Sediar megaeventos esportivos vale à pena?

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Sediar megaeventos esportivos vale ? pena?

Giuliana Costa1

Resumo A hospedagem de megaeventos esportivos e os processos de transforma??o urbana que estes eventos requerem ? funcional ? competi??o das cidades na arena global para a atra??o de capitais e investimentos. Os eventos esportivos t?m um papel fundamental nesta estrat?gia. Se at? recentemente prevaleceu na literatura e no policy making uma vis?o normativa, prescritiva e acr?tica destes eventos, hoje come?a a emerger um olhar mais cr?tico. Este artigo quer ser ?til ? reflex?o sobre se e at? que ponto vale ? pena sediar megaeventos identificando as vantagens e desvantagens de sediar megaeventos esportivos em termos econ?micos e sociais atrav?s da an?lise cr?tica de parte da volumosa literatura internacional de car?ter sociol?gico e econ?mico produzida nos ?ltimos anos, assim como da evid?ncia emp?rica dispon?vel. Ele apresenta alguns conceitos e quadros te?ricos ?teis para introduzir e discutir alguns dos processos de transforma??o do Rio de Janeiro, cidade que se prepara a receber dois dos mais importante eventos esportivos do planeta.

Palavras-chave Megaeventos esportivos;Vantagens e desvantagens; Legado social e econ?mico

The pros and cons to hosting mega-events

Abstract Hosting mega-events is part of a complex urban global strategy to attract capitals and investments from abroad. Sports events have a fundamental role in this strategy.Till now literature and policy making have adopted a prescriptive positive attitude towards this kind of events and the opportunities offered by them to staging cities and countries. Nevertheless, in the last years a more critical approach has developed among scholars and economic agents. This article will discuss the pros and cons of attracting sports megaevents using economic and sociological literature as well as empirical evidence. Concepts and theoretical approaches stemming from this review will be applied to Rio de Janeiro, a city that will host two of the major sports events in the planet.

Key words Sports mega-events; Pros and cons; Socio-economic legacies

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Introdu??o

Sediar grandes eventos, sejam eles culturais, pol?ticos, esportivos, econ?micos ou sociais, ? parte n?o somente de uma ampla estrat?gia de "re-imagina??o" das cidades e dos pa?ses (Bianchini e Schwengel, 1991), funcional ? competi??o na arena global para a atra??o de capitais e investimentos e para a gera??o de novos fluxos tur?sticos, mas tamb?m ? funcional a impulsar as economias locais e identificar solu??es para os enormes problemas sociais e f?sicos das cidades atrav?s dos processos de transforma??o urbana que os eventos requerem (Hiller 2000, Gratton e Henry, 2001; Essex e Chalkley, 1998). Os chamados "megaeventos" s?o eventos que ocorrem em larga escala, possuem um car?ter dram?tico e espetacular, seduzem as massas populares e recebem o reconhecimento internacional; eles provocam consequ?ncias importantes para a cidade anfitri? ou para o pa?s que serve de sede; beneficiam de uma elevada cobertura e aten??o da m?dia e representam uma interrup??o na administra??o ordin?ria do tecido urbano (Horne e Manzenreiter 2006). O papel dos megaeventos esportivos tem sido associado ao desenvolvimento econ?mico, ? regenera??o urbana, ? impactos sociais positivos (Hall, 1992), ao crescimento ou consolida??o de urban coalitions (Jonas, 1992) ?teis para o gerenciamento da cidade em todos os seus aspectos. O Rio de Janeiro vai receber dois dos maiores eventos esportivos do mundo, a Copa Mundial de Futebol, em 2014, e os Jogos Ol?mpicos de 2016. Assim como aconteceu em outras cidades-sede (Levermore 2010, Misener e Mason 2010, Costa 2012a), muitas d?vidas est?o surgindo sobre a capacidade dos eventos esportivos de transformar de forma positiva os perfis social e econ?mico do Rio de Janeiro. O entusiasmo dos primeiros anos est? diminuindo e est? dando espa?o a uma maior capacidade cr?tica de alguns atores importantes na cena p?blica: representantes do mundo acad?mico, dos movimentos sociais e das Ongs cariocas denunciam que os processos de prepara??o da cidade e de transforma??o urbana em curso estariam acarretando efeitos negativos nas popula??es locais (especialmente nas mais vulner?veis) n?o suficientemente (economicamente) compensados e que os custos de oportunidade de investir grandes somas de recursos p?blicos para os grandes eventos s?o excessivamente altos num contexto metropolitano caracterizado por n?veis de desigualdade s?cio-econ?mica entre os mais pronunciados do pa?s e por uma falta cr?nica de infraestruturas (Costa 2012a).

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Este artigo quer ser ?til ? reflex?o sobre se e at? que ponto vale ? pena sediar megaeventos atrav?s da an?lise cr?tica de parte da volumosa literatura internacional de car?ter sociol?gico e econ?mico produzida nos ?ltimos anos, assim como da evid?ncia emp?rica dispon?vel. Ele apresenta alguns conceitos e quadros te?ricos ?teis para introduzir e discutir alguns dos processos de transforma??o do Rio de Janeiro em prol dos eventos dos pr?ximos anos.

Problematizando a quest?o da hospedagem de megaeventos esportivos

Nos ?ltimos 20 anos e depois de um longo per?odo de abordagem prescritiva e acr?tica sobre a oportunidade de sediar grandes eventos esportivos (Hall, 1992), muita maior aten??o tem sido dada ao fato de que se trata de eventos de curto prazo, mas com consequ?ncias de longo prazo e que h? sempre "perdedores" e "vencedores" nos processos de transforma??o socioecon?micos e espaciais produzidos pos estes eventos. Evid?ncias de pesquisa apontam que muitos fatores devem ser levados em considera??o na decis?o de atrair ou n?o eventos dessa natureza e porte. A origem das cr?ticas sobre os impactos positivos ou n?o nas cidades anfitri?s foi a grande d?vida ? entre outras ? deixada pelos Jogos Ol?mpicos de Montreal, em 1976.

Muitos autores (entre eles Furrer 2002; Gratton e Henry 2011, COHRE 2007, Guala 2009) colocaram em evidencia a problem?tica de eventos que requerem uma enorme concentra??o de investimentos no tempo e no espa?o (uma cidade ou, at? mesmo, em ?reas espec?ficas dentro de uma cidade-anfitri?). Isto estaria em contradi??o com a garantia de sustentabilidade e o legado a longo prazo. Tamb?m foi evidenciado como a organiza??o de grandes eventos requer a??es anti-democraticas, como por exemplo, a falta de respeito ?s formas de consulta p?blica que seriam utilizadas em condi??es de normalidade para a realiza??o de projetos urbanos ou para a implementa??o de novas pol?ticas p?blicas.

Em geral, existe um aumento consistente da literatura que d? maior espa?o ?s interpreta??es mais cr?ticas sobre os impactos dos grandes eventos nas cidades que os recebem e que indicam os pontos negativos que, talvez, sejam superiores ?s vantagens (Gibson, 1998).

Surge ent?o uma quest?o importante no debate internacional: por que os pa?ses e as cidades depositam tanta expectativa na hospedagem de uma Ol?mpiada ou de um outro mega-evento?

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A hospedagem de megaeventos esportivos: aspectos econ?micos Vamos seguir primeiro os argumentos econ?micos, sejam eles positivos ou negativos. Zimbalist (2010), por exemplo, argumenta que os potenciais benef?cios econ?micos, diretos ou indiretos, quase sempre s?o individualizados como sendo a principal raz?o para hospedar os grandes eventos. Os benef?cios diretos consistem em atrair fluxos de capitais e de turistas antes, durante e depois dos jogos, nas consequ?ncias positivas das transforma??es urbanas relacionadas com a constru??o/melhoramento de instala??es esportivas ou das infraestruturas gerais, na cria??o de servi?os de telecomunica??es eficientes, no impulso das economias locais, na maior oferta de emprego (especialmente em alguns setores como os da constru??o civil) e, no longo prazo, na disponibiliza??o de baixos custos de transportes, gra?as ? moderniza??o das malhas rodovi?rias e ferrovi?rias, al?m do aumento dos recursos destinados aos transportes p?blicos. Os benef?cios indiretos poderiam ser, de acordo com o autor, maiores do que aqueles diretos, mas muito mais complexos de se contabilizar: eles podem incluir a receita de publicidade que apresenta a cidade anfitri? ou o pa?s anfitri?o como sendo um potencial destino tur?stico ou de neg?cios no futuro, a melhora na percep??o da cidade ou do pa?s sede por parte de um p?blico internacional e um aumento do orgulho c?vico da popula??o local e nacional. Aspectos positivos no com?rcio e nas exporta??es tamb?m foram evidenciados (Rose e Spiegel, 2010). Outros observadores indicam que um dos maiores efeitos positivos destes eventos ? o de "colocar no mapa" (global) a cidade anfitri? atrav?s de diferentes iniciativas como os projetos de renova??o urbana; a difus?o da pr?tica do esporte ou a promo??o de informa??es ?teis para as popula??es locais; a responsabiliza??o da classe pol?tica local devido ? exposi??o internacional relacionada com os eventos (Furrer, 2002). Segundo a OECD (2008, 2010), os benef?cios gerais da hospedagem de eventos globais (e n?o apenas esportivos) podem ser caracterizados como "prim?rios" e "secund?rios" para indicar o per?odo de tempo no qual eles ocorrem e n?o para indicar a linearidade temporal com o qual occorrem. ? poss?vel, por exemplo, que os benef?cios prim?rios se sobreponham ?s vantagens secund?rias se eles forem, naturalmente, de longo prazo. Os benef?cios prim?rios nascem do alinhamento das estrat?gias de crescimento dos neg?cios e dos objetivos de natureza coletiva da cidade ou da na??o atrav?s de parcerias p?blico-privadas (PPPs), os investimentos na vitalidade do com?rcio, a expans?o estrutural da economia local, o refor?o das cadeias de abastecimento de bens e servi?os, os im-

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pactos positivos no meio ambiente (seja ele constru?do ou natural). As vantagens secund?rias s?o aquelas que derivam do uso das novas infra-estruturadas criadas a partir do evento. Elas s?o, por exemplo, o incremento da conex?o da cidade; o impacto no mercado de trabalho; o desenvolvimento do mercado imobili?rio; a promo??o da cidade no cen?rio mundial devido a sua capacidade de administrar um projeto complexo. Este ?ltimo ponto requer uma clarifica??o: participar e hospedar um grande evento constitui uma certifica??o para competir por outros eventos j? que nas palavras do OECD, "uma cidade com experi?ncia em hospedar eventos, naturalmente, deve ser levada em maior considera??o caso haja quaisquer d?vidas em rela??o ? outra cidade concorrente. Em um mundo urbano cada vez mais competitivo ter experi?ncia pode fazer a diferen?a" (2010, p. 14).

At? aqui, apresentamos os potenciais impactos positivos da escolha de sediar megaeventos, tais como os encontramos na literatura. Mas as evid?ncias emp?ricas relacionadas aos megaeventos esportivos, tais como a Copa do Mundo de Futebol, as Ol?mpiadas e outras competi??es menores como os Commonwealth Games e os Jogos Panamericanos mostram outra face da quest?o. Muitas pesquisas recentes apontam que a hospedagem de grandes eventos n?o apenas n?o produz efeitos econ?micos positivos como, pior ainda, pode deixar at? mesmo uma pesada heran?a econ?mica: os fluxos de turismo n?o aumentam o suficiente ou de maneira significativa (Burton 2003); os eventos podem deixar uma percep??o positiva relativamente modesta junto ? popula??o local (Ritchie e Smith 1991, Matheson, 2008) e, em muitos casos, a hospedagem de eventos teve claros efeitos negativos como a gera??o de custos muito maiores dos que calculados nos processos de candidatura (Zimbalist, 2010; Bray, 2011).2 Frequentemente, os custos finais s?o muito maiores do que os or?ados devido a v?rias raz?es: a primeira delas ? que "no tempo que corre entre a prepara??o da cidade para o evento e sua realiza??o, o custo das constru??es e a valoriza??o da terra podem subir de forma significativa. Tamb?m ocorre que, para conquistar o apoio popular para concorrer ao evento, uma determinada cidade possa camuflar os custos reais. E com a apresenta??o das candidaturas das cidades aspirantes existe a tend?ncia natural de n?o apenas satisfazer os crit?rios m?nimos, mas de ir mais al?m, acrescentando outras `prioridades' aos planos originais" (Zimbalist, 2010, p.9). Mesmo com os Jogos de Barcelona, considerados pela literatura como os de maior sucesso em termos de legado positivo, a d?vida deixada ao governo da Espanha foi de $4 bilh?es, al?m de outros d?bitos de $2,2 bilh?es acumulados nos caixas do munic?pio e da prov?ncia.

