Pelas ondas do rádio - Inicial — UFRGS



Após o regatão, o rádio e a televisão

Paulo Roberto Ferreira[1]

Resumo:

A primeira emissora de rádio surgiu na Amazônia em 1928. Foi a Rádio Clube do Pará, em Belém, que teve um papel muito importante como veículo de integração. Antes do rádio, o contato entre o homem do interior da região e o mundo urbano, era feito pelo barco que abastecia os seringais e pequenas povoações com suas mercadorias. A casa aviadora ou “regatão” quebrava o isolamento e levava também as cartas dos parentes que viviam nas localidades, às margens dos rios.

A televisão só chegou em 1961. Em Manaus muita gente captava o sinal de uma emissora da Venezuela, antes da chegada da primeira TV local.Mas, ainda hoje, na era da comunicação digital, o rádio cumpre importante papel na Amazônia, já que naquele imenso território, o aparelho de rádio, de pilha ou a manivela, reduz a distância e leva música, notícia e as mensagens pelos programas do tipo “Correio do Interior”.

Palavras-chave: rádio, Amazônia, história.

Pouco mais de 100 anos depois do lançamento do primeiro jornal na Amazônia,[2] chega a era do rádio, uma das grandes novidades do início do século 20. A exemplo do que ocorreu com os jornais, o rádio foi desde o início um instrumento de dominação e controle político. Getúlio Vargas usou bastante o rádio antes, durante e depois da ditadura do Estado do Novo para fortalecer o populismo.

A programação das emissoras era praticamente a mesma em todo o Brasil: musicais, eventos de auditórios, concurso de calouros e radionovelas. O jornalismo ocupou também o seu espaço. E o esporte, principalmente a transmissão de jogos de futebol, foi crescendo gradativamente dentro da grade das emissoras.

Na Amazônia, o rádio teve um papel muito importante na integração entre as capitais e as distantes localidades do interior, que na primeira metade do século 20 eram ligadas por via fluvial. Enquanto os jornais impressos se concentram mais nas zonas urbanas, a área rural permanecia num grande isolamento.

As ondas do rádio chegavam até os vilarejos mais distantes, na beira do rio, nos garimpos, nos seringais, nas fazendas, nas roças, dentro das canoas, dos barcos, dos navios, dos caminhões tipo pau-de-arara, etc.

A imprensa, antecessora do novo veículo, cumpriu o papel fundamental de formadora da força de trabalho para o rádio. Foi o que aconteceu em Belém, onde a mão-de-obra dos jornais foi recrutada pela primeira emissora que se instalou na região. Edgar de Campos Proença, um dos fundadores da Rádio Clube do Pará, atuava no jornalismo na década de 20. A emissora foi ao ar no dia 22 de abril de 1928 e é tida como a quarta do Brasil.

A PRC-5 (o primeiro prefixo da emissora) começou de modo amadorístico, de um clube de amigos. Surgiu do interesse de Proença, Roberto Camelier, bacharel em Direito, e Eriberto Pio, telegrafista. Quando o governo de Getúlio Vargas definiu, em 1931, um percentual de 10% da programação para venda de anúncios, a emissora se firmou, já que passou a contar com uma cota de financiamento constante.

Com um transmissor de onda tropical (OT), a Rádio Clube do Pará passou a ser ouvida em vários pontos da região, a partir de 1942. No dia 7 de junho de 1945, a PRC-5 ultrapassa a fronteira paraense e inicia a irradiação de programas especiais sobre o Território do Amapá, por meio da sua onda tropical de 60 metros, sempre às quintas-feiras, a partir das 19:30 horas (nesse tempo, o programa A Voz do Brasil tinha apenas 30 minutos de duração), que eram retransmitidos por um sistema de alto-falantes, tanto em Macapá como no interior do antigo território, hoje Estado do Amapá.[3]

Correio não oficial

O programa “Mensageiro para o Interior” assegurou mais rapidez de comunicação que os serviços oferecidos pelo Departamento de Correio e Telégrafo (DCT). As informações eram captadas e repassadas de boca a boca até chegar no destinatário, caso ele não fosse dono de um aparelho receptor de rádio. Na década de 60, um diretor do DCT exigiu que a emissora retirasse do ar o programa, sob a justificativa de que fazia concorrência à empresa estatal.

