UMA ANÁLISE DO PENTECOSTALISMO NO MUNDO



UMA ANÁLISE DO PENTECOSTALISMO NO MUNDO

CAPÍTULO UM

Introdução

Quando eu comecei a pesquisar o pentecostalismo há quase quarenta anos atrás eu não poderia imaginar que ao final de minha carreira acadêmica eu retornaria para esse mesmo tópico. Na verdade, minha esposa, que tem acompanhado minha peregrinação teológica paciente e criticamente—dou graças a Deus por uma esposa questionadora e crítica—perguntou-me: “Por quê você investe tanto trabalho nesse livro? Sua carreira acadêmica está encerrada.”

Se a esposa da gente faz tal pergunta, é bom a gente ter uma boa resposta. Minha resposta foi: A principal razão não é o tremendo crescimento do pentecostalismo/carismatismo/independentismo de zero para quase 500 milhões em menos de um século, um crescimento singular na história da igreja sem excluir os primeiros séculos da igreja. A principal razão é que o pentecostalismo “chegou a uma encruzilhada.”[1] Surge de suas próprias fileiras o desafio por uma historiografia crítica, por análises social e política, por um tratamento mais diferenciado da obra do Espírito, por uma espiritualidade que não exclua pensamento crítico, por uma nova avaliação das culturas pré-cristãs presentes nas igrejas-irmãs do Terceiro Mundo e por uma abertura ecumênica e diálogo. Esta estória tem que ser contada, principalmente porque ela não é vista pelos pentecostais como uma concessão para o mundo ou para o movimento ecumênico mas como uma leitura mais completa de seu próprio passado. Os detalhes são aprofundados neste volume. É difícil prever qual o caminho que trilharão as principais igrejas pentecostais, o movimento de renovação carismática e as “igrejas indígenas não-brancas” (Barrett) pentecostais ou assemelhadas no Terceiro Mundo. É minha esperança e minha oração que este volume possa ajudar pentecostais e não-pentecostais a alcançarem uma compreensão mais genuína do que significa ser pentecostal.

Comparado com o volume anterior, The Pentecostals [Os Pentecostais], este é um livro totalmente teológico, mas expressa sua teologia na forma de histórias. Isto parece ser para mim uma forma de tratamento acadêmico mais adequado às espiritualidades contextuais do pentecostalismo do que as afirmações e discussões proposicionais, também chamadas universais, porque ele situa as práticas e convicções pentecostais em seus diferentes contextos culturais. Isto já fica evidente na análise complexa das cinco raízes históricas, que podem ser representadas graficamente da forma abaixo:

Eu não sou o único que tem descoberto a importância de nosso tópico para a religião, para a política e para o futuro de nosso mundo. Harvey Cox, famoso por sua obra The Secular City [A Cidade Secularizada], em contraste com a ignorância geral sobre o assunto na academia, escreve: “Um movimento religioso que já conta com quase meio bilhão de pessoas e está se multiplicando geometricamente não deve ser descartado tão facilmente.” Cox cita sociólogos eminentes projetando que “no início do século vinte e um os pentecostais, em todas as suas diferentes manifestações, superarão em número aos católicos e protestantes juntos.” Entretanto, “sua verdadeira área de crescimento não está na América, não está na televisão e também não está entre pessoas brancas”[2] mas sim no Terceiro Mundo, porque representa uma certa “secularização cristã com os pés no chão, voltada para o terrestre.”[3]

É isto que torna o pentecostalismo atraente. Foi por isto que uma igreja presbiteriana prestigiosa de Nova Iorque, a Riverside Church, selecionou como pastor dentre vários candidatos um pentecostal negro, o professor James A. Forbes[4] do Union Theological Seminary, sem solicitar-lhe que abandonasse sua afiliação pentecostal? Eu acho que vai demorar um pouco até que as universidades e catedrais européias busquem por auxílio junto aos pentecostais. Mas quem sabe?

“A espiritualidade pentecostal é o futuro,” diz Werner Hoerschelmann,[5] um dos “Hauptpastoren” da Igreja Luterana em Hamburgo. Por muitos anos, Hans-Jürgen Becken, um especialista alemão das Igrejas Independentes Africanas, tem ressaltado não apenas o crescimento mas também a contribuição teológica e médica dessas igrejas. De um encontro com elas ele espera não apenas auxílio na “solução da visível crise de nossos serviços ocidentais de saúde mas também uma mudança de coração do indivíduo, seja ele o médico ou o paciente.”[6] John A. Mackay, o grande ancião do presbiterianismo e do ecumenismo, ex-presidente do Princeton Theological Seminary, disse que “a verdadeira esperança do ecumenismo é a renovação carismática,”[7] pois “vida com diferenças é melhor do que morte harmoniosa.”[8] Parece claro para qualquer observador bem informado que o pentecostalismo e o ecumenismo devem encontrar uma forma de trabalhar juntos muito mais intensamente. Isto exigirá arrependimento de ambos os lados, e compromisso organizacional, financeiro e teológico. Afinal, o Conselho Mundial de Igrejas buscou ativamente a cooperação da igrejas ortodoxas (um segmento muito menor do cristianismo) e isto fez—corretamente, eu penso—com grande risco financeiro e político. Então por que não com os pentecostais?

Parece que aos poucos o Conselho Mundial de Igrejas vai se movendo nessa direção. Sobre a questão “Para onde vai o Conselho Mundial de Igrejas?” seu secretário geral, Konrad Raiser, tem isto a dizer: “O atual crescimento do cristianismo é quase inteiramente devido às igrejas evangélicas e pentecostais . . . Isto significa para o Conselho Mundial de Igrejas que ele tem que se abrir para essas novas manifestações de existência cristã, de igreja cristã e de testemunho cristão.”[9]

Do lado pentecostal o problema também tem sido reconhecido como será visto na seção V (pp. 334-88). Como diz o ecumênico pentecostal Cecil M. Robeck, Jr.: “No final, o século vinte será avaliado pelos historiadores da igreja como o século no qual o Espírito Santo gerou e nutriu dois grandes movimentos: um deles formalmente conhecido como o Movimento Ecumênico, o outro, dificilmente reconhecendo-se a si mesmo como ecumênico, o Movimento Carismático/Pentecostal. Esses dois movimentos têm tido muito em comum, mas raramente têm reconhecido a mão ou o Espírito de Deus estando presente no outro.” E Dale T. Irvin acrescenta que os pentecostais ainda não atuaram sobre a teologia ecumênica de seu fundador, William J. Seymour.[10]

A discussão crítica com não-pentecostais pode ser vista no crescente interesse de teólogos pentecostais na obra de Jürgen Moltmann. Eles debatem com ele por escrito e face a face. O Journal of Pentecostal Theology [Revista de Teologia Pentecostal] dedicou uma edição inteira ao The Spirit of Life [O Espírito de Vida] de Moltmann. Os teólogos pentecostais parecem estar bem informados sobre a totalidade da obra de Moltmann, pelo menos em relação àquilo que foi publicado em inglês. Alguns leram seus livros também em alemão. Eles acolheram com alegria sua superação do Filioque (capítulo 17, pp. 218-22), sua ênfase na pneumatologia, sua tentativa em incluir a experiência na reflexão teológica. Entretanto, eles lamentam que ele parece não estar consciente da crescente literatura acadêmica de carismáticos e pentecostais.[11] Moltmann se defende contra essa reprovação. Ele se declara teólogo alemão, influenciado por Lutero, Melanchton, Kant, Hegel e Barth.[12] Por estas razões questões específicas dos pentecostais não encontraram eco em sua obra. Isto obviamente é verdade. Porém, isto também mostra a estreiteza daquilo que chamamos teologia acadêmica. Moltmann diz contra a reprovação dos pentecostais que ele “infelizmente nunca foi o ‘teólogo do Conselho Mundial de Igrejas.’”[13] Apesar disto ele tem estado sempre bastante alerta para o desenvolvimento ecumênico. Se um teólogo de tamanha proeminência confessa sua ignorância sobre assunto tão importante, como se sairão seus colegas? Isto é uma infelicidade e terá que mudar no futuro para que a teologia européia não seja a ideologia de algumas “tribos européias ocidentais.”

Uma das mais difíceis mas também das mais promissoras áreas de cooperação ecumênica é a oração—oração em público. Oração pública é muito difícil pois exige equilíbrio entre exibicionismo por um lado e trivialidades religiosas por outro. As diferenças psicológicas e culturais entre uma oração latino-americana e uma alemã, entre uma oração pentecostal e uma luterana, são enormes. Não obstante, acredito que existem formas de orar conjuntamente, não apenas a Oração do Senhor.

Por muitos anos tenho tentado formular orações nas quais possam participar pessoas religiosas e não-religiosas, pessoas da religião de alta voltagem dos pentecostais e da religião de baixa tensão das igrejas tradicionais. Eu inseri algumas destas neste volume.[14]

Querido Deus, Meu pai diz que eu sou muito pequeno. Minha mãe diz que eu sou vagaroso. Minha professora diz que eu sou um sonhador. Meu chefe diz que os outros são melhores.Meus colegas dizem que me falta solidariedade. Meu comandante diz que eu sou um covarde. Meu pastor diz que eu sou um pecador. Minha esposa diz que os outros ganham mais. Meus filhos dizem que eu sou quadrado. E tu, meu Deus, o que tu dizes? Tu dizes que tu me criaste segundo tua semelhança.

Este livro contém muitas citações. Elas são importantes, de qualquer forma mais importantes do que minha interpretação, pois pretendo documentar o estado do debate em um decisivo momento da história carismática/pentecostal. Estas citações são quase sem exceção passagens retiradas de artigos acadêmicos. Eu pude eliminar quase que totalmente propaganda, polêmicas e literatura devocional. Estou buscando leitores do tipo que descrevi na dedicatória: carismáticos/pentecostais e seus oponentes mas também aqueles que aspiram pela renovação da Igreja. Onde utilizo fórmulas que possam ferir algum leitor, peço por perdão logo em seguida. Minha intenção não é ferir, mas desafiar. Escrever um livro teológico sobre tal tema controverso somente pode ser realizado na esperança de misericórdia, tanto de Deus como dos leitores.

Este livro não é uma tradução do alemão. Tentei escrevê-lo em inglês. Sou grato a Joan Pearce, minha ex-secretária de Birmingham, por ajudar-me. Outras pessoas também me ajudaram generosamente. Professores Robeck e Spittler, ambos ministros das Assembléias de Deus e do Fuller Theological Seminary, Pasadena, graciosamente me forneceram informações e freqüentemente discutiram o conteúdo deste livro. William Faupel, professor no Asbury Theological Seminary, Wilmore, Kentucky, e um de meus ex-alunos de doutorado, forneceu-me regularmente notícias da Sociedade para Estudos Pentecostais. Outros pesquisadores pentecostais me enviaram artigos e livros e me mantiveram informados sobre importantes tendências. O crédito lhes é dado onde quer que tenha usado o material que forneceram. Finalmente, quero agradecer o editor por sua paciência e encorajamento.

Krattigen, Suíça 28 de setembro de 1997

Setenta e cinco anos após a morte do fundador negro do movimento carismático/pentecostal, William J. Seymour

CAPÍTULO DOIS

Santos em Birmingham

A seguinte estória procura cobrir todos os aspectos da espiritualidade carismática/pentecostal visando fornecer uma introdução à este tipo de religião. O principal personagem (Sr. Chips) é obviamente fictício[15] mas os eventos ou estão documentados ou foram observados por mim. O “culto memorial” ao final da estória era—no tempo que escrevia—desejo que fosse verdade. Desde então foi feito muito progresso.[16] A estória começou como uma conferência na consulta entre o Movimento Carismático e o Conselho Mundial de Igrejas em Bossey[17] e desde então foi reimpressa várias vezes.

Quando o Sr. Chips se aproximava do centro da cidade o motorista do táxi apontou para a Rotunda, uma elegante torre de três andares edificada sobre o shopping center. O tráfego ficou congestionado e o táxi parou. Chips viu as luzes azuis dos carros de polícia e das ambulâncias e ouviu suas sirenes. Um alto-falante da polícia anunciou: “Isto é uma emergência. Todos os motoristas de táxi por favor venham para a Rotunda. Precisamos urgentemente de vocês.” O motorista de táxi disse, “Desculpe!” e inclinou-se para abrir a porta do táxi. Antes que Chips percebesse o que estava acontecendo viu-se parado no asfalto no frio. Por sorte ele tivera tempo o suficiente para agarrar sua mala.

Bombas em Birmingham

Ele ficou triste por nunca ter aprendido a xingar apropriadamente. Agora, ele pensava, poderia ter usado uns poucos palavrões—mas afinal ele era um homem bem educado e um professor de gramática na escola. Ele começou a andar em direção a Rua da Nova Estação, mas um cordão policial bloqueava o caminho. Um oficial da polícia ordenava que todos deixassem a área imediatamente pois uma bomba fora lançada em bar repleto de pessoas. Quando ele olhou ao redor, pode ver as vidraças estilhaçadas. Ele afastou-se mas não sabia para onde ir. Obviamente seria impossível encontrar um táxi uma vez que todos estavam sendo utilizados para auxiliar as ambulâncias no transporte dos muitos feridos para o hospital. Ele tentou telefonar para sua amiga Shirley Delattre, uma freira francesa, para informar sua situação. Ele encontrou uma cabina telefônica e procurou pelo número de Shirley, mas uma grande explosão balançou a cabina. Chips tapos seus ouvidos com ambas as mãos. Quando saltou para fora da cabina pode ver que outra bomba explodira do outro lado da rua. Ele podia ouvir os choros e gemidos dos feridos. Metade da rua estava coberta de escombros e Chips quase não acreditou em seus olhos quando viu braços e pernas esmagados e sangrando entre estilhaços de móveis, tijolos e vidros. Ele atravessou a rua correndo e ajudou uma mulher a sair dos escombros do edifício onde explodira a bomba.

“Exatamente como na guerra, exatamente como na guerra,” ele pensou. “E nós não aprendemos nada.” Embora a mulher estivesse apenas levemente ferida, sua face fora horrivelmente cortada por cacos de vidro e ele estava coberta de sangue. Chips deu-lhe seu lenço. Então os policiais e o pessoal das ambulâncias que estavam trabalhando na limpeza do bar onde ocorrera a primeira explosão chegaram correndo para procurar por mais vítimas. Um oficial da polícia disse polida mas firmemente para Chips, “Por favor saia daqui. Pode haver outra bomba guardada para nós.” Chips olhou para ele. “É claro. Se ao menos eu soubesse para onde ir.”

De alguma forma ele encontrou um táxi, e o motorista disse-lhe que ouvira na rádio local que mais de duzentas pessoas tinham sido feridas e vinte tinham morrido. “São sempre esses irlandeses sedentos de sangue,” ele acrescentou, e balançou sua cabeça.

“Bem na hora, bem na hora,” disse Shirley Delattre, quando Chips chegou em sua casa. “Esta noite você irá comigo a uma reunião de espiritualidade na casa do Sr. Hellberg, um famoso cirurgião ortopedista.” “Espere um minuto . . . ” Chips murmurou. “Não, não há tempo para esperar nada, você pode explicar tudo no caminho.” Antes que Chips se desse conta do que estava acontecendo ele estava no “patinho feio” francês de Shirley Delattre e assim eles partiram.

Ele limpou sua garganta e disse, “Vocês carismáticos celestiais, vocês não se preocupam com nada neste mundo. Uma vez que vocês têm seu grupo religioso, nada mais interessa. O mundo poderia se despedaçar ou morrer de fome . . . ”

“Ah, está certo,” sorriu a freira francesa. “Tudo bem, meu amigo, quando chegarmos na casa de Hellberg você verá por si mesmo que este é o momento para orar e que a oração é mais importante que prantear e reclamar.”

A senhora Hellberg os recebeu pessoalmente na porta da frente e apresentou-os aos outros convidados que já haviam chegado e que estavam sentados ou em pé na enorme sala de estar. Shirley Delattre falou sobre o Sr. Hellberg para Chips: Ele era altamente conceituado por sua habilidade profissional, embora fosse considerado um pouquinho esquisito. Por exemplo, dizia-se que ele se apresentara em um banquete oficial como carpinteiro. Ele era um carpinteiro, assim ele dissera, pois consertava ossos. Ele os colocava no lugar de novo, juntava-os novamente exatamente como um marceneiro consertaria um armário antigo precioso. Em sua residência o casal Hellberg possuía um gabinete médico francês bastante antigo, fabricado no tempo de Napoleão. Chips adoraria tê-lo visto, mas não teve coragem de pedir. Afinal, ele fora convidado para uma “reunião de espiritualidade.”

Quando Jesus vem . . .

No momento, porém, a atmosfera não lhe parecia espiritual. As pessoas estavam rindo e conversando, e o que é que ele viu lá—o gerente de um banco local tinha um copo de uísque na mão. Chips o cumprimentou com um aceno de cabeça. Sim, também o filho mais velho de Hellberg estava enchendo os copos de todo mundo. Havia vinho branco, vinho tinto, uísque, cerveja e suco de laranja. Subitamente uma moça sorriu para ele e disse-lhe com um sotaque notadamente irlandês, “Boa noite, Sr. Chips. Você não me reconhece?”

Chips não conseguia reconhecê-la, até que ele percebeu que ela era a moça que limpava sua sala de aula todas as noites. De calça comprida, gorro e avental, ela parecia muito diferente. Agora pela primeira vez ele podia ver o cabelo ruivo lustroso e os olhos brilhantes dela.

“Minha irmã está comigo,” ela disse, e sorriu galhofeiramente. “Ela nunca viu um professor de gramática escolar ao vivo. Moira, venha cá!” Moira atravessou a sala e cumprimentou o Sr. Chips. “Então é assim que se parece um professor de gramática escolar,” ela disse. Embaraçado, Chips sorriu desconfortavelmente e pensou, “E é assim que se parece uma verdadeira noiva revolucionária irlandesa.” Mas, sendo um inglês, ele escondeu seus pensamentos.

Em vez disso ele falou, “Prazer em te conhecer. O que você está de fato fazendo aqui?”

“Desde o ano passado temos vindo regularmente a estas reuniões de oração,” ela respondeu. “No início, quando chegamos aqui na Inglaterra, estávamos perdidas. O clima e as pessoas pareciam muito frios. Aquele gerente de banco ali—eu limpo seu banco todas as sextas—nos convidou para virmos aqui. Ele é anglicano, mas eu sou católica. Eu resolvi perguntar ao nosso padre se deveríamos vir, e ele decidiu vir conosco e ficou atônito quando descobriu que nossos anfitriões, o casal Hellberg, são católicos também. Católicos ingleses, é claro. E, mais ainda, também encontramos aqui um grande número de freiras e monges de diferentes ordens. Eu gosto daqui.”

Parecia que ninguém ouvira falar das bombas no centro da cidade. Todos estavam contentes—irlandeses e ingleses, católicos e protestantes.

A senhora Hellberg pegou seu violão que estava pendurado na parede e começou a cantar alguns cânticos simples e curtos que o Sr. Chips nunca ouvira antes. “Espírito do Deus vivo” era um deles; outro era a estória de um homem—

Que estava sentado sozinho mendigando na beira da estrada. Seus olhos estavam cegos, a luz ele não podia ver. Ele agarrava seus trapos e tiritava nas sombras. Então Jesus veio e ordenou que suas trevas desaparecessem. Quando Jesus vem o poder do tentador é destruído, Quando Jesus vem as lágrimas são enxugadas. Ele acaba com a tristeza e enche a vida com glória Pois tudo é modificado quando Jesus vem para ficar.[18]

Todos cantaram o refrão, “Quando Jesus vem . . . ” As duas jovens irlandesas haviam tirado seus violões das caixas e também estavam tocando, enquanto um jovem negro acompanhava o cântico produzindo um baixo obstinato original com seu trombone.

O Hippie de Atenas

Então a senhora Hellberg começou a recitar um tipo de litania. Pareceu muito católica aos ouvidos do Sr. Chips, e contudo não era católica da maneira que ele esperava que fosse. A invocação dos santos começou com o “noivo da pobreza, nosso irmão Francisco, seguidor de Jesus e amigo da criação.” Ela incluiu Gandhi, “apóstolo da não-violência, vergonha para as igrejas”; “bom papa João, amigo dos pobres, que almejou a unidade de todos os povos”; Atenágoras, “patriarca do amor” e Simão Kimbangu, “profeta e prisioneiro da esperança”; os “pacificadores,” Dag Hammerskjold e Albert Luthuli, Gautama Buda, “máscara de Cristo” e “fonte de compaixão”; João de Patmos, “visionário e apóstolo, que resistiu à Besta Mundial”; Dante, Bunyan e Isaac Watts, “visionários e poetas, peregrinos da luz interior; Maria Madalena, “prostituta fiel, primeira testemunha da nova vida”; Bach, Mozart e Beethoven, “que falam a linguagem da alma”; Darwin e Teilhard de Chardin, “estudantes da terra, viajantes no passado e no futuro”; Einstein, Marx e Freud, “filhos da sinagoga”; Menno Simmons e George Fox, “exploradores do evangelho, generais na guerra do Cordeiro,” e muitos outros que Chips não conhecia. Também foram inclusas as vítimas inocentes de Coventry, Dresden e Hiroshima e as mais recentes em Londonderry, Belfast e Birmingham. (“Então, eles tinham ouvido falar das bombas?” Chips perguntou a si mesmo.) Sócrates foi chamado “o hippie de Atenas,” o que deixou o Sr. Chips bastante espantado pois, afinal, ele era um homem instruído.[19]

A senhora Hellberg continuou, lembrando a “mãe solteira, bem-aventurada Maria, fonte de nossa libertação.” A litania culminou no louvor de “nosso herói e líder, Jesus, trabalhador manual, raiz de nossa dignidade, o profeta que resistiu às autoridades estabelecidas, o Libertador, o rei pois primeiro foi servo, o poeta que nos deu uma nova linguagem, Jesus, o Filho de Deus, a brilhante pedra de esquina de nossa unidade em um novo Espírito.”

Chips ficou profundamente surpreso com esta teologia intercultural. A reunião de oração prosseguiu. Sem embaraço eles oraram por problemas pessoais, por enfermidades, filhos, seus trabalhos, a escola (aqui Chips suspirou levemente), as igrejas, seus filhos no exército britânico e seus filhos no exército republicano irlandês. Oravam várias vezes ao Espírito Santo.

“Vem, Santo Espírito!” eles cantavam.

Um homem, que Chips não conhecia, orou em línguas. Chips virou sua cabeça para poder ouvir melhor, mas não pode entender uma palavra. Após a mensagem em línguas—silêncio. Uma das jovens irlandesas interpretou. “Como ela pode fazer isso?” Chips se perguntou. O inglês dela era simples e quase sem erros, coisa que Chips observou com satisfação. No mínimo essas reuniões de oração eram proveitosas para o cultivo da língua inglesa.

Chips manteve seus olhos abertos. Algo fez seu nariz coçar. O padre católico sentado no chão ao seu lado estava fumando um cachimbo vagarosamente. “Bem,” pensou Chips, “isto aqui é uma festa ou uma reunião de oração?”

Festa ou Reunião de Oração?

A senhora Hellberg passou a liderar a pequena comunidade em um coro e então perguntou: “Alguém quer ler uma passagem bíblica ou fazer alguma pergunta?”

Chips gostaria de ter feito sua questão, “festa ou reunião de oração?” mas então uma mulher, alguém que chegara atrasada e que ele até então não tinha notado, levantou-se. Ela tentava falar mas não conseguia pois suas palavras eram cortadas por crises de choro violento. Chips sentiu-se bastante desconfortável, mas claramente ele foi o único que se sentiu assim. Por fim a mulher começou a falar.

“Eu acabei de perder meu irmão e meu marido,” ela balbuciou. “Foram explodidos em pedaços por uma bomba irlandesa.” Silêncio. “Sou protestante e gostaria que um católico e um protestante orassem juntos para que a amargura que estou sentindo em meu coração não crie raízes. Por favor, ajudem-me a crer em Deus e a amar seus filhos.” Ela caiu de joelhos e se desmanchou em lágrimas.

O padre católico deu um passo adiante. “Qual dos protestantes irá orar comigo?” ele perguntou. Shirley Delattre cutucou Chips, mas ele não quis ser parte dessa cena de terapia em grupo pública. “Não,” ele cochichou. Felizmente o Sr. Thoroughgood, um professor que ele conhecia de nome, se voluntariou. O que eles oraram, Chips esqueceu imediatamente, pois não conseguia entender como é que um católico e um protestante poderiam nessa situação orarem juntos por paz e reconciliação.[20] Eles devem estar sofrendo de algum tipo de maluquice religiosa, ele disse a si mesmo. Então eles cantaram juntos a Oração do Senhor e muitos dos convidados foram para casa. Chips quis se despedir do Sr. Hellberg e partir, mas não conseguiu encontrá-lo. A senhora Hellberg explicou que durante a reunião seu marido fora chamado por um paciente, mas agora ele estava na cozinha tomando café. Chips bateu na porta e entrou. O Sr. Hellberg estava sentado à mesa da cozinha, com a cabeça entre as mãos. O café de sua xícara estava frio. Chips fez menção de pedir desculpas e sair, mas o doutor disse, “Entre. Entre e sente-se. Meu café está frio. Vamos fazer um pouco de café fresco.”

Chips não disse nada e sentou-se.

“Tem algo muito errado com o Pedrinho,” o doutor prosseguiu, expressando seus pensamentos em voz alta. “Tem algo muito errado e eu falhei em algum lugar. É verdade que ‘quando Jesus vem o poder do tentador é destruído.’ Fiz meu trabalho e também orei. Mas a perna do Pedrinho não está bem. E, em primeiro lugar, por quê ela foi ferida? Pedrinho não é um político, é apenas um estudante. Por quê é que ele foi ferido? Agora ele nunca mais poderá andar normalmente de novo. Quem é que não trabalhou direito aqui, eu ou Jesus, ou nós dois?”

Chips sentiu-se bastante desconfortável. Ele nunca esperava ouvir o famoso doutor falar dessa maneira. A senhora Hellberg entrou e sentou-se junto deles à mesa em silêncio, pois nada havia para dizer. Sem jeito, Chips colocou sua mão no bolso e tirou um folheto que alguém havia lhe dado naquela noite. Ele leu:

Se você desprender sua fé hoje você poderá levar o céu para casa com você.

Se haverá cura para o corpo no céu, há cura aqui no mundo agora.[21]

Uma tolice, Chips pensou, e decidiu colocar o folheto de volta no bolso.

Então ele percebeu que o doutor continuava a olhar para ele esperando por uma resposta. “Não posso responder sua questão,” Chips disse abruptamente. “Mas uma coisa posso lhe dizer. O que você me falou esta noite é mais importante para mim do que toda a reunião de espiritualidade. Eu também tenho minhas dificuldades, mas que um famoso doutor como o senhor tenha suas dúvidas, isto foi para mim uma visitação do Espírito Santo.”

No seu caminho para casa o Sr. Chips cantarolou em silêncio para si mesmo, “Quando Jesus vem o poder do tentador é destruído.” Mas ele estava levemente irritado com o cântico. Este não era um pouco simples demais?

O Culto em Memória

No domingo seguinte foi realizado na catedral um grande culto em memória e lembrança patrocinado pelo conselho de igrejas de Birmingham. Para não ofender nem protestantes nem católicos, decidiu-se que John Adegoke, líder de uma igreja cristã negra, deveria presidir. No mínimo a metade da nave estava cheia de negros que tinham vindo para lamentar e orar com a congregação branca.

Uma longa procissão encheu a igreja: primeiro um grande coro negro, seguido pelo coro e pelos cônegos da catedral; depois o reitor da universidade; atrás dele o arcebispo católico e o bispo anglicano; atrás deles o chefe dos atendentes da British Leyland e o prefeito conservador da cidade; e finalmente John Adegoke, Apóstolo Sênior da Sociedade Serafim e Querubim.

Um jovem negro abriu o culto com um cântico. Ele cantou acompanhado por uma bateria de tambores e o órgão da catedral.

“Quando o Espírito Santo enche o seu ser você pode sorrir Quando você sente como o batista . . . ” e aí ele interrompeu sua canção e comentou: “Vocês sabem, meus irmãos e minhas irmãs, João Batista, aquele que teve que comer gafanhotos e mel silvestre. Quando vocês sentem como o Batista . . . ” E a maioria da congregação—embora os dois bispos tenham ficado de fora—o acompanhou: “Você pode sorrir.”

“Quando o seu coração está cheio de pesar você pode sorrir.”

O coro negro, vestido com longas becas brilhantes, entoou o refrão. “Você pode sorrir.” Os tambores seguiram o ritmo, no início bem suavemente: “Você pode, você pode, sim, você pode sorrir.” O coro acompanhou com harmonia total e numa grande síncope. E os percussionistas fizeram suas baquetas dançarem sobre os tambores. “Vocês podem sorrir.” O solista cantou o próximo verso: “Quando eles atiram bombas em você” E aqui ele não foi capaz de entoar “Você pode sorrir.” Apenas os percussionistas mantiveram o ritmo e a congregação permaneceu em silêncio. “Quando eles miram você porque você é negro você pode sorrir.” “Aleluia, você pode sorrir.” O coro começou a se mover e, com passadas pequenas, rítmicas, as pessoas do coro dançaram desde a galeria até a nave da igreja. Muitos dentre a congregação se levantaram e cantaram repetidamente, “Sim, Senhor, você pode sorrir. “Quando a Frente Nacional atira pedras em você você pode sorrir. Quando as pessoas do Poder Negro chamam você de covarde você pode sorrir.” John Adegoke pôs-se de pé. “No nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo.” Os coros e a congregação responderam, “Amém.”

“Aqui na catedral de Birmingham nós todos nos reunimos como irmãos e irmãs, membros do corpo de Cristo. Nós saudamos o bispo anglicano, o arcebispo católico romano. Saudamos os cristãos católicos e protestantes.”

“E agora com os anjos e arcanjos e toda a gloriosa companhia dos céus, os santos do passado da Europa e da África, incluindo aqueles santos que morreram nesta semana, nós louvamos e magnificamos Teu nome.”

“Amém,” cantou os coros novamente. “Que eles descansem em paz,” disse o Apóstolo Sênior.

O coro negro cantou outro hino. Foi um daqueles espirituais famosos sobre a libertação final de todos os povos. Aparentemente era um hino sobre o céu. “Estou prestes a me livrar de meu fardo pesado.” Chips conhecia bem esse espiritual. Estava presente no oratório de Michael Tippett intitulado “Filho de Nossa Época”. Sua esposa tinha cantado este espiritual para ele muitas vezes.

“Do que, meus irmãos e irmãs, nós estamos prestes a nos livrar?” perguntou um dos cantores. E em completa harmonia o coro e a congregação respondeu, “estou prestes a me livrar de meu fardo pesado.”

Uma anciã negra cantou o próximo verso. Ela não cantou apenas com sua boca, a qual ela podia abrir de forma incrivelmente larga. Tudo nela cantava—os quadris bem reforçados, as pernas grossas, os braços fortes. Até os peitos grandes, balançando, cantavam de acordo com o ritmo do hino: “Sei que minhas vestes me servirão bem. Eu as provei nas portas do inferno.”

E novamente a congregação em uníssono: “Estou prestes a me livrar de meu fardo pesado.”

Chips nada podia fazer a não ser pensar na guerra civil que estava despedaçando seu país, guerra entre católicos e protestantes, entre irlandeses e ingleses, entre a esquerda e a direita. Espontaneamente ele orou: “Venha a nós o teu reino.”

Quando o hino terminou, John Adegoke saudou os poucos alemães luteranos que também estavam entre a congregação. “Vocês sabem, Martinho Lutero, o grande herói da fé, é o pai da igreja deles,” ele explicou, pois tinha aprendido algo sobre Lutero no curso de teologia que a Universidade de Birmingham iniciara para líderes das igrejas negras. Para grande espanto de Chips, a congregação—primeiro os negros e depois os brancos—irromperam no hino: “Nós venceremos . . . ”

Chips perguntou-se se eles não estavam confundindo Martinho Lutero com Martin Luther King. Talvez os dois fossem um e a mesma pessoa para eles. Parece que a dimensão temporal não existe para os cristãos negros. Proximidade para eles não é nem temporal nem espacial. O que os move é o que está perto.

“Sim, minha boa gente,” o arcebispo católico retomou o tema, “devemos nos admirar, admirar e maravilhar, quando vencermos, quando todos triunfarmos sobre nosso próprio egoísmo, quando todos os santos entrarem marchando na cidade de ruas de ouro . . . ” Ele tinha acabado de terminar quando o trombone começou a tocar—era o mesmo trombonista que Chips vira na residência do casal Hellberg. O trombone tocava: “Oh, quando os santos . . . ” A música agora vinha de todos os lados em um grande número de variações. “Oh, quando os santos, oh, quando os santos, oh, quando os santos chegarem marchando.” E o coro e alguns membros da congregação se levantaram e dançaram e marcharam pela igreja.

Então o arcebispo católico disse em voz alta. “Amém” e todos ficaram quietos novamente.

“Amigos,” agora foi a vez do bispo anglicano pregar. “Amigos,” ele disse, “quando os santos entrarem marchando na nova Jerusalém, vocês pensam que haverá santos católicos, santos luteranos, santos anglicanos, santos pentecostais?”

“Não, não,” gritaram os cristãos negros e os cristãos brancos olharam ao redor. O bispo anglicano estava bastante surpreso—os bispos sempre ficam bastante surpresos quando o povo de Deus responde suas questões retóricas—mas ele prosseguiu. “Haverá santos negros e santos brancos, santos irlandeses e santos ingleses?”

E a congregação gritou novamente “Não, não,” e desta vez vários ingleses e irlandeses também gritaram.

“Não,” o pregador prosseguiu. “Não, haverá apenas santos. Santos que dedicaram suas vidas a Cristo. Mas alguns de nós se admirarão. No céu nos admiraremos mais ainda do que aqui. Vocês sabem, no céu ficará claro, na verdade muito claro, o que nós adoramos. Se adoramos Jesus, o trabalhador manual, Jesus nosso salvador, ou se adoramos nossos próprios temores e nossos próprios preconceitos. Sim, ficará claro se adoramos nossa própria raça, nosso dinheiro, nossa igreja, nossa cultura e nossa tradição, ou se adoramos Jesus. Eu não ficarei nem um pouco surpreso se, no dia do juízo, todas as pessoas brancas forem confrontadas por um Jesus negro . . . ” O pregador fez uma pausa. Houve um silêncio mortal na igreja.

O bispo continuou. “Sim, eu não ficarei nem um pouco surpreso se todas as pessoas brancas forem confrontadas por um Jesus negro, e todas as pessoas negras por um Jesus branco. Amém.”

John Adegoke agradeceu aos dois pregadores e acrescentou, “Eu não ficarei nem um pouco surpreso se, no dia do juízo final, todos os irlandeses forem confrontados por um Jesus inglês, e todos os ingleses por um Jesus irlandês. Vamos orar.”

A oração foi em silêncio. Ninguém disse uma palavra. Foram ouvidos apenas alguns poucos suspiros e algum choro. Após a oração o coro da catedral entoou um de seus lindos hinos tradicionais.

“Vamos confessar nossos pecados,” disse John Adegoke. O prefeito, o chefe dos atendentes da British Leyland e uma mulher negra vieram a frente. Eles oraram um por vez, e nos intervalos o coro entoou “Senhor tem misericórdia.” “Nós buscamos primeiro vencer as eleições e não o bem das pessoas.” “Senhor tem misericórdia” “Nós buscamos primeiro coagir as pessoas em sindicatos e não buscamos o bem delas” “Senhor tem misericórdia” “Pensamos que nossa gente queria dinheiro em primeiro lugar e não percebemos que o que eles queriam era honestidade.” “Senhor tem misericórdia” “Nos comportamos como as igrejas. Acreditamos que nós, os vigários dos sindicatos,acreditamos que nós, os eruditos dos partidos, sabíamos melhor o que era bom para o povo.” “Senhor tem misericórdia” “E agora que nosso país está em ruínas nossos jovens riem de nós nossos vizinhos meneiam suas cabeças nos achegamos a Ti humildemente, Ó Senhor, e suplicamos a Ti, ajuda-nos a nos tornarmos humanos, humanos em nossas negociações industriais, humanos em nossas táticas políticas.”

“Senhor tem misericórdia.”

Após um longo silêncio, o reitor da universidade proferiu os anúncios finais. Ele disse, “Deixem me fazer uma pergunta que me espanta. Embora eu seja cristão, não compreendo por que é que nós conseguimos prantear juntos mas não conseguimos agir juntos. Por quê é que conseguimos cantar juntos mas não conseguimos celebrar a eucaristia juntos? Vocês me prometem que pensarão nisto? É uma questão simples de um leigo.”

Com esta “bênção” a congregação foi liberada e Chips refletiu: Uma questão simples de um leigo, certamente, mas uma questão muito importante.

Este foi o início de um profundo processo de reavaliação por parte dos cristãos em Birmingham. Eles somaram seus recursos espirituais e intelectuais—e ocasionalmente até mesmo seus recursos financeiros—e demonstraram que os cristãos são diferentes.

CAPÍTULO TRÊS

O Início

Um Fundador de Igreja Negro: William Joseph Seymour (1870-1922)

Dois movimentos cristãos de alcance mundial foram fundados por não-europeus. Um é o Movimento Pentecostal mundial, o outro é o Cristianismo. O fundador do primeiro foi um negro ecumênico dos Estados Unidos, o do segundo foi um rabino contador de estórias que pertencia a cultura oral do Oriente Médio.

Ambos os movimentos devem seu crescimento inicial às estruturas orais de suas origens. A razão para o crescimento espantoso do pentecostalismo não se encontra em uma doutrina pentecostal particular. Doutrinariamente, o pentecostalismo não é uma totalidade consistente, menos ainda se for incluído no pentecostalismo as igrejas indígenas não-brancas e o Movimento Carismático. Há pentecostais trinitários e não-trinitários, pentecostais que batizam crianças e pentecostais que só batizam adultos, e muitas outras variações. Há até mesmo denominações pentecostais que aceitam subsídios governamentais (e.g., Noruega, certos países do leste da Europa sob regimes comunistas e certos países africanos). A razão para este crescimento encontra-se em sua raiz negra que pode ser descrita da forma abaixo

liturgia oral; teologia e testemunho narrativos; máximo de participação nos níveis de reflexão, oração e tomada de decisão e portanto uma forma de comunidade que é reconciliadora; inclusão de sonhos e visões em formas pessoais e públicas de culto; estes funcionam como um tipo de ícone para o indivíduo e para a comunidade; uma compreensão da relação corpo/mente informada pelas experiências de correspondência entre corpo e mente, sendo a aplicação mais marcante dessa percepção o ministério de cura pela oração e pela dança litúrgica.

Na Europa e na América do Norte o pentecostalismo está se desenvolvendo rapidamente em uma religião evangélica de classe média. Muitos dos elementos que foram vitais para seu surgimento e expansão no terceiro mundo estão desaparecendo. Eles estão sendo substituídos por eficientes estruturas de angariação de recursos, uma burocracia eclesiástica moderna e uma teologia pentecostal conceitual. Na Europa e na América do Norte esta teologia segue as tradições evangélicas, as quais é acrescentada a crença no batismo do Espírito, normalmente mas nem sempre caracterizado pelo “sinal inicial” de falar em línguas.

As coisas eram diferentes, porém, no início, durante o reavivamento na rua Azusa[22] em Los Angeles sob a liderança do negro William Joseph Seymour. Sua estória foi contada pela primeira vez por Douglas Nelson.[23] James Cone está correto quando afirma: “As histórias terão que ser escritas de novo após a leitura de Nelson.”[24]

Quem foi William Joseph Seymour? Ele era filho de ex-escravos de Centerville, Louisiana. Aprendeu a ler e escrever sozinho e durante algum tempo estudou na escola bíblica de Charles Fox Parham em Topeka, Kansas. Parham (1873-1929), freqüentemente descrito como pioneiro do pentecostalismo, era também simpatizante da Ku Klux Klan—portanto ele excluiu Seymour de suas aulas de Bíblia. Foi permitido a Seymour apenas ouvir as aulas fora da sala de aula através da porta entreaberta. Não obstante, Seymour aceitou a doutrina do batismo do Espírito exposta por Parham e começou a ensiná-la em uma igreja Holiness em Los Angeles.

Seymour e seus irmãos e irmãs negros sofreram amargamente. Durante a vida adulta de Seymour 3.436 pessoas negras sabidamente foram linchadas, atingindo a média de duas por semana. Inúmeras brutalidades ocorreram ao redor dele, muitas delas instigadas por cristãos. Apesar de constante humilhação, ele desenvolveu uma espiritualidade que em 1906 produziu um reavivamento em Los Angeles que muitos historiadores pentecostais acreditam ser o berço do pentecostalismo. As raízes da espiritualidade de Seymour encontram-se em seu passado. Ele afirmou sua herança negra ao introduzir espirituais negros e música negra em sua liturgia numa época quando esta música era considerada inferior e não apropriada para o culto cristão. Ao mesmo tempo ele expressava com firmeza sua compreensão do Pentecostes. Para ele o Pentecostes significava mais do que falar em línguas. Significava viver o amor diante do ódio—vencer o ódio de uma nação inteira por meio da demonstração que o Pentecostes é algo bastante diferente da maneira de viver americana voltada para o sucesso.

No reavivamento de Los Angeles bispos brancos e trabalhadores negros, homens e mulheres, asiáticos e mexicanos, professores brancos e lavadeiras negras eram iguais (isto em 1906!). Não é de se admirar que jornalistas da imprensa religiosa e secular tenham noticiado de forma detalhada os eventos extraordinários. Como eles não puderam compreender a natureza revolucionária desta espiritualidade pentecostal, se abrigaram no ridículo, zombando: “O que de bom pode vir de um auto-intitulado profeta negro?”

As igrejas tradicionais também criticaram o emergente movimento pentecostal, desprezando os pentecostais por causa de suas origens negras inferiores.[25] Logo a pressão social levou a emergente burocracia eclesiástica pentecostal a domesticar o reavivamento de Los Angeles[26] por meio da segregação das igrejas pentecostais em organizações brancas e negras exatamente como a maioria das outras igrejas tinha feito. Tal segregação, porém, não impediu as denominações pentecostais de se desenvolverem em uma escala mundial. Hoje, o pentecostalismo é muito mais forte naqueles países do Terceiro Mundo onde o modo oral de comunicação é quase a única forma de propagar o Evangelho.

Parham ou Seymour?

Muitos historiadores pentecostais mencionam Parham[27] e Seymour como co-fundadores do movimento. Quem foi Charles Fox Parham? A resposta mais completa nos é fornecida por uma biografia bem documentada escrita por James R. Goff.[28] Este deixa claro—e isto não tem sido questionado pelos pesquisadores informados—que Parham “inventou” a doutrina da “evidência inicial.” Goff expressa sua tese principal desta maneira: “Foi Parham sozinho quem elaborou a fórmula ideológica distintiva do falar em línguas como evidência inicial do batismo do Espírito Santo. Tal descoberta, de fato, criou o movimento pentecostal.”[29] Goff descreve detalhadamente como Parham desenvolveu a doutrina da “evidência inicial.” De fato, toda autêntica glossolalia era para Parham xenolalia (ou seja, a capacidade de falar um idioma identificável sem jamais tê-lo aprendido); e a xenolalia tornou-se para ele tanto o “selo” de uma chamada missionária para um campo missionário específico como o dom capacitador divino para desempenhar tal chamada. Goff demonstra convincentemente, em outras palavras, que a glossolalia não “caiu do céu” (como normalmente é descrito em livros pentecostais). “Não há quase nenhuma dúvida de que Parham estava conscientemente motivando seus alunos em direção desse conceito de línguas missionárias.”[30]

Goff ilumina mais detalhes da vida de Parham que não tinham sido considerados de forma suficientemente séria no passado; por exemplo, a estrita e contínua oposição de Parham à medicina e à vacinação,[31] seu pacifismo durante a Primeira Guerra Mundial, sua simpatia pelo socialismo e sua doutrina da “imortalidade condicional” (i.e., a “destruição dos ímpios”).[32]

Sobre a acusação de homossexualidade, Goff chega a conclusão que “na análise final o escândalo Parham permanece um mistério.”[33] Muitas questões permanecem em aberto. De onde vieram os rumores? Voliva de Zion City estava obviamente bastante motivado a destruir Parham—ele era seu arqui-rival. Mas ele não poderia ter inventado as acusações, embora tenha “produzido” evidência que ninguém mais pode confirmar. Por quê Parham foi preso e depois as acusações foram retiradas, e por quê os registros do tribunal não foram encontrados? Parece-me que, até que mais evidências sejam apresentadas, Parham deva ser considerado como tendo sido “inocente das acusações.” Ademais, a estória de Parham (e outras estórias similares) pode algum dia estimular os pentecostais a reexaminarem sua avaliação da homossexualidade, especialmente à luz de novas evidências médicas e teológicas.

À luz de separação racial posterior no pentecostalismo, a ideologia e a práxis racial de Parham são importantes. Ele propagou teorias anglo-israelitas e sionismo. Eu cito Parham ao pé da letra: “A distinção dos povos da terra presente no Antigo Testamento permanece quase a mesma hoje. Os hebreus, judeus, e os vários descendentes das dez tribos—os anglo-saxões, os alemães do sul, os dinamarqueses (Dan), os suecos, os hindus, os japoneses e os hindu-japoneses do Havaí, e estes possuem todo o poder espiritual do mundo. Os gentios—os franceses, os espanhóis, os italianos, os gregos, os russos e os turcos. Estes são formalistas, e também seus descendentes em todas as partes do mundo. Os pagãos ainda continuam bastante pagãos—os negros, os malaios, os mongóis e os índios.”[34]

A hierarquia de raças de Parham, com os anglo-saxões no topo como raça-mestra, combina bem com as atitudes correntes no sul dos Estados Unidos de sua época. Na verdade alguns líderes cristãos eram muito mais racistas do que ele (e.g. Carother), mas outros rejeitavam todas as teorias e atitudes racistas (e.g. J. A. Dowie e partes do Movimento Holiness).

Para Parham, permitir que W. J. Seymour assistisse seus estudos bíblicos em uma sala adjacente através da porta entreaberta já era uma grande concessão. Goff chama isto de abordagem “paternalista benigna.” Porém, quando Seymour não aceitou mais a autoridade de Parham sem questionamentos, o paternalismo benigno transformou-se em hostilidade. Parham disse que Seymour estava “possuído por um espírito de liderança.” Agora os pentecostais negros ficavam “assombrados” e “hipnotizados.”[35] “O racismo paternalista que ele praticara antes da rua Azusa deu lugar a um racismo mais agudo, mais flagrante.”[36]

Finalmente, a alegação de Goff de que Parham e somente Parham é o fundador do pentecostalismo—porque ele formulou a doutrina da “evidência inicial” pela primeira vez—deve ser examinada.

Eu não quero discordar de Goff em relação a fatos (embora eu suponha que haja outros que fariam a mesma alegação de primazia para Tomlinson).[37] Suas conclusões, porém, são outros quinhentos. Goff rejeita W. J. Seymour como o pioneiro do pentecostalismo porque a compreensão que este tinha do Pentecostes, ecumênica e não limitada a raça e classe, ficou em grande medida sem sucesso nos Estados Unidos. Portanto o único candidato restante é o racista Charles F. Parham. Com este tipo de argumento pode-se provar que Jesus Cristo não é o fundador do cristianismo, porque a igreja cristã rapidamente abandonou aspectos importantes do exemplo e ensino de Cristo. Mais ironicamente, porém, se aplicarmos o critério de Goff no próprio Parham, ele também não se sairá bem. Sua compreensão da glossolalia como xenolalia missionária não sobreviveu muito mais do que a compreensão interracial do Pentecostes de Seymour. Mesmo o “sinal inicial” é questionado atualmente. Russell Spittler, pastor das Assembléias de Deus nos Estados Unidos, erudito do Novo Testamento e diretor do Centro David Du Plessis no Fuller Theological Seminary, diz: “A glossolalia é um fenômeno humano, não limitado ao cristianismo nem mesmo ao comportamento religioso . . . A crença que distingue o movimento apenas erroneamente pode ser tida como expressando a essência do pentecostalismo.”[38]

O pacifismo de Parham, sua doutrina da “destruição dos ímpios,” sua animosidade para com a medicina, suas teorias anglo-israelitas, sua simpatia para com a Ku Klux Klan—tudo isto tem sido contradito pelo pentecostalismo. Acrescente-se que o pentecostalismo americano não é o único tipo de pentecostalismo. Se eliminarmos a compreensão de Pentecostes de Seymour todas as estatísticas ufanistas do pentecostalismo se desfarão, porque dificilmente encontraremos um movimento pentecostal no mundo que não esteja construído sobre os modos negros orais de comunicação de Seymour. Ademais, o pentecostalismo ainda não atingiu sua maturidade. Pode muito bem ser que ele ofereça a chave para a superação do racismo no mundo hoje, já que alguns dos mais ilustrados pentecostais estão agora descobrindo que o Pentecostes é maior do que a estreita ideologia de Parham.

Parece que por ora as Assembléias de Deus jogam sua sorte em Seymour como fundador do movimento. Elas escrevem: “O reavivamento da rua Azusa testemunhou a destruição de barreiras que normalmente separam as pessoas umas das outras: raça, classe, gênero, riqueza, idioma, educação, filiação eclesiástica e cultura . . . A missão tinha a liderança e congregação integradas—e embora fosse décadas antes do movimento pelos direitos civis, havia uma espantosa ausência de discriminação. Isto não agradou a todos os observadores—incluindo Charles Parham, pai espiritual de William J. Seymour. Ele próprio racialmente preconceituoso, Parham foi para a rua Azusa e denunciou a mistura de raças e após isto seu ministério decaiu. Deus não abençoará tal hostilidade para com ninguém por quem Cristo morreu.”[39]

No final das contas a opção entre Parham e Seymour não é histórica mas teológica. Onde é que se percebe a contribuição decisiva do Pentecostes: na experiência religiosa de falar em línguas como visto em Parham, ou na experiência pentecostal reconciliadora do Pentecostes como visto em Seymour (que obviamente inclui a glossolalia e lhe concede um papel importante)?

Em minha opinião Goff tomou a decisão teológica errada. Mas isto dificilmente diminui a importância de seu livro. Ao fornecer todos os detalhes da vida de Parham com fidelidade e clareza, ele torna possível ao leitor crítico chegar à uma conclusão diametralmente oposta a que ele alcançou.

Finalmente, Azusa combina melhor com uma tradição muito maior e mais antiga, ou seja, aquela de uma congregação onde cada um é um contribuinte em potencial para a liturgia. Isto pode ser demonstrado no arranjo dos bancos em Azusa: todos os assentos estão no mesmo nível; não há nenhuma plataforma frontal elevada (onde todas as coisas acontecem). Veja a seguinte comparação entre a igreja da rua Azusa e uma igreja kimbanguista rural (capítulo 6, p. 24).

Outras igrejas emergindo no meio de perseguição são as igrejas valdenses no Piemonte (Itália) e as camisardes nas Cevennes (França) (capítulo 24, p. 338). Ambas possuem arranjos arquitetônicos bastante similares aqueles da rua Azusa. O estilo de participação oral não ficou restrito aos pentecostais ou aos negros, mas pode ser observado em muitas outras igrejas da perseguição.

Rua Azusa S = Seymour, que age como facilitador e líder, mas não como o único ou mesmo o mais importante “ator.”

Igreja Kimbanguista Rural

Uma “igreja” kimbanguista rural consiste de estacas que marcam o “santuário” enquanto os santos se reúnem para adoração. Esta é a igreja de uma congregação peregrina nos tempos de perseguição. Após o culto as estacas são retiradas. A cada novo culto a “igreja” é reconstruída. No centro encontra-se uma área para o líder que age de forma muito parecida com Seymour. Não há bancos!

CAPÍTULO QUATRO

Uma Pipa Voa Contra o Vento: Poder Negro e Pentecostalismo Negro nos Estados Unidos[40]

Os Estados Unidos “têm que escolher entre democracia e repressão, entre a república e um estado policial; pois a América não pode reprimir trinta milhões de pessoas que estão progredindo, sem destruir toda a nação nesse processo.”[41] Isto não foi escrito por um teólogo crítico de esquerda, mas por

Um Evangelista Pentecostal Negro: Arthur Blazier[42]

Em um relatório exato e detalhado, escrito no final da década de 1960, ele descreve um dos quarteirões de favela de Chicago, o assim chamado Woodlawn. Isto não é um idílico parque gramado mas uma área de favela, onde vegetam sessenta mil negros em cinco quilômetros quadrados, em condições indescritíveis de higiene; onde o lixo é coletado apenas parcialmente ou nem isso; onde reinam ratos e vermes; e onde as crianças aprendem tão pouco em suas salas de aula super cheias que ao deixarem a escola elas apenas incham o exército de desempregados e viciados em drogas.

Brazier protesta contra esta situação. Ele quer destruir o mito da supremacia moral e intelectual dos brancos. A América, diz ele, foi construída nas costas dos negros. Os negros plantaram o algodão; mas andaram vestidos com trapos. Os negros construíram as ferrovias; mas não tiveram permissão para andar de trem. Foi um médico negro quem descobriu o plasma sanguíneo; mas ele morreu pois não havia ninguém disposto a doar-lhe sangue.[43]

Esta situação não pode ser modificada pela violência das armas; somente pela violência da não-violência. Nós os negros, ele escreve, também estamos a favor da lei e da ordem; mas não a favor daquela lei que o branco quer forçar sobre nós, que classifica como criminosos os manifestantes que denunciam essa injustiça horrorosa, enquanto aqueles responsáveis por ela são deixados em paz. Nós não entendemos por lei a ação da polícia pela qual um suspeito pode ser baleado como criminoso—fazendo do policial juiz, júri e verdugo em uma única pessoa. Certamente, Brazier concede, a maioria dos policiais não faz mau uso de seu poder. Mas há muitos que fazem.

Como a “violência da não-violência” que Brazier defende funciona na prática? O programa de Brazier é o de auto-determinação para os residentes em Woodlawn, executado pela Organização Woodlawn. Esta organização é no início subsidiada por igrejas brancas, mas é organizada e dirigida pelos negros da favela. Seu princípio basilar é que são os próprios negros quem devem fazer algo para a melhoria de suas casas. De outra forma, eles nunca vão aprender a se organizar, pensar e cooperar. Sob a direção de Brazier e de outros pentecostais negros, a Organização Woodlawn monta estações de controle onde aqueles que sentem que foram enganados nas lojas podem verificar os preços, qualidade e peso dos produtos que compraram. Os lojistas enganadores são repreendidos e em caso de novas incidências, seus nomes são publicados. Os proprietários de casas que ganham dinheiro em Woodlawn cobrando aluguéis exorbitantes, mas que eles mesmos vivem em condomínios em áreas nobres, são informados do estado miserável das casas que eles alugam—da praga de ratos e cupins. Mas isso não ajuda em quase nada. Então a imprensa e a televisão são convidados a fotografar os banheiros destruídos, as casas nas quais os sistemas de aquecimento deixaram de funcionar, as casas onde o revestimento está caindo em pedaços, onde as portas e janelas estão quebradas e há goteiras por toda parte. Isto faz os proprietários se sentirem desconfortáveis, mas quase nunca muda o jeito deles. Normalmente Woodlawn tem que dar mais um passo—organizar uma greve no pagamento dos aluguéis, na qual os aluguéis são depositados em uma conta bancária da Organização Woodlawn em vez de serem depositados nas contas dos proprietários. Se os preguiçosos proprietários decidem ir aos tribunais, todo o seu mau comportamento é exposto.

São inventados programas similares para melhorar as escolas miseráveis, que estão sob direção dos brancos. Para acabar com os saques e tiroteios—contra os quais a polícia quase não tem poder algum—duas organizações de jovens (“Guardas” e “Discípulos”) são treinadas e utilizadas para a manutenção da ordem.

Teologicamente estas diferentes atividades são vistas dentro da estrutura da doutrina paulina dos carismas. Em adição aos carismas conhecidos na história do pentecostalismo, como falar em línguas, profecia, dança religiosa e oração pelos enfermos, eles praticam os dons de demonstrar, organizar e tornar público. Estes são considerados como outro tipo de profecia. I conheci igrejas pentecostais negras nas quais estas atividades eram mencionadas explicitamente em uma lista dos dons do Espírito.[44] Estes dons não usurpam o lugar dos outros, como nos diversos grupos eclesiásticos políticos na Europa onde a análise política substitui a oração e o louvor (sem mencionar a dança e o falar em línguas). Em vez disso, eles se tornam parte de uma nova unidade entre oração e política, ação social e louvor.

Os Pentecostais Negros Despertam

Nesta batalha contra a injustiça, a igreja está adiante do mundo—é assim que Brazier resume seu livro. Mas o exemplo de Brazier não é o único. Em 1970, durante uma viagem de pesquisa estudando as mais importantes igrejas pentecostais negras nos Estados Unidos (cujos seguidores somam milhões[45]), descobri programas similares. Dietrich Bonhoeffer[46] já chamara a atenção para esses negros americanos “enteados da história da igreja.” Entretanto sua teologia oral (passada adiante da mesma forma que o Novo Testamento foi passado adiante [de acordo com a crítica da forma] antes de atingir sua forma escrita), sua obra missionária nas Índias Ocidentais, sua reflexão política e social primária—tudo isto ainda permanece ignorado e mesmo interpretado erroneamente, como sendo evidências de uma forma de fé se desenvolvendo para se tornar um cristianismo literário europeu maduro, tanto pelos pentecostais brancos como pelas igrejas tradicionais. Há exceções importantes nessa superficialidade e má interpretação, porém, não tanto nas obras padrões de ética social, ou nas histórias do pensamento teológico, mas em certas outras obras. Tome-se por exemplo o cuidadoso estudo de liturgia escrito pelo liturgiólogo católico Lothar Zenetti, que dedicou seu livro Hot Melodies [Melodias Calorosas][47] à uma igreja pentecostal negra (Temple Church of God in Christ [Igreja de Deus em Cristo em Temple]), em cujo seio ele experienciou o poder do Espírito Santo vivo e o “novo cântico”; ou o relatório de viagem do falecido Ernst Benz, professor na Universidade de Marburgo, que, em seu livro The Holy Ghost in America [O Espírito Santo na América][48] descreve seu primeiro encontro com os pentecostais negros como uma “descoberta surpreendente de algo absolutamente novo”; ou a magistral obra de S. E. Ahlstrom intitulada Religious History of the American People [História Religiosa do Povo Americano],[49] que concede certo reconhecimento ao pentecostalismo negro; ou finalmente, obras por meus pesquisadores no doutorado, Roswith Gerloff[50] e Ian MacRobert.[51]

Pode ser observada entre os pentecostais negros uma crescente conscientização dos valores inerentes na cultura negra.[52] Uma de suas igrejas, a Church of the Living God [Igreja do Deus Vivo],[53] tem expressado tal conscientização por meio de uma interessante exegese da Bíblia—reivindicando que muitos dos santos da Bíblia, incluindo Jesus, pertencem a raça negra. Como Jesus era descendente de Davi e de Abraão (ambos pertencentes a raça negra), o próprio Jesus pertence a raça negra. Ao mesmo tempo, porém, Jesus não teve um pai terreno; portanto ele pertence a todos os homens e não apenas aos negros: ele representa a totalidade da humanidade.

No que concerne às questões sociais, o bispo F. D. Washington, da Church of God in Christ [Igreja de Deus em Cristo], deplora o “bloqueio mental” da igreja que é o reponsável por uma falsa compreensão do que é evangelismo pois busca promover a organização ou construção de igrejas quando, conforme ele afirma:

Gostemos ou não, temos que admitir que a igreja (enquanto edifício ou denominação) exerce a mais pobre de todas as atrações sobre os pecadores. Seu desempenho é exatamente zero, porque muitos pecadores não vão à igreja. Mas permanece o fantástico fato que a pessoa de Jesus Cristo—quando Ele é apresentado corretamente—exerce a maior de todas as atrações sobre o coração humano neste mundo.[54]

É simplesmente lógico que este líder pentecostal negro tenha sido fortemente atraído pelo conceito de evangelismo conforme apresentado nos estudos do Conselho Mundial de Igrejas.[55] “O que é necessário para se filiar ao Conselho Mundial de Igrejas?” ele perguntou abrupta e inesperadamente. E é ainda mais compreensível que a greve dos lixeiros em Memphis sob a liderança do Dr. Martin Luther King tenha tido sua sede no enorme templo Mason[56] da igreja mencionada acima, a Church of God in Christ [Igreja de Deus em Cristo]. O assassinato de Martim Luther King atingiu os pentecostais negros de uma forma bastante pessoal, mas até agora não destruiu a esperança deles no poder da não-violência.

Tal esperança, por sua vez, significa que os pentecostais negros não podem concordar com um evangelismo puramente “espiritual.” Em uma entrevista sobre Billy Graham, o evangelista pentecostal negro George M. Perry disse: “Acreditamos no conteúdo da mensagem de Graham, mas não podemos marchar juntos com sua orientação branca, suburbana, de classe média que não tem nada a dizer aos pobres nem aos negros.” Resumindo, o evangelismo de massas praticado pelo reverendo Billy Graham e outros pregadores—Perry concluiu—nunca teve e nunca terá qualquer relevância para a comunidade negra.[57]

“Uma teologia se desenvolvendo a partir de qualquer situação de opressão como o cenário negro na América tem que começar com os fatores sócio-culturais que agem sobre a humanidade das pessoas para o bem ou para o mal,” afirma o teólogo pentecostal negro Leonard Lovett. Ele acrescenta:

O fato dos primeiros pentecostais brancos terem evitado os problemas locais de injustiças sócio-econômicas e discriminações numa sociedade em mudança levou àquilo que Fidler se refere como um “pré-milenarismo fatalista que permitiu aos pentecostais brancos relegarem os problemas circunvizinhos para ‘quando Jesus vier,’ enquanto no estrangeiro eles podiam ‘apressar o arrebatamento’ com uma distante aplicação paternalista de amor e cuidado cristão.”[58]

Outra questão que pode ser ainda mais perturbadora para as denominações pentecostais brancas é a descoberta por alguns pesquisadores de algumas raízes do reavivamento pentecostal que são originalmente africanas, e não apenas afro-americanas. Mas por quê isto deveria nos atemorizar? Damesma forma que Deus escolheu os desprezados filhos de Israel para abençoar o mundo todo, ele novamente escolheu escravos negros (incluindo aquilo de bom no seu passado pagão) para abençoar seus senhores brancos, e toda a igreja universal. Afinal, o cristianismo não nasceu na Europa![59] Uma manifestação prática dessas bênçãos é que

os pentecostais negros têm conquistado assentos nas câmaras municipais e nas legislaturas estaduais e têm sido designados para posições de segundo escalão na área executiva do governo federal. Robert L. Harris, um pastor da Church of God in Christ, tornou-se o primeiro deputado estadual negro na história de Utah, derrotando um candidato mórmon branco. J. O. Patterson, Jr., o filho do falecido líder da Church of God in Christ, é o primeiro candidato afro-americano do condado de Shelby, Tennessee, a ser eleito para a assembléia legislativa estadual desde a Reconstrução. Samuel Jackson, membro da Church of God in Christ, serviu como secretário assistente do Ministério da Habitação e Desenvolvimento Urbano durante a década de 1970.[60]

Passado Revolucionário dos Pentecostais Brancos

É evidente que esta nova orientação dos pentecostais negros é observada com espanto pelas igrejas pentecostais brancas tradicionais dos Estados Unidos. Porém, como já vimos, elas sabem que elas próprias rastreiam sua história até um reavivamento ocorrido em uma igreja negra de Los Angeles. O movimento pentecostal começou no mesmo ambiente no qual emergiram o spiritual, o jazz e o blues. Contudo, enquanto a música negra tem alcançado reconhecimento como uma contribuição dos a cultura universal, a influência negra no movimento pentecostal, que hoje conta com mais de quatrocentos milhões de seguidores, tem sido esquecida—e isto apesar do fato de que os pentecostais consideram W. J. Seymour como um de seus pioneiros. “O fato do personagem proeminente na realização do reavivamento pentecostal em Los Angeles ter sido um negro é de extrema importância para os pentecostais de todas as raças,” afirma o historiador pentecostal Vinson Synan.[61] Eu concordo com esta avaliação. “Ainda mais significativo é o fato que esse acordo inter-racial ocorreu no seio daqueles grupos que tradicionalmente têm estado em disputa, os brancos pobres e os negros pobres.”[62] Ainda mais espantoso, os pentecostais brancos receberam sua ordenação das mãos de bispos pentecostais negros.[63] Uma testemunha ocular pentecostal, Frank Bartleman, orgulhosamente relata que no reavivamento em Los Angeles “a ‘linha de cor’ foi lavada no sangue.”[64] Outro pioneiro pentecostal, o clérigo anglicano Alexander A. Boddy, descreveu o reavivamento em Los Angeles como “algo muito extraordinário” porque “pastores brancos do sul eram preparados zelosamente para irem aos negros em Los Angeles, terem comunhão com eles e receberem através das orações e intercessões deles as bênçãos do Espírito. E foi ainda mais maravilhoso que estes pastores brancos voltaram para o sul e relataram aos membros de suas congregações que eles tinham orado em um Espírito e recebido as mesmas bênçãos que os negros,”[65] uma tradição que é seguida por Michael Harper: “Negar a uma pessoa de cor os mesmos direitos humanos de um branco, ou tratar uma pessoa diferentemente por causa da cor de sua pele, é um pecado contra Deus. Um ministério profético deve procurar fazer com que aqueles que toleram tal pecado passem a condená-lo.”[66]

Não tem sido apresentada nenhuma explicação para o fato das igrejas negras não fazerem parte da organização da Pentecostal Fellowship of North America [Comunhão Pentecostal da América do Norte].[67] A razão para tal desenvolvimento encontra-se por um lado na crítica feroz contra o pentecostalismo efetuada pelas igrejas tradicionais, que tentaram desacreditar os pentecostais ressaltando suas origens humildes em uma igreja de negros; e por outro lado nas leis dos estados sulistas, que proibiam reuniões racialmente mistas. Portanto, seria desleal culpar somente os pentecostais brancos por este desenvolvimento. Eles simplesmente se adaptaram àquilo que naquele tempo era considerado ser o protestantismo americano.