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J? o comit? organizador de Nagano apresentou $28 milh?es como lucro, enquanto v?rias institui??es do governo japon?s amargaram d?bitos da ordem de $11 bilh?es (Burton e O'Reilly, 2009). Em Atenas, o investimento p?blico excedeu mais do que $40 bilh?es e deixou rastros negativos nas finan?as da Gr?cia at? hoje.

Outros impactos econ?micos negativos podem ser associados ao mau uso dos terrenos, ?s inadequadas planifica??es e ? subutiliza??o de infra-estruturas. Estas ?ltimas podem se transformar em "elefantes brancos"3, estruturas ou edif?cios constru?dos para eventos e que s?o abandonados depois de terem valorizado o terreno em que foram erguidos e depois de terem se beneficiado de grandes investimentos de manuten??o.

Os exemplos oferecidos por Zimbalist (2010) falam por si: em Sidney, o custo anual de gest?o do est?dio ol?mpico com capacidade para 90 mil espectadores supera os $30 milh?es; muitas das ?reas usadas nos Jogos de Atenas, de 2004, s?o raramente usadas e bem poucas tem uso coletivo, al?m de ocuparem terrenos valorizados e pr?ximos ao centro urbano; os Jogos de Pequim deixaram para a posteridade muitas constru??es caras, incluindo o legend?rio parque aqu?tico Water Cube, o qual ? bastante pouco utilizado. Jogos Ol?mpicos de Inverno tamb?m deixaram custos e estruturas inutilizadas, como a pista de bob constru?da em Val di Susa para a Ol?mpiada de Turim, de 2006 (Guala, 2009).

As ofertas e os respectivos planos de despesas para uma Ol?mpiada n?o apenas se tornam cada vez mais "ricos" com o tempo, mas se distanciaram dos objetivos de promover o crescimento ao longo prazo (Bray, 2011) especialmente nos pa?ses mais desenvolvidos. De acordo com a literatura relevante, quais seriam ent?o as condi??es ideais para que os megaeventos deixem legados e impactos econ?micos positivos nas cidades anfitri?s? Experi?ncias positivas caracterizam-se pelo uso de infra-estruturas j? existentes, o uso das escar?as ?reas urbanas para fins coletivos e pela cria??o de infraestruturas ?teis no futuro e integradas de forma construtiva na cidade ou na regi?o de hospedagem (Zimbalist, 2010; Fainstein, 2009). Barcelona ? considerada como um caso excepcional, que "mostra o caminho" como afirmou o CEO do comit? Ol?mpico organizador da cidade:

o legado material deixado pelos Jogos uma d?cada atr?s foi um presente divino para Barcelona. A cidade foi capaz de enfrentar a grave crise econ?mica que se seguiu em 1993 de forma mais eficiente do que as outras regi?es

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espanholas, precisamente porque os investimentos na Ol?mpiada tinham sido planejados em fun??o das necessidades permanentes da cidade e n?o daquelas tempor?rias dos Jogos ol?mpicos (declara??o em Furrer ,2002, Jose-Miguel Abad, The Daily Telegraph, 5 Nov. 2002).

Para alguns observadores, os megaeventos podem constituir uma "janela de oportunidade" para fazer algo que, ao contr?rio, seria muito dif?cil de realizar em tempos normais por falta de consenso pol?tico e capacidade de concentrar recursos financeiros para um determinado objetivo, al?m da contribui??o dada por agencias quais o IOC - International Olympic Committee (Preuss 2004, p. 11).