Edgar Proença foi a Brasília e mostrou um mapa do Pará ao ministro das Comunicações. Em seguida, explicou que um telegrama enviado das margens do rio Iriri para a sede do município de Altamira, no oeste do Pará (hoje chamada de Terra do Meio), levava quatro dias de barco para chegar ao destinatário. “As grandes distâncias e as dificuldades de acesso convenceram o ministro de que a população da Amazônia não podia prescindir da rapidez da mensagem radiofônica e o Mensageiro para o Interior foi mantido”.[4]

Para muita gente que mora nas áreas mais isoladas, como o arquipélago do Marajó ou a margem esquerda do rio Amazonas, o único contato com o mundo, às vezes, é feito através de um rádio de pilha ou a manivela. A Rádio Clube do Pará saiu do controle da família Proença no início dos anos 80 e foi parar nas mãos de um grupo de empresários que, em pouco tempo, vendeu a emissora para a família do então governador Jader Barbalho.

No Estado do Amazonas, a primeira rádio surgiu em 29 de setembro de 1936, ao lado do porto de Manaus, transmitindo informações para os viajantes. Com o nome de “Voz da Baricéia”, um pequeno transmissor montado pelo radioamador Lazardo Rodrigues, que depois foi vendido para a rede dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, e ganhou o nome de Rádio Baré, em 1945.

Seu primeiro diretor foi Josué Cláudio de Souza. Um dos programas de maior sucesso da emissora foi o “Avisos para o interior”, que pelas ondas tropicais chegava às mais distantes comunidades ribeirinhas. “Eram familiares da capital que mandavam suas mensagens e recomendações e também seus pedidos e encomendas de tudo que se imaginava pudesse ser remetido para Manaus”.[5]

Em 23 de julho de 1946 vai ao ar, em caráter experimental, a Radio Difusora de Macapá, emissora estatal que surge com o governador do Território Federal do Amapá, Capitão Janary Nunes. Quando comemorou o seu segundo aniversário de inauguração, em 1948, a emissora realiza a primeira transmissão esportiva, diretamente do campo da praça Capitão Augusto Assis de Vasconcelos - Atual Praça Veiga Cabral. Jogavam pela 5ª rodada do campeonato amapaense, os times do Amapá Clube e o Esporte Clube Macapá.

Agências de notícias

Em 1954, Chateaubriand inaugura mais uma emissora da sua cadeia de rádios e jornais. Desta vez foi a Marajoara, de Belém, que começou a operar num dia 7 de setembro, sob a direção do jornalista Frederico Barata, que era o superintendente do jornal “A Província do Pará”.

A emissora contou com experientes radialistas de Pernambuco e também da Rádio Tupi, de São Paulo, além de locutores e radioatores que haviam passado pela Rádio Clube do Pará. A Marajoara trabalhava com a agência Meridional, dos Associados, e com a United Press International, que abasteciam os quatro jornais falados dos primeiros anos da emissora.

Um dos programas de maior audiência foi “A Patrulha da cidade”, que tratava tanto da área policial como dos problemas urbanos de Belém. A emissora tinha um grande auditório no Largo de Nazaré, onde fazia transmissão de shows ao vivo. Quando os Diários Associados entraram em crise, a Rádio Marajoara foi vendida para o empresário Carlos Santos, que ainda hoje controla a emissora.

O homem chega à Lua

Em Roraima, a emissora mais antiga é a Rádio Roraima, fundada em 1957 pelo presidente da República, Juscelino Kubitschek de Oliveira. Durante muitas décadas a Rádio Havana, de Cuba, e a Voz da América, do governo dos Estados Unidos, tinham grande audiência em Boa Vista. A Rádio Roraima deu a cor local ao noticiário e fez a ligação entre a cidade e os garimpos, com o programa “Mensageiros no Ar”. Laucides Oliveira, que foi diretor da rádio, viveu um momento muito especial, quando transmitiu a chegada do homem à Lua.

“A Rádio Roraima estava lá, a cidade toda esperando, e quando nós demos a notícia, traduzindo a frase do astronauta, começaram a estourar os fogos em diversos pontos da cidade. Aquilo me deu uma consciência muito grande da importância que aquele trabalho tinha, da importância do jornalismo, do esforço que todos nós fazíamos”.[6]

No Pará surgiu ainda a Rádio Guajará, em 1958, mas só passou a operar em caráter definitivo dois anos depois. É que o seu proprietário, Lopo de Castro, deputado federal e ex-prefeito de Belém, tinha divergências políticas com o governo federal, que é quem autoriza a concessão de uso das emissoras de rádio e televisão.

Por causa de críticas ao governador Aurélio do Carmo, dois transmissores da emissora foram alvejados, possivelmente por forças ligadas ao movimento “baratista” (seguidores do ex-governador Magalhães Barata, falecido em 1959). Mas a rádio não interrompeu suas transmissões. Com três jornais radiofônicos diários, a emissora conquistou muitos ouvintes.

Um dos episódios marcantes dos primeiros tempos da Guajará foi a notícia, em primeira mão, em Belém, da morte do Papa João XXIII. O radialista José Travassos passou praticamente uma semana dentro da emissora, grudado no noticiário, em espanhol, da Rádio Vaticano. Atualmente a emissora tem outro nome e faz parte da Rede Boas Novas, sob controle da igreja evangélica Assembléia de Deus.

Arapongas na escuta

“O Alô, Alô Interior” foi um dos programas de muita audiência da Rádio Guajará. Era comandado por Almir Silva, que criou um estilo próprio, muito irreverente, para transmitir as mensagens. Ele começou sua atuação no Ceará e depois passou pelo rádio maranhense antes de chegar a Belém.

“A graça do programa era que após quase todas as mensagens, muitas vezes escritas por gente simples, Almir fazia um comentário jocoso. Para a mensagem que dava conta da saúde de Milico, ele reservou uma pérola, hoje inserida na história do rádio paraense.

Foi dizer a mensagem e comentar:- Essa é boa...! É a primeira vez que eu ouço falar de um milico passando mal...

Havia um detalhe: estávamos em plena ditadura militar e os setores de informações, os arapongas, tinham especial atenção pelo programa do Almir, que bem poderia estar mandando mensagens cifradas a perigosos guerrilheiros”.[7]

Horas depois o radialista foi procurado, na emissora, e levado por um oficial e mais

quatro militares para o quartel do Exército, para prestar esclarecimentos.

O escritor Benedicto Monteiro usou o rádio transistor para fazer a ligação do tempo amazônico com o tempo universal, em seu primeiro romance.

Futurólogo Herman Khan prevê que as guerras do futuro não serão travadas diretamente entre as potências – a não ser por erro de cálculo ou acidente – mas em território de países subdesenvolvidos.

Dizendo querer evitar uma guerra civil, o Presidente da República, já deposto, exila-se no Uruguai.[8]

O cosmonauta russo, Bykovsky, sobe ao espaço a bordo da Vostok VI, seguido de Valentina Tereshkova, a primeira mulher a se lançar no espaço sideral.

O Vaticano informa que mais de 7 mil padres pediram licença do celibato.

No momento em que o povo cubano canta “Nikita, Nikita, lo que se dá no se tira”, Nikita Kruchev retira 40 foguetes de alcance médio e intermediário, equipados com ogivas nucleares, que ele secretamente enviara a Cuba para que montassem sua base de mísseis, a 100 quilômetros da costa americana.

Verde Vagomundo

“Eu apelei para o rádio transistor porque realmente o rádio transistor processou uma revolução no Baixo-Amazonas. Ele levou aquele povo notícia e conhecimento que ele jamais poderia ter, porque é totalmente isolado do mundo. Depois que terminou a época do ‘regatão’ no Baixo-Amazonas, que extinguiram-se as grandes companhias de navegação, faliram as grandes casas aviadoras, praticamente essa região ficou sem comunicação, porque a comunicação era o regatão”.[9]

Não foi por acaso que a Rádio Clube do Pará manteve no ar, por mais de 30 anos, um programa líder em audiência, no horário noturno, que se inspirava no modelo do comércio ambulante fluvial, que assegurava o suprimento de matéria-prima para a economia da borracha.

Era “O regatão vem aí”, apresentado por Jacy Duarte, que levava muita música sertaneja, piadas e lendas amazônicas. Tinha três personagens: o velho caboclo, de origem nordestina, o padre e o sacristão.

“O velho representava o caboclo esperto que zombava muito e contava estórias fantasiosas ao sacristão Bastião Abestado, como a cobra que engolia barco, peixe que voava e assim por diante. O padre sempre aparecia depois para repreender o velho. E nisso a viagem prosseguia”.[10]

Caiari no Guaporé

Enquanto isso, novas rádios vão surgindo. Em 1960 foi a vez da Rádio Difusora do Pará, que pertencia ao ex-governador Moura Carvalho. Depois mudou para Rádio Liberal, mesmo nome do jornal que apoiava o PSD, o partido que estava no poder no Pará.

Um dos bons programas da emissora era o “Dez dedos de som”, que ia ao ar todas as noites, com muito cavaquinho, piano e violão. Joaquim Antunes, que já havia passado pela PRC-5 e Marajoara, foi diretor de programação da Rádio Liberal. A emissora ainda hoje está sob controle dos herdeiros de Rômulo Maiorana, que adquiriu a rádio de Moura Carvalho.

No antigo Território do Guaporé (atual Rondônia) foi lançada, em 1961, a Rádio Caiari, pelas mãos do padre salesiano Vitor Hugo. O nome da rádio é uma homenagem à primitiva denominação do rio Madeira e de um bairro de Porto Velho, onde a rádio está instalada.

O primeiro transmissor foi adaptado de um velho aparelho de radioamador, usado na Segunda Guerra Mundial para passar sinais de telegrafia. A rádio foi instalada inicialmente no Colégio Dom Bosco. Em 1964 surge a Rádio Educadora, de Guajará-Mirim, também ligada à Igreja católica.

No oeste do Pará foi inaugurada, também em 1964, a Rádio Rural de Santarém, ligada ao bispo daquela cidade, e que se propõe a ser um instrumento para alfabetizar e educar as populações rurais. Sob a direção de frei Juvenal, a rádio se volta para a educação popular em parceria com o Movimento de Educação de Base, a pastoral católica para educação.

Controle ideológico

No período da ditadura iniciada em 1964, os militares criaram, em 1977, a Rádio Nacional da Amazônia, ligada à Radiobras, com o objetivo de neutralizar o sinal de rádios estrangeiras na região, principalmente a Rádio Havana. Mas com o passar dos anos, a emissora acabou contribuindo para o processo de integração das populações locais, que passaram a contar com uma programação nacional, que hoje conta com um bom nível de qualidade.

A emissora funciona e transmite sua programação de Brasília, e busca valorizar a riqueza cultural da região, além de levar até as áreas fronteiriças notícias em tempo real fornecidas pela Agência Brasil, a agência oficial do governo.

A concessão de rádio, que sempre esteve vinculada a uma certa afinidade do pretendente aos governantes de plantão, permitiu a ampliação gradativa das emissoras, nos mais diferentes pontos do interior amazônico, até 1985. Com a chegada de José Sarney à Presidência da República, essa prática se tornou mais explícita, o que facilitou a formação de novos currais eleitorais, agora comandados por um moderno tipo de coronelismo, o coronelismo eletrônico.

“A partir dos anos 80 firmaram-se no Brasil dois tipos de relacionamento entre o rádio e a política. De um lado, radialistas com programas de grande audiência que se candidataram a cargos públicos e foram eleitos com os votos dos ouvintes. De outro, políticos que se tornaram donos de emissoras vinculando o seu apoio ao Executivo à concessão de canais AM ou FM. Nos dois casos, os objetivos têm sido, quase sempre, usar o rádio como meio de divulgação pessoal e obter vantagens com isso, principalmente eleitorais”.[11]

Outra distorção do papel do rádio, principalmente da emissora comercial, é que, de uma maneira geral, sentindo o efeito da concorrência com a televisão, envereda pelo caminho mais fácil para conquistar a audiência. Dirige o seu foco para programas que tratam das misérias humanas. “(...) as emissoras de rádio têm programas exclusivos para a violência, onde são veiculados velhos preconceitos e estimulado um humor mórbido dirigido não apenas contra os ‘marginais’ agressores, mas também contra as vítimas”.[12]

Boas experiências

Hoje existem mais de uma centena de rádios AM e FM operando na Amazônia, além das novas emissoras, as rádios comunitárias, que contam com um menor raio de alcance, mas que podem prestar bons serviços à população das localidades onde estão instaladas.

As emissoras educativas e as ligadas a instituições religiosas têm utilizado o potencial do rádio para um papel mais formativo do cidadão. Com apoio do Unicef, a Rádio Rural de Santarém desenvolve um projeto de educação nos municípios de Santarém e Belterra, no Pará.

Voltado para crianças e adolescentes de 1ª à 4ª série do ensino fundamental e implantado desde 1999, o projeto beneficia 30 mil estudantes e 1.100 professores. Crianças, adolescentes e professores sintonizam o “Para Ouvir e Aprender”, através de aparelhos movidos a pilha ou a manivela, nas escolas onde não existe energia elétrica ou solar.

Outra boa experiência é a do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que desde 1996 criou o programa Potyrõ, que significa "todas as mãos juntas". É produzido em Belém, pela empresa Ver-a-Mídia e distribuído, semanalmente, para 107 emissoras de rádio em todo o país. Em formato jornalístico, o programa aborda os principais problemas dos povos indígenas e procura resgatar os valores culturais das diversas comunidades indígenas.

