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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO

REMIX LITERÁRIO: UMA GRANDE EXPERIÊNCIA

Fabrício Yassuo Horita Fuzimoto

Rio de Janeiro/ RJ

2013

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO

REMIX LITERÁRIO: UMA GRANDE EXPERIÊNCIA

Fabrício Yassuo Horita Fuzimoto

Orientador: Prof. Dra Cristiane Costa

Rio de Janeiro/ RJ

2013

REMIX LITERÁRIO: UMA GRANDE EXPERIÊNCIA

Fabrício Yassuo Horita Fuzimoto

Trabalho apresentado à Coordenação de Projetos Experimentais da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social, Habilitação Produção Editorial.

Aprovado por

_______________________________________________

Prof. Dra Cristiane Costa – Orientadora

_______________________________________________

Prof. Dra Ilana Strozenberg

_______________________________________________

Prof. Dra Ieda Tucherman

Aprovada em:

Grau:

Rio de Janeiro/ RJ

2013

DEDICATÓRIA

AGRADECIMENTO

Obrigado a todas as pessoas que ajudaram de alguma forma, e acreditaram – mesmo que fosse difícil – em minha graduação. Foram seis anos de espera, sendo preciso também bastante fé.

Obrigado aos que influenciaram diretamente para que ela acontecesse, em especial a Paulo César Castro, modesto grande coração da Eco, e “Melqui” Pereira, do IFCS, que me ensinou que as coisas podem ser diferentes, tudo depende da fé que se tem nas pessoas.

FUZIMOTO, Fabrício Yassuo Horita. Remix Literário: uma grande experiência. Orientador: Cristiane Costa. Rio de Janeiro, 2013. Monografia (Graduação em Produção Editorial) – Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro. 59f.

RESUMO

Este trabalho tem o objetivo de realizar uma pesquisa aprofundada do remix literário, relacionando seu surgimento com a chamada “era do remix” a qual vivemos atualmente e as novas tecnologias da informação e interação. Será feito o mapeamento através de um fio condutor que explicará os contextos históricos que influenciaram para sua criação. Para tanto, o portal MixLit será utilizado como objeto de estudo de sua aplicação prática. Será levantada, ainda, a importância do remix literário como instrumento de convergência entre a literatura eletrônica e a impressa e seu pioneirismo como experiência literária; como também como ferramenta para questionamento da atual legislação brasileira sobre direitos autorais.

Palavras-chaves: remix Literário, literatura eletrônica, novas tecnologias

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 8

2. CONTEXTO HISTÓRICO: COLAGEM........................................................ 13

2.1 CUBISMO............................................................................................... 14

2.2 DADAÍSMO............................................................................................ 17

2.2.1 DADAÍSMO NA LITERATURA....................................................... 19

3. O COMEÇO NA MÚSICA: O NASCIMENTO DO REMIX............................ 24

3.1 MASHUPS.............................................................................................. 26

4. CHEGADA AO REMIX LITERÁRIO: NOVAS TECNOLOGIAS

E WEB 2.0......................................................................................................... 28

4.1 A REVOLUÇÃO FONOGRÁFICA E A AUTONOMIA NA WEB 2.0...... 29

4.2 OS CAMINHOS LITERÁRIOS NA “ERA DO REMIX”.......................... 32

4.2.1 PLATAFORMAS NARRATIVAS.................................................... 32

4.2.2 A CULTURA – OU A ERA? – DO REMIX...................................... 35

4.3 REMIX LITERÁRIO: UMA GRANDE EXPERIÊNCIA............................ 36

4.3.1 REMIX LITERÁRIO BRASILEIRO: MIXLIT.................................... 41

4.3.2 MASHUPS LITERÁRIOS................................................................ 44

5. A QUESTÃO DOS DIREITOS AUTORAIS.................................................. 47

5.1 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E A INTERNACIONAL........................ 48

5.2 O REMIX E AS LEIS.............................................................................. 49

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................... 55

7. REFERÊNCIAS............................................................................................ 57

1. INTRODUÇÃO

Toda forma de invenção ou criação artística tem em sua origem a genialidade do criador, a pessoa que inventa, pensa diferente, surge com algo novo e, com isso, é merecedora do reconhecimento da sua obra. Este pensamento foi predominante até o surgimento das novas tecnologias – a partir da década de 1960 – que revolucionaram o mercado musical e puseram em questionamento a exclusividade do autor. A criação de recursos que permitiram a manipulação do produto musical culminou no surgimento do remix – técnica que altera uma produção musical com o objetivo de customizá-la, alterando seu estilo original. Inventado por Tom Mould, em 1974, o remix deu início à discussão sobre direitos autorais e influenciou na transformação ocorrida no meio digital.

Este projeto visa a mostrar o fio condutor que contextualiza o remix, exibindo o caminho percorrido por ele até chegar à literatura. Esta relação do remix com a literatura, no que é chamado de remix literário, é o tema deste trabalho. Ao longo dele, também será explicada a relação do termo com as novas tecnologias, e sua importância para a ligação entre o analógico e o digital.

O remix literário pode ser considerado uma passagem entre a literatura impressa e a eletrônica? Este é mais um dos questionamentos abordados durante o desenvolvimento do trabalho, que também vai esclarecer sua representação no século XXI.

Mas qual a origem do remix literário? Quais os seus desdobramentos?

No capítulo que dá início a este estudo será explicado o contexto histórico do remix literário, desde a invenção do papel até os movimentos artísticos do início do século XX.

Genericamente, remix significa mistura. E essa ideia de mistura possui um vasto contexto histórico, estando em sua origem a colagem, técnica que consiste em juntar, numa mesma superfície, várias matérias da mesma origem, com o objetivo de criar uma nova forma de expressão visual.

As técnicas de colagem começaram a ser utilizadas na China, com a invenção do papel, há cerca de 200 a.C. Mas seu uso era muito limitado, permanecendo assim até o século X, quando os calígrafos japoneses começaram a empregá-la em seus poemas. Eles preparavam uma superfície colando pedaços de papel e tecido sobre um suporte. Depois, pintava-os com seus ideogramas para formarem seus poemas.

Houve traços de colagem ao longo de todos os séculos seguintes, mas ela se manifestou como forma de expressão artística somente a partir do início do século XX, através do cubismo, um dos movimentos em que foi iniciada, também, a arte pós-moderna. Os criadores do cubismo foram Pablo Picasso e Georges Braque. Em seguida, o dadaísmo, que nasceu em Zurique, na Suíça, também manifestou fortes traços de colagem, que era uma das formas mais claras de ruptura com a arte clássica. No dadaísmo, aconteceu uma das primeiras ligações da colagem com a literatura.

No capítulo 3, será contada a origem do remix: quem inventou, que tecnologias possibilitaram sua criação e o contexto musical que influenciou na evolução das técnicas musicas posteriores.

A materialização da transformação da colagem para o remix deu-se graças às inovações tecnológicas ocorridas um pouco antes, durante a década de 1960, quando foram inventados recursos de pós-produção para manipular os elementos que compõem uma canção. Grandes artistas, como os Beatles, por exemplo, aproveitaram-se de tais recursos para adicionar novos elementos ao que era produzido em estúdio, como efeitos, modulações e superposições.

Dada essa tecnologia, o nascimento do remix ocorreu na música, durante os anos 1970, com Tom Moulton, um famoso produtor americano que chegou a afirmar que algumas de suas criações “nasceram de forma acidentais”. O remix, de acordo com ele, foi fruto de uma insatisfação em relação às músicas tocadas nas discotecas da época. Todas elas, segundo Moulton, eram muito curtas e isso impedia que fossem aproveitadas nas pistas de dança. O produtor, então, passou a produzir versões estendidas das músicas em discos de 7 polegadas. Um dia, ele experimentou usar uma mídia de 12 polegadas, dando origem ao remix.

Com essa técnica em mãos, os DJs começaram a explorar também outras invenções da época, como o vinil de 12 polegadas e o break, criados também por Moulton. As mudanças transformaram o mercado musical e, principalmente, o das discotecas, no auge da Disco Music – gênero musical que, na época, protestava contra a dominação do rock.

Essa mistura, posteriormente, se expandiu a outras modalidades artísticas e técnicas, como a arquitetura, o design, a moda, os quadrinhos, cinema, literatura etc.

O remix evoluiu e dele nasceu o mashup, que caracteriza-se pela junção de duas ou mais obras audiovisuais – em sua maioria músicas – que dão origem a uma nova obra. Dessa forma, enquanto no remix há uma releitura de uma produção musical – com alterações de batidas, ritmo, vocal e adição de efeitos –, no mashup o objetivo é a mistura de duas ou mais músicas para formar outra utilizando os efeitos de remixagem. O mashup se popularizou bastante nos últimos anos, ditando o ritmo das boates ao redor do mundo. Muitos DJs anônimos ganharam fama por pela qualidade dos mashups produzidos, às vezes, dentro de um quarto.

No capítulo seguinte – “Chegada ao remix literário: novas tecnologias e web 2.0” – será analisada a evolução que levou ao contexto contemporâneo: como a revolução fonográfica influenciou para a chegada da chama web 2.0, quais são suas características, e a batalha travada por grandes gravadoras musicais que expuseram e fizeram ser repensada a questão dos direitos autorais. Também será realizado o embasamento teórico desta pesquisa, bem como uma dissertação sobre a importância do remix literário como ferramenta de convergência entre as literaturas eletrônica e impressa, sendo fruto das novas tecnologias.

O mashup é fruto da web 2.0 e das novas tecnologias da informação e comunicação. Contudo, a transformação começou no início dos anos 1990, com o aparecimento da internet, na chamada web 1.0. Nesse período, o usuário se mantinha passivo às informações transmitidas na rede, sujeito às emissões de sites.

Até que a revolução fonográfica aconteceu, e surgiram o mp3, em 1997, e o Napster, em 1999. O programa de compartilhamento P2P (peer to peer) criou um sistema de interação e troca de músicas mp3, cujo objetivo era fazer a música circular livremente pela web. O usuário se tornou tanto o emissor quanto o receptor do conteúdo, o que fez com que o Napster se tornasse o pioneiro da era da globalização da informação e interatividade. Pelo prejuízo evidente que causou às gravadoras de música, a empresa, após muitos processos judiciais por infringir as leis de direitos autorais, fechou suas portas em 2001. Mas a porta já tinha sido aberta. Com as novas tecnologias, como programas que permitiam a edição de conteúdos audiovisuais, qualquer usuário da internet pôde se tornar um produtor musical independente e também um disseminador de conteúdo protegido por direitos autorais.

Os direitos ao criador da obra, seja ela qual for, são assegurados graças às leis de direito autoral. No entanto, quando se trata de remix e mashups, o questionamento ganha contornos mais abrangentes, pois se trata de uso de fragmentos de várias criações, resultando em uma própria e, à sua maneira, autêntica.

A cultura do compartilhamento transcendeu o mercado musical e chegou a área do conhecimento, sendo um ícone dessa passagem o Wikipedia, onde é possível passar e receber informação. A cultura se tornou livre, independente, criada por muitos para muitos, os quais, por sua vez, a transformam e a remixam para torná-la em algo novo.

Após nascer com a música, o remix chegou finalmente até a literatura. Em resumo, pode-se dizer que é um corta e cola de fragmentos de textos de diversos livros – conhecidos ou não – que dão origem a uma nova narrativa literária. O remix literário ainda é uma experiência das novas tecnologias, e pode ser realizada dentro e fora do meio digital.

Também será colocado em pauta neste estudo o tom de convergência, do remix literário, entre a plataforma impressa e a eletrônica, pois bebe das duas fontes e também deságua em ambas. A era da informação e interação no ambiente digital possibilitou experiências na literatura impressa e vice-versa por meio de recepções cognitivas do usuário, como é possível analisar no principal livro utilizado como base teórica do trabalho, Literatura Eletrônica: novos horizontes para o literário, de Katherine Hayles. Dessa forma, a literatura eletrônica realiza a função adicional de entrelaçar modos humanos de conhecimento com cognição da máquina, ao passo que as experiências interacionais físicas do ser humano também influenciam nas que serão experimentadas digitalmente.

Mesmo sem consolidação como nova forma de expressão literária, deu origem ao mashup literário, uma modalidade que ganhou fama após publicações que misturam obras consagradas com conteúdo de ficção. O estilo possibilitou publicações imprevisíveis na literatura, e foi possível testemunhar a criação de obras como Lincoln, o Caçador de Vampiros e Orgulho e Preconceito com Zumbis – este último baseado na obra clássica de Jane Austen.

O pioneiro do remix literário no Brasil é o escritor Leonardo Villa-Forte, dono do portal MixLit, que reúne textos produzidos por ele ou enviados por adeptos do estilo. Como ainda não é uma experiência consolidada, foi utilizado como objeto de estudo somente o MixLit, pela proximidade com o leitor brasileiro.

No capítulo que encerra esta pesquisa, veremos que um dos principais desafios desta nova experiência literária é repensar os limites dos direitos autorais não só na literatura, mas em todas as áreas do conhecimento. Villa-Forte, em seu portal, defende a disseminação dos textos de outros autores para que haja divulgação de suas obras. Essa revolução, que atingiu todas as áreas do saber e artísticas e consolidou a era do remix, criou uma reflexão sobre a atual legislação de direitos autorais, chegando-se a conclusão de que é necessária uma reforma nas leis, além de uma expansão ao conceito de compartilhamento.

2. CONTEXTO HISTÓRICO: COLAGEM

Quando a mãe dá aos seus filhos um frasco de cola e alguns recortes para que eles brinquem ou a professora os pede que façam isso em sala de aula, mal imaginam que estão dando seguimento a uma técnica que teve seu surgimento há mais de dois mil anos – se forem considerados os registros que remetem à invenção do papel, na China, cerca de 200 a.C[1]. A colagem existe há muito tempo, mas é preciso que se explique seu conceito para que não seja confundida com outras técnicas, como o mosaico – que consiste em colar pequenas peças coloridas com o intuito de formar desenhos sobre uma superfície – utilizado pelos gregos e romanos, estes, sim, há milhares de anos; e a construção, mistura de vários elementos e matérias para a formação do objeto artístico[2].

A colagem consiste em juntar, numa mesma superfície, uma mistura de várias matérias da mesma origem, com o objetivo de criar uma nova forma de expressão visual. Ao contrário de outras técnicas milenares, ela se consolidou num período mais recente. Mais especificamente no começo do século XX. Seus precursores foram Pablo Picasso e Georges Braque. Ambos são artistas do cubismo, um estilo artístico que deu vida à colagem – esta que começou de maneira despretensiosa, como uma brincadeira de criança. Dessa forma, seu uso criativo foi explorado de forma muito limitada.

Para haver colagem, é necessária a existência de um método. A criação é feita em duas fases. Na primeira, acontece a escolha do material que será colado – esta fase é chamada de coleta. A segunda etapa é a de composição. As figuras são recortadas e então são escolhidos os locais para a colagem dos papéis, objetos ou quaisquer que sejam os materiais escolhidos.

Em termos gerais, é importante observar que há traços de colagem ao longo de todos os séculos. Da China, em 200 a.C, com a invenção do papel, até acentuar-se entre os calígrafos japoneses, que a empregavam para produzir os ideogramas que dariam origem aos seus poemas. Na Idade Média, muitos artistas usavam a colagem com o objetivo de reforçar algumas imagens religiosas de grandes catedrais e igrejas. No Renascimento, artesãos a utilizavam como forma de decoração.

Entretanto, a colagem possui aspecto e linguagem mais abrangentes do que uma simples definição como “cortar e colar”. Ela contribui para diversos processos de criação, para os quais ela serve de fonte e inspiração e método criativo, ou seja, pode ser considerada parte de um conceito abstrato que engloba uma ação que passa pela construção empírica de um objeto artístico com origem, mas sem forma definida. A colagem permitiu a ampliação dos horizontes artísticos de expressões artísticas surrealistas, sendo, portanto, um marco do começo do século XX tanto no aspecto literário quanto artístico. Mas antes desse horizonte o qual ela alcançou, a colagem precisou passar por outros processos artísticos antes que se manifestasse de forma mais abrangente e se tornasse um dos expoentes pós-modernos.

1. – CUBISMO

O Cubismo representa as formas da natureza através de figuras geométricas. Cada figura, por sua vez, representa partes de um objeto no mesmo plano, sem nenhum compromisso com a aparência real das coisas. A partir do cubismo, a colagem ganhou vida e se tornou expressão artística. O cubismo se concentra no sentido oposto ao da realidade.

Os maiores expoentes do cubismo foram Georges Braque (1882-1963) e Pablo Picasso (1881-1973), fundadores do cubismo e também da colagem como forma de expressão artística. O primeiro começou o movimento com Fruteira e Copo (1912), considerado uma das primeiras colagens da arte moderna. A técnica, empregada largamente a partir de então, transforma-se num movimento que tornar-se-ia historicamente conhecido. Picasso aplicou outro ponto na estrutura desta manifestação artística ao divulgar Copo e Garrafa de Suze (1912). Em sua definição, o artista espanhol definiu o cubismo como "uma arte que trata primordialmente de formas, e quando uma forma é realizada, ela aí está para viver sua própria vida".

Dessa forma, em vez de correr na direção aos objetos e seres da realidade, a arte cubista trata da decomposição do real, utilizando-se de vários prismas para tal, como se a arte pudesse ser vista de vários ângulos. Isso fez a colagem ganhar cada vez mais força como forma de manifestação artística.

Outros artistas cubistas tiveram a ideia de misturar coisas reais com as que estavam pintadas. Várias foram as intervenções, desde colar rótulos de verdade em produtos pintados. Esse tipo de técnica, porém, é chamada de construção – misturando-se vários elementos e materiais. Mas a colagem, assim como outras técnicas, nasceu a partir de outras peculiaridades.

Todas essas etapas de colagem durante o cubismo tiveram duas classificações. A primeira é chamada de cubismo analítico, no qual os artistas passam mais tempo se preocupando com a estrutura e com a reorganização dos objetos em planos diferentes após sua decomposição do original. A colagem encontra-se em sua forma mais rebuscada, onde o objetivo era a concepção conceitual do objeto, e não a sua forma. Dessa maneira, o aspecto visual, de identificação estética da mensagem, não era tão importante quanto a mensagem implícita contida no objeto, sendo peças de arte muitas vezes monocromáticas. As obras de arte do cubismo analítico são as que possuem o conteúdo mais profundo da época, por às vezes ameaçar a possibilidade de compreensão do observador.

O cubismo sintético, por sua vez, buscava uma corrente contrária ao primeiro. Seu objetivo era a recomposição. Utilizava cores fortes, com grande identificação do observador e apelo visual, por meio do qual não existia mais a visualização por vários ângulos. Esse é o tipo de colagem predominante dentre os dois, utilizando-se a técnica chamada de papiers collés (papéis colados), que tentava encontrar o caminho da síntese, ou seja, a simplificação das ideias. Muitos elementos eram aproveitados para a produção artística, além dos variados papéis, como pedaços de quadros, de madeiras, cartas de baralho, além de areia, tecidos e outros materiais facilmente utilizáveis em superfícies planas.

Pablo Picasso e Georges Braque, dois dos maiores artistas do século XX, participaram das duas fases do cubismo, sendo criadores e percursionistas de sua evolução. Homem no Chapéu (1911-1912) foi uma das colagens mais famosas de Picasso, assim como Natureza morta com cadeira de palha (1912), tida como a primeira colagem realizada pelo artista.

Depois do cubismo, a colagem avançou para outras manifestações artísticas, ganhando força nas expressões surrealistas.

Sobre esse aspecto surrealista que a colagem adquiriu ao ser absorvida por outras artes, o teórico Renato Cohen, em seu livro Performance como linguagem, definiu bem o que significou à época. De acordo com ele (2002, p. 64), foi na colagem surrealista, chamada de collage, que se adquiriu um pensamento sobre a colagem no qual ela representa um verdadeiro distanciamento da realidade, processo que é provocado exatamente pela fragmentação: é a recriação da realidade através da justaposição. Cohen diz: “A essência da collage é promover o encontro das imagens e fazer-nos esquecer que elas se encontram”. (IDE)

Mas é preciso fazer a distinção entre as duas nomenclaturas, apesar da semelhança. Collage, escrito em francês e que se refere à derivação surrealista da colagem, caracteriza a linguagem. Já a colagem em si é apenas uma das partes do processo de criação que inclui a seleção, a picagem, a montagem etc. Em segundo lugar, é fácil ver que essa definição é apriorística porque não é preciso acontecer materialmente todos esses processos (picagem, colagem etc.) para termos uma collage. Como num quadro surrealista, as figuras da collage podem ser imaginadas. Por isso, esta é definida como a colagem surrealista.

A colagem surrealista pode ser feita até por uma criança com uma cola na mão e material para colar, sem necessariamente passar por um processo, como a colagem. Isso possibilita a qualquer indivíduo se manifestar artisticamente, exibindo sua forma de ver o mundo: sem regras, imposição, ele cola o que quer, faz o que quer – mesmo que sua representação com a arte seja representar nada.

O escritor e cineasta J.C Ismael reitera exatamente isso:

O colador enfraquece os deuses do Olimpo, separando uns dos outros, rearranjando-os à sua maneira, agindo como um Deus supremo capaz de impor sua vontade sem admitir a menor contestação. Para o colador a harmonia preestabelecida leva ao delírio. Cumpre-lhe buscar uma nova ordem para essa harmonia, resgatando-a das amarras prosaicas do cotidiano (1984, p. 9).

Dessa forma, as possibilidades se tornam infinitas e as mais improváveis combinações ganham vida e se tornam plausíveis, do ponto de vista do criador. Algumas collages são célebres, como as obras de arte de René Magritte, que buscava intensamente afastar e, ao mesmo tempo, aproximar objetos e imagens para “criar paradoxos visuais, associar duas experiências visuais que não podem ocorrer simultaneamente” (TORCZYNER, 1977).

Outro artista, o qual possui obras valorosas que exprimem naturalmente o significado da collage, é Max Ernst, responsável por O Sangue – um homem, com uma cabeça de águia, segura uma mulher nua que crava uma espada em seu pé – e Uma semana de bondade – uma mulher da alta sociedade da época entra de mãos dadas em casa com um homem que possui o tronco e a cabeça de uma águia. Sua arte, mais que o distanciamento, exibe uma busca pela verdade:

Esse distanciamento, produzido pela recriação da realidade (como no exemplo citado — um homem com cabeça de águia) não vai provocar uma separação entre vida (no que diz respeito aos acontecimentos cotidianos) e arte, mas, pelo contrário, vai possibilitar a estimulação do aparelho sensório para outras leituras dos acontecimentos de vida. A arte funcionaria, dessa forma, como uma chave para uma decodificação mágica da realidade, constituindo-se segundo o pensamento esotérico, num dos quatro caminhos para a verdade ao lado da religião, da filosofia e da ciência. (COHEN, 2002, p. 63)

2.2 – DADAÍSMO

O dadaísmo surgiu na Europa, mais especificamente na cidade de Zurique, na Suíça, em 1916, durante a Primeira Guerra Mundial. Trabalhava com a ruptura das obras de arte tradicionais, avesso às tendências, agindo, assim, de maneira anárquica e bastante crítica em relação ao cenário que se desenhava à época. Foi um movimento da vanguarda artística e literária. Muito popular, e formado por vários artistas do início do século, divididos nas mais diversas formas de expressão, como escritores, poetas e artistas plásticos, tendo entre seus líderes Tristan Tzara, Hugo Ball, Hans Arp e R. Ruelsenbeck.

A colagem foi muito explorada pelos artistas dadaístas, visto que era uma forma de expressão artística diferente da utilizada pelos artistas clássicos, e que ia ao encontro da filosofia dos dadaístas – o desprezo pela exigência estética e o abandono da pintura a óleo. Foi sob a vigência desse movimento que o uso da colagem ganhou mais força na literatura, como será visto mais abaixo.

Durante todas as noites, muitos desses personagens europeus se reuniam no clube preferido da classe artística moderna, o Cabaret Voltaire, fundado por Ruelsenbeck. Eles desejavam mais liberdade para criar e experimentar novos caminhos na arte, ao mesmo tempo em que procuravam manifestar sua insatisfação com os contornos que a arte, e até a sociedade, tomavam. Um dos principais protestos do grupo era contra a realização da Primeira Guerra Mundial. Outra crítica era contra a falta de autonomia dos movimentos artísticos da época.

Para tanto, o dadaísmo caracteriza-se pelo caráter questionador, que desafia a lógica por ele desencadeada, assim como quebra os paradigmas da construção. Com isso, o Dada (como também é chamado) caracterizou-se como um movimento de crítica cultural, indo bem além de um manifesto pela arte.

A postura diferenciada dos dadaístas aboliu a lógica predominante no início do século XX. As mudanças aconteceram, principalmente, no campo da ação, levando à arte um caráter de espontaneidade e gratuidade, de “desorganização” social, no qual o sentido das coisas fora afetado. O poeta Tristan Tzara[3] (1918), à época, explicou num de seus manifestos Dadá:

Dada não significa nada: Sabe-se pelos jornais que os negros Krou denominam a cauda da vaca santa: Dada. O cubo é a mãe em certa região da Itália: Dada. Um cavalo de madeira, a ama-de-leite, dupla afirmação em russo e em romeno: Dada. Sábios jornalistas viram nela uma arte para os bebês, outros jesus chamando criancinhas do dia, o retorno a primitivismo seco e barulhento, barulhento e monótono. Não se constrói a sensibilidade sobre uma palavra; toda a construção converge para a perfeição que aborrece, a ideia estagnante de um pântano dourado, relativo ao produto humano (TZARA, 1918)

Apesar da grande expressão por meio da pintura, na literatura o dadaísmo também ganhou contornos que o ajudaram a se estabelecer e ficar para a posteridade. Havia traços de mistura, através do recorte de papeis, e colagem nas criações dadaístas.

Tzara ironizou a forma como o mundo funcionava, e o fez por meio de seus poemas, com os quais conseguia se manifestar artisticamente, mas de uma forma diferente da dos demais. Ele tentou simplificar, explicando que não passava de uma questão de conceito e com aplicações reais.

Para por em prática seu pensamento, o poeta, num de seus diversos manifestos – mais especificamente o último publicado por ele –, enumerou um passo a passo para se alcançar a prática dadaísta no ambiente narrativo, mais especificamente explicitando, em forma de receita, como fazer um poema dadaísta.

Pegue um jornal. Pegue a tesoura.

Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu poema.

Recorte o artigo.

Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam esse artigo e meta-as num saco.

Agite suavemente.

Tire em seguida cada pedaço um após o outro.

Copie conscienciosamente na ordem em que elas são tiradas do saco.

O poema se parecerá com você.

E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade graciosa, ainda que incompreendido do público.

Pela quebra radical das formas conhecidas de arte e escrita, o Dadá sofreu fortes críticas de alguns grupos do meio artístico, sendo acusado de praticar uma espécie de terrorismo cultural. Por outro lado, também ganhou status de revolucionário pelos que admiravam seu ideal questionador e transformador. Não à toa, já que cada Manifesto Dadá, escrito por Tzara, exibia tamanho potencial:

Eu digo a vocês: Não existe um começo e não iremos tremer, não somos sentimentais. Somos um vento furioso, arrancando a roupa suja das nuvens e orações, preparando o grande espetáculo de desastres, fogo e decomposição. Nós vamos colocar fim ao luto e substituir lágrimas por sirenes gritando de um continente a outro. Pavilhões de alegrias intensas e viúvas envenenadas. (TZARA, 1918)

2.2.1 – DADAÍSMO NA LITERATURA

Um dos expoentes da colagem dadaísta na literatura foi Kurt Schwitters, que não pode ser considerado somente um ícone dadaísta, pois teve envolvimento com vários movimentos, como o cubismo, futurismo, expressionismo e até o construtivismo russo. Foi exatamente essa polivalência que o fez inserir o dadaísmo nos textos literários, entre outras obras escritas. Pois, além de poeta, foi também dramaturgo, prosador, ensaísta, teórico, publicitário, pintor, escultor, entre outras formas de modalidade artística. Ele criou a denominação Merz para designar todas as obras com origem na colagem, sejam essas obras literárias, das artes plásticas, na pintura etc.

Na literatura, o Merz veio como uma nova forma de ler o mundo, assim como também se destacou na pintura, nas artes cênicas, em ensaios e esculturas. Ou seja, o Merz, onde quer que fosse representado, era análogo, o conceito era facilmente identificável tanto nas palavras quanto nas figuras. Tudo era utilizado como influência para criar sua literatura: textos de propaganda, palavras do cotidiano, recortes de jornais, ditos populares. A tradutora e estudiosa de Schwitters, Fabiana Macchi (2004), destaca que foi a partir de sua vocação para a experimentação que o artista alcançou o primado da forma estética, não importando o material que se usaria para atingi-la.

Sob o pano de fundo da destruição causada pela primeira guerra mundial e de uma sociedade necessitando de reestruturação, sua arte passa a se utilizar de dejetos, restos, cacos de objetos — o lixo da sociedade industrial — para reestruturá-los esteticamente. Lá estão, em suas colagens e sobreposições, recortes de jornais, passagens de bonde, nacos de madeira, restos de objetos de metal etc. Ele explica: “O material utilizado é irrelevante; o essencial é a forma. Por isso utilizo qualquer material, contanto que a obra exija” (SCHWITTERS, 1996 p.14 apud MACCHI, 2004). 

Apesar da forma não importar, foi na literatura que ele fez suas maiores experiências, sendo considerado um inventor e experimentador, com grande destaque na poesia.

A Poesia Merz é abstrata. E utiliza, da mesma forma que a pintura Merz, pedaços de coisas já existentes, no caso, de frases retiradas de jornais, de outdoors, de catálogos, de conversas etc., com ou sem modificações (...). Estes pedaços não precisam ter relação com o sentido, pois o sentido não existe mais. (...). Também não existem mais elefantes, existem apenas pedaços de poema. (MACCHI, 2004)

Macchi continua explicando mais profundamente, dissecando a técnica empregada por Kurt Schwitters em sua literatura, principalmente em seus poemas.

Sua produção literária registra, igualmente, incursões e experimentos em todos os gêneros e estilos, bem como uma série de intersecções entre os gêneros. Trabalhou com várias técnicas, em várias concepções de métodos, em constante pesquisa. Muitos de seus poemas são cadeias de palavras sem concatenação semântica lógica, aglomerados de verbos inventados e palavras desconexas, formando uma composição rítmica, às vezes visual. Outras vezes, uma sequência semântica lógica é interrompida pela introdução de um elemento que sugere outros sentidos, que remete a outra cadeia lógica (...). Às vezes, as palavras aparecem descontextualizadas, referindo-se, senão a si próprias, interligadas, na melhor das hipóteses, a nível sonoro ou rítmico (IDEM).

Seu poema mais famoso é Para Anna Flor[4]. O texto foi impresso e publicado e cartazes de um metro espalhados pelas ruas de Hannover, na Alemanha. A publicação sofreu severas críticas, assim como aconteceu com o dadaísmo. O escritor respondeu aos avanços dos críticos com cartas abertas e crônicas, gerando grande polêmica no país. Do mesmo modo, o poema também foi muito elogiado pelos adeptos a novidades, e acabou ganhando dimensões maiores ainda com o destaque dado pela crítica e pelos defensores. Foi assim que Para Anna Flor se imortalizou como um dos textos mais polêmicos da história da literatura alemã, sendo mencionado até os dias de hoje. (MACCHI, 2004)

Para Anna Flor

Poema Merz I

(c. 1919)

Ó tu, amada dos meus vinte e sete sentidos, eu

lhe amo! — Tu teu te a ti, eu a ti, tu a mim.

— Nós?

Isto (aliás) não vem ao caso.

Quem és tu, dona inumerável? Tu és

— és? — Dizem que serias — deixa

que digam, eles nem sabem como a torre da igreja se sustém.

O chapéu sobre os pés, caminhas

sobre as mãos, com as mãos tu caminhas.

Olá, teus vestidos vermelhos, serrados em pregas brancas.

Eu amo Anna Flor vermelho, vermelho eu lhe amo! — Tu

teu te a ti, eu a ti, tu a mim. — Nós?

Isto (aliás) é coisa para a brasa fria.

Flor vermelha, vermelha Anna Flor, o que andam dizendo?

Responda e ganhe: 1. Anna Flor tem um macaco no sótão.

2. Anna Flor é vermelha.

3. Qual é a cor do macaco?

Azul é a cor do teu cabelo amarelo.

Vermelho é o chiado do teu macaco verde.

Tu, moça simples de vestido de chita, tu, doce

bicho verde, eu lhe amo! — Tu teu te a ti, eu

a ti, tu a mim, — Nós?

Isto (aliás) é coisa para o braseiro.

Anna Flor! Anna, a-n-n-a, gotejo o teu nome.

Teu nome pinga como tenra gordura bovina.

Sabes, Anna? Já o sabes?

Posso ler-te também de trás para frente, e tu,

a mais formosa de todas, serás sempre, de trás para frente e de

frente para trás: »a-n-n-a«.

Gordura bovina goteja acaricia minhas costas.

Anna Flor, tu, bicho gotejante, eu lhe amo!

Na América Latina, um dos que ganharam essa alcunha de transformador foi o chileno Vicente Huidobro (1893 a 1947), considerado pelos concretistas brasileiros um dos grandes revolucionários da poesia, e adepto ao dadaísmo na literatura. Mesmo depois do fim do movimento – que na Europa declinou no início do século XX –, Vicente Huidobro continuou a praticar sua poesia dadaísta, que viria a inspirar outras técnicas, como a fotomontagem de palavras. De acordo com Huidobro (1927), a poesia é uma expressão do autor, que vem de dentro do seu pensamento e, para tanto, deve ser respeitada, independentemente da forma com que se apresenta. A poesia é a invenção do artista, dizia ele.

Poema criado é um poema em que cada parte que o constitui, e todo o conjunto, mostra um jeito novo, independente do mundo exterior, desligado de qualquer outra realidade que não seja a própria, pois toma o seu lugar no mundo como um fenômeno singular, separado e diferente dos demais fenômenos. Tal poema é uma coisa que não pode existir senão na cabeça do poeta. Quando escrevo, apresento um fato novo, alguma coisa que ainda não conhecem, que nunca verão e que, no entanto, gostariam de ver. Um poeta deve dizer algumas coisas que nunca seriam ditas sem ele.

O poema Arte Poética (1916), um de seus principais, demonstra a forma com que tratava seu texto, uma ruptura com os poemas clássicos:

Que o verso seja como uma chave

Que abra mil portas.

Uma folha cai; algo passa voando;

Quanto fitem os olhos criado seja,

E a alma de quem ouve fique tremendo.

Inventa mundos novos e cultiva a palavra;

O adjetivo, quando não dá vida, mata.

Estamos no ciclo dos nervos.

O músculo pende,

Como lembrança, nos museus;

Mas nem por isso temos menos força:

O vigor verdadeiro

Reside na cabeça.

Por que cantais a rosa, ó Poetas!

Fazei-a florescer no poema.

Somente para nós

Vivem as coisas sob o sol.

O Poeta é um pequeno deus.

Foi assim que ele se consolidou com um dos expoentes poetas da era do dadaísmo, mesmo com o fim do movimento, que terminou oficialmente no ano de 1922. Tristan Tzara e André Breton, precursores do dadaísmo se desentenderam em relação aos princípios de ambos. Tzara queria manter uma postura mais conservadora, preservando seu pioneirismo editorial. Todavia, Breton, juntamente com outros líderes do movimento, como o alemão Hugo Ball, partiu para explorar outras possibilidades que a arte poderia proporcionar. Esse rompimento teve vital importância para os rumos que a arte tomaria, pois dessa ruptura nasceria o movimento Surrealista, que teve Breton como um de seus criadores. Apesar da resistência ao fim do dadaísmo, Tristan Tzara acabou abandonando também o movimento, aderindo ao Surrealismo e se tornando mais um a promovê-lo.

3. O COMEÇO NA MÚSICA: NASCIMENTO DO REMIX

Apesar de possuir um contexto histórico, o remix, conceitualmente e reconhecidamente, está datado dos anos 1970, e foi criado pelo produtor Tom Moulton. Genericamente, havia traços de elementos da cultura do remix há mais de dois anos, mas há uma discrepância com a forma a qual tratamos atualmente. Não se deve confundir a colagem com o remix. São diferentes em relação à matéria-prima. Em semelhança ao remix, a colagem nutre somente a ideia de mistura, de junção de diferentes materiais, para a construção de algo novo. O remix nasceu na música para fazer música; dela acabou passando para outras expressões artísticas, como cinema, moda, design, arquitetura etc., até finalmente chegar na literatura.

Muita coisa aconteceu na música na década de 1970. Entre a queda do rock clássico e o nascimento da música punk, surgiram várias bandas que transformariam o rock para sempre, assim como estilos músicas que se tornariam elemento essencial no híbrido que protagoniza a música contemporânea, como o rock progressivo e o glam rock. Bandas como Led Zeppelin, Black Sabbath e Deep Purple disputavam espaço com Pink Floyd e David Bowie. Da Inglaterra, os Sex Pistols e o The Clash se expressavam da mesma forma que o The Ramones, nos Estados Unidos. Todos eles, entretanto, não foram páreos para o pop de um garoto negro que surgia em carreira solo, após sucesso com seus irmãos: Michael Jackson lançou seus quatro primeiros discos e, no fim, da década, havia se consolidado como o maior símbolo da música pop com o lançamento de Off the Wall.

A música vivia seu auge e era explorada de todas as formas, parando consequentemente nas pistas de dança. A disco music, que estava em decadência ressurgiu com o lançamento do clássico Os Embalos de Sábado à Noite, com John Travolta, nos cinemas. Nessa turbulência artística e musical, não à toa, apareceu o remix.

Não faltou inspiração para Tom Moulton levar às discotecas sua invenção. Nascido em 1940, na cidade de Nova Iorque, Tom era fã de Black Music. Pouco antes de completar 30 anos, portanto no final da década de 1960, ele começou a frequentar um lugar que tocava músicas negras, a Fire Island, localizada no subúrbio nova-iorquino.

Mas as músicas que tocavam no lugar eram curtas demais, o que incomodava Tom. Com isso, os responsáveis pelo som (que ainda não recebiam o nome de “DJ”) tinham que se virar para mixar uma faixa à outra, pois as canções terminavam com um fadeout (volume que vai diminuindo até acabar a música) e possuíam um ritmo totalmente diferente uma das outras.

Tom chegou ao ponto de não suportar mais ouvir aquelas canções, como ele próprio dizia:

“... achava aquilo horrível (as mixagens), porque as pessoas não sabiam se dançavam a primeira ou a segunda música; e elas, que já eram curtas, ficavam ainda mais, com os cortes para as passagens entre uma e outra...”.

Em entrevista[5] ao portal Open Vault (2013), uma biblioteca de arquivos de mídia, o produtor exteriorizou sua frustração com a música nas discotecas da época e descreveu sua trajetória nos caminhos que o levaram à criação do remix:

Em 1972, notei que havia muita frustração na música da época. Elas eram todas no formato 2 - 1/3, com duração de três minutos, da qual você tocava basicamente 45 segundos. Depois dos três minutos, você sabe, a multidão não sabia se terminava o que estava dançando ou se tentava alguma outra coisa. E eu pensava: "Deus, seria ótimo se você pudesse estender esse sentimento". Fui, então, a um estúdio de gravação. Eu costumava participar do negócio de gravadoras como promotor e questionei a May James, uma amiga minha, se ela tinha a versão instrumental de uma música do selo que eu gostava. Ela disse que sim, levei a canção para casa e a reeditei e juntei. Eles gostaram tanto que perguntaram por que eu não tentava fazer a mesma coisa com uma música real no estúdio. Eu aceitei e nos divertimos. Foi basicamente assim que tudo começou[6].

Moulton se refere neste caso às primeiras mixagens feitas por ele, que começou produzindo Discos Mix – versões estendidas das músicas. Com sua invenção, ele passou a produzir discos e distribuir pelas casas de dança da época. Entretanto, seu produto demorou a ter aceitação. Quando houve, outros músicos levaram o crédito pelas mixagens. Isso fez Tom parar de distribuir suas mídias.

Essas mídias eram produzidas por Tom em discos de 7’’ (polegadas) – os quais comportavam somente uma música de cada lado. Mas, num dia, os discos de 7 polegadas estavam em falta e restou a ele usar os de 10 polegadas. Como sobraria muito espaço, foi necessário alargar os sulcos do disco para ocupar toda a extensão da mídia, procedimento que melhora a qualidade do som.

O resultado extraordinário da experiência o induziu a mais uma ousadia. Ele testou alargar ainda mais os sulcos do disco numa mídia de 12 polegadas. O segundo excelente resultado viria a transformar o mundo da música e levá-la a outro patamar, dando origem ao remix, utilizando-se do Disco Mix, ou 12 inch. Seu primeiro fruto foi I'll Be Holding On, de Al Downing, em 1974.

A evolução fora inevitável. A partir dos anos 1980, o remix redimensionou-se, atingindo níveis de complexidade e criatividade que perduram até hoje. Diversas músicas transformaram-se com a interferência do remix, ora superando suas versões originais, ora se fundindo a outras, formando uma nova canção, como é o caso dos mashups.

3.1 – MASHUPS

O mashup caracteriza-se pela junção de duas ou mais obras audiovisuais e surgiu como evolução técnica dentro do remix, por isso é considerado uma forma de remixagem. Contudo, nos mashups, tal criação não é considerada somente uma modificação da obra original – como o remix –, mas sim a constituição de uma nova obra. Ou seja, são utilizados fragmentos de obras audiovisuais que somados formam um terceiro elemento. O mashup pode ser exemplificado pelo fórmula : “a + b = c”.

Ao redor do mundo, possui várias nomeações, como: bootlegs, mashep hits, smashups, boots, cutups, blends e bastard pop. O mais interessante no termo cutups é a origem de seu nome. Ele foi designado por William S. Burroughs, na década de 1960, como descrição de suas experiências com a literatura. Burroughs cortava fragmentos de obras literárias para montar outras, rearranjando de forma que terminasse em algo novo. Dessa forma, o cutup está intimamente ligado ao mashup literário, o qual será visto mais à frente.

No remix é feita uma releitura de uma produção. Dessa forma, muda-se a batida, o ritmo, a sonoridade, vocal, e também são adicionados efeitos e extensões, como forma de transformar a música. Já no mashup são misturadas duas ou mais músicas – somadas a efeitos sonoros de remixagem – com o objetivo de formar uma nova produção musical.

Outra diferença pontual é que o mashup é fruto das novas tecnologias especificas da Web 2.0, que teve como um de seus precursores o Napster e o advento do mp3. Junto deles, o aparecimento de diversas ferramentas de edição de som caseiras possibilitou que os DJs pudessem trabalhar em invenções musicais, sendo uma delas os mashups. Tal intervenção começou timidamente com o uso dos samplers, e evoluiu para a fusão de duas ou mais músicas. Portanto, enquanto o remix nasceu da necessidade, utilizando-se somente das ferramentas disponíveis à época, o mashup é fruto da convergência de elementos típicos da web 2.0, como: os softwares de compartilhamento P2P (peer o peer) e de edição de som; as plataformas hipermídias e o formato mp3 (MPEG 1 Layer-3); além, é claro, da cultura do remix, definida pelo teórico Lev Manovich como a que dominou o século XXI e está presente em todas as estruturas da sociedade e manifestações artísticas conhecidas pelo homem. Juntamente com as ideias abordadas por Lev Manovich, a definição de cultura do remix e o que ela engloba serão vistas de forma mais ampla no próximo capítulo, principalmente pela sua importância nas transformações perceptivas da sociedade contemporânea e suas criações artísticas.

4. CHEGADA AO REMIX LITERÁRIO: NOVAS TECNOLOGIAS E WEB 2.0

Nos últimos 20 anos, houve uma drástica mudança no que se refere ao acesso das pessoas à informação. Do nascimento dos meios de comunicação até o final dos anos 1980, a informação era transmitida através da mídia tradicional: jorna, rádio, TV, revistas, rádio etