para fora e obrigando o bíceps a se estender. O músculo contraído de qualquer movimento chama-se agonista; o estendido é antagonista. Todo músculo dança conforme a música, ou seja, pode ser tanto agonista como antagonista — depende do movimento.

Adenosina trifosfato (ATP)

Num movimento, há também músculos que se contraem apenas para fixar um membro ou o tronco inteiro e, dessa maneira, dar uma base de sustentação ao músculo que de fato se desloca. Por exemplo, ao cerrar o punho, aparentemente só os músculos da mão e dos dedos trabalham; mas, se os músculos do antebraço não ficassem bem contraídos para segurar o pulso, este se dobraria junto com os dedos. Para a contração, um músculo precisa de energia. Essa energia é liberada com a quebra de moléculas da substância adenosina trifosfato (ATP).

O estímulo nervoso possui determinada eletricidade que, em contato com uma substância gelatinosa que banha o músculo, encaminha uma partícula de cálcio para dentro das fibras; o cálcio, então, ativa enzimas próprias do músculo que quebram a ATP. A única questão é haver moléculas de ATP em quantidade suficiente. O fisiologista Turíbio Leite, professor da Escola Paulista de Medicina, ensina que existem três fontes de ATP. A primeira seria uma espécie de estoque particular do músculo. A segunda é a glicólise: reações dentro do músculo transformam a glicose das fibras ou a trazida pelo sangue em ATP e ácido láctico. Esta é uma substância inibidora que, ao se acumular nas fibras, causa tanta dor que a pessoa não agüenta mais contrair o músculo.

"Esse processo", explica o professor Turíbio, "produz grande quantidade de energia, mas por tempo limitado. Por isso, é um metabolismo para atividades que exigem velocidade. "Os atletas atenuam os efeitos do ácido láctico e por isso suportam melhor um acúmulo da substância. Mas quem não é atleta cede à dor e logo pára. Do contrário, corre o risco de sentir uma cãibra, a contração involuntária do músculo cansado, que serve de sinal de alerta. É claro que as cãibras também atacam em plena madrugada, quando se está quieto, dormindo. Mas aí o problema é neurológico – uma ordem equivocada para o músculo se contrair a toda velocidade, provocada muitas vezes por estresse psicológico.

Quando o mal é meramente muscular, uma massagem local ajuda de imediato. Ela provoca mecanicamente o relaxamento do músculo contraído e, ao ativar a circulação no lugar, ajuda o sangue a espalhar o ácido láctico. As massagens para aliviar a tensão funcionam da mesma maneira. Pois, quando a mente faz verdadeiras acrobacias por causa de um problema qualquer, a pessoa fica literalmente tensa — culpa das ordens do cérebro para contrair certos músculos que, como em toda ginástica, ficam ali gastando energia para manter a tensão e acumulando o ácido láctico.

A última fonte de ATP, o metabolismo aeróbio, é o oxigênio trazido pelo sangue, que produz a substância em reações químicas com a glicose. Nesse caso, a “sobra”, gás carbônico e água, é eliminada na expiração. Esse é o metabolismo que mais se usa no dia-a-dia: não produz velocidade, mas tem a vantagem da resistência. Todo músculo possui dois tipos de fibras: as de tipo 1, que desenvolvem mais o metabolismo aeróbico; e as de tipo 2, que realizam melhor o metabolismo da glicólise. Pesquisadores supõem que a prática de determinado esporte pode transformar uma fibra tipo 1 em tipo 2 e vice-versa. Mas isso nunca foi observado na prática. "Nascemos com a proporção de fibras 1 e 2 determinada", diz o fisiologista Turíbio Leite, "o que significa que temos predisposição genética para esportes rápidos ou de resistência."

Qualquer reação para produzir ATP no músculo acaba liberando muito calor. São os músculos, portanto, os responsáveis pelos 36 graus centígrados do corpo humano — a temperatura ideal para que o organismo funcione direito. Quando o clima ameaça baixar essa temperatura, o cérebro manda os músculos se agitarem. É quando as pessoas tremem de frio.

Outra responsabilidade dos músculos é a postura corporal. Músculos enfraquecidos fazem a coluna despencar para algum lado. Por exemplo, a lordose (acentuação da curvatura lombar) é conseqüência de músculos abdominais fracos, incapazes de sustentar as vísceras; estas então caem sobre o osso da bacia que, por sua vez, joga todo o seu peso sobre a coluna lombar.

Ossos

Mesmo quem não tem vocação para atleta olímpico deveria tirar o máximo proveito dos músculos que a natureza lhe deu. Está provado que músculos fortes evitam o tão doloroso endurecimento das articulações — e também doenças graves como a osteoporose ou desmineralização dos ossos. Sempre se soube, por exemplo, que os músculos do braço direito de um tenista destro são mais desenvolvidos que os do braço esquerdo. O que se descobriu faz pouco tempo é que também os ossos do braço direito desse tenista são mais largos. Antigamente, acreditava-se que, com o passar dos anos, os músculos deviam ser poupados. Nada mais errado. Todos devem dançar, andar, nadar. Enfim, o segredo de tratar bem os músculos é saber que ninguém pode se dar ao luxo de ficar parado.

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O melhor da malhação

Um belo corpo, receita a Organização Mundial de Saúde, consiste em ter boa capacidade cardiorrespiratória, força, flexibilidade e obesidade sob controle. Atrás desse ideal estão as multidões que freqüentam academias de ginástica. Mas não existe nada de novo nesses saltitantes anos 80. No século passado, começou a aparecer a ginástica tal como é conhecida. Do ideal de civilização difundido pelos ingleses no seu vasto império fazia parte a aptidão física.

"A grande novidade é que hoje a Educação Física tem muito mais base científica", observa o professor Mauro Guiselini, da USP. "Existem áreas de estudo novas, como a Fisiologia do Esforço. E, graças à Biomecânica, que mostra quais músculos participam de cada movimento, pode-se tirar melhor proveito dos exercícios.” A ciência, portanto, acabou esclarecendo muita coisa. Ela condena o uso de hormônios consumidos por halterofilistas — que ajudam a desenvolver os músculos, mas causam impotência sexual. Por outro lado, derrubou a idéia de que pessoas muito musculosas não têm flexibilidade. Com exercícios de alongamento para músculos e tendões, um fortíssimo culturista pode ter o jogo de cintura de um bailarino.

Outra idéia riscada é a de que quem faz muita ginástica nunca pode parar, senão os músculos "despencam". Não é bem assim. É verdade que os músculos armazenam tudo o que é ruim — como toxinas — por muito tempo e não guardam o que é bom, ou seja, o condicionamento físico. Para manter-se em forma, a pessoa não deve interromper a ginástica: 30 por cento de tudo o que conquistou em um ano de malhação na academia vai-se embora em apenas três ou quatro semanas de vida sedentária. Mas o pior que pode acontecer — e acontece — é os músculos voltarem a ser o que eram antes da ginástica. "Nunca ficam pior do que isso", consola o professor Guiselini.

Mais do que a musculação, a ginástica aeróbica, que chegou ao Brasil nos primeiros anos 80, é o grande sucesso de público. Não é para menos: está provado que levar o coração à freqüência de 130 batimentos por minuto, durante 20 a 30 minutos, três vezes por semana, é o suficiente para manter a bomba em excelente estado. "A aeróbica", aprova Guiselini, "tem a vantagem de utilizar a música como um elemento fundamental, tirando da ginástica a chatice do 'um, dois, três, quatro'. Além de reforçar o coração, condiciona os outros músculos e desenvolve a coordenação motora. É, portanto, um exercício completo."

Bibliografia

SuperInteressante - vários Números

Para saber mais:

Da flecha à bola - (SUPER número 8, ano 2)

Canhões em campo - (SUPER número 9, ano 3)

A ciência constrói atletas - (SUPER número 3, ano 5)

Olhos de craque - (SUPER número 11, ano 7)

Olha a bola - (SUPER número 12, ano 7)

Os números não mentem jamais. Será? - (SUPER número 9, ano 8)

Superatleta - (SUPER número 7, ano 10)

Vitaminas - (SUPER número 3, ano 9)

Dor nas costas - (SUPER número 4, ano 9)

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