Improviso e empirismo na TV

Os governos militares e sua geopolítica previam a integração da Amazônia ao restante do território brasileiro de qualquer maneira. E como existem sérias dificuldades físicas, uma das alternativas encontradas foi por meio das telecomunicações.

“A televisão talvez fosse o melhor meio de comunicação para representar esta espécie de integração. Porque refletia a acumulação e concentração de capital, era formada por um oligopólio da indústria da informação, estava situada num país dependente e tendia a reproduzir internamente as disparidades a nível internacional. De um lado, a importação dos padrões norte-americanos de programação reforçava as tendências e legitimava a própria dependência; do outro, a televisão servia aos interesses dos grupos dominantes e, sob rígida censura, legitimava a política econômico-financeira do Governo e reforçava os valores da coalizão dominante do poder pós-64”, afirma Sônia Moreira.

Em setembro de 1950 a televisão chega ao Brasil pelas mãos de Assis Chateaubriand, que também estende sua ação para a Amazônia. Com um atraso de 11 anos, a primeira emissora inaugurada em Belém foi a TV Marajoara, Canal 2, em setembro de 1961.

De início a programação era quase toda local. Junto com a rádio, a TV Marajoara chegou a contar com cerca de 300 pessoas entre seus empregados. A emissora só permanecia no ar por três horas, no início da noite. Chegou a ter dois telejornais diários, novelas e programas musicais. Tudo apresentado ao vivo.

“A TV Marajoara traduziu o improviso e o empirismo da chegada da televisão. Assim como o resto do país, o Pará não possuía estrutura para ganhar uma emissora de televisão.[13]. Não havia anunciantes em potencial. A economia de Belém era forte como entreposto comercial.

A atividade industrial no Estado do Pará era pouco expressiva, depois da Segunda Guerra Mundial. Predominavam as empresas ligadas ao extrativismo da castanha, do fumo, da fiação e tecelagem de aniagem, com aproveitamento das fibras naturais (malva e juta) e de bebidas (guaraná e aguardente).

A televisão começa a mudar os hábitos da população, até então acostumada a sentar na porta de suas casas para conversar, no final da tarde e início da noite. As brincadeiras de crianças como roda, pira-cola, macaca (amarelinha) e outras, vão aos poucos desaparecendo. Todo mundo corre para frente dos aparelhos, nas poucas casas, onde a família tem condições de adquirir o que se chamava “cinema em casa”.

Pouco a pouco a produção local, que envolvia atores, cenógrafos, iluminadores, vai diminuindo, na medida em que a cabeça de rede da TV Marajoara, a TV Tupi, começa a enviar seus enlatados nacionais e internacionais. O jornalismo, o esporte e os programas de variedades ainda sobreviveram durante muitos anos, antes da modernização dos meios de comunicação, como o video tape e as transmissões via satélite.

Chega a concorrência

A concorrência chega em 1967 com a inauguração da TV Guajará – Canal 4, do mesmo grupo da rádio, já como transmissora da TV Globo. A emissora de Belém começou suas atividades na era do video tape. O jornalismo era feito no mesmo modelo da pioneira, a TV Marajoara: as matérias eram gravadas em filmes de 16 milímetros, sem a utilização de áudio.

O repórter “fazia as filmagens na rua e voltava para a estação, onde havia um laboratório para revelação do filme. Às vezes o filme era editado, não eletronicamente, mas colando uma cena na outra – com cola – assim como são editados os filmes de cinema, para ser exibido ao vivo no telejornal”.[14]

A dança dos canais

A TV Guajará perde a condição de afiliada da Globo, em meados dos anos 70, e passa a transmitir a programação da TV Bandeirantes. A programação da Globo vai para o novo canal que surge em Belém, a TV Liberal – Canal 7, da família Maiorana, que inaugura a emissora em abril de 1976. Bem diferente da TV Marajoara e em menor proporção da TV Guajará, a TV Liberal tem pouco espaço para a programação local, uma exigência da rede nacional, que só permite os telejornais e os programas esportivos.

Com a força da Globo e com o suporte de dois veículos líderes de leitores (jornal O Liberal) e de audiência radiofônica (Rádio Liberal), a TV Liberal em pouco tempo conquista os telespectadores. Mas sua atuação fica restrita à região metropolitana de Belém. Somente após a metade dos anos 80 é que a programação da emissora chega aos mais distantes locais do interior.

Para isso o grupo liderado por Rômulo Maiorana firma um convênio com o governador Hélio Gueiros (ex-diretor e redator do jornal O Liberal) e passa a utilizar as torres da Fundação de Telecomunicações do Pará (Funtelpa), controladora da TV Cultura, para transmissão da programação da TV Liberal, que ainda é remunerada por levar a programação da Globo ao interior paraense. O convênio, embora denunciado ao Ministério Público, se mantém por mais de 15 anos.

No oeste do Pará

A distância entre Belém e Santarém, a principal cidade do oeste do Pará, é de uma hora de avião a jato ou três dias de barco. Esse isolamento fez com que lideranças políticas e empresários da região se mobilizassem para conseguir um canal de TV para Santarém, que até a década de 80 era o segundo município em população (hoje é Ananindeua, na região metropolitana de Belém). No dia 26 de maio de 1979 foi inaugurada a TV Tapajós, afiliada da Rede Globo, sob o comando dos empresários Joaquim da Costa Pereira e Paulo Campos Correia, que um ano depois conseguiram a concessão também de uma emissora de rádio FM, a Rádio Tapajós, hoje 94 FM.

Com o fim da TV Marajoara, a retransmissora da Tupi, em Belém, passa a ser filial do SBT, que entra no ar, ainda como Canal 2, em setembro de 1981 e posteriormente muda para Canal 5. Em 1986 surge a estatal TV Cultura, como repetidora da TV Educativa do Rio de Janeiro. Sob a presidência de Orlando Carneiro, que vinha da TV Marajoara, a emissora vai ao ar pelo Canal 2.

Posteriormente a emissora passa a ter programação local. Começa com um telejornal, um programa esportivo, o “Sem Censura Pará”, o “Revista Feminina” e o infantil “Catalendas”, que ganha projeção nacional e passa a ser exibido na Rede Pública de Televisão. A emissora faz parte da Funtelpa, que abriga também a Rádio Cultura FM.

Em dezembro de 1988 o empresário Jair Bernardino, do setor de revenda de veículos e de distribuição de gás, monta a TV RBA (Rede Brasil Amazônia), Canal 13, que passa a transmitir a programação da TV Manchete. Com a morte de Bernardino, a emissora passa para o controle da família do líder político Jader Barbalho, que já controlava a Rádio Clube do Pará e o jornal Diário do Pará.

A emissora, que começou com apenas um programa local de 15 minutos, o Jornal da RBA, ampliou, a partir de 1993, o espaço para quatro horas. Primeiro com o programa “Barra Pesada”, que trata do noticiário policial e algumas demandas comunitárias. Em seguida entrou no ar outra variação do Barra Pesada, o “Metendo Bronca, o chicote do povo”.

Os apresentadores dos dois programas foram eleitos vereadores na Câmara Municipal de Belém. A RBA também dedica grande espaço ao esporte paraense, com dois horários diários. O programa semanal de entrevistas, “Argumento”, tem grande audiência na grande Belém.

Mensagens evangélicas

Já na década de 90 chega a TBN, a TV Boas Novas, Canal 4, resultado da venda da TV Guajará para um grupo de pastores ligados à igreja Assembléia de Deus. A emissora passa a integrar a Rede Boas Novas, de Manaus, fundada pelo pastor Samuel Câmara, que começou com uma emissora de televisão (antiga TV Ajuricaba), com 38 repetidoras no interior e uma emissora de rádio.

Atualmente a RBN conta com três canais de satélite, 48 emissoras de TV aberta, 34 canais de TV a cabo e oito emissoras de rádio espalhadas pelo país. As cabeças de rede são as emissoras de Belém e Manaus.

Com o nome de Rádio e Televisão Marajoara, Canal 10, a Rede Record chega a Belém, com emissora própria, em 10 de julho de 1997. O canal foi adquirido do empresário Carlos Santos, que comprou a Rádio Marajoara, mas não conseguiu implantar a sua emissora em Belém. Somente em 2003 ele coloca no ar o Canal 50, em UHF, no município de Ananindeua. Carlos Santos é ligado ao setor lojista, é cantor e ex-governador do Pará.

Imagem da Venezuela

No Amazonas, a primeira imagem de televisão foi a TV Manauara, que surgiu como hobby da família Hauache, que lançou um sistema parecido com o das atuais TVs a cabo. Funcionava no centro de Manaus, e só sintonizavam o canal os moradores das avenidas Eduardo Ribeiro, 7 de Setembro e Joaquim Nabuco, por onde passava o cabo da engenhoca, que tinha apenas uma licença, mas não era oficialmente um emissora.

Os cabos eram fixados nos postes da rede de energia elétrica. O maior problema era provocado pelos papagaios (pipas), que com suas linhas enceradas, cortavam os cabos e dificultavam o sinal. Nessa época, muita gente, em Manaus, tinha aparelho de televisão e captava também o Canal 2 de Caracas, na Venezuela. A imagem era muito precária, com muito chiado e chuvisco.[15]

Com a instalação da Zona Franca de Manaus, a partir de 1967, um pólo industrial, que funciona como plataforma de exportação de mercadorias, principalmente eletrodoméstico , criou um clima favorável para a instalação da primeira emissora no Amazonas. Após participar de uma licitação pública, a família de Abdul Hauache Neto conseguiu a concessão do Canal 38, UHF e implantou, em setembro de 1967, a primeira emissora aberta, TV Ajuricaba, em homenagem a um herói indígena da região.

Até 1974 a TV Ajuricaba reproduzia a programação nacional da TV Record, que fazia parte da Rede de Emissoras Independentes. A partir daquele ano a emissora amazonense se vincula à TV Globo, até 1986, quando passa a ser afiliada da Rede Manchete. Hoje a TV Ajuricaba, Canal 8, pertence à Rede Boas Novas de Rádio e Televisão.

Ligada ao grupo de Chateaubriand, surge em 1971 a TV Baré, controlada por 30 sócios, que aos poucos foram vendendo suas cotas para o empresário Umberto Calderaro, do jornal A Crítica. A partir de 1981, o sócio majoritário muda o nome da emissora para TV A Crítica, que hoje integra a Rede Calderaro de Comunicação, que inclui mais dois canais em UHF. A TV A Crítica é afiliada do SBT no Amazonas.

Fitas por malotes

A TV Amazonas, Canal 5, foi ao ar em 1972, resultado de uma sociedade entre Phelippe Daou, Milton Cordeiro, Joaquim Margarido e Robert Phellipe. Como as duas grandes redes da época, Tupi e Globo, já tinham afiliadas no Amazonas, a nova emissora passa a adquirir programas da TV Bandeirantes, que também estava surgindo no mercado, mas ainda não era uma cabeça de rede.

O passo seguinte foi partir para o interior do Estado e também em direção às outras capitais da Amazônia. No interior foram construídas dezenas de retransmissoras. A empresa entrava com pedido de concessão e quando o Ministério das Comunicações autorizava, os seus dirigentes solicitavam às prefeituras a cessão do terreno para instalar a torre e o transmissor, e com isso o grupo foi montando uma rede.

A partir de 1973 a TV Amazonas se tornou afiliada da Rede Bandeirantes, onde permaneceu até 1986, quando passou a retransmitir a programação da Rede Globo de Televisão. Hoje fazem parte também da Rede Amazônica de Rádio e Televisão, a TV Roraima, em Boa Vista, que começou a funcionar em julho de 74 (inicialmente implantada pelo Governo do Território de Roraima); a TV Rondônia, instalada em Porto Velho, em setembro de 1974; a TV Acre, que opera desde outubro de 1974, em Rio Branco; e a TV Amapá, que surge em janeiro de 1975, em Macapá.

Estão vinculadas ainda àquela rede, 202 retransmissoras, sendo 94 no Amazonas; 32 no Acre; 17 no Amapá; 39 em Rondônia; e 20 em Roraima. A logística para distribuir e manter os programas exigia muito esforço. Antes da utilização de satélite, a rede trabalhava com seis mil fitas em quase toda a Região Norte (exceto o Pará e o Tocantins), que seguiam de avião, de ônibus ou por barco.

Porém o maior transtorno acontecia quando os malotes eram extraviados. Desapareciam filmes e capítulos de novelas, o que provocava as mais inusitadas reações da população. A partir de 1980 esse quadro mudou. E dez anos depois a rede lançou o AmazonSat, um canal de satélite que serviu para romper o isolamento em vários outros pontos da Amazônia.

É transmitido em canal aberto para várias emissoras UHF, na região, por antena parabólica em qualquer parte do Brasil e pela Internet nos demais países. A programação é voltada exclusivamente para a cobertura dos assuntos amazônicos, sua população, cultura, economia, meio ambiente e o desenvolvimento sustentável.

Estão no ar, também no Estado do Amazonas, a TV Rio Negro, Canal 13, do Grupo Garcia, que surgiu em 1990, e que hoje é afiliada da Rede Bandeirantes; a TV Manaus, que distribui a programação da Rede Record de Televisão; e a TV Educativa do Amazonas, que foi ao ar pela primeira vez em 1971. Pertence ao Governo do Amazonas e em 1992 se tornou Fundação Televisão e Rádio Cultura do Amazonas (Funtec/AM), filiando-se à TV Cultura de São Paulo. Sua programação local é voltada para o jornalismo e a cultura.

Nos Estados do Acre, Amapá, Rondônia e Roraima todas as demais emissoras de televisão chegaram depois da Rede Amazônica, que é afiliada da Rede Globo. No Acre existem ainda a TV Gazeta, Canal 11, que distribui a programação da Rede Record; A TV 5, Canal 5, ligada à RTV; a TV Rio Branco, Canal 8, afiliada ao SBT; e a TV Cultura, Canal 2.

Além da TV Rondônia, da Rede Amazônica, que transmite a programação da Globo, o Estado conta ainda com a TV Candelária (RTV), TV Norte (Record), TV Alamanda (SBT) e TV Meridional (Bandeirantes). Em Roraima, estão no ar a TV Roraima (Globo), TV Caburaí (Band), TV Imperial (Record), TV Tropical (SBT), TV Ativa (Gazeta), TV Maracá (CNT) e TV Universitária (antiga TV Macuxi), ligada à RPTV.

Ainda hoje, na era da comunicação digital, o rádio ainda cumpre importante papel na Amazônia, já que naquele imenso território, onde os rios funcionam como as grandes avenidas, em muitas localidades, como na vila Serrinha, comunidade quilombola do rio Trombetas, no Baixo-Amazonas, Norte do Pará, o aparelho de rádio, de pilha ou a manivela, reduz a distância com a cidade, já que a viagem, em pequenas embarcações, demora três horas de ida e mais três de volta. Por isso, todos os dias, entre às 4 e 5 horas da tarde, dona Miraci Regis de Melo liga o seu aparelho para ouvir as mensagens do programa “Correio do Interior”, da Rádio Jornal Cidade de Oriximiná.

BIBLIOGRAFIA

1 - Vieira, Ruth e Gonçalves, Fátima, “Ligo o rádio para sonhar”, Coordenadoria da Prefeitura de Belém, 2003, Belém (PA).

2 - Monteiro, Benedicto, “Verde Vagomundo”, Edições Gernasa, 1974, Rio de Janeiro (RJ).

3 - Bandeira, Euclides “Chembra”, A selva e as ondas do rádio, .br, 2004;

4 - Moreira, Sônia Virgínia, Rádio Palanque - Fazendo política no ar, Mil Palavras, Rio de Janeiro, 1998

5 - Silva, Marina, Mulheres na Amazônia – Intimidade exposta, texto para estudo, cidadania/marina.

6 - Leal, Ana Tereza e Lisboa Waldirene, Retratos da Televisão no Pará, TCC do curso de Comunicação Social da UFPA, Belém, 2000.

7 - Cabral, Eula Dantas Taveira, História da Televisão Amazonense, Universidade Metodista de São Paulo, 2002.

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[1]Paulo Roberto Ferreira é jornalista.

[2] O primeiro jornal impresso na Amazônia foi O Paraense, em 1922.

[3] Site da Rádio Difusora de Macapá

[4] Vieira, Ruth e Gonçalves, Fátima, Ligo o rádio para sonhar, Coordenadoria da Prefeitura de Belém, 2003.

[5] Site da Rádio Baré

[6] Entrevista concedida a Paulo Roberto Ferreira, em Boa Vista, em 16/03/2004

[7] Bandeira, Euclides “Chembra”, A selva e as ondas do rádio, .br

[8] Monteiro Benedicto, Verde Vagomundo, Editora Cejup, 6ª edição, 1997, Belém.

[9] Monteiro, Benedicto, entrevista ao jornal Bandeira 3, Belém, 1975

[10] Vieira, Ruth e Gonçalves, Fátima, Ligo o rádio para sonhar, Coordenadoria de Comunicação da Prefeitura de Belém, 2003.

[11] Moreira, Sônia Virgínia, Rádio Palanque - Fazendo política no ar, Mil Palavras, Rio de Janeiro, 1998

[12] Silva, Marina, Mulheres na Amazônia – Intimidade exposta, texto para estudo, cidadania/marina.

[13] Leal, Ana Tereza e Lisboa Waldirene, Retratos da Televisão no Pará, TCC do curso de Comunicação Social da UFPA, Belém, 2000.

[14] Ana Tereza e Lisboa Waldirene, Retratos da Televisão no Pará, TCC do curso de Comunicação Social da UFPA, Belém, 2000.

[15] Cabral, Eula Dantas Taveira, História da Televisão Amazonense, Universidade Metodista de São Paulo

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