A hospedagem de megaeventos esportivos: aspectos sociais Al?m da discuss?o sobre os poss?veis benef?cios econ?micos, existe na literatura e nas pr?ticas de gest?o urbana um interesse crescente no uso de eventos esportivos como ponto de partida para programas de desenvolvimento social e comunit?rio (Levermore, 2010; Misener e Mason, 2010). Mas este enfoque foi e ?, como afirmado acima, objeto de argumenta??es contrarias j? que os impactos negativos dos eventos podem corresponder ou, at? mesmo, sobrepassar suas vantagens. Existe um crescente "corpus" de acad?micos, policy makers e ONGs internacionais empenhados na an?lise emp?rica dos custos sociais dos maiores eventos esportivos, mesmo sendo este uma presen?a ainda minorit?ria na produ??o intelectual, na qual prevalece uma vis?o normativa, prescritiva e acr?tica. Os elementos problem?ticos destes eventos s?o incontorn?veis para a tomada de decis?es e para guiar os processos de conflito urbano. As vantagens de sediar grandes eventos (sejam eles esportivos, culturais ou de outra matriz qualquer) devem ser relativizadas; posi??es otimistas4 no mercado das ideias devem ser contrabalanceadas. Um primeiro ponto a ser assinalado ? que os impactos sociais negativos de eventos de larga escala s?o muito mais dif?ceis de avaliar do que os eventuais benef?cios.Alguns pesquisadores colocam em evid?ncia que o fato de sediar grandes eventos esportivos traz geralmente vantagens somente ? uma selecionada parcela da popula??o, principalmente ?s elites dirigentes dos neg?cios e ? classe pol?tica (Burbank et al, 2001; Whitson e Horne, 2006; Vainer, 2010; Costa, 2012a). Em termos gerais, os megaeventos catalizam investimentos seletivos at? mesmo quando estes s?o apresentados como a??es universalistas5.

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Os "custos sociais" mais evidentes dos megaeventos s?o os despejos e as remo??es os quais t?m sido definidos como "caracter?stica comum aos megaeventos" (Porter, 2009, p. 365). As remo??es de comunidades pobres para abrir o caminho ao setor imobili?rio e ao desenvolvimento de zonas com terrenos valorizados na cidade ocorrem sem necessariamente ser ligadas a megaeventos, mas estes constituem uma ocasi?o ?nica para proceder neste sentido.

Antes de tudo existe um consenso social em rela??o ao futebol e ao esporte em geral que suporta a??es fortemente anti-democr?ticas e injustas. Em segundo lugar, muitos "estados de exce??o" (Agambem, 2003; Vainer, 2010) foram impostos para proteger os "direitos dos Jogos" como a cria??o de "zonas de exclus?o" ao redor das constru??es esportivas nas quais os residentes n?o podem circular ou a proibi??o de protestos e passeatas dentro e nas imedia??es das instala??es dos eventos (Neri, 2010; Costa, 2012a e 2012b; Curi e Coll, 2011). Os processos de gentrifica??o tamb?m s?o levados em considera??o como fatores que, indiretamente, afetam as condi??es de vida das pessoas que s?o obrigadas a se mudar para partes mais perif?ricas e menos valorizadas das cidades por conta dos processos de valoriza??o fundi?ria e imobili?ria que os eventos esportivos trazem consigo. Estes eventos transformam e deixam os espa?os urbanos menos acess?veis aos pobres e ao mesmo tempo beneficiam certos interesses econ?micos6.

Em terceiro lugar, a literatura e a hist?ria recente mostram como os megaeventos raramente beneficiam as comunidades mais carentes. Muitos estudos assinalam que, especialmente nos pa?ses em desenvolvimento, os empregos criados em fun??o destes eventos s?o mal remunerados, tempor?rios e at? mesmo perigosos; os despejos, que normalmente afetam popula??es economicamente mais fr?geis, terminam fazendo com que os atingidos tenham que morar em condi??es piores, mais distantes das op??es de trabalho, de transportes, das escolas, dos hospitais e de outros servi?os b?sicos (Omena, 2011; COHRE, 2007). Outros custos sociais est?o relacionados com a falta de transpar?ncia nas decis?es que t?m como objeto a transforma??o do tecido urbano, com a repress?o ?s manifesta??es de protesto, com formas de criminaliza??o da pobreza e com mudan?as partid?rias nas regras do planejamento urbano. Todos estes aspectos devem ser contabilizados para calcular os custos sociais dos megaeventos assim como os custos de oportunidade de sitiar tais eventos em cidades nos quais nem sequer os servi?os b?sicos s?o cobertos. Cabe a pergunta neste caso: estas cidades deveriam investir neste tipo de evento?

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