Os pentecostais negros não estão satisfeitos com o fato de que alguns pentecostais brancos na América ainda enxergam o compromisso social e político como uma tarefa para o indivíduo cristão e não para as igrejas como um todo,[68] nem com os apelos por amor cristão generalizados e tardios dos pentecostais brancos.[69] Para os pentecostais negros o “problema pentecostal” é a “divisão das raças,” que deve ser solucionado para que o movimento possa “balançar o mundo.”[70] O apelo de R. C. Cunningham para “conversão” e “não coerção,”[71] cairá em ouvidos mocos enquanto continuar a ser proferido apenas para aqueles que estão por baixo. E necessário que tal apelo se torne igualmente audível para aqueles que estão por cima.

É compreensível que o pastor das Assembléias de Deus no Alabama tenha dito o seguinte: “Sinto que a maior acusação contra a igreja do Senhor Jesus em nosso país é nossa postura (ou falta de uma) diante dos problemas raciais.”[72] E o historiador das Assembléias Pentecostais do Mundo, Morris E. Golder, compara o batista Martin Luther King e seu ministério libertador (“quase sem ajuda ele desafiou os costumes do Sul”) com as declarações impetuosas dos pentecostais sobre o poder do Espírito Santo. Golder afirma:

Se os irmãos brancos [pentecostais] tivessem se posicionado firmemente contra o preconceito e a injustiça racial, tendo a autoridade mais poderosa (o Espírito Santo) e a mensagem mais poderosa (o evangelho de Jesus Cristo), eles poderiam ter sido os instrumentos de Deus para a destruição dessa ideologia horrenda. Mas em vez de lutarem contra ela, eles se submeteram a sua influência e têm sido afetados por ela até o presente.[73]

E Lovett conclui: O pentecostalismo negro afirma com insistência dogmática que a libertação é sempre uma conseqüência da presença do Espírito. Libertação autêntica não pode nunca ocorrer separada do encontro pentecostal genuíno, e da mesma forma, encontro pentecostal autêntico não pode ocorrer a não ser que a libertação se torne a conseqüência. É outra forma de dizer que ninguém pode experimentar a plenitude do Espírito e ser um racista genuíno (meus itálicos).[74]

Eu me pergunto o que os teólogos e pentecostais brancos têm a dizer sobre esta pneumatologia!

As Músicas dos Negros

Já observamos que o movimento pentecostal surgiu no mesmo ambiente que gerou e concebeu as agora famosas músicas dos negros. As opiniões sobre a origem e função do Negro spiritual são diversas. Este é considerado como uma interpretação errônea da música dos cristãos brancos,[75] ou como uma “confissão de fé” da igreja negra,[76] ou como o “expoente mais evidente do verdadeiro eu do negro,”[77] ou como um documento oral de eventos na história do negro americano,[78] ou como um protesto contra a injustiça social,[79] ou como uma adaptação de cânticos africanos,[80] ou como cânticos oriundos das reuniões de acampamentos do movimento de reavivamento branco,[81] ou como os produtos de bardos negros como “singing Johnson” e “Ma White,”[82] ou como uma mistura de melodias européias e americanas com ritmo africano.[83] Qualquer que seja a história do spiritual,[84] ele mesmo está na raiz de pelo menos quatro correntes musicais do presente: 1. Os diferentes estilos de jazz incluindo o blues. 2. A música encontrada em igrejas pentecostais brancas, que está enraizada na música negra mas que tem sido bastante modificada e adaptada ao ouvido branco, particularmente nos Estados Unidos, onde alguns dos primeiros compositores de hinos eram pentecostais negros.[85] 3. A música gospel espontânea que é mais contemporânea, e relacionada principalmente com os pentecostais e com algumas igrejas batistas negras. A música gospel é autóctone, da comunidade local, e reflete as correntes condições de vida da congregação, em contraste com o spiritual mais tradicional. 4. Tentativas de adaptá-lo à música eclesiástica tradicional na América e na Europa.[86] Contudo, há um grande debate sobre se o spiritual tem lugar no culto em igrejas não negras, uma controvérsia que se torna ainda mais aguda quando os spirituals são traduzidos para o francês ou o alemão ou quando eles são entoados em inglês por uma congregação não inglesa.[87]

Aceitemos ou não a interpretação de M. M. Fisher do spiritual como um meio de comunicar dados históricos em uma cultura oral, impedir que o passado dos negros seja esquecido, é certo que o spiritual é um poderoso meio de comunicação que tem “pregado” e comunicado o evangelho nas comunidades americanas negras mais poderosamente do que qualquer livro ou sermão. E é este elemento de espiritualidade negra que foi assumido pelo reavivamento pentecostal naquelas partes do mundo onde tal reavivamento foi verdadeiramente bem sucedido; e.g. América Latina, Zaire, Itália, Indonésia, Coréia e Rússia. Onde os pentecostais trabalham em uma sociedade pré ou pós letrada, eles não pensam segundo linhas lógicas e sistemáticas, mas por parábolas e associações. Seu maior meio de comunicação não é o livro ou o jornal mas o provérbio, o coro, a piada, o testemunho, a estória miraculosa ou os programas de rádio e televisão.

Os cânticos do tipo spiritual não são, conforme James H. Cone ressaltou, apolíticos e extramundanos. “contrariamente a opinião popular,” diz Cone, os spirituals não são evidência que o povo negro se conformou com a escravidão humana. Pelo contrário, eles são músicas de liberdade negra que enfatizam a libertação negra como consistente com a revelação divina. Por esta razão, é extremamente apropriado para os negros cantá-los nesta ‘nova’ era de Poder Negro. E se algumas pessoas ainda consideram os spirituals inconsistentes com o Poder Negro e com a Teologia Negra, isto acontece porque elas estão mal orientadas e os cânticos estão sendo interpretados de forma equivocada. Há pouca evidência que os escravos negros tenham aceito sua servidão porque acreditavam que essa era a vontade de Deus. O caso é o oposto. Os spirituals falar da libertação do povo negro efetuada por Deus, sua vontade em corrigir a opressão dos escravos negros apesar do poder avassalador dos senhores brancos. Pois os negros acreditavam que existe um poder onisciente, onipresente e onipotente agindo no mundo, e que tal poder está do lado do oprimido e do pisoteado. Como evidência eles apontavam para o cego que recebeu sua visão, o coxo que andou e Lázaro que foi recebido no reino de Deus enquanto o rico foi rejeitado. E se “o Deus que viveu no tempo de Moisés ainda é o mesmo hoje,” então Deus vindicará o sofrimento dos negros justos e punirá os brancos injustos por suas más obras.[88]

Baseando-se na análise fundamental de M. M. Fisher, Cone afirma:

A libertação divina do oprimido pela escravidão é o conceito teológico central nos spirituals negros. Estas músicas mostram que os escravos negros não acreditavam que a servidão humana era compatível com seu passado africano e seu conhecimento do evangelho cristão. Eles não acreditavam que Deus criara os africanos para serem escravos dos europeus. Desta forma, eles cantavam sobre o Deus que estava envolvido na história—história deles—corrigindo o que os brancos haviam pervertido. . . .

Devido ao fato de que os negros acreditavam que eles eram filhos de Deus, eles afirmavam sua pessoalidade, recusando-se a conciliar sua servidão com a revelação divina.[89]

A igreja do negro era sua escola, seu fórum, sua arena política, seu clube social, sua galeria de arte, seu conservatório musical. Era liceu e ginásio tanto quanto santo dos santos. A religião do negro era sua comunhão com as pessoas, sua audiência com Deus. Foi a força sustentadora peculiar que deu-lhe o vigor para resistir quando a resistência não apresentava nenhuma promessa, e a coragem para ser criativo diante de sua própria desumanização.[90]

Hoje é evidente que os cristãos do Terceiro Mundo superarão em número aqueles da Europa e da América no ano 2000.[91] O cristianismo começou como um movimento do Terceiro Mundo em algum lugar num canto esquecido do império romano; agora ele retorna ao seu início não ocidental—dentro de uma década a maioria dos cristãos, ou no mínimo uma parte bastante considerável, se identificarão mais fortemente com o tipo não letrado espontâneo de espiritualidade pentecostal. Portanto parece que os métodos litúrgico e espiritual das comunidades pentecostais negras e assemelhadas nos Estados Unidos desempenharão um papel estratégico no futuro, uma vez que fenomenologicamente pertencem a humanidade não letrada, embora estejam vivendo na cultura letrada da América. É por isso que no futuro elas poderão ter que desempenhar um papel importante na “tradução” de uma cultura para outra, tanto no âmbito político quanto no teológico.

Movimentos de Transformação Social

Podemos concluir do que acabamos de ver que o pentecostalismo negro e o Poder Negro não são opostos, como alguns poderiam erroneamente supor. Um observador europeu poderia estar inclinado a considerar o pentecostalismo negro como um mecanismo religioso de adaptação e o Poder Negro como um movimento de protesto político. Este não é o caso—pelo menos não em tal fórmula antitética. Luther P. Gerlach e Virginia Hine, em um estudo comparativo, descrevem ambos como “movimentos de transformação social.”[92] Eles incluem no pentecostalismo não apenas os pentecostais brancos e negros, mas também os grupos carismáticos que estão crescendo rapidamente e ganhando importância cada vez maior dentro das igrejas tradicionais, particularmente entre os intelectuais católico-romanos. Este movimento que está brotando dentro das igrejas tradicionais vem destruindo a teoria normalmente aceita que a espiritualidade pentecostal está vinculada ao ambiente daqueles que são pobres espiritual e materialmente. Nas reuniões dos carismáticos inicialmente encontramos não os iletrados mas os intelectuais, não os ignorantes mas os exegetas críticos, não puritanos frustrados mas cristãos normais. Ainda hoje, estas pessoas não apenas falam em línguas e oram juntas; elas comem, fumam e bebem juntas. Luther P. Gerlach observou que pessoas com educação superior estão alcançando a experiência pentecostal do batismo no Espírito mais rapidamente do que estudantes com educação básica, e que falar em línguas é menos freqüente entre os pentecostais mexicanos do que entre os americanos brancos de classe média. As tentativas para descrever o falar em línguas como um fenômeno patológico ou meio patológico entre grupos marginais têm sido reprovadas (até onde é possível fornecer critérios objetivos) por estudos sociológicos e psicológicos competentes.[93]

Em sua comparação entre Poder Negro e pentecostalismo estes dois antropólogos americanos, que não pertecem nem ao Poder Negro nem ao movimento pentecostal, chegaram a conclusão que o Poder Negro não pode ser visto como um contraste ao movimento pentecostal negro. Ambos os movimentos são religiosos e revolucionários, e é difícil traçar uma linha divisória entre os dois.

O pentecostalismo é revolucionário porque oferece alternativas à teologia “letrada” e assim descongela o “pensamento congelado” dentro de formas literárias de culto e de comissões de discussão e concede as mesmas chances a todos—incluindo a gente “oral.” Ele permite que ocorra um processo de democratização da linguagem através do desmantelamento dos privilégios dos sistemas proposicionais, racionais e abstratos—o qual, como é demonstrado pelo crescimento do movimento carismático dentro das igrejas históricas, é experimentado como benéfico mesmo pelos intelectuais. Tais exemplos de alfabetização política são encontrados não apenas nas igrejas pentecostais negras no Estados Unidos, mas também nos movimentos pentecostais na Rússia, na África do Sul, Na Suécia e na América Latina. Nossa pesquisa sócio-política tem ignorado completamente—e aqui o Conselho Mundial de Igrejas deve ser mencionado explicitamente entre os culpados—este despertamento religioso e político, algumas vezes com um suave tom de pesar por esses crentes levemente dopados pela religião.

Gerlach, da mesma forma, afirma que o Poder Negro é um movimento religioso. Ele aponta para a conversão de Malcom X ao Islã, da qual emergiu a identidade muçulmana negra. A linguagem religiosa do restante do movimento Poder Negro também é notável. Os seguidores falam de “transfiguração em negritude” e “batismo em negritude,” e vêem no Poder Negro expressis verbis uma religião, na qual alguém se torna iniciado por uma experiência de compromisso—um tipo de conversão, que é articulada na estrutura geral de uma liturgia.

Ademais, é da essência desta revolução cultural desenvolver formas organizacionais fluidas, que nosso pensamento linear pode compreender somente com dificuldade. Ela é conduzida de uma forma policéfala—i.e., por muitas cabeças—e encontra seus seguidores através da comunicação normal na vida cotidiana, na classe baixa particularmente entre os parenets, na classe alta entre o círculo de amigos. Os executivos nesse arranjo policéfalo mudam freqüentemente, e os diferentes grupos mudam seu status na estrutura geral do movimento de semana para semana. Somente esta organização policéfala torna possível para uma minoria resistir à uma maioria. A unidade do movimento não é assegurada por sedes normais mas por “evangelistas itinerantes” (tanto no movimento carismático como no movimento Poder Negro) e por meio de senhas e cânticos comuns. É fácil, diz Gerlach, descobrir se um grupo do Poder Negro é liderado por comunistas. Se houver estruturas hierárquicas evidentes e centros executivos claros, então estaremos lidando com uma organização comunista. E é exatamente por isso que os poucos grupos do Poder Negro liderados por comunistas não são revolucionários mas reacionários, uma vez que não libertam os negros da tutela branca, mas substituem uma estrutura de dominação por outra.

Da mesma maneira, a transição de um movimento carismático para uma igreja pentecostal é reconhecível pela estrutura linear de dependência e direção emergente. Tal transição do movimento carismático policéfalo para uma igreja organizada centralmente (seja em linhas episcopais, congregacionais ou presbiterianas) pode freqüentemente ser observada em casos individuais. Ao mesmo tempo, é gerado um novo protesto contra o “pensamento de cima” manipulador, que ou leva a formação de um novo reavivamento pentecostal/carismático (fora da organização em questão) ou desafia a organização a voltar à sua forma policéfala inicial.

Ao lidar com a atitude destes movimentos de oposição, Gerlach traça mais um paralelo. Uma pipa voa contra o vento. Um movimento revolucionário como o Poder Negro ou o movimento pentecostal somente pode se levantar contra o vento da oposição. É por isso que o Poder Negro emergiu em muitas cidades apenas com a ajudada da ação policial. Da mesma maneira, muitos movimentos carismáticos somente puderam se formar nas igrejas tradicionais com a ajuda da oposição da hierarquia eclesiástica ao falar em línguas.[94]

Tal movimento revolucionário policéfalo, diz Gerlach, pode ser contraposto efetivamente apenas por “super-habilidade,” i.e. por um controle rigoroso de todos os meios de comunicação, incluindo o correio e o telefone, e pelo aprisionamento e eliminação de todos os companheiros itinerantes simpáticos ou suspeitos de o serem, incluindo aqueles erroneamente tidos por simpáticos ao movimento. Este método foi utilizado em épocas anteriores na Igreja Católica Romana, em certos estados fascistas e na Rússia. Porém, nos Estados Unidos—e alguém gostaria de acrescentar, na igreja cristã—tal método é impensável. Portanto, Gerlach conclui, seja o que for que a intervenção eclesiástica levante contra os revolucionários carismáticos, e seja qual for a intervenção do Estado contra o Poder Negro, isto representará exatamente a quantidade de vento que estes movimentos necessitam para se elevar e voar. Tais intervenções produzem exatamente o oposto daquilo que pretendem.

Tolerância e Convicção

A análise de Gerlach é fascinante. Mas ela atende todas as situações? Parece-me que a qualidade revolucionária de tais movimentos depende de duas condições que são excludentes entre si. Primeiramente, estes movimentos têm que ter uma base existencial e emocional quase axiomática que não possa ser estremecida nem por argumentos nem por mais pesquisa; ou—se se preferir—eles têm que se basear em uma convicção religiosa. Mas, em segundo lugar, eles devem permitir espaço para questionamento e crítica baseados em fatos e argumentos, para impedir que tal convicção religiosa se torne uma prisão ideológica.

Presentemente existem exemplos suficientes para a primeira tese. Observados objetivamente e racionalmente, os chineses vermelhos foram derrotados por Chiang Kai Shek quando iniciaram sua longa marcha. Semelhantemente, a escalada do bombardeio do Vietnã do Norte deveria ter levado à capitulação dos norte vietnamitas. Porém, em ambas as instâncias não ocorreu a conseqüência “lógica.” Por quê não? Gerlach responde (de acordo com suas convicções como agnóstico) que o compromisso religioso tem tamanho poder que transforma a realidade. Disto Gerlach tira uma conclusão que é extremamente relevante para a totalidade do debate sobre desenvolvimento e fome, a saber, que a mania de consertar os problemas políticos e econômicos com remendos, tratando os sintomas, tem que ser substituída pelo reconhecimento desses grupos culturalmente revolucionários como catalizadores de transformação.

Mao Tsé Tung e o movimento pentecostal novamente fornecem exemplos marcantes para a segunda tese. As ideologias inquestionáveis e indiferenciadas que proíbem tolerância e tabus leigos sobre questões importantes destruem, exatamente com esta postura, o irromper revolucionário e carismático original. O que então vemos é a bem conhecida aplicação da letra da lei—seja protestante, católica, pentecostal ou comunista—pela qual as pessoas compensam pelos sacrifícios que têm que fazer compelindo outros a fazerem os mesmos sacrifícios (Ersatz-Lust).[95] O Poder Negro e o pentecostalismo quebraram a hipocrisia institucionalizada ao assumir literalmente aquilo que era afirmado oficialmente mas não praticado (na igreja: o sacerdócio universal dos crentes; no estado: direitos iguais para brancos e negros). Contudo estes movimentos se tornam vítimas de hipocrisia institucionalizada no momento em que criam uma ideologia fechada deste ato revolucionário. Parece que convicção e compromisso total não permitem espaço para a “luxúria da tolerância.” Ou a pessoa está pronta para arriscar tudo por um objetivo reconhecível, mas então não está preparada para ser desviada desse objetivo por argumentos ou por fatos; ou ela é uma pessoa tolerante, liberal e crítica, mas então lhe falta aquele compromisso total que, e somente ele, age como catalizador de transformação.

Podemos muito bem perguntar: Somente os fanáticos podem ser evangelistas? A história da igreja parece responder essa questão afirmativamente. Nem os profetas bíblicos, nem os evangelistas do Novo Testamento, nem os reformadores, nem os teólogos, evangelistas e missionários contemporâneos, todos os quais são fiéis ao ponto do compromisso total, foram ou têm sido tolerantes—com algumas exceções notáveis. À luz deste fato, os pentecostais algumas vezes têm dito que a tolerância de muitos dos cristãos de hoje tem suas raízes em sua insegurança religiosa.

O Espírito Santo é um “Cavalheiro”

Não obstante tudo isto, não estou preparado para aceitar que haja um conflito definitivo entre convicção total e tolerância genuína. O Espírito Santo é um “cavalheiro,” afirmam corretamente os pentecostais.[96] Se tivermos que utilizar todas as nossas energias para suprimir todos os argumentos críticos, então nos faltará a energia necessária para a realização de tarefas mais diferenciadas. Combinar tolerância com convicção total, porém, exige a totalidade da vida e da energia de alguém. Neste sentido, tolerância vivida pode ser compreendida como uma concretização da doutrina da justificação pela graça somente: se realmente acreditamos que somos teólogos, pastores, burocratas eclesiásticos, evangelistas ou políticos cristãos sola gratia, então sempre teremos que lidar com a possibilidade de estarmos errados—e contudo justificados por Deus—e, em segundo lugar, que aquele a quem queremos convencer será justificado por Deus sola gratia, ainda que ele esteja errado.

Em relação ao Poder Negro e ao movimento pentecostal, isto significa que temos que reconhecer direitos iguais à teologia não letrada. Somente no encontro entre culturas “orais” e “letradas” nós podemos descobrir o quanto nossa teologia “letrada” (i.e., nossos métodos analíticos críticos) se relaciona com a pré e a pós racionalidade, e qual é a relação entre “a lógica das entranhas” e “a lógica do cérebro.” Então podemos perguntar: como a dança fala conosco e como a tese fornece uma variação sobre um tema? Ou, utilizando uma imagem: qual é a razão que é somente as muitas cores do arco-íris no céu que podem criar aquela luz brilhante que permite que vejamos a realidade? Se Deus nos deu uma cabeça, “coração e rins” para que possamos conhecer o mundo, ele certamente não permitirá que nós deixemos uma destas formas de percepção definhar. Pelo contrário, temos que investigar como a cabeça pode aprender com o pulsar do coração e o coração com o pensamento crítico.

Estas não são as questões de um especialista. Ao responder (ou recusar a responder) tais questões, decidimos se a igreja, enquanto universal, verdadeiramente católica, tem futuro, porque o número daqueles cristãos e teólogos—se estivermos preparados para chamá-los por tal nome—que buscam e praticam uma teologia oral como alternativa ou complemento a um sistema lógico e racional de termos, está aumentando substancialmente. Este tema foi desenvolvido com profundidade nos três volumes de minha teologia intercultural e em muitas peças para músicos, dançarinos e atores na Alemanha e na Suíça. Em tais peças, não necessidade que os artistas sejam cristãos comprometidos, porque os textos bíblicos—e no caso do réquiem Bonhoeffer os textos de Bonhoeffer—encontram seu caminho para os corações tanto dos espectadores como dos atores.[97]

Uma coisa é certa: o problema ecumênico do futuro imediato não é o relacionamento entre católicos e protestantes, mas entre teologia “oral” e “letrada.”

O relacionamento entre oral e letrada, entre negros e brancos, também é um problema ainda não resolvido entre os pentecostais. O pentecostal branco Cecil M. Robeck, Jr., afirma sem rodeios: “Muitas das maiores denominações pentecostais nos Estados Unidos são altamente segregadas. O racismo é um problema desmedido no pentecostalismo americano. . . . Pentecostais brancos têm apoiado o partido republicano e a assim chamada ‘direita religiosa’ enquanto pentecostais negros têm se inclinado a apoiar o partido democrata e se recusado a serem co-optados pela ‘direita religiosa.’”[98]

Samuel Solivan critica o fracasso do pentecostalismo em relação à raça:

Nós temos optado por uma fácil abordagem do tipo “Amo você no Senhor” em relação aos problemas de racismo e intolerância. Nossas estruturas denominacionais, ou organizações distritais, nossas assembléias nacionais são controladas e definidas por um pequeno número de pessoas e seus amigos que, praticamente todos, pensam e agem da mesma maneira. Nós institucionalizamos nosso preconceito e nosso racismo. Nós justificamos, santificamos e batizamos nosso racismo e nos enganamos a nós mesmos crendo que o Espírito tem nos guiado. Foi um espírito, é verdade, mas qual? Nem tudo que diz ser do Espírito de Deus é seu Espírito.[99]

O “Milagre de Memphis”

No outono de 1994 a antiga Pentecostal Fellowship of North America [Comunhão Pentecostal da América do Norte] (na qual estavam representadas apenas igrejas brancas) foi dissolvida.[100] Foi fundada uma nova organização, na qual as igrejas pentecostais brancas e as negras eram membros iguais (mas sem as Oneness Churches [Igrejas da Unidade]).[101] Ela recebeu o nome de “Pentecostal/Charismatic Churches of North America” [Igrejas Pentecostais/Carismáticas da América do Norte]. A guerra racial entre pentecostais brancos e negros chegou ao fim com uma referência explícita ao fundador do pentecostalismo, William Joseph Seymour, que via na integração de brancos e negros em sua igreja uma característica essencial da obra do Espírito Santo.[102] Um símbolo disto foi que um pastor branco das Assembléias de Deus espontaneamente lavou os pés do bispo negro Ithniel Clemmons[103]—um gesto cujo significado não pode ser subestimado e que teria sido impossível alguns anos atrás.

A escolha de Memphis para o evento não foi acidental. Foi naquela cidade que Martin Luther King, Jr., foi assassinado. Sem a confissão de culpa, “nossa participação no pecado de racismo pelo nosso silêncio, negação e cegueira,”[104] não teria sido possível a reconciliação. Se tal reconciliação é mesmo tão memorável quanto alguns observadores pensam somente ficará provado quando a reconciliação religiosa for transformada numa realidade política.[105]

Oração da Minhoca

Querido Deus, algumas vezes me sinto como uma minhoca. Eu rastejo sobre minha barriga e como pó desde a manhã até a noite e poeira da noite até a manhã. E as pessoas passam e dizem: Ah, é apenas uma minhoca e me machucam e me esmagam com seus sapatos. E algumas vezes um pombo anda para lá e para cá, todo majestoso em preto e branco, e ele dá bicadas em mim e eu tenho que escorregar para dentro de algum buraco na terra. Por quê eu tenho que ser uma minhoca? Por quê eu não posso ser um flamingo, ou um poderoso leão rugidor, ou pelo menos uma borboleta? Por quê eu sou apenas uma minhoca? Querido Deus, você não me perguntou se eu queria ser uma minhoca. Meus pais não me perguntaram se eu queria ser uma minhoca, ou mesmo se eu queria nascer. E assim eu sou o que sou, uma minhoca até aquele momento quando você Deus, sussurrar em meu ouvido: Minhoca, você é importante! Sem você não há vida, nem plantas, nem verduras, nem animais, nem pessoas, nem universidades, nem governo, nem ciência e arte e nem os pombos com toda a pompa acadêmica deles. O que você pode dizer sobre isto, querido Deus? Eu sei o que eu digo: Eu digo, muito grato, querido Deus, muito grato mesmo. Eu sou importante. Mas, querido Deus, eu me pergunto se você não poderia dizer isto aos pombos também. Muito obrigado.

CAPÍTULO CINCO

África do Sul - Memórias Perigosas: Começo Integrado

Na África do Sul o pentecostalismo começou como uma igreja integrada e desenvolveu-se—como nos Estados Unidos—em uma igreja segregada. As raízes e origens estão descritas detalhadamente em The Pentecostals [Os Pentecostais].[106] Ali também pode ser encontrada uma descrição da conexão entre o pentecostalismo e as igrejas sionistas negras.[107]

Os primeiros cultos pentecostais, embora não iniciados por negros, foram conduzidos em uma igreja negra em Doornfontein.[108] John G. Lake (1870-1935)[109] e Thomas Hezmalhalch (1845-1934),[110] os primeiros missionários pentecostais para a África do Sul, tinham ambos cultuado na igreja de Seymour e estavam já familiarizados com o compromisso e prática não racial de Seymour na missão da rua Azusa. Embora exista uma teoria que Lake defendesse a segregação na vida social,[111] inicialmente ele não apoiou o racismo na igreja.[112]

Depois que Lake se mudou da igreja de negros em Doornfontein para uma igreja sionista branca (o “Sionismo Branco” não é aparentado com o sionismo da África do Sul, mas com a Catholic Apostolic Church [Igreja Apostólica Católica] de Zion, Illinois, Estados Unidos)[113] no centro de Johannesburg, ele resistiu abertamente aos brancos que queriam excluir da igreja Elias Letaba, que mais tarde se tornaria um famoso líder pentecostal negro, dando-lhe o ósculo santo diante de toda a congregação.

Porém, o conselho executivo, que era formado apenas por brancos, logo cedeu à pressão da comunidade branca racista. Já em novembro de 1908 o conselho decidira “que o batismo de nativos doravante deverá ocorrer após o batismo de brancos.”[114] No início de 1909 o conselho decidiu que o batismo de “brancos, mestiços e nativos deve ser separado.”[115]

A Apostolic Faith Mission [Missão de Fé Apostólica], o movimento iniciado por Lake, refletiu todos os tabus raciais da sociedade sul africana. Em 1910 Lake ainda pode escrever à Upper Room Mission [Missão do Cenáculo] que embora os afrikaners tivessem, como os sulistas dos Estados Unidos, um forte preconceito contra os negros, havia muitos trabalhadores brancos em cujos corações “Deus provocara o amor aos nativos.”[116] Em 1944, entretanto, o conselho executivo declarou que a Missão se posicionava a favor da segregação. “O fato que o nativo, o indiano ou o mestiço é salvo não lhe torna europeu.”[117]

Após a Segunda Guerra Mundial, quando o Partido Nacionalista alcan’’cou o poder na África do Sul, a Apostolic Faith Mission apoiou consistentemente o governo e sua política de apartheid. Em 1955, quando o primeiro ministro J. Strydom aumentou o número de senadores para obter a maioria exigida tanto na Câmara como no Senado para retirar os chamados votantes mestiços da lista de votantes, G. R. Wessels, vice-presidente da Apostolic Faith Mission, era um dos senadores enquanto permanecia ministro ordenado. Portanto a Apostolic Faith Mission tornou-se parceira direta do governo no esforço deste em implementar o apartheid.

Portanto não é surpreendente que os pentecostais sul africanos brancos rejeitem a idéia de que o movimento pentecostal foi fundado por um ministro negro, juntamente com a noção mais ampla de que a experiência negra tem tido um impacto nas crenças e nas práticas do movimento. Como muitos pentecostais brancos, F. P. Möller traça a origem do movimento até Parham.[118] Embora ele reconheça a parte desempenhada por Seymour, ele desconsidera toda a controvérsia ao redor da liderança de Seymour e o relacionamento entre brancos e negros: “Mais tarde Seymour foi substituído por pessoas mais capazes e as diferentes raças pararam de cultuar conjuntamente.”[119]

Burger, um historiador da Apostolic Faith Mission, considera Parham como o pai doutrinário do movimento. Ele descreve minha própria tese (como também de Lovett e MacRobert) que afirma que o pentecostalismo nasceu em uma igreja negra, como uma “conclusão unilateral, deturpada.” Ele diz que a subseqüente segregação do movimento pentecostal foi uma “segregação racial espontânea e natural.” Ele também afirma que quando Seymour cumpriu sua função “homens mais fortes com mais iniciativa e maior potencial de liderança” assumiram o controle.[120] Burger atribui a segregação na Apostolic Faith Mission ao fato de que os afrikaners compreendiam a história, a natureza e a atitude das relações raciais na África do Sul melhor do que os missionários americanos.[121]

Não seria correto atribuir a divisão brancos/negros no movimento pentecostal sul africano ao apartheid. Foi demonstrado que os pentecostais sul africanos brancos não são diferentes do restante do movimento. Nem as interpretações de Burger e de Möller podem ser vistas como exclusivas da África do Sul. Porém, na África do Sul, com seu apartheid legalizado, a distorção das história tem impedido os pentecostais de quebrarem as barreiras raciais e se tornarem um testemunho singular do poder unificador do Espírito. O maior avanço na luta contra o apartheid veio da iniciativa do primeiro ministro, que era reformado holandês, em negociar com o líder do Congresso Nacional Africano e não dos líderes pentecostais cheios do Espírito? A observação de MacRobert em relação aos pentecostais britânicos e americanos (pelo menos no passado) também se aplica a África do Sul:

Muitos pentecostais brancos com quem tenho conversado—tanto britânicos como americanos—ficam profundamente embaraçados por causa das origens negras do movimento e rapidamente refutam o papel principal desempenhado por Seymour. Eles preferem reabilitar Parham—ainda que ele fosse homossexual, pelo menos era branco—ou negar a existência de liderança humana, do que aceitar um negro como seu fundador.[122]

Resgatar o Passado para Derrotar o Racismo

Esta seção novamente está baseada em J. H. Horn. A maioria das vezes eu o cito verbatim, uma vez que quero dar proeminência à uma nova forma de fazer teologia pentecostal que percebe na “conexão negra” não um embaraço mas uma promessa. Em minha opinião isto diz respeito tanto às origens do movimento e sua implantação na África, como por exemplo na forma do kimbanguismo,[123] como ao sionismo.[124]

Como já vimos, o movimento pentecostal mudou de um movimento totalmente integrado freqüentemente sob liderança negra em seus primeiros anos, para diversas comunidades segregadas. Porém, o aspecto mais vergonhoso desta história não é meramente que o movimento eventualmente organizou-se em assembléias e igrejas segundo categorias raciais, mas que alguns de seus líderes brancos mais tarde se envolveram em atividades racistas, enquanto muitos outros aceitaram tacitamente o racismo na igreja e na sociedade.[125]

Pelo menos dois dos primeiros pentecostais, Charles Parham e Aimee McPherson,[126] mantiveram vínculos íntimos com a Ku Klux Klan na década de 1920.[127] Parham contribuía com artigos para um periódico racista, anti-semita e freqüentemente pregava para os homens da Klan, a quem se referia como “aqueles homens esplêndidos,” e cujos objetivos ele interpretava como “ideais elevados para o melhoramento da humanidade.”[128]

Anderson divide a vida de Parham em três períodos, o período pré-pentecostal no qual seu racismo era bastante visível, a fase inicial dinâmica do movimento pentecostal no qual seu racismo foi mantido suspenso, e finalmente o período pós-reavivamento durante o qual aquelas hostilidades raciais amadureceram. Anderson sugere que a experiência pentecostal pode ter sido a razão para a abordagem moderada de Parham e de outros pentecostais brancos durante a fase inicial do movimento.[129]

C. de Wet, um missiólogo pentecostal da África do Sul, tenta explicar o retorno de fiéis pentecostais ao racismo de uma perspectiva pneumatológica. Ele sugere que durante períodos de dramáticos derramamentos do Espírito e os conseqüentes reavivamentos, a linha de cor é apagada.[130] Ou, fraseando de forma mais teológica, o Espírito possuidor, que enche o cristão, elimina todo racismo. Uma vez que o reavivamento acaba, porém, e o entusiasmo inicial dá lugar à organização e aos dogmas, todos os antigos preconceitos retornam.

Se a hipótese de Wet for considerada seriamente pelos pentecostais, ela terá uma conseqüência importante. Ela significará que a doutrina pentecostal do batismo do Espírito Santo terá que ser investigada à luz do “pecado original” dos pentecostais, i.e., racismo. À esta luz podemos ver que o batismo no Espírito não é uma experiência “de uma vez para sempre.” Certamente, as experiências raciais dos pais pentecostais indicam que os cristãos cheios do Espírito podem perder a plenitude do Espírito. A questão freqüentemente feita pelos pentecostais negros pede mais atenção: “Pode um branco racista ser cheio do Espírito?”

Ao aceitarem a possibilidade de que crentes podem perder a plenitude do Espírito, os pentecostais alinharão sua pneumatologia com sua soteriologia, a qual aceita que crentes podem perder sua salvação. A história pentecostal lembra-nos que o não racismo era um dos sinais mais evidentes do batismo no Espírito. Isto não significa que os pentecostais devem necessariamente rejeitar sua doutrina das línguas (ou outros dons) como a evidência inicial do batismo. Mas desafiará os pentecostais a não confiarem meramente na “evidência inicial,” mas a esperarem que aqueles que dizem ter tido uma experiência carismática ou pentecostal abandonem o racismo.

A afirmação das Assembléias de Deus na década de vinte que “pode haver verdadeiros cristãos na Klan” e declarações semelhantes por pentecostais sul africanos em relação ao movimentos políticos de extrema direita têm que ser questionados.[131]

Mais positivamente: Se há qualquer substância de verdade na hipótese de Wet, então a mensagem pentecostal tem o potencial latente desafiador de derrotar o racismo. Assim, apesar da história negativa do pentecostalismo nesta área, seu início positivo fornece esperança para o futuro. Se o movimento pentecostal sul africano pode experimentar um “derramamento do Espírito” verdadeiro, ele pode (e irá) servir como um exemplo para o mundo. O movimento pentecostal poderá então servir como catalisador para uma nova sociedade, um instrumento de esperança em “nossa terra sofrida.”

A “linha de cor” poderá ser novamente “lavada no sangue.” Quando o Espírito vem, orgulhosos racistas brancos se ajoelham diante de ministros negros para oração, ministros brancos são ordenados por profetas negros,[132] e cristãos percebem uns ao outros como filhos de Deus, considerando a cor da pele irrelevante.

É ilusão imaginar ministros brancos vindo de Krugersdorp para Soweto receberem o batismo no Espírito? E é possível na África do Sul uma congregação não racial sob a liderança de um ministro negro? Se o Espírito Santo está realmente se movendo, isto não é um sonho escatológico, mas uma possibilidade pentecostal.

Não apenas a história inicial do movimento pentecostal clássico, mas também a história do movimento carismático tem sublinhado o potencial da experiência pentecostal em ajuntar pessoas provenientes de uma variedade de contextos. No auge do movimento carismático na América, católicos, cristãos ortodoxos, protestantes (e até pentecostais!) se reuniam aos milhares para louvarem ao Senhor e se confraternizarem.[133] J. Buck, comentando sobre a terceira conferência sobre o Espírito Santo em Jerusalém, ressalta a comunhão entre o padre Bartholomew, sacerdote ortodoxo, e o padre Orsini, sacerdote católico romano.[134] Na África do Sul, a Conferência de Renovação Sul Africana em 1980 exerceu o mesmo impacto. Em um editorial sobre este evento, Crompton comenta:

Centenas além do que podíamos calcular tiveram a experiência do Espírito Santo e milhares tiveram suas atitudes uns para com os outros fundamentalmente mudadas; ingleses para com afrikaans [sic], afrikaans [sic] para com ingleses, negros para com brancos, brancos para com negros, mestiços para com africanos e ambos para com indianos, protestantes para com católicos e vice versa, pentecostais para com tradicionais.[135]

Infelizmente, tal “derramamento do Espírito,” como o primeiro reavivamento pentecostal, não produziu resultados inter-raciais permanentes. Há literalmente milhares de pentecostais e carismáticos cheios do Espírito na África do Sul que não conseguem compreender a discrepância entre racismo e vida cheia do Espírito.

O início do movimento pentecostal mostrou-nos uma alternativa para a maneira com a qual atualmente lidamos com o problema racial. A descoberta das raízes e da história de seu próprio movimento permitirá aos pentecostais sul africanos confrontar o desafio do Espírito para romper as poderosas barreiras do racismo, dos complexos de superioridade racial e do ódio racial.

Reavaliação das Raízes Negras

Como vimos, o início humilde do movimento em uma igreja negra sob liderança negra é um embaraço para muitos pentecostais brancos. A reação de Charles Parham em seu período pós-pentecostal é ainda típico de muitos pentecostais e carismáticos:

Houve um maravilhoso derramamento do Espírito em Los Angeles . . . Então eles introduziram com sucesso todos os gestos comuns nas antigas reuniões de acampamento entre pessoas de cor . . . Esta é a maneira pela qual cultuavam a Deus, mas o que me entristece e mais me dói é ver brancos imitando negrice ignorante, bruta . . . e atribuindo isso ao Espírito Santo.[136]

Porém, tal herança negra não tem que ser um embaraço, mas em vez disso pode ser uma experiência libertadora para os pentecostais sul africanos. A longa controvérsia entre igrejas tradicionais e pentecostais sobre práticas litúrgicas é apenas uma área onde a história negra pode ser valiosa para os pentecostais. MacRobert ressalta que a herança afro-americana de Seymour e de seus compatriotas foi a principal influência que forneceu aos pentecostais sua liturgia singular. Seymour afirmou sua herança negra introduzindo Negro spirituals e música negra em sua liturgia numa época em que tal música era considerada inferior e imprópria para o culto cristão, pois “ele bebera da ‘instituição invisível’ do cristianismo popular negro” com seus temas de liberdade, igualdade e comunidade.[137]

Por muitos anos, a liturgia pentecostal ficou sob feroz ataque na África do Sul. Tão recente quanto 1984 algumas das maiores igrejas reformadas reagiram fortemente contra a South African Broadcasting Corporation quando ela convidou pentecostais para participarem de sua programação. A “liturgia inaceitável” dos pentecostais e a “desordem” nos cultos foram as principais razões para a oposição.

Se a influência africana em tal liturgia for levada em conta, essa crítica pode ser vista como uma opção por “valores ocidentais superiores” na igreja. Transmitir liturgias pentecostais pode ter um grande significado simbólico como expressão das raízes africanas de todos os pentecostais sul africanos. Os pentecostais sempre se recusaram a se deixar influenciar pela crítica dos protestantes ocidentais à sua liturgia. Além das defesas tradicionais—“as Escrituras prescrevem a liberdade,” “a Bíblia nos instrui a louvar o Senhor” etc.—os pentecostais na África do Sul pode adicionar uma defesa muito mais legítima: a liturgia pentecostal na África do Sul é uma expressão de nossa rica herança africana e uma expressão de fé valiosa para o povo da África, tanto brancos como negros.[138]

A negridão como uma experiência e uma realidade dada por Deus também pode encontrar libertação na história pentecostal. Em um mundo onde a negridão freqüentemente tem sido descrita no pior dos casos como uma maldição e no melhor como algo de segunda classe, os pentecostais negros podem se regozijar com o fato que Deus escolheu um negro para acender o fogo pentecostal.

Os pentecostais acreditam que o reavivamento pentecostal foi um ato de Deus, um derramamento do Espírito. Se este movimento pentecostal é do Espírito, então também é do Espírito ter um negro estado em seu início. No apartheid da África do Sul este fato por si só tem que libertar os pentecostais brancos de seu paternalismo e de sua tendência de esperar tão pouco dos negros.

O temor de liderança negra na África do Sul não está confinado à arena política. Nos círculos pentecostais brancos, tal temor tem sido a principal pedra de tropeço no caminho das tentativas de unificação entre os setores brancos e negros de mais do que uma denominação pentecostal.[139] Até aqui tenho seguido Nico Horn, um pentecostal sul africano mestiço.

Um Testemunho Pentecostal Relevante

Por três décadas tenho defendido a tese de que o pentecostalismo deve uma grande parte de sua substância à William J. Seymour e sua herança africana. Tenho sido amaldiçoado e ridicularizado por tomar tal posição, mas agora ela está ganhando terreno, e as conseqüências de sua aceitação são óbvias.

Quais são tais conseqüências para a África do Sul? Entre outras, elas incluem uma conscientização política que não agrada nem os teólogos da libertação (pois ela rejeita a violência) nem os teólogos mais conservadores (pois ela é revolucionária). É revolucionária porque começa a questionar a teologia pentecostal sul africana tradicional. Por exemplo, em 1988 F. P. Möller escreveu que: “No caso de uma revolução, ou revolta armada, a igreja não deve se envolver. Ela deve sempre estar em uma posição da qual possa ministrar às pessoas de todos os grupos em conflito.”[140] De Wet replicou à tal afirmação dizendo que:

Presentemente a igreja não está ministrando “às pessoas de todos os grupos em conflito.” A Apostolic Faith Mission tem capelães ministrando às tropas governamentais. Quando um pastor da Apostolic Faith Mission na África, Frank Chikane, tentou ministrar aos “outros” grupos, ele foi excluído por “estar envolvido em política.”[141] Se a afirmação de Möller deve ser entendida ao pé da letra, e a Apostolic Faith Mission quer ministrar “às pessoas de todos os grupos em conflito,” ela também terá que nomear capelães para as forças que se opõem ao governo. Se não, os capelães servindo às forças armadas governamentais devem ser retirados.[142]

Japie Lapoorta, outro pentecostal sul africano negro, demonstra convincentemente que a Apostolic Faith Mission esteve bastante envolvida na política de apartheid; por exemplo, quando eles adotaram uma resolução em abril de 1947 para reconhecer 16 de dezembro, Dingaansdag (a comemoração do dia quando os boers( fizeram um voto a Deus e mataram um grande número de zulus(( no rio da Morte) como um feriado religioso da mesma importância que o Natal ou a Sexta-feira Santa.[143] O envolvimento de G. R. Wessels no Partido Nacionalista já foi documentado,[144] como também o fato de que líderes e ministros nacionalistas eram freqüentemente convidados para as conferências dos trabalhadores da Apostolic Faith Mission. Por outro lado, P. L. le Roux, presidente da Apostolic Faith Mission de 1913 a 1943, “protagonizou uma longa batalha contra o nacionalismo afrikaner, nazismo e outros movimentos de direita.”[145] Ele defendia, por exemplo, que “a celebração das vitórias militares dos brancos e da ocupação do território causavam racismo e anti-semitismo, que não é de Deus, mas do espírito da época e do Anti-Cristo.”[146]

Por outro lado a Apostolic Faith Mission é—até onde eu sei—a única denominação pentecostal que tem uma Secretaria para Assuntos Ecumênicos oficial (que teve bastante importância no diálogo católico romano/pentecostal).[147] Mas talvez de importância ainda maior do que tal Secretaria para Assuntos Ecumênicos sancionada oficialmente seja o trabalho do pastor Frank Chikane. Por causa de sua crítica aberta ao sistema sul africano de apartheid, ele foi por diversas vezes detido pela polícia, levado para a prisão e torturado. Em meio as suas dificuldades ele procurou servir como ministro na Apostolic Faith Mission. Em 1981, porém, ele foi suspenso pela denominação e teve suas credenciais cassadas sob acusação de praticar ações que a igreja considerou “políticas.” Embora Chikane tenha entregue suas credenciais, ele continuou como membro em plena comunhão da Apostolic Faith Mission mantendo-se como membro da congregação de seu pai. Em 1990 sua suspensão foi cancelada; atualmente ele novamente aparece na lista de clérigos da Apostolic Faith Mission.

De 1983 em diante Chikane foi Secretário Geral do Instituto para Teologia Contextual. Entre os programas que ele supervisionava, um dos mais significativos ecumenicamente falando foi a redação do agora famoso Kairos Document [Documento Kairos]. Posteriormente, juntamente com 132 “Evangélicos Preocupados,” ele assinou o documento Evangelical Witness in South Africa [Testemunho dos Evangélicos na África do Sul], uma reedição do Kairos Document na linguagem dos evangélicos.[148] Foi contra tal documento que R. P. Möller escreveu seu livro Church and Politics [Igreja e Política], já citado. Particularmente, Möller diz que o documento respirava “o espírito de revolução e confrontação” e utilizava “a Bíblia e expressões teológicas” para promover a ideologia marxista. De fato,l Möller estava tão convencido das simpatias “marxistas-comunistas” de alguns de seus irmãos pentecostais que argumentou que o “ataque marxista-comunista contra a África do Sul . . . reveste-se de vestes religiosas . . . Está preparado para se apresentar até mesmo como ‘pentecostal.’”[149]

Pouco tempo depois da publicação do Kairos Document, Frank Chikane foi eleito para substituir o arcebispo Desmond Tutu como Secretário Geral do Conselho Sul Africano de Igrejas. Isto é extraordinário uma vez que a Apostolic Faith Mission não é parte do Conselho. Dizem que esta denominação está prestes a requerer a condição de observador oficial.[150] A contribuição mais importante de Frank Chikane foi, porém, a redação de A Relevant Pentecostal Witness [Um Testemunho Pentecostal Relevante].[151] Este documento deve ser lido e estudado por todos os pentecostais e carismáticos pois demonstra o potencial teológico, social e político da experiência pentecostal.[152] Ele começa com uma recordação das raízes negras do pentecostalismo e lamenta o “silêncio dos pentecostais”: “Nosso silêncio é um apoio intencional de uma ideologia irreconciliável com as Escrituras Sagradas e com nossa fé cristã. . . . É irônico que seja aplicada disciplina severa àqueles que vacilam e cometem pecados que nós como pentecostais enfatizamos, porém aqueles que são culpados de muitos dos pecados do apartheid podem até mesmo encontrar santuário atrás de nossos púlpitos.” Segue-se então uma discussão sobre santidade, vida moral, boa vontade, honestidade, hábitos sóbrios, humildade, obediência a Palavra de Deus e respeito à lei e ordem.

O que não é compreendido, porém, é que estas virtudes são normalmente fáceis de conseguir em uma sociedade de classe média afluente. Aqueles que têm que lutar com moradias inferiores e trabalhos inferiores não têm o luxo nem a propensão para se deliciarem com sentimentos de boa vontade, humildade e obediência para com seus “senhores” brancos. Consequentemente somos confrontados com uma situação onde um crente de uma comunidade oprimida, para poder receber o batismo no Espírito, tem que realizar um esforço maior de santidade do que um crente de uma comunidade branca afluente.

Como pentecostais temos fracassado em perceber que a manutenção da afluência branca é feita às custas da opressão e da pobreza dos negros. Temos fracassado em reconhecer que as condições sociais nas comunidades oprimidas são resultado direto das condições sociais nas comunidades brancas afluentes. Não negamos que aqueles aspectos de moralidade e santidade que os pentecostais ressaltam sejam importantes. Porém, em nossa situação eles são ineficazes quando não são vistos como estando intrinsecamente vinculados a corrupção da afluência branca. . . . Na África do Sul o Corpo de Cristo não está unido mas política e economicamente dividido.”

O documento acrescenta, “Os cristãos primitivos não se sujeitaram ao governo do momento para que a vida ficasse fácil.” E Japie Lapoorta declara sem rodeios: “Não racismo é um Dom do Espírito da mesma forma que línguas.” Finalmente, os pentecostais negros na África do Sul fazem novamente a questão repetida vezes sem conta: Pode alguém ser cheio do Espírito e racista?

Esta questão certamente veio a mente de Frank Chikane quando ele foi torturado por um presbítero de sua própria denominação pentecostal (que era policial). Quem é que está cheio do Espírito aqui: o torturador, o torturado, ambos ou nenhum? Está na hora dos teólogos e exegetas pentecostais abordarem este tipo de questão.

Quanto a convocação para integração total, uma pergunta tem que ser feita: O que significa integração? Ela inclui as diversas igrejas sionistas independentes na África do Sul? E isto significa—por exemplo em assuntos de liturgia e teologia—a capitulação da identidade negra diante da tradição branca? Integração não pode significar tal coisa. Isto tem sido tentado por mais de cem anos e falhado. Significa então a capitulação da cultura branca diante da tradição negra? Isto nunca foi tentado, e não está claro se funcionaria. Significa, pois, um acordo entre as duas? Como seria tal acordo? Isto implicaria em congregações integradas, ou em congregações mais ou menos segregadas em uma denominação integrada? Certamente poderia implicar em uma educação teológica integrada, se fosse deixado claro desde o princípio que educação teológica não doutrina, em vez disso, desenvolve variados modelos culturais e teológicos de ser cristão. Também poderia implicar na realização ocasional (ou mesmo regular) de reuniões integradas, enquanto mantendo congregações cultural e racialmente segregadas. Esta é uma questão complicada que exploraremos mais no capítulo nove.

J. N. Horn parece estar consciente das dificuldades estruturais de uma igreja integrada quando—em outro contexto—discute os padrões de liderança da igreja e pergunta experimentalmente se uma liderança apostólica (ou “episcopal”, na terminologia eclesiológica moderna) pode ou não ser no mínimo tão espiritual quanto uma forma de governo constituída por líderes democraticamente eleitos.[153] Mas então, pessoas de “estatura apostólica” não são particularmente numerosas na igreja cristã. Nem todo mundo que diz ter autoridade apostólica é um Dom Hélder Câmara, um Martin Luther King, um Beyers Naude ou um Frank Chikane. Na realidade—com uma exceção, ou seja, Dom Hélder Câmara— a nenhum dos mencionados acima foi conferido o título de “bispo” ou “apóstolo”. Certamente existem verdadeiros apóstolos e bispos na igreja cristã. Infelizmente—ou talvez felizmente, quem sabe?—eles quase nunca são reconhecidos como tais. Que existem muitos assim chamados apóstolos e bispos nas igrejas cristãs—tanto nas grandes como nas pequenas—é um fato tão conhecido que dispensa documentação.[154]

uMoya—Uma Pneumatologia Pentecostal Negra

Outra opção poderia ser explorar resolutamente as possibilidades de uma pneumatologia negra baseada no conceito e experiência zulu do uMoya, o Espírito na cultura zulu.[155] Tal tentativa é realizada pelo teólogo pentecostal Allan Anderson.[156] Ele nos recorda do fato de que a teologia cristã não entrou na África num vácuo. Exatamente como os teólogos helenistas aceitaram certas conotações da cultura grega com o termo grego pneuma; exatamente como os teólogos latinos aceitaram certas conotações dualistas da cultura helênica-latina com o termo spiritus (com amplas conseqüências para a teologia européia—que tem esquecido o significado original de ruach jahwe, o termo hebraico);[157] exatamente como os teólogos franceses ouvem na palavra esprit e os teólogos alemães na palavra Geist algo do contexto cultural intelectual e “espiritado” dessas palavras; assim também Anderson procura utilizar o termo Moya para descobrir o Espírito Santo em um contexto africano com sua compreensão de poder, espírito, mundo e culto aos ancestrais. Será interessante ver como seus colegas pentecostais na África e em outros lugares irão reagir.

Ele sublinha os paralelos históricos e fenomenológicos entre o pentecostalismo e a religião africana, e está particularmente interessado naquilo que denomina igrejas do tipo Espírito (que eu chamo de igrejas sionistas ou pentecostais africanas independentes). Ele inclui também em sua apreciação geral o kimbanguismo do Zaire, as igrejas Aladura da Nigéria e igrejas similares de Gana. A conclusão mais importante de sua tese, que foi apresentada na Universidade da África do Sul—além de seu claro reconhecimento de uma continuação entre a religião africana e o pentecostalismo[158]—é a declaração de que: “O Espírito Santo tem santificado para seu uso expressões religiosas que são encontradas na África tradicional!”[159]

Por outro lado, não encontrei nenhum traço de tais reflexões na ainda assim interessante estória das Assembléias de Deus no sul da África escrita por Peter Watt—e isto, apesar de sua ênfase no fato de que a maioria dos seguidores da Assembléia de Deus serem negros. Ele é bastante claro sobre o “colonialismo eclesiástico” dos missionários estrangeiros[160] e demanda abertura ecumênica.[161] Por outro lado há um compromisso político bastante claro expresso em uma declaração oficial já em 1989 (!):

Somos contra a exploração injusta, a discriminação racial . . . A justiça bíblica seria melhor expressa no princípio de uma pessoa, um voto. Cremos ser um assunto de verdadeira urgência a convocação da Convenção Nacional. Ela deve incluir os líderes de importância na África do Sul, quer estejam no momento detidos, banidos, encarcerados, exilados ou agindo sob o presente sistema.[162]

Certamente isto não é expressão de uma espiritualidade apolítica do tipo utópico enganador.

Um debate entre Peter Watt, Allan Anderson, J. Nico Horn, Japie Lapoorta, Frank Chikane e outros poderia produzir uma frutífera agenda política e teológica sul africana, ou em termos africanos, uma pneumatologia africana. Um livro publicado recentemente por Allan Anderson intitulado Bazalwane,[163] será importante para este debate devido a seu rico material histórico sobre os penetcostais africanos na África do Sul (incluindo as igrejas sionistas e outras pentecostais independentes) e também porque o autor percebe não apenas um vínculo histórico mas também um teológico entre estes diferentes tipos de pentecostalismo na África do Sul.

Tal vínculo teológico é identificado por uma antropóloga canadense, Karla Poewe. Ela observa que na África do Sul, como em qualquer outro lugar,

teologias da libertação escritas eram populares entre estudantes, professores e, especialmente, cristãos politicamente radicais do Conselho Sul Africano de Igrejas. Elas eram teologias oposicionistas cujos seguidores falavam de revolução, mas trabalhavam dentro dos setores formais da sociedade a qual se opunham. Conquanto as práticas liberacionistas fossem freqüentemente rejeitadas pelos membros das diversas igrejas independentes, mesmo por aqueles que possuíam educação superior, as teologias da libertação escritas eram compreendidas por eles e percebidas como servindo uma função específica e importante.[164]

“Téologos negros falam negro e fazem branco,” diz Kenosi Mofokeng, que preside a Association of African Spiritual Churches [Associação das Igrejas Espirituais Africanas].[165] A razão é que as teologias da libertação escritas

surgiram a partir das experiências de sacerdotes católicos, freqüentemente americanos com educação superior, ou outros eruditos que trabalhavam com os pobres. Elas não surgiram a partir das experiências dos próprios pobres, mas a partir de como os sacerdotes e eruditos que se encontravam com os pobres imaginavam que os pobres sentiam sua pobreza. Consequentemente, elas são primeiramente e acima de tudo teologias que registram o choque cultural daqueles que trabalhavam com os pobres.[166]

Infelizmente este tipo de teologia da libertação tem por vezes se desenvolvido em uma ideologia na qual todo o mal é visto “no sistema,” e na qual matar e mutilar igualmente negros e brancos que casualmente discordam de uma ideologia revolucionária em particular é tido como necessário, no interesse da luta por libertação.

Como estou de fora dessa luta não sinto que possa ou deva julgá-la. Mas uma coisa é certa: Os liberacionistas até agora não demonstraram respeito suficiente pela religião daqueles a quem querem libertar. O modelo deles por vezes ainda é um modelo colonialista.[167]

CAPÍTULO SEIS

Pentecostes de N’Kamba: Simão Kimbangu e Sua Igreja[168]

Nem no sentido estritamente dogmático nem no sentido histórico a Eglise de Jésus-Christ sur la terre d’après le prophète Simon Kimbangu (EJCSK) pertence ao movimento pentecostal. Sua prática idiossincrática do batismo do Espírito,[169] por exemplo, é desconhecida entre os pentecostais. Diferentemente das outras igrejas independentes na África,[170] a igreja kimbanguista não surgiu do trabalho missionário pentecostal. Mas por outro lado existem paralelos notáveis entre os pentecostais e os kimbanguistas: cura através da oração; louvor espontâneo dentro dos moldes de liturgias não escritas, mas não obstante eficientes; a congregação como uma comunidade fraternal, envolvente; a liderança hierárquica da igreja; e o falar em línguas, tremores e visões.[171] Sobretudo, tanto os kimbanguistas como os pentecostais acreditam que o Espírito Santo pode ser experimentado, e que os espíritos malignos são melhor neutralizados pelo poder do Espírito.[172] Quando no comitê central do Conselho Mundial de Igrejas em Canterbury (1969) a igreja pentecostal brasileira O Brasil para Cristo[173] foi admitida no Conselho Mundial, juntamente com a igreja kimbanguista, o líder pentecostal brasileiro Manoel de Melo chamou o chefe espiritual dos kimbanguistas, Joseph Diangienda, de pentecostal, enquanto que este último aceitou Manoel de Melo como um kimbanguista.

Há outra razão para incluir este capítulo em um livro sobre as promessas e problemas do pentecostalismo. A EJCSK é uma das igrejas de um tipo pentecostal no Terceiro Mundo melhor documentada e pesquisada. Sua história e teologia contêm laconicamente quase todos os problemas e promessas de tais igrejas.

O Movimento Pentecostal e os Kimbanguistas no Zaire[174]

Susan Asch fornece a grosso modo a seguinte estatística: em uma população total de vinte e oito milhões encontram-se doze milhões de católicos, nove milhões na Eglise du Christ au Zaïre[175] e três milhões de kimbanguistas.[176] O número de pentecostais neste quadro é quase desprezível, talvez cento e trinta mil. As seguintes estatísticas estão disponíveis:

Communauté Assemblées de Dieu à l’Est du Zaïre (Handbuch, 01.18.003): 21 congregações, 30.613 membros (WChH 1968, 64); Barrett (WChE, 762) fornece para a mesma igreja 220 congregações, 4.409 membros, 10.780 seguidores (oriunda das Assembléias de Deus do Reino Unido).

Communauté Assemblées de Dieu au Zaïre (Handbuch, 01.18.004): 51 pastores e congregações, 50.000 seguidores (WChH 1968, 64); Barrett (WChE, 762): 270 congregações, 16.019 membros, 50.000 seguidores (oriunda das Assembléias de Deus dos Estados Unidos da América).

Communauté Evangélique de Pentecôte au Shaba: Barrett (WChE, 763) 120 congregações, 18.014 membros, 50.000 seguidores (aparentada com a Zaïrian Evangelistic Mission [Missão Evangelizadora do Zaire]).

Communauté Pentecôtiste au Zaïre: Barrett (WChE, 763) 600 congregações, 54.371 membros, 180.000 seguidores (oriunda da Zaïrian Evangelistic Mission).

Eglise de Dieu: Barrett (WChE, 762) 29 congregações, 6.163 membros, 10.000 seguidores (oriunda da Igreja de Deus de Cleveland, Estados Unidos da América).

Communauté des Eglises de Grace au Zaïre: Barrett (WChE, 762) 152 congregações, 5.538 membros, 20.000 seguidores. Conjunto de algumas igrejas que saíram da EJCSK “oficial.” Obviamente, o pentecostalismo no Zaire não é representado pelas diversas igrejas missionárias pentecostais mas pelo kimbanguismo em todas as suas formas. Barrett corretamente menciona as diferentes organizações do kimbanguismo sob o título “pentecostalismo.”[177] É claro que é um pentecostalismo sui generis.

A história no Zaire das Assembléias de Deus britânicas e norte americanas,[178] da British Congo Evangelistic Mission [Missão Evangelizadora do Congo Britânico] (atual Zaïrian Evangelistic Mission, ZEM)[179] e das Assembléias de Deus da França[180]—incluindo a notável obra educacional e hospitalar dos pentecostais noruegueses[181] e suecos[182]—ainda está por ser escrita. Sabemos muito pouco ou nada sobre o relacionamento (ou falta de relacionamento) entre estas e o kimbanguismo.

Parece que as diferentes missões pentecostais dificilmente tiveram qualquer contato uma com as outras, possivelmente porque cada uma trabalhava em uma parte diferente deste grande país. Marie-Louise Martin menciona quarenta e seis igrejas e sociedades missionárias protestantes no Zaire—muitas delas evangélicas.[183] Deve-se olhar para o protesto contra a fragmentação da igreja no Zaire à luz de tal contexto. Os jovens lançam a culpa por isto aos pés dos “missionários mercadores e traiçoeiros.”[184]

Poderia se esperar que houvesse cooperação pelo menos entre os pentecostais e os kimbanguistas no Zaire, e pode-se ver uns poucos sinais encorajadores aqui. Conquanto seja verdade que a rejeição das igrejas pentecostais negras no passado na África do Sul[185] encontra paralelo na rejeição dos kimbanguistas pelas Assembléias de Deus americanas,[186] no presente—e isto é um novo desenvolvimento—as vozes daqueles pentecostais que vêem nos kimbanguistas seus irmãos e irmãs estão crescendo. Christian Krust, um pentecostal alemão, relata o seguinte da Quarta Assembléia do Conselho Mundial de Igrejas em Uppsala em 1968:

Até aqui eu não sabia nada sobre a existência de tal igreja [ou seja, a igreja kimbanguista]. Mas quando, após cumprimentarmos a todos e nos apresentarmos, nos ajoelhamos para orarmos juntos, os dois irmãos [kimbanguistas] do Congo se juntaram a nós em oração. É verdade que minha compreensão da língua francesa é apenas parcial e não me foi possível seguir o fraseado exato da oração deles mas a maneira na qual oravam e falavam com Deus, aquilo me impressionou tremendamente e também aos outros na sala de oração: Estes irmãos estão especialmente inspirados pelo Espírito Santo! Eles falavam com tal dignidade e serenidade que aquecia nossos corações. Na subsequente discussão informal aprofundou-se a impressão de que aqueles dois irmãos [Jean-Claude L. Luntadila, Philip Nanga] estavam firmemente enraizados na fé, que eles eram verdadeiros membros do corpo de Cristo, nascidos de novo e batizados com o Espírito Santo.[187]

Podemos apenas esperar que as Assembléias de Deus mudarão seu juízo desfavorável em relação aos kimbanguistas (uma religião “pseudo cristã”) à luz dos relatos dos pentecostais europeus.

Minha avaliação está baseada em documentos e correspondência confidenciais nos arquivos do Conselho Mundial de Igrejas,[188] em conhecimento pessoal de kimbanguistas e uma visita ao Zaire, e sobretudo nas obras seminais escritas por Asch e Ustorf.[189]

Marie-Louise Martin também teve acesso a documentos relevantes sobre a origem da igreja, e foi capaz de entrevistar testemunhas oculares.[190] Isto possibilitou a ela verificar que muitos relatos e estórias eram lendas e portanto ela os descartou. Algumas dessas lendas apareceram em 1961 em uma pequena liturgia,[191] supostamente publicada por pastores kimbanguistas com a aprovação de seu líder espiritual. Embora este opúsculo seja freqüentemente utilizado como fonte por pesquisadores,[192] sem dúvida é uma falsificação; primeiramente porque os kimbanguistas não utilizavam liturgias impressas.[193]

Werner Ustorf, porém, tem sérias dúvidas quanto a descrição de Marie-Louise Martin não ser nada mais do que uma perspectiva alinhada “ortodoxa” do kimbanguismo conforme este é apresentado atualmente por sua liderança urbana. Ele vem procurando reconstruir em sua totalidade a vida e a morte de Simão Kimbangu baseando-se em documentos até então ignorados ou esquecidos (entre eles duas cartas de Simão Kimbangu).

Simão Kimbangu

Os kimbanguistas se divertem com a pneumatologia européia que diz que o Espírito Santo é um pássaro; para os kimbanguistas o Espírito se manifesta em um homem, Simão Kimbangu.[194] Uma pneumatologia muito interessante! Porém, uma vez que este homem morreu, seus filhos se tornaram a encarnação do poder e da orientação divina.

Quem foi Simão Kimbangu? Ele nasceu em 1889 em N’Kamba (Thysville, Baixo Zaire). Kuyela, seu pai, e Lwezi, sua mãe, morreram prematuramente. Ele foi criado por sua tia, Kinzembo. Quando jovem tornou-se cristão. Recebeu sua educação teológica dos batistas, e em julho de 1915 foi batizado no rio que passa por Ngombe-Lutete, juntamente com sua esposa Mvilu Marie e o homem que mais tarde seria seu assistente, Mikala Mandombe. Ele tentou ser catequista com a Sociedade Missionária Batista, mas não foi aceito pois possuía apenas um “treinamento de vila” e conseguia ler apenas “com muito tropeço.”[195]

Em 1918 ele buscou sua sorte trabalhando na Huileries du Congo Belge, e mais tarde como um tipo de vendedor ambulante em Kinshasa, para o que precisou de um “permis de séjour.”[196] As vendas nas ruas foram um fracasso. Ele “retornou a N’Kamba e tentou sobreviver como agricultor e carpinteiro. Não obstante, a família sofreu demasiadamente.”[197]

Já em 1915/16 ele recebera uma primeira vocação: “Tive um sonho no qual Deus me dizia: ‘Ouvi suas orações. As pessoas pensam que é necessário “de l’esprit”[198] para realizar minha obra, mas eu te darei em abundância.’”[199]

Uma noite em 1918, quando muitos estavam morrendo por causa da gripe pois a ajuda médica prometida pelas missões não chegara, Kimbangu ouviu uma voz dizendo: “Eu sou Cristo, meu servos são infiéis, e escolhi você para testemunhar e converter seus irmãos . . . Pastoreie minhas ovelhas.”[200] Simão respondeu: “Eu não sei realizar tal tipo de trabalho, Senhor. Há outros com melhor treinamento do que eu, eles cuidarão do rebanho.”[201] Esta conversa se repetiu noite após noite, e a esposa de Simão ouviu-o respondendo ao Senhor.

Na manhã de 6 de abril de 1921 (atualmente celebrado como o dia da fundação da igreja) Simão foi ao mercado. Então sentiu-se compelido a ir contra sua vontade à vila vizinha de Ngombe-Kinsukke, adentrar na cabana de Nkiantondo, uma mulher doente, e impor suas mãos sobre a cabeça dela e curá-la em nome de Cristo. A mulher ficou curada. Logo ocorreram outras curas. Marie-Louise resume este período:

O ponto mais importante ressaltado pelos narradores kimbanguistas é: “Não deveria acontecer no Congo a mesma coisa que aconteceu na Palestina? Já se foi a época dos milagres? Cristo não ordenou aos seus discípulos que pregassem e curassem? Se olharmos para as estórias nos Atos dos Apóstolos, não foi no poder do Espírito Santo que eles realizaram tais coisas?”[202]

“Para os seguidores de Kimbangu o que ocorrera fora nada menos do que um novo Pentecostes. O Espírito Santo evidentemente descera sobre Simão Kimbangu e lhe conferira autoridade para curar e pregar.”[203] Esta convicção é tão grande que a fórmula trinitária “no nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo” por vezes é complementada pelas palavras “que veio sobre Simão Kimbangu,” ou “que falou a nós por intermédio de Simão Kimbangu.” Isto não significa, como tem sido declarado,[204] que Simão Kimbangu substititui o Espírito Santo aos olhos de seus seguidores, mas que eles o consideram um instrumento (ou talvez uma encarnação) do Espírito Santo.

Isto se torna mais compreensível quando tomamos conhecimento do sofrimento no qual a população se encontrava naquela época. O colonialismo, com sua opressão e doenças contagiosas, reduzira a população dos bakongo à dois terços. A medicina européia era impotente diante das epidemias. Portanto, é compreensível que as curas de Kimbangu fossem consideradas uma dádiva de Deus.[205]

Então as massas convergiram. Sem querer tal coisa, Kimbangu tornou-se o fundador de um movimento amplo e entusiasta que balançou todo o país. Com a Bíblia em suas mãos ele conclamou seus compatriotas a destruírem toda feitiçaria e se absterem de danças pagãs e da poligamia. Surpreso com o grande sucesso, ele escolheu cinco auxiliares africanos. Mas os missionários e o governo colonial belga de então ficaram muito desconfiados.[206] Igrejas e locais de trabalho se esvaziaram, e Kimbangu foi responsabilizado por isto. De qualquer modo, pode-se considerar o movimento—como Ustorf faz—“um movimento de base apocalíptica de não cooperação que atrapalhou o funcionamento normal da economia colonial.”[207] Kimbangu foi injustamente acusado de ser inimigo dos europeus[208] e de seduzir o povo para a preguiça e para a recusa em pagar seus impostos.[209]

Em Nome da Lei e da Ordem

O servidor civil belga Morel foi convocado a iniciar uma investigação do reavivamento kimbanguista. Quando Morel chegou em N’Kamba o profeta e seus cinco discípulos sentiram o Espírito sobre eles e falaram em línguas e cantaram por toda a noite.[210]

Morel chegou a seguinte conclusão:

Kimbangu quer fundar uma religião que reflita a mentalidade dos africanos, uma religião que contenha os fundamentos do protestantismo misturados com práticas de feitiçaria . . . Todos podem ver que as religiões européias se petrificaram pelas abstrações e não correspondem à mentalidade dos africanos que desejam fatos tangíveis e proteção contra os demônios. A religião de Kimbangu os atrai porque é sustentada por fatos tangíveis.[211]

E Marie-Louise Martin acrescenta: “Quão certo estava Morel, mas o tempo para apreciar positivamente esta percepção ainda não estava maduro!”[212] pois Morel continua: “Portanto é necessário combater Kimbangu. Sua tendência é pan-africana. Os nativos dirão: ‘Encontramos um Deus dos negros, a religião perfeita para os africanos’ . . . A lei e a ordem exigem que o kimbanguismo seja parado silenciosa mas imediatamente.”[213]

Quando o governo colonial decidiu prender Kimbangu, ele fugiu de N’Kamba; mas em setembro de 1921, por sua própria vontade, ele apresentou-se aos seus perseguidores. Antes disso, ele admoestou seus seguidores a aceitarem o sofrimento corajosamente, nunca utilizarem a espada e nunca pagarem o mal que lhes era feito pelos europeus com o mal. Embora nenhum branco jamais tenha sido ferido, Kimbangu foi detido em setembro de 1921 após apenas cinco meses de ministério público. Em um psedo-processo—o escritor belga Chomé o classificou como uma “monstruosidade judicial”[214]—o comandante militar Rossi o sentenciou a 120 chibatadas,[215] e depois a pena de morte. Porém, o rei belga, Alberto I, reduziu a pena capital para prisão perpétua, parcialmente por causa da intercessão de alguns missionários.[216] Kimbangu foi deportado para Katanga onde passou trinta anos no cárcere. Ele morreu na prisão de Elisabethville (atual Lubumbashi) em 12 de outubro de 1951. J. van Wing (cujo relato obviamente também foi usado pelas Assembléias de Deus) declarou que Kimbangu em seu leito de morte concordou em se tornar católico, mas sua declaração é negada categoricamente pelas irmãs que haviam cuidado de Kimbangu na prisão, e por um de seus carcereiros.

O beneditino François Xavier Nsenkoto afirma que Kimbangu se converteu à igreja católica pouco antes de sua morte e que ele, Nsenkoto, o batizou.[217] Isto é fortemente negado por Sinda[218] e pelos líderes neo-kimbanguistas.[219] Ustorf, que discute todo o material cuidadosa e detalhadamente, correspondeu-se com Nsenkoto e também publicou duas cartas (disputadas) escritas na prisão por Kimbangu. Todavia, tende a concordar com Nsenkoto. Gilis afirma corretamente: “Não importa se ele morreu católico ou kimbanguista. Morreu em paz.”[220]

Ustorf, que discute a emergente consciência missionária em Kimbangu no contexto social e histórico da época pode explicar uma certa moderação na prisão (cf. Mt 11:3) e interpreta adequadamente a missão de Kimbangu quando escreve: “Kimbangu quase não tentou procurar um significado na Bíblia ou encontrar um texto voltado para sua situação. Ele estava procurando muito mais—como em geral fazem os pentecostais—por paralelos à sua história pessoal e social na Bíblia que iriam revelar seu significado. Claramente ele descobriu na Bíblia outros textos que não os dos missionários.”[221] Ressalte-se que este é um tipo de hermenêutica que também encontramos entre os primeiros discípulos de Jesus.[222]

Sofrimentos

Muito sofrimento aqui A doença nos faz sofrer. As lágrimas correm. Venha em nosso auxílio! Espírito Santo, venha, ò venha! Venha em nosso auxílio![223]

Muitos hinos falam dos sofrimentos daquela época quando Kimbangu aceitou sua prisão sem oferecer nenhuma resistência. Antes de entrar na prisão, Kimbangu admoestou seus seguidores a não exercerem qualquer oposição, deixando-lhes apenas a Bíblia e a sugestão de que eles devessem se unir às missões protestantes. Os kimbanguistas então se depararam com uma cruel perseguição que durou quase quarenta anos. Cerca de trinta e sete mil pessoas fora deportadas e muitas delas morreram no exílio.[224] Bastava apenas ser acusado de kimbanguista, ou pronunciar o nome Simão Kimbangu, para ser deportado sem julgamento. Durante um banquete em Kinshasa no qual um grupo de teatro apresentou a “Paixão de Kimbangu,” um kimbanguista me disse que ele fora preso as quatro horas da manhã pois a polícia encontrara em sua casa um artigo de jornal sobre Kimbangu. Ele foi levado para um campo de concentração[225] onde toda manhã diversos kimbanguistas eram açoitados e mortos—apenas por diversão. Porém, a deportação não quebrou o espírito de testemunho destes cristãos. A prova disto está em seus hinos:

Deus criou o céu e a terra. Ninguém é mais poderoso do que Ele. Um dia desses ele vai acabar com toda adulação. Venha rapidamente, vamos orar![226]

Surgiram congregações kimbanguistas no antigo Congo Belga, no antigo Congo Francês, no Gabão, em Angola e em Ruanda, a maioria secretamente. Como os líderes eram regularmente detidos, alguns destes grupos degeneraram e iniciaram intermináveis querelas uns com os outros. As últimas detenções ocorreram em 1957 (segundo Ustorf em 1959). Então seguiu-se o episódio—famoso na história da igreja kimbanguista—no Estádio de Esportes Rei Balduíno, atual Estádio São Rafael. Joseph Diangienda relatou o evento da seguinte maneira para Marie-Louise Martin: Enquanto ele permanecia no carro e orava,

Uma delegação de kimbanguistas foi com uma carta ao governador geral belga, Pétillon. A carta, assinada por seiscentos líderes kimbanguistas que eram reconhecidos por sua conduta irreparável continha o seguinte: “Estamos sofrendo demais. Onde quer que nos reunimos para orar seus soldados nos prendem. Não queremos causar tamanho problema para a polícia. Iremos todos nos reunir no Estádio Rei Balduíno—desarmados—e lá você poderá nos massacrar se assim o desejar.” A solução alternativa—não expressa na carta—“ou conceda-nos liberdade de religião.”

A delegação foi ao encontro de Pétillon enquanto os kimbanguistas começavam a se reunir no Estádio Balduíno para se prepararem para a prisão e morte. O governador ficou numa situação muito delicada, “Vocês acham que o governo tem o direito de eliminar todo um setor da população sem motivo? Ele perguntou aos delegados. Eles responderam: “Bem, o governo não tem esse direito? Então por quê tem o direito de deportar trinta e sete mil famílias?” Pétillon hesitou. Ele queria evitar uma decisão. O quê Bruxelas diria se ele ordenasse a polícia a atirar numa multidão desarmada? O quê a imprensa mundial diria? Por outro lado, o quê diriam os colons, os colonos brancos, se ele concedesse liberdade religiosa aos kimbanguistas? Mas a delegação insistia num claro sim ou não, sem rodeios. Finalmente o governador fez a única coisa razoável. Ele concedeu tolerância, dizendo: “Concedo-lhes tolerância mas sem a garantia do governo. Para isto não estou autorizado. Todavia, não prenderei vocês.”[227]

“Ficamos extremamente jubilosos,”[228] conclui Luntadila, o secretário geral da igreja, em seu relato do incidente. As negociações ainda duraram algum tempo. No natal de 1959—depois de quase quarenta anos peregrinando no deserto—a igreja kimbanguista foi reconhecida pelo governo belga e colocada no mesmo nível das missões protestantes e católica. Em 30 de junho de 1960 o Congo se libertou do jugo colonial. Aqueles kimbanguistas deportados que tinham sobrevivido puderam retornar.

A Igreja Kimbanguista no Presente

A Presente Doutrina Sobre Simão Kimbangu

Um exame de todas as passagens na literatura kimbanguista referentes a Kimbangu apresentam-no como o “enviado de Nosso Senhor Jesus Cristo”[229]; como “profeta”[230] e “exemplo”[231]; como aquele por meio do qual “o povo do Congo sabe que Deus e Jesus se lembraram de nós”[232]; e em uma instância como o consolador prometido em João 14:12-18.[233] As declarações sobre a segunda vinda de Kimbangu[234] e sua pré-existência,[235] que um teólogo europeu poderia compreender erroneamente como sendo idéias cristológicas, são interpretadas por Marie-Louise Martin no contexto de uma compreensão africana, que—similar aquela da Igreja Ortodoxa—assume que os cristãos vivos e mortos são uma única comunidade. O título “Deus” é explicitamente rejeitado para Kimbangu.[236] O termo mais inteligível para o leitor europeu provavelmente é aquele de intercessor;[237] i.e., Simão Kimbangu ocupa uma posição na igreja kimbanguista semelhante aquela dos santos na Igreja Católica. Talvez isto se deva à influência católica. “Porém, mais importante é o fato de que na África ninguém se aproxima da autoridade mais alta diretamente; a modéstia proíbe tal coisa. Busca-se um intermediário . . .”[238]

Os Príncipes Hereditários

A igreja kimbanguista presentemente é liderada por um tipo de hierarquia hereditária, constituída pelos filhos de Kimbangu. Joseph Diangienda por exemplo é Tata nfumu’a nlogon, traduzido pelos kimbanguistas como chefe espiritual. Este título significa na realidade um tipo de líder ou rei supremo sagrado. Esta hierarquia religiosa hereditária freqüentemente é criticada por teólogos cristãos como sendo contrária aos princípios de uma igreja cristã. Sobre isto Marie-Louise Martin diz o seguinte: “Precisamos não apenas de líderes educados, mas também de líderes carismáticos, em quem—como em Joseph Diangienda—brilhe algo da exousia, da autoridade, de Cristo. A falta de tais líderes na África [e na Europa?] é responsável por muitas crises na igreja. A África não vive por idéias, fórmulas e credos corretos mas por encarnações da fé cristã no sentido mais amplo.”[239] Em minha opinião aqui Martin não explica suficientemente por que esta qualidade carismática tem que ser hereditária—não obstante todas as profundas idéias expressas em sua afirmação. O problema aparecerá novamente, em todas as suas ambigüidades, na próxima geração de líderes.

Escolas, Missão e Obra Social

Quando as crianças kimbanguistas foram proibidas de freqüentar as escolas missionárias, os kimbanguistas tiveram que construir suas próprias escolas e seus próprios estabelecimentos de beneficência. Em 1968 o sistema escolar kimbanguista matriculava noventa e seis mil alunos em escolas subsidiadas pelo governo e muitas centenas de milhares de crianças e jovens em escolas que naquela época não eram reconhecidas. Hoje, o sistema está sob a direção de F. M’Vuendy,[240] um kimbanguista que obteve seu doutorado na Sorbonne. M’Vuendy também se tornou “le nouveau comissaire d’état à l’einseignement primaire et secondaire”[o novo comissário de Estado para o ensino fundamental e médio]—um tipo de ministro da educação no governo.[241]

Ademais, existem escolas para mulheres, oficinas para aprendizes e cooperativas para agricultores, como também kibbutzim (fazendas coletivas). Os kimbanguistas também constróem suas próprias pontes, usinas geradoras de eletricidade e fábricas. Um evangelista kimbanguista iniciou trabalho missionário entre os pigmeus ensinando-lhes como plantar mandioca e milho e como criar galinhas. Portanto, primeiro os pigmeus receberam ajuda para superar suas necessidades econômicas na transição de uma cultura caçadora para uma cultura de agricultura elementar.

Em e com esta obra social os kimbanguistas proclamam o Evangelho. Eles até já iniciaram uma missão entre os negros nos Estados Unidos, com quem expressaram solidariedade. Em um de seus catecismos podemos ler:

Saibam disto, que nós a raça negra somos a mais desonrada de todas as raças que Deus criou nesta terra. Não poderíamos terminar de contar os tormentos impostos sobre nós pelo homem branco, especialmente pelos homens brancos do governo. Pensem como fomos transportados pelos povos da Europa, quantos negros foram colocados em navios como sardinhas no mar, sem nunca terem uma mão estendida para ajudá-los. Por vezes um pequeno número conseguia chegar na América e em outros países do homem branco, mas mesmo estes poucos eram lançados em ilimitado sofrimento.[242]

Ética e Posição Política[243]

De acordo com a ordem eclesiástica de 6 de março de 1960 os kimbanguistas seguem estas regras éticas: respeitar as autoridades (Rom. 13:1-3) amar uns aos outros, incluindo os próprios inimigos (Mt. 5:43-45)

abstenção de bebidas fortes abstenção de tabaco e sobretudo de drogas abstenção de danças ou mesmo assistir danças (danças imorais) não nadar nem dormir sem roupas agir com caridade para com os necessitados, independentemente de raça ou cor (Rom. 12:9-21) abstenção de feitiçaria pagar impostos (Mt. 22:17-21) evitar toda maledicência contra o próximo evitar toda calúnia contra o próximo todos os membros devem confessar suas faltas a um grupo seleto o kimbanguismo é uma igreja do Espírito Santo; portanto todos os cristãos kimbanguistas têm que se comportar de acordo com o Espírito Santo a EJCSK não proíbe nenhuma comida, exceto carne de porco e de macaco a igreja tem o direito de excluir o membro que não quer seguir estas regras.[244]

A igreja “condena todo uso de violência na busca de resolução dos problemas entre os homens.”[245] Apesar disto, os kimbanguistas se alistam para o serviço militar. Eles rejeitam tanto o capitalismo como o comunismo.[246] Esta afirmação tem sido questionada por muitos observadores bem informados; eles ressaltam a extrema lealdade da liderança kimbanguista para com o regime de Mobutu,[247] a qual somente pode ser explicada (mas também não justificada) como a reação de uma minoria perseguida que encontra, por fim, um lugar de respeito na sociedade.

Culto

No culto kimbanguista os hinos,[248] que por vezes foram compostos durante períodos de perseguição, são tão importantes quanto o sermão. O primeiro historiador dos kimbanguistas chamou seus cantores de “chantres.”[249] Normalmente o canto é acompanhado por uma orquestra de flautas. Ocasionalmente toca uma banda de instrumentos de metais. Homens e mulheres compartilham igualmente na proclamação da palavra. O chefe espiritual, Joseph Diangienda, não prega. Ele ora; pois—diz ele—para um bispo ou líder religioso orar é mais importante do que pregar. Os kimbanguistas se reúnem diariamente em pequenos grupos para curtos encontros nos lares. Ao meio dia sempre oram. Na tarde e na noite das quartas-feiras realizam pequenas reuniões de oração. Todo sábado se reúnem em pequenos grupos de oração nos lares e oram por toda a noite. Aos domingos celebram seu culto principal que—sobretudo em Kinshasa—uma vez ao mês se estende para se tornar um grande culto festivo. Neste culto festivo eles trazem suas ofertas de acordo com o costume africano: dinheiro, produtos e outros presentes. Sem jamais terem lido Bonhoeffer, os kimbanguistas não admitem nenhuma separação estrita entre sagrado e profano. O encontro social e os cantos, composições musicais, conversas e ofertas de presentes profanos possuem tanto caráter religioso quanto os cantos, orações, composições musicais, ofertórios e danças estilizadas “religiosos.”[250]

A Catolicidade dos Kimbanguistas[251]

Com perseverança e paciência os kimbanguistas têm procurado entrar em diálogo com as igrejas européias. Para tal propósito, buscaram ingressar no Conselho Mundial de Igrejas. Na perspectiva dos kimbanguistas, uma igreja zairense não é uma igreja no sentido pleno da palavra, pois a igreja ou é universal ou não é igreja.[252] Como a igreja kimbanguista não pode ser universal por si só, ela considera o Conselho Mundial de Igrejas como um instrumento pelo qual ela pode participar na catolicidade de toda a igreja—uma noção eclesiológica que falta à muitas igrejas européias. Porém, foi montada uma oposição considerável contra a entrada dos kimbanguistas no Conselho Mundial de Igrejas.

Tal oposição veio de dois quadrantes: Por um lado temia-se—e com razão!—que a recepção dos kimbanguistas no Conselho Mundial relativizaria a obra missionária americana e européia na África. Por outro lado, os kimbanguistas não eram confiáveis teologicamente. Foi-lhes solicitado que submetessem sua confissão de fé—algo que nunca fora solicitado a nenhuma igreja americana ou européia. Mas a igreja kimbanguista não tinha uma confissão de fé. A teologia deles está incorporada em seus hinos e liturgia. “Eu não tenho o espírito para leitura,” disse Simão Kimbangu. “Não obstante, tenho considerável inteligência para religião.”[253] Para agradar ao Conselho Mundial de Igrejas os kimbanguistas escreveram uma confissão evangélica normal, que foi considerada em Genebra como plágio. Sua apresentação por um dos executivos do Conselho Mundial de Igrejas em Genebra—que declarou que sob tais condições nem os apóstolos nem Nosso Senhor Jesus Cristo jamais teriam tido uma chance de serem recebidos no Conselho Mundial de Igrejas—permaneceu sem resposta. Como as negociações se arrastavam por muitos anos, Joseph Diangienda escreveu uma importante carta ao Secretário Geral do Conselho Mundial de Igrejas em 15 de julho de 1969.[254]

Três pontos daquela carta:

1. A igreja kimbanguista não busca ingresso no Conselho Mundial de Igrejas visando vantagem material. Ela tem se desenvolvido independentemente de dinheiro estrangeiro e assim continuará.

2. A razão para o pedido de ingresso é espiritual. Já é hora dos cristãos considerarem seriamente os problemas de paz mundial, de justiça, de auxílio aqueles sem qualquer direito. Isto é algo que a igreja kimbanguista não pode fazer por si só. Esta tarefa tem que ser realizada pela igreja mundial.[255]

3. Mas se o Conselho Mundial de Igrejas chegar a conclusão de que o ingresso dos kimbanguistas irá “poluir” a pureza da instituição ecumênica, então teremos que aceitar isso com pesar. Assim mesmo, gostaríamos de dizer que permanecemos seus amigos.

A igreja kimbanguista foi recebida no Conselho Mundial de Igrejas em 1969.

Uma Teologia Africana

Os elementos africanos na igreja kimbanguista já foram sublinhados. A questão é, porém, se a igreja kimbanguista desenvolverá ou não uma teoria; ou seja, uma articulação teológica de sua prática. Talvez isto possa acontecer em sua doutrina dos sacramentos. Até recentemente a igreja não celebrava a Ceia do Senhor, sendo da opinião de que os sacramentos não pertencem à uma denominação—mesmo se esta fosse a kimbanguista. Em princípio os kimbanguistas argumentam que não há sacramentos denominacionais (i.e., sectários) mas apenas sacramentos católicos (i.e., ecumênicos). “Para nós,” declarou Joseph Diangienda a Dominique Desanti, “a comunhão será ainda mais ecumênica do que é para os católicos ou para os protestantes ocidentais.”[256] Uma comunhão denominacional contradiz a intenção do sacramento, que é uma expressão não racional da comunhão de todos os cristãos transcendendo a articulação racional. Na opinião dos kimbanguistas é portanto necessário que a comunhão seja tratada pelo menos dentro do quadro geral de todas as igrejas no Zaire. Apesar disto a primeira comunhão dos kimbanguistas celebrada em 6 de abril de 1971 não foi realizada como uma comunhão aberta.[257] Trezentos e cinqüenta mil kimbanguistas participaram em uma celebração que durou um dia e meio. Em vez de vinho e pão importados eles utilizaram “hidromel; um pão feito de batatas, milho e bananas preparado na maneira tradicional, a banana agindo como fermento.”[258] Agora—como nos dias de Zuínglio—será celebrada apenas três vezes por ano (na páscoa, no dia memorial da morte de Kimbangu e no natal).

Até o presente a igreja não pratica o batismo na água. Em vez disso, eles praticam o batismo no espírito (com um aperto de mão, seguido pela elevação do candidato, que se ajoelha diante do pastor). Este batismo no espírito não é administrado aos cristãos que vêm de outras igrejas para o kimbanguismo. Como eles já foram batizados, simplesmente se ora por eles. Para as crianças há uma cerimônia de invocação.

Marie-Louise Martin

Os pastores da igreja são em sua maioria honorários e ganham seu próprio sustento. O problema da educação teológica para pastores presentes e futuros é portanto bastante agudo. A falecida Marie-Louise Martin encarou este problema apesar das muitas dificuldades e com grande sacrifício pessoal. Parece que ela obteve sucesso ao educar um número de teólogos africanos sem aliená-los, com sua educação, de seu ambiente social[259] e religioso.[260]

Uma avaliação da igreja que eu quero mencionar é aquela de Geoffrey Wainwright. Ele mensura os kimbanguistas com a régua de uma ortodoxia protestante estritamente definida. Nem tudo na doutrina e na prática dos kimbanguistas corresponde com tais pressuposições. Apesar disto Wainwright chega a conclusão que “dentro do kimbanguismo uma concepção africana de Cristo . . . pode estar se esforçando para encontrar expressão teológica, e isto numa forma potencialmente ortodoxa.” Ele concede, porém, que já na época do Novo Testamento os conceitos de Cristo (Cristo, Senhor, Salvador, Filho de Deus, Filho do Homem) “vieram de seus múltiplos contextos anteriores carregados com associações não inteiramente apropriadas a Jesus sem alguma modificação.”[261] Wainwright não parece considerar a possibilidade de que a assim chamada posição ortodoxa possa talvez não ser tão bíblica quanto geralmente se pensa.

Marie-Louise Martin julga as chances para uma “teologia africana” muito mais positivamente: “O que se nos apresenta nas igrejas independentes da África em geral e na igreja kimbanguista em particular é aquilo que missiólogos na Europa têm desejado por tanto tempo: o início de uma teologia em estilo africano.”[262] H. W. Fehderau conclui de forma proposital: “Tem havido muita conversa sobre tornar nossas igrejas missionárias em igrejas indígenas; a igreja kimbanguista é indígena.”[263] E James E. Bertsche compara as igrejas de base missionária com as kimbanguistas:

Contra o contexto de um programa missionário parcialmente subsidiado e largamente institucionalizado, está o desafio do dinâmico movimento leigo de base do kimbanguismo. Espalhando-se junto as artérias de comunicação, através de barreiras de linguagem e linhas tribais, sua tropa de choque tem sido seus leigos entusiastas, sem salários. . . . Comparado com a efervescência deste movimento leigo, o programa da igreja estabelecida por missões mediana deve parecer de fato bastante rotineiro e desinteressante para os kimbanguistas.[264]

Disto Marie-Louise Martin tira a seguinte conclusão:

Até agora em muitas faculdades e seminários teológicos africanos tem-se ensinado teologia de acordo com o padrão europeu. Mesmo os cursos estavam—e ainda estão—afinados com este padrão. Obviamente os dogmas têm sido traduzidos para os idiomas africanos, e os hinos em alemão, francês e inglês também têm sido traduzidos para as línguas dos basotho, dos zulu, dos bavenda, dos bakongo e de muitos outros povos, juntamente com as melodias ocidentais reformadas ou de reavivamento, e até mesmo os harmônios. Mas será que estas traduções levaram o Evangelho até eles? É necessário algo mais do que apenas tradução para verdadeiramente se comunicar o Evangelho. O Evangelho e a igreja não devem mais aparecer em vestes ocidentais. Estas novas vestimentas somente podem ser tecidas por uma igreja africana, testada pelos sofrimentos e orgulhosa de sua missão. Creio que este é o caso na interpretação existencial kimbanguista da história da salvação, sua hierarquia, seus símbolos, seus ritos, suas imagens e músicas africanas ou africanizadas. Este é um início promissor. Podemos apenas torcer para que quando a igreja kimbanguista tiver seus próprios teólogos treinados em universidades eles não irão trair sua herança e falar no jargão ocidental. Nós teólogos do Ocidente temos apenas um pequeno papel a desempenhar neste desenvolvimento explicando o contexto histórico dos textos bíblicos, sublinhando a Formgeschichte, as formas literárias da tradição bíblica, que têm muitas similaridades com formas africanas de transmissão de tradição. Talvez também possamos ser de alguma ajuda quando os africanos usarem nossa terminologia própria e não entenderem-na. Podemos também assisti-los contando-lhes como outras igrejas se desenvolveram em outras partes do mundo, com ênfase especial na igreja antiga, nos pais da igreja e nas antigas igrejas africanas no Egito, na Núbia e na Etiópia, tanto quanto sabemos do desenvolvimento delas. Isto nos dá uma oportunidade para mostrarmos onde—conforme seja o caso—ocorreram desenvolvimentos equivocados e porque certas igrejas aceitaram certos ritos e formas. Assim podemos aprofundar a compreensão ecumênica. Talvez possamos também auxiliar na resolução das candentes questões éticas na nova África baseados em uma teologia bíblica sublinhando os perigos de um novo legalismo. E finalmente será nossa tarefa apontar vez após vez para a cruz de Cristo, que é a crise de todo empreendimento humano, de todos os desejos, idéias e símbolos humanos e de todas as teologias, mas onde estão prometidos o perdão, a ressurreição e a nova criação.

Não creio que possamos fazer muito mais. Temos que deixar o máximo possível para os africanos e sermos pacientes com eles mesmo quando sua expressão, seus termos, suas formas, suas organizações e suas estruturas nos parecerem imperfeitas ou mesmo totalmente erradas. Temos que vencer nosso medo de um possível sincretismo [capítulo 11, pp. 132-41], o que não significa fechar os olhos para seus perigos, mas sim confiar, como Paulo fez, que o Espírito Santo guiará os irmãos africanos à toda verdade. Se adotarmos essa atitude virá o dia em que a África produzirá uma nova formulação da mensagem de Jesus Cristo, que poderá ser significativa também para o Ocidente e fornecer uma nova dimensão ao diálogo ecumênico.

O Evangelho é um Evangelho de salvação. Isso é exatamente o que talvez a África tenha entendido melhor do que o Ocidente, onde entendemos o termo “salvação” muito freqüentemente como a “salvação da alma.” Na África, salvação significa aquilo que “shalom” significava para os hebreus: salvação e cura—não apenas de enfermidades, mas salvação no sentido mais amplo, “uma nova terra e sobretudo, um novo céu,” justiça social, paz, e em decorrência disto, nenhuma discriminação, nada de amarga pobreza lado a lado com riquezas suntuosas; fraternidade, ordem em liberdade, desenvolvimento dos potenciais individuais de todos, mas de tal forma que a comunidade é servida, o que é mais importante para os africanos do que a realização individual. Salvação inclui cura; uma nova vida na terra, livre de ódio, paixões, mentiras, corrupção, opressão; e santidade como uma expressão de nossa gratidão e a liberdade que Deus tem concedido em seu amor a todos os homens.[265] Isto será uma verdadeira escatologia.[266]

Outras Teologias Africanas

Desde que Marie-Louise Martin escreveu seu livro, outros têm desenvolvido teologias africanas, mas principalmente como idéias e não—até onde posso ver—em um programa de educação teológica africano. Pode-se mencionar, entre outros,[267] Kwesi Dickson, e sobretudo, E. Fasholé-Luke. Dickson, um professor africano na Universidade de Gana, descreve a situação da educação teológica africana em termos tristemente desfavoráveis (citando Fasholé-Luke[268]):

Os teólogos africanos continuam enfatizando os chavões teológicos que aprenderam nas universidades, faculdades e seminários teológicos no exterior, ou exibindo sua erudição citando as mais recentes idéias teológicas da Europa e da América do Norte. Como conseqüência, a educação teológica na África tem tido, no geral, o efeito de produzir teólogos que se sentem melhor ambientados no pensamento teológico ocidental ainda que tal pensamento pertença apenas a certo nível de sua consciência. É verdade que não se pode ignorar o que veio antes, mesmo que isso tenha vindo de outros contextos. Não obstante, não se pode argumentar com seriedade que as idéias teológicas emanando do Ocidente devam ser consideradas normativas também fora do Ocidente, defendendo que isto indicaria uma preocupação com uniformidade de expressão teológica e representaria um símbolo da unidade da Igreja.

Ele prossegue para lamentar o fato de que toda expressão teológica está vinculada ao inglês, francês ou português, e portanto—uma vez que essas línguas são estrangeiras em quase todos os países da África—permanece um assunto forâneo. Assim, ele diz, a Igreja sofre sob uma divisão de trabalho devastadora e não bíblica: aqui os produtores de teologia, o clero; ali os meros consumidores, o laicato. Não é de se admirar que alguns dos leigos com melhor treinamento já não se interessem mais por esse tipo de teologia, uma vez que eles são considerados principalmente como fontes de renda, e não como parceiros teológicos e peritos em teologia prática. Obviamente, esta é uma situação que nós no Ocidente já conhecemos muito bem.

Dickson chama a atenção para a diferente abordagem nas igrejas independentes (tais como a igreja kimbanguista), e afirma com termos bem definidos: “Nenhum estudo sério da teologia cristã na África pode com alguma justificativa ignorar estas igrejas e sua vida e pensamento.”[269] “E pensamento,” ele acrescenta! A teologia africana pode não ser sistemática, ele diz; mas a forma sistemática, a articulação proposicional de uma cadeia de argumentos, não é obrigatória para sua apresentação. Então, pode-se perguntar, quais são as alternativas?

Pode-se corretamente considerar a teologia de Dickson como uma dessas alternativas. Externamente, ela parece uma apresentação sistemática; mas sua dinâmica interna é diferente. É certo que ela é coerente e clara, mas sua coerência é mais semelhante aquela de um evangelho do Novo Testamento ou de uma novela de rádio do que de um tratado sistemático. Isto se torna evidente quando consideramos que o primeiro item que ele trata sob “Em Busca de Uma Expressão Teológica” é música. Em seguida, no capítulo sobre “A Teologia da Cruz em Contexto,” ele lida demoradamente com os costumes funerários comercializados europeus/americanos (como um exemplo de evitar a realidade da morte), os quais ele contrasta com o luto público na sociedade africana (como um exemplo daquilo que Mitscherlich denomina Trauerarbeit [“trabalho de luto”]).[270] Ele busca novos títulos cristológicos como Cristo “o Ancestral,” “o maior de todos os ancestrais que nunca deixa de ser um dos ‘mortos que vivem.’”[271]

É evidente que Dickson teria fracassado se ele tivesse apresentado seu livro para a obtenção de um doutorado em uma universidade alemã, suíça ou britânica. Isto obviamente não é um veredicto sobre o livro de Dickson mas sobre nossa própria falta de flexibilidade. Talvez não seja insignificante que um dos livros mais importantes da teologia européia, a saber, o comentário de Karl Barth sobre a Epístola aos Romanos, teria tido o mesmo destino se ele não tivesse optado por evitar o sistema acadêmico. Por quê é que nós não somos capazes de reconhecer o pensamento seminal de tais obras dentro da estrutura de nossa tradição educacional?

Pode-se acrescentar a isto a situação difícil da teologia acadêmica na Europa e na América. Somos instruídos sobre todos os métodos de exegese crítica e pensamento crítico, mas os membros de nossas igrejas continuam a discutir se Adão e Eva, Noé e Matusalém, foram ou não pessoas históricas. Eles ainda discutem se Deus poderia ou não Ter criado o universo em sete dias. A totalidade do sistema teológico parece um passatempo enorme, caro, mas fútil. A teologia “se desvinculou da comunidade para cuja vida seus resultados poderiam ser significativos.”[272] Uma vez que meu tema aqui não é a educação teológica européia termino aqui com estas observações. Mas quando refletimos sobre o fato que exportamos esse “passatempo” para o Terceiro Mundo como a mais recente realização na academia passamos a considerar o veredicto de Dickson um tanto suave.

Eu considero como outro exemplo de teologia africana o importante livro Christianity in Independent Africa [Cristianismo na África Independente], editado por E. Fasholé-Luke. Quase cinqüenta eruditos—africanos e europeus, católicos, protestantes e independentes—apresentam ali o resultado condensado de anos de pesquisa crítica conjunta. É um livro que questiona, algumas vezes com humor, algumas vezes com dolorosa precisão, não apenas nosso próprio passado teológico e missionário (disto, parece, agora já estamos quase perdoados pelos africanos), mas, mais ainda, nosso negligente isolamento teológico europeu nos dias atuais.

Somos informados por R. Elliot Kendall que trinta e seis mil missionários estão presentemente trabalhando na África.[273] Enquanto as sociedades missionárias mais antigas reduzem o número de seus missionários, as novas missões de fé aumentam o número dos seus. Há agora mais missionários trabalhando na África do que antes da independência, porém eles são menos significativos na liderança das igrejas.[274] Estima-se, por exemplo, que hajam cerca de 36.750.000 católicos romanos na África. Estes são atendidos por 3.700 sacerdotes africanos e 10.900 sacerdotes brancos (1973). Adrian Hastings descreve de forma impressionante o que “africanização” significa nesse contexto. “Trezentas dioceses significa trezentos bispos, trezentos vigários gerais, trezentos sacerdotes para ministrarem nas catedrais paroquiais, seiscentos ou mais para ensinarem em seminários, trezentos diretores de catequese diocesana, trezentos capelães para escolas secundárias, mais ou menos uma centena para administração eclesiástica nacional, outra centena para estudar, duas ou três centenas mais doentes ou aposentados. Quantos sobram para o trabalho pastoral rural regular?”[275] A resposta para essa situação anômala não é “a necessidade de mais sacerdotes, mais irmãs e irmãos, e mais dinheiro” do exterior. “É ilusório esperar por uma Igreja realmente ‘local’ na África a menos que estejamos preparados para questionar até mesmo o sistema em si,” diz o antigo diretor do Centre for Black and White Christian Partnership [Centro para a Parceria Cristã entre Negros e Brancos] em Birmingham [Inglaterra], Patrick A. Kalilombe.[276]

Um dos fatos que põe o sistema na berlinda é que, para sobreviverem, as igrejas mais antigas tendem a se tornarem cada vez mais parecidas com as igrejas independentes.[277] Essas igrejas independentes não são meramente seitas marginais mas uma força política e social recentemente emergente, como temos visto neste capítulo. Turner descreve uma visita à Igreja Celestial de Cristo em Ibadan [Nigéria] em 1973. “Conversei antes e depois do culto com quatro pessoas—as duas primeiras trabalhavam na área administrativa da Universidade de Ibadan, a terceira era professor lá, e a quarta (que observei anteriormente liderando uma classe de estudo bíblico em seu roupão branco e descalço) revelou ser o vice-presidente da Universidade.”[278] Semelhantemente, “líderes políticos, ministros de estado ou membros do Parlamento” freqüentemente consultam os profetas das igrejas Aladura (um grupo de igrejas independentes) na Nigéria.[279]

É, contudo, por uma razão ainda mais importante que a espiritualidade dessas igrejas está se tornando politicamente significativa. “A importância política de uma igreja depende da natureza de seus contatos com mulheres, analfabetos rurais, desempregados urbanos e outros setores e minorias menos privilegiados.”[280] Os grandes festivais da igreja kimbanguista e de outras igrejas, que reúnem regularmente milhares de fiéis, “têm um potencial imensamente importante como focos de comunicação em uma situação na qual os outros meios tendem a estar sob vigilância estrita ou primariamente preocupados com o interesse daqueles altamente educados.”[281]

Nesse processo de comunicação as mulheres são cruciais. O reavivamento na igreja Bukoba “significou que as mulheres, que sempre tinham estado quietas em público, começaram a falar nas reuniões e em pequenos ajuntamentos.”[282] É exatamente aí que as igrejas tradicionais se mostraram bastante “apolíticas,” por causa de sua pobre performance na questão da “liderança clerical feminina.”[283]

A política na África não pode ser separada da religião. “Praticamente nenhum governante africano tem sido capaz de adotar uma postura puramente secular.”[284] Em princípio é possível conceber uma base para as nações que não seja a religião. “Na prática apenas a religião é forte o suficiente para sustentá-las.”[285] “Raspe o político leigo proeminente e você descobrirá que sua ousadia pública e coragem animal estão escoradas em sua bajulação secreta interminável dos senhores das forças sobrenaturais na sociedade tradicional.”[286]

A interdependência entre política e religião tem tanto seus perigos como suas promessas. Um ministério religioso profético e crítico está emergindo apenas vagarosamente, mas está emergindo, por exemplo na África do Sul (capítulo 5, pp. 48-51), ou em Ruanda, onde revoltas raciais “conduziram um estado africano, erigido sobre uma causa moral, ao círculo mais interno do inferno político reservado para a África do Sul.”[287] Dr. Fasholé-Luke, chefe do Departamento de Teologia da Universidade de Serra Leoa, escreve[288] que os cristãos nos estados independentes da África parecem crer que a opressão está confinada a África do Sul e ao colonialismo branco, mas falham em perceber a opressão de negros contra negros em seus próprios países.

No campo mais teológico Desmond Tutu reclama que a “teologia africana tem falhado na produção de uma lâmina suficientemente afiada.” O arcebispo africano e vencedor do Prêmio Nobel da Paz acrescenta:

Por quê deveríamos nos sentir constrangidos se nossa teologia não é sistemática? Por quê deveríamos sentir que alguma coisa está errada se nossa teologia é muito dramática para ser verbalizada mas pode ser expressa adequadamente apenas nos cânticos jubilosos e no movimento cintilante da dança da África na liturgia . . . Deixemos a teologia africana se entusiasmar com a terribilidade do transcendente quando outros se embaraçam para falar sobre o Rei, altíssimo e elevado, cuja corte enche o templo.[289]

Mesmo uma organização como o Conselho Mundial de Igrejas descobre ser difícil acompanhar as palavras com obras. Gabriel Setiloane[290] descreve seu desapontamento quando uma publicação do Conselho Mundial eliminou a seção sobre os ancestrais em uma de suas meditações. Os ancestrais estão presentes em todos lugares na África e não apenas no meio dos que possuem pouca educação. Simon Barrington-Ward, bispo anglicano em Coventry, e Michael Singleton[291] merecem altos elogios por introduzirem este tópico fascinante mas controverso. Para eles a crença em espíritos ancestrais não é apenas uma reminiscência do passado africano mas uma forma de lidar com uma situação pluralista e tecnológica complexa, uma forma de juntar um mundo estilhaçado, e uma ponte entre a Europa e a África—uma idéia que já fora adiantada pelo sociólogo francês Roger Bastide.[292]

Esta digressão sobre a teologia africana é suficiente para mostrar que a teologia kimbanguista não é apenas um tipo de teologia local ou exótica. As questões que o kimbanguismo suscita são questões centrais para a África (e Europa), embora seja discutível se eles já encontraram respostas adequadas.

Kimbanguismo dos Kimbanguistas e “Kimbanguismo Oficial”

A igreja kimbanguista tem experimentado um crescimento tremendo. Ela cresceu passando de uma pequena igreja minoritária para uma igreja das massas com três (ou talvez mais ainda) milhões de seguidores. Esse crescimento aconteceu—pelo menos no estágio inicial—sem dinheiro do exterior. Com suas próprias mãos—mas com alguma ajuda do governo—eles têm construído suas igrejas e suas escolas. Alguém poderia dizer: bem, as missões têm feito exatamente a mesma coisa. É verdade, mas aí está uma igreja que, a partir de sua pobreza, a partir do seio de sua celebração e oração, tem se aberto para os problemas sociais de seu país sem solicitar as migalhas das fartas mesas dos europeus e americanos.

O desenvolvimento inflamado do kimbanguismo não implica apenas em grandes oportunidades mas também em muitos perigos. Diversas questões permanecem em aberto, como Dominique Desanti, que se descreve como um “observador descrente, mas profundamente interessado,”[293] tem expresso.

Pode ser argumentado, em primeiro lugar, que a moralidade estrita e o puritanismo austero do kimbanguismo estão indo contra as tendências atuais. As pessoas jovens nas cidades, que são constantemente confrontados com um estilo de vida totalmente diferente, podem muito bem preferir uma forma de religião mais tolerante. Talvez exista o perigo de que a organização hierárquica dos clérigos, que são escolhidos pelo líder espiritual sem direito de apelação, pode tender a atrapalhar o ardor místico que foi a vitalidade das primeiras comunidades. A Igreja se verá forçada a certa conformidade ao aceitar subsídios do governo para escolas e clínicas? Finalmente, não é possível que a introdução da Santa Comunhão[294] colocará um final a um dos aspectos mais originais desta religião, ou seja, a comunicação direta com Deus através da invocação e do misticismo?

Essas são questões que confrontaram o cristianismo primitivo quase dois mil anos atrás; questões com as quais os valdenses, os anabatistas e as igrejas da Reforma, e em nosso século os pentecostais, tiveram que enfrentar, e que todos eles tentaram solucionar cada um de sua própria maneira; questões que põem em evidência uma vez mais o significado ecumênico do kimbanguismo. Eles esperavam o reino de Deus. O que veio foi a igreja (kimbanguista). É dessa forma que Paul Raymaekers faz uma paráfrase da situação. Ele conclui: “Mas a nova igreja e a nova sociedade no Zaire não teriam vindo sem essa fé no reino que está além das igrejas e da sociedade.”[295]

Em outro nível, surgem questões similares àquelas conhecidas nas igrejas americanas e européias. Elas são sublinhadas por Werner Ustorf e Susan Asch.[296] Werner Ustorf demonstra que certas partes da “versão oficial” da história kimbanguista são lendas. Afinal, os documentos publicados pela liderança atual em Kinshasa refletem a história de sua igreja segundo a perspectiva ortodoxa (kimbanguista). Em termos históricos, seus documentos refletem a história da igreja escrita do ponto de vista dos vitoriosos. Mas a história kimbanguista também inclui vítimas que até agora têm sido silenciados. Esses são os kimbanguistas que se apegam a antiga tradição rural de Simão Kimbangu. Eles são condenados pela liderança kimbanguista como heréticos—assim, desde 1966 pelo menos dezessete facções (algumas delas suficientemente fortes) se separaram da EJCSK; por exemplo “Le Salut en Jésus-Christ par le Témoin Simon Kimbangu, Eglise Congolaise.”[297] Essa igreja foi proibida em 9 de junho de 1966 por causa de “perigo para a ordem pública.” Seu fundador, Bamba, foi executado em 2 de junho de 1966 após um julgamento forjado e ilegal no centro de Kinshasa diante de trezentos mil espectadores. O motivo do assassinato de Bamba e de outros três ministros do alto escalão na República do Congo foi a formação de um “Comitê para o Retorno a Legalidade,” que buscava pôr fim ao regime sangrento do General Mobutu sem derramamento de sangue. Porém, a conspiração foi delatada.[298]

A transição de um movimento oprimido para uma igreja estabelecida tem produzido problemas para os kimbanguistas similares aqueles experimentados pela igreja primitiva quando ela passou de uma minoria perseguida para a condição de igreja do estado. Agora, como naquela época, tais problemas terão que ser enfrentados em pelo menos dois níveis. Primeiramente, quase certamente a Igreja Kimbanguista terá que escrever sua história em diálogo com e em oposição aqueles kimbanguistas rurais que não vêem continuidade entre Simão Kimbangu e a liderança atual da EJCKS. O que acontecerá se a base documental da história eclesiástica “oficial” for abalada? O que acontecerá se a diversidade de opiniões quanto a “interpretação correta” da história kimbanguista forçar os kimbanguistas a escreverem sua história em diálogo com seus próprios dissidentes? O que acontecerá se todos os documentos forem disponibilizados? Muitos dos kimbanguistas mais rurais provavelmente estão mais próximos da tradição e valores de Simão Kimbangu do que dos valores dos atuais líderes em Kinshasa, que rejeitaram os próprios ensinos de Kimbangu como “heréticos.” Alguns desses kimbanguistas rurais têm permanecido com a igreja “oficial”, outros têm formado suas próprias organizações kimbanguistas ou quase-kimbanguistas. O brado de guerra “Retorno a Kimbangu; retorno aos tempos do reavivamento” pode criar estímulos e confusões semelhantes aos brados “Retorno a Lutero,” “aos Pais da Igreja,” “ao reavivamento pentecostal inicial” ou mesmo “ao Novo Testamento.” Pode-se esperar um questionamento sério da autoridade eclesiástica na igreja kimbanguista. Se algum dos grupos dissidentes decidir solicitar associação ao Conselho Mundial de Igrejas, tanto o Conselho Mundial como a liderança kimbanguista estarão em apuros.[299]

Em segundo lugar, o problema de autoridade na igreja não está resolvido. O sistema de príncipes hereditários certamente será desafiado, em relação a direção da igreja e em relação a correta interpretação da vida e mensagem de Simão Kimbangu. Como o caso de Bamba e os de outros dissidentes demonstram, a estória de Kimbangu pode ser interpretada de diferentes maneiras. Pode surgir uma situação na qual a igreja kimbanguista será forçada a retornar a sua tradição de oposição por meio de sofrimento.

Susan Asch chega a conclusões semelhantes as de Werner Ustorf. Ela fala do kimbanguismo e dos kimbanguistas (com sua tradição rural) distintamente do kimbanguismo oficial dos líderes da igreja em Kinshasa. A ironia é que o kimbanguismo “oficial” é minoritário.[300]

Obviamente essa situação não é exclusiva do kimbanguismo. Provavelmente o catolicismo oficial é uma pequena minoria na Igreja Católica mundial, e provavelmente o mesmo se aplica mais ou menos a todas as grandes igrejas, como também aos partidos políticos. É certo que a liderança do Partido Conservador Britânico é uma pequena minoria no partido; o mesmo é verdadeiro para os socialistas franceses e muitas outras organizações.

Em outro sentido também há duas igrejas na igreja kimbanguista. Quando visitei os kimbanguistas observei que quando eles falavam numa língua africana eles falavam francamente, sem vergonha alguma, de Kimbangu, cuja presença e auxílio tinham como certos. Mas quando falavam em francês era produzido um tipo impecável de Barthianismo. Isso não é uma questão de linguagem apenas. Para o visitante os kimbanguistas apresentavam a imagem de uma igreja protestante ortodoxa, uma imagem que ganhou vida devido as intermináveis discussões no Conselho Mundial de Igrejas (e em outros cantos), durante as quais os kimbanguistas tiveram que provar que não eram hereges. Mas entre seus próprios membros africanos rurais eles falam do coração.

Essa face dupla do kimbanguismo é confirmada por uma descoberta alarmante feita por Susan Asch.[301] Ela demonstra que muitos dos prestigiosos projetos de desenvolvimento do kimbanguismo são—por causa de métodos e pessoal importados—um fracasso. Isso não é mais verdadeiro no kimbanguismo do que em outras igrejas, mas não obstante é perturbador. Asch diz que a maioria do grupo de professores do kimbanguismo é estrangeira (haitianos e egípcios).[302] Não sou capaz de julgar a avaliação de Susan Asch, mas alguns dos fatos que ela apresenta parecem sugerir que a Igreja Kimbanguista tem recebido financiamento excessivo das agências de desenvolvimento, e que esse dinheiro não tem sido saudável para os próprios projetos de desenvolvimento que estão sendo financiados. Se isso é verdadeiro, então temos uma situação semelhante aquela encontrada em outros projetos de desenvolvimento na África.

Porém, não quero terminar este capítulo com uma nota sombria. Quaisquer que sejam os recuos do kimbanguismo, sua vitalidade prática e espiritual impressiona qualquer observador. Os kimbanguistas terão que solucionar suas dificuldades com suas próprias idéias e força espiritual. Nenhum estrangeiro pode fazer isso por eles.

Oração da Lagarta

Querido Deus,

As vezes me sinto igual uma lagarta, eu como grama e folhas e folhas e grama. As vezes um pássaro voa sobre mim e fico temeroso. Ou uma galinha chega por perto e cacareja e cisca a terra com seus pés, e tenho que me esconder novamente. Por que eu tenho que ser uma lagarta, querido Deus, Por que eu não posso saltar como um cabrito montês, voar como uma águia, nadar como um peixe.Por que eu posso apenas rastejar como uma lagarta.Não fui quem me fiz, e tu não me perguntaste se eu queria ser uma lagarta, nem mesmo se eu queria ser criado. Nem meus pais me consultaram e pediram por meu consentimento. E é por isso que sou o que sou, uma pobre lagarta rastejante de A até Z.Até aquele dia quando estarei encerrado em um pequeno casulo e a porta for trancada, e eu anelando, anelando, anelando na escuridão, e as coisas se modificam e eu sou transformado e irrompo para fora do casulo e vôo no brilho do sol de uma eterna manhã de Domingo E então estarei feliz tendo sido uma lagarta porque tu, meu Deus, tu dás nova vida a esta lagarta, a vida de uma maravilhosa borboleta.

CAPÍTULO SETE

México: Flores e Cantos. Uma Contribuição Mexicana ao Fazer Teologia[303]

Teologia Intercultural—Um Sistema de Mão Dupla

É possível um diálogo teológico entre as igrejas do Terceiro Mundo e os sistemas teológicos da Europa e da América? Se existe qualquer significado nos slogans ecumênicos “Unidade da Humanidade, Unidade da Igreja”[304] ou “Missão nos Seis Continentes,”[305] então tal diálogo tem que ser possível. Mas até agora o Terceiro Mundo tem aparecido teologicamente apenas quando tem utilizado conceitos europeus/americanos. Nossos parceiros teológicos do Terceiro Mundo, que pensam diferentemente de nós, ou nunca se fazem ouvir em seus próprios termos, ou então perdem o interesse nesse debate teológico, o qual se torna um luxo que eles somente podem desfrutar com subsídios do exterior. As regras desse jogo teológico são nossas mesmo quando o jogo é jogado em Nairóbi ou no México. Essa é a principal razão para o alarmante fato de que muitas das igrejas cristãs no Terceiro Mundo não se associam ao Conselho Mundial de Igrejas, e muitas também são descartadas nos campos da teologia sistemática, da história eclesiástica e da missiologia. Quem vasculhar a literatura teológica dos últimos vinte anos ou os relatórios dos diversos comitês do Conselho Mundial de Igrejas por contribuições teológicas do Terceiro Mundo, verá que o resultado é lamentável. Philip Potter, das Índias Ocidentais, antigo secretário geral do Conselho Mundial de Igrejas, explica que é fácil perceber por que (por exemplo) os delegados africanos na Quinta Assembléia da Federação Mundial Luterana em Evian, 1970, simplesmente imitaram a teologia européia tradicional:

Que oportunidade eles tiveram para refletirem sobre a fé de sua própria maneira? Se eles não tivessem sido “bons meninos” eles nunca teriam se tornado líderes eclesiásticos. . . . Nós raramente tivemos permissão para pensar por nós mesmos. Por tempo suficiente temos sofrido com um tipo de imperialismo teológico. Eu chamo isso de racismo. Se nós não ocidentais não nos apegarmos rigidamente às fórmulas precisas do escolasticismo ocidental, não seremos considerados teólogos, ou suficientemente brilhantes para comunicarmos o Evangelho.[306]

O bispo pentecostal mexicano, Manuel Gaxiola-Gaxiola, se junta à essa crítica em sua dissertação sobre o pentecostalismo mexicano. Ele descreve o México como estando “tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos”[307] e fala de “uma ingerência desnecessária dos Estados Unidos nos negócios internos da América Latina [Doutrina Monroe],”[308] da “intervenção americana em favor de Victoriano Huerto, o vilão sanguinário da Revolução Mexicana, e, obviamente, dos grandes investimentos americanos, que exigem pressão e proteção diplomática.”[309] Tal situação “ainda não convenceu todas as pessoas que se tornar protestante não significa se tornar americano, o que é um dos maiores obstáculos para a conversão de muitos.”[310] “O novo proletariado no México é super eficiente e super barato. A pessoa encontra trabalho nos portões das modernas fábricas, mas sabe que está sendo empregada porque é a pessoa que menos recebe para fazer aquele trabalho, mas assim que a companhia multinacional para a qual ela trabalha encontrar outra pessoa em outro país que deseja trabalhar por menos, a fábrica se deslocará para aquele país.”[311]

Quando os Silenciados Começam a Falar

Este é o momento certo para quem está procurando categorias não ocidentais para pensar teologicamente e apresentar teologia. A Divisão de Missão Mundial e Evangelismo do Conselho Mundial de Igrejas vem trabalhando com tais experimentos—e eles são certamente experimentos! O caminho diferente que o Conselho Mundial está buscando somente pode ser encontrado em diálogo com aquelas pessoas no Terceiro Mundo que não podem e não irão aceitar nossos modos de comunicação.

O contexto histórico de tais conversações no México é interessante. O propósito daquilo que o Conselho Mundial de Igrejas está fazendo foi descrito em uma entrevista à imprensa no México como o movimento revolucionário “que a fé cristã não meramente permite mas positivamente exige,” por meio do qual

deve ser permitido aos homens sem voz, homens que foram reduzidos ao silêncio por nossos conceitos intelectuais e preconceitos raciais, falarem por si mesmos. Isto significa que o diálogo não pode ter uma vantagem embutida para o ocidental. Essa é a revolução que almejamos. Isso, também, é o que Paolo [sic] Freire busca. Os governantes do Brasil tinham mais medo dessa revolução do que de qualquer levante armado. Por isso é que eles encarceraram o antigo ministro da educação, Freire, pois homens conscientes de sua dignidade e importância são mais perigosos do que escravos armados.[312]

Capacitar Outros a Desenvolverem um Rosto

Mil anos atrás o México já havia desenvolvido um dos mais avançados programas de educação, e uma fascinante filosofia. Para formular sua filosofia, porém, eles não criaram um sistema comparável com o sistema de um Aristóteles, um Tomás de Aquino, ou um Hegel. Miguel Léon-Portilla, um especialista em civilização mexicana (náhuatl) antiga, corretamente ressalta que a qualidade de uma filosofia, teologia ou teoria de educação não pode ser avaliada pelo critério dela criar ou não um sistema.[313] Conquanto possa haver filósofos e teólogos “que ainda consideram ser a construção de um sistema lógico coerente a única forma de pensamento filosófico”[314] esta é uma atitude equivocada que se aceita exigiria que nós excluíssemos da discussão até mesmo famosos filósofos ocidentais como Agostinho, Pascal, Kierkegaard, Unamuno, Ortega e Bergson, sem mencionar Lutero e a Bíblia.

A filosofia não sistemática dos antigos mexicanos não os impediu de criar um programa educacional compulsório que dava às crianças nas circunstâncias mais humildes uma oportunidade de educação igual com a nobreza e a realeza.[315] A figura central nessa educação era o tlamantini: o homem sábio, ou “aquele que conhece as coisas,”[316] ou “aquele que faz os outros desenvolverem uma face, uma personalidade.” Sobre essa figura, León-Portilla conta-nos que “ele coloca-os, por assim dizer, diante de um espelho e faz com que eles descubram a si mesmos.”[317] Sob sua influência as pessoas “humanizam seus desejos.” “O bom tlamantini—com um bom médico—submete-se à crítica prática de seus métodos e está pronto a fazer experimentos. O mau tlamantini—como um mau médico—guarda sua tradição para si mesmo. Como a lagartixa, ele gosta dos cantos escuros; ele lida com poções mágicas secretas e dessa maneira destrui as faces dos homens, as personalidades dos homens.”[318]

O meio educacional entre esses mexicanos antigos não era o manual ou o livro texto, mas a poesia. Neste mundo ninguém pode declarar a verdade, disse o tlamantini, exceto talvez por meio de “flores e cantos.”[319] Se eles quisessem ser precisos eles não buscavam definições mais elaboradas, mas descreviam o que queriam dizer referindo-se a duas de suas características mais notáveis (difrasismo). Por exemplo, descreviam uma mulher como “saia e blusa,” uma cidade como “água e montanha” e a transcendência de Deus como “noite e vento.”[320] Como um caçador, o tlamantini estava a procura de cantos; ele “obtém sorrateiramente flores e cantos,”[321] “borboletas de canto.”[322]

Essa abordagem recusava-se a expressar o inexprimível. Daí o ceticismo e agnosticismo dos nahuas. Podemos dizer qualquer coisa certa sobre o futuro, sobre a vida após a morte, ou mesmo sobre o significado da vida?[323] Esse ceticismo encontrava expressão última na questão: O homem possui alguma verdade?[324] O que estava em questão aqui não era a sinceridade do homem; era a questão muito mais radical se homem, de qualquer modo, poderia possuir a verdade. Tanto a natureza da verdade como o mundo dos bens, temos que “considerar como emprestados para nós, ò amigos.”[325]

Entra a “Verdadeira Fé”

Com a chegada dos espanhóis, os cantos desvaneceram, as flores foram pisoteadas, as plumas de quetzal arrancadas. A filosofia dos mexicanos foi desprezada como sendo superstição, ainda que baseados em seu programa educacional de “flores e cantos” os mexicanos tivessem desenvolvido uma matemática, uma astronomia e uma arquitetura que ainda hoje despertam nossa admiração. Os livros do povo nahuatl foram queimados, seus templos saqueados, sua língua suprimida, seus mestres e sacerdotes mortos. Las Casas, um missionário católico e defensor dos índios, calculou que doze milhões de índios morreram em trinta e oito anos, a maioria como escravos nas minas.[326]

O último testemunho dos nahuas é encontrado no registro[327] contemporâneo da discussão que alguns dos tlamantinime tiveram com os missionários espanhóis recentemente chegados. Os missionários urgiam-nos a sinceramente abominarem, desprezarem, amaldiçoarem e cuspirem nos deuses que eles tinham cultuado. Os mexicanos responderam cortesmente que eles estavam bastante conscientes das dificuldades e perigos que os espanhóis tiveram que enfrentar na travessia do oceano:

Nossos Senhores, nossos mui estimados Senhores: muitas dificuldades vocês enfrentaram para chegar nesta terra. . . .[328]

Vocês disseram que nós não conhecemos o Senhor da Vizinhança Próxima[329] a quem pertencem os céus e a terra.Vocês disseram que nossos deuses não são deuses verdadeiros.Novas palavras são estas que vocês proferem; por causa delas somos perturbados, por causa delas estamos atormentados.[330]

Como os missionários podiam proferir tais coisas ofensivas? Os mexicanos tinham conhecido Deus por séculos, à medida que Deus pode ser conhecido por qualquer um. O que os missionários queriam que eles cressem eles não criam ser verdadeiro, mesmo que dizer isso ofendesse os missionários. Então, de forma simples e impressionante, os mexicanos responderam:

Permitam-nos então que morramos, deixem-nos perecer agora, uma vez que nossos deuses já estão mortos.[331]

Um Herege Defende os Índios

Desde cerca de 1509 os especialistas legais católicos defendiam que era necessário, antes de embarcar para a guerra, justificar tal passo para os povos gentios da América Latina e conclamá-los a se renderem voluntariamente.

A partir de 1513 essa proclamação oficial (conhecida como o requerimiento) passou a ser obrigatória . . . Os habitantes do país eram informados de que havia apenas um Deus e que seu representante era o papa em Roma e, ademais, que este último tinha dado os territórios deles para os reis de Espanha. Exigia-se do povo, então, que aceitasse a fé cristã e a ela se submetesse. A recusa voluntária em assim fazer implicaria em guerra, todos os tipos de infortúnio, a escravização de todos eles juntamente com suas esposas e filhos, uma vez que eles seriam rebeldes contra seu legítimo soberano. Uma vez que ninguém, obviamente, se submeteu voluntariamente, o morticínio começou.[332]

Aqueles que se submeteram não obstante foram escravizados. Um dos poucos a desafiar tais práticas foi o frei dominicano Bartolomé de las Casas. De maneira resumida e categórica, ele considerou como injustas todas as guerras efetuadas pelos espanhóis.[333] “Os supostamente gloriosos feitos dos heróis espanhóis são grandes iniquidades. A Espanha ainda vai ter que pagar por isso até o último ceitil. Ela fracassou na tarefa que lhe foi confiada e mostrou-se incapaz de se satisfazer com o menor benefício material desses territórios coloniais.”[334] Correspondentemente, frei Bartolomé recusou-se a conceder absolvição aos soldados que partiam.[335] Além disso, ele insistia em que o imperador Carlos V deveria devolver toda a propriedade que injustamente tomara para si.[336] Não é surpreendente, portanto, que os espanhóis tenham difamado Las Casas como herege e anticristo luterano.[337]

A controvérsia atingiu o auge na disputa entre Las Casas e Juan Ginés de Sepúlveda em 1550-1557. Sepúlveda citou quatro razões para justificar a guerra contra os gentios:

1. Devido ao caráter hediondo de seus pecados, particularmente sua idolatria e seus pecados contra a natureza, eles mereciam ser punidos.

2. Devido a sua condição primitiva, eles tinham a obrigação de servirem aos espanhóis mais avançados, e se eles se recusassem, deveriam ser obrigados a tal pela força.

3. Porque o caminho para a pregação do Evangelho somente poderia ser preparado pela conquista.

4. Porque os seres humanos inocentes destinados ao sacrifício tinham que ser libertos, e o canibalismo eliminado.[338]

A réplica de Las Casas ao primeiro ponto foi que os pecados dos gentios não se enquadravam na competência da igreja. “Pois, que me importa julga os que estão de fora? . . . Deus julga os que estão de fora,” disse São Paulo (1 Cor. 5:12s). Ao segundo ponto ele respondeu que os índios não eram meramente rudes bárbaros. Ele respondeu ao terceiro ponto lembrando Sepúlveda de que Cristo, ao enviar seus discípulos, aconselhou-os a que estivessem prontos a entregar suas vidas por Sua causa. Ao último ponto de seu oponente, Las Casas respondeu que a guerra trazia em sua esteira monstruosidades, ódio, medo e falsidade; portanto os males da guerra ultrapassavam em muito quaisquer possíveis benefícios a serem alcançados na proteção de inocentes.[339]

Ruínas

Las Casas não foi atendido. Tudo o que restou, pois, do sistema educacional, língua, arte e arquitetura mexicanos é ruínas. Não é exagero dizer que o presente analfabetismo geral e a dependência econômica dos mexicanos foram criados pelos europeus, e têm sido mantidos pelos americanos. A invasão e conquista do México foi o início de um longo martírio. Ainda está acontecendo diante de nossos próprios olhos. Os mestizos e os índios, “a partir de um sentimento da mais profunda vergonha espiritual, dificilmente ousam levantar suas cabeças. O problema do camponês não é simplesmente que ele possui apenas algumas poucas moedas em seu bolso. É algo mais, que o reduz a algo menos do que um homem,” diz Oscar Maldonado, um sacerdote católico romano mexicano.[340]

Contudo, a antiga tradição mexicana continua a viver de uma forma fragmentária. Mesmo os restos das esculturas, templos e livros compelem a admiração do visitante do Museu Antropológico no México.[341] Mas as ruínas que foram deixadas não são apenas aquelas de pedra. Há reminiscências da tradição mexicana que são descobertas, por exemplo, quando padres e freiras se juntam aos campesinos para escavarem a humanidade sepultada dos antigos mexicanos. Os camponeses podem uma vez mais recuperar “sua face.” Mas nós também encontramos essa antiga tradição mexicana no movimento pentecostal mexicano. Esses pentecostais estão desenvolvendo sua própria vida econômica e social—talvez até mesmo sua própria teologia—independentemente de missionários estrangeiros.[342]

Iglesia Cristiana Independiente Pentecostés

Uma das igrejas desses pentecostais é a Iglesia Cristiana Independiente Pentecostés com 150.000 membros.[343] Seu fundador foi Andrés Ornelas Martínez (falecido em 1958),[344] um mineiro de San Juan de Los Lagos no estado mexicano de Jalisco. Pouco depois da Primeira Guerra Mundial Ornelas emigrou para Miami (Arizona) onde alguém lhe deu uma edição em espanhol do Livro de Provérbios. Numa primeira olhada o livro não lhe despertou atenção. Quando de seu retorno para sua cidade natal,[345] ele começou a ler o livro para amenizar o tédio, e achou o livro interessante. Mas estavam faltando as últimas páginas do livro, e então ele solicitou todo o “Livro de Provérbios” ao endereço em Los Angeles que estava impresso no rodapé da página do título. Ele recebeu alguns folhetos, o Livro de Provérbios e um Novo Testamento. O estudo do Novo Testamento cativou-o tanto que quando os outros estavam dormindo a noite ele saía para o campo para orar, confessar seus pecados e pedir a Deus que o usasse para algo digno. Em dezembro de 1920[346] ele viajou novamente para Miami em busca de uma Bíblia completa. Ao ouvir um colega mineiro pronunciar a palavra “Bíblia” ele lhe perguntou: “Você tem uma Bíblia? Pode mostrá-la para mim?” Ele mal pode esperar pelo fim do turno para poder ver a Bíblia. O colega o levou ao seu pastor que deu uma Bíblia a Andrés Ornelas. (Essa Bíblia atualmente está guardada na sede da Iglesia Cristiana Independiente Pentecostés, Pachuco).

Em maio de 1921 Ornelas retornou ao México, e foi primeiramente aos cultos dos metodistas em Pachuco (Hgo). Lá ele conheceu Raymundo Nieto, que o apresentou ao batismo pentecostal no Espírito e batizou-o em outubro de 1922 em um rio.[347] Em junho de 1922 os dois já tinham fundado uma congregação pentecostal em Pachuco que hoje é considerada como a igreja mãe da Iglesia Cristiana Independiente Pentecostés.[348] Devido ao seu testemunho destemido, cura de enfermos e cristianismo prático, eles conquistaram um número de seguidores. Porém, esse também foi o período em que o governo favoreceu o protestantismo por causa de sua antipatia para com a Igreja Católica.[349] Em 1927 Raymundo não foi mais “considerado estar numa posição para continuar seu pastorado” (conforme Ramírez conta isso).[350] Ornelas tornou-se o pastor da igreja de Pachuco.

Por meio da junção com outras igrejas, entre elas uma que fora fundada pelo missionário pentecostal sueco Axel Anderson (Igreja Filadélfia, renomeada Igreja Saron) na Cidade do México, a organização cresceu constantemente. Em 1941 Ornelas se afastou dos missionários estrangeiros. Em 1953 ele teve sucesso em unir duzentas congregações em uma única organização. “Foi um ato histórico quando ele sacudiu o jugo dos maus estrangeiros e seus paladinos mexicanos,” declara o jornal oficial da igreja em um breve relato histórico.[351] Em 1955 a igreja juntou-se com a importante Iglesia Evangélica Independiente. A igreja unida é chamada hoje—depois de mais outras uniões—Iglesia Cristiana Independiente Pentecostés. Logo bem no início eles enviaram seus missionários para a Colômbia e Porto Rico.[352] Eles também foram instrumentais na fundação de um banco, El Banco del Fondo Común.[353] Ramírez relata orgulhosamente no prefácio de sua história da igreja: “O movimento é genuinamente indígena. Não recebe subsídios de nenhuma nação ou missão estrangeira.”[354]

Ixmiquilpan

“A região de Mesquital* do estado de Hidalgo no México é um dos lugares mais secos e pobres do país. Vales semelhantes a pradarias são cercados por montanhas amarelas. Durante o dia o sol queima impiedosamente e a noite pode ficar muito fria, uma vez que os vales estão a dois mil metros acima do nível do mar.”[355]

A industrialização que invadiu a Cidade do México, Monterrey e Guadalajara na década de 1950 ainda não chegou na região de Mesquital, onde a agricultura e um pequeno artesanato doméstico produzem uma renda muito pobre, e onde em 1960 mais do que metade da população ainda falava a língua dos índios otomí. Esses índios podem ser divididos novamente em metade que falam exclusivamente otomí e metade que, além da língua indígena, dominam algo do espanhol.[356] Mais de um terço são analfabetos.

Os efeitos da revolução política e social que conquistou as grandes cidades entre 1910 e 1917 chegaram muito mais tarde no território dos otomí. Na década de 1930 dificilmente se poderia encontrar algum protestante ali. Aqueles que ousavam confessar a nova fé ou eram expulsos ou mortos.

É por isso que em 1936 um jovem índio de nome Venancio Hernández[357] teve que deixar seu vale natal e a fazenda onde ele e seus ancestrais tinham trabalhado desde a chegada dos espanhóis. Após ter aprendido a ler e escrever sozinho, ele conseguiu de alguma forma adquirir uma Bíblia. Ele começou a lê-la, primeiro bastante ceticamente pois sabia que a grande revolução mexicana era conscientemente bastante anti-eclesiástica se não anti-religiosa. Como índio ele também sabia como a religião dos conquistadores tinha sido imposta sobre a população nativa, por vezes pela força, e como a hierarquia da igreja tinha se posicionado, durante a guerra de independência no início do século dezenove, ao lado dos espanhóis e do rei estrangeiro.

Porém a Bíblia que Venancio Hernández agora lia parecia-lhe ser totalmente diferente. O Cristo que ela descrevia não estava meio escondido pela Virgem Maria ou os santos. Ele não era nem um menino pobre e frágil nem um filho de Deus coroado com espinhos, lacrimejando, morrendo ou mesmo morto. Pelo contrário: ele falava com autoridade, demonstrava coragem e não temia nem os poderosos deste mundo nem a indignação das pessoas que tinham esperando outro Messias. Tal personalidade teria se encaixado muito bem na revolução mexicana! Mais: esse Cristo falava com pessoas individualmente sobre o pecado delas, a perdidão delas; e a elas revelava Deus através de seu amor pela humanidade, e pela sua morte expiatória, pela qual ele reconciliou a humanidade com Deus. Era necessário apenas aceitar essa dádiva . . .! Por quê ninguém tinha trazido essa mensagem a Venancio Hernández? A Virgem Maria, os santos, os locais de romarias e as indulgências: nada disso era necessário se esse livro estivesse certo. E ele estava certo, pois Venâncio alcançara uma certeza interna até então desconhecida para ele. Ali estava uma mensagem que finalmente fornecia a direção espiritual correta para seu pensamento revolucionário, e para sua busca por justiça política e social.[358]

Venancio Hernández não queria, e não poderia, permanecer em silêncio. Durante a siesta ele lia aquele maravilhoso livro para outros trabalhadores na fazenda. Eles criam e se convertiam, mudavam seus antigos hábitos, e logo formaram uma pequena congregação sob a árvore onde se reuniam.

O proprietário da fazenda foi informado que alguns de seus camponeses índios tinham se tornado protestantes. Ele chamou Venancio Hernández e seus amigos e proibiu-os de realizarem qualquer reunião religiosa. Os índios não responderam, mas continuaram a oração comunitária e a leitura da Bíblia. O proprietário da fazenda, o padre local e outros índios se uniram para expulsar a pequena congregação de seu vale sob ameaça de morte.

Sob a liderança de Venancio eles caminharam para o vale próximo, para a vila de Ixmiquilpan,[359] onde passa a principal estrada da Cidade do México para Guadalajara. O grupo se estabeleceu fora da vila, em uma pequena colina onde o exército tinha instalado um pequeno posto de observação. Essa proximidade do posto militar deu-lhes uma certa proteção. Hernández sabia que a pequena congregação tinha que se manter unida para evitar o risco de uma súbita dispersão.

Naquela época, o sistema de reforma agrária limitava a propriedade de terras a quinhentos hectares, assim um dos grandes proprietários de terras de Ixmiquilpan teve que vender parte de sua propriedade. Venancio e seus seguidores o procuraram e conseguiram um contrato favorável. Eles compraram um bom pedaço de terra com direitos de irrigação. Como eles possuíam muito pouco dinheiro em caixa, o vendedor das terras permitiu que eles efetuassem o pagamento parcelado.[360] A pequena comunidade evangélica de cristãos o tinha impressionado e, apesar das pressões de outros quadrantes, ele lhes deu uma chance. “Deus tem estado conosco!” disse Venancio pensativamente, quando relatou sobre aqueles dias pioneiros.[361]

Uma Cooperativa Pentecostal

A terra da fazenda recém adquirida era de propriedade coletiva, mas os terrenos nos quais gradualmente iam sendo construídas pequenas casas de pedra e plantadas hortas familiares eram propriedades privadas. Até então os índios tinham residido apenas em cabanas de cactos; nesse momento se organizaram em cooperativas agrícolas e construíram uma fábrica de têxteis cooperativa cuja modernização tem sido permanente. Comparada com a Europa e a América, suas ferramentas e máquinas são modestas. O fato proeminente, porém, é que os índios criaram essa economia local por si mesmos. Eles não dependem de financiamento e orientação de fora—mesmo na forma de missionários—uma vez que essa produção artesanal é baseada em habilidades tradicionais. Esses índios possuem uma capacidade fora do comum, tanto intelectual quanto manual: Com precisão e habilidade um desses índios instala um projetor juntamente com um gerador (para produzir a eletricidade necessária), sem esquecer de verificar cuidadosamente todos os contatos. Ele também é capaz de revisar e consertar seu trator agrícola versátil por si mesmo.

Através dos anos, a igreja deles teve que resistir a pesada perseguição por parte do clero católico local. “Algumas vezes o padre disse que não éramos boas pessoas, até mesmo que éramos do diabo,” eles contaram mais tarde para Maria Amerlinck (uma antropóloga católica que fez um estudo antropológico cuidadoso da igreja pentecostal em Ixmiquilpan).[362] “Na realidade,” comenta Amerlinck, “a perseguição não fora iniciada pelos padres, mas por algumas das pessoas abastadas de Ixmiquilpan que tinham apoio da estrutura política local e que não gostavam do fato dos índios terem adquirido terras. Porém, com a ajuda de forças políticas regionais[363] e nacionais e com alguma ajuda econômica de fora as dificuldades foram vencidas.”[364] Os pentecostais consideraram ser seu dever não responderem a perseguição com vingança. “Pela oração e leitura da Bíblia buscaram a vontade de Deus e em vez de exercer vingança ofereceram perdão. Os assassinos reconheceram sua impiedade, se arrependeram e se tornaram membros da igreja.”[365]

Quando o governador do estado deles precisou de trabalhadores para a construção de estradas, eles fizeram a seguinte oferta: “Nós sabemos,” disseram, “que você quer construir estradas em nossa região mas lhe faltam trabalhadores. Forneceremos trezentos homens diariamente de graça se você fornecer as máquinas e o conhecimento técnico. É dessa forma que demonstraremos a você que nós ‘cristãos’ somos cidadãos úteis.” Tal demonstração revelou ser melhor do que qualquer declaração teórica de que eles não eram—como acusavam seus perseguidores—sectários, mas membros responsáveis da sociedade. Durante a construção da estrada eles compuseram novos contos no estilo refreado suave dos otomí. Hoje esses cantos fazem parte da liturgia deles, e os relembram do tempo da perseguição e como ela foi vencida.[366]

Perigos do Exterior

A igreja já não é mais ameaçada pelos católicos. Na verdade, estes estão dispostos a aprender com Venancio, que foi, por exemplo, efetivado como membro da Comissão Teológica Consultiva da Igreja Católica do México. Atualmente a igreja é ameaçada por uma “verdadeira fé” diferente. Eu estava pessoalmente presente em um culto em Ixmiquilpan no qual estava pregando um missionário americano. No início do culto três jovens índios foram à frente com seus violões, se ajoelharam e oraram silenciosamente. Depois eles tocaram e cantaram com um controle refinado e estilo extremamente comovente. Mesmo os membros da congregação não cantaram muito alto, como é comum nos círculos pentecostais. Mas então foi a hora do sermão do missionário! Suas palavras cruzavam para lá e para cá sobre a congregação índia como um rolo compressor. Os índios reclinaram suas cabeças suavemente mas mesmo assim eu achei que para eles era quase impossível agüentarem essa inundação de oratória sem considerá-la um insulto. Mas quatro séculos desenvolveram neles uma capacidade de permanecerem dignificados e enobrecidos mesmo na humilhação. Quando foi feito o apelo para conversão, muitos deles foram à frente, cobriram suas faces com seus rebozos e choraram silenciosamente. Antes do término do culto o missionário e seus acompanhantes saíram do templo.

Na casa do chefe foi montada uma grande mesa com uma enorme variedade de pratos mexicanos, carinhosa e habilmente preparados, juntamente com frutas e bebidas. O missionário falava sem parar—em inglês, que os otomí não entendem—enquanto o chefe permanecia na porta com sua esposa e atendia aos convidados. Quando a comida acabou, todos se levantaram. “Desculpe-me,” disse o chefe índio, “tenho um amigo doente e gostaria que você orasse por ele.” “Pois não,” respondeu o missionário. “Vamos orar.” E com sua voz estrondosa ele matraqueou uma oração: “Senhor, tu podes curar mesmo de longe. Faças com que nosso desventurado amigo fique bem. Amém. Mas agora temos que partir.” E com isso, ele se foi. Mas Venancio ficou triste por ele. O missionário tinha culpa de ser um gringo?

Conversão e Desenvolvimento

O segredo da congregação de Venancio encontra-se em sua independência teológica e econômica. Não consegui identificar exatamente quando Venancio uniu sua congregação com a Iglesia Cristiana Independiente Pentecostés, cuja sede fica próxima, em Pachuco. Ele é o pastor presidente, e tem sob sua orientação cerca de quarenta obreros, pregadores leigos que servem, cada um, sem deixarem seu trabalho como agricultores e artesãos, congregações com cerca de cem pessoas.[367]

A ascensão social dos membros da igreja é fenomenal. “Há um vínculo íntimo entre evangelismo e a busca por educação,”[368] diz Amerlinck. Dar testemunho,[369] participar na vida da congregação, auto-financiar a igreja,[370] “desenvolve” os dons latentes nesses índios ao seu pleno potencial. Para eles, “dar” (dinheiro, animais, verduras, mesmo bebidas) para a igreja não é “dar esmolas,” porque Deus não é um esmoleiro (lismonero). Ela resume seu argumento da seguinte forma: “Sob essas circunstâncias a conversão religiosa é a única saída dos estreitos confinamentos do tradicionalismo . . . Os índios precisam dessa nova ideologia como um meio de racionalização que os capacite a compreender sua relação com o mundo que se transforma a sua volta e forneça uma dignidade definitiva ao indivíduo.”[371]

Enquanto na igreja católica em Ixmiquilpan a maioria dos padres são estrangeiros,[372] os pentecostais têm exclusivamente ministros nativos (que quase sem exceção ganham a vida trabalhando secularmente). Antes de sua conversão muitos deles eram empregados como agricultores diaristas. Hoje muitos deles são agricultores em terra própria, pedreiros, proprietários de pequenas lojas e fabriquetas, caminhoneiros e mecânicos.[373]

Os pastores pentecostais não consideram seu ministério um ministério puramente religioso que os diferencie e separe do restante da população. Eles não se enxergam como especialistas remunerados da religião, mas muito mais como “evangelistas econômicos” da mesma qualidade, ou “assessores de desenvolvimento evangelístico”. Eles trabalham para se sustentarem pois seu exemplo e a maneira pela qual edificam suas próprias casas é parte de sua proclamação. Eles se sentem superiores aos padres católicos e muito orgulhosos de seu ministério especial de evangelismo. Eles criticam os padres abertamente—e, se surgir oportunidade, também a hierarquia católica[374]--porque eles trabalham exclusivamente como padres e se tornam passíveis de serem acusados de exercerem seu ministério por dinheiro.[375] Discutindo a questão de um ministério de tempo integral remunerado, eles disseram: “O que nossos colegas no trabalho diriam? Como ministros de tempo integral ficaríamos distanciados deles.”[376] Hernández resume a teologia de sua comunhão vivida com estas palavras: “A comunidade crê na salvação das mãos pelo trabalho, da mente pelo aprendizado da leitura, do corpo pela cura divina[377] e da alma pelo novo nascimento.”[378]

Não resta dúvida alguma que os otomí criaram um exemplo de política de desenvolvimento que por sua própria simplicidade é fascinante. Dentro desse sistema eles explicitamente incluíram as mulheres[379]--uma atitude revolucionária em sua sociedade. Aqui e ali, mas muito relutantemente, também vemos o início de um diálogo com a teologia e as igrejas européias.[380] A tentativa não está isenta de riscos—Maria Amerlinck chama atenção para o crescente paternalismo, particularmente entre os líderes em Pachuco.[381] A independência econômica e teológica deles é impressionante, e foi uma questão de vida ou morte na fase pioneira da igreja; mas será que ela sobreviverá na situação econômica mais complexa do futuro? E o que farão os otomí se forem limitados pelas estruturas políticas e econômicas de poder que não podem ser superadas facilmente por seu método de auto-ajuda?

Também é possível que em uma esfera mais ampla sua inteligência, charme e compreensão teológica produzirão soluções que nós europeus ainda não descobrimos. Mas para fornecer a qualquer solução o espaço necessário, é preciso que a humanidade e a cultura dos otomí sejam escavadas em um campo mais amplo, ecumênico. Eu estive envolvido em uma dessas tentativas numa “expedição ecumênica de escavação.”

Escavando as Ruínas

Para evitarmos que nossa escavação provocasse destruição, tivemos que achar alguém no México que pudesse conversar tanto com intelectuais como com pessoas com pouca ou nenhuma educação formal. Isso era particularmente importante uma vez que nossos esforços não deveriam ficar restritos aos índios, mas cobrir todos os setores da população mexicana, e ser uma descoberta conjunta feita com a participação deles. Trabalhamos com a pressuposição que era tanto possível quanto desejável iniciar um diálogo teológico entre intelectuais e analfabetos; índios mexicanos, europeus mexicanos e mestiços; professores de faculdade jesuíta e trabalhadores de estrada adventistas; jornalistas e pregadores pentecostais; metodistas de classe média e índios mórmons. O convite para as “discussões” teve que ser feito pessoalmente para não encabular os analfabetos. A senhorita Maria Antonieta Hernández, na época professora de Educação Cristã na Comunidade Teológica do México, era a pessoa certa para a função. Sua aparência inequivocamente mexicana superou qualquer desconfiança por parte dos índios e campesinos, pentecostais e mórmons. Como anglicana ela tinha acesso tanto a protestantes como católicos. Por meio de sua propensão para o modo de comunicação “flores e cantos” ela despertou a curiosidade de jornalistas e o pessoal da televisão. Quais foram os resultados da escavação? Uma vez que os relatórios detalhados dos seis seminários realizados na primavera de 1970 em Monterrey, Mexico, Merida, Amecameca e Guadalajara foram publicados em espanhol, vou me limitar a resumir alguns dos principais pontos discutidos.[382]

O Método “Flores e Cantos”

A abordagem óbvia para a maioria dos participantes parecia ser uma discussão teológica baseada em estórias bíblicas ou fictícias, com a utilização de filmes e descrições. A exposição do filme “Parábola”—um filme mudo descrevendo a paixão e ressurreição de Cristo utilizando como veículo o martírio de um palhaço—provocou objeções de alguns intelectuais batistas e metodistas. Cristo não podia ser apresentado no símbolo de um palhaço, eles acreditavam. “Por que não?” perguntou um trabalhador mestiço (um pregador pentecostal). “Esse filme mostra o circo da vida no qual todos desempenhamos um papel, queiramos ou não. Dançamos exatamente como marionetes, segundo o passo decidido por aqueles que manipulam os cordões. Gracias a Dios, Cristo veio, colocou-se em nosso lugar para que ficássemos livres, para que nos tornássemos em pessoas com um rosto.”

Na discussão das quatro diferentes versões da estória da confissão de Pedro (Marcos 8:27-33; Mateus 16:13-23; Lucas 8:18-22; João 6:66-71), dois grupos chegaram a seguinte conclusão:

É praticamente impossível formular uma confissão de fé moderna em termos conceituais. Confessar a fé hoje pressupõe troca constante, correção mútua e relacionamento com situações em permanente mudança. Podemos, porém, enxergar quatro elementos que devem fazer parte de qualquer confissão de fé:

Uma confissão de fé atual exige várias confissões. Essa variedade pode por vezes incluir até mesmo confissões mutuamente contraditórias. Não pudemos concordar se esse pluralismo tem que ser limitado às várias posições bíblicas ou se pode ser estendido de forma a incluir novas posições não representadas na Bíblia.

Confessar a fé (martyria) implica o elemento de sofrimento.

Toda confissão de fé deve estar relacionada com a história de Jesus de Nazaré.

O teste para saber se uma confissão de fé é bíblica ou meramente uma invenção humana é a discussão ecumênica atravessando fronteiras raciais, confessionais, sociais, nacionais e sexuais.

O Humano e o Sagrado

Os participantes então consideraram a estória do “Anjo da Guarda,” de Gerardo Murillo,[383] que fala de uma mulher grosseira mas de bom coração que assume o cuidado de uma garota cuja mãe ficara presa erroneamente por alguns meses. Por sua coragem e persistência ela consegue a libertação da mãe da menina. A discussão começou da seguinte questão: Em que sentido essa mulher foi um “anjo da guarda”? Ao responderem essa questão alguns tomaram a linha tradicional e separaram a ação do Espírito Santo (ou do anjo) da simpatia puramente humana, enquanto outros defenderam que a mulher, sendo de origem divina como pessoa humana, foi de fato um instrumento do Espírito Santo apesar de sua linguagem grosseira e sua inclinação para o álcool.

Essa descoberta fez necessária mais discussão sobre a relação entre as pneumatologias lucana e paulina no Novo Testamento. Durante essa fascinante discussão um dos campesinos formulou a seguinte pneumatologia: “Conhecimento da Bíblia e da liturgia não é uma condição para a obra do Espírito Santo no ser humano. O Espírito Santo foi concedido para toda a humanidade.” Uma campesina disse o seguinte diante da objeção de que o Espírito Santo opera apenas naqueles que lhe são obedientes: “Isso não é verdade. Maria Madalena, por exemplo, que se aproximou de Jesus com vontade de conquistá-lo, vestiu-se com uma roupa atraente e cobriu Jesus com um perfume bastante sedutor. Obviamente ela não estava pronta para receber o dom de Jesus. Mas Jesus olhou para ela e lhe deu tudo o que Ele tinha para dar.” Surpreendentemente foi uma católica que apresentou essa interpretação evangélica.

Religiões Não Cristãs

Juntamente com o relato do eunuco etíope (Atos 8:26-40) foi levantada a questão se o batismo era essencial para a salvação. A informação de que o versículo crítico (37) está ausente de certos manuscritos não suscitou nenhum sentimento fundamentalista como acontece algumas vezes na Europa. Também, ninguém fez aquela pergunta angustiante que inevitavelmente surge na Europa: “O que é que sobra ali para cremos?” nem quando foi mencionada a teoria das duas fontes (somente como hipótese), nem durante a discussão detalhada da crítica da forma da confissão de Pedro. Os fatos foram observados, mas a questão que importava mais para essas pessoas era: Qual é a relevância desses fatos?

Ao discutir a estória do eunuco etíope, um jesuíta explicou que a interpretação de Felipe da passagem de Isaías (Is. 53:7-8) em Atos 8:32-33 estava em conflito com aquela dos exegetas de sua época. A questão então passou para a autoridade da exegese de Felipe, interpretando a passagem de Isaías como uma referência a Jesus. Não existem eventos e textos que hoje têm que ser interpretados em termos de Jesus, em oposição tanto a tradição cristã como a não cristã? “Existem discípulos de Jesus Cristo fora da Igreja. Portanto, o símbolo externo de ser cristão não é o batismo, nem a abstinência de álcool e cigarro, nem as imagens de santos em nossas casas, mas a descoberta de que Jesus Cristo é maior do que nossas idéias políticas e teológicas, na verdade, maior do que nossa fé.”[384]

Alguns índios mórmons “escavaram” as preocupações enterradas de seus ancestrais com a história-ficção mórmom tradicional, com sua insistência na aparição de Cristo no continente americano antes da chegada de Colombo. Eles estavam preocupados primariamente não com a precisão histórica dessa afirmação mas sua função, ou seja, a expressão da crença de que mesmo os antigos mexicanos tinham recebido uma revelação de Deus. Eles também queriam saber, portanto, se a revelação cristã tinha sido efetuada de uma vez para sempre ou se ainda havia revelação no presente. Quando isso foi afirmado—com a qualificação que a revelação no presente deve ser considerada em relação com sua fonte e ser corrigida na discussão ecumênica—surgiu a questão decisiva: Esse processo de correção é mútuo? O que eles estavam obviamente preocupados em fazer era escavar os testemunhos enterrados de seu passado e enxergá-los novamente à luz da revelação de Cristo. Aqui também os caminhos de Deus são estranhos: dentre todas as pessoas, essa sugestão esclarecedora veio de índios mórmons!

Um leitor evangélico pode muito bem perguntar: Onde em tudo isso está o centro do evangelho, a justificação pela fé? Isso já foi formulado acima na estória de Maria Madalena, na percepção de que ser cristão transcende as expressões tradicionais de fé cristã. Talvez também estivesse presente na percepção de um grupo sobre a teologia do javista, que concluiu com uma aspiração: “Precisamos hoje de profetas como o javista para deixarem claro a Igreja que ela vive exclusivamente pela misericórdia de Deus e não baseada na sua fé e nas realizações cristãs.”

Normalmente o México é considerado um país secularizado. Temas teológicos e religiosos quase nunca são levados para a mídia de massa. Foi, portanto, bastante surpreendente ver a televisão de Monterrey dedicando um programa de uma hora para esse tipo de interpretação da Bíblia, e a imprensa escrita descrevendo-o como uma “escola ativa e prática de renovação cristã.” Esse diálogo foi descrito como uma “exegese fiel da Escritura Sagrada,” diferente dos métodos de doutrinação e polêmica.[385]

Perspectivas

Desde que visitei os pentecostais mexicanos, Manuel Gaxiola-Gaxiola escreveu sua dissertação. Ele menciona diversos problemas que emergiram desde então (nem tanto com a Iglesia Cristiana Independiente Pentecostés mas muito mais com as igrejas pentecostais na Cidade do México). Ali os pentecostais têm que aprender—de acordo com Gaxiola—que “confissões elaboradas em um contexto não permanecem as mesmas quando tal contexto muda.”[386] Isso significa que o ministro pentecostal tem que ser capaz de falar simultaneamente em diversos níveis. Ele tem que ser bilíngüe; ou seja, ele tem que conhecer a linguagem oral das raízes do pentecostalismo, mas também tem que ser capaz de falar e compreender a linguagem escrita de conceitos e definições. Assim está emergindo um ministério bem educado sem a imagem de classe média.[387]

Por outro lado, o clima ecumênico não é—apesar do diálogo Pentecostal/Vaticano[388]—satisfatório. Um dos principais arcebispos chegou a dizer que as “seitas” são mais prejudiciais do que a AIDS.[389] A Igreja Católica não parece compreender que algo fundamental tem que mudar se ela quer interromper a drenagem de 8.000 pessoas que diariamente rompem com o sistema tradicional.[390] Aqui novamente é lamentável que os pentecostais e católicos latino americanos não estiveram envolvidos no diálogo católico/pentecostal. Parece, porém, que isso vai mudar rapidamente.

CAPÍTULO OITO

Coréia: A Cultura Xamanista Oral em Transformação Pentecostal[391]

Uma Cultura Antiga

Boo-Woong Yoo é um pastor presbiteriano da Coréia. Sua igreja o enviou para o Quênia como professor de teologia. Nessa mesma época ele foi solicitado a escrever sua dissertação de doutorado em teologia abordando o pentecostalismo coreano, para o que ele viajava regularmente para Birmingham. Seu tema é tão extraordinário quanto seu método e sua energia para trabalhar.

Primeiramente ele teve que reunir os inúmeros documentos coreanos sobre seu tema. Ele encontrou-os em diversos arquivos na Coréia e nos Estados Unidos. Ele os estudou em Birmingham e num seminário bastante remoto no sopé do monte Kilimanjaro, onde ele ensinava teologia. Ele contou-me como ele escreveu capítulo após capítulo, empacotou seus manuscritos num Land Rover e viajou diversos dias até chegar em Nairóbi, onde ele os digitou em dois processadores de textos, um em inglês e o outro em coreano (para os documentos originais). Não havia processador de texto disponível em seu seminário africano.

Em sua introdução, Yoo enfatiza que a Coréia possui uma cultura muito antiga. A história escrita da Coréia data do primeiro milênio antes de Cristo—uma época na qual nossos ancestrais não tinham cultura escrita, e muitos ainda se cobriam com pele de urso. A tradição oral recua mais ainda, ao ano 2332 a.C., mil anos antes do rei Davi e 3400 anos antes de Guilherme, o Conquistador. A história moderna da Coréia inicia com a dinastia Yi (1392 d.C.), que unificou os reinos coreanos dispersos.

Uma vez que a Coréia tem sido influenciada pela China por um longo tempo, não é surpreendente que as primeiras grandes religiões da Coréia tenham sido o budismo e, mais tarde, o confucianismo. Porém, logo no início essas duas religiões foram penetradas pelo xamanismo coreano. O cristianismo também, em suas versões católica, protestante e pentecostal, tem emprestado muito do xamanismo coreano.[392]

Foi somente no século dezesseis que os primeiros missionários católicos chegaram na Coréia. Porém, o catolicismo não se espalhou no mesmo grau que o protestantismo tem se espalhado no século vinte. Uma das razões para isso talvez seja o fato do protestantismo (sob a influência da teologia pentecostal Minjung) ser mais independente financeira e teologicamente do que o catolicismo.

O protestantismo na Coréia começou apenas a cerca de cem anos atrás—um período bastante curto se comparado com os muitos milênios da história coreana. Os primeiros missionários protestantes concentraram seu trabalho entre os pobres, os camponeses, e posteriormente, quando a industrialização chegou, entre os trabalhadores. Um desses primeiros missionários foi o suíço-americano H. Appenzeller, que aprendera o Catecismo Alemão de Heidelberg com sua mãe.

Desde 1910 (o primeiro ano da ocupação japonesa, a qual durou até 1945) o protestantismo tem duplicado a cada dez anos (ver a tabela). Todas as igrejas contribuem para esse crescimento, mas os pentecostais tem dado uma contribuição particularmente vigorosa.

Crescimento do Protestantismo Coreano 1960-83

1960. 1.250.000

1970. 2.200.000

1980. 7.000.000

1983. 8.500.000[393]

Yoo divide a história do pentecostalismo coreano em três ramos distintos: (1) pentecostalismo fundamentalista (a partir de 1900), (2) pentecostalismo místico (na década de 1930) e (3) pentecostalismo cujas raízes estão na tradição Minjung (1970ss.)

Pentecostalismo Fundamentalista

O primeiro pentecostalismo foi um movimento popular que operava através de formas xamanistas de religião (caracterizadas pela cura de enfermos, visões, êxtases, o sacerdócio feminino e a falta de educação teológica). Essas formas eram adaptadas de uma maneira pentecostal. Esses primeiros pentecostais assumiam a literalidade do texto bíblico e experimentaram profundos reavivamentos que podem ser comparados com os reavivamentos do início do pentecostalismo na Europa e na América.

Em contraste com estes últimos reavivamentos, os reavivamentos coreanos não provocaram igrejas separadas, mas permaneceram mais ou menos dentro das igrejas tradicionais como movimentos de reavivamento carismático-ecumênicos. Eles assim influenciaram essas igrejas profundamente. É essa influência que torna o primeiro pentecostalismo coreano importante—mais importante sob qualquer medida do que as igrejas pentecostais coreanas posteriores.

Essa influência também teve suas desvantagens. No passado o pensamento crítico foi negligenciado em favor da experiência religiosa; a salvação eterna considerada mais importante do que as mudanças na sociedade. Mas essas duas “fraquezas” são compreensíveis. As pessoas que eram tocadas por esses primeiros reavivamentos não tinham acesso a educação superior. E, uma vez que a Coréia naquela época estava ocupada e era oprimida pelo Japão, as pessoas comuns não tinham nenhuma oportunidade para “mudar a sociedade.” Porém, entre o povo comum a resistência à ocupação japonesa era claramente visível.

O fato de que atualmente muitos teólogos coreanos (pentecostais e outros) realizam estudos pós-graduados na América e na Europa demonstra que a mudança tem sido rápida.

Pentecostalismo Místico

O segundo pentecostalismo começou com a tradição mística da Coréia. Seu representante mais importante é Yong-do Yi. Yi proclamou uma doutrina dualista: o espiritual, o religioso, o imaterial é bom; o material, o mundano é mau. Ele próprio levou muito a sério essa doutrina. Ele deu suas roupas a um mendigo, vendeu sua casa e utilizou o dinheiro da venda para financiar os estudos de um jovem teólogo. Seu conceito central era aquele de “morrer diariamente.”

Ele era poeta, e escreveu hinos sobre a paixão de Cristo:

Sobre meu Senhor certa vez colocaram uma coroa de espinhos. Venham agora e a coloquem sobre mim, pois vejo meu Gólgota se aproximando. Açoitem-me. Apressem-me. Deixem-me declarar que estou completo. Vocês saberão de onde vim, quando beberem meu sangue e comerem minha carne. Ó Senhor, conceda-me o dia em que poderia dizer, “Está consumado.”[394]

Aqueles que conhecem a leitura devocional reconhecerão nessas linhas temas católicos ou mesmo budistas. À luz de seus ataques sobre as igrejas tradicionais que rejeitaram esse declarado misticismo de paixão, é improvável uma influência católica sobre Yi. Sua comunidade desapareceu—com exceção de um pequeno remanescente—mas sua influência sobre a espiritualidade coreana não deve ser subestimada.

Pentecostalismo Minjung

O terceiro movimento pentecostal tem muito em comum com a assim chamada teologia Minjung, que busca interpretar a Bíblia com o povo (ochlos). Na Minjung, a teologia não é mais algo importado do estrangeiro. O povo da Coréia também possui conhecimento; nem tudo lhes deve ser ensinado por teólogos americanos ou europeus. Já não é mais aceitável que o povo aprenda a cultura dos opressores, da elite intelectual e econômica. Como podem aqueles que estão prisioneiros da cultura de opressão (aqueles teólogos educados na maneira ocidental) saberem o que o povo sente? Diferentemente da teologia da libertação latino-americana, a Minjung enxerga os policiais que perseguem os cristãos também como parte do povo. Eles também são oprimidos; os torturadores também precisam ouvir o Evangelho, muitas vezes por aqueles que estão torturando. Por fim Yoo e seus companheiros perguntam: Porque é que não há nenhum escritor da teologia da libertação latino-americana que seja representante do povo oprimido da América Latina, dos índios americanos, dos negros? Apenas os descendentes dos invasores espanhóis e portugueses escrevem uma teologia da libertação. Para Yoo isso significa que a teologia da libertação latino-americana ainda tem muito a caminhar para se tornar uma teologia da libertação.[395]

Com relação a teologia Minjung coreana Yoo sugere criticamente: Talvez a teologia Minjung impressa oficialmente também seja uma teologia que uma elite escreveu para o povo. Para ele, um contraste e complemento para a teologia Minjung impressa é a teologia Minjung vivida das igrejas pentecostais indígenas independentes, e daquelas igrejas que têm sido influenciadas por essa tradição. Nessas igrejas todo o povo de Deus faz teologia, não apenas os eruditos. Ele faz teologia em cânticos e orações, em testemunhos e estudos bíblicos. Este é um pensamento ousado, que não será aceitável em todo canto na Coréia, na Europa ou na América. Porém, Yoo ensina teologia na África. Ele deve ter compreendido lá que os padrões de pensamento da teologia ocidental não funcionam no contexto asiático.

Essa teologia Minjung vivida, escreve Yoo, tem aprendido algo bastante importante do xamanismo coreano ao dar voz as mulheres,[396] e aos assim chamados leigos, o proletariado cultural da Coréia.

Yoo tem produzido um estudo novo e original. Ele também tem descrito os diversos “evangelistas de crescimento da igreja” americanos que têm trabalhado na Coréia. Minha impressão, porém, é que devido as enormes barreiras de língua, os americanos dizem uma coisa e os coreanos entendem outra. Numa situação dessas, o difícil idioma coreano, que não pode ser aprendido facilmente pelos ocidentais, é uma vantagem. Ele protege a perícia do povo, impedindo-a de ser paralisada pelos peritos estrangeiros em evangelismo.

A apresentação de Yoo também é notável: o pentecostalismo coreano não é apresentado como um produto dos missionários pentecostais ocidentais. É por isso que o pentecostalismo coreano é bastante diferente. Todos os fundadores pioneiros são coreanos, que estão profundamente enraizados na cultura popular coreana e integram seletivamente essa cultura em sua espiritualidade.

É obviamente difícil conseguir estatísticas acuradas em um país onde a cada ano são fundadas novas igrejas, e as pessoas se tronam cristãs aos milhares. De acordo com Yoo, dos 8.500.000 protestantes e 1.160.000 católicos (dados de 1983—população da Coréia: 37.500.000), dois terços são influenciados pelo pentecostalismo. Existem, porém, apenas cerca de 1.100.000 seguidores das igrejas pentecostais no sentido estrito. É difícil avaliar a precisão dessas estatísticas pois não está claro quanto seguidores das “igrejas indígenas não brancas” nas estatísticas de Barrett pertencem à igrejas pentecostais independentes (ver tabela).

Cristãos na Coréia (1985)

Igrejas indígenas não brancas 4.801.600 12,8% da população

Protestantes 4.025.500 10,8% da população

Católicos 1.160.000 3,1% da população

Seitas 110.000 0,3% da população

Anglicanos 110.000 0,3% da população

Ortodoxos 43.000 0,1% da população[397]

Barrett indica 11.000.000 cristãos para 1985; isso não está inteiramente de acordo com os dados de Yoo para 1983. Talvez a diferença entre Yoo e Barrett possa ser explicada da seguinte maneira: Yoo é um teólogo coreano. Ele inclui as igrejas coreanas indígenas não brancas (que não pertencem a nenhuma das igrejas ocidentais) nas protestantes, e não as conta como uma categoria especial. O anglicano Barrett por outro lado distingue entre as igrejas de missão baseadas no Ocidente e as igrejas coreanas teológica e financeiramente independentes. É certo que o protestantismo coreano se tornará cada vez mais independente, tanto teológica quanto financeiramente. Isso já pode ser visto em sua importante obra missionária na Ásia e na África. Apenas os católicos e os anglicanos continuarão dependentes do Ocidente. Uma vez mais fica evidente que mesmo estatísticas simples são juízos teológicos: Incluindo todas as igrejas cristãs (exceto a Católica) nas protestantes apresenta um retrato coreano da Igreja Protestante. Distinguir entre igrejas coreanas independentes e protestantes baseadas no Ocidente é a perspectiva de fora.

É difícil avaliar o desenvolvimento que virá. No momento as igrejas ainda estão crescendo muito rapidamente. Não diminuirá a influência do xamanismo, da Minjung e do pentecostalismo e da espiritualidade reavivada. Deveremos assistir no futuro ao surgimento de uma forte igreja coreana teológica e organizacionalmente independente.

A interpretação coreana que Yoo faz do pentecostalismo teve uma recepção bastante variegada. Por exemplo, Robeck escreve:

Os pentecostais norte americanos que se alinham com as preocupações da Pentecostal Fellowship of North America [Comunhão Pentecostal da América do Norte] considerarão este estudo bastante frustrante . . . Isto não é história das missões pentecostais norte americanas. Isto não é a história da fundação e formação das denominações pentecostais coreanas segundo as linhas de suas correspondentes na Pentecostal Fellowship of North America. Isto não é a história de igrejas como a Full Gospel Central Church [Igreja Central do Evangelho Pleno]. No geral, isto é um estudo de movimentos de renovação nos quais se reconhece que o Espírito Santo desempenha um papel maior.[398]

Um resenhista coreano diz: “Eu questiono se a teologia Minjung pode ser relacionada com o movimento pentecostal do cristianismo na Coréia."[399] Yoo é criticado na Coréia pois ele não seguiu as categorias esmeradas dos intelectuais Minjung. Ele é rejeitado pelos pentecostais americanos porque eles “terão certa dificuldade para se reconhecerem ali.”[400] Mas e se o pentecostalismo coreano for de um tipo diferente de pentecostalismo (mais aparentado com as outras igrejas, menos centrado no denominacionalismo), e se não for apenas permissível mas necessário interpretá-lo e criticá-lo com as categorias de uma cultura xamanista de milhares de anos? As vezes eu me pergunto como alguém escreveria uma história do pentecostalismo americano se tivesse que tomar como ponto de partida categorias históricas e teológicas impostas de fora dos Estados Unidos; da Coréia, por exemplo.

Por outro lado, Mark R. Mullins, professor associado na Universidade Meiji Gakuin, em Tóquio, parece concordar com Yoo no que se refere a influência do xamanismo sobre o pentecostalismo. Yoo vê no xamanismo “uma fé para as massas.” Porque ele é oral, ele articula Han (um tipo de sentimento coletivo de derrota, resignação e vazio; mas também de tenacidade e vontade de viver que vem da fraqueza), e se concretiza em curas, visões e experiências espirituais.[401] “Embora os líderes das igrejas pentecostais neguem a influência da ‘religião pagã’ muitos estudiosos concordam que o xamanismo tem sido a força central modelando o desenvolvimento do pentecostalismo coreano.”[402]

CAPÍTULO NOVE

Inglaterra: Interação Entre Negros e Brancos na Educação Teológica[403] A História de uma “Escola Negra” Apartheid, apesar de boas leis sobre discriminação racial

“Por que é que nós,” questionou o deão da Faculdade de Artes na Universidade de Birmingham, “quase não temos estudantes negros em nossa universidade? É verdade que temos numerosos estudantes negros da África e mesmo dos Estados Unidos, mas onde estão nossos negros nascidos na Grã-Bretanha? Não acredito que eles não tenham condições de receber educação superior. Tem que haver outras razões.” É de fato uma observação notável em um país no qual o racismo é proscrito; no qual, para citar apenas um exemplo, alguém que anunciasse uma casa para venda “somente para compradores brancos” seria processado. A razão para a falta de estudantes negros nascidos na Grã-Bretanha na universidade encontra-se no fato de que as escolas inglesas estão estruturadas para alunos ingleses, de forma que os negros não podem se identificar nem com seu currículo nem com sua administração. A cultura negra e assuntos negros estão ausentes. Quando eu chamei a atenção de meus companheiros na Faculdade de Artes para esse fato e pedi a introdução de estudos negros na universidade, de forma que pudéssemos conseguir professores que tivessem no mínimo uma idéia do que era teologia negra, história negra, linguagem negra e música negra, recebi sorrisos simpáticos de alguns e sobrancelhas cerradas de outros: “O que é essa ‘teologia negra’? Há apenas uma teologia. Algum dia você irá pedir uma cadeira de música e literatura negra.”

Para falar a verdade, isso era exatamente o que eu tinha em mente. Mas eu não me atrevi a expressar essa idéia aventureira. Devo dizer, porém, que pelo menos os teólogos sabiam que uma coisa como “teologia negra” existia. Mas os dirigentes da faculdade não se sensibilizaram com minhas observações. Em vez de um teólogo negro eles contrataram um grafólogo forênsico—como se essa fosse a necessidade acadêmica mais premente em nossa universidade!

O resultado dessa política educacional tem sido catastrófico. Não quero dizer que os violentos e incendiários distúrbios nas ruas, os coquetéis Molotov e os mortos e feridos presenciados em Birmingham na década de 1980[404] tenham sido o desenlace direto de nossa política educacional, mas muito do que ocorreu certamente poderia ter sido evitado se tivéssemos mais negros entre os professores, os policiais, os servidores públicos, os políticos, os assistentes sociais e os estudantes universitários. Os ingleses vão pagar caro por não terem lido uma página do livro americano. Há mais de trinta anos atrás os americanos tiveram que lidar com problemas semelhantes e decidiram trabalhar para uma melhoria expressiva na educação dos negros.

Nesse contexto, não é surpreendente que as igrejas anglicana e metodista quase não tenham sacerdotes negros (não obstante o fato de terem muitos membros negros).[405] Se alguém observar essa anomalia ouvirá que: “Os negros não se candidatam para esses postos; e os que assim o fazem não são qualificados.” Se considerarmos isso como uma desculpa apenas, permanecerá como uma boa desculpa. Porém, seria melhor ir às raízes do problema do que ficar apenas dando desculpas. Essa é exatamente a tarefa a que se propõe o Centre for Black and White Christian Partnership [Centro para Parceria Cristã entre Negros e Brancos] em Birmingham.

O Início[406]

No começo o Centro estava direcionado principalmente para o treinamento de pastores operários das 750 congregações negras na Inglaterra, que estão organizadas em mais de 100 denominações negras. Essas igrejas são de tradições bastante diferentes: metodista, adventista, pentecostal e daquelas que até então não existiam na Europa—igrejas negras independentes da África Ocidental e do Caribe. Algumas dessas igrejas são muito numerosas em seus países de origem, e vinte porcento da população negra na Grã-Bretanha pertence à elas. Isto faz da igreja a forma de organização mais importante, se não a única relevante, dos negros na Grã-Bretanha, um fato que era quase totalmente desconhecido dos cristãos brancos, políticos e conselhos locais.

É bastante surpreendente que as sociedades missionárias britânicas, que são famosas por seu trabalho missionário e ecumênico pioneiro no Terceiro Mundo, tenham perdido quase por completo a oportunidade para um diálogo intercultural renovador em seu próprio país. Também o Partido Trabalhista, que não pôde criticar suficientemente o apartheid da África do Sul, é incapaz de reconhecer o potencial cultural, político e de liderança espiritual dessas igrejas em seu próprio país. Foi preciso dois “missionários” estrangeiros para enxergar isso—uma pastora alemã e um professor universitário suíço. Com base no trabalho de pesquisa da primeira, Roswith Gerloff,[407] foram feitos contatos com líderes eclesiásticos negros. Apesar do fato de que muitos deles tinham apenas alguns anos de escola, o que eles queriam era um programa de educação teológica de nível universitário.

Quase todos os líderes das igrejas negras são pastores-operários. Durante a semana trabalham nas fábricas, ou como motoristas de ônibus, ferroviários ou contadores, a menos que estejam desempregados—como freqüentemente é o caso. Nos fins de semana são pastores ou bispos, e muitos deles trajam lindas togas litúrgicas e mitras episcopais, diante das quais as vestes de um cardeal católico romano ficam ofuscadas. Criar um programa teológico de nível universitário para esses pastores-operários foi um grande desafio. Tivemos que inventar um curso que fizesse sentido para os negros e fosse aceitável para a universidade. As disciplinas foram organizadas como uma série de estudos de fim de semana, ministradas por professores da universidade e da Faculdade Selly Oak. O método educacional é aquele de Paolo (sic) Freire: a linguagem, as categorias de pensamento e as experiências dos participantes do curso formam a base para o ensino.

Mais tarde, ao ler os relatórios dos teólogos da Coréia, reconheci em sua linguagem oral o mesmo método, que rejeita a linguagem conceitual (literária) do Ocidente e a linguagem cultural (literária) da China. Porém, precisa ser dito que esse método não se encaixa facilmente na nossa tradição acadêmica européia.[408]

O Currículo

A primeira vista as disciplinas no programa negro parecem ser bastante tradicionais: Missões, Antigo Testamento, Novo Testamento, Doutrina Cristã. Na disciplina “Missões” os alunos começam com a história e experiência das igrejas negras; com a experiência de escravidão, a experiência da igreja como “o lugar e meio de sobrevivência,” a missão das igrejas negras na Inglaterra branca. Nas disciplinas bíblicas eles começam com o surpreendente conhecimento bíblico dos participantes, com o vocabulário bíblico que eles conhecem, mas também com as diferentes interpretações sobre jejum, lava-pés, visões e falar em línguas, que emergem claramente por exemplo entre os alunos africanos e caribenhos. Então eles são capazes de demonstrar que as opiniões sobre essas e outras formas de espiritualidade estão divididas não apenas no tempo presente, mas o próprio Novo Testamento já contém registros de uma pluralidade de espiritualidades e teologias. Assim os participantes enxergam a pesquisa histórico-crítica não como algo que eles têm que aprender para passarem nos exames, mas como uma ferramenta importante para lidarem com as diferenças na comunidade cristã negra.

A disciplina sobre doutrina cristã é desenvolvida de forma semelhante. Entre os participantes há aqueles representando no mínimo meia dúzia de diferentes tradições culturais. Estas podem ser explicadas por um lado pelas diferentes tradições ocidentais às quais as igrejas negras foram expostas, e por outro lado pelas diferentes influências culturais (africana, caribenha e norte-americana). É particularmente importante isolar e interpretar os símbolos religiosos africanos e as formas de linguagem geradas a partir de suas raízes pré-cristãs africanas comuns, e que foram “salvas através da escravidão” pela tradição oral das mães e avós. Culto, oração, canto e testemunho são tão importantes nesta escola quanto palestra e exames.

Eu sugeri aos meus companheiros na universidade que eles se habituassem a começar suas aulas com oração e canto; que eles incluíssem uma ceia compartilhada por alunos, professores e convidados; e que eles concluíssem o curso de fim de semana com um culto em uma igreja branca ou em uma igreja negra. Quando eu sugeri que todas essas atividades fossem consideradas como elementos didáticos básicos, eles sorriram para mim. Lembraram-me que Birmingham é uma universidade totalmente secular na qual oração, culto, ceias, cantos e danças não fazem parte do programa educacional. Defendi minha proposta ressaltando os fatos de que os negros não falam sobre Deus sem também falarem com Deus; de que para eles é inconcebível uma análise crítica de textos bíblicos sem dança, canto e testemunho; e de que para eles se engajar em um debate feroz sobre opressão branca sem a subseqüente celebração de reconciliação intercultural não é atitude cristã. O resultado dessas deliberações foi que todos esses elementos foram incluídos no curso sob o disfarce de “concessões culturais.” Entrementes os estudantes brancos me perguntaram por que eles não poderiam ser educados de uma maneira semelhante, uma vez que os estudantes negros eram aprovados nos rígidos exames da universidade e alguns até mesmo produziam interessantes dissertações de mestrado.[409]

Uma experiência é particularmente reveladora para a compreensão da teologia que é ensinada nessa escola. Um dos professores, um erudito em Novo Testamento, era também um sacerdote anglicano. Por muitos anos ele vinha tendo dificuldades com a tradição que recebera. Uma vez ele explicou para mim por que ele possivelmente não poderia crer em Deus. Suas razões não fizeram muito sentido para mim porque pertenciam à tradição inglesa de racionalismo e positivismo. Um dia ele surpreendeu seu bispo pedindo para ser desobrigado de seu voto de ordenação. Ele tornou públicas suas razões para tal decisão.

Pense na confusão que isso produziu entre os cristãos em Birmingham. Alguns dos evangélicos que de outra forma não estão muito interessados nas igrejas negras argumentaram ferozmente com elas. “E essa criatura, que nem mesmo acredita em Deus (para não falar do fato de que ele não é nascido de novo), essa criatura ensina Novo Testamento para vocês!” “Bem, vamos examinar a situação,” responderam os negros. Então eles se reuniram com seu professor e lhe disseram:

1. “Você disse no rádio que você não acredita em Deus. Nós sabíamos disso o tempo todo. De agora em diante as coisas somente podem melhorar, uma vez que você confessou isso em público.”

2. “Sabemos que a fé é um dom de Deus que recebemos exclusivamente pela graça. É óbvio que até agora você ainda não recebeu tal graça. Porém, você é um excelente professor de exegese do Novo Testamento. Foi por isso que viemos para a universidade. Quanto a fé, sabemos que ela não pode ser ensinada, ela é recebida exclusivamente pela graça. Mas quanto ao ofício de interpretar própria e habilidosamente o Novo Testamento, você é nosso professor. Não pensamos que você está desqualificado como nosso professor porque você não acredita em Deus.”

3. “Você pode estar certo de que oraremos por você para que o dom da fé possa um dia lhe ser concedido.”

Essa é a teologia de pastores que são considerados sem educação teológica!

Roswith Gerloff, por muitos anos diretora do Centro, resumiu sua experiência em uma imagem bíblica:

Os amigos do homem paralítico no Evangelho desceram pelo telhando porque estavam convencidos de que aquele homem precisava de ajuda e que Jesus estava na casa. Nós também temos descido pelo telhado, temos protegido pessoas desprivilegiadas porque estamos convencidos de seu potencial intelectual e espiritual e porque sabemos que Cristo tem algo a dizer às nossas instituições acadêmicas e eclesiásticas. Não foi a confiança na virtude dessas instituições que nos levou a agir dessa maneira. Foi a confiança no Cristo que conclama esses instituições ao arrependimento. Nesse processo algo como conversões foram possíveis, conversões de alunos chamados de acríticos para o pensamento claro e conversões de professores chamados de não espirituais para uma experiência de fé.[410]

A Experiência e sua Mensuração

Há formas de comunicação diferentes daquelas do discurso proposicional filosófico e teológico. Há formas de educação diferentes daquelas predominantes em nossas universidades. Tais formas não são inferiores, elas são diferentes. É necessário se retirar do caminho da tradição se queremos avançar. Obviamente isso foi disputado. No nosso caso o protesto não veio primeiramente da universidade mas das igrejas. Elas enxergaram o fortalecimento do potencial de liderança negra como um ato não ecumênico. Elas gostariam que nós condicionássemos nossos estudantes negros a retornarem às suas igrejas brancas. A partir do momento em que os negros escolheram o caminho oposto e estabeleceram suas próprias estruturas, as igrejas brancas reagiram com muita antipatia para com o Centro. Esta é a pior forma de apartheid, fomos informados pela direção dos metodistas. Pauline Webb, uma das lutadoras mais proeminentes contra o racismo no contexto ecumênico mundial, descobriu quão difícil é aceitar em seu próprio país que os negros tracem seus próprios destinos.

A introdução da competência negra na igreja e na universidade põe em perigo privilégios brancos. Ela questiona nossa lei do mais forte. Quando o tratamento teologicamente competente de um “professor incrédulo” (ver o exemplo acima) é visto em sua significância teológica e é de fato mais siginificante teologicamente do que a discussão de tradições teológicas herdadas, então nossos privilégios são questionados. E isso pode ser bastante ameaçador. Porém, uma escola teológica—se ela é verdadeiramente teológica—tem sido sempre perigosa.

Esta também tem sido a experiência dos teólogos Minjung na Coréia. Eles abandonaram a linguagem conceitual de seus opressores e optaram ao invés pela linguagem oral das pessoas comuns, os ochlos do evangelho de marcos, os Minjung da Coréia. Esta foi uma decisão tanto cultural quanto política. Muitos deles perderam seu status acadêmico como resultado de tal opção. Isso não significa que eles optaram por uma luta de classes cultural; os teólogos Minjung rejeitam as teorias de classes. Eles buscam um diálogo com seus opressores (os policiais que os torturam, por exemplo) análogo aquele de Jesus e dos administradores coloniais romanos. Eles são céticos quanto a teologia da libertação latino-americana e fazem a questão óbvia: Esses teólogos são realmente teólogos do povo ou a teologia deles é muito mais uma teologia escrita por uma elite para o povo?[411]

Para Birmingham isso significa que o diálogo entre a polícia, a igreja e as autoridades da universidade é tão importante quanto o diálogo entre os grupos populares de brancos e negros. Apenas uma condição precisa ser atendida—o diálogo tem que ser conduzido em uma linguagem oral, de forma que os opressores, o povo educado, não possam ficar com todas as vantagens do seu lado. Se essa condição for atendida então tanto os negros como os brancos, os assim chamados educados e os assim chamados não educados, iniciarão um diálogo com uma promessa humana e teológica.

Esta idéia tem sido articulada por muitos anos para as igrejas ocidentais por Theophil Vogt.[412] Baseado numa longa experiência, ele descreve o fruto teológico do estudo bíblico em grupo que é orientado para a religião vivida, e no qual o povo de Deus é o sujeito da hermenêutica. Teoricamente esta idéia já está presente nos reformadores e em Karl Barth, que iniciou sua Church Dogmatics [Dogmática Eclesiástica] com a frase, “a teologia é uma função da Igreja.” Porém, Não é suficiente meramente situar tal frase no início de uma dogmática. Precisamos de métodos que possibilitem a entrada do povo de Deus nesse processo teológico. Se os teólogos convocarem os assim chamados externos, os opressores e os oprimidos, o povo “literato” e o “oral”, para a produção de sua teologia, e os teólogos pararem de acreditar em uma “divisão de trabalho” entre os produtores (os teólogos universitários) e os consumidores (o povo de Deus), então emergirá uma teologia nova e radical. Uma vez que os povos literatos são também sempre povos orais (mas não vice-versa), é importante que nosso estudo da Bíblia seja conduzido por meio oral. Vogt percebe nessa utilização de um meio oral uma chance para “ser eliminada a discrepância entre a crescente especialização do teólogo acadêmico e a também crescente ignorância teológica do povo de Deus.” Ele lamenta, porém, que os frutos desses estudos bíblicos são até o momento quase totalmente ignorados pelo ambiente acadêmico.

A razão para isso pode ser que o método de estudo bíblico de Vogt combina idéias da exegese histórico-crítica com aquelas de terapia de grupo e Theme-Centered Interaction [Interação Centralizada em Tema] (TCI). Ele procura manter a tensão viva entre a “estrangeiridade” do texto e a proximidade de sua mensagem dando peso igual a ambos os aspectos, o exegético e o TCI. O quanto tal combinação pode se tornar frutífera pode ser demonstrado por uma apreciação da escola negra no contexto da TCI.

A Escola Negra no Contexto da TCI[413]

Numa primeira olhada fica claro que os quatro componentes da TCI estão presentes na aventura educacional do Centre for Black and White Christian Partnership e que busca-se um equilíbrio entre [1] a pessoa (eu), [2] a interação grupal (nós), [3] o tópico (isso), e [4] o contexto (o globo).

A Pessoa: “Eu”

Na educação universitária o “eu” é provavelmente o mais negligenciado dos quatro ingredientes. É tido como não acadêmico considerar o “eu” na pesquisa acadêmica. Isso não apenas conduz à eliminação do “eu” como também concede a pessoa mais importante (normalmente o professor) uma posição privilegiada inaceitável—ainda mais quando isso acontece inconscientemente. Na ciência já há algum tempo tem sido entendido o quão fortemente o “eu” influencia os resultados de uma pesquisa. Isso não é menos verdadeiro para as ciências humanas do que para as ciências naturais.[414] O “eu” é em parte responsável pelas questões que levantamos, pelas prioridades de nossa pesquisa, e portanto pelos resultados de nossa pesquisa. No caso de nossa escola a inclusão do “eu” foi uma questão de “ser ou não ser.”

Menciono como exemplo uma palestra na qual um professor de Novo Testamento explicava aos alunos o motivo de Mateus Ter adicionado as palavras “e jejum” na sentença “esta casta [de demônios] não se expulsa senão à força de oração e de jejum” (Mateus 17:21), em contraste com Marcos (Marcos 9:29), que não adiciona “e de jejum.” Mateus, argumentou o professor, adiciona essas palavras porque em sua congregação, em sua tradição, o jejum era muito conhecido. O que praticamos é transmitido (no caso em questão não sabemos se foi uma tradição transmitida por Jesus, ou uma adição influenciada pela prática na congregação de Mateus). Os alunos escreveram em seus cadernos: “Aquilo que é praticado é refletido na liturgia e na teologia de uma congregação. Aquilo que não é praticado tende a ser esquecido.”

Inesperadamente, e aparentemente fora de contexto, um aluno perguntou ao professor (perturbação!): “Você já jejuou em sua vida?” Tal questão pareceu irrelevante ao professor, então ele repetiu: “Este é um problema de tradição textual. Aquilo que é praticado é retido . . .” Porém, o aluno não quis ser deixado de lado. “mas você já jejuou alguma vez?” ele perguntou novamente. O professor deixou de lado sua fixação no “isso” e retrucou francamente: “Não.” “Mas eu já.” Disse o aluno. “Veja bem, eu pertenço à uma tradição na qual são feitas experiências de jejum [ele tinha aprendido a usar terminologia abstrata para dizer coisas simples]. E posso afirmar, é uma coisa bela e importante.”

Assim a interdição foi rompida e o “tópico” (ou seja, jejuar) pôde falar por si mesmo fora de sua forma literária fixada. Coisas semelhantes ocorreram na interpretação dos relatos de cura do Novo Testamento e no estudo dos relatos de visões e audições.

A Interação Grupal: “Nós”

A interação grupal normalmente aparece na educação universitária na forma de seminário. Uma vez que conseguimos criar grupos de seminário homogêneos através de um processo de seleção aparentemente objetivo (no continente europeu conseguimos até separar alunos católicos e protestantes para sua educação teológica!), nós ou temos que introduzir conflitos artificiais no seminário para torná-lo interessante, ou o seminário torna-se apenas uma palestra apresentada por diversos conferencistas.

Um seminário no Centre for Black and White Christian Partnership é diferente. Há estudantes negros e brancos, jovens e velhos, homens e mulheres, academicamente treinados e alunos com apenas poucos anos de escola primária, todos seguidores de muitas igrejas diferentes. Tem que ser garantido que a interação não seja dominada por um único grupo; vamos dizer, os academicamente treinados ou os religiosamente articulados. No interesse de uma interação adequada, é necessário um processo contínuo de tradução de uma “linguagem” em outra. Isso somente é possível com o auxílio dos alunos. Ademais, é importante que o professor aprenda as novas “linguagens” de seus alunos. Assim ele é ao mesmo tempo professor e aluno. Uma harmonização apressada tem que ser evitada, por exemplo, quando sabatistas defendem o sábado como o dia de descanso divinamente ordenado, ou quando outros consideram essa hermenêutica bíblica sabatista uma religião da lei ultrapassada.

O Tópico: “Isso”

O currículo da escola é a grosso modo a Bíblia e a função (a missão) das igrejas e culturas negras na Inglaterra. Para compreendê-las os alunos Têm quer introduzidos à sua própria história, o contexto africano, tráfico de escravos e escravidão, cultura caribenha, migração para a Inglaterra, e assim por diante. Eles conhecem essa história como uma memória familiar de seus avós, e como experiência diária na Inglaterra. Muitos dos alunos sabem que eles próprios são os resultados indiretos do estupro de suas bisavós pelos superintendentes e governadores brancos. Um deles, que conhece sua genealogia detalhadamente, irritou os participantes ingleses ao ressaltar que ele era parente da rainha. (Algumas vezes um duque real era ativo no aumento da população escrava—particularmente após a abolição do tráfico de escravos.)

Porém, os participantes normalmente não podem integrar este tópico na história mais ampla da igreja e do mundo. Se algum dia eles estudaram história, foi sempre uma história sem referência à sua própria experiência familiar e grupal, sua própria história de paixão. Isso significa que a história tem que ser recontada, mas de forma tal que os fragmentos de memórias individuais e coletivas recebam seu lugar legítimo nessa perspectiva histórica.

O Contexto: “O Globo”

O contexto da escola é a universidade e a sociedade britânica. Não é logicamente possível uma total integração da educação dos negros na universidade uma vez que esta funciona como um contexto para a expressão e defesa do privilégio dos brancos. De fato, a escola negra é um organismo forâneo no corpo da universidade; mas talvez também seja uma esperança para o futuro, desde que percebamos as limitações de nossa educação ocidental.

Apesar dessa impossibilidade lógica, a escola funciona dentro do quadro geral de regras e regulamentos, exigências e exames da universidade. Isso é possível somente porque os professores e examinadores são pessoas pragmáticas que—pelo menos por ora—estão decididos a suspender seus “preconceitos acadêmicos.”

Uma outra noção da TCI é a conexão entre mente e corpo. “A pessoa humana é uma unidade psico-biológica e portanto é parte do universo.”[415] Se isso é correto, então o ensino e o aprendizado têm que estar relacionados com essa unidade psico-biológica e não apenas com as faculdades cognitivas do indivíduo. Por isso é que o ensino não é conduzido apenas por meio de palestras e seminários, mas também por oração (integração ao cosmos), culto (integração à oikoumene), dramas (particularmente através de cenas montadas com o propósito específico de apresentar problemas e soluções aos participantes), e sobretudo dança, sobre a qual nós, professores brancos, entendemos muito pouco. A dança é um modo de expressão que também contém elementos cognitivos. Ao assistirmos outros dançarem, podemos aprender muito sobre nós mesmos e sobre os outros. Ao dançarmos, podemos aprender muito sobre o “eu,” o “nós” e o “isso.” Ademais, a dança é um modo de expressão que favorece os dons nos quais esses alunos são mais desenvolvidos do que os professores.

Uma Olhada para o Futuro

Igrejas negras podem ser encontradas não apenas na Inglaterra, mas também na Holanda, França, Alemanha e Itália.[416] Isso enche de importância a introdução de elementos negros significativos no ensino acadêmico europeu; se houver uma interação bem sucedida entre a cultura negra e a branca, isso será o início de uma educação transcultural, e de uma teologia intercultural. O fato de termos conseguido professores negros para a escola é um bom presságio para tal educação (embora um professor teve que ser trazido da África do Sul, uma vez que não conseguimos encontrar a pessoa apropriada entre a população negra local!).

O projeto Birmingham não é a primeira escola desse tipo, pois tentativas semelhantes estão ocorrendo nos Estados Unidos e na África do Sul, mas foi a primeira desse tipo na Europa. Consequentemente, tem sido um teste para a competência e habilidade intercultural da erudição européia. Obviamente, muito tem sido escrito sobre esse tipo de educação em um nível teórico—podemos pensar em Illich e Freire; mas até agora não foi tentado nenhum programa patrocinado na Europa. Essa experiência revela a viabilidade de uma universidade de operários (sobre a qual muito tem sido dito mas pouco tem sido feito) que não force os alunos a abandonarem a competência escolar de sua cultura proletária.

Após refletir bastante, minha opinião é que a experiência ou irá terminar sem recursos ou será ignorada. Presentemente ela só continua graças à subsídios recebidos da Suíça e da Alemanha. O governo britânico contribui com pouco ou nada, e as igrejas relutam em ajudar de uma forma significativa, no mínimo porque a escola fortalece a possibilidade de uma alternativa às igrejas européias atraente e sustentável. Se após receberem seus certificados os negros retornassem para os braços das igrejas tradicionais a experiência seria justificada do ponto de vista das igrejas britânicas. Mas até o presente essa não tem sido a intenção dos negros. Pelo contrário, a escola fortalece neles a auto-consciência e a habilidade para articular sua própria espiritualidade, um fato que também produzirá frutos políticos no futuro. É normal aceitar que os negros sejam admirados conquanto realizem seus próprios feitos na África do Sul ou no Zimbábue. Quando, porém, eles pretendem contribuir com sua competência negra para com um sistema educacional que é bastante resistente para com culturas “estrangeiras”, as pessoas ficam nervosas.

É necessário admitir que uma igreja dividida racialmente não é o ideal. Mas antes de falarmos sobre unidade ecumênica entre negros e brancos, os cristãos negros têm que adquirir auto-confiança. Eles têm que descobrir seu “eu” e articulá-lo em relação ao “nós” e ao ‘isso.” Posteriormente se poderá trabalhar uma interação mais explícita entre as igrejas brancas e negras. Porém, isso não acontecerá de acordo com nossas regras e prioridades mas, em vez disso, de acordo com regras e prioridades elaboradas conjuntamente. Nesse sentido o Centre for Black and White Christian Partnership é não apenas uma escola para os pastores operários negros desprivilegiados, mas também uma parábola retratando as promessas e problemas de uma interação entre a competência de negros e de brancos.

Uma coisa é certa, pelo menos para a teologia, mas também muito possivelmente para a medicina, psicologia, pedagogia e economia: o modelo de interação não é um luxo que podemos nos permitir quando não temos mais nada para fazer. Ele é parte da essência mesma da educação.

Em seu trabalho seminal intitulado Plea for British Black Theologies [Apelo por teologias negras britânicas], Roswith Gerloff demosntra convincentemente que a maioria das igrejas negras na Grã-Bretanha são do tipo pentecostal. John Wilkinson, em sua análise dos negros nas igrejas anglicanas,[417] revela que a espiritualidade anglicana negra tem muito em comum com a tradição pentecostal negra (embora nem tanto com a teologia pentecostal).

A história do Centre for Black and White Christian Partnership é importante para os educadores pentecostais e para as instituições acadêmicas tradicionais.[418] Ela mostra o que pode acontecer tanto aos pentecostais como aos professores universitários quando eles começam a fazer teologia juntos.

Em geral teme-se que tal aventura ecumênica termine com os pentecostais perdendo seu fogo ou—igualmente indesejável—com os estabelecimentos acadêmicos rebaixando seus padrões. Tais temores são compreensíveis, mas a experiência de Birmingham e experiências subseqüentes na Alemanha e na Suíça demonstram que tal temor não tem fundamento. É possível combinar a raiz oral negra com a raiz crítica da educação européia ocidental, e chegar a uma teologia tanto mais relevante quanto mais crítica.

CAPÍTULO DEZ

Chile: O Passado do Metodismo no Presente do Pentecostalismo[419]

O propósito deste capítulo é preparar o leitor para o capítulo 12, onde será defendido que muito daquilo que hoje chamamos “pentecostalismo” está baseado em Wesley. Como exemplo utilizo a história do início da missão metodista ao Chile, concentrando no reavivamento sob Willis Hoover, a mistura da cultura wesleyana com a cultura popular chilena, a discordância surgida entre chilenos e americanos e o subseqüente estabelecimento da primeira igreja protestante financeira e teologicamente auto-suficiente no Terceiro Mundo: a Igreja Pentecostal no Chile.

Na seção interpretativa a seguir, questionarei por que as raízes comuns dos metodistas chilenos e americanos não foram descobertas na época, e por que esses traços em comum ainda hoje somente são aceitos com grande relutância. A resposta é que o conflito em nossa história não foi uma discordância teológica mas cultural. Tal fato, por sua vez, tem repercussões em nossas atividades educacionais e ecumênicas.

A História Uma Missão Metodista Auto-Sustentada

O empreendimento missionário dos metodistas no Chile começou, no fim da década de 1880, com William Taylor e sua missão auto-sustentada. Tendo discordado da política da junta de missões, a qual ele achava que fornecia sustento financeiro demasiado e assim solapava o sentido de responsabilidade dos novos convertidos, Taylor relutou em submeter sua missão ao controle da junta. Por sua vez, os bispos da Igreja Metodista Episcopal decidiram que não deveriam ordenar os missionários de Taylor e que não poderiam permitir que eles mantivessem sua conexão com a conferência nos Estados Unidos. Assim, foram frustradas as esperanças de Taylor de financiar seu empreendimento missionário através de instituições educacionais missionárias, e a obra foi assumida pela Igreja Metodista dos Estados Unidos em 1897.[420]

Não obstante, em minha opinião essa curta tentativa por uma igreja auto-sustentada está na raiz tanto das dificuldades que a Igreja Metodista Episcopal enfrentou no Chile em 1909 como na emergência de uma Igreja Metodista autóctone (posteriormente a Iglesia Metodista Pentecostal).

Como os missionários de Taylor não tiveram—até 1897—nenhuma assistência eclesiástica oficial, eles tendiam a ser recrutados dentre o segmento dos menos educados, da faixa mais reavivalista, da Igreja Metodista nos Estados Unidos. Não é de admirar-se que foi uma presbiteriana, Florence Smith, quem afirmou rudemente que a Missão Presbiteriana Chilena “está muito a frente da Igreja Metodista Episcopal na educação, cultura, juízo saudável e sabedoria mundana.” Mas ela também teve que admitir: por outro lado,nos falta o amor e o fervor da vida espiritual, ou será que não sabemos como expressar o fervor e o amor que sentimos? O senhor Hoover, o missionário metodista episcopal responsável pela obra aqui, é um homem de mente limitada. Ele não é educado o suficiente para guiar os irmãos chilenos. Ele é estreito, mesmo fanático, mas acredito que ele possa verdadeiramente dizer: “E uma coisa faço” e “considero todas as coisas como perda para que possa ganhar os chilenos para Cristo.” Ele está imoderadamente orgulhoso do notável sucesso de sua obra—muito ofensivamente para nós! Há uma grande porção de conversa fiada e sensacionalismo e outros defeitos fácil de apontar, mas o fato permanece, os pobres têm ouvido o Evangelho.[421]

A “conversa fiada” e o “sensacionalismo” produziram resultados interessantes. Entre 1893 e 1897 a Igreja Metodista no Chile mais do que duplicou em tamanho; entre 1897 e 1903 ela duplicou novamente, e de 1903 a 1907 ela duplicou pela terceira vez. Em 1906 os metodistas chilenos já numeravam mais de quatro mil (ver gráfico).

O mais importante desses missionários “fanáticos” e “imoderadamente orgulhosos” mas bem sucedidos foi Willis Hoover, nascido em 1858 em Freeport, Illinois, EUA.[422] Ele estudou medicina em Chicago, mas o ofício de médico não o satisfez. Em 1889 ele se ofereceu para a missão auto-sustentada de William Taylor. Então ele aprendeu a falar bem o espanhol e tornou-se pastor da igreja em Iqueque. Em 1902 ele substituiu E. E. Wilson como pastor da igreja em Valparaíso. Ali ele começou a sentir que os membros possuíam apenas vagas idéias sobre o fundamental ensino metodista da santificação. Durante uma série de estudos sobre os Atos dos Apóstolos para professores de escola dominical, um deles perguntou o que é que impedia que a igreja deles fosse como a igreja apostólica. Hoover retrucou que o único impedimento para tal residiu neles mesmos.[423]

Em 1906 um terrível terremoto destruiu tanto a sua antiga igreja como o edifício que estava sendo construído para ser a nova igreja. Foram necessários esforços redobrados para construir uma terceira igreja. Ela foi dedicada em 7 de março de 1909.[424] Construída principalmente com as doações da própria congregação, tinha capacidade para mil pessoas sentadas. Um importante princípio tinha sido estabelecido que se tornaria decisivo para desdobramentos futuros; a saber, aquele da participação leiga em larga escala tanto no ministério financeiro quanto no espiritual.

Os missionários mais jovens e “melhor educados”, porém, que então estavam chegando dos Estados Unidos, desaprovaram o reavivalismo de Hoover, sua auto-confidência, sua amizade com os chilenos e seu protesto contra a utilização da comissão financeira dos missionários “para negociação por trás das costas dos nacionais.”[425]

O Passado Metodista Revivido[426]

Em 1907 a senhora Hoover recebeu um panfleto sobre “o batismo do Espírito Santo e fogo”[427] escrito por Minnie Abrams, que fora aluna da Chicago Training School [Escola de Treinamento de Chicago] na mesma época que ela.[428] O panfleto descreve um reavivamento pentecostal em uma casa para meninas dirigido por uma senhora brâmane, Pandita Ramabai, em Mukti.[429] Foram traços característicos do reavivamento o falar em línguas, visões e transes. O mais importante foi a argumentação da senhorita Abrams de que o batismo do Espírito Santo e fogo era algo adicional à experiência de justificação e santificação conhecida entre os metodistas.[430] Hoover procurou saber mais sobre o início do reavivamento pentecostal e se correspondeu com, entre outros, T. B. Barratt, o polêmico evangelista metodista em Oslo[431] que mais tarde viria a ser o “apóstolo pentecostal” para toda a Europa.[432]

Em uma noite de domingo em fevereiro de 1909, quando Hoover estava na reunião da conferência anual em Temuco, um dos irmãos da igreja de Valparaiso convidou os membros da junta oficial para ocuparem os assentos da frente no início do culto. Lendo o segundo capítulo de Joel, do verso doze em diante, ele disse: “Eu e vocês somos responsáveis pela situação desta igreja e devemos nos arrepender e nos endireitar com Deus [mesmo] se isso tomar a noite toda.” Após um período de oração no altar ele dispensou a congregação, solicitando à junta oficial que ficasse com ele por toda a noite, com quaisquer outros que desejassem permanecer com eles. Ficaram vinte ou trinta. Durante a noite um deles viu um braseiro no altar. Outros sentiram a mão do Senhor sobre suas cabeças enquanto oravam no altar; tal foi a bênção recebida que eles pediram para aquele irmão promover outra reunião para varar a noite, o que ele fez, marcando para o próximo sábado.[433]

Quando de seu retorno perguntaram a Hoover o que deveria ser feito em relação à vigília marcada para o próximo sábado. Ele disse que ela deveria ocorrer. Esse foi outro ponto decisivo no decorrer dos eventos. Primeiro os chilenos tinham assumido a responsabilidade pela construção de sua igreja, agora eles assumiam a responsabilidade pelo conteúdo de sua vida litúrgica e pela direção da vida da igreja como um todo—a causa tanto do subseqüente reavivamento quanto das dificuldades com os missionários americanos.

A vigília tornou-se um traço regular na igreja. Mas “a inundação avassaladora veio em 4 de julho de 1909, que era um domingo. A noite de sábado fora uma noite toda de oração, durante a qual quatro moças vaidosas (três das quais cantavam no coro) cairam ao chão sob o poder do Espírito. Uma delas, após permanecer deitada por muito tempo, levantou-se e com notável poder começou a exortar, dizendo, ‘O Senhor está vindo em breve e manda que fiquemos prontos.’ O efeito produzido foi indescritível.”[434]

Quando Hoover foi questionado sobre as moças deitadas no chão, “Llama Ud, eso humano?” ele calmamente retrucou, “Não.” “Mas então o que é isso?” lhe perguntaram novamente. “Divino,” disse ele.[435]

A ênfase nesse estágio inicial estava sobre a renovação da vida pelo Espírito Santo. Os pecados eram confessados em público, os débitos eram saldados, pecadores empedernidos se convertiam e pessoas que estavam indispostas se reconciliavam entre si.[436]

Uma moça inglesa, Nellie (ou Elena) Laidlaw, foi um elo importante entre Valparaíso e Santiago. Ela tinha sido uma bêbada e prostituta, mas declarou conversão e tornou-se uma das principais profetisas em Valparaíso.[437] Sua atividade mais polêmica era caminhar entre a congregação com os olhos fechados, subitamente escolher alguém e ordená-lo a se ajoelhar. Então Nellie revelava o que estava no coração da pessoa, convocava-a ao arrependimento e impunha suas mãos sobre a cabeça dela para que ela recebesse o Espírito.[438] Mesmo que Hoover tivesse desejado ele não poderia ter interferido, pois ele tinha ensinado sua congregação que o pastor não era nada mais do que o membro mais humilde, e que eles tinham apenas que seguir a liderança do Espírito. Como essa liderança do Espírito se tornaria operacional, seja na forma xamanista,[439] episcopal[440] ou de grupos dinâmicos congregados—isto os pentecostais ainda teriam que aprender.

Lei e Ordem

No início de setembro de 1909 Nellie Laidlaw visitou sua irmã em Santiago. Em 12 de setembro ela foi à uma das duas igrejas metodistas em Santiago, querendo falar, mas foi impedida por Robinson, o pastor. Então Nellie foi para o pátio, onde entregou suas revelações.[441] Mais tarde alguns de seus seguidores entraram novamente para protestarem junto a Robinson. Na discussão que se seguiu, Robinson empurrou um homem, mas perdeu o equilíbrio e caiu da plataforma, o que ocasionou um corte em sua cabeça.[442]

Relatos baseados em rumores e declarando que “Robinson fora golpeado na cabeça”[443] foram enviados para Nova Iorque. Essa e outras alegações ainda piores presentemente são contraditas irreconciliavelmente pela melhor evidência disponível em Santiago.[444]

À noite Nellie Laidlaw novamente quis falar na igreja. Rice, o ministro, pediu que ela se calasse. Como ela não se calou, ele chamou o policial que estava esperando do lado de fora e pediu-lhe para prendê-la. Diante disso os partidários de Nellie ficaram furiosos e protegeram-na de forma que ela não pudesse ser presa. O policial chamou por reforço. Os policiais que chegaram liberaram o corredor e levaram Nellie para a delegacia de polícia, onde ela passou a noite.[445]

Assim, 12 de setembro de 1909 é uma importante data na história eclesiástica chilena. Nesse dia os metodistas garantiram a lei e a ordem, mas perderam o coração do povo. Os pentecostais celebram o 12 de setembro como seu aniversário de reforma. A terceira reforma, como Lalive a denomina—a primeira sendo a de Lutero, Zuínglio e Calvino, a segunda a reforma de Wesley.

As reuniões em Valparaíso continuaram de uma forma barulhenta que perturbou a vizinhança e conduziu à uma investigação oficial por parte das autoridades municipais.[446] Então um jornalista começou a fazer reportagens sobre as reuniões. Para despertar o interesse de seus leitores ele prestou queixa criminal contra Hoover por, entre outras coisas, dar à sua congregação uma bebida perniciosa chamada “o sangue do cordeiro,” que os fazia deitarem no chão por horas a fio em um estado de estupefação.[447] Rice achou que deveria interferir. Juntamente com Robinson e o cônsul americano ele visitou o juiz em Valparaíso em 4 de outubro, e descobriu que havia uma ordem escrita para o fechamento da igreja metodista ali. Tal ordem considerava a igreja um transtorno público.[448] A municipalidade exigiu que Hoover assinasse um documento se comprometendo a encerrar as reuniões as dez horas da noite, mas não interferiu de outra forma em seu trabalho. A queixa criminal logo foi dispensada como sendo absurda, mas Rice telegrafou para Nova Iorque: “Hoover processado criminalmente . . .”[449] Sob a impressão de que Hoover estava sob detenção, Stuntz telegrafou para os membros da comissão financeira[450] orientando-os a enviarem Hoover de férias imediatamente, caso eles achassem que isso era necessário.[451] O cenário estava pronto para um magnífico julgamento de heresia.

O Julgamento de Heresia

O local era Valparaíso e a data era 10 de fevereiro de 1910. Uma comissão sob a presidência de Robert Elphick apresentou à Conferência Anual as conclusões de seu exame da doutrina e prática de Hoover. Além das acusações relacionadas com os excessos que já foram discutidos, e que por essa época Hoover já eliminara em grande parte, a comissão considerou Hoover culpado de ensinar falsas doutrinas.[452]

Foi firmada uma resolução[453] que rejeitava a falsa doutrina de que o batismo do Espírito Santo era acompanhado por lágrimas, visões, milagres, curas e outras manifestações. Ela declarava “que tais doutrinas são anti-metodistas, contrárias às Escrituras e irracionais.”[454]

Como o julgamento ocorreu em público, os membros da igreja chilena tiveram oportunidade de seguir os procedimentos diretamente. Aos seus olhos não era apenas Hoover que estava sendo julgado mas seu próprio reavivamento chileno. O que estava em jogo não era somente uma questão doutrinária vital[455] mas uma questão cultural ainda mais importante. “Talvez irracional,” os chilenos responderam às acusações levantadas contra eles, “mas certamente não anti-metodistas e contrárias às Escrituras.”

Não foi Hoover mas os chilenos reavivados que finalmente perceberam que a ruptura com os missionários americanos era inevitável. Foi solicitado à Hoover que saísse de férias mas os chilenos lhe pediram para ficar e permanecer junto com eles. Ele permaneceu, perdendo sua condição e seu salário de missionário da Igreja Metodista. Os chilenos perderam seus edifícios das igrejas, para os quais eles próprios tinham pago a partir de sua pobreza, mas ganharam o que muito provavelmente seja a primeira igreja protestante financeira e teologicamente independente no Terceiro Mundo. Nesse sentido 12 de setembro de 1909 pode ser considerado como o aniversário da Terceira Reforma.

“A opinião ponderada mesmo daqueles metodistas mais sensíveis para apreciarem os pontos positivos do reavivamento pentecostal no Chile era que o movimento estava fadado a se tornar uma seita que enfrentaria muitas dificuldades e por fim desapareceria em poucos anos.”[456] Quão enganados eles estavam. Para dobrarem o número de membros novamente os metodistas levaram não sete anos, como nos anos anteriores ao cisma com os pentecostais, mas setenta anos, enquanto que no mesmo período as igrejas pentecostais alcançaram aproximadamente um milhão de membros.

A Igreja Metodista afastou-se daquilo que ela considerou ser anti-metodista e irracional; ao fazer isso, ela também se afastou do verdadeiro solo no qual a Igreja Metodista no Chile poderia crescer.

As Interpretações

A Igreja Metodista Pentecostal no Chile declara categoricamente que ela é uma igreja metodista fidedigna.[457] Eles têm afirmado: “A diferença entre os metodistas e nós não se encontra em diferença de doutrina. É apenas que eles meramente possuem as doutrinas metodistas, ao passo que nós as experimentamos.”

Na verdade a Igreja Metodista Pentecostal não desenvolveu aquilo que por vezes é denominado “uma típica doutrina pentecostal,” se por isso entendermos uma doutrina pentecostal do tipo defendido pelas Assembléias de Deus. Eles não ensinam o “sinal inicial,” ou seja, que o falar em línguas é o sinal exterior do batismo do Espírito. Outros sinais e dons podem muito bem cumprir essa função. Eles praticam o batismo infantil, continuam com o sistema de classe metodista e com a ordem episcopal metodista, utilizam livremente literatura e agendas litúrgicas metodistas, e imprimem em seus hinários os vinte e cinco artigos da Igreja Metodista Episcopal sem qualquer alteração. Ademais, eles possuem fortes objeções aos missionários das Assembléias de Deus no Chile baseados nos Estados Unidos, tanto por razões doutrinárias quanto pela defesa de sua própria independência cultural, política e organizacional.[458]

A Questão Cultural

O movimento pentecostal chileno interpreta seu próprio início da seguinte maneira: “Os irmãos ficaram possuídos por danças e visões espirituais, falaram nas línguas dos anjos, profetizaram sobre o grande reavivamento espiritual. O Espírito Santo se apoderava deles nas ruas. As autoridades os levaram para as prisões como criminosos, mas os irmãos dançaram nas prisões, falando em línguas e profetizando para esses mesmos oficiais.”[459]

W. C. Hoover descreve:

Risos, lágrimas, gritos, cânticos, línguas estrangeiras, visões e êxtases durante as quais o indivíduo caía no chão e sentia-se alçado para outro lugar, para o céu, para o Paraíso, em campos esplêndidos com vários tipos de experiências: conversas com Deus, com os anjos ou com o diabo. Aqueles que experimentavam tais coisas lucravam sobremaneira e geralmente eram modificados por elas e ficavam cheios de louvor, do espírito de oração e de amor.[460]

Para os jornalistas (El Chileno) isso era “obra de um embusteiro ou maluco.” “Gritos, crises de desmaios e convulsões” eram considerados “cenas tragicômicas.” Era portanto necessário que “a Lei interviesse.”[461]

A Aliança Cristã e Missionária descreveu o reavivamento como um excesso de fanatismo religioso com “gesticulações grotescas.”

Eles oravam tão alto que era possível ouvir os gritos à um quarteirão de distância. As reuniões duravam até a meia-noite e algumas vezes varavam até a madrugada. . . Alguns gritavam como galos, outros dançavam, outros pensavam que estavam tocando algum instrumento de corda, outros caíam vez após outra no chão chorando e berrando; seus corpos ficavam insensíveis; outros confessavam seus pecados e a coisa toda terminava como um verdadeiro escândalo.[462]

Para os metodistas, como já vimos, o reavivamento era simplesmente “anti-metodista, contrário às Escrituras e irracional.”

Não há muita teologia em nenhuma dessas interpretações. Na verdade o periódico metodista, El Cristiano, rejeitou um artigo de Hoover que consistia integralmente de citações de Wesley em defesa do reavivamento.[463] Se não foi teológica, então qual foi a motivação para as duras declarações proferidas por ambos os lados?

Os pentecostais tinham descoberto que as manifestações permitia-lhes participarem no culto com seus próprios dons. Eles poderiam se tornar litúrgica e teologicamente ativos ao nível da e com os meios de sua própria cultura. Como esses meios se pareciam sobremaneira com os registros do passado bíblico e metodista havia uma única interpretação possível. Se fora o Espírito Santo naqueles tempos, tinha que ser o mesmo Espírito Santo no presente.

Os metodistas e a Aliança Cristã e Missionária foram incapazes de se unir em culto naquele nível. Contudo essas manifestações se aproximavam perigosamente dos registros de suas próprias origens. O ressurgimento do passado, com todo o prestígio de história da igreja estimada, era uma ameaça muito perigosa para um presente que se dizia ser uma continuação do passado, mas que na verdade era culturalmente descontínuo.

O que mais os metodistas poderiam fazer, senão declarar que o reavivamento chileno não era parte de sua tradição? Ele era tão ameaçador que tinha que ser declarado forâneo e irracional—como se os reavivamentos metodistas anteriores tivessem sido particularmente abençoados pela racionalidade, e como se nas Escrituras a “racionalidade” estivesse apresentada como um fundamento para a verdade.

A Questão Missiológica

O que a tradição ocidental de cristianismo deve fazer quando nossos convertidos desenvolvem um tipo de cristianismo não apenas diferente do nosso, mas que recorda impressionantemente um estágio de nosso próprio passado? Obviamente nós não nos opomos à pesquisa histórica, mas ficamos temerosos quando a história revive novamente. O que a tradição ocidental deve fazer se esse novo tipo de cristianismo não apenas se torna parte vital da igreja cristã, mas também parece se tornar a parte mais importante do cristianismo do Terceiro Mundo?[464]

Até o momento temos convidado esses cristãos a participarem da comunhão ecumênica com algum (não impressionante) sucesso. Temos nos convencido de que esses cristãos não são teologicamente bem informados, que eles são evangelicamente estreitos e sem interesse pela igreja mais ampla. Assim temos “explicado” porque a parte maior do cristianismo no Terceiro Mundo não está relacionada com nenhuma agência ecumênica. Temos que fornecer alguma explanação, considerando como o Conselho Mundial de Igrejas tem se estabelecido como representante do cristianismo do Terceiro Mundo. Os cristãos do Terceiro Mundo não estão no Conselho Mundial de Igrejas. Por quê não?

Ouçamos o relato de um dos líderes da Igreja Metodista Pentecostal, Alfredo Ramírez Ramírez, que participou da Assembléia Geral do Conselho Mundial de Igrejas em Uppsala (1968). Eu ouvi o relatório que ele forneceu a seus companheiros quando de seu retorno a Santiago. Primeiramente Ramírez ficou sobremaneira surpreso pelo fato de que em Uppsala os sermões eram lidos: “Como eu disse, o sermão foi lido, o que parece ser costumeiro [para eles]. Eles não pregam como nós pregamos. Nós falamos livremente em nossos sermões com a ajuda do Senhor, com total liberdade espiritual, de acordo com a inspiração do Espírito Santo, pois somente ele conhece as necessidades de cada coração.” Mas ele ficou bastante impressionado com o canto em um dos cultos.

O culto todo foi inesquecível. Como a banda formada por 120 instrumentos de sopro que tocou os hinos tão divinamente que eu cheguei ao ponto de ser inspirado a dançar pelo Espírito do Senhor. Sim, amados irmãos, eu estava no ponto de fazer isso. Mas perguntei a mim mesmo, “O que esses irmãos irão pensar, eles que não acreditam nas manifestações do Espírito Santo?” Talvez alguns deles ficassem escandalizados se me vissem dançar para o Cordeiro de Deus. Graças a Deus que Ele não efetuou essa manifestação espiritual em mim.[465]

Esta última observação mostra que embora os pentecostais chilenos entendam que sua dança litúrgica seja inspirada pelo Espírito, ela não ocorre inteiramente fora do controle deles. Na realidade, ela é maravilhosamente controlada e integrada em seus cultos. O paralelo mais próximo que eu posso achar é aquele de um pianista realmente habilidoso que domina a técnica de tocar o teclado. A habilidade é uma questão de muitos anos de prática e exercício; a maneira em que ele a utiliza é uma questão de inspiração do momento. Esse talento para a dança é algo que os chilenos herdaram de gerações de dançarinos; a maneira na qual eles o utilizam é uma questão de inspiração do momento.

Mas e quanto a sua outra observação: “Talvez alguns deles ficassem escandalizados . . .”? Fiquei profundamente triste quando soube dele que ele não se sentira livre para trazer sua contribuição àquele culto de louvor.[466] Talvez ele estivesse certo. Talvez alguns poderiam se escandalizar. Mas porque deveríamos ficar mais escandalizados quando os chilenos trazem sua liturgia para o movimento ecumênico do que quando nós introduzimos nossa liturgia no Chile? Na verdade eles estão descontentes com nossos tipos de liturgia. Esse mal estar é—em minha opinião—realmente o responsável pelo relacionamento bastante tênue entre os pentecostais do Terceiro Mundo (e outras igrejas autóctones) e as igrejas históricas. As razões teológicas que são oferecidas são em sua maioria baseadas em incompreensões mútuas e racionalizações secundárias.

Isto não é um apelo para a introdução da dança nas nossas liturgias ocidentais, mas estou preocupado com o fato de que talvez não sejamos realmente católicos, nem mesmo ecumênicos. Um movimento verdadeiramente católico e ecumênico encontraria caminhos para superar essa brecha cultural. Alguns cristãos ocidentais podem ser capazes de participar de uma liturgia pentecostal do Terceiro Mundo. Tudo bem para eles. Mas isso não é nem mesmo necessário. O que é necessário é um livre espaço de tolerância—permitindo que esses outros cristãos permaneçam coerentes consigo mesmos quando eles se encontram conosco. Sem tal espaço de tolerância—uma ponte sobre as águas tormentosas da diferença cultural—a igreja nunca será católica e nunca reconhecerá os frutos de sua própria tarefa missionária.

A Questão Teológica

Eu não vou responder a questão de se os pentecostais chilenos eram “anti-metodistas” ou não. Essa é uma questão que quero deixar para os metodistas responderem. Todavia, gostaria de oferecer algumas observações as quais nos servirão de base para podermos responder aquela questão.

(1) Uma comparação entre as descrições do reavivamento no Chile e o reavivamento de Wesley, e uma comparação das interpretações teológicas desses reavivamentos, é uma abordagem à nossa questão bastante grosseira. Já deve estar evidente que qualquer afirmação teológica e qualquer experiência religiosa é culturalmente condicionada e portanto não pode ser julgada por si só. Temos que avaliar ambas baseados em sua função em determinado contexto. Há afirmações teológicas e experiências religiosas que cumprem uma função teologicamente justificável em um contexto específico. Há aquelas que não cumprem tal propósito.

(2) Isso implica em que o cristianismo, incluindo a teologia cristã e as experiências religiosas cristãs, não é fenomenologicamente e conceitualmente o mesmo em todos os lugares e sempre. Para percebermos isso precisamos apenas estudar a história das missões ou a história da igreja em geral—isto é, se ainda não aprendemos isso com as boas teologias do Antigo e do Novo Testamentos. Se o cristianismo não é o mesmo em todos os lugares e sempre, e se, ademais, estágios diferentes de história da igreja estão hoje preservados lado a lado; se, em outras palavras, os contemporâneos cronológicos não são contemporâneos culturais; então temos que lidar com o fato de termos “os passados do cristianismo” presentes em nossas igrejas. Se culturas de diferentes países coexistem em um único e mesmo local; se, em outras palavras, cohabitantes locais não são cohabitantes culturais, então temos que lidar com o fato de termos diferentes culturas presentes em um único local. Por isso é que nos deparamos com a busca por uma “teologia intercultural.”

(3) Se um proeminente pentecostal como Oral Roberts[467] pode se tornar um ministro metodista sem mudar sua teologia, então é difícil acusar os chilenos de serem “anti-metodistas.” Ao estudar cuidadosamente as publicações metodistas suíças e alemãs entre 1900 e 1910 pareceu a mim que o vocabulário e os conceitos dos pentecostais chilenos freqüentemente são mais metodistas do que aqueles de seus oponentes metodistas.[468]

A Busca por uma Teologia Intercultural

Se, como temos sugerido, a Igreja Metodista Pentecostal [chilena] e a Igreja Metodista Episcopal [norte-americana] são simplesmente duas variações culturais da mesma tradição metodista, então as questões óbvias são: Primeiro, é possível, e de fato desejável, que as duas igrejas cresçam unidas novamente? Segundo, como igrejas culturalmente incompatíveis discutem teologia e chegam a uma avaliação comum da vantagem (ou desvantagem) ou do desejo (ou falta dele) por inculturações específicas do cristianismo?

Em um artigo traduzido pela Basel Mission [Missão Basiléia],[469] dois pesquisadores chilenos concluíram por uma avaliação positiva da forma cultural do pentecostalismo chileno. Do ponto de vista deles, a igreja pentecostal chilena e a Igreja Metodista Episcopal não são “simplesmente variações da mesma tradição metodista” (como tenho defendido), mas o pentecostalismo chileno autóctone é uma expressão válida[470] de religião popular autóctone—e a igreja metodista não.

Uma vez que uma reunificação das duas igrejas parece improvável (embora não tão impossível) a questão da cooperação ecumênica se torna mais importante.[471] Essa também é a convicção de Juan Sepúlveda, um pentecostal chileno. Não é surpreendente, escreve ele, “que tanto o ecumenismo mundial como o latino americano estejam cada vez mais . . . pensando sobre a possibilidade de uma incorporação maciça do pentecostalismo na tarefa ecumênica.”[472] Ele também rejeita a noção do pentecostalismo como um representante da ordem arcaica. Por causa de seu caráter de “religião popular,” sugere ele, o pentecostalismo não é uma “sobrevivência de tradição.” Sua mensagem não tem se oposto aos projetos de modernização.

Pelo contrário, eles [os pentecostais] têm dedicado seus esforços, do ponto de vista de sua “nova fé,” à promover uma nova experiência religiosa, que tem surgido através do trabalho em pequenas escolas rurais e entre pessoas que têm se entusiasmado com o movimento ruma a religiosidade popular. Nem é o pentecostalismo um problema fácil para a os cientistas sociais críticos compreenderem. A intensidade de sua experiência religiosa não tem demonstrado nenhuma evidência de interesse na crítica histórica da sociedade. Isto tem dado aos críticos a impressão de que o pentecostalismo é um novo instrumento da ideologia de dominação prevalecente, impedindo assim a possibilidade das pessoas expressarem sua crítica. A opinião dos cientistas sociais sobre o pentecostalismo está demonstrada, entre outras, nas seguintes expressões: ópio, dominação via religião, proclamação religiosa de conformismo social, “refúgio das massas.” Soma-se à estas o esforço evidente do estrangeiro para direcionar essa tendência religiosa através da exposição dramática dos pregadores profissionais da assim chamada “igreja eletrônica.”[473]

Em conclusão, Sepúlveda cita o professor brasileiro Edênio Valle, que percebe nesse tipo de religião popular um modo psicológico de oposição:

O grupo individual que apela para esse código revela não aceitação dos códigos oficiais propostos ou impostos por aqueles que exercem poder. Eles [os indivíduos] demonstram que a linguagem aceita é considerada por eles como forânea, portanto alienadora em relação às experiências individuais ou coletivas, particularmente aquelas que são suprimidas.

Essa democratização da linguagem “exerce uma função protetora. Isto é, os oprimidos são capazes de dizer aos opressores seus próprios sentimentos de uma forma tal que a resposta dada é dissimulada.”[474] Em outras palavras, temos aqui um processo semelhante aquele expresso nos hinos e spirituals dos escravos oprimidos nos Estados Unidos (capítulo 4, pp. 32-34???). Sepúlveda percebe na autoctonia do pentecostalismo chileno a razão de seu crescimento extraordinário. As igrejas pentecostais superam todas as outras igrejas protestantes por um fator de 300.[475] Os pentecostais passaram de seita perseguida para uma igreja oficial. Alguns setores do pentecostalismo de fato apoiaram o regime de Pinochet;[476] mas outros estão participando em ações proféticas “criticando as autoridades à luz das promessas de Deus.”[477]

Tudo isso torna imperativa a cooperação ecumênica. A crua realidade, porém, é que até agora não temos tido uma linguagem que nos capacite a conduzir um debate teológico com teólogos de igrejas fora de nossa cultura, que utilizam a linguagem das experiências religiosas de fora de nossa tradição analítica.

Parece-me que há apenas duas vias abertas. Ou eles aprendem nossa linguagem e nossa maneira de fazer teologia ou nós aprendemos a maneira deles. A primeira tem sido tentada por quase cem anos. Nós a denominamos educação teológica; na verdade é um processo de lavagem cerebral epistemológica e imperialismo cultural. Mesmo as diversas formas de “teologias da libertação” ainda são estruturadas e construídas em nossa maneira, embora sejam direcionadas contra a base de força política e econômica (mas não cultural) da Europa e dos Estados Unidos. Como a primeira via tem se mostrado deficiente no treinamento de um pastorado autóctone na América Latina e na África, podemos considerar trilhar a segunda via. É aí onde as tentativas por “teologias narrativas”[478] se tornam academicamente necessárias, porque elas no mínimo dariam à teologia a possibilidade de se tornar universal. Ou a teologia é universal e intercultural ou ela não merece o título de uma disciplina acadêmica.

CAPÍTULO ONZE

Apelo por um Sincretismo Teologicamente Responsável O Cristianismo é um Sincretismo Por Excelência[479]

Antes de buscarmos as raízes históricas do pentecostalismo em Wesley e em seus mentores católicos, temos que abordar um problema teológico premente. Quem ler toda a seção I deste livro poderá levantar mais de uma vez a seguinte questão: Tudo isso não é apenas uma forma de sincretismo cristão—a aceitação de formas xamanistas de religião na Coréia (capítulo 8, pp. 99-105), as raízes negras e africanas do pentecostalismo (capítulo 3, pp. 18-24), as tentativas de integrar a religião popular no pentecostalismo chileno (capítulo 10, pp. 117-31), a africanização do cristianismo no [antigo] Zaïre (capítulo 6, pp. 55-58) e na África do Sul (capítulo 5, pp. 54-80), a escavação no México de antigos elementos culturais mexicanos (capítulo 7, pp. 81-98)? E de fato não há dúvida alguma de que essas são formas de sincretismo. Porém, assim são todas as formas de cristianismo, também e particularmente o cristianismo ocidental. A questão não é “sincretismo, sim ou não,” mas que tipo de sincretismo. A própria Bíblia já é um exemplo de sincretismo teologicamente responsável. Basta lembrarmos do exemplo do exílio.[480] Os israelitas chegaram a Babilônia com a teologia do javista. Eles trouxeram uma religião nômade que logo mostrou-se deficiente.

Para compreendermos essa situação podemos imaginar três partidos: O primeiro era o “partido da religião tradicional.” Aqueles desse partido diziam: “Se foi suficientemente bom para nosso pai Abraão, é suficientemente bom para nós. Sabemos que o mundo é um oásis, pois é assim que está escrito em nossos livros sagrados. Yahweh nos tirou do Egito. O que os babilônios dizem é o mais puro paganismo.”

O segundo era o partido dos judeus filo-babilônios. Eles diziam: “Talvez no passado Yahweh tenha nos salvado do Egito, mas agora está desaparecido. O templo está destruído. A aristocracia foi levada em cativeiro. Conseguimos salvar apenas poucos remanescentes de nossos antigos documentos. Os dez manadamentos? Os babilônios também os possuem e em uma versão atualizada! A Babilônia é o poder militar e cultural vitorioso; sua ciência explica o mundo.”

O terceiro partido era uma minoria. Ele está documentado em Ezequiel, em alguns salmos e sobretudo no código sacerdotal (P). Eles diziam: “Nós não discutimos com os babilônios sobre a origem e forma do mundo. Talvez eles estejam certos. Apenas, eles deveriam ser um pouco mais consistentes e um pouco mais críticos, pois não há nenhuma evidência de uma deusa do caos, como eles dizem. A água que cerca o mundo não é uma deusa mas apenas uma substância material. O sol e a lua não são deuses, são luminares (oroth). O sangue não é sangue de um deus como os babilônios dizem. Todos esses são fenômenos físicos e biológicos. São coisas, não deuses; e funcionam de acordo com as leis de Deus. Foram feitas por ele mas não são idênticas à ele.” De fato, essas percepções estão na base de nossas ciências naturais, pois se a lua fosse uma deusa não se poderia caminhar sobre ela. Se a água fosse uma deusa, não se poderia submetê-la à eletrólise. São coisas, e portanto abertas à investigação e manipulação humana. Se tal abordagem à natureza também tem suas desvantagens é outra questão.

É evidente que os judeus teriam desaparecido na Babilônia se apenas tivessem existido os dois primeiros partidos. O fato de que a tradição bíblica pode continuar deve-se ao terceiro partido. Isso é um exemplo de um sincretismo teologicamente responsável.

Encontramos mais de tais sincretismos na Bíblia. O templo, por exemplo, foi construído de acordo com projeto cananeu, por arquitetos e artesãos cananeus. A única diferença é que no lugar do ídolo cananeu no templo encontramos a arca e as tábuas dos mandamentos, símbolos do pacto de Deus com seu povo.

Se olharmos para o Novo Testamento encontraremos o mesmo tipo de sincretismo. Mateus foi audacioso o suficiente para declarar que os magos (não reis) descobriram seu caminho até o local onde Jesus nasceu baseados em sua astrologia pagã, enquanto que os escribas estudiosos da Bíblia em Jerusalém procuraram matar o menino Jesus. Talvez Mateus devesse se alegrar por não ter tido de submeter seu Evangelho a uma comissão teológica para aprovação: ele teria sido reprovado.

Mais tarde veremos que Paulo, também, não se afugenta do sincretismo. Seu famoso capítulo treze de I Coríntios é uma colagem de ditados religiosos populares contemporâneos (como pode-se confirmar consultando qualquer comentário crítico). Ele consegue até mesmo não mencionar Cristo em todo o capítulo. Este se torna cristão apenas por sua inclusão em I Coríntios. O “círculo popular” nessa passagem talvez seja a razão porque tantos casais escolhem-na como texto para seu casamento.

O mesmo se aplica às nossas igrejas modernas, sejam católicas, protestantes ou pentecostais: elas são exemplos de sincretismo. Por exemplo, desde Tomás de Aquino temos aceito a metodologia de um filósofo pagão (Aristóteles). Isso é particularmente verdadeiro para os evangélicos que dizem que todas as afirmações na Bíblia têm que ser harmonizáveis para serem verdadeiras. A pressuposição de que a consistência lógica é um sinal da verdade certamente não é uma idéia bíblica mas uma noção filosófica aristotélica. Em nossas universidades e escolas bíblicas funcionamos de acordo com as leis da coerência e da lógica. De outra forma não nos encaixaríamos nesta cultura. Porém, torna-se fatal quando pensamos que nossas formas de pensar é a própria coisa. Se esquecermos que há culturas, e.g., a chinesa, a hebraica ou a mexicana arcaica (capítulo 7, pp. 81-98), que não operam de acordo com Aristóteles, nós assumimos nossas formas de pensar como a verdade. Em épocas mais recentes até mesmo alguns matemáticos e físicos têm descoberto que as leis da lógica e da coerência, a lei da incontraditabilidade, são verdadeiras apenas de uma forma limitada.[481] Semelhantemente, descobrimos na vida cotidiana que alguém pode ser inconsistente mas confiável—pergunte a qualquer pessoa casada. Há pessoas, que são totalmente consistentes—funcionam como um computador—todavia se mostram não confiáveis. Assim é com a Bíblia: ela, também, é confiável mas não consistente.

Também é bem sabido que nossos ritos e festas (natal, páscoa) e mesmo os nomes de nossos dias da semana* (Sunday, Monday, etc.), não são oriundos do Novo Testamento, mas de nossos antepassados celtas e germânicos. Da mesma maneira a forma de nossos sermões, e nossos templos, que freqüentemente foram construídos sobre os alicerces de templos pagãos. Nossos ritos e festas pagãos carregam consigo uma grande herança de nosso passado pagão. É só pensar em nossas cerimônias de casamento e funerais—eles também seguem padrões pagãos. Os cristãos do Novo Testamento não realizavam funerais. Eles não sonhavam com tais coisas. “Deixem os mortos sepultarem seus próprios mortos,” diziam eles. Cristo perturbou todo funeral do qual participou ao ressuscitar o morto. Eu não concluo disso que os pastores têm que ressuscitar os mortos em vez de sepultá-los. Esse tipo de adaptação cristã à novas situações, esse sincretismo teologicamente responsável, é necessário. Já não mais aguardamos a segunda vinda de Cristo imediatamente, como faziam os primeiros cristãos. Portanto, são nos exigidas outras formas de testemunho.

A Religião é o Negócio do Futuro

Vinte anos atrás nos prometiam um futuro totalmente secularizado. Hoje o caso é o contrário. Somos inundados por uma onda religiosa atrás de outra. “Não podemos ser incrédulos . . . Para levar a efeito o ateísmo é necessário profundo compromisso religioso.”[482] Nenhuma discussão teológica pode olvidar esse fato. A religião é parte da humanidade. É por isso que temos que lidar com a religião da mesma maneira que com os demais dados da criação, tais como produção e comércio, atração e amizade.

Pense na confusão que criamos nas pessoas que tiveram experiências religiosas ou parapsicológicas. Os teólogos acreditam que são competentes em questões de ecologia e economia, em política e psicologia. E é correto que façam sua contribuição nesses tópicos, embora seria apropriado uma modéstia maior. Mas não é correto recusar a cooperação no campo onde deveríamos ser especialistas—o campo da religião. Esse tipo de recusa não é falta dos pastores, mas de nossa educação teológica. Nela o tópico da religião vivida, especialmente da religião popular, é tabu. Mas proibir a discussão desse tipo é não compreender Karl Barth, que disse que se ele escrevesse sua dogmática novamente ele a escreveria em diálogo com as grandes religiões mundiais. Obviamente ele ainda chegaria à uma teologia cristologicamente centrada, mas seus parceiros de diálogo incluiriam não apenas Agostinho, Lutero e a Bíblia; mas também Buda, Maomé e as religiões indianas, e as religiões populares reemergentes.

A razão pela qual os pastores fracassam nessa área é que não podemos articular nossas próprias experiências religiosas. Não é verdade que o clero esteja perdendo a fé. Mas é verdade que eles são prisioneiros de uma cultura burguesa—a chamada erudita, onde podemos falar em público sobre qualquer coisa, mesmo as mais íntimas, mas não sobre a própria experiência religiosa. É por isso que as pessoas pensam que somos incrédulos. Não é surpresa que a religião busque um lugar fora das igrejas, que ela crie suas próprias organizações em outro lugar.

Aqueles que têm sonhos religiosos não procuram o pastor mas o psiquiatra ou os auto-intitulados gurus do estrangeiro. Aqueles que aspiram por uma experiência religiosa, por direção em suas vidas e por comunhão, procuram os grupos de oração carismáticos, um grupo de estudo bíblico ou uma classe de ioga. Eles peregrinam a Taizé,* a um Ashram** indiano, a um curandeiro espiritual filipino ou a uma Kirchentag*** alemã; mas nem se importam com a paróquia da esquina próxima. “Entre todos os meus pacientes abaixo dos quarenta anos, não há nenhum cujo problema último não seja de ordem religiosa,” diz Carl Gustav Jung.[483] Isso também é verdade em relação aos países que foram comunistas. Mesmo antes de Gorbachev havia mais cristãos na União Soviética do que membros do Partido Comunista. E isso, após quase um século de propaganda comunista. Na China a igreja triplicou desde que os missionários tiveram que partir.

Uma coisa é certa: a religião não desaparecerá. A única questão é, a serviço de quem ela estará? Servirá ela a sede por auto-realização, pela paz interior do ocidental moderno? Hoje os ocidentais possuem casas, carros e roupas em abundância. Agora eles estão buscando inspiração em drogas, em gostos exóticos, em sons e imagens extraordinários, em renascimentos em uma existência anterior, em terapias e sentimentos novos e estimulantes. Aquele que consegue “vender” sentimentos é bem sucedido. Já não é mais uma desgraça perder posses, mas é uma desgraça não ter experimentado a mais recente moda em religião. Harvey Cox denomina isso “glutonaria espiritual.”[484] No passado as pessoas faziam jornadas na África. Hoje fazem viagens para a transcendência. Após a comercialização do sexo, estamos agora assistindo à comercialização da religião (capítulo 18, pp. 229-33). Com a religião pode-se ganhar muito dinheiro, e não apenas nos Estados Unidos. Os clientes entregam tanto capital como matéria-prima. Hoje, os bancos de dados da igreja eletrônica são vendidos e empregados por organizações políticas e empresas comerciais de mala direta.

Certamente, as igrejas protestam contra essa erva daninha religiosa, contra essa banalização do sagrado, essa comercialização da religião—e com razão. Mas sem sucesso. Os pastores são incapazes de lutar contra as multinacionais religiosas. Pois nesse assunto como em qualquer outro a verdade é o seguinte: A melhor crítica do falso é a prática do verdadeiro.

A questão é: confrontada com esse tremendo crescimento no interesse pela religião, o que é que a igreja deve fazer? A saída mais fácil e financeiramente mais lucrativa seria transformar a igreja em um complexo religioso industrial altamente organizado, com seus supermercados em todas as cidades. Ali se poderia comprar de acordo com o gosto, experiência religiosa, terapias, meditações e—por que não?—experiências extáticas e comunhão de curta duração. Então as funções estariam claras, os registros bem mantidos e o status da igreja na sociedade ficaria sem questionamento. Essa capitulação direta diante das forças do mercado religioso é obviamente um sincretismo teologicamente irresponsável. Mas igualmente irresponsável é uma oposição obstinada: quem quer que queira religião terá que comprá-la no pacote, na qualidade e no preço que apenas nós temos a oferecer. Tal postura somente é possível onde as igrejas detêm um monopólio no mercado religioso. E essa época está definitivamente superada.

Mais importante do que o argumento do mercado é o bíblico. Assumindo a postura isolacionista mencionada, renunciaríamos à nossa tarefa profética e crítica por um sincretismo teologicamente responsável. É minha opinião que devamos aceitar o desafio, mas de tal maneira que fique claro que Deus é algo diferente de nossa experiência de Deus, e que transcendência é algo diferente de uma viagem à transcendência.

Os modelos para tal sincretismo são os autores bíblicos; mas não que devamos dizer: No Novo Testamento não há funerais, capelães militares, escolas dominicais, batismo infantil, árvores de Natal, doutrina da Trindade, sinos de igreja, por conseguinte tudo isso é falso. Em vez disso, devemos perguntar: Como os autores bíblicos lidaram com o contexto religioso de sua época?

O mesmo é verdadeiro em relação ao nosso diálogo com a medicina, com as ciências, com as religiões populares e até mesmo com o patriotismo. Os autores bíblicos apenas raramente negavam a verdade relativa das outras cosmovisões ao seu redor. Mas eles as convertiam, e as destronavam de seu status absoluto (isto se aplica hoje à medicina, à economia e à ciência). Eles as reconheciam como coisas criadas por Deus; coisas não são deuses. Eles estavam conscientes de que todas essas coisas são partes da criação de Deus. Essa é uma percepção missiologicamente importante. Um missionário que se recusa a falar em chinês, iorubá ou telugu não é um missionário, mas um propagandista europeu. Em outras palavras, é necessário que haja não apenas um sincretismo mas muitos, dependendo dos parceiros com quem entramos em diálogo. Afinal de contas, temos quatro evangelhos que emergiram em diferentes culturas e situações. Esses diferentes sincretismos não têm tanto em comum um conteúdo mas um método, o qual examinaremos agora através de um exemplo concreto.

A Epístola aos Colossenses: exemplo de um sincretismo teologicamente responsável[485]

Eu cito o hino em Col. 1:15-20 sem as interpretações e correções do autor de Colossenses:

Ele é a imagem (eikon) do Deus invisível, o primogênito (prototokos) da criação porque nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis. Por meio dele e para ele todas as coisas são criadas. Ele antecede à tudo—todas as coisas têm nele a sua coerência. Ele é a cabeça do corpo. Ele é o princípio (arche), o primogênito dos mortos; pois nele toda a plenitude (pleroma) desejava viver, e reconciliar todas as coisas por meio dele e para ele, fazendo paz na terra e no céu.

Esta é uma citação do “Hinário da Nova Era” da igreja em Colossos. Podemos assumir que este hino era cantado na igreja de Colossos em homenagem à uma divindade suprema presente na totalidade do cosmo ( ele é a cabeça do corpo”). Para os cristãos colossenses tal cabeça certamente é Cristo, embora Cristo nunca seja mencionado no hino. A ausência de tal referência sugere que este hino fora um hino não cristão.

O hino é cantado por pessoas para quem o mundo, o corpo do cosmo, está despedaçado. Os fios de harmonia estão perturbados. O cosmo está revoltado consigo mesmo e precisa ser reconciliado; a própria existência mesmo do cosmo está em jogo. A batalha dos elementos naturais uns contra os outros resulta em catátrofes e ameaça conduzir à um colapso geral do mundo todo. As pessoas são as vítimas deste mundo instável; elas se vêem como prisioneiras de uma natureza desordenada.

Conhecemos a literatura Nova Era dessa época. Está repleta de queixas agudas contra a lamentável existência do homem. Nada pode ser feito contra essa situação. O famoso salmo dos naassenos[486]--um hino pagão—se lamenta:

A alma é como a caça tímida sempre perseguida na terra pela implacável morte a qual prova seu poder incansavelmente na longa caçada. Se hoje ela está no reino da luz, amanhã estará afundada em lamentos. Pai, olhe para baixo e abençoe este ser aflito e alquebrado, quando ela vagueia pela terra, distante do lar, desamparada e enlutada. Ela quer escapar do caos amargo, mas não conhece nenhuma saída.

As pessoas aspiravam pela salvação do mundo, pelo livramento das forças cósmicas que as torturavam. Os cristãos colossenses retrucavam: Nosso Cristo venceu esses poderes, pacificou o cosmo, matou a morte. Ele é o arquiprincípio, o preservador do cosmo, regente e príncipe de suas forças incalculáveis. “Todas as coisas encontram nele sua coerência” (Col 1:17). Ele é o líder, o cabeça desse corpo cósmico.

Essa é, então, a situação em Colossos. Como o autor da Epístola aos Colossenses reage? Para não complicar eu assumirei ser Paulo. O que Paulo faz com esse texto?

Primeiro ele aceita a linguagem mítica e para ele estranha—bem diferente de muitos dos teólogos contemporâneos. Ele procura responder na linguagem dos colossenses, e lida com essa religião popular Nova Era no “hinário” dos colossenses. Ao mesmo tempo, porém, com suas interpretações e alterações, bem como com suas adições no final do hino, ele corrige a essência dessa religião popular. Três exemplos:

Os colossenses cantavam: Cristo é a cabeça do corpo cósmico. Paulo corrige e escreve: Certamente, Cristo é a cabeça do corpo. Mas “o corpo” não é—como vocês pensam—o mundo. O corpo é gente. O corpo são vocês, colossenses. O corpo é a igreja (ele adiciona “tes ekklesias”). Através de vocês, colossenses, Cristo exerce seu governo como cabeça—uma declaração surpreendente diante do pequeno número de cristãos em Colossos: eles eram membros de uma pequena seita, relativamente sem importância no império romano.

Os colossenses cantavam: Cristo reconciliou através de sua ressurreição o cosmo e as foças, as pessoas e os poderes. Paulo adiciona: Certamente ele é o primogênito dentre os mortos e efetuou nossa reconciliação. Ele nos reconciliou por meio de “sua morte em seu corpo de carne” (1:22). Esta é uma declaração impressionante: a afirmação que o primogênito de toda a criação, a imagem do Deus invisível, é exatamente o mesmo que teve uma morte lamentável na cruz num momento específico, num local específico. Ele não é apenas um princípio, um poder cósmico que opera no mundo. Ele é também uma pessoa histórica.

Os colossenses cantavam: O caos no cosmo tem que ser derrotado. Alguma coisa tem que acontecer com este mundo. Paulo responde: Certamente, nosso mundo está doente e precisa ser sarado; porém, a cura não ocorre por meio de poderes cósmicos misteriosos, mas através de pessoas que seguem aquele que morreu na cruz; ou seja, por meio de pessoas reconciliadas e reconciliadoras.

O que é que Paulo faz aqui? Ele aceita o sincretismo dos colossenses e o transforma em um sincretismo teologicamente responsável. Ele socializa esse sincretismo, modificando suas referências à poderes em referências à pessoas. Paulo dá um caráter concreto às abstrações do sincretismo Nova Era: ele trata detalhadamente aquilo que está sob o senhorio de Cristo. A sua lista concreta já deixa claro que os tronos e potestades, os poderes e radiações—as leis da economia e da tecnologia, mas também os raios das estrelas, dos cristais, e tudo o mais—já não podem mais desempenhar o mesmo papel que tradicionalmente desempenhavam em Colossos. O governo desse Senhor sobre todas as coisas inclui nisso as vidas daqueles a quem se dirige a epístola. É por isso que Paulo já não mais pode falar de forma não histórica. Na verdade, ele tem que falar até mesmo de si próprio. O poder de Cristo que penetra na totalidade do mundo não é um poder cósmico misterioso, mas o poder da pregação e da vida do apóstolo que cumpre seu ministério à sombra da cruz. E tal ministério lhe impunha suor e frio, fome e sede, espancamento e ridicularização, conforme ele percorria as estradas do império romano.

O sincretismo teologicamente responsável ancora a Nova Era dos colossenses não em um mito, mas na realidade da cruz. Obviamente Paulo sabe que o Evangelho também significa livramento dos poderes cósmicos. Mas a poesia mítica é substituída pelo evento fatual da cruz.

Um Exemplo Moderno: sincretismo com a cultura do economismo (capitalismo)

O que se segue é baseado no trabalho de uma professora de economia na universidade de Cambridge, que escreveu uma tese de doutorado sob minha orientação sobre o tema: Os economistas podem se converter?[487] Por conversão ela entende não apenas uma experiência religiosa mas também, seguindo Lonergan, um processo cognitivo.

Jane Collier estava desapontada com o fato de que os líderes eclesiásticos que ela observava discutindo economia na televisão sempre argumentavam moralmente em vez de lidarem com os argumentos técnicos dos economistas. Eles utilizavam sua linguagem em termos de moralidade, preferencialmente àquela dos economistas. Nessa situação os argumentos morais são irrelevantes porque a mecânica da economia (conforme os economistas) é uma realidade. Gostemos ou não, o rio Amazonas flui para o mar—nenhum argumento, seja teológico ou moral, pode alterar a lei da natureza que rege seu fluxo. O livre mercado, também, funciona de acordo com leis pré-estabelecidas.

Em vez de ficar argumentando moralmente, Collier enfrenta esse argumento técnico dizendo: a economia não é uma ciência neutra que nos informa sobre o mecanismo da economia—ela se utiliza de preconceitos conscientes e inconscientes e de juízos de valor. Collier denomina tais juízos de valor “a cultura do economismo”; eles correspondem aos tronos e potestades, as forças cósmicas de nosso exemplo bíblico. Collier demonstra que esses juízos de valor funcionam apenas dentro de uma opção de fé secular. Então ela retorna ao seu desapontamento com os líderes eclesiásticos e sugere que em vez de argumentarem moralmente eles deveriam exigir dos economistas honestidade científica. Não se pode esperar que os economistas sejam moralmente corretos, mas pode-se esperar que sejam bons acadêmicos.

Collier segue sua própria receita. Permanecendo estritamente no âmbito da economia, ela demonstra como as decisões dos economistas—e na realidade todas as decisões chamadas científicas—sempre são também determinadas por opções de fé. Ela demonstra convincentemente que a cultura do economismo é um sistema de fé. Manter tal fé, ele adiciona, é um direito dos economistas; sem ela, eles não poderiam funcionar. Só que eles deveriam chamar sua opção de fé pelo nome, ou seja, uma opção de fé e não uma lei pré-estabelecida.

Em seu capítulo sobre conversão Collier demonstra que também existem outras opções de fé para os economistas, ou seja, aquelas opções que não “acreditam” nos tronos e potestades, e que levam em conta que Cristo os destituiu de seus poderes.

Aqui temos um sincretismo teologicamente responsável: os deuses do capitalismo e da cosmovisão da economia não são negados a priori. Ela não afirma: seus mecanismos e poderes não estão na Bíblia, logo eles não existem. Mas ela diz:

1. A economia não é—como vocês afirmam—uma ciência objetiva mas uma opção de fé. E que ela é realmente isso é comprovado pelos próprios instrumentos que os economistas utilizam.

2. Tal cosmovisão estará aberta para um sincretismo teologicamente responsável se vocês enxergarem que esses poderes e mecanismos não existem independentemente, mas pertencem ao mundo criado e portanto podem ser questionados, alterados e rearrumados.

3. Queremos lhes mostrar as conseqüências desse seu sistema. É realmente o melhor sistema? Nós teólogos não estamos qualificados para julgar, mas confiamos que sua integridade acadêmica lhes levará a admitir que vocês não podem provar que essas assim chamadas leis existem “na natureza”; mas que são simplesmente sua fé. Se vocês deixarem de lado essa fé por um momento, vocês poderão alcançar outras noções.

Um sistema que depende da produção de enormes excedentes por um lado e da fome por outro, que depende do estímulo de uma gigantesca indústria bélica, isto certamente não pode ser o melhor sistema que vocês podem desenvolver. Um sistema que força uma pequena menina de doze anos a escrever o seguinte poema não pode ser o melhor que vocês conseguem inventar:

Minha mãe se chama tristeza No verão ela se preocupa com água, no inverno com carvão e durante o ano inteiro com arroz. De dia ela se preocupa com comida, de noite se preocupa com seus filhos e dia após dia só tem tristeza. É por isso que o nome da minha mãe é tristeza e o do meu pai doidice furiosa provocada pela bebedice. E meu nome é lágrimas e infelicidade.[488]

A RAIZ CATÓLICA

Qualquer observador do pentecostalismo verá que ele é particularmente bem sucedido em culturas católicas. Isto tem suas razões. Uma delas é que o pentecostalismo possui não apenas raízes negras orais mas também raízes católicas. À estas raízes o pentecostalismo deve seu arminianismo estrito (a doutrina do livre arbítrio[489]); sua crença em dois mundos, um natural e outro sobrenatural; sua estrutura eclesiástica hierárquica; e sua doutrina de dois (ou as vezes um terceiro) estágios na ordo salutis, sendo o elemento decisivo uma segunda (ou as vezes uma terceira) experiência de crise religiosa depois da salvação. Wesley efetuou a mediação entre esses elementos católicos e o pentecostalismo e o movimento de santificação americano. É por isso que agora passamos para a emergência e alterações da doutrina da perfeição em Wesley e sua recepção no movimento de santificação.

CAPÍTULO DOZE

Raízes Católicas de Wesley

O Perfeicionismo no Metodismo Suíço e Alemão

Ao estudar o movimento pentecostal suíço e alemão fiquei impressionado com a descoberta de que a maioria de suas doutrinas não foram criadas por eles. Eles haviam aceitado-as do movimento de santificação suíço e alemão, e este movimento de santificação tinha por sua vez sido sobremaneira influenciado pelo metodismo. As principais fontes para esta afirmação são os periódicos metodistas do início do século vinte e o Handbuch des Methodismus de Jacoby.1 A essência teológica das publicações metodistas é: Há a necessidade de, e de fato a possibilidade para, perfeição. Isso não exclui erro, ignorância e mil outras fraquezas; isso não exclui “o pecado assim impropriamente chamado, isto é, a transgressão involuntária de uma lei divina, conhecida ou não.” Mas chamar isso de pecado é um equívoco. Jacoby, que exerceu profunda influência na Suíça e na Alemanha como professor de seminário e editor de seus periódicos,[490] defende as definições de Wesley sobre perfeição e pecado.[491] Em Zurique, Ernst Gebhardt, pastor metodista ali de 1874 a 1877, interpretou o pensamento de R. Pearsall Smith falando da necessidade de um batismo no Espírito, com o que ele queria dizer uma experiência de santificação diferente da justificação.[492] Muitos são os testemunhos daqueles que afirmam que a perfeição no sentido de Jacoby e de Gebhardt é uma segunda experiência após a conversão.[493]

Seguindo relatos do reavivamento galês, as expectativas de experiências do batismo do Espírito se tornaram mais intensas. Evan Roberts, líder proeminente no reavivamento galês, foi saudado como um pregador local dos “Metodistas Livres.”[494] Até mesmo alguns dos traços mais entusiastas do reavivamento não perturbaram os suíços e os alemães. As primeiras irrupções de pentecostalismo foram portanto acolhidas com alegria.[495] O falar em línguas não foi criticado no reavivamento de Barratt na Noruega; na realidade, Barratt foi apresentado como “o líder de nossa missão urbana em Christiana [Oslo], um homem bem conhecido por nós por causa da Conferência Européia Metodista em Zurique quatro anos atrás. Ele é um homem sóbrio.”[496] Os relatos passaram a ser mais cautelosos somente após as irrupções extáticas em Kassel.[497] Falou-se que Barratt deixara a Conferência Noruega Metodista “porque tinha outros compromissos prementes.”[498]

De acordo com a ordem de sua igreja, quando de sua ordenação os pastores metodistas tinham que responder afirmativamente à seguinte questão: “Você espera se tornar perfeito em amor durante sua vida?”[499] Quando os pentecostais tumultuaram algumas das igrejas metodistas na Suíça os metodistas escreveram: “O que gera a base para o pentecostalismo não é uma compreensão errônea da doutrina da santificação mas um ideal equivocado da igreja com seu falso subjetivismo,”[500] e “há uma perfeição cristã alcançável nesta vida.”[501]

Um estudo intensivo da literatura metodista da épica da emergência do pentecostalismo na Alemanha e na Suíça me desafiou a descobrir o que Wesley tinha a dizer sobre isso. Os metodistas estavam de fato sendo fiéis a Wesley ou o tinham compreendido de forma equivocada?

Doutrina da Perfeição de Wesley

A doutrina da santificação de Wesley antes de sua conversão fora influenciada substancialmente pelo monge católico Lourenço Scopuli (1530-1610);[502] pelo teólogo escocês Henrique Scougal (nascido em 1650);[503] por Tomás Kêmpis;[504] pelo bispo Jeremias Taylor (1613-67), fellow do All Souls College e suspeito de ser cripto-católico por causa de sua comunhão íntima com Franz Santa Clara;[505] pelo instrutor de perfeição William Law (1686-1761), homem profundamente influenciado por Jakob Boehme;[506] pelo católico espanhol Gregório Lopez (1542-96), que viveu a maior parte de sua vida como eremita no México;[507] pelo nobre católico francês Jean-Baptiste de Renty (1611-1649);[508] e por outros.[509]

Porém, para nosso objetivo a doutrina da perfeição de Wesley depois de sua conversão é mais importante. Vou introduzi-la fornecendo um resumo cronológico da doutrina da perfeição de Wesley após sua conversão.

Em agosto de 1738 Wesley copiou a definição de “plena certeza de fé” de um morávio sueco, Arbid Gradin, em latim e em inglês em seu diário.[510] À esta definição pertence a frase “livramento de todo desejo carnal, e a cessação de todos os pecados, mesmo os interiores,” que mais tarde ele aceita em seu “Plain Account . . .”

Ca. 1738: O caráter do metodista: O metodista

Portanto está feliz com Deus; sim, sempre feliz . . . O perfeito amor que agora existe elimina todo temor, ele se regozija ainda mais . . . Ele “ama ao seu próximo como a si mesmo”; ele ama todo homem como sua própria alma . . . Pois ele é “puro de coração.” O amor purificou seu coração da inveja, malícia, ira e de todo temperamento impróprio. O amor o limpou do orgulho, de onde “provém apenas disputa”; . . . Não há nenhum movimento em seu coração senão segundo sua [de Deus] vontade. Todo pensamento que surge aponta para ele [Deus], e é “obediência à lei de Cristo” . . . e apresenta em todos os pontos “uma consciência livre de ofensa para com Deus e para com os homens.” Tudo o que Deus proibiu ele evita; tudo o que Deus permitiu ele desfruta. (WW XI, 371s.)

Wesley diz explicitamente que já apresentara essa doutrina em 1725 e mais claramente em 1730 quando se tornara “homo unius libri.” Desde aquela época, assim diz ele, não adicionara nada. (WW XI, 373.)

Em 1730 ele publicou um sermão sobre a Perfeição Cristã (WW XI, 374-8) que demonstrava que perfeição não significava estar isento de erro.

1741, Prefácio ao Segundo Hinário (WW XI, 378-82). Aqui Wesley imprime algumas fórmulas extremas mas adiciona notas de rodapé nas quais corrige algumas das mais ousadas, especialmente aquela sobre “santa indiferença” que aceitara de Renty.[511] Alguém que recebeu apenas a remissão dos pecados é não obstante filho de Deus. A purificação do coração vem posteriormente. Ele não conhece ninguém que tenha recebido em um único momento a remissão dos pecados, o testemunho permanente do Espírito, um coração novo, limpo (WW XI, 380).

1742, Prefácio ao Terceiro Hinário (WW XI, 383-87). Isto é muito mais uma coleção de passagens das Escrituras.

1744 (25 de junho): Primeira Conferência para Pregadores (WW XI, 387). A perfeição significa a derrota de todos os pecados interiores.

1745 (1º de agosto): Segunda Conferência para Pregadores (WW XI, 387): A maioria dos crentes será santificada apenas pouco antes da morte.

1747 (16 de junho): Quarta Conferência para Pregadores (WW XI, 388-91): Aqui Wesley demonstra a partir das Escrituras que apenas alguns poucos dos recipientes das cartas paulinas, e o próprio Paulo, tinham sido completamente santificados. Mas ele prossegue para defender a doutrina da perfeição pois de outra forma as orações em João 17:20-23,[512] Efésios 3:14 e I Tessalonicenses 5:23 seriam “simples zombaria de Deus.”

1759, Reflexões sobre a Perfeição Cristã (WW XI, 394-407). Isto é um resumo de tudo o que Wesley dissera até então sobre a perfeição.

1763, Reflexões Complementares sobre a Perfeição Cristã (WW XI, 414-41). Neste ensaio ele examina se os entusiastas de um reavivamento em Londres em 1762 tinham sido plenamente santificados ou não. Ele argumenta que poucos deles tinham recebido a perfeição; muitos não alcançaram alegria, amabilidade, bondade, fidelidade, humildade ou temperança.

1777, Um Relato Completo da Perfeição Cristã segundo crido e ensinado pelo Rev. Sr. John Wesley do ano 1725 ao ano 1777 (WW XI, 366-446): Este livreto contém todos os escritos e minutas acima mencionados e resume a doutrina de Wesley em dez pontos (WW XI, 441s.):

1) A perfeição existe; pois é mencionada vez após outra na Escritura.

2) Ela não é tão primeira quanto a justificação; pois as pessoas justificadas devem “caminhar para a perfeição” (Hebreus 6:1).

3) Ela não é tão última quanto a morte; pois São Paulo fala de pessoas vivas que eram perfeitas (Filipenses 3:15).

4) Ela não é absoluta. A perfeição absoluta não pertence ao homem, nem aos anjos, mas a Deus somente.

5) Ela não torna o homem infalível. Ninguém é infalível, porquanto permanece no corpo.

6) Ela é sem pecado? Não é proveitoso brigar por causa de um termo. Ela é “salvação do pecado.”

7) Ela é “amor perfeito” (I João 4:18). Essa é a essência dela; suas propriedades, ou frutos inseparáveis, são, crescente regozijo, oração sem cessar e ações de graças em tudo (I Tessalonicenses 5:16 etc.).

8) Ela não é provável. Ela está tão distante de estar estabelecida em um ponto indivisível, de ser incapaz de aumentar, que alguém perfeito em amor pode crescer em graça muito mais rápido do que antes.

9) Ela é perdível, pode ser perdida; do que temos numerosos exemplos. Mas não estávamos totalmente convencidos disso até cinco ou seis anos atrás.

10) Ela é permanentemente tanto seguida quanto precedida por um esforço gradual.

Esta doutrina de Wesley foi severamente criticada por Zinzendorf,[513] por Böhler,[514] e sobretudo por Paul Fleisch, teólogo alemão luterano e especialista nos movimentos pentecostal e de santidade alemães. “Em Wesley a justificação se torna simplesmente uma pré-condição para a santificação.”[515]

A crítica de Fleisch é correta? Sua avaliação tem duas falhas metodológicas primárias: (1) Ele trabalha inteiramente fundamentado no “Plain Account” e desconsidera outros escritos de Wesley—talvez não estivessem disponíveis para ele. Quando realizei minha pesquisa em Zurique, a biblioteca da universidade não possuía as obras de Wesley—tal era o espírito ecumênico da Universidade de Zurique naquela época. Eu tive que ir até a sede do bispo metodista onde encontrei uma biblioteca teológica surpreendente e extremamente completa, não apenas sobre metodismo. (2) Ele trabalhou baseado em uma tradução alemã deficiente.

O Wesley “Católico” e o Wesley “Metodista”

O Wesley “católico”

Qualquer pessoa que conheça a literatura católica daquela época reconhecerá uma inclinação católica nesses escritos, o que não é surpreendente uma vez que Wesley foi—como já vimos—fortemente influenciado por autores católicos, e traduziu alguns de seus livros para seus pregadores leigos. Walter Klaiber, o atual bispo dos metodistas na Alemanha, procura interpretar Wesley em um sentido luterano; e sem dúvida é bem sucedido em muitas passagens. Mas mesmo ele tem que aceitar que na diferença crucial entre os reformadores e os católicos, ou seja, na doutrina da predestinação, Wesley estava no mínimo inseguro. Em seu sermão sobre a “graça livre” ele atacou violentamente a doutrina da predestinação.[516] Seu adversário, George Whitefield (também metodista), diz portanto: Quando Wesley fala de “graça livre” ele quer dizer na verdade “livre arbítrio.”[517] Esta é a alternativa decisiva: Livre arbítrio ou predestinação? Se essa questão fosse apresentada dessa maneira, sem dúvida não apenas a maioria dos metodistas mas o próprio Wesley optariam pelo “livre arbítrio” contra a predestinação—ou seja, pela opção católica.[518]

Porém, levando em consideração os outros escritos de Wesley, não apenas o “Plain Account,” encontramos outro lado do fundador do metodismo.

O Wesley “metodista”

Em outros escritos de Wesley também encontramos passagens que correspondem ao “Plain Account.”[519] Mas há outras. O exemplo mais impressionante é a famosa anotação em seu diário de 24 de janeiro de 1738—que é antes de sua conversão. Ela revela sem dúvida uma compreensão de pecado diferente daquela no “Plain Account.”

Fui para a América para converter os índios; mas ò!, que me converterá? Quem, quem é aquele que me livrará deste mau coração de descrença? . . . Eu penso, de verdade, que se o evangelho é verdadeiro, estou salvo: pois não apenas distribui, mas distribuo, todos os meus bens aos pobres; não apenas ofereci meu corpo para ser queimado, afogado ou seja lá o que for que Deus tem reservado para mim; mas persigo a caridade, (embora não como penso que deveria, mas como posso) se por acaso puder alcançá-la (WW I, 74).

Eu que fui para a América para converter os outros, nunca fora convertido a Deus. [Nota ao pé da página: “Não estou certo disso.”] (WW I, 75) Eles são preparados em filosofia? Eu era. Em línguas clássicas e modernas? Eu também era. Eles estudaram ciência e religião? Eu estudei isso por muitos anos. Eles podem falar fluentemente sobre coisas espirituais? Igualmente eu também posso. Eles são generosos em esmolas? Espera aí, eu distribui todos os meus bens para alimentar os pobres. Eles dão tanto do seu trabalho como de sua própria substância? Eu tenho trabalhado mais abundantemente do que todos eles. Eles estão dispostos a sofrer por seus irmãos? Eu abandonei amigos, reputação, bem-estar, pátria; tenho arriscado minha vida, viajando em terras estrangeiras; tenho entregue meu corpo para ser devorado pelo rigor, tostado pelo calor, consumido pelo trabalho árduo e pelo cansaço, ou por qualquer outra coisa que agrade a Deus lançar sobre mim. (WW I, 76).[520]

Mas tudo isso (seja mais ou menos, não faz diferença) me torna mais aceitável a Deus? Tudo o que fiz ou posso saber, falar, dar, fazer ou sofrer me justifica diante de sua presença? Sim, ou o uso constante de todos os meios de graça? (Os quais, não obstante, é a satisfação correta de nosso dever sagrado.)[521] Ou que saiba nada de mim mesmo; que eu seja, com respeito a minha aparência, sem culpa e de moral íntegra? Ou (para se aproximar ainda mais) por ter a convicção racional de todas as verdades do cristianismo? Tudo isso me dá o direito de dizer que tenho o caráter divino, celestial, santo de um cristão? De jeito nenhum. Se os oráculos de Deus são verdadeiros, se ainda temos que viver de acordo com “a lei e o testemunho;” todas essas coisas, embora quando dignificadas pela fé em Cristo sejam santas e justas e boas, porém sem isso são “estrume e refugo” realizadas apenas para serem devoradas pelo “fogo que nunca se consome”.

Isto, então, tenho aprendido nos confins da terra—que eu “não alcanço a glória de Deus:” Que o meu coração inteiro é “totalmente corrupto e abominável;” e, consequentemente, minha vida toda; (tendo em vista que não pode ser que uma “árvore má produza bons frutos:”). Que “afastado como estou da vida de Deus”, eu sou “filho da ira”, [Nota no rodapé da página: “Não creio nisso.”] e herdeiro do inferno: que minhas próprias obras, meus próprios sofrimentos, minha própria retidão, estão tão distante de me reconciliarem com um Deus ofendido, tão distante de proporcionarem qualquer expiação para o menor daqueles pecados, que “são mais numerosos do que os cabelos da minha cabeça,” que os mais razoáveis deles precisam eles mesmos de expiação, ou não poderão subsistir ao seu juízo íntegro; que “tendo a sentença da morte” em meu coração, e que não tendo nada em ou de mim mesmo para me defender, não tenho nenhuma esperança, a não ser a de ser justificado graciosamente, “pela redenção que está em Jesus” . . . (WW XI, 76-77).

Wesley sabia, tanto antes como depois de sua conversão, que o pecado é a condição humana, independentemente do que alguém faça ou deixe de fazer. Mas paralelamente à esta compreensão de pecado ele também defendia uma compreensão de pecado como uma obra concreta, uma violação consciente e voluntária de uma lei conhecida de Deus. Sua doutrina da perfeição de fato só é possível com esta segunda compreensão de pecado. Portanto Wesley esteve sempre oscilando entre as duas compreensões de pecado.

Em seu livro Checks to Antinomianism (1771-75), o assistente suíço de Wesley, John William Fletcher (também chamado o “santo do metodismo”) defendeu a doutrina da perfeição.[522] Ele foi o primeiro a escrever em inglês utilizando o termo “batismo do Espírito” para a experiência de perfeição ou santificação.[523]

Avaliação

É difícil alinhar a compreensão de pecado de Wesley com a de Paulo. Apesar disso Wesley em sua época fez mais para a aceitação de Paulo do que muitos que o citavam correta mas não compreensivelmente. Por que não deveríamos interpretar Wesley em seu contexto histórico como fazemos com qualquer texto histórico? Poderíamos então considerar o fato de que Wesley teve que lidar com uma sociedade e uma igreja de indiferença ética (clérigos bêbados, pessoas que estavam na prisão porque não podiam pagar seus impostos eclesiásticos), de misticismo e pragmatismo. Apesar de sua compreensão de pecado e perfeição, que provavelmente é diferente da de Paulo, talvez Wesley estivesse mais perto de Paulo do que seus antagonistas. Estes citavam Paulo regularmente, mas não parecem ter compreendido a profundidade de Paulo. Talvez Wesley proclamasse o Evangelho melhor—pois mais compreensivelmente—do que eles. Sua oferta de perdão e sua demanda por perfeição era social e individualmente concreta. Seu apelo ao arrependimento tinha conseqüências claras e experimentáveis. O preço disso era abandonar o conceito simul iustus et peccator (somos sempre pecadores e justificados) dos Reformadores, bem como sua doutrina da predestinação. Esses conceitos são, em todo caso, um enigma para a maioria das pessoas. Para verificar isso é necessário somente consultar o artigo sobre Lutero no Oxford Dictionary of the Christian Church,[524] que fala mais sobre as igrejas inglesas do que sobre Lutero. A compreensão de graça incondicional ensinada na Reforma provavelmente para muita gente é uma mera teoria, ou alternativamente um fardo pesado, pois ela identifica as pessoas como pecadores para o resto de suas vidas. Talvez a compreensão dialética de graça e pecado em Paulo tenha que ser simplificada e logicamente organizada para a maioria das pessoas.

Foi isso que a tradição que fluiu do Wesley católico para o movimento de santidade americano fez, com todas as suas conseqüências práticas positivas e negativas. A vantagem de tal abordagem tem sido um cristianismo ativo social e individualmente. A desvantagem, talvez, tem sido a tendência para esquecer que uma boa consciência não é necessariamente prova de perfeição. Blaise Pascal, o grande matemático e teólogo francês que também tinha experimentado um “batismo do Espírito,” disse de forma marcante: “Ninguém nunca pratica o mal de forma tão completa e tão feliz como quando assim o faz com uma clara consciência.”[525]

CAPÍTULO TREZE

Pentecostais e Católicos

Antes de continuar a estória “do movimento de santidade americano para o pentecostalismo,” quero fazer uma pausa e dar uma olhada na Igreja Católica Romana; pois, se o pentecostalismo tem uma de suas raízes na espiritualidade católica, e se “há maiores relações entre católicos e pentecostais do que entre o catolicismo e as igrejas protestantes,”[526] é de se esperar que hajam algumas repercussões do pentecostalismo no campo católico. Esse é o caso pelo menos em duas direções; a saber, no crescimento de um movimento de renovação católico ou católico pentecostal, e em diversos importantes diálogos entre o Vaticano e o pentecostalismo.

Um Movimento Católico Pentecostal

Já em 1962 havia alguns poucos contatos entre católicos e pentecostais na Holanda[527] e nos Estados Unidos. Alguns padres tinham participado em reuniões da Associação Internacional dos Homens de Negócio do Evangelho Pleno (uma organização laica dentro do pentecostalismo clássico)[528] e assim experimentaram e aceitaram a espiritualidade pentecostal.[529] Mas o irromper veio somente em 1966-67, quando

Diversos leigos católicos, todos membros do corpo docente da Universidade Duquesne em Pittsburgh se retiraram conjuntamente para um período de profunda oração e discussão sobre a vitalidade de sua fé . . . Não satisfeitos com uma vida acadêmica de torre de marfim, ele se preocupavam com os problemas da renovação da Igreja . . . Em anos recentes eles têm estado envolvidos com os movimentos ecumênico e litúrgico, com os direitos civis e com as preocupações com a paz mundial.[530]

Kevin e Dorothy Ranaghan, ambos professores universitários de teologia, se destacaram nesse grupo de intelectuais católicos. No final de 1966 eles leram a estória do evangelista pentecostal David Wilkerson,[531] que descobrira que a oração e os dons do Espírito eram os meios mais eficazes para combater o vício das drogas entre os jovens. Depois leram um relatório sobre o neopentecostalismo dentro das igrejas protestantes,[532] e ficaram curiosos para saber mais sobre esse movimento carismático. Através da mediação do pároco anglicano William Lewis eles entraram em contato com um grupo de oração carismático. Logo receberam o Dom de falar em línguas. De Duquesne o movimento se espalhou para a Universidade Notre Dame e por todos os Estados Unidos. Hoje o movimento carismático é um dos setores mais fortes na Igreja Católica Romana, tendo se espalhado para igrejas católicas por todo o mundo. Também há relatos de desenvolvimento semelhante nas igrejas ortodoxas orientais.[533]

Em adição à vasta literatura jornalística, há algumas publicações acadêmicas sobre o movimento carismático católico. Para uma compreensão crítica são indispensáveis os ensaios do ex-assistente de pesquisa teológica de Dom Helder Câmara, Abdalaziz de Moura; do professor de teologia dominicano François-H. Lepargneur;[534] do dominicano britânico Simon Tugwell; do teólogo J. Massyngberde Ford; e sobretudo do beneditino americano Kilian McDonnell, que examinou por completo o reavivamento e suas raízes. McDonnell, Moura e Lepargneur—diferentemente de Ranaghan e O’Connor—não pertencem no sentido mais estrito ao católicos pentecostais. Portanto sua abordagem crítica mas simpática e seus relatos exatos são particularmente importantes.

Relação entre Católicos e Pentecostais

Conforme o movimento de renovação carismática crescia, católicos pentecostais e pentecostais clássicos começaram a se reunir para oração regularmente em muitas cidades. As publicações oficiais dos pentecostais clássicos não estavam seguras sobre como interpretar esse novo fenômeno. Isso é compreensível, uma vez que entre os pentecostais até recentemente a Igreja Católica era vista como a precursora da “grande prostituta,” “conduzindo à super-igreja uniforme, mundana e anti-cristã, que está predita na Revelação de João.”[535] Por outro lado os católicos no passado escreveram sobre os pentecostais principalmente polêmicas baseadas na ignorância.[536]

Tudo isso está mudando rapidamente, embora não na mesma velocidade em todos os lugares. As igrejas pentecostais clássicas e os católicos tradicionais especialistas em seitas não conseguem acompanhar a situação em mudança. Um leitor de Maryland escreveu, por exemplo, ao Pentecostal Evangel, querendo saber como os católicos podem receber o Espírito e “ainda praticar a confissão e manter seus ídolos? . . . Alguns de nosso povo estão indo à reuniões de oração católicas e isso me perturba. Como cristãos precisamos de sabedoria para discernir os espíritos nestes últimos dias.”[537]

Os pentecostais clássicos ficaram “escandalizados” com o fato de que os católicos pentecostais fumavam e bebiam e ainda assim diziam terem recebido o batismo do Espírito Santo. Vinson Synan, da Pentecostal Holiness Church, diz que os pentecostais clássicos terão que fazer “uma reavaliação dolorosa” do que exatamente é ser pentecostal, à luz da renovação católica.[538] Não obstante, é preciso concordar com Mackay, que “antevê uma aproximação mais cordial entre católicos e pentecostais do que entre os seguidores das denominações tradicionais.” O teólogo presbiteriano Rodman Williams indica corretamente que o significado das negociações oficiais entre pentecostais e católicos no nível mais alto do Vaticano “dificilmente poderá ser super enfatizado.”[539]

Sinais de uma mudança têm estado aparente por algum tempo, por exemplo nas publicações dos pentecostais franceses.[540] A atual polêmica dos especialistas em seitas católicos alemães e italianos contra o pentecostalismo, e as correspondentes condenações da Igreja Católica por parte dos pentecostais, logo serão obsoletas.

É claro que ainda permanecem reminiscências de polêmicas passadas, como por exemplo quando o mais importante periódico pentecostal norte-americano publicou que o Concílio Vaticano Segundo tinha “produzido muito pouco digno de nota.”[541] Por outro lado, em publicações católicas mais recentes tem havido uma abertura surpreendente para com o movimento pentecostal clássico;[542] algumas vezes até mesmo uma franca admiração. Católicos e pentecostais têm um problema em comum: Em uma época na qual todas as autoridades estão declinando, a autoridade do clero também declina. O mundo moderno não pergunta mais pela compreensão católica ou pentecostal de Deus mas: Deus está vivo? Caso positivo, o que ele pode fazer para mim? Há qualquer sentido em orar e confiar nesse Deus? Tudo o que a igreja faz não é apenas um empreendimento vasto e inútil que gasta o dinheiro do povo, ou na melhor das hipóteses uma “ilusão necessária”? A resposta que o pentecostal fornece à todas essas questões é aquela do cego de nascença: “Se ele é pecador ou não eu não sei; mas uma coisa sei: eu era cego e agora vejo”(João 9:25).

O dominicano Tugwell comenta o seguinte sobre isso: “As pessoas estão insatisfeitas com a religião que não faz nada além de pregar e moralizar; elas querem a religião em sua essência.”[543] Em sua análise de “A ideologia da conversão pentecostal,” o beneditino Kilian McDonnell diz de forma correta que no movimento pentecostal o problema do “crente descrente” não se resolve remetendo-o ao “domínio” das afirmações teológicas abstratas no qual ele está irremediavelmente perdido. Ele não é capaz nem de negar nem de aceitar as afirmações sobre esse Deus “dos teólogos”. Mas—segundo McDonnell—na liturgia pentecostal ele pode experimentar a capacidade de orar novamente.[544]

Não há necessidade de salientar que a prova pentecostal de Deus não é suficiente, e em certa situações levará até mesmo à abolição da fé Qua fé.[545] Até certo ponto os próprios pentecostais têm essa percepção (capítulo 18, pp. 229-33). Apesar disso, a questão permanece: Como a fé experimenta a presença real de Cristo? Vale a pena os protestantes e católicos meditarem nessa questão.

Características teológicas

Pode-se detectar no catolicismo pentecostal uma tendência para aceitar dos pentecostais clássicos sua experiência mas sem sua articulação doutrinária. Por exemplo, o fundamentalismo é rejeitado como sendo oposto aos carismas. “No passado era bastante freqüente que os cristãos que experimentavam o batismo no Espírito Santo adotassem não apenas o ambiente cultural do pentecostalismo denominacional mas também as categorias do meio fundamentalista.”[546] Mas para Ranaghan, se a experiência pentecostal é para toda a igreja e não apenas para uma seita em particular, parece ser necessária a interpretação da dimensão carismática a partir de diferentes pontos de vista, incluindo aquele da exegese crítica.[547]

Podemos concluir disso que os carismas não são sobrenaturais. Já o teólogo protestante Arnold Bittlinger tem provado que não existe critério pelo qual pode-se distinguir entre línguas estrangeiras genuínas e o falar em línguas. “Falar em línguas,” diz ele, “dve ser considerado como um fenômeno natural, exatamente como sonhar, rir ou chorar.”[548] Portanto o “sobrenatural” pode ser visto dentro de uma antiga tradição católica como “sendo precisamente a realização de nossa natureza.”[549] Utilizando categorias funcionais (e não ontológicas), McDonnell afirma picantemente: “Um dom não é um o que mas um como. Um Dom é menos uma nova capacidade e mais o uso de uma antiga capacidade como uma função do reino de Cristo. Atividades bastante seculares podem ser dons do Espírito se elas são usadas como funções do reino.”[550] Josephine Massyngberde Ford pergunta diretamente se o Messias de Handel, as paixões de Bach e os livros de São Tomás de Aquino são devidos à inspiração direta ou à carismas humanos. A resposta dela: “Uma excelente combinação de ambos.”[551]

Um dos mais articulados dentre esses teólogos católicos carismáticos é o dominicano Simon Tugwell, de Oxford. Ele tem apresentado diversas meditações no rádio britânico, uma delas incluindo um segmento gravado de cânticos em línguas por três freiras católicas, o que provocou várias centenas de cartas de agradecimento à BBC [Companhia de Radiodifusão Britânica]. Tal meditação foi preparada com muita oração e reflexão no estúdio (para o desespero dos técnicos que não apreciaram essa “perda” de valioso tempo de estúdio e instalações técnicas “só para meditação”). A meditação mesma foi então transmitida ao vivo.

Tugwell tem defendido em diversas publicações o uso do falar em línguas, que parece para ele “significar a produção de fenômenos genuinamente linguísticos, que podem ou não ser identificados por alguém presente como alguma língua definida, mas que não carrega nenhum significado semântico ordinário para a própria pessoa que fala.”[552] Não é simplesmente “oração no Espírito,” nem a “pré-escola de Deus.” “A oração que nós mesmos não conseguimos compreender totalmente é uma parte essencial da oração cristã: Falar em línguas é uma expressão particularmente direta desse princípio.” Mas também é—de um ponto de vista fenomenológico—ambíguo. Isto se aplica—diz Tugwell—à todas as atividades pneumáticas. Ele conclui que o Novo Testamento não coloca pressão sobre ninguém para buscar o dom de línguas, mas encoraja aqueles que o recebem à usá-lo para desenvolverem uma experiência mais rica e mais plena da vida cristã como um todo. Assim Tugwell sugere que esse dom tem uma parte na totalidade da vida cristã. “Isso não nos compromete de forma alguma a aceitar a compreensão pentecostal do dom de línguas, nem ao seu tipo de religião.”[553]

Tugwell prossegue para afirmar que “a doutrina pentecostal é insustentável tanto escriturística como teologicamente,” e isso é “motivo de alarme” para o teólogo. Contudo ele mantém que “o pentecostalismo representa um desejo genuíno pela mensagem original, pura do Evangelho que ‘não é palavras persuasivas de sabedoria, mas demonstração do Espírito e poder’ (I Cor. 2:4), isto também provoca uma demanda legítima no interesse e simpatia do teólogo.” Ele rejeita a noção de que o batismo no Espírito adiciona qualquer coisa a mais à fé cristã. “Adicionar qualquer coisa ao cristianismo fundamental é na verdade subtrair algo ao Evangelho.”[554]

Tugwell utiliza categorias do misticismo medieval para interpretar as suas experiências espirituais e a de seus companheiros católicos. O misticismo, diz ele, “não é intrinsecamente cristão, mas pode ser tornado cristão.” Ele diferencia entre oráculos e profecia, entre ídolos e ícones. “Um ídolo é um deus, ou uma manifestação de deus, ou uma experiência de deus, ou uma doutrina de deus, que alguém ‘fez uma coisa em si.’” Mas “Cristo é maior do que seu meio de comunicação.” Profecia e ícone “desnuda-nos diante de Deus, retirando nossas máscaras e enganações, nossos falsos eus,” ao passo que aqueles utilizando oráculos e ídolos sempre procuram Ter poder sobre Deus, demonstrando assim o quão certos eles são.[555]

É claro que Tugwell sabe que definições e nomes (também um tipo de ídolo) as vezes são necessários para nossa sanidade, mas eles nunca capturam Deus adequadamente. Apenas “quando tivermos vencido” (Apoc. 2:17) alcançaremos nossa identidade plena, e somente então a realidade da experiência de Deus se adequará à sua definição. É por isso que Tugwell não vê nenhuma diferença fenomenológica entre misticismo cristão e não-cristão, entre oráculo e profecia, entre ídolo e ícone. A diferença não se encontra no nível da fenomenologia, mas no do significado. Olhando do lado de fora, ambos esses misticismos parecem exatamente da mesma maneira. Somente pela função das experiências místicas, quando elas criam espaço para liberdade, eles se tornam cristãos. Diante disso, Tugwell conclui que em uma comunidade carismática tem que haver liberdade para quem quiser falar em línguas e oferecer orações extemporâneas, e também para quem quiser se abster de tais tipos de espiritualidade sem se sentir desprestigiado. Como entre alguns protestantes neopentecostais alemães, os católicos pentecostais semelhantemente percebem no trabalho comunitário, no jornalismo, e na administração,[556] mesmo na música, na poesia e na teologia,[557] carismas do Espírito Santo, aproximando-se da compreensão que o pentecostalismo negro tem de carisma.[558]

A bem da verdade deve ser dito que Tugwell é visto com suspeita por muitos católicos pentecostais, particularmente na Inglaterra. Eles o percebem muito mais como um de seus críticos sinceros do que como um “católico pentecostal.” O próprio Tugwell não deseja ser classificado nessa categoria. Por outro lado, ele não é o único apreensivo quanto ao termo e conceito do “batismo do Espírito.” Não é surpresa então que o falar em línguas não seja reconhecido por O’Connor como o “sinal inicial,” i.e., como o sinal primeiro e compulsório do batismo do Espírito.[559] Mas isso não impede que os católicos pentecostais percebam o valor espiritual e psíquico-terapêutico da glossolalia. É rejeitada a avaliação corriqueira de que o falar em línguas seja uma patologia.[560]

Se reconhece que o termo “batismo do Espírito” foi cunhado pelos pentecostais clássicos, os quais muito dificilmente possuem uma teologia do sacramento;[561] mas as raízes católicas da espiritualidade pentecostal não foram reconhecidas em lugar algum—até onde posso afirmar. Uma teologia católica dos carismas deve falar da renovação[562] do Espírito recebida no batismo em vez da iniciação na vida do Espírito no batismo do Espírito.[563] Embora Kilian McDonnell saiba que entre os pais da igreja houve alguns que ensinavam “dois estágios” de salvação similarmente ao ensino nas igrejas pentecostais clássicas, ele defende que para Paulo “tornar-se cristão e receber o Espírito ocorrem juntos.”[564]

Os teólogos do movimento católico pentecostal têm enfatizado que a espiritualidade pentecostal não impede a espiritualidade mariológica, pelo contrária, promove-a.[565] No prefácio de seu livro sobre o Espírito, Tugwell incluiu uma oração para e com Maria.[566] Os católicos corretamente têm percebido que os pentecostais não são—ao contrário de sua auto-interpretação—tipicamente protestantes.

Sobre a ética dos católicos pentecostais, no início ninguém poderia encontrar nenhuma tendência rigorista. No início também foram mantidos vivos os aspectos políticos de uma espiritualidade cristã. “Parece ser decisivo,” diz um observador jesuíta, “que pessoas que no passado não podiam ver um negro sem ficar furioso, agora podem abraçá-lo.”[567]

Significado Ecumênico dos Católicos Pentecostais

As reuniões de oração dos católicos pentecostais despedaçaram a teoria da “privação econômica”—teoria que normalmente era apresentada como uma “explicação” do pentecostalismo clássico, mais antigo. Participavam dessas reuniões não os ignorantes mas os intelectuais, não os acríticos mas os exegetas críticos, não puritanos frustrados mas cristãos bastante normais. Havia não apenas o falar em línguas mas dicussão crítica de problemas teológicos e sociais; não apenas o entoar de hinos mas a composição dos mesmos; não apenas oração, mas comida, bebida e cigarro. Era possível rir e chorar, bater palmas—e também sair da sala quando não se gostasse desse estilo.[568] O jesuíta Sudbrack[569] portanto vê a espiritualidade pentecostal em relação com a Festa dos foliões de Harvey Cox. Tópicos políticos e sociais não estavam excluídos dessas reuniões:

Qualquer movimento genuíno do Espírito Santo não se deterá no restabelecimento da unidade na família ou na pequena comunidade ou na paróquia. Ele tem que se mover inexoravelmente em direção a criação de liberdade e justiça na cmunidade mais ampla da nação e entre as nações. Muitos dos participantes [da Conferência na {universidade} Columbia, de 19 a 23 de fevereiro de 1973] tinham trabalhado engajados em atividades de ação social.[570]

Harold F. Cohen vai mais além ao afirmar: “pode-se encontrar um paralelo interessante entre a renovação carismática e as declarações dos documentos de Medellín.”[571] A revista da Associação Internacional dos Homens de Negócio do Evangelho Pleno relata que o bispo mexicano Sérgio Mendez Arceo teria dito: “Apenas o socialismo pode capacitar a América Latina a alcançar o verdadeiro desenvolvimento.”[572] “A reunião de oração não é um fim em si mesma, mas seu objetivo é construir uma comunidade de cristãos madura.”[573] Desde o outono de 1971 têm sido realizados experimentos em “comunidades”[574] que talvez possam superar não apenas as divisões ecumênicas mas também as políticas e sociais.

Tem havido espaço até mesmo para o palavreado revolucionário exacerbado, o que inclui uma condenação do “livre comércio,” as questões revolucionárias do Terceiro Mundo, a necessidade de uma “esporada de marxismo,” e a inevitável interligação da economia com a espiritualidade.[575] Existem obviamente vozes importantes, mas elas não representam os sentimentos gerais dos católicos pentecostais “de carteirinha.”

O movimento católico pentecostal tem desenvolvido seu próprio empuxe ecumênico—um enigma tanto para os evangélicos como para os pentecostais clássicos. É verdade que isso só foi possível depois do Concílio Vaticano Segundo, mas os católicos pentecostais têm traduzido seus documentos em experiência ao nível local, onde oikoumene não é apenas discutido mas vivido. É compreensível que na alegria da descoberta ecumênica, as diferenças teológicas entre as diferentes igrejas católica e protestantes não tenham sido levadas suficientemente a sério, como critica Gelpi.[576]

Os católicos aceitam o fato de que esse reavivamento tem suas raízes fora da igreja católica. Embora O’Connor não deixe qualquer dúvida quanto a sua ortodoxia católica, ele responde da seguinte forma a questão de se é concebível que o Espírito Santo esteja mais em ação nas igrejas pentecostais clássicas do que na igreja que geralmente tem sido aceita como sendo a igreja mais autêntica: “Esta pode ser a maneira de Deus demonstrar aos membros da Igreja que Ele apenas é o Senhor soberano, e que todas as instituições e hierarquias na terra, mesmo na Igreja, não nada além de instrumentos e ministros . . . Não é preciso que se nos demonstre que a ação de Deus transcende a ação da Igreja.”[577]

Em contraste com a marginalização protestante do reavivamento pentecostal quase cem anos atrás, e às desqualificações ocasionais do movimento de renovação dentro das igrejas protestantes no presente, a Conferência Episcopal da Igreja Católica nos Estados Unidos tem tido relações bastante amistosas com o catolicismo pentecostal. Os bispos afirmam: O movimento possui razões teologicamente legítimas para sua existência, e repousa sobre uma base bíblica sólida. Existe abusos aqui e acolá, mas o movimento como um todo não deve ser impedido. “Padres prudentes” devem acompanhar os grupos e ajudá-los a manter o ímpeto que receberam das igrejas pentecostais clássicas, sem aceitar seus erros. Compreensivelmente um observador critica zombeteiramente os bispos por preferirem os “carismáticos domesticados” aos Berrigans revolucionários.[578] Mas esse pode ser um juízo míope.

Uma coisa é certa: a igreja católica (pelo menos na América Latina mas possivelmente também em outros lugares) tem apenas duas opções: ou ela se torna uma igreja de gueto ao defender estruturas litúrgicas e hierárquicas ultrapassadas ou aceita elementos da religião oral popular do pentecostalismo. Esta última opção ela já tomou, é claro, na formação das “comunidades de base” e na atribuição de responsabilidades à líderes leigos, os assim chamados “delegados de la palabra de Dios.”* Salta aos olhos de qualquer observador não preconceituoso que essas “comunidades de base” são uma forma católica genuína de pentecostalismo, ainda que isto não seja reconhecível em todo canto. Mas elas também apresentam uma série de problemas. Como no caso dos comunistas na antiga República Democrática da Alemanha, a igreja católica também será confrontada por uma base popular que dirá, “Nós somos a igreja.” Uma igreja católica monolítica, centralmente administrada, já não é mais viável. A escolha é clara: Ou o Vaticano aceitará que é um servo do povo de Deus, e que sua hierarquia não poderá no longo prazo continuar a produzir dogmas e decretos morais que o povo não compreende; ou então perderá seu povo e seus fundos. Esta última não implica em que o Vaticano desapareceria, mas que se tornaria insignificante, pois ele não pode defender seu monopólia com a guarda suíça. A alternativa é um Vaticano que seja um verdadeiro facilitador, um “pastor pastorum,” um porta voz (ou talvez até mesmo uma porta voz) para as convicções, aspirações e desejos do povo de Deus católico.

Católicos Pentecostais—Ecumênicos ou Denominacionais?

Fico triste por ter que encerrar esta seção sobre o movimento de renovação católico com uma observação algo crítica. O movimento de renovação na igreja católica, ou “católicos pentecostais” como eles se chamavam no início, começou—como o próprio movimento pentecostal—como um movimento de renovação ecumênico. As reuniões de oração eram ecumênicas, por exemplo, como demonstrei no capítulo 2 (pp. 6-15). Iniciativas importantes vieram dessas reuniões de oração. Mas talvez por volta de 1980 esse espírito ecumênico tinha desaparecido. Os católicos e os protestantes tinham organizado seus próprios grupos de oração denominacionais, e alguns deles tinham se tornado em novas igrejas pentecostais, como veremos mais tarde.

O padre católico romano Peter Hocken detectou essa mudança num estágio inicial em sua meticulosa pesquisa sobre o início da renovação carismática na Inglaterra.[579] Em contraste com muitos escritores sobre o batismo do Espírito, Hocken viu nessa experiência de crise um elemento cognitivo. O fato de pessoas oriundas de contextos evangélico à católico, de persuasão teológica conservadora à liberal, passarem por uma experiência que percebem como idêntica, exige uma nova leitura de nossas costumeiras teologias.

Certamente esse foi o caso do pioneiro pentecostal ecumênico David Du Plessis. Ele percebeu corretamente que os pentecostais não devem ser vistos simplesmente como a ala esquerda do protestantismo. Há demasiados elementos católicos em sua história e espiritualidade. Portanto é tolice—na opinião de Du Plessis—excluir ou o Conselho Mundial de Igrejas ou Roma da esfera de visitação do Espírito.[580]

É verdade, entretanto, que nem os pentecostais nem as igrejas tradicionais estão equipadas para lidarem com as questões teológicas que surgem de tal observação. Hocken escreve:

Conquanto tenha havido uma comunhão genuína no Espírito entre os batizados no Espírito, não houve uma compreensão comum do movimento e de seu propósito na visão de Deus. A possibilidade de uma compreensão comum dependia dos participantes estarem desejosos de permitir que suas teologias costumeiras, especialmente suas eclesiologias, fossem desafiadas e expandidas em uma fidelidade comum à graça do batismo no Espírito e em fidelidade paralela à obra de Deus no coração de cada tradição.[581]

A abordagem hermenêutica de Hocken pode ser considerada católica romana. Mas no contexto no qual ele apresenta suas conclusões esta hermenêutica também pode ser considerada pentecostal, protestante ou anglicana. Ela de fato revela um gume crítico em relação à todas eclesiologias, incluindo a católica romana.

Assim Peter Hocken percebe a singularidade da renovação carismática no fato de que pela primeira vez desde a Reforma tem emergido um movimento ecumênico de base que tem atravessado as fronteiras entre evangélicos e católicos. Isto é, de fato, de grande significado. A base para essa abordagem ecumênica é o fato de que os cristãos têm descoberto uma experiência comum, que está no cerne de sua espiritualidade—e isso apesar de suas diferentes teologias e interpretações dessa experiência.

Porém, o movimento carismático tem se desdobrado em outras direções. Tendo fracassado no intento de impedir conjuntamente o batismo no Espírito em suas igrejas, os teólogos denominacionais estão ocupados em todo canto provando que ele pode ser “contido” dentro das tradições de suas denominações. E talvez seja correto que eles procurem assim fazer, porque é sempre mais fácil aceitar algo novo demonstrando que esse algo não é assim tão novo. Uma prova desse processo é a coleção de Kilian McDonnell: são três volumes maciços contendo uma centena de declarações eclesiásticas sobre a renovação carismática.[582]

Tais sinais de aceitação e integração são encorajadores. Mas se essa obra é do Espírito, como seus seguidores acreditam, então também é do Espírito que ela comece como um movimento ecumênico. Uma reapropriação desse espírito ecumênico original pode nos levar a descobrir novas possibilidades hermenêuticas para as novas crises de nossa época. Em outras palavras, o batismo do Espírito introduz um elemento cognitivo e crítico nos campos liberal, evangélico e católico. Os evangélicos descobrem que é possível ser um crente comprometido e cheio do Espírito sem aceitar as proposições teológicas evangélicas. Os críticos liberais descobrem que a tradição oral pentecostal é um potente veículo para a comunicação de importantes noções sociais e ecumênicas em um ambiente que os liberais nunca poderão alcançar. Os católicos descobrem que pode ser possível seu um católico maduro sem aceitar a infalibilidade do ministério petrino. Os protestantes descobrem que padres católicos romanos levam a Escritura, e na realidade a tradição da Reforma, tão a sério como eles mesmos.

Em publicações adicionais Hocken[583] tem desenvolvido seu pensamento convocando à uma postura que evite dois extremos: por um lado, a “igreja doméstica” que rompe com o passado e inicia de novo, e por outro lado uma renovação carismática que deixa tudo como está, não questionando nada, apenas fornecendo alguns bons cânticos, algumas reuniões de oração mais fervorosas e o falar em línguas. Hocken postula uma terceira via. A renovação é uma coisa nova, e convoca seus membros à uma lealdade dupla: lealdade para com a denominação de origem e lealdade para com a ecumenicidade do Espírito.

Cecil Robeck, do lado pentecostal, chega à conclusões bastante similares.

Nossas melhores formulações confessionais da Verdade e da práxis de nossa igrejas que freqüentemente conservamos com ciúmes, de certa forma estão, em última instância, distorcidas e desfiguradas. Nisto aloja-se o potencial para sofrimento . . . Algumas vezes no diálogo, certas pessoas ou grupos, cegados por seu próprio aparente sucesso, assumirão que devam argumentar de uma posição “fortalecida” ou que devam ter a supremacia. Talvez procurarão se assentar na cabeceira da mesa de diálogo, exibindo dessa forma um ar de superioridade. Talvez procurarão (1) manipular a agenda para que esta sirva seus próprios interesses eclesiásticos exclusivistas, (2) se opor à Verdade em vez de se submeter à ela, (3) engajar em comportamento arrogante ou triunfalista que se realiza em uma forma de imperialismo teológico ou tirania prática, ou exige mudanças nas ações de seus parceiros em diálogo antes mesmo que o diálogo tenha começado. Esse comportamento ignora os ensinos de Jesus (Lucas 14:7-11), o qual com todo o direito se assenta à cabeceira da mesa. A vulnerabilidade de um parceiro no diálogo sem uma abertura e respeito similar por parte do outro na verdade nulifica o processo de diálogo, sabota a comunicação genuína e impede qualquer busca autêntica pela Verdade . . . Uma revelação inicial do processo de diálogo é que a maioria de nós trabalha com definições relativamente exclusivas da Igreja. Nós padronizamos nossas experiências de Deus e as tornamos normativas. Nós então julgamos as experiências dos outros de acordo com essas normas . . . Lucas registrou que os discípulos de Jesus estavam orgulhosos, talvez até mesmo arrogantes na exclusividade de seu direito de usar o nome de Jesus. Em uma ocasião eles declararam triunfalmente que eles impediram com todo o zelo um “estranho” de utilizar o nome de Jesus, “salvaguardando” dessa forma o uso daquele nome. Jesus os admoestou (Lucas 9:50).[584]

Veremos mais tarde o quanto a recomendação de Robeck tem sido seguida nos círculos pentecostais. Por ora trataremos do movimento de renovação na igreja católica, e aqui é necessário dizer que a função ecumênico-crítica desse movimento tem sido em grande parte desperdiçada. Como exemplo menciono a importante dissertação de Lucida Schmieder,[585] escrita sob a supervisão do professor Heribert Mühlen em Paderborn.

Lucida Schmieder é uma freira missionária beneditina. Após seus estudos ela trabalhou no Brasil e posteriormente na Alemanha. Ela rastreia a tradição do batismo do Espírito nos movimentos de reavivamento nos séculos dezesseis e dezessete, impulsionados por líderes como Úlrico Zuínglio, o anabatista Baltasar Hubmaier e o espiritualista Gaspar Schwenckfeld. Ela não diz que há interação histórica, mas demonstra o paralelo entre estruturas de pensamento e experiência. Depois ela prossegue e discute detalhadamente Wesley (sem mencionar suas raízes católicas) e o movimento de santificação alemão e americano. Para nosso propósito, a Quarta parte de seu livro é a mais importante. Ali ela procura apresentar o movimento de renovação como boa espiritualidade católica, da qual nem as autoridades seculares nem as eclesiásticas têm nada a temer. A impressão que se tem do livro de Lucida Schmieder é que essa nova espiritualidade não muda nenhuma de nossas melodias teológicas, mas altera o ritmo e por vezes a nota. Ela não muda a igreja católica, mas a incendeia. Não muda seu ministério, mas torna-o mais crível. Não muda seu compromisso ecumênico, mas torna-o mais vivo. O quanto isso é uma expressão de política eclesiástica não posso julgar. (Essa apresentação agora corresponde em grande parte aos fatos, pelo menos em relação ao movimento carismático no Ocidente.)

Assim Schmieder marginaliza o início crítico e ecumênico do cristianismo carismático; por exemplo o significado teologicamente explosivo das mulheres, dos negros, dos pobres e dos leigos nos primeiros anos do pentecostalismo clássico. Vindo do Brasil, é surpreendente que Schmieder não considera Paulo Freire, Leonardo Boff ou Helder Câmara, com suas interpretações da religião popular pentecostal e suas ênfases numa compreensão ecumênica da igreja católica. É surpreendente que em sua obra o Espírito Santo fala eloqüentemente em experiências religiosas e privadas, mas é igualmente eloqüentemente silencioso sobre os grandes problemas de opressão, injustiça, fome e discriminação. Porém, é necessário dizer que sua obra representa a maioria do movimento de renovação católica atual, apesar de algumas vozes críticas, como aquelas de Peter Hocken e outros.

Já foi demosntrado pela freira católica Mary Hall que também há outra forma de lidar com pentecostalismo católico. Em seu livro Quest for a Liberated Christian [Busca por um cristão libertado] ela compara um homem, um movimento e uma missão. O homem é Helder Câmara, o movimento é o pentecostalismo católico e a missão é o sistema escolar católico no Paquistão onde ela trabalhou como missionária. Ao lidar com o pentecostalismo católico ela sublinha seu potencial tanto libertador como domesticador.

Agora nos deslocamos de nossa visão geral do movimento de renovação católica para a obra subversiva do Espírito em outra arena, aquela do diálogo oficial entre pentecostais e católicos romanos.

O Diálogo Vaticano/Pentecostal

Nem a imprensa secular nem a religiosa, nem mesmo os diversos periódicos pentecostais, relataram um dos eventos mais importantes no cenário religioso de nosso século; ou seja, o diálogo católico/pentecostal que ocorreu de 1972 em diante durante quatro qüinqüenais. Uma das razões para esse silêncio pode ser que os participantes pentecostais estavam com medo de falar sobre tal diálogo. Algumas vezes eles até mesmo pediram para que suas identidades não fossem reveladas. As Assembléias de Deus dos Estados Unidos sempre que podiam colocavam obstáculos e desencorajavam a participação de seus próprios membros executivos. “Por quê essa recusa em participar?” pergunta Jerry Sandidge. Parece, escreve ele, ter sido devida ao envolvimento de David Du Plessis. Du Plessis “ainda era um embaraço” para as Assembléias de Deus.[586] “Portanto a equipe pentecostal ingressou na sessão de 1977 do Diálogo, que era o segundo qüinqüenal da série, com pouquíssimo apoio dos líderes da principal das denominações pentecostais clássicas.”[587] Du Plessis tentou colocar o diálogo na agenda da Conferência Pentecostal Mundial em cujo início ele desempenhara papel principal. Mas sua proposta foi rejeitada.[588] O Comitê Assessor da Conferência Pentecostal Mundial recomendou aos seus membros a não participação no diálogo.[589]

Não obstante, o diálogo ocorreu. Seus relatórios,[590] bem como várias análises altamente eruditas,[591] estão disponíveis em forma impressa. Chegou a hora de contar essa estória. Um dos ecumênicos mais corajosos, Cecil Robeck, professor de teologia das Assembléias de Deus, diz que:

Não publicar os relatórios do diálogo internacional entre católicos romanos e pentecostais em periódicos pentecostais pode ser uma boa política pentecostal. Mas é necessário perguntar se tal postura auxilia ou atrapalha o reino de Deus. Os pentecostais e os católicos romanos têm a obrigação de aprender uns com os outros o máximo que puderem sobre uns dos outros pois ambos reivindicam ser parte do mesmo Corpo de Cristo. Os pentecostais quase que ainda não começaram a perceber a enormidade de mudanças que está acontecendo entre os católicos romanos desde o Vaticano Segundo. Se os pentecostais continuarem a responder aos católicos romanos com descrições baseadas em estereótipos ultrapassados ou extremadas generalizações impiedosas, será o mesmo que insistir na presença permanente de argueiros nos olhos católicos romanos sem a devida consideração das traves nos olhos pentecostais. Reter informação que pode ajudar a remover tanto os argueiros como as traves é participar na perpetuação da incompreensão.[592]

O Primeiro Qüinqüenal, 1972-76

O diálogo católico/pentecostal não estava preocupado “com os problemas de união estrutural imediata, embora obviamente seu objeto [fosse] a aproximação conjunta de cristãos em oração e testemunho comum.”[593] Depois de diversas reuniões preliminares nas quais David Du Plessis teve importante papel, as sessões do diálogo ocorreram em Zurique (1972), Roma (1973), Craheim, Alemanha (1974), Veneza (1975) e Roma (1976). Entre os participantes estava um amplo espectro de eruditos católicos e líderes pentecostais e carismáticos (embora não incluindo representantes do Terceiro Mundo). As conversas resultantes representam o único diálogo realizado pela igreja Católica Romana com um movimento não oficial[594]—e na realidade, um movimento representado não por seus líderes oficiais mas pelos amigos pessoais de um líder catalizador (David Du Plessis). Em certo sentido esse estágio inicial lembra nitidamente o início do Conselho Mundial de Igrejas. Eu sempre me recordarei como Visser t’Hooft contou-me que o Conselho Mundial de Igrejas foi originalmente um grupo de amigos (“a rede da turma”) que decidiram fazer algo sobre a falta de unidade das Igrejas. É por isso que os documentos oficiais não revelam a estória verdadeira. O que acontecia entre as sessões, durante as refeições, nos cultos, nas conversas pessoais, era provavelmente mais importante para a mudança de clima do que os procedimentos oficiais. O trabalho de Bittlinger tem se constituído numa janela muito importante nesse processo, porque ele possui o raro Dom para documentar tais eventos “não oficiais” mas não obstante altamente importantes.

Os tópicos discutidos foram “Batismo no Espírito Santo,” a relação entre “Recepção do Espírito e Regeneração Cristã,” “Dons Espirituais,” “Culto Público,” “Discernimento,” e “Oração e Louvor.”

Os relatórios mostram claramente os pontos de partida diferentes das três partes. No final, essas diferenças ficaram difundidas numa longa introdução histórica ao misticismo. Porém, David J. Du Plessis disse ao comitê que o estudo do misticismo do passado não era de valor particular.

Pode-se encontrar muito pouco nos escritos antigos que tenha sido escrito por aqueles que tiveram a experiência, e temos que nos basear na informação secundária daqueles que escreveram sobre a experiência de outros, porém sem saberem do que se tratava . . . O estudo dos fenômenos carismáticos medievais através de fontes secundárias é tão fútil e infrutífero quanto a tentativa de um mancebo cortejar sua amada por meio dos esforços de um intérprete.[595]

Talvez Du Plessis aqui também estivesse refletindo sobre as dificuldades com intérpretes.[596] Embora a declaração de Du Plessis não seja justa para com a pesquisa histórica sólida, ele expressou uma percepção fundamental de um genuíno pentecosal. Ou seja: há coisas que somente podem ser comunicadas de forma bastante incompleta por meio da linguagem proposicional. A linguagem religiosa—e a linguagem teológica—é mais uma arte do que uma ciência. Não é por acaso que nas universidades os departamentos de teologia estão nas faculdades de humanas e não nas de exatas.

Quanto àqueles que tinham experimentado o Espírito, o propósito declarado dos pentecostais clássicos participantes foi testemunhar de sua experiência, algumas vezes com notável sucesso; por outro lado, suas tentativas de falar uma linguagem erudita despertavam apenas sorrisos disfarçados de seus interlocutores católicos.[597] (Observar que isso mudou no desenrolar do diálogo. Os pentecostais vem desenvolvendo uma tradição erudita rigorosa; se eles têm se beneficiado disso é outra questão.)

Essas excursões históricas, porém, foram apenas preliminares. As verdadeiras diferenças apareceram quando os métodos exegéticos de estudos bíblicos foram expostos. Para o pentecostalismo clássico o livro dos Atos dos Apóstolos é o documento normativo da igreja normativa. O Secretariado e alguns dos eruditos carismáticos, por outro lado, utilizavam as ferramentas críticas da erudição bíblica.[598] Assim os últimos aceitavam uma compreensão pluralista da igreja, do Espírito Santo e da teologia em geral, enquanto os pentecostais clássicos consideravam a pneumatologia de Lucas como a exclusiva e única verdadeira compreensão do Espírito, a qual as outras pneumatologias da Bíblia têm que se submeter.

É surpreendente que o diálogo não se rompeu nesse ponto, e que foi marcado um segundo qüinqüenal, ao qual seriam convidados apenas os representantes do Secretariado e dos pentecostais clássicos.

Mais importante do que os relatórios do diálogo é o fato de que ele ocorreu. Os pentecostais clássicos sempre tinham dito: O Pentecostes é uma experiência, não uma doutrina. Agora os católicos tinham tido a mesma experiência. O que isso diz sobre a igreja Católica Romana? Originariamente os pentecostais nutriam a expectativa de que os católicos cheios do Espírito deixassem a igreja Católica e se tornassem membros de uma igreja pentecostal. David Wilkerson, ministro das Assembléias de Deus, previra em uma visão grandes perseguições para os católicos pentecostais que os forçariam a abandonar sua igreja. As únicas opções seriam: ou eles deixariam a igreja Católica e se tornariam um tipo de pentecostal clássico ou o Espírito Santo os deixaria.[599]

Tal “ou isso ou aquilo” ficou impossível para os pentecostais que tinham participado do diálogo. Du Plessis rejeitou a visão de Wilkerson,[600] e R. Douglas Wead, um ex-ministro das Assembléias de Deus, tem desde então descrito de uma forma perturbadoramente honesta o processo de sua própria educação ecumênica em seu contato com católicos pentecostais.[601]

O Segundo Qüinqüenal (1977-1982)

Podemos ter uma noção do segundo qüinqüenal através da excelente obra em dois volumes de Jerry L. Sandidge. Ele foi um homem extraordinário. Nascido em Tulsa, Oklahoma, em 1939, suas “raízes espirituais” chegavam até uma pequena igreja pentecostal em sua cidade natal. O único pastor que teve na infância e na adolescência foi um homem que nunca completara a sexta série. Apesar de sua falta de educação formal e preparo acadêmico para o ministério, o rev. Johnny “Pappy” Stubblefield era “u verdadeiro homem de Deus.”[602] Sandidge freqüentou o Central Bible College em Springfield, Missouri (a Escola Bíblica das Assembléias de Deus) onde recebeu um Bacharelado em Artes em Bíblia (1961) e um Mestrado em Artes em Educação Religiosa (1964). Na primavera de 1962 ele foi como fotógrafo em uma expedição arqueológica a Tell Dothan. Ele foi ministro em diversas igrejas das Assembléias de Deus e de 1966 a 1971 trabalhou na Sede Internacional das Assembléias de Deus para a Escola Dominical e Departamento Juvenil. Recebeu o mestrado em Educação em orientação e aconselhamento da Universidade de Missouri, Columbia, Missouri.

Em 1971 ele e sua esposa foram aprovados pelas Assembléias de Deus para o serviço missionário estrangeiro. Eles serviram nas Assembléias de Deus na Bélgica por dez anos, dois dos quais ele atuou como deão dos estudantes no Continental Bible College, em St. Pieters-Leeuw (1972-74), e os outros oito como fundador e diretor da Universidade Ação, em Leuven (1974-1982) (um tipo de capelania universitária). Em 1976 completou o Mestrado em Ciência Religiosa na Universidae Católica de Leuven e em 1977 um bacharelado especial em filosofia no Instituto Superior de Filosofia em Leuven.[603]

Então ele embarcou em um programa altamente ambicioso; ou seja, em uma dissertação de doutorado em filosofia em Leuven no qual descreveu e analisou o diálogo católico/pentecostal—especialmente o segundo qüinqüenal. Que um ministro das Assembléias de Deus receba a maior parte de sua educação em uma universidade católica belga já é em si um fato notável (embora ele não fosse o único; havia diversos pentecostais estudando em Leuven). Durante seu tempo lá ele foi apresentado por Du Plessis ao diálogo católico/pentecostal e subseqüentemente recebeu a permissão para acessar todos os documentos confidenciais do diálogo no Secretariado em Roma. Du Plessis também permitiu-lhe livre uso de seus extensos arquivos pessoais (atualmente no Centro David Du Plessis, em Pasadena, Califórnia).

Durante o segundo qüinqüenal Sandidge apresentou um ensaio intitulado “Uma perspectiva pentecostal sobre Maria,”[604] uma notável peça de pesquisa realizada em meio a uma séria enfermidade—câncer na garganta—que lhe provocou hospitalização. Devido a notícias não confirmadas e altamente exageradas na imprensa sobre a discussão sobre Maria durante o diálogo, Sandidge perdeu seu sustento financeiro das Assembléias de Deus (embora não sua credencial ministerial). Sua esposa assumiu o sustento da família;[605] ele continuou determinado a concluir sua obra. Durante os anos de 1985 a 1987 ele serviu como professor assistente de história eclesiástica na Escola de Teologia e Missões na Universidade Oral Roberts, em Tulsa, Oklahoma. Depois disso ele ensinou por vários anos na CBN University e então assumiu o pastorado no Templo Evangélico, em Springfield, Missouri. Faleceu em 1992. Sigo sua obra bem de perto.

A discussão no segundo qüinqüenal centrou-se em questões como “Falar em línguas,” “Fé e experiência,” “Hermenêutica,” “Cura,” “A Igreja como comunidade de adoração,” “Tradições e tradição,” e “Maria.” Os locais para as sessões foram Roma (1977 e 1979); Veneza (1980); Viena (1981); e Collegeville, Minnesota (1982). Uma vez que tenho que lidar com hermenêutica e outras questões mencionadas em capítulos seguintes, aqui irei apenas realçar três áreas de controvérsia: (1) Maria, a mãe de Jesus, (2) o lugar das mulheres no ministério, e (3) a eucaristia.

(1) Maria

Foi solicitado a Sandidge que apresentasse um ensaio sobre Maria a partir da perspectiva pentecostal. Sua primeira descoberta foi “uma grande carência de material escrito por pentecostais sobre Maria.”[606] “Na verdade, quase que se poderia dizer que nós não temos nem mesmo uma ‘perspectiva’ de Maria, a não ser que seja em termos negativos, i.e., aquelas coisas que nós universalmente não cremos sobre ela.”[607] Portanto Sandidge leu a literatura mariológica católica e comentou-a a partir do ponto de vista pentecostal. Ele foi esmagado pela riqueza de material e pelo fato de que parecia haver uma abordagem pluralista a Maria na igreja Católica. “Há espaços para diversas teologias de Maria.”[608] Ele então prossegue e fornece as bases bíblica e histórica da mariologia católica, incluindo o dogma da Imaculada Conceição de 1854, ressaltando claramente as diferenças entre pentecostais e católicos. O relato da imprensa afirmou: “O tópico que se esperava ser extremamente polêmico terminou com um consenso maior do que se esperava.”[609] Talvez a redação dessa frase tenha sido infeliz, diante das vívidas discussões sobre Maria.[610]

Com certeza o ensaio de Sandidge indicava as áreas de concordância (por exemplo o nascimento virginal), como também um ampla área onde mais compreensão era possível. Sandidge demonstrou em seu ensaio uma grande sensibilidade para a prática religiosa sobre Maria, e deu exemplos do lado pentecostal onde a religião popular era praticada devido a necessidades pastorais. Porém, para Sandidge o final foi praticamente uma catástrofe. A imprensa noticiou: “Pentecostais e católicos concordam sobre Maria.”[611] Baseados em notícias da imprensa não confirmadas e falhas, os executivos das Assembléias de Deus “ordenaram que Sandidge mudasse o tópico de sua dissertação doutoral para a Universidade Católica de Leuven” (apesar do fato de que eles tinham anteriormente concordado com ele) e encerrasse qualquer envolvimento no diálogo com os católicos romanos.[612]

Obviamente, uma coisa é criticar a igreja Católica por ela censurar teólogos católicos como Hans Küng ou Leonardo Boff, e outra bastante diferente é aceitar ação e pensamento pioneiros de seus próprios missionários e teólogos. Porém, eu imagino que agora as Assembléias de Deus se lamentam por sua ação dura em relação a Sandidge, e mais ainda em relação a Du Plessis.[613]

(2) O lugar das mulheres no ministério

Os pentecostais, que em alguns países têm mulheres entre seus ministros, apresentaram esta “questão difícil” aos católicos: “Por que é que o ministério das mulheres na igreja Católica Romana parece relegado a práticas tão arcaicas? Os pentecostais acreditam em um ministério válido para os leigos. Como a igreja Católica Romana lida com a questão do ministério para ‘os da base,’ os leigos?”[614] Sandidge não registra a resposta dos católicos, a não ser observar as bem conhecidas definições teológicas católicas de ministério . Por outro lado ele relata um interessante desenvolvimento no movimento pentecostal britânico: “um apelo para uma ordem religiosa de mulheres ser elevada ao ministério àqueles em necessidade,” sob o título de “Freiras Pentecostais.” Este termo não é de escárnio, mas pelo contrário, é utlizado positivamente “para sugerir uma ordem de mulheres devotadas a obra do Senhor da mesma maneira que atualmente os anglicanos, os católicos romanos e o Exército da Salvação têm inúmeras mulheres cheias do Espírito Santo, devotadas à ampla área do cuidado social.”[615] Influência católica?

(3) Sobre a eucaristia

Neste tópico os pentecostais apresentaram aos católicos outra “questão difícil”: “Se a eucaristia é o cerne do culto, à luz de Atos 15:5-11 e I Cor 12:12-13 como podem os católicos romanos em sã consciência excluírem alguém da mesa do Senhor? Onde na Escritura vocês encontram base para utilizarem a mesa do Senhor (o cerne do culto) como um instrumento de disciplina, i.e., uma mesa restrita (cf. I Cor 11:2, 11:28, Mt 26:25)?”[616] Os pentecostais ficaram chateados porque não lhes foi permitido participar na eucaristia católica, mas católicos “cujas vidas não se conformam ao Evangelho são admitidos a eucaristia simplesmente por causa de sua suposta fé católica.”[617] Eles questionaram ainda mais: A “mediação de Cristo” é exclusivamente para a eclesiologia católica romana? Quem e quais são os “irmãos separados?”[618]

Robert McAlister fez a pertinente questão: “Por que é que vocês nos chamam irmãos e se recusam a partilhar a mesa conosco, hipócritas!”[619] “O apóstolo Paulo deixa bem claro que nossa preocupação não é se nosso irmão ou irmã ou alguma outra denominação é digna ou não da mesa do Senhor. Ele sublinha que nossa única responsabilidade é examinarmos a nós mesmos.”[620] Em debates posteriores os pentecostais confessaram a compreensão zuingliana da eucaristia, preferencialmente a luterana.[621] Porém eu duvido que eles—ou na verdade a maioria das pessoas que usam o termo “zuingliana”—estavam conscientes do aspecto transubstanciacional da eucaristia de Zuínglio (transubstanciação das pessoas no corpo de Cristo) que tem deixado traços profundos na teologia e na liturgia anglicanas.[622] Deve ser observado que a posição dos pentecostais sobre isto não foi tão forte como parece aqui, pois posteriormente no diálogo eles tiveram um debate acalorado entre eles próprios sobre a ceia do Senhor. “A delegação católica romana ficou silenciosa enquanto o diálogo-interno estava em progresso.”[623] William Carmichael chegou a seguinte conclusão: “É verdade (e um triste fato) que freqüentemente existe aguda discordância dentro da tradição pentecostal. Nós somos de fato um ‘saco de gatos.’”[624]

O Terceiro (1985-89) e o Quarto Qüinqüenais

O encerramento do terceiro qüinqüenal foi adiado até 1985, em parte por causa da morte dos papas Paulo VI e João Paulo I num pequeno intervalo de tempo. A equipe pentecostal foi reorganizada e desta vez incluiu alguns delegados oficiais.[625] Também estavam inclusas duas mulheres, uma católica negra e uma pentecostal mexicana, e no geral um amplo espectro de jovens líderes e eruditos pentecostais, incluindo representantes da Europa Oriental. David Du Plessis se afastou para permitir a transferência da liderança para seu irmão mais jovem, Justus Du Plessis. Os temas e locais do diálogo foram: Riano, Itália (1985): “Comunhão do Santos”; Sierra Madre, Califórnia (1986): “O Espírito Santo e a Visão de Koinonia no Novo Testamento”; Veneza, Itália (1987): Koinonia, Igreja e Sacramentos”; Emmetten, Suíça (1988): “Koinonia e Batismo”; e Roma (1989): a redação do Relatório Final.

Uma vez que não tenho informação direta sobre as trocas de idéias durante essas sessões, a discussão que apareceu depois do diálogo devem servir como uma conclusão geral.

Haveria um quarto qüinqüenal sob a nova direção de Cecil M. Robeck, Jr., ministro das Assembléias de Deus e professor de ecumenismo e história eclesiástica no Seminário Teológico Fuller, em Pasadena, Califórnia. O tema oficial seria “Evangelismo e Missão” mas a verdadeira questão em debate era a acusação de proselitismo,[626] feita pelos católicos especialmente contra os pentecostais latino americanos (ver p. 180, “O Estilo do Diálogo”). A sugestão feita por Cecil M. Robeck de se realizar em Santiago do Chile a sessão sobre proselitismo do diálogo—uma vez que esta questão é particularmente importante para os católicos e pentecostais latino americanos e por causa do profundo compromisso ecumênico dos pentecostais chilenos (capítulo 27, pp. 367-71)—foi recusada, não pelos pentecostais, mas pelos católicos, que sentiram que esse “não era o momento certo para tal diálogo.” Em minha opinião essa foi uma importante oportunidade que se perdeu de se chegar ao cerne das questões entre pentecostais e católicos.

Avaliação e Discussão

Juntamente com os três relatórios finais dos três qüinqüenais, a revista Pneuma também publicou diversas reações de líderes pentecostais e de outros teólogos.[627] Todos eles expressaram sua apreciação pelo relatório. É um milagre que apesar do fato de que por vezes o diálogo “beirou a comédia,”[628] o relatório surgiu no final. Também não se deve subestimar os muitos problemas técnicos que prejudicaram o projeto. Entre tais problemas encontramos os seguintes: Os pentecostais tinham que pagar por suas viagens e hospedagens, o que obviamente selecionou os participantes. Os pentecostais também estavam em constante temor—pelo menos durante os dois primeiros qüinqüenais—de serem perseguidos por seus “papas” denominacionais. Finalmente, por causa de doenças e outros problemas a composição do grupo de diálogo mudava constantemente; algumas vezes ninguém, exceto Du Plessis, sabia quem era e quem não era membro do grupo.[629]

Na introdução ao relatório final foi afirmado que o tema koinonia foi escolhido porque o tópico “comunhão dos santos” emergiu da discussão sobre Maria; por causa da importância do conceito em outros diálogos bilaterais; e por causa da fertilidade frutífera do tema nas reflexões sobre a auto-compreensão eclesiástica ocorrendo em muitas igrejas e comunhões cristãs.

Emergiu uma divergência significativa sobre a interpretação da Escritura:

No catolicismo romano a interpretação da Escritura acontece diariamente nas vidas dos fiéis em muitos níveis, como na família, no púlpito e na sala de aula. A totalidade dos fiéis, que possui uma unção que flui do Santíssimo não pode errar em questões de fé (cf. I João 2:20, 27). Os católicos romanos defendem que o magistério da Igreja não está acima da Palavra de Deus, mas a serve, ensinando apenas o que foi transmitido, ouvindo esse ensino dedicadamente, guardando-o escrupulosamente e explanando-o fielmente por comissionamento divino e com o auxílio do Espírito Santo (Dei Verum, 10).[630]

Se os católicos tivessem deixado dessa maneira teria que se admitir que eles têm uma abordagem da Escritura muito mais pentecostal do que os pentecostais, pois os pentecostais “vêem com ceticismo qualquer reivindicação de que a totalidade do corpo de fiéis não pode errar em questões de fé.”[631]

Obviamente isso tem a ver com a espinhosa questão da infalibilidade papal. David Du Plessis já tentara desmontar o potencial destruidor da questão ao afirmar em um sermão que Deus estava “utilizando a doutrina da infalibilidade do povo para realizar o Concílio Vaticano II e também permitir a renovação carismática dentro do catolicismo em virtude da oração do papa João XXIII por um novo Pentecostes.”[632] Esta declaração apareceu na imprensa como “Protestante evangélico diz que a infalibilidade papal é verdadeira.”[633] Du Plessis precisou de toda a sua habilidade para esclarecer esse assunto.[634] Durante o segundo qüinqüenal os católicos apresentaram a seguinte “questão difícil” aos pentecostais: “Quando os ministros pentecostais exercem sua autoridade e falam a verdade, espera-se submissão. Quem decide e como é decidido o que é verdade no caso? Se a resposta for ‘a mensagem bíblica’, quem decide entre as várias interpretações do texto bíblico?”[635]

Qualquer pessoa que conheça o pentecostalismo concordará em que os pentecostais não conseguem responder essa questão, o que obviamente não significa que a posição católica romana seja a solução para o dilema.

No relatório final essa questão complexa foi resumida da seguinte forma:

Os pentecostais crêem que a ordem eclesiástica exigida pela koinonia não está expressa satisfatoriamente em alguns aspectos importantes da eclesiologia católica romana. Mesmo dentro do contexto de colegialidade, alguns exemplos parecem demonstrar isso: aquelas passagens onde é afirmado que “a ordem episcopal é o sujeito do poder total e supremo sobre a Igreja universal,” e ainda mais importante, quando é afirmado que “o Pontífice Romano tem poder total, supremo e universal sobre a Igreja”, o qual “ele pode sempre exercer . . . livremente” (Lumen Gentium, 22). No geral, os pentecostais propõem que modelos eclesiais presbiterianos e/ou congregacionais expressam melhor a mutualidade ou reciprocidade exigida pela “koinonia.”[636]

Em minha opinião isso é um protesto pentecostal bastante suave. Um pontífice romano que tem “poder total, supremo e universal sobre a Igreja” é em minha opinião provavelmente o maior obstáculo para crescimento e espiritualidade na igreja Católica e para a comunhão ecumênica com outros cristãos. Muitos católicos estão conscientes disso. Eles se opõe ao “poder total, supremo e universal do pontífice sobre a Igreja”, tanto em teoria como na prática, e não deixam de ser católicos (nisso Hans Küng não está sozinho). Alguns pesquisadores católicos têm me dito que apenas os protestantes ainda acreditam na infalibilidade do papa. Seria desejável uma discussão mais completa sobre esse grande obstáculo ao ecumenismo e sobre essa controvérsia dentro da igreja Católica. Isso não significa que não exista espaço para um “ministério petrino,” mas não há espaço para um poder jurisdicional para o pontífice. Talvez os pentecostais não ousem se atracar com este ponto pois eles sabem muito bem que eles próprios têm se tornado bastante clericais e que alguns pastores ou executivos pentecostais têm poderes que deixariam o papa com inveja. Mas não seria esse um caso para o arrependimento mútuo?

Outro osso da discórdia foi o batismo. Essa questão foi incluída no relatório final “por causa da dificuldade que o batismo e a prática do batismo têm em nosso diálogo.”[637] Jakob Zopfi, pentecostal suíço e editor de World Pentecost, comenta em sua avaliação do diálogo a sentença “Pentecostais e católicos romanos divergem em que os católicos romanos entendem o batismo como um sacramento.”[638] Ele diz: “Essa questão faz toda a diferença do mundo, a diferença é que o batismo infantil é um batismo morto, e um batismo morto conduz a uma organização morta.”[639] Esta é uma declaração extraordinária, pois subitamente a diferença vital entre católicos e pentecostais já não é mais um proprium pentecostal mas a compreensão batista de batismo (tenho minhas dúvidas se os batistas expressariam isso de forma tão severa). Fico a pensar o que Zopfi tem a dizer sobre a igreja metodista ou o movimento pentecostal chileno (capítulo 10, pp. 117-31), que são muito maiores do que a sua Missão Pentecostal Suíça e que praticam o batismo infantil. Eles são organizações mortas?

A diferença sobre batismo também encontrou espaço no relatório final: “Para todos os pentecostais não há aproximação com Cristo senão o abandono do pecado em arrependimento . . . o batismo só é realizado após a conversão consciente da pessoa.”[640] Aqui a questão é: O que constitui a conversão (ver capítulo 19, pp. 246-57)? Abandono do pecado da violência e racismo, do pecado da cobiça e ganância de poder? Se isso for parte do “abandono do pecado,” os pentecostais não poderiam ter realizado o batismo de um número considerável de seus membros. Mas se isso não for parte da conversão, que tipo de conversão é essa? Ou para usar o exemplo de Frank Chikane (capítulo 5, pp. 48-50): quem tinha abandonado o pecado e experimentado uma conversão consciente—o torturador pentecostal ou o Frank Chikane torturado, ambos, ou nenhum deles?

É claro que eu não me oponho a prática do batismo de adultos, mas, se “conversão consciente” for pré-condição para o batismo, ou o termo “conversão” terá que ser enxugado de forma a ficar virtualmente sem sentido ou então—e este seria o passo adiante—o batismo de adultos não deverá ser administrado com base no abandono do pecado por parte do batizando, mas com base em sua confissão, em esperança e fé que Cristo inicie uma nova obra em sua vida. Isto tornaria o batismo de adultos muito menos diferente em termos substanciais do batismo infantil.[641]

O Estilo do Diálogo

Um comentário muito interessante foi feito por Jesse Miranda, superintendente distrital do distrito latino americano do Pacífico das Assembléias de Deus, que está apelando por uma compreensão do pluralismo dentro da aldeia global. Está ocorrendo uma revolução espiritual na América Latina, diz Miranda, mas “ela tem sido ignorada e permanece em grande parte invisível. Cada vez mais, os pentecostais clássicos estão se tornando classe média e deixando seus pares buscarem novas formas e paradigmas para uma expressão bíblica da unidade de koinonia cristã.”[642] Leonardo Lovett, pentecostal negro, questiona o debate por completo. O relatório final sofre não pelo que fala mas por “suas evidentes omissões.” Sofre, em particular, da falta de participação do Terceiro Mundo.

Que oportunidade de ter enfrentado as questões de partilha em relação a poder, pobreza e impotência. O documento tende a se demorar demais em questões sobre piedade interior com pouca ou nenhuma preocupação pelo concreto. Qualquer discussão sobre a Encarnação que não aborde maneiras concretas pelas quais esta possa ser realizada no sangue, nas entranhas e nos tecidos da sociedade é nula (pontos 14-16). O que dizer sobre a partilha de poder no interior da costumeira hierarquia eclesiástica elitista da igreja na qual as principais decisões afetando o destino de muitos normalmente são “passadas adiante”? O que dizer da partilha de riqueza pela hierarquia do Vaticano nos países do Terceiro Mundo de maneira concreta além de “tijolo e massa”? Quem irá advertir os pentecostais sobre sua nova obsessão com prédios, prestígio, poder e sobre aqueles que têm levado a mensagem de “prosperidade” em sua bagagem cultural [ver capítulo 18, pp. 228-43], cujas próprias pressuposições que abraça acusa as pessoas do Terceiro Mundo cuja pobreza é em sua maior parte cultural? O partir do pão em Atos 2:42 e o partilhar de “todas as coisas em comum” é limitado como se fosse percebido apenas em termos de sacramentalismo. Ambos, católicos e pentecostais têm igualmente a oportunidade, durante este quarto final do século vinte, de começar a tarefa crucial de partilhar “todas as coisas em comum” além de suas “paredes institucionais sagradas.” As condições estão maduras em todo o mundo para tal empreendimento.[643]

De acordo com Lovett o relatório final sobre Koinonia omite completamente tais ênfases.

Tudo isso representa—como afirmei em outro canto—“A Koinonia da Situação.”[644] Este ethos emergiu de uma composição unilateral de ambos os grupos do diálogo, embora tenham sido feitas tentativas sem sucesso para assegurar maior participação do Terceiro Mundo.[645] Miriam Castiglione, observadora crítica do cenário italiano, afirma em outro contexto que o neopentecostalismo ecumênico é uma tentativa de defender o guetoísmo cristão e evitar o debate mais difícil com não-cristãos e as questões deste mundo.[646]

Sandidge também percebeu essa deficiência, e o fato de que isso ultrapassa a composição do grupo de diálogo. O que é necessário, observa ele, é a inclusão de outros estilos de discussão que não os ocidentais.[647] “O elemento pré-literário do pentecostalismo precisa ser parte do diálogo.”[648]

O diálogo parecia estar “inclinado” em favor da abordagem teológica católica romana, i.e., abordagens discursiva, científica e intelectual. Havia elementos “pentecostais” no diálogo mas foi dado pouco espaço a teologia oral ou narrativa, ao testemunho, a experiência espiritual validando a verdade, e ao exercício de dons espirituais como contexto para a troca teológica.[649]

“Portanto tais padrões de diálogo dificilmente poderiam ser justos, por exemplo, com a Igreja Kimbanguista na África (capítulo 6, pp. 54-80), da mesma forma que não são com os pentecostais.”[650]

De fato, este é um problema fundamental em todos os diálogos ecumênicos. Eu conheço apenas dois lugares no mundo onde ocorre um diálogo genuíno entre as culturas literária e oral: O primeiro são as reuniões da Society for Pentecostal Studies [Sociedade para Estudos Pentecostais], onde um diversos pentecostais negros com vasto preparo formal utilizam argumentos, cânticos, testemunhos e orações simultaneamente e são respeitados por seus interlocutores branco. Esse também é um local de encontro entre trinitarianos e unitarianos, entre pentecostais brancos e negros, entre homens e mulheres e entre pentecostais clássicos e carismáticos (incluindo católicos carismáticos).[651] Coisa semelhante pode ser dita sobre o grupo de pesquisa que se reúne com Jean-Daniel Plüss e os irmãos van der Laan na Europa. O segundo “lugar de encontro” é a escola para pastores-trabalhadores em Birmingham (capítulo 9, pp. 106-16).

Tal encontro de estilos teológicos tem que se tornar prioridade nos diálogos vindouros. É interessante que os protestantes carismáticos logo no início quiseram “ver representantes das igrejas pentecostais ainda não representadas, por exemplo a igrejas africanas independentes.” Isso foi contraposto, por frágeis argumentos, tanto pelos pentecostais clássicos como pelos católicos pentecostais. Estes últimos argumentaram que muitos desses cristãos seriam ex-católicos (como se isso fosse um argumento). No encerramento primeiro qüinqüenal novamente foi sugerido que fossem convidadas para o segundo qüinqüenal pessoas das igrejas pentecostais africanas independentes. Isso foi rejeitado de pronto pelo presidente, o sul africano David Du Plessis, novamente com argumentos frágeis: pensava-se então que a Conferência Pentecostal Mundial nunca ficaria interessada no diálogo.[652]

Sandidge resume o problema da seguinte maneira. Na família pentecostal mundial há pelo menos seis grupos distintos:

Há aqueles pentecostais clássicos identificados com a Conferência Pentecostal Mundial e fortemente associados com a ala evangélica do cristianismo (na verdade uma minoria dentro do pentecostalismo, com apenas 60 milhões de toda a comunidade carismática/pentecostal, que conta com mais de 400 milhões).[653]

As igrejas pentecostais pertencentes ao Conselho Mundial de Igrejas. São poucas (capítulo 27, pp. 384-87) mas provavelmente demonstrariam uma abertura ecumênica maior do que o primeiro grupo.

As numerosas igrejas autóctones no Terceiro Mundo que não estão relacionadas com a Conferência Pentecostal Mundial nem com as sociedades missionárias pentecostais norte-americanas ou européias.

Um grande número de congregações pentecostais independentes que não possuem nenhuma afiliação denominacional mas que mantêm altos níveis de atividade na evangelização, missões e implantação de igrejas.

As muitas congregações carismáticas/pentecostais independentes, de classe média e de bom tamanho, que recentemente começaram a se formar na América do Norte e em partes da Europa. (Alguns dados chegam a apresentar sessenta mil igrejas locais nos Estados Unidos.) Muitos desses grupos, conhecidos por Du Plessis, estavam apenas emergindo no cenário da renovação carismática quando do início do diálogo.

Aqueles grupos e denominações pentecostais que estão em grande parte isolados do resto do mundo pentecostal por causa de raça, teologia ou opção.[654]

No início Du Plessis procurou o primeiro grupo. Como ele foi rejeitado pela grande maioria, ele tentou abordar os grupos menores; mas nunca conseguiu de fato alcançar o grande movimento pentecostal independente do Terceiro Mundo.[655]

Finalmente, é necessário dizer que por causa do diálogo o clima se modificou dramaticamente em ambos os lados. Alguns dos primeiros opositores foram conquistados, por exemplo Alfred Missen da Grã-Bretanha,[656] e talvez até mesmo Thomas Zimmerman.[657] Ludwig Eisenlöffel, pentecostal alemão, publicou uma resenha bastante simpática do livro de Bittlinger, Papst und Pfingstler,[658] da mesma forma que a revista católica Schweizerische Kirchenzeitung.[659]

Peter Hocken, em sua brilhante resenha da obra de Sandidge, admoesta seus correligionários católicos: “Parece que muitos católicos ainda atribuem muito rapidamente motivos indignos aos missionários pentecostais vendo seu advento primordialmente em termos de agressão sectária e subversão sinistra da fé católica.”[660]

Eu não sei se o Santo Padre em Roma ouve o Peter Hocken, mas deveria. Na palestra de abertura da Quarta Conferência Geral do Episcopado Latino Americano, João Paulo II pronunciou um discurso algo triunfalista sobre a missão católica na América Latina.[661] Por outro lado o discurso é bastante esclarecedor porque admite o pluralismo de facto e o questionamento da autoridade papal na igreja Católica (embora que tudo isso seja, é claro, rejeitado). Ele também menciona a invasão das seitas na América Latina, englobando nesse termo os Testemunhas de Jeová e outros bem como os pentecostais. Não diferenciar entre aqueles com os quais seu próprio Secretariado vem por anos travando intenso diálogo e aqueles que não têm nenhuma preocupação com a ecumenicidade da igreja é uma generalização lamentável, e que foi criticada por diversos católicos[662] e pentecostais.[663]

Uma coisa é certa: o novo clima ecumênico entre pentecostais, especialmente na América, é devido em parte a esse diálogo (mais sobre isso no capítulo 27, pp. 371-74).

Esta é uma oração para católicos, protestantes e para mim mesmo:

Oração do Mosquito

Deus, Algumas vezes me sinto como um mosquito. De manhã, quando o sol está brilhando, eu fico zunindo alegremente de um lado para o outro. Mas então uma força se apossa de mim: tenho que ferroar alguém; tenho que sugar sangue para sobreviver.Deus, eu não fiz esse ferrão. Por que é que eu sou um mosquito? Eu preferia ser uma mosca, que vive de melado ou uma borboleta que suga mel. Por que é que tenho que ser um mosquito, que só pode sobreviver ferroando os outros? Não foi eu quem me fiz. Você não me perguntou se eu queria ser um mosquito, nem meus pais me perguntaram. Querido Deus, haverá também mosquitos no reino de Deus?

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[1] Faupel, “Whither?” 9-27, citação, 10. Ver também Robeck, “Where?” 1.

[2] Cox, “Why,” 3-8, 47, citação 8. Sobre Cox veja Hollenweger, Wie, 142-45 e ITh 2, 35s, 39, 123; ITh 3, 164, 176-78.

[3] Cox, “Reflections,” 29-34, citação 31. Para a crítica pertinente de Cox principalmente sobre o pentecostalismo norte-americano, veja cap. 16, pp. 213s.

[4] Stout, “Forbes,” 34.

[5] Hoerschelmann, “Machtfaktor,” 67-70, citação 67.

[6] Becken, “Afrikanisches,” 166.

[7] John A. Mackay em uma entrevista, citado em Curlee/Curlee, Springtime, 79.

[8] Mackay, Ecumenics, 198.

[9] Raiser, “Interview,” 5.

[10] Robeck, em sua resenha de Jerry L. Sandidge, Roman Catholic Pentecostal Dialogue em Pneuma 11/2, 1989, 135-37, citação 135. Irvin, “One Bond,” 53.

[11] Stibbe, “Appraisal,” 5-16; Kuzmic, “War-Time Reading,” 17-24, esp. 23; Macchia, “Response,” 25-33, esp. 33; Chan, “Asian,” 35-40; Sepúlveda, “Perspective,” 41-49; Lapoorta, ‘African,” 51-58.

[12] Moltmann, “Response,” 59-70, esp. 60.

[13] Ibid., 61.

[14] Orações nas pp. 40 (minhoca), 80 (lagarta), 180 (mosquito), 199-200 (tartaruga), 216-217 (vaca), 286-87 (pássaro canoro), 387-88 (sapo), 400 (avestruz).

[15] Para a pessoa fictícia do Sr. Chips ver James Hilton, Goodbye, Mr. Chips.

[16] Ver cap. 9, pp. 106-16.

[17] Ver cap. 27, pp. 377-82. Para publicação anterior ver Hollenweger, “Saints.”

[18] Oswald J. Smith, “Then Jesus Came,” 35.

[19] Esta liturgia está em Brown-York, Covenant. Discussion in ITh 1, 96ss.

[20] Sobre a importância do movimento carismático para o conflito na Irlanda, ver McCarthy, “Charismatic Renewal.” Idem, Significance; Kerr, Power to Love. Flynn, Irish Experience.

[21] De um folheto da “Apostolic Faith” (Portland, Oregon).

[22] Este capítulo é deliberadamente curto pois Cecil M. Robeck está preparando uma história detalhada do reavivamento da rua Azusa, na qual ele utilizará um arquivo detalhado contendo os nomes de todos os visitantes e/ou membros documentados das reuniões na rua Azusa, juntamente com uma história documentada de cada reunião ocorrida na primavera e no verão de 1906, fornecendo assim uma reconstrução minuciosa do desenvolvimento religioso e sociológico do reavivamento: Cecil M. Robeck, The Azusa Street Revival (em preparação). Um aperitivo é Robeck, “Azusa,” 31-36 (com uma lista dos estrangeiros que visitaram Azusa) e em Robeck, “Origins,” 166-80 (contra Robeck: Goff, “History,” 186-91). Lapoorta, “South Africa,” 25-33. Horn, “Experience,” 117-40. Lovett, “Black Origins.” Faupel, “Durham,” 85-96. DuPree, Biographical, resenhado por David D. Daniels, Pneuma, 13 (1, 1991), 86-88.

[23] Fontes: Nelson, For Such a Time as This. Para uma resenha completa desta importante dissertação incluindo suas debilidades ver van der Laan, C., EPTA Bulletin 4/1, 1985, 13-16. Literatura mais antiga em The Pentecostals, 22-24. Ver também MacRobert, “Black Roots,” 73-84; idem, Racism; idem, Black Pentecostalism; Hollenweger, “Bonhoeffer,” 192-201; Synan, “Seymour,” 778-81; Tinney, “Seymour,” 33-34; idem, “Blackness,” 27-36; Robeck, “Seymour,” 72-95; idem, “Taking Stock,” 35-60, em particular, 11-14; Brooks, Azusa Street Revival. Nelson-Gerloff, “Seymour,” 908-9; Irvin. “One Bond,” 25-53. São importantes as primeiras edições publicadas por Seymour de Apostolic Faith (Los Angeles, 1906-8), reimpressas em Corum, Like as of Fire; idem, God’s Glorious Outpouring dois vídeos documentários disponíveis na CTL Productions, P. O. Box 1428, Whittier, CA 90609). Van der Laan, C., “Portret,” 7-11.

[24] Citado por Clemmons, “True Koinonia,” 46-56, citação 52.

[25] “O surpreendente argumento que o pentecostalismo deveria ser repudiado baseado na conexão de Los Angeles foi provavelmente uma alusão às origens negras” (Van der Laan, C., “Proceedings,” 36-41, citação 39).

[26] Detalhes e documentos registrados por Gerloff, Plea, 67ss. (resenhado por Peter Hocken em Pneuma 15/1, 1993, 117-19).

[27] Um dos primeiros a “reavaliar” Parham foi Kendrick, Promise Fulfilled, 52ss.

[28] Goff, Fields (resenhado por Augustus Cerillo, Jr., em Pneuma 15/1. 1993, 77-88). Ver também Goff, “Parham,” 660-61.

[29] Goff, Fields, 164.

[30] Goff, Fields, 75.

[31] “O diabo tentou nos convencer que poderíamos ser médico e cristão ao mesmo tempo,” Parham, Charles F., Voice, 18-19; Goff, Fields, 28. Parham, Charles F., Voice, 46s; Goff, Fields, 41. Apostolic Faith (Topeka) 1 (13.9.1899), 7; Goff, Fields, 43. Kansas City Times (1901); Goff, Fields, 83.

[32] Apostolic Faith (Baxter), ed. especial (25.12.1910), 5 e 2 (2.8.1962), 2; Goff, Fields, 153.

[33] Goff, Fields, 141.

[34] Topeka State Journal 9.1.1901, 6; ver também 6.1.1901, 2 e 21.1.1901, 7; Goff, Fields, 102.

[35] Parham, Sarah E., Life, 163; Goff, Fields, 130.

[36] Goff, Fields, 132.

[37] E. G., Conn, Like a Mighty Army. Mas Harold Hunter (como Conn, da Igreja de Deus [Cleveland]) rejeita a alegação: Hunter, “Spirit-Baptism,” 1-17.

[38] Spittler, “Glossolalia,” 340. Ver cap. 17, p. 222.

[39] “Being the People God Called,” PE, 29.9.1991, 3-7, 20-21 (citação 6). Este é um relatório oficial do comitê sobre vida espiritual das Assembléias de Deus. Ver também Robeck, “Social Concern,” 97-106.

[40] Este capítulo começou como um capítulo em meu Pentecost Between Black and White. Agora aparece aqui numa versão revista, atualizada e anotada. Documentos, literatura e fontes sobre os pentecostais negros em Hollenweger, Black Pentecostal Concept. Cf., também, The Pentecostals, 22-24, 469s. Lovett, “Black Holiness-Pentecostals,” 76-84. Idem, “Black Theology,” 84-86. Idem, “Black Origins,” (As obras pioneiras de Lovett são uma mina de pensamento seminal e informação). Jones, C.E., Black Holiness (bibliografia).

[41] Brazier, Black Self-Determination, 5.

[42] Cf. Brazier, “Origin,” 3, como também o requerimento oficial de Brazier a junta executiva de sua igreja (Assembléias Pentecostais do Mundo; lit., documentos, fontes, Handbuch 02a.02.139; Hollenweger, Black Pentecostal Concept 59-67; Reed, “Assemblies,” 700-701) para “orientação quanto a participar nas demonstrações presentemente ocorrendo em Albany, Georgia. Ele leu um telegrama do reverendo Abernathy e do reverendo Martin Luther King solicitando ou o apoio de nossos bispos ou sua [do presbítero Brazier] presença nas demonstrações. Após a devida deliberação e aconselhamento, recomendamos que o presbítero Brazier agisse unicamente segundo sua própria consciência.” (1963 Minute Book of the Pentecostal Assemblies of the World, s.e., 1963, 63; Hollenweger, Black Pentecostal Concept, 67.)

[43] Brazier, Black Self-Determination, 12.

[44] The House of the Lord [A Casa do Senhor] (Hollenweger, Black Pentecostal Concept, 57ss.).

[45] No mínimo um milhão e meio, no máximo cinco milhões, dependendo se aceitamos ou não as estatísticas da Church of God in Christ [Igreja de Deus em Cristo] (3.700.000; 02a.02.075; Black Pentecostal Concept, 27) e da House of Prayer for All People [Casa de Oração para Todos os Povos] (Handbuch, 02a.02.097; Black Pentecostal Concept, 43ss). Barrett estabelece 3.400.000 (“Statistics,” 817).

[46] Bonhoeffer, “Bericht,” I, 97.

[47] Zenetti, Heisse, 7.

[48] Benz, Amerika.

[49] Ahlstrom, History, 1059s. Ver também Piepkorn, Religious Bodies (esp. Vol. III: Holiness and Pentecostal).

[50] Gerloff, Plea.

[51] MacRobert, Racism (para mais publicações de MacRobert sobre o assunto, ver a pequena lista de títulos no final deste livro).

[52] Cf. Jones, O. T., “Crisis,” e as obras de Lovett (ver a pequena lista de títulos no final deste livro).

[53] Handbuch, 02a.02.082; Hollenweger, Black Pentecostal Concept, 34-40. Jones, C. E., “Living God,” 211.

[54] Bispo F. D. Washington na 62a Convocação da Igreja de Deus em Cristo em 1969 (Holy Convocation, ed. J. O. Patterson, s.e., 1969).

[55] Wieser, Planning for Mission. Hollenweger, Church for Others. Idem, Kirche. Desenvolvido mais em ITh, 3 volumes.

[56] C. H. Mason (1866-1961) foi o quase lendário fundador da Church of God in Christ (biografia e literatura, Handbuch, 07.907.001; Clemmons, “Mason,” 585-88, literatura. Ver também Baer, “Socio-Religious.”

[57] Dugan, “Mass Evangelism.”

[58] Fidler, “History,” citado em Lovett, “Perspectives.”

[59] A discussão completa está em meu Handbuch, 02a.02.049. Fontes: Herskovits, Myth, Dubois, Souls, idem, Negro Church, von Hornbostel, “African Negro Music,” idem, “American Negro Songs,” Tiérsot, “La musique,” Ley, Spirituals.

[60] Lincoln-Mamiya, Black Church, 84, citado em Baer-Singer, African-American Religion, 176s.

[61] Synan, Holiness-Pentecostal.

[62] Ibid., 165.

[63] Fontes em Synan, Holiness-Pentecostal, 80, 137.

[64] Bartleman, What Really Happened at Azusa Street? 29.

[65] Boddy, “Ueber Land und Meer.”

[66] Harper, “Question,” 2-3.

[67] Synan, Holiness-Pentecostal, 180.

[68] Cf. um relato de um discurso proferido por W. H. Judd, ex-membro do Congresso, “Political Action,” 23.

[69] Assemblies of God, Our Mission in Today’s World, 85. Mas veja o tom bastante diferente no Cap. 3, p. 23 e no cap. 15, pp. 193s.

[70] Editorial no International Outlook (Los Angeles), out./dez. 1963, 15; citado em Synan, Holiness-Pentecostal, 179.

[71] Cunningham, “Social Concern,” 5.

[72] Assemblies of God, Our Mission in Today’s World, 133.

[73] Golder, History of the Pentecostal Assemblies of the World, 133.

[74] Lovett, “perspectives”; também em sua dissertação não publicada, “Black Holiness-Pentecostals,” 165; citado em Volf, “Materiality,” 447-67, citação, 462, nota 97.

[75] Jackson, G. P., “Spirituals,” 8.8-12.

[76] Läuchli, “Negro Spirituals,” 446ss.

[77] Odum, “Religious Folk Songs,” 265-365.

[78] Fisher, Negro Slave Songs.

[79] Lovell, “Social Implications,” 634-43. Ver também sua monumental obra intitulada Black Song. Também: Spencer, Protest and Praise.

[80] Krehbiel, Afro-American Folk Songs. DuBois, Negro Church.

[81] Washington, Booker T., The Story of the Negro.

[82] Johnson, Books of American Negro Spirituals.

[83] Von Hornbostel, “American Negro Music,” 30-62. Idem, “American Negro Songs,” 748-53.

[84] Mais literatura em Handbuch, 02a.02.049ss.; em Hollenweger, Black Pentecostal Concept, 9-10, e em idem, “Spirituals.”

[85] E. g., G. T. Haywood (“Jesus, teh Son of God,” “I See a Crimson Sream of Blood”; literatura em Robeck, “Haywood,” 349-50). T> Harris (“All That Thrills My Soul is Jesus,” “He’s Coming Soon,” “More Abundantly,” “By His Stripes We Are Healed,” “Pentecost in My Soul,” “Jesus Loves the Little Children”); Wilson, E. A., “Harris,” 347-48.

[86] Exemplos: Michael Tippet, Oratorio “A Child of Our Time,” e o Quarteto de Cordas de Dvorak, F maior, op. 96 (“Sometimes I feel like a motherless child”).

[87] E. g., Rutenborn, “Theologie,” 65-69. Hanft, “Theologie,” 160-68. Kern, “Jazz”; Koch, “Varationen,” 77s.

[88] Cone, “Black Spirituals,” 54-69, citação 60. Ver também idem, Spirituals and the Blues.

[89] Cone, “Black Spirituals,” 59.

[90] C. E. Lincoln, prefácio a Washington, J. R., Black Sects and Cults, ix-x.

[91] Ver Barrett, WChE. Idem, Schism and Renewal. Idem, “AD 2000,” 39-54. Criticando a percepção de Barrett: Osobo, “Fascinating,” 64-69. Mitchell, “Towards the Sociology of Religious Independency,” 2-21. As estatísticas de Barrett na década de setenta se mostraram acuradas. Seus críticos erraram pois não consideraram o poder inovador e missionário das igrejas pentecostais e independentes. Não sabemos se as predições de Barrett para o ano 2000 também serão acuradas. Porém, a tendência é clara.

[92] Gerlach-Hine, People, Power, Change.

[93] A literatura sobre glossolalia é enorme. Um dos primeiros foi o psiquiatra sul africano L. M. Vivier-van Eetveldt. Outros foram G. J. Jennings, V. H. Hine, W. J. Samarin, D. Christie-Murray, M. T. Kelsey, W. E. Mills, C. C. Williams, R. P. Spittler (Spittler também menciona a pesquisa européia do início deste século que não agrupava “glossolalia” sob “patologia,” e.g., Lombard e Mosimann). Robert Mapes Anderson (em seu por outro lado excelente Vision of the Disinherited) desconsidera pesquisa mais recente sobre glossolalia e portanto conclui pelo lado da antiga, mas agora ultrapassada, teoria da privação. Para uma bibliografia completa ver a pequena lista de títulos no final deste livro. Ver também cap. 26, pp. 358-62.

[94] Uma observação similar foi feita por G. Balandier sobre o surgimento do kimbanguismo no Zaire (cap. 6): “Temos que ver que aquela repressão organizada pelas autoridades belgas realmente estabeleceram a nova Igreja. . . .” (Balandier, Sociologie actuelle, 434s.).

[95] Mitscherlich, Die Unfähigkeit, 122.

[96] O Espírito Santo é uma mulher, dizem as feministas, pois “Ruach” é feminina.

[97] O assunto é desenvolvido mais ainda no cáp. 9, pp. 106-16, em Hollenweger, “Theology,” e idem, “Music,” 276-86. Sobre minhas peças e musicais ver Heuberger, “Hollenweger als Dichter und Liturgiker,” 61-72. Para uma lista de tais peças ver cap. 21, nota 29, p. 283.

[98] Robeck, “Taking Stock,” 35-60, citação 46s., minha ênfase.

[99] Solivan, “Cultural Glossolalia,” 25. Ver também, Butler, “Walls.”

[100] Synan, “Miracle,” n.p.; Robeck, “Memphis,” 36-73; Maempa, “Interracial,” 24-26.

[101] Reed, “Oneness,” 644-51.

[102] Ponto 10 do “Racial Reconciliation Manifesto” (“abandonando nossas hostilidades”), PE 4205, 11.12.1994, 25.

[103] Ver a fotografia em Ministries Today 13/1, Jan./Fev. 1995, 36.

[104] Ponto 4 do “Racial Reconciliation Manifesto” PE 4205, 11.12.1994, 25. Ministries Today 13/1, Jan./Fev. 1995, 38.

[105] Vozes críticas em relação a “Memphis” em Pneuma 18/1, Primavera de 1996 (contribuições por Clemmons, Lovett, Gaxiola-Gaxiola, Solivan, Amos, Robeck e Macchia).

[106] The Pentecostals, 111-75. Outras fontes são: Hayes, Black Charismatic Anglicans. Robinson, To the Ends of the Earth. Merwe Burger, Die Geloofsgeskiedenis. Horn-Louw. Eén Kudde. Watt, From Africa’s Soil. De Wet, Apostolic Faith Mission in South Africa. Horn, “Experience,” 117-40. Idem, “South African Pentecostals and Apartheid,” 157-68. Saayman, “Some Reflections,” 40-56 (fartamente documentado).

[107] O restante deste capítulo em sua maior parte segue Horn verbatim (“Experience,” 128-30).

[108] Merwe Burger, Die Geloofsgeskiedenis, 167.

[109] Zeigler, “Lake,” 531.

[110] Warner, “Hezmalhalch,” 389.

[111] Conquanto Kamphausen aceite minha teoria de que o sionismo é fruto do missionário pentecostal, ele afirma que o sionismo paralisou o etiopismo e roubou sua substância política. Ele faz uma citação de uma carta de Lake para o presidente do Transvaal, Louis Botha: “Temos trabalhado principalmente entre os etíopes com a intenção de submetê-los ao controle dos brancos. . . . Constatamos que quando os etíopes estão realmente salvos, eles abandonam seu etiopismo e aceitam de nós com alegria o governo e o controle dos brancos.” (Carta de Lake para Louis Botha, 27.9.1909, Secretary for Native affairs, vol. 92, Nº 36606, 1909, Gov. Arch. Pretoria; Kamphausen, Anfänge, 464. Kamphausen cita a carta em sua própria tradução em alemão. Eu traduzi a carta de volta para o inglês).

É certo que este documento reflete a opinião dos então missionários e também dos líderes atuais da Apostolic Faith Church. Mas isto não significa que os sionistas concordam com ele. Por quê todos eles se separaram da Apostolic Faith Church? Se o sionismo é apolítico é outra questão, uma vez que encontramos entre seus primeiros profetas líderes políticos como Elias Mahlangu (1881-1960) que filiou-se ao Congresso Nacional Africano (Sundkler, Zulu Zion, 61). Ou, para citar um exemplo de uma perspectiva diferente, um evangelista que soa tão apolítico quanto Nicholas Bhengu disse-me: “Não há razão em dizer a verdade aos europeus. Eles ouvem apenas o que querem ouvir. Estou muito velho para mudar alguma coisa. Porém, as coisas não podem continuar como estão.” Quão certo ele estava!

[112] Merwe Burger, Die Geloofsgeskiedenis, 147s; Burton, Pastor, 55s.

[113] The Pentecostals, 116ss.

[114] Burton, Pastor, 52. Livro de Atas da Apostolic Faith Mission, 6.11.1908, Sundkler, Zulu Zion, 54.

[115] Merwe Burger, Die Geloofsgeskiedenis, 175.

[116] Ibid. Ver também Lindsay, John Lake, 22. Sundkler, Zulu Zion, 54.

[117] Merwe Burger, Die Geloofsgeskiedenis, 422s.

[118] Ver também as notas de F. P. Möller em meu capítulo sobre a África do Sul, The Pentecostals, 121, 124s., 145s., 148, 155, 171, 173.

[119] Möller, Diskussie oor die Charismata, 18.

[120] Merwe Burger, Die Geloofsgeskiedenis, 80.

[121] Ibid., 175.

[122] MacRobert, “Black Roots,” 89.

[123] Ver cap. 6, pp. 54-80.

[124] Ver The Pentecostals, 149-75.

[125] Esta aceitação tácita foi rompida pela “Declaration of Solidarity with the Relevant Pentecostal Witness from South Africa” na “Conference on Charismatic and Pentecostal Research” em Kappel a. A., Suíça, em julho de 1991. Ela afirma: “Nós lamentamos que não denunciamos consistente e corajosamente o apartheid e a opressão política e a exploração econômica que este sistema imoral tem causado para nossos irmãos e irmãs na África do Sul. Também reconhecemos nossa atitude não crítica ao aceitarmos a informação disseminada pela mídia sem verificarmos independentemente os fatos sobre a luta contínua da Igreja na situação sul africana. Portanto nos arrependemos . . .” Publicada com uma introdução por Murray W. Dempster em Transformation 9/1. Janeiro/Março 1992, 32s. e em EPTA Bulletin 10/1. 1991, 34s. A declaração foi assinada por diversos eruditos pentecostais bem conhecidos.

[126] Embora Robeck mencione que McPherson encorajou a evangelista negra Emma Cotton, Robeck, “McPherson,” 568-71. Sobre a controvérsia sobre McPherson ver The Pentecostals, 487-88.

[127] Anderson, Robert Mapes, Vision of the Disinherited, 190.

[128] Ibid.

[129] Ibid.

[130] de Wet, Apostolic Faith Mission in South Africa, 181s.

[131] Anderson, Robert Mapes, Vision of the Disinherited, 191.

[132] Horn, “Experience,” 122. Clemmons, “Mason,” 585-88.

[133] Buck, “Logos,” 40s.

[134] Ibid.

[135] Crompton, “Tide Has Turned,”1-13. Ver também Poewe, “Links and Parallels,” 141-58.

[136] Citado em Anderson, Robert Mapes, Vision of the Disinherited, 190.

[137] Hollenweger, “Intercultural,” 526-56; MacRobert, Black Pentecostalism (bibl.).

[138] Isto tem enormes conseqüências para a missão pentecostal, ver cap. 22, pp. 288-306 sobre missão e cap. 6, pp. 54-80 sobre Simão Kimbangu.

[139] Horn-Louw, Eén Kudde, 78. Não estou certo sobre onde Horn fundamenta sua declaração. Sobre o treinamento de Seymour ver Nelson, For Such a Time as This.

[140] Möller, Church and Politics, 39s.

[141] Sobre Frank Chikane ver Chikane, No Life of My Own.

[142] De Wet, Apostolic Faith Mission in South Africa.

( N.T. Os boers foram os colonizadores holandeses calvinistas do sul da África e seus descendentes.

(( N.T. Os zulus eram um povo de língua banto formando o maior grupo étnico no sul da África quando da chegada dos holandeses.

[143] Lapoorta, “South Africa,” 28. Horn-Louw, Eén Kudde, citado em Lapoorta, “South Africa,” 28.

[144] Lapoorta, “South Africa,” 28.

[145] Horn, “South African Pentecostals and Apartheid,” 160.

[146] Le Roux, “Die Gees,” 6-7; citado em Horn, “South African Pentecostals and Apartheid,” 160.

[147] Robeck, “Pentecostals and Ecumenism,” 20. Ver também Hollenweger, “Koinonia,” 154-57.

[148] Esta seção está baseada quase inteiramente em Robeck, loc. Cit., Kairos Document, Evangelical Witness. Ver também Robeck, “Taking Stock,” 35-60, particularmente 48s.

[149]Möller, Church and Politics, 20.

[150] Robeck, “Pentecostals and Ecumenism,” 20.

[151] Publicado originariamente sob o título de “The Road to Damascus: Kairos and Conversion”; normalmente citado como A Relevant Pentecostal Witness.

[152] Ver em particular a interpretação de Lapoorta, “South Africa,” 28.

[153] Horn, “Apostolic Leadership.”

[154] Ver Donald Gee citado em The Pentecostals, 193.

[155] Ver a extensa discussão em The Pentecostals, 149ss.

[156] Anderson, Moya.

[157] Ver mais detalhes sobre isto em ITh 3.

[158] Anderson, Moya, 126-29.

[159] Ibid., 123. Um importante ensaio sobre este tema foi apresentado por Daneel na Conferência Brighton, intitulado “African”; também na International Review of Mission, 82/326, abril de 1993, 143-66.

[160] Watt, From Africa’s Soil, 197s.

[161] Ibid., 151-64.

[162] Ibid., 182s.

[163] Sobre este livro ver capítulo 20, pp. 266s.

[164] Poewe, “Theologies of Black South Africans,” 43-65, citação 46.

[165] Ibid., 46.

[166] Ibid., 47. Ver também Poewe-Hexham/Hexham, “Apartheid,” 78-83. Réplicas por J. N. Horn e Wynand J. de Kock no mesmo volume.

[167] Mais sobre teologia africana no capítulo 6, pp. 70-80.

[168] Este capítulo foi iniciado como um capítulo em meu Pentecost Between Black and White. Ele foi totalmente revisado, atualizado e anotado.

[169] Ver abaixo, p. 70.

[170] E. g., na África do Sul, cf. The Pentecostals, 120-22, 149-75 e Oshun, “Perspective,” 105-14; EPTA Bulletin 4/2, 1985, 73s.

[171] Ver o relato mais antigo (Nfinanangani-Nzungu, “Kimbangu,” 15-42). O documento foi encontrado nos arquivos do Service Colonial des Affaires Indigènes et de la Main d’Oeuvre, Léopoldville (atual Kinshasa). Ele mencionar Kimbangu falando em línguas duas vezes: “Eu falei em uma língua estranha” (“Kimbangu,” 24); “Ele falou em uma nova língua” (“Kimbangu,” 35). No presente, tremores e o falar em línguas são desencorajados.

[172] Este aspecto foi tratado particularmente por E. Bazola em sua análise sociológica, Bazola, “Kimbanguisme,” 144-52.

[173] The Pentecostals, 99-108.

[174] Zaire é o nome africano para o antigo Congo Belga [N.T. O nome atual do país é República Democrática do Congo].

[175] Este é o nome do antigo Conselho Protestante de Igrejas, no qual muitas igrejas missionárias protestantes foram forçadas a entrar por decreto do governo. Nas estatísticas abaixo todas as igrejas com o prefixo “communauté” são membros da Eglise du Christ au Zaïre.

[176] Asch, Kimbangu, 91.

[177] Barrett, WChE, 762s.

[178] Wilson, E. A. G., Making Many Rich, 161-70. Carmichael, “Congo,” 19s.

[179] Steiner, L., Mit folgenden Zeichen, 98. Burton, “Kongo.” 19ss; idem, Man; idem, Working; idem, Village; idem, Pastor; idem, Missionary; idem, Signs; idem, Mafundijyo. Moorhead, Congo Forest. Gee, Flesh, 63-67 (também em Gee, Wind and Flame, passim); Frodsham, With Signs Following, 165-75; Hodgson, Out of the Darkness.

[180] Giraud, “Congo,” 35/7-8:22-23; 35/11:24-25. Vernaud, “Congo,” 37/6:23-24; 37/7-8:20-21; 36/10:21-22.

[181] Andresen, “Literaturmisjon,” 189-92. Bårdli, “Skolearbeidet,” 176-88. Børresen, “1955-1960,” 165-69. Orlien, “Sykehuset i nay Kaziba,” 169-75.

[182] Stenholm, “Svenska,” citado por Blomquist, Svenska pingstväckelsen, 264.

[183] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 56s.

[184] Mukuan, “Dupl. Minutes.” Cf. também, Service oecuménique de Presse 38/15, 10.6.1971, 2 (CMI, Genebra, apenas na edição francesa) e Ecumenical Press Service 39/2, 20.1.1972.

[185] The Pentecostals, 126-139; acima cap. 5, pp. 41-43.

[186] “A vila de Banza Mateke, cento e vinte quilômetros ao nordeste de Matadi, Congo belga, tornou-se o centro de um movimento religioso nacionalista que está causando certa preocupação entre os missionários no Congo. O movimento ‘Ngunza’ é extremamente nacionalista, tendo jurado ‘lançar todos os brancos no oceano’. Ele tem em seu credo uma mistura de louvor espiritual, materialismo e elementos do cristianismo. Seu Cristo é um congolês, Simoni Kimbangi (sic), que viveu uma boa vida e morreu como católico romano. Eles defendem que ‘Jesus Cristo é o salvador do homem branco. O nosso é Simoni Kimbangi, e ele logo ressuscitará dentre os mortos e nos guiará à vitória’. Os pregadores Ngunza oram ‘no nome do Pai e de Simão, e do Espírito Santo’. Não raramente milhares vêem para esta vila trazendo seus enfermos para o pregado Ngunza Gabriel Mabwaka, para oração, esperando por algum milagre para aliviar seu sofrimento. O ritual inclui elementos de feitiçaria e oração deturpada. Para derrotar essa religião ‘pseudo cristã’ será necessário oração verdadeira no nome de Nosso Senhor Jesus Cristo.” PE 2401, 15.5.1960, 10. Contra estas exprobações ver pp. 69s.

[187] Krust, “Kimbanguistenkirche,” 147-48. Cf. também Steiner, L., “Kimbanguistenkirche.”

[188] Parcialmente sumarizados em um documento que foi redigido conjuntamente pelo CMI e os kimbanguistas, “The Kimbanguist Church in the Congo,” publicação: Ecumenical Review 19/1, Jan. 1967, 29-36. Alguns dos mais importantes de tais documentos são citados e resumidos por Niederberger, “Kimbangu-Kirche,” 215-19.

[189] Além da literatura mencionada nas notas, é necessário acrescentar: Béguin-Martin, “Kimbanguisme,” 5-37; Casebow, Kimbanguisme. “Le Kimbanguisme,” Courrier hebdomaire 8.1.1960. Dialungana, Kisikulusa; Diangienda, “Kimbanguisme,” 16-17; idem, “Coup”; Lasserre, “L’Eglise,” 45-52; Lerrigo, “Prophet Movement in the Congo,” 270-77; Luzolo, Mvand’avelela; Martin, M.-L., “Prophetism in the Congo,” 154-63. Idem, Prophetic Christianity in the Congo; Masembo, Le Prophétisme kongo. Mwene-Batende, Etude sociologique; Ntontolo, Mouvements prophétiques; Ryckmans, Les mouvements prophétique du kongo; Doutreloux, “Prophétisme”; Lanternari, Movimenti, 11ss. Bibliografia em Mitchell-Turner, Bibliography. Atualização em Journal of Religion in Africa 1, 1968, 173-210. Chassard, “Essai de bibliographie,” 43-49.

Afora os trabalhos de Susanne Asch, a pesquisa mais importante é a de Werner Ustorf, Afrikanische Initiative. Em seu Christianized Africa—De-Christianized Europe? Ustorf resume suas idéias de uma forma menos crítica (34, 43s, 49-57, 60-70, 73s, 99). Para uma pesquisa sólida sobre o kimbanguismo, a obra Afrikanische Initiative de Ustorf é indispensável.

[190] Entre os documentos, até então desconhecidos, são particularmente importantes: relatos dos secretários de Simão Kimbangu, Nfinangani e Nzungu, que foram confiscados pela administração colonial belga em 17.6.1921 (ver acima, nota 4); um relatório da administração belga (assim chamado “documentos secretos belgas) que caíram nas mãos dos kimbanguistas em 1960; diversas cartas e relatórios por missionários da Sociedade Missionária Batista Britânica (em seus arquivos em Londres) e outros.

[191] Nkanda Bisamu bia Simon Kimbangu. Subtítulo francês: Office du prophète Simon Kimbangu, 1961.

[192] Chomé, Kimbangu; Raymaekers em sua introdução ao documento mencionado na nota 4.

[193] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 48; tradução inglesa: Kimbangu, 40.

[194] Asch, Kimbangu, 165.

[195] Casebow em 23 de abril de 1958, escrevendo de Ngombe Lutete a Carta Circular nº 2 ao Baptists Missionary Headquarters (Arquivo da Sociedade Missionária Batista, Casebow Papers; Ustorf, Afrikanische Initiative, 122, 154. Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 70). Os líderes atuais do kimbanguismo dizem que Kimbangu foi um catequista com os batistas.

[196] Ordonnance de 10.8.1920, citado por Feci, “Kimbangu,” 9, de acordo com o Progrès colonial de 16.6.1921 e 23.6.1921, citado em Asch, Kimbangu, 21.

[197] Fontes in Ustorf, Afrikanische Initiative, 125.

[198] “De l’esprit” no sentido francês significa “inteligência.”

[199] Nfinangani-Nzungu, “Kimbangu,” § 2.

[200] Choffat, “Kimbanguiste,” 4.

[201] Desanti, “Golden Anniversary,” 7-19 (com excelente fotografias).

[202] De um rascunho não publicado de Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse.

[203] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 74; inglês; Kimbangu, 47 (tradução minha).

[204] Buana-Kibongi, “Kimbanguisme,” 75-81. Esta formulação é muito similar a de Montano. O uso que Tertuliano faz do termo “Espírito,” “quando descrevendo Montano parece ter sido sua maneira de igualar as palavras de Montano com os ensinos do Espírito, não suas pessoas.” Robeck, Prophecy, 260, nota 27. Sobre a famosa comparação do homem “como uma lira” ver Robeck, Prophecy, 287, nota 29. Robeck é um erudito pentecostal especializado em patrística que escreve sobre profecia em Cartago como alguém que está consciente dos problemas e promessas da profecia e revelação permanentes nos dias atuais. Ver também Robeck, “Canon.” Devo está reflexão comparativa ao Dr. Robeck.

[205] Asch, Kimbangu, 17, 19, citando van Wing, “Kimbanguisme,” 563-618, citação da p. 565.

[206] Choffat (“Kimbanguiste,” 32, nota 34) cita algumas vozes de La Voix du Rédempteur, agosto de 1921 e dezembro de 1921; da mesma forma Bertsche (“Kimbanguism,” 18) cita Dunfoneny, Congo, 2/4, 1924, 380-88.

[207] Ustorf, Afrikanische Initiative, 194.

[208] Isto é contradito por uma oração de Simão Kimbangu que tem sido guardada: “Abençoe todas as raças da terra, as grandes e as pequenas, mulheres e homens, brancos e negros” (publicada no documento kimbanguista Mise au points, 1957, citada por Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 77.) Cf. Gilis, Kimbangu, fondateur de l’église, 39, e ainda mais por uma declaração que apareceu no periódico Kimbanguisme (nº 1, maio de 1960): “Nossa religião permanece aberta para todas as raças” (citada por Decapmaeker, “Kimbanguisme,” 64). Apesar do tratamento áspero e injusto, que os kimbanguistas receberam dos brancos, foi um kimbanguista (Charles Kosolokele) que durante os levantes em 1960 usou de toda a sua influência para libertar os brancos (Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 171. Hoskyns, Congo, 90). Por outro lado é verdade que, de acordo com Bazola, os kimbanguistas ocasionalmente criticavam os missionários. Mas não se pode deduzir facilmente disto que eles detestassem os brancos. Ver e.g.: “Os missionários católicos e protestantes nos trouxeram o Evangelho e a doutrina de Jesus Cristo, o Filho Unigênito de Deus, que morreu na cruz para a salvação de todos os homens, os quais, pelo pecado de Adão, violaram o ideal divino que tornou-se impossível de ser atingido por causa da natureza degenerada daqueles” (Wikisi-Yowani-Luntadila-Diata, Mise au point, citado por Bazola, “Kimbanguisme,” (133). “Os missionários falsificaram a mensagem do Evangelho ao esconderem certa doutrina, ou seja, aquela sobre o Espírito Santo” (Bazola, “Kimbanguisme,” 148).

[209] Cf. a obrigação de pagar impostos na ética kimbanguista, abaixo p. 67.

[210] Nfinangani-Nzungu, Kimbangu, nota 4.

[211] O Relatório Morel em Ryckmans, Les mouvements prophétique du kongo, 47 e em Ustorf, Afrikanische Initiative, 375, nota 4. Os relatórios da administração colonial eram extremamente racistas e superficiais. Eles acusavam Kimbangu de “superstição” (Rapport de l’administration du Congo Belge, 1922, citado em Asch, Kimbangu, 28) ou de doença mental (mesmo relatório, 1921, Asch, Kimbangu, 25).

[212] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 87s.; inglês, Kimbangu, 57 (tradução minha).

[213] Ryckmans, Les mouvements prophétique du kongo. De fato, é possível que Kimbangu tenha estado em contato com as idéias de alguns batistas negros cujas idéias podemos resumir da seguinte forma: a) a civilização negra está na raiz da civilização européia; b) os negros têm que romper suas cadeias e se tornarem novamente pioneiros da humanidade; c) o próprio Cristo era negro; d) ele convoca os negros a criarem sua própria religião baseados em suas próprias tradições. Para conexões entre os batistas negros e Kimbangu, ver Asch, Kimbangu, 21s. Em uma visita a Kinshasa os kimbanguistas me disseram que dois deles tinham tentado visitar o então idoso Morel para dizer-lhe que eles o haviam perdoado. Embora eles tivessem voado para Bruxelas para tal visita, Morel não os recebeu.

[214] Chomé, Kimbangu, 72.

[215] Um açoite posterior, quando ele foi entregue à prisão, é descrito da seguinte maneira por um dos agentes coloniais: “Primeira disciplina. Meu Kibangu [sic] fez por merecer suas chicotadas, ele as receberá, isto está claro. Os kimbanguistas sorriram. Eles pensavam que o chicote se quebraria no ar. Kibangu e sua epiderme são santas, intocáveis. Um milagre estava para acontecer. Emoção. Silêncio. Chiplá! Meu profeta chora desesperadamente. Sua . . . bem, você sabe o quê, era sensível como a de qualquer um. Chiplá! Ele está se contorcendo de dor. Aquilo foi o fim. Kibangu entendeu que ele não era profeta e os outros prisioneiros também aprenderam isso. Aquilo cura muita coisa, o chicote.” (declaração de Enauts, citado em Chalux [pseudônimo], Congo Belge, 409).

[216] A situação difícil dos missionários protestantes que “foram pegos num fogo cruzado entre a administração, cristãos católico-romanos e cristãos protestantes africanos” (Irvine, “Birth,” 23-76) é discutida por Ustorf, Afrikanische Initiative; Irvine, “Birth”; e Fehderau, “Prophetic Christianity,” 157-78.

[217] Nsenkoto, La Croix du Congo, 25/46, 17.11.1975, 1s. citado em Ustorf, Afrikanische Initiative, 457s. Semelhante a van Wing (“Kimbanguisme” nota 39) e Ngindu, “Colloque,” 631-45.

[218] Sinda, Le messianisme congolais, 85.

[219] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 97; inglês: Kimbangu, 64.

[220] Gilis, Kimbangu, fondateur de l’église, 109.

[221] Ustorf, Afrikanische Initiative; 184.

[222] Weber, H.-R., “Bibel,” 97-107.

[223] Bolamba, Diaconie, 19; Asch, Kimbangu, 23. Os hinos kimbanguistas foram coletados pela polícia belga, ver Boka-Raymaekers, Chants.

[224] Sobreviveram apenas 2685. Asch, Kimbangu, 40, citando um documento de Luntadila, novembro de 1971, 3 (arquivos EJCSK, Secretariado Geral). Também Desanti, “Golden Anniversary,” 18.

[225] Tais campos de concentração estão documentados em Asch, Kimbangu, 33.

[226] Boka-Raymaekers, Chants, nº 3.

[227] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 151-53; inglês: Kimbangu, 105 (minha tradução); Asch, Kimbangu, 38s. Os kimbanguistas já haviam agido de modo semelhante anteriormente: em 1923, quando diversos catequistas foram presos (Balandier, Sociologie actuelle, 443) e em 1964 (N.T. sic) em Stanleyville (Choffat, “Kimbanguiste,” nota 34, 12). Ustorf (Afrikanische Initiative) considera a estória uma lenda. Ele considera a obra Kirche ohne Weisse (inglês: Kimbangu) de Marie-Louise Martin, em termos gerais, uma adaptação não crítica da “história eclesiástica oficial” da atual hierarquia kimbanguista no poder. Mas Asch fornece boa documentação. Ustorf também expressou sua crítica a “história oficial” na resenha de L’histoire du Kimbanguisme de Diangienda publicada em Zeitschrift für Mission 11/4, 1985, 248-50.

[228] Luntadila, L’Essor.

[229] Catéchisme 11.7.1957, questão 1: Qui est Tata (título respeitoso que significa pai dirigido a todo homem adulto) Simon Kimbangu? Resposta: “Tata Kimbangu est l’envoyé de Notre Seigneur Jésus-Christ.” No catecismo kikonga (1958) a passagem correspondente diz o seguinte: “O Tata Simon Kimbangu inani? O Tata Simon Kimbangu i Ntumwa Nfumu’ eto Yesu Klisto” (ambos os catecismos citados no todo por Raymaekers, Zaïre, 737-40.

[230] Dialangana, Zolanga, nº 3; citado por MacGaffey, “Beloved City,” 138.

[231] Dialangana, Tanganinia, 22ss.: “Tata caminhou extamente sobre as pegadas de Nosso Senhor Jesus Cristo. Devemos segui-lo, pois Nosso Senhor o escolheu para mostrar-nos o caminho.” Citado por Martin, M.-L., Kirche Ohne Weisse, 205; inglês: Kimbangu, 145.

[232] Dialangana, Zolanga, nº 4.7: “Porque Simão Kimbangu obedeceu a voz de Jesus, todas as coisas prometidas se cumpriram nele, a obra de Jesus foi revelada e os nomes de Deus o Pai e do Senhor Jesus foram glorificados. Desde a chegada dos missionários nunca tinha acontecido dos mortos ressuscitarem, os coxos andarem e os cegos enxergarem, ou que as pessoas de livre vontade abandonassem seus feitiços ou desejassem orar a Deus. E somente então nós o povo do Kongo soubemos que Deus e Jesus se lembraram de nós. O pesar e o sofrimento de nossos pais foram ouvidos por Deus o Pai, e as lágrimas de nós, povo negro, foram enxutas no Kongo” (citado por MacGaffey, “Beloved City,” 139).

[233] Catéchisme, 11.7.1957, questão 2: “Comment le savons-nous que Tata Simon Kimbangu est l’envoyé de Notre Seigneur Jésus-Christ? Jésus-Christ lui-même nous a promis de demander à son père de nous envoyer un autre Consolateur pour réaliser plus que lui. Lisez Jean 14.12-18.” Kikongo: “Bweyi tuzayidi vo tata Kimbangu Simon i Ntumwa Klisto? Kadi Yandi Mfumu eto Yesu Klisto kibeni watusila nsila vo sikatulombela kwa Se katufidisila onsadisi wa nkaka yni sikavanga mavangu masundidi (Womai 14:12-18),” citado por Raymaekers, Zaïre, 737-40).

[234] Os catecismos de 1957 (resposta 13) falam de Kimbangu, que “est mort et résuscité et demeure avec nous en tout esprit.” Questão 11: “Tata Simon Kimbangu saura-t-il revoir encore? Quelle est la conclusion de tout cela? Certes, il reviendra, car tout ce qui a commencé doit avoir sa réalisation! Jean 16.19-33” (citado por Raymaekers, Zaïre).

[235] Catéchisme, 1957, questão 20: “A quel moment Tata Simon Kimbangu a-t-it commencé? Il demeurait avec Dieu dès le commencement (Jean 1.1),” citado por Raymaekers, Zaïre, e Gilis, Kimbangu, fondateur d’église, 104. Le Catéchisme concernant le prophète Simon Kimbangu (N’Kamba 1970) igualmente (1.4, citado por Wainwright, “Reflections,” 22s.

[236] Catéchisme, 1957, questão 19 e hino nº 5 na coleção de hinos mencionada na nota 56 acima, também citado por Bazola, “Kimbanguisme,” 132s.

[237] Calendário da igreja kimbanguista de 1969: Simão Kimbangu “intercede pelas necessidades dos fiéis junto a Jesus, de forma que ele possa mostrar misericórdia.” (Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 208). Da mesma forma na revista da igreja, Kimbanguisme (2.9.1960), em um artigo de Victor Fwakwanzo: “Oh prophète, vous qui aves répondu à la voix de Dieu, vous qui avez vécu tant de peines pour le salut de tous les hommes sans distinction de couleur ni de race, vous qui avez vécu une vie misérable ici-bas, vous qui prêchez l’amour du prochain, vous qui avez été maltraité pour avoir prêché la doctrine divine, vous qui avez vécu une vie semblable à celle de Notre Seigneur Jésus-Christ, nous vous implorons que ceux qui vous ont fait souffrir soient pardonés, car ils ne savaient pas que vous êtes l’envoyé de Dieu.” Lasserre, “L’église,” 26.

[238] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 208; inglês: Kimbangu, 147 (minha tradução).

[239] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 215s; inglês: Kimbangu, 152 (minha tradução).

[240] M’Vuendy, Kimbanguisme.

[241] Asch, Kimbangu, 76, 81.

[242] Dialangana, Zolanga nº 3.1; citado por MacGaffey, “Beloved City,” 136.

[243] Sobre isto cf. Sinda, Le messianisme congolais. Hollenweger, Marxist and Kimbanguist Mission; idem, ITh 1 (índice). Banda-Mwaka, “Kimbanguisme,” 3-53. Cf. também a “mensagem para todos os cristãos” da EJCSK, publicada no Zeichen der Zeit 3/193, 112.

[244] Citado por Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 186; inglês: Kimbangu, 132 tem uma versão diferente. Uma ordem eclesiástica semelhante de 1959 é citada por Raymaekers, Zaïre, 695.

[245] Diangienda, “Eglise et politique,” 41.

[246] “Un fidèle de l’EJCSK ne peut accepter de propager ou d’adhérer à une idéologie, doctrine ou théorie sur laquelle se fonde un système politique, économique et social Qui tend à expliquer l’évolution historique du monde en écartant l’intervention divine” (Diangienda, “Eglise et politique,” 40). Cf. também Diangienda, “L’EJCSK face aux problèmes politiques, économiques, sociaux tel qu’ils se posent au Congo, en Afrique et dans le monde” (dupl.; citado por Bertsche, “Kimbanguism,” 27), onde é feito um pedido por serviço médico gratuito, educação gratuita para todos os cidadãos e outras coisas mais.

[247] Asch, Kimbangu, 109, 130-33, 74-78.

[248] Ver sobre isto mais detalhadamente em Raymaekers, Zaïre, 675-756, e Masson, “Chants kimbanguistes,” 82-90.

[249] No relatório, mencionado na nota 4, p. 35.

[250] Pode-se ficar tentado a descrever os passos estilizados rítmicos desta cerimônia como uma dança. Mas a dança é altamente controversa (tanto sacrada como secular) na igreja kimbanguista, cf. acima, p. 67, Raymaekers, Zaïre, 587s e Asch, Kimbangu, 143.

[251] Cf. Niederberger, “Kimbangu-Kirche,” 215-22. Italiaander, “Prophet,” 31-44. Martin, M.L., “Afrikanische Gestalt,” 16-29. Comitê Central do CMI, Minutes and Reports of the 23rd Meeting, CC 1969 (Canterbury), 11. La Documentation catholique, nº 1547, set. 1969, 830: “L’Eglise Kimbanguiste admise au C. O. E.”

[252] Isto pode ser percebido no nome da igreja: Eglise de Jésus-Christ sur la terre par le prophète Simon Kimbangu. “Sur la terre” pode ser entendido como uma tradução de “kat’holen ten gen” (católica). O conhecimento de idiomas e os cultos em muitas línguas entre os kimbanguistas (kikongo, lingala, Tchiluba, francês) sublinham a ecumenicidade da igreja (Heimer, “Kimbanguists,” 16-17).

[253] Citado no relatório dos secretários de Kimbangu, citado acima na nota 4 (p. 21).

[254] Carta de 15.7.1969, arquivo do secretariado geral do CMI.

[255] O líder pentecostal brasileiro Manuel de Melo argumentara de forma semelhante: The Pentecostals, 99-110. De Melo, “Participation,” 245-48.

[256] Diangienda, em uma entrevista com Desanti, “Golden Anniversary,” 18.

[257] Se isto significa uma solução transitória ou uma adaptação à política denominacional geral das igrejas cristãs (influência negativa da fraternidade ecumênica!) ainda não se sabe.

[258] Martin, M.-L., “Congolese Church Celebrates,” citando um informativo para a imprensa não datado escrito por Luntadila (“Réflexions sur la Sainte Cène”).

[259] A educação é realizada parcialmente através de cursos noturnos.

[260] A educação é realizada dentro do quadro geral da espiritualidade kimbanguista.

[261] Wainwright, “Reflections,” 18-35. Cf. também, van Wing, “Kimbanguisme,” 618.

[262] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 203; inglês: Kimbangu, 175 (minha tradução).

[263] Fehderau, “Prophetic Christianity,” 178.

[264] Bertsche, “Kimbanguism,” 32.

[265] Sobre tal compreensão de salvação ver os ensaios do estudo ecumênico sobre “Estruturas de uma congregação missionária.” Wieser, Planning for Mission; Hollenweger, Church for Others; idem, Kirche. Ver também o capítulo 19 sobre soteriologia, pp. 246-57.

[266] Martin, M.-L., Kirche ohne Weisse, 248-50; inglês: Kimbangu, 175-77 (minha tradução).

[267] Pobee, Exploring Afro-Christology. Parrat, Reader in African Christian Theology. Berinyuu, Pastoral Care. Lartey, Pastoral Counseling.

[268] E. Fasholé-Luke, in Anderson and Stransky (eds.), Mission Trends nº 3, 137; citado em Dickson, Theology, 4.

[269] Dickson, Theology, 10.

[270] Mitscherlich, Die Unfähigkeit.

[271] Dickson, Theology, 198.

[272] Wink, Bible in Human Transformation, 10. Mais sobre isto no capítulo 23, pp. 307-25.

[273] Kendall, “Missionary Factor,” 16.

[274] Tasie-Gray, “Introduction,” 7.

[275] Hastings, “Ministry,” 38. Cf. também Hastings, History of African Christianity.

[276] Kalilombe, “Local Churches,” 89.

[277] Tasie-Gray, “Introduction,” 4. Setiloane, “Traditional,” 404 (citando Sundkler, African Studies, 20.4.1961, 203).

[278] Turner, “Patterns,” 50. Eu visitei a mesma igreja e fiquei impressionado por sua vitalidade, abertura e espírito inovador (e.g., na arquitetura da igreja).

[279] Omoyajowo, Äladura Churches,” 99.

[280] Tasie-Gray, “Introduction,” 7.

[281] Ibid., 12.

[282] Swantz, “Changing Role,” 145.

[283] Steady, “Role of Women,” 156.

[284] Tasie-Gray, “Introduction,” 8.

[285] Mushete, “Authenticity and Christianity in Zaïre,” 238.

[286] Ayandele, “Appendix,” 612.

[287] Linden, “Rwanda,” 250.

[288] Fasholé-Luke, “Introduction,” 358.

[289] Tutu, “Whither African Theology?” 368s.

[290] Setiloane, “Traditional,” 406.

[291] Barrington-Ward, “Centre Cannot Hold,” 455-70. Singleton, “Direction,” 471-78.

[292] Bastide, Les religions africaines au Brésil, 515 (The Pentecostals, 97).

[293] Desanti, “Golden Anniversary,” 15 (somente na versão francesa desse artigo).

[294] Sobre a introdução da Comunhão ver acima, p. 70.

[295] Raymaekers, “Kimbanguisme,” 7-14.

[296] Asch, Kimbangu, 51.

[297] Sobre essa igreja e seu líder ver ibid., 37, 68, 64, 67.

[298] Ustorf, Afrikanische Initiative, 222.

[299] Ibid., 51.

[300] Asch, Kimbangu, 95, 299.

[301] Ibid., 117, 183, 185, 187, 190, 256.

[302] Ibid., 204.

[303] Este capítulo foi iniciado em espanhol (Concepto Latinoamericano III: “Flores y Cantos.” Un Concepto Mexicano, Concept, Edição Especial 32, outubro de 1970, Genebra: Conselho Mundial de Igrejas). Mais tarde foi publicado um resumo na International Review of Mission (60/238, abril de 1971, 232-44) e em meu Pentecost Between Black and White. É publicado aqui em uma versão revisada, atualizada e anotada. Além das fontes citadas nas notas seguintes pode-se consultar: Gaxiola-Gaxiola, “Inicios del Pentecostalismo en Mexico,” 25-48. Idem, “Pentecostal Ministry,” 57-63. Idem, The Serpent and the Dove. Goodman, “Apostolics of Yucatan.” Idem, “Shaman,” Pneuma 13/2, 1991, contém artigos originais de pentecostais latino-americanos e uma excelente bibliografia (193-97). Uma vez que este é primariamente um capítulo no qual é discutida a raiz oral (em alguns casos pré-cristã) do pentecostalismo, não entro em uma história detalhada do pentecostalismo no México.

[304] Tema da “Comissão Fé e Ordem,” 1971, em Lovaina. Cf. o documento-estudo “Unity.” Também J. Robert Nelson, “Unity of the Church.”

[305] Orchard, Witness in Six Continents.

[306] Philip Potter em uma entrevista sobre a “assim chamada crise de Missão.” “Zur sogenannten Grundlagenkrise der Mission.”

[307] Gaxiola-Gaxiola, Mexican, 49. Ver também seu “Inicios del Pentecostalismo en Mexico.”

[308] Gaxiola, Mexican, 48.

[309] Ibid., 49.

[310] Ibid., 256.

[311] Ibid., 301.

[312] Boletin de Cencos A. C. Nº 4164, México, 13.5.1970. Freire, Pedagogy.

[313] Léon-Portilla, La filosofia náhuatl, XV.

[314] Ibid., XVI.

[315] Soustelle, La vie quotidienne, 203; León-Portilla, La filosofia náhuatl, 224.

[316] Códice Matritense de la Real Academia (textos en náhautl de los indígenos informantes de Sahagún), ed. Facs de Pasy y Troncoso, Madrid, VIII, 1936, 118r, 118v; León-Portilla, Aztec Thought and Culture (trad. Inglesa de La filosofia náhuatl), 63s. Sobre a gramática da antiga língua mexicana: Garibay, Llave de Náhuatl.

[317] Te-ix-tomani, ibid.; León-Portilla, Aztec Thought, 13; idem, La filosofia náhuatl, 68.

[318] Itech netlacaneco, ibid.; León-Portilla, Aztec Thought, 15; idem, La filosofia náhuatl, 70.

[319] Ibid. 118/19; León-Portilla, Aztec Thought, 27, 73; idem, La filosofia náhuatl, 84. In xochitl in cuiatl; Peñafiel, Cantares Mexicanos, 13r; León-Portilla, Aztec Thought, 76; idem, La filosofia náhuatl, 153.

[320] In cuéitl in huipilli—in atl in tépetl—yohualli ehécatl. León-Portilla, Aztec Thought, 102; idem, La filosofia náhuatl, 178.

[321] Peñafiel, Cantares Mexicanos; León-Portilla, Aztec Thought, 181; idem, La filosofia náhuatl, 320.

[322] Peñafiel, Cantares Mexicanos, 11v; León-Portilla, Aztec Thought, 182; idem, La filosofia náhuatl, 321.

[323] Peñafiel, Cantares Mexicanos, 17r; León-Portilla, Aztec Thought, 7; idem, La filosofia náhuatl, 60.

[324] ?Cuix oc nell’n tlaca? Peñafiel, Cantares Mexicanos, 10v; León-Portilla, Aztec Thought, 7; idem, La filosofia náhuatl, 61.

[325] Ma oc netlataneuh o nican in antocnihuam. Peñafiel, Cantares Mexicanos, 17r; León-Portilla, Aztec Thought, 124; idem, La filosofia náhuatl, 203.

[326] Biermann, Las Casas, 59.

[327] Lehmann, Sterbende Götter. O excelente livro de fontes contém o texto no original náhuatl e em uma tradução em espanhol antigo por José Maria Pou y Marti, El libre perdido.

[328] Lehmann, Sterbende Götter, 93.

[329] In tloque navaque (nome de Deus).

[330] Lehmann, Sterbende Götter, 102.

[331] Ibid.

[332] Biermann, Las Casas, 55.

[333] No tratado “Sobre los indios hechos esclavos.” Las Casas, Opúsculos, 257-90 (citação Obras V); citado em Biermann, Las Casas, 53.

[334] Em Doce Dudas (Obras V, 478-536); Biermann, Las Casas, 71.

[335] Biermann, Las Casas, 18.

[336] Na Representación (Obras V, 123-33; Biermann, Las Casas, 26, nota 99.

[337] Ximénez, Historia, I, 346; Biermann, Las Casas, 32.

[338] Biermann, Las Casas, 43.

[339] Las Casas, Apologia, preservada como manuscrito na Bibliotèque Nationale, Paris, Nuevos Fondos Latinos 12, 926. Biermann, Las Casas, 43.

[340] Maldonado, “Mexicanos,” 20-25.

[341] Cf. e.g., Bernal, Cien obras.

[342] Estatísticas exatas sobre o pentecostalismo mexicano são difíceis de estimar. Cf. Handbuch, 02b.22. O melhor provavelmente é Barrett, WChE, 487, que fornece para 1980 550.000 protestantes e 1.500.000 independentes mexicanos (a maioria dos quais pentecostais). Mais estatísticas em Gaxiola, Mexican, 227, e em Müller, “Mexiko,” 692, onde ele menciona mais de quatro milhões de protestantes (1990); mas ele não separa esse número em protestantes e pentecostais e independentes, respectivamente. Para o conjunto da América Latina cerca de 25% da população será de evangélicos, a maioria pentecostais (2000; Zanuso, Iglesias, 267; Gaxiola-Gaxiola, “Latin American,” 107, 129, citação 107. No Brasil há mais pessoas nas igrejas das Assembléias de Deus do que católicos nas igrejas cat

ólicas (14.400.000 contra 12.600.000), daí as declarações exaltadas de bispos católicos e do papa (Robeck, “Southern,” 101-6, citação 102).

[343] Barrett, WChE, 491. Amerlinck y Assereto, Ixmiquilpan, 88.

[344] Os importantes diários de Andrés Ornelas Martínez estão na sede da Iglesia Cristiana Independiente Pentecostés em Pachuco (Hgo). Lá pode-se encontrar também a autobiografia do fundador (atualmente esgotada). Literatura sobre Martínez e sua igreja: Amerlinck y Assereto, Ixmiquilpan, 88s. Crouch, World Outlook, 33-35. Ornelas, “Libertad.” Espinosa, “Datos.” Idem, “Cinco.” Tschuy, “Lateinamerika,” 1-4. Ramírez, Bodas de Oro.

[345] Ramírez indica El Saus de los Ibarras como a cidade natal de Andrés Ornelas (Bodas de Oro, 24).

[346] Esse é o dado biográfico mais antigo que pude encontrar sobre Andrés Ornelas Martínez (Ramírez, Bodas de Oro, 24).

[347] Ramírez, Bodas de Oro, 31.

[348] Ibid., 30.

[349] Amerlinck y Assereto, Ixmiquilpan, 88.

[350] Ramírez, Bodas de Oro, 39.

[351] Espinosa, “Datos.”

[352] Ramírez, Bodas de Oro, 96s.

[353] Ibid., 84.

[354] Ibid., 13.

* N.T. O mesquite [espanhol mexicano = mezquite] é um arbusto leguminoso espinhento encontrado nas áreas áridas do México.

[355] Tschuy, “Lateinamerika,” 1.

[356] Amerlinck y Assereto, Ixmiquilpan, indica 337.061 habitantes na região de Mesquital (1960). Desses, 81.562 falam otomí e 17.113 apenas otomí. Na região de Ixmiquilpan (24.871 habitantes) 13.927 são bilíngues e 5.763 falam apenas otomí. Daí a importância dos cultos em otomí (Ibid., 12).

[357] Ver Hernández, “Hombres nuevos.”

[358] Depois de sua conversão ele não abandonou sua luta contra os ricos exploradores mas se apercebeu que as trezentas balas de munição e a pistola de seu irmão (da melhor qualidade alemã segundo ele menciona explicitamente) eram muito pouco para sua batalha. Ele necessitava de armas melhores e mais eficientes. E essas não são paz no coração e uma religião individualista, como alguém poderia esperar, mas a demonstração na prática (e não apenas a proclamação) de modelos de uma sociedade alternativa. Ver sua carta ao seu irmão Silvester em Ramírez, Bodas de Oro, 25s.

[359] De acordo com Ramírez dois anos antes da chegada de Hernández (em 1936) Prudencio Esquivel já havia fundado um pequeno grupo pentecostal em Ixmiquilpan. (Bodas de Oro, 125; a paginação está errada, foi impresso erroneamente 117).

[360] De acordo com Amerlinck y Assereto, os pentecostais compraram um hectare de terra e 75 casas entre 1948 e 1956 (Ixmiquilpan, 96).

[361] Tschuy, “Lateinamerika,” 1-3. De acordo com Amerlinck y Assereto, a fundação da congregação de Ixmilquilpan se dá entre 1938 e 1940.

[362] Amerlinck y Assereto, Ixmiquilpan, 87.

[363] Um empréstimo do Instituto Lingüístico de Verão (Ibid., 98).

[364] Ibid., 87s. Sobre as perseguições: Lascári, “Josefina Láscari.” Mensajero Pentecostés 2/62, março 1961, 20 (Victoriano Montiel, Ixmiquilpan) Raymundo Ramírez, “Hilario Arágon,” citado em Mensajero Pentecostés 2/72, janeiro 1972, 24s. (“en una turba de fanaticos, el cura y el cdte municipal son los autores intellectuales del crimen”). Ramírez, Bodas de Oro, 80.

[365] Tschuy, “Lateinamerika,” 5.

[366] Ramírez, Bodas de Oro, 80.

[367] Amerlinck y Assereto, Ixmiquilpan (23, 89) fornece a seguinte estatística:

Católicos Pentecostais Outros

1940 18.338 57

1950 20.912 245

1960 23.657 1.069 145(*)

(*) sem informação, sem religião, oito outras denominações e religiões.

[368] Ibid., 112.

[369] Ibid., 122.

[370] Ibid., 123.

[371] Ibid., 4-5.

[372] Dois padres italianos, um padre norte americano, seis missionárias norte americanas e nenhum padre mexicano na lista de Amerlinck e Assereto (Ixmiquilpan, 23).

[373] Amerlinck e Assereto fornecem uma lista exata de uma amostra de 83 pais de família: ocupação antes da conversão, ocupação depois da conversão; acomodação antes e depois da conversão etc. Enquanto quase todos eles tinham sido agricultores antes da conversão, Amerlinck e Assereto encontraram depois da conversão: 18 agricultores em terra própria, 23 pedreiros (quase um monopólio dos pentecostais!), 3 proprietários de lojas (um possui uma fábrica Nixtemal), 2 empregados em um posto de gasolina, 1 mecânico, 1 aprendiz de mecânico, 4 “promotores de assuntos indígenas,” e apenas 8 empregados como agricultores e 2 empregadas domésticas. (Ixmiquilpan, 104ss.).

[374] Mensajero Pentecostés 2/61, maio 1961, 20: “El Cardenal José ‘Efrain’ Rivera” (citado de Rototemas 6.12.1958): “Para nadie es un secreto que Garibi Rivera representa el sector mas sectario, intransigente y obstruso de la iglesia en Mexico.”

[375] Amerlinck e Assereto, Ixmiquilpan, 129.

[376] Ibid., 130.

[377] É assim que a doutrina dos evangelistas americanos de cura divina, como Oral Roberts, é absorvida, “Fe contra,” 9-11, Osborn, T. L., “Preguntas,” 6-8; idem, “Hoy,” 3-7.

[378] Tschuy, “Lateinamerika,” 4.

[379] Reuniões especiais de mulheres (cf. e.g., Mensajero Pentecostés 2/51, agosto 1961, 5-7).

[380] Niemöller, “Nochebuena” (Sermão de Niemoeller no México e menção de “El hombre que se enfrentó a Hitler” por Pedro Gringoire, México 1938).

[381] Keller, “La Bíblia.”

[382] Disponível em espanhol em Concept mencionado acima, nota 1.

[383] Murillo, “Un ángel mexicano,” 46-51.

[384] Posteriormente eu desenvolvi esse problema em uma peça de três partes “A Aventura da Fé,” Verlag Metanoia, Kindhausen, Suíça.

[385] Tribuna de Monterrey, 2.3.1970, 5; El Provenir (Monterrey), 2.3.1970, 5.

[386] Gaxiola-Gaxiola, Mexican, 290.

[387] Ibid., 318.

[388] Ver capítulo 13, pp. 165-80.

[389] Gaxiola-Gaxiola, Mexican, 270.

[390] Ibid., 276. Mais informação dobre o pentecostalismo mexicano em Gill, Contextualised, e em Hollenweger, El Pentecostalismo, 83-117.

[391] Este capítulo está sobremodo baseado em Yoo, Korean Pentecostalism e Yoo, “Response to Korean Shamanism.”

[392] Sobre o pastor pentecostal como um “xamã” ver The Pentecostals, 474ss. O famoso pastor pentecostal coreano Paul Yonggi Cho (nascido em 1936) pode ser considerado um xamã pentecostal por excelência, embora seus biógrafos ocidentais evitem esse termo (D. J. Wilson, “Cho”; Kennedy, Dream). Mas veja Villafañe, The Liberating Spirit, 208, e Cho, Fourth Dimension, 90, 96, 100, onde é apresentada uma percepção do Espírito de Deus muito mais inclusiva. Mark R. Mullins descreve a teologia de Paul Yonggi Cho “como uma síntese de xamanismo coreano, ‘pensamento positivo’ de Robert Shuller e o pragmatismo da escola missiológica que enfatiza o crescimento da igreja associada com a Escola de Missão Mundial do Seminário Teológico Fuller.” Ver o excelente artigo, Mullins, “Empire,” 87-102, esp. 92.

[393] Fonte: Studies on Pentecostalism in Korea (Seoul: Korean Christian Academy Press, 1983, 300s. [Coreano]); Yoo, Korean Pentecostalism, 3.

[394] Pyun, Diary. Yoo, Korean Pentecostalism, 119.

[395] Quando escrevi uma resenha do livro de Yoo para um periódico suíço, ela foi rejeitada porque os católicos não gostaram da crítica que Yoo faz da teologia da libertação (predominantemente católica). É sempre a mesma estória: os teólogos do terceiro mundo podem ser tão revolucionários quanto queiram, desde que sejam revolucionários da nossa maneira, pois se pensarem teologicamente por si mesmos não serão bem vindos!

[396] Isso nos faz lembrar do protesto contra Hyun Kyung Chung em Canberra (ver capítulo 27, pp. 382-84). Chung, Struggle. Ela é outra pensadora teológica coreana incômoda; sobre a abordagem pentecostal aos ancestrais ver capítulo 20, pp. 266-67.

[397] Fonte: Barrett, WChE, 440ss.

[398] Cecil M. Robeck, em uma resenha do livro de Yoo, Korean Pentecostalism, Pneuma 12/1, 1990, 61.

[399] Resenha por Wi Jo Kang em Missiology 21/1, jan. 1993, 593. Não tenho acesso ao livro coreano por Jae Bum Lee (History).

[400] Robeck, Cecil M. Jr., Pneuma, 12/1, 1990, 62.

[401] Yoo, “Response to Korean Shamanism,” e Yoo, Korean Pentecostalism, 223ss.

[402] Mullins, “Empire,” 92. Mullins se apoia em Grayson, Early Buddhism and Christianity in Korea, 205; Lee, Jae Bum, Korean, 279-86; e Suh, “Forty Years of Korean Protestant Churches: 1945-1985.” Mullins também discute, em seu artigo bem documentado, os seguintes autores: Syn-Duk, Choi, “A comparative study of two new religious movements in the Republic of Korea: the Unification Church and the Full Gospel Central Church”; Byron H. Earhardt, “The New Religions of Korea: A Preliminary Interpretation,” Transactions of the Korea Branch of the Royal Asiatic Society 49, 1974; Byong-Suh Kim, “The Explosive Growth of the Korean Church Today: A Sociological Analysis,” International Review of Mission 74/293, 1985, 61-74.

[403] Este capítulo começou como um artigo em Theology (Hollenweger, “Interaction”). Foi revisado, atualizado e anotado. Ver também Thompson (“Popular Religiosity in Britain”), que situa a experiência negra na Grã-Bretanha num contexto mais amplo.

[404] Sobre isso ver Hollenweger, “L’expérience,” 186-92.

[405] Wilkinson, Church in Black and White.

[406] Ver o relatório de um de seus primeiros dirigentes: Mazibuko, Education.

[407] Ver seu estudo exaustivo: Gerloff, Plea. Também da mesma autora “Education.” Há mais literatura da mesma autora na Pequena Lista de Títulos, pp. 426-27. [???]

[408] Vongbock, Minjung Theology.

[409] E.g., Foster, Black Women; Pemberton, A Study of Caribbean Religions; Simmonds, “A Portrayal of Identity”; Tomlin, Black Preaching Style. A publicação de todas ou de algumas dessas dissertações está planejada na série Studies in the Intercultural History of Christianity.

[410] De um esboço anterior, não publicado, do texto de Gerloff intitulado “Education.”

[411] Ver capítulo 8, pp. 99-105. [???]

[412] Vogt, Bibelarbeit, 149.

[413] Farau-Cohn, Gelebte Geschichte der Psychotherapie.

[414] Kuhn, The Structure of Scientific Revolutions.

[415] Cohn, “Das Modell der themenzentrierten Interaktion,” 357.

[416] Ter Haar, “Strangers,” 1-31. Gerloff, “Lebendige Bibel,” 411-14.

[417] Wilkinson, Church in Black and White.

[418] Atualmente Roswith Gerloff encabeça um programa semelhante na Univesidade de Leeds (Inglaterra). Também, a integração de igrejas pentecostais negras nas agências ecumênicas européias e britânicas é um novo desdobramento animador, mas também criará problemas para o funcionamento suave dessas organizações ecumênicas.

[419] Este capítulo começou como uma conferência na World Methodist Historical Society em Birmingham (1978). Foi publicado em Epworth Review 6/2, maio de 1979, 35-47 (mas com significativas eliminações principalmente sobre os primeiros testemunhos positivos sobre Hoover) e integralmente em Methodist History 20/4, julho de 1982, 169-82. Em espanhol em Spiritus 1/1, 1985, 31-46 (México). Foi revisado e atualizado.

Fontes: Methodist Files, Methodist Letter-books, Presbyterian Microfilms, doravante mencionados, estão localizados no Interchurch Center, Nova Iorque. Material detalhado em meu Handbuch, 02b.08 (60 páginas de documentos e interpretação). Também: Ossa, Lo ajeno. Idem, Espiritualidad popular. Irma Palma, En tierra extraña.

[420] Barclay, History of Methodist Missions, III, 792. Lalive d’Epinay, Haven of the Masses, 5. Bundy, “Taylora,” 197-210; Taylorb,” 3-21.

[421] Carta de Florence Smith para Speer escrita de Valparaíso, datada de 22/1/1906 (Presbyterian Microfilms); citada em Kessler, Study, 105.

[422] Methodist Files; Kessler, Study, 108. Jones, C. E., “Hoover.”

[423] Hoover, Historia, 11. Essa nota mostra que Hoover levou o arminianismo à sua conclusão lógica, e também que mesmo naquela época ele já tinha optado pela pneumatologia de Lucas. Sobre isso ver Schweizer, “pneuma” e The Pentecostals, 336-41.

[424] Actas de la conferencia misionera occidental de Sud América de la Iglesia Metodista Episcopal, Temuco 19-23 de fevereiro de 1909; Kessler, Study, 110.

[425] Informação concedida a Kessler por Merayne Copplestone, Nova Iorque (Study, 110). Ver também Campbell, Buell, carta a Stuntz, 31/10/1910, na qual ele reclama que a igreja de Hoover achava que eles eram “mais santos do que os outros.” Kessler, Study, 110.

[426] Lalive afirma que o “nascimento do pentecostalismo chileno ainda permanece muito pouco conhecido” (Lalive d’Epinay, Haven of the Masses, 7). Contudo a situação das fontes é bastante boa. Os líderes pentecostais chilenos guardaram—mantendo a boa tradição metodista—os registros do passado. Parte desse material, mais os arquivos da Igreja Metodista em Nova Iorque, foram utilizados por Kessler. Como complemento temos Chile Pentecostal e outros periódicos religiosos no Chile, e Vergara, Protestantismo. De menor importância para a pesquisa histórica estão as principais obras sociológicas: Lalive d’Epinay, Haven of the Masses; Willems, New Faith; Martin, David, Tongues. Literatura mais antiga pode ser encontrada extensivamente em meu Handbuch, 02b.08.

[427] Abrams, “Mukti”; idem, Fire.

[428] Frodsham, With Signs Following, 175.

[429] O reavivamento religioso algumas vezes assumiu formas extáticas e estranhas. A imprensa religiosa ficou jubilosa quanto ao “fogo celestial na Índia.” A biografia cuidadosa de Ramabai escrita por Sengupta (Pandita Ramabai) fornece algumas informações cautelosas sobre o reavivamento, enfatiza o trabalho social de Pandita Ramabai, mas minimiza os problemas teológicos e culturais do reavivamento. Hoje a Ramabai Mukti Mission declara ignorar totalmente o reavivamento pentecostal (carta de G. Fletcher, superintendente da Ramabai Mukti Mission, de 21/3/1963, ao autor). Extensiva bibliografia e discussão em Handbuch, 03.07.013. Bixler fornece o registro de forma direta (“Ramabai”). Ver também, McGee, “Abrams,” 7.

[430] Hoover, Historia, 14.

[431] A resposta de Barratt para Hoover em ibid., 95-98.

[432] Bloch-Hoell, The Pentecostal Movement, 75ss.

[433] Frodsham, With Signs Following, 176s.

[434] Ibid., 177s.

[435] Hoover, Historia, 30.

[436] El Cristiano 5/7/1909; Hoover, Historia, 26s.; Kessler, Study, 116. Mesmo Buell Campbell que foi o primeiro pastor permanente da Igreja Metodista em Valparaíso depois de Hoover, e que era bastante crítico de seu predecessor, admitiu que essas primeiras reuniões tiveram “muitos elementos do bem” (Campbell, carta para Stuntz, 25/7/1910; Kessler, Study, 114). Um irmão deixou a vigília para devolver algumas coisas lhe tinham sido emprestadas na época do terremoto em 1906, mas que ele não tinha devolvido. Na vigília seguinte, enquanto ele estava orando, ele foi dominado por um ataque de riso suave (Hoover, Historia, 20). Victor Pavéz Toro (El Cristiano, 21/6 e 2/8/1909; Kessler, Study, 116), Rice (Actas; Kessler, Study, 116), Tulio Moran, um presbiteriano de Concepción, estavam convencidos naquele estágio da genuinidade da obra.

[437] Sobre Nellie Laidlaw em detalhe (e documentado): Kessler, Study, 117ss.; ver também Lalive d’Epinay, Haven of the Masses, 9ss.

[438] Hoover, Historia, 35.

[439] Quanto ao ministro pentecostal como um “xamã moderno” ver The Pentecostals, 474ss.

[440] As igrejas pentecostais chilenas são episcopais, da mesma forma que a maioria das igrejas pentecostais negras nos EUA e muitas igrejas pentecostais no Terceiro Mundo.

[441] El Cristiano 20/9/1909; Hoover, Historia, 36.

[442] El Mercurio, 13/9/1909; Kessler, Study, 117.

[443] Neely, Bishop, carta, 16/10/1909. (Methodist Letter-book, vol. 156, 109). Neely citou um relato feito pelo El Heraldo Evangélico, o jornal presbiteriano no Chile, que por sua vez tinha se baseado em outros relatos; Kessler, Study, 120.

[444] Kessler cuidadosamente examina a evidência documental disponível e dá prioridade em seu relato (no qual baseio meu sumário) à testemunhas oculares.

[445] El Cristiano 20/9/1909. A vida subseqüente de Nellie Laidlaw foi trágica. Ela se tornou usuária de drogas e morreu sem se arrepender. (Stuntz, carta para Sampson Rogers, 10/5/1910 [Methodist Letter-book, vol. 156, 19]), Kessler, Study, 121. Mas dez anos depois seu antagonista, Rice, foi expulso da missão metodista por razões disciplinares (Lalive d’Epinay, Haven of the Masses, 12).

[446] Hoover, Historia, 51.

[447] El Mercurio 2/10/1909; Hoover, Historia, 38s.

[448] Campbell, carta para Stuntz, 25/7/1910; Kessler, Study, 123.

[449] Stuntz, carta para Bristol, 7/10/1909 (Methodist Letter-book, vol. 155, 251).

[450] I.e., a comissão no Chile era composta inteiramente por missionários.

[451] Stuntz, carta para Neely, 19/10/1909 (Methodist Letter-book, vol. 155, 259); Kessler, Study, 123. Embora Godsil Arms tenha defendido Hoover (Hoover, Historia, 55).

[452] Sobre as fontes: As minutas da conferência eliminaram quase toda menção à Hoover sendo repudiado pois um acordo foi feito no último minuto para que Hoover saísse de férias e o caso fosse abafado, mas tal acordo no final não se materializou. A maioria das deliberações, porém, foram publicadas no El Cristiano (14/2/1910, do qual Rice era o editor), sobretudo para a humilhação de Hoover mas para a vantagem do historiador do presente; Kessler é bastante detalhista sobre isso.

[453] Formalmente direcionada contra Nellie Laidlaw, mas em essência alvejando o novo reavivamento.

[454] Hoover, Historia, 62s.: “Resolución: Por cuanto ciertas doctrinas falsas, tales como la enseñanza que el bautismo del Espiritu Santo es acompañado por el don de lágrimas y visiones, milagres de sanidad, y otras manifestaciones, han sido diseminadas en varias partes de esta conferencia, y representadas como las doctrinas de la Iglesia Metodista Episcopal, nosotros por la presente declaramos que aquellas doctrinas son antimetodistas, contrarias a las Escrituras e irracionales, y nuestros miembros están avisados que no deben aceptarlas como las enseñanzas de nuestra Iglesia.” O falar em línguas não é sequer mencionado!

[455] Kessler, Study, 128.

[456] Stuntz, carta para Robinson, 7/7/1910 (Methodist Letter-book, vol. 156, 101); Kessler, Study, 130.

[457] A Iglesia Metodista Pentecostal saiu da Igreja Metodista Episcopal “no por ningún desacuerdo que tuviera com los principios o doctrinas, sino que sigue el mismo régimen” (Iglesia Metodista Pentecostal, “Introducción,” Himnos), citado por Vergara, Protestantismo, 123.

[458] Hollenweger, “Latinamerika.” Ver sobre isto o capítulo 17, pp. 222-24.[???]

[459] Chile Pentecostal, setembro de 1954; citado por Vergara, Protestantismo, 111. Sobre a função da dança, ver Hollenweger, “Danced.” Ver também Robeck, “Taking Stock,” 35-60, especialmente 50.

[460] Hoover, Historia, 33.

[461] Ibid., 39.

[462] Oyarzún, Reminiscensias, 50-52; citado por Vergara, Protestantismo, 112s.

[463] Lalive d’Epinay, Haven of the Masses, 9.

[464] Sobre o problema desse conflito cultural ver Lalive d’Epinay, “Chile.”

[465] Ramírez-Ramírez, “I Could Have Danced.”

[466] Sobre a função da liturgia pentecostal ver capítulo 21, pp. 273-77.[???]

[467] Roberts, Oral, The Call; Robinson, Oral; The Pentecostals, 363-65; Chappell, “Roberts,” 759s.

[468] Em particular Evangelist e Schweizer Evangelist. Ver capítulo 12, pp. 144-45.[???]

[469] Palma-Villela, “Volksreligion,” 24-32.

[470] Os autores escrevem “a única expressão de religião popular,” Palma-Villela, “Volksreligion,” 25. O pentecostal chileno Juan Sepúlveda (“Struggle”) confirma o aspecto de “religião popular” que ele denomina “Pentecostalismo crioullo” mas sua abordagem é mais analítica e algo mais crítica. Mais sobre isto nos capítulos 16 (pp. 204-16) e 17 (pp. 218-27),[???]

[471] Sobre pentecostalismo e ecumenismo no Chile, ver capítulos 27 (pp. 367-71) e 27 (pp. 384-87). ???Handbuch, 02b.08.054d e The Pentecostals, 438ss.

[472] Sepúlveda, “Pentecostalism.”

[473] Sepúlveda, “Pentecostalism,” 81.

[474] Valle, “Psicologia”; Sepúlveda, “Pentecostalism,” 88.

[475] Handbook, do CMI fornece para 1985 as seguintes estatísticas de membros de igrejas: Luteranos, 2000; metodistas, 6000; Iglesia Pentecostal de Chile, 90.000; Misión Iglesia Pentecostal, 12.000 (Handbook, 264-66). CC, 1988, 11, nem sequer mencionas os metodistas. Barrett calcula para 1980 mais de 1.800.000 chilenos autóctones (=pentecostais) numa população de cerca de onze milhões. (Barrett, WChE, 226ss.).

[476] “Declaración de apoyo a la Junta de Govierno de las iglesias evangélicas” nº 2, em Posición Evangélica (Santiago), 1975; Sepúlveda, “Struggle,” 312.

[477] Sepúlveda, “Struggle,” 315. “A maioria das igrejas membros da ‘Confraternidadd Cristiana de Iglesias,’ uma organização ecumênica que tem mantido, desde 1982, uma postura crítica para com o regime militar, são pentecostais.” Sepúlveda, “Struggle,” 315, nota 10.

Mais literatura sobre os pentecostais chilenos: Sampedro, Pentecostalismo; História del avivamiento; Schick-Talbert, La Iglesia Metodista Pentecostal; Alvarez, História; Cook, William, “Interview”; Godoy, “Ochenta”; Tennekes, El movimiento; idem, “Mouvement Pentecôtiste”; Valencia, En tierra extraña; Vidal, M. e Ana, El pentecostal. O importante artigo de Samuel Palma Manriquez, secretário geral da SEPADE (Fonte Evangélica para o Desenvolvimento, Chile) e professor de sociologia na Universidade de Santiago do Chile (“Religião do povo e evangelismo”), não pode ser integrado neste capítulo. Ele confirma muitas das minhas próprias observações: a religião dos pobres na forma de pentecostalismo é auto-suficiente e auto-sustentada, em contraste com as assim chamadas igrejas históricas (p. 365???0; ela tem um relacionamento ambíguo com a cultura autóctone e a sociedade maior; uma geração mais jovem de pentecostais é bem educada e está lutando com uma nova interpretação do pentecostalismo, tentando preencher a brecha entre sua experiência e sua ideologia tradicional. Uma mina de informação sobre o pentecostalismo chileno é o periódico Evangelio y Sociedad (Passy 032, Provincia—Santiago, Casilla 238 Correo 3, Chile).

[478] Como exemplo ver capítulo 2, pp. 6-15. ????

[479] Cf. o capítulo “Sincretismo” na obra seminal de Boff, Churc, Charisma and Power [Igreja, carisma e poder], 92ss. Também o líder da Musama Christo Disco Church em Londres observa que a questão não é “sincretismo, sim ou não,” mas que tipo de sincretismo. Ver a excelente palestra desse líder pentecostal africano na Conferência do CMI (Jehu-Appiah, “Overview”).

[480] Relatado detalhadamente em Holllenweger, Conflict.

[481] Esse problema epistemológico é discutido detalhadamente no capítulo “The End of Natural Science” em ITh 3, 286ss.

* Isso não ocorre na língua portuguesa.

[482] Lange, Predigen, 83.

* N.T. Comunidade ecumênica internacional de inclinação católica, fundada em 1940 em Taizé, França, pelo irmão Roger. Na Internet:

** N.T. Palavra de origem sânscrita que indica para os hindus um local de retiro espiritual.

*** N.T. Kirchentage são reuniões bienais na Alemanha de inclinação protestante com mais de cem mil participantes cada vez, oriundos de todas as partes do mundo e das diferentes confissões cristãs, interessados nos desafios para a fé cristã no mundo hodierno. Na Internet:

[483] Jung, “Psychotherapie.” 362.

[484] Cox, Turning East, 133.

[485] Eu utilizei os comentários de Schweizer e Lähnemann (ver a Pequena Lista de Títulos). Cf. também ITh 2, 158ss.

[486] O Salmo dos Naassenos é um hino contemporâneo “diretamente adaptado para o desempenho no teatro.” Traduzido aqui por A. S. Worrell da versão alemã de Harnack, Lehrbuch, 257: Apocrypha 2, 436. Para uma tradução inglesa desse salmo ver Hipólito 5.10.2 (Ante-Nicene Fathers [reimpressão; Peabody: Hendrickson, 1994]).

[487] Collier, Economism.

[488] Citado em Johanna Linz, “Meine Mutter heisst Sorge,” em Die Weltmission Das Wort in der Welt, 1990/5, 4.

[489] Synan, “Boundaries.”

1 Não preciso entrar em detalhes sobre o metodismo europeu em um livro inglês/americano. Ver The Pentecostals, 218-43; mais detalhado na versão alemã. O que se segue não pretende ser uma interpretação geral da vida e obra do gigante John Wesley. Serve apenas como um indicador das raízes católicas em Wesley, no movimento de santificação e no pentecostalismo. Os interessador podem considerar as fontes em meu Handbuch, 05.28.001, 05.28.002, 05.28.003 e 05.28.004. Ver também Bundy, “European.”

[490] Peter, Geschichte, 233.

[491] Wesley, “Plain Account,” WW XI, 396; Jacoby, Handbuch, 265.

[492] Schulz, Die Bedeutung, 117, 120. SE 12.11.1898, 364. Sobre Smith ver abaixo o capítulo 14, nota 7, p. 183????.

[493] SE 23.5.1896, 162. Hug, “Haben.” SE 28.5.1898, 172s., 180. SE 23.7.1898, 236s., 30.7.1898, 241s., 6.8.1898, 325s. SE 17.9.1898, 302. 8.10.1898, 325s. SE 5.11.1898, 353. 12.11.1898, 361. 1.11.1898, 369. SE 20.5.1899, 156. SE 22.6.1900, 172s. 22.6.1900, 173. 22.2.1902, 61. 29.2.1902, 68. 8.3.1902, 76. 15.3.1902, 85. 22.3.1902, 92. 29.3.1902, 100. 5.4.1902, 108. 21.5.1904, 169. 211.5.1905, 164. 14.10.1905, 324. 14.10.1905, 327. 21.10.1905, 329s. 21.10.1905, 164. 14.10.1905, 324. 14.10.1905, 327. 21.10.1905, 329s. 21.10.1905, 334. 24.6.1906, 294. 30.9.1906, 310. 18.3.1905, 84s. 6.5.1905, 143. 10.6.1906, 180. 5.8.1905, 246. 29.7.1905, 328. 6.10.1906, 318. 19.8.1908, 263. 9.9.1905, 286. 13.4.1907, 116. 27.4.1907. 4.5.1907, 141. 11.5.1907, 148. 18.5.1907, 157.

[494] SE 18.3.1905, 84s.

[495] SE 19.8.1908, 263.

[496] SE 13.4.1907, 116.

[497] The Pentecostals, 223.

[498] SE 21.9.1907, 301.

[499] Kirchenordnung, ? 103.3, 101.

[500] Wächterstimmen, Jan. 1910, 25.

[501] SE 29.10.1910, 697.

[502] Scopoli, nascido em Otrento, leigo até os quarenta anos, ingressou na ordem religiosa dos teatinos, devido ao seu zelo e influência foi perseguido e reduzido a condição de leigo em 1585. Escreveu Il combattimento spirituale. Sua autoria é no entanto questionada. A Enciclopedia universal ilustrada europeo-americano Vol. XII, 213 em um artigo sobre Juan de Castañiza; Barcelona, sem data) diz que essa obra foi erroneamente atribuída a Scopuli. Alamo, “Castañiza”; Andrei, “Scopuli”; Vezzosi, Scrittori; Steiner, B., “Untersuchungen”; Lang, “Scopuli”; Mercier, “Scopuli.” O combattimento spirituale parece ter chegado na Inglaterra através da adaptação espanhola de Juan de Castañiza (nascido em Iladiego, morto em Salamanca em 1598); Filipe II fez dele seu capelão e “censor de theologia entre los del Tribunal de la fe”(Enc. Univ. XII, 213). A perfeição cristã é retratada como misticismo voluntarista e intelectualista. “Estar pronto para o sofrimento é tudo, pois a intenção de Deus aponta para o último.” Muitas vezes a vontade em si mesma deve ser suficiente. Schmidt, Martin, John Wesley I, 48ss. Wesley aprendeu sobre isso com sua mãe.

[503] Em sua Vida a verdadeira religião é vista como “uma união da alma com Deus, uma participação real na natureza divina, a própria imagem de Deus retratada na alma, ou, na frase do apóstolo, é Cristo formado em mim,” 30. “. . . que seu Espírito seja derramado sobre toda carne. Isso é sobremaneira irreligiosamente limitado à extraordinária efusão do Espírito Santo naquele início do cristianismo: tal postura é claramente contrária tanto às promessas do Antigo Testamento como a totalidade do Novo, e contrária a nada menos do que a sobremodo divina oração de nosso Salvador na qual ele expressa que ele não estava intercedendo por seus discípulos apenas, mas por todos aqueles que creriam em seu Nome por meio da palavra deles” (edição de 1733, 105; citado em Schmidt, Martin, John Wesley, I, 55, 49ss. E nota 8 [não na edição de 1948]). Wesley foi apresentado a Scougal por sua mãe.

[504] Betty Kirkham, filha de um clérigo, introduziu Wesley ao pensamento de Tomás Kêmpis (Schmidt, Martin, John Wesley, I, 95).

[505] Em seu Discourse, Taylor trata primeiramente com os anabatistas; posteriormente bispo, tradutor do jesuíta espanhol J. E. Niremberg (Overbeck, “Taylor”). The Dictionary of National Biography, 1885ss., Reino Unido, 55.422-29. Brilioth, “Jeremy Taylor.” Ele era chamado o Shakespeare da prosa inglesa. Seu Rule and Experiences of Holy Living e seu Rule . . . Dying pertencem aos fundamentos da literatura devocional inglesa. Segundo Taylor, o amor é o maior dom que podemos oferecer a Deus. O apóstolo o denomina “vínculo da perfeição” (Heber, Jeremy Taylor, 4.193, citado em Schmidt, Martin, John Wesley, I, 78). Vida de acordo com a vontade de Deus aparece em cada detalhe como a “epítome do comportamento civil” (Schmidt, Martin, John Wesley, I, 79). “Abster de gargalhada dissoluta e libertina, gracejos petulantes e inconvenientes, gritaria, zombaria e todas aquelas ações que são consideradas pela sociedade como indecência e falta de civilidade” (Heber, Jeremy Taylor, 4.103, 138). Schmidt “perde o sentido do trágico” (Schmidt, Martin, John Wesley, I, 79). Wesley lera Taylor (Journal 14.5.1763; WW III, 212).

[506] Ele representava a doutrina da “luz interior” (Fleisch, “Law,” 1504). Dictionary of National Biography, 1885ss., Reino Unido, 32.236-40. Hobhouse, Selected. A perfeição como condição para a vida eterna significava para ele perfeição na intenção. “Pois certamente é um caso bastante diferente, não conseguir alcançar a perfeição apesar do melhor esforço, do que não alcançá-la por não se esforçar para tanto. O primeira prática pode conduzir a pessoa para grande recompensa no céu, e a outra jogá-la com o servo inútil nas trevas exteriores.” Law, Treatise, 224 (Treatise . . ., edição de 1893, 6). Wesley conhecia os escritos de Law (Journal 14.5.1765, 186, WW III, 213).

[507] Enciclopedia universal ilustrada europeo-americano, XXXI, 113 (“Lopez”). O que fascinava Wesley nesse homem era sua busca pela perfeição no amor de Deus. Schmidt, Martin, John Wesley, I, 253.

[508] Ele fundou “des sociétés d’artisans pour vivre ensemble comme les premiers chrétiens, en sorte que le gain de leur travail fût commun et que le surplus du nécessaire fût employé au soulagement des pauvres” (“de Renty”). Foi importante para Wesley a “santa indiferença” de Renty diante da morte de sua esposa: “Madam as femme fut très grièvement malade et pensa mourir . . . Monsieur de Renty . . . dit: Je ne peux pas nier que ma nature ne ressente une grande douleur de cette perte, mais mon esprit est remplis de tant de joie de me voir en état de donner et de sacrifier à Dieu une chose qui m’est si chère.” Le Chrétien réel ou la Vie du Marquis de Renty, Colônia, 17012, 365, segundo Schmidt, Martin, John Wesley, I, 213-15, citação 215.

[509] E.g., Tauler e Molinos (Schmidt, Martin, John Wesley, I, 753).

[510] “Descanse no sangue de Cristo; uma firme confiança em Deus, uma convicção de seu favor; a mais alta tranqüilidade, serenidade e quietude, com o livramento de todo desejo carnal, e a cessação de todos os pecados, mesmo os interiores.” (Wesley, “Plain Account,” WW XI, 369s.). “Requies in sanguine Christi; firma fiducia in Deum, et persuasio de gratia divina; tranquillitas mentis summa, atque serenitas et pax; cum absentia omnis desiderii carnalis, et cessatione peccatorum etiam interiorum. Verbo, cor quod antea instar maris turbulenti agiatabatur, in summa fuit requie, instar maris sereni et tranquilli” (Tagebuch, 37s.; “Plain Account,” em WW está faltando a última sentença.

[511] Acima, nota 20.

[512] Ver acima, nota 15, sobre Henry Scougal.

[513] Fleisch, Heiligungsbewegung, 43. Klaiber, “Aus Glauben” (citações 329-31).

[514] Fleisch, Heiligungsbewegung, 45.

[515] Ibid., 42.

[516] Sermão nº 110, WW 3, 544-63. Significativamente, Wesley não incluiu este sermão em nenhuma de suas coleções de sermões, Klaiber, “Aus Glauben,” 332, nota 78.

[517] Carta ao Ver. Sr. John Wesley. Whitefield, Works IV, 53-73, citação 71.

[518] Ver a controvérsia entre Lutero e Erasmo e Zuínglio e Erasmo sobre “Livre arbítrio,” ITh 1, 320s. Inglês: Hollenweger, “Zwingli,” particularmente 88s.

[519] WW IV, 156; Wesley, Letters VII, 102; VII, 322; Sermão nº 83, WW VI, 491; WW III, 308.

[520] A lista imitando II Coríntios 11 não é exagero. Sua missão americana estava conectada com seu ideal ascético principalmente porque ele tinha medo do mar. Testemunho de seu procedimento espartano ascético e disciplinado pode ser encontrado em seu diário (não confundir com seu Journal), no qual ele relata cada um de seus dias em detalhe taquigraficamente e em escrita secreta de quatro horas da manhã até nove e meia da noite. Observar também o forte aspecto social de sua sede por santificação.

[521] Aqui Wesley cita a liturgia eucarística anglicana. “Meio de graça”—a eucaristia.

[522] Francês: Guilleaume de la Fléchère, 1729-85, nascido em Nyon no lago de Genebra, lecionou teologia em Genebra, rejeitou a doutrina da predestinação e foi professor particular na Inglaterra, onde conheceu o metodismo. Após ter recebido “plena certeza de fé” (1757) ele tornou-se pastor e assim permaneceu até sua morte em Madeley. Além disso ele dirigiu o seminário da condessa Huntington em Trevacca (1768-71), mas teve que partir por causa das disputas com Whitefield sobre a predestinação de Calvino. Ele nunca pretendeu ter alcançado “perfeição em amor” (Fleisch, “Fletcher”; Scott, “Fletcher”; “Fletcher,” Lexikon der Schweiz, 3.171; Wesley, “Short Account”; Nuelsen, Fletcher; Brandt-Bessire, Sources, 63-72; Schulz, Bie Bedeutung, 118; Dayton, “Roots,” 7s.).

[523] Bundy, “European,” 280.

[524] “As doutrinas centrais [de Lutero] eram um espelho de seu temepramento e de suas experiências . . . O homem está totalmente sob o poder do mal e não pode fazer outra coisa senão pecar. A justificação é algo que é realizada no homem por um tipo de ficção legal . . . embora na realidade ele permaneça tão pecaminoso quanto antes.” Cross, “Luther,” Sobre esse estranho dicionário ver ITh 2, 30s.

[525] “Jamais on ne fait le mal si pleinement et si gaiement que quand on ne le fait par conscience,” Pascal, Pensées, Frag. 895. The Pentecostals, 328.

[526] Vereb, Interview. Lundgren, “Dialog”; citado por Sandidge, Dialogue (1977-1982), I, 213.

[527] Zeegers, “R. K. Kerk.”

[528] The Pentecostals, 6s., 8, 15, 43, 212, 356, 364s., 426, 468, 485.

[529] O’Docharty, “Tried.” Schulgen, “Heaven.”

[530] Ranaghan, Catholic Pentecostals, 6. O’Connor, Pentecostal Movement, 105. Lundgren, Ny pingst. Houve uma explosão de literatura sobre o pentecostalismo católico no fim da década de 1960 e início da seguinte. Bibliografias: Melton, Bibliography; Lambert, Bibliographique; Hollenweger, Pentecost Between Black and White, 127-33; idem, Christen, 119-25; idem, New Wine, 60-75; e na versão espanhola de The Pentecostals (El Pentecostalismo), 61-66.

[531] Wilkerson, Switchblade.

[532] Sherrill, Tongues.

[533] Kovaleski, “Charismen”; Aion, “Dialogue”; Stone, “Orthodox”; Renewal, “Orthodox.”

[534] Sobre estes ver em detalhe em The Pentecostals, 101-7.

[535] Duncan, M., Revelation. Literatura adicional em The Pentecostals, 436-38. Resenha em Bittlinger, Papst, 2-9. Esse tipo de polêmica ainda não acabou. Por exemplo, quando o papa chamou as seitas pentecostais “lobos vorazes” (ver abaixo, nota 136), Robeck teve que utilizar toda a sua delicadeza, habilidade teológica e ecumênica para conter o estrago (correspondência confidencial em meu poder).

[536] Por exemplo certo católico italiano em The Pentecostals, 257s.

[537] “Evangeletters.”

[538] Torkelson, “Filled.”

[539] Harper, “Dialogue.” Renewal, “Dialogue.” Williams, Rodman J., “Breakthrough.” One in Christ, “Dialogue.”

[540] O periódico pentecostal francês Expériences (Carhais 29N), especialmente as edições nº 2, 1971 e nº 8, 1972 com artigos de O’Connor, Du Plessis, Ranaghan e pentecostais franceses.

[541] Bolten, “Recent,” 6s.

[542] Chéry, “Sectes”; idem, “Accusent”; Gaëta, “Chili” (1956!); Vergara, Protestantismo; idem, “Avance”; Zenetti, Heisse, 304-9. Particularmente interessante é a mudança passada por Damboriena, de crítico impiedoso para parceiro tolerante: Damboriena, “Chile”; idem, “Algunos”; idem, “Fury”; idem, Tongues.

[543] Tugwell, Receive, 13.

[544] McDonnell, “Ideology.” Ver também capítulo 21, pp.269-87 e capítulo 26, pp. 356-60.

[545] Tugwell, Receive, 104.

[546] Ranaghan, Catholic Pentecostals, 261. McDonnell, “Catholic Pentecostalism,” 41. Ver também idem, Open.

[547] Ranaghan, Catholic Pentecostals, 260.

[548] Bittlinger, “Glossolalie.”

[549] Tugwell, Receive, 18.

[550] McDonnell (com Bittlinger), Problem, 53.

[551] Ford, J. M., Baptism, XII, 51.

[552] Tugwell, “Gift,” 137.

[553] Ibid., 137, 139.

[554] Tugwell, “Reflections,” 268, 269, 280. Esta e outras afirmações semelhantes provocaram um protesto de Michael Harper, ver sua resenha em Renewal 39, junho/julho de 1972, 8.

[555] Tugwell, Receive, 95.

[556] Ranaghan, Catholic Pentecostals, 249. McDonnell (with Bittlinger), Problem.

[557] Ford, J. M., Baptism.

[558] Ver capítulo 4, pp. 25-40 e capítulo 17, pp. 218-27.

[559] O’Connor, Pentecostal Movement, 125.

[560] Jennings, “Glossolalia.” Samarin, Tongues. O’Connor, Pentecostal Movement, 132.

[561] Ranaghan, Catholic Pentecostals, 249 and McDonnell (with Bittlinger), Problem.

[562] Caffarel, Pentecôtisme, sugere “efusão do Espírito.” Ford, J. M., “Catholicism,” sugere “liberação do Espírito.”

[563] Clark, Confirmation. O’Connor, Pentecostal Movement, 132.

[564] McDonnell (with Bittlinger), Problem, 36.

[565] O’Connor, Pentecostal Movement, 59.

[566] Tugwell, Receive, 11.

[567] Altrichter, “Katholische.”

[568] Tugwell, Receive, 18 e passim.

[569] Sudbrack, “Im Spiegel der Zeit.” Sobre Harvey Cox e pentecostalismo ver capítulo 1, p. 2.

[570] New Covenant, 3/2, agosto 1973, 26s.

[571] Cohen, “Renovación.”

[572] Arceo, “Antorcha.”

[573] Introduction, 10.

[574] Clark, Building; Connor, “Covenant”; Delespesse, Church. Sobre a influência de conventos existentes ver Cyprian, New Covenant, 2-5; Aymot, New Covenant; Reddy, New Covenant.

[575] McLeod, “Renew.”

[576] Gelpi, Piety, 61-97.

[577] O’Connor, Pentecost in the Catholic Church, 28s.

[578] Weber, Karl, “Amerika.”

* N.T. No Brasil temos os agentes pastorais.

[579] Hocken, Streams.

[580] Hocken, Streams, cita Du Plessis (p. 129 de uma fita). Os pentecostais “têm negado que são protestantes,” eles possuem muito em comum com os católicos romanos (Elim Evangel, 10 de março de 1962, 146; Elim Evangel, 29 de junho de 1963, 402) Hocken, Streams, 146.

[581] Hocken, Streams, 178s.

[582] McDonnell, Presence.

[583] Hocken, One Lord; idem, “Charismatic”; idem, “Renewal.”

[584] Robeck, “Du Plessis.” Ver também idem, “Growing.”

[585] Schmieder, Geisttaufe.

[586] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 366. Carmichael, William, Letter, 30.6.1982. O superintendente geral das Assembléias de Deus, Thomas Zimmerman, esteve pessoalmente contrário ao diálogo (Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 331) mas pareceu reconsiderar sua posição quando Du Plessis abdicou de seu papel condutor (Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 365).

[587] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 176.

[588] Ibid., I, 333.

[589] Ibid., I, 175. Synan, Carta a Robert McAlister (Oklahoma City, Okla.), 5.1.1977 (foi enviado cópia para Du Plessis). Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 324.

[590] Os relatórios finais de todos os três qüinqüenais foram publicados em Pneuma 12/2, outono de 1990. Uma boa resenha em McDonnell, “Improbable Conversations,” 20-31, e idem, “Five Defining Issues,” 110-21. Ver também as duas dissertações católicas: Terrance Robert Crowe, Pentecostal Unity, e Lee, Paul D., Ecclesiology; também Hocken, “Ecumenical Dialogue”; Robeck, “Catholics.”

[591] Em particular Bittlinger, Papst; Sandidge, Dialogue (1977-1982); Robeck, “Pentecostals and Ecumenism”; Sandidge, “Dialogue.”

[592] Robeck, “Specks,” 82.

[593] Ponto 4 do relatório do primeiro qüinqüenal, Pneuma 12/2, outono 1990, 85.

[594] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 384. “Retrospectivamente, é surpreendente que um secretariado oficial da Igreja concordasse em se reunir com um grupo não oficial de cristãos descritos por um participante como ‘David Du Plessis e seus amigos’” (Hocken, “Extraordinary,” 204).

[595] Du Plessis, “Background,” 178.

[596] Bittlinger, Papst, 356-57, nota 5. Também Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 273.

[597] Hocken, “Extraordinary.”

[598] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 185. Uma discussão completa da hermenêutica pentecostal no capítulo 23, pp. 307-25.

[599] Wilkerson, Vision; Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 400, 419.

[600] Du Plessis, “persecution”; Martin, R., “Vision.”

[601] Wead, Charismatics.

[602] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, v.

[603] Ibid., I, 284s.

[604] Ibid., II, 289-351. Ver também as notas seguintes.

[605] Ibid., I, iii.

[606] Ibid., II, 290.

[607] Ibid.

[608] McDonnell, “Protestants,” 29, citado por Sandidge, Dialogue (1977-1982) II, 293. Também há espaço para uma mariologia evangélica nas igrejas protestantes. Ver minha peça Mary, the Mother of Jesus (escrita para uma atriz suíça) e Hollenweger, “Ave Maria”; idem, “Devotion.”

[609] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 363.

[610] Ibid., I, 236ss.

[611] Ibid., I, 244, 336, 397.

[612] Correspondência entre os executivos das Assembléias de Deus e Sandidge em Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 340, 397.

[613] Sobre Du Plessis ver capítulo 26, pp. 350-55.

[614] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 260.

[615] Quy, “Nuns”; Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 435. Mais sobre o ministério das mulheres no movimento pentecostal no capítulo sobre eclesiologia, capítulo 20, pp. 267s.

[616] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 220.

[617] Ibid., I, 227.

[618] Ibid., I, 220.

[619] Carta de McAlister a William Carmichael, Rio de Janeiro, 24 de novembro de 1980; Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 225.

[620] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 225.

[621] Ibid., I, 226.

[622] Sobre isto ver Hollenweger, “Einfluss.” Ver também o jesuíta Albert Ziegler (Zwingli). De acordo com Ziegler o motivo para a reforma foi a inflexibilidade da hierarquia católica que tratou os sintomas em vez de ir às raízes da deterioração da igreja. Ele traça paralelos explícitos com o catolicismo atual e ressalta que a reforma não começou com uma controvérsia sobre verdades fundamentais mas no campo do cristianismo prático (celibato sacerdotal, a Bíblia na linguagem do povo, mudanças na liturgia) e percebe na reforma de Zuínglio uma “Comunidade Eclesial de Base” não diferente das comunidades atuais na América Latina. Ele descreve como ecumênica a eucaristia de Zuínglio. Há espaço para a eucaristia de Zuínglio na igreja Católica. Ziegler lida com a compreensão ecumênica e conciliar que Zuínglio tinha da igreja universal, a qual denomina “uma percepção bastante atual.” O ministério do papado em sua forma histórica presente não é a única forma católica possível do ministério petrino. Na tradição católica há outras formas de expressar a unidade da igreja, formas estas mais conciliares e ecumênicas. Portanto ele convida seus colegas católicos a lerem Zuínglio ecumenicamente. O mesmo convite deve ser dirigido aos teólogos reformados e pentecostais.

[623] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 232.

[624] Carmichael, William, Carta de 22 de outubro de 1980; McAlister, Carta de 30 de dezembro de 1980. Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 232.

[625] Sandidge menciona três denominações que enviaram delegados oficiais: a Igreja Internacional do Evangelho Quadrangular, a Igreja de Deus (Cleveland) e a Igreja de Deus da Profecia (Cleveland). Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 382. Em adição a estas, Hocken menciona a Broederschap van Pinkstergemeenten da Holanda e a Igreja Evangélica-Pentecostal Unida da Polônia. Hocken, “Extraordinary,” 205, nota 11.

[626] “Proselitismo” é um termo que nunca aparece na literatura pentecostal.

[627] Pneuma 12/2, outono de 1990, contém respostas de David K. Bernard, Fr. Frank Colborn, Fr. Donald L. Gelpi, S.J., J. L. Hall, Walter J. Hollenweger, David A. Hubbard, Harold D. Hunter, Leonard Lovett, Jesse Miranda, Fr. Thomas P. Rausch, S.J., Vinson Synan, George Vandervelde, Jakob Zopfi.

[628] Hocken, “Extraordinary,” 202.

[629] Ibid., 202-3.

[630] Relatório Final, ponto 25, Pneuma 12/2, outono de 1990, 122.

[631] Ibid., ponto 26, 122.

[632] Carta circular de Du Plessis, “A Season for Peace and Praise,” 1976-77; Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 176 (Ali Sandidge discute a compreensão equivocada que Du Plessis tem da infalibilidade papal).

[633] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 176.

[634] Ibid., I, 177.

[635] Ibid., I, 259.

[636] Ponto 87 do Relatório Final, Pneuma 12/2, outono de 1990, 135.

[637] Pneuma 12/2, outono de 1990, 126; Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 129.

[638] Relatório Final, Pneuma 12/2, outono de 1990, ponto 41, 125.

[639] Zopfi, “Candid Thoughts,” 182.

[640] Relatório Final, ponto 47, Pneuma 12/2, outono de 1990, 127.

[641] Sobre este assunto é particularmente importante o ministro pentecostal iugoslavo, Miroslav Volf; ver sobre ele a parte sobre eclesiologia, capítulo 20, p. 261.

[642] Miranda, “A Response,” citação 171.

[643] Lovett, “Response,” 169.

[644] “The Catholics and the Pentecostals of the West have met (with a few exceptions) to talk about koinonia.” Hollenweger, “Koinonia,” 156.

[645] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 268, 327. Bittlinger discute esse aspecto passim e cita Du Plessis: “Os católicos trazem seus melhores eruditos, e nós deveríamos convidar negros e mulheres?” Bittlinger, Papst, 447, nota 1.

[646] Castiglione, Italia.

[647] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 268, 327, 323, 326.

[648] Ibid., I, 351.

[649] Ibid., I, 123.

[650] Hocken, “Extraordinary,” 211.

[651] Robeck, “Society.”

[652] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 180, 334.

[653] A informação de 60 milhões é de Vanelderen, “Conference.”

[654] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 328s., 325.

[655] Ibid., I, 329.

[656] Ibid., I, 374. Hocken, “Extraordinary,” 208, nota 21.

[657] Sandidge, Dialogue (1977-1982) I, 331, 365.

[658] Eisenlöffel, “Papst.”

[659] Moser, “Dialog.”

[660] Hocken menciona em particular a declaração católica mexicana classificando conjuntamente as Assembléias de Deus e os Testemunhas de Jeová como agressivos proselitistas sectários. “É uma violação dos princípios ecumênicos situar conjuntamente os pentecostais clássicos e grupos sub-cristãos como os Testemunhas de Jeová. Os católicos também devem distinguir entre os movimentos pentecostais autóctones na América Latina e aqueles importados da América do Norte. A evidência mostra que os primeiros estão crescendo mais rapidamente.” Hocken, “Extraordinary,” 212, nota 29. Ver também a nota seguinte.

[661] João Paulo II, “Adress.”

[662] Cleary, “Misreading,” 7s. Robeck, “Taking Stock.” O artigo de Cleary apareceu em espanhol também: “El maltrato de la Jerarquía Católica a los Pentecostales.”

[663] Robeck, “Pope.” Visão geral em McDonnell, “Death,” 14-19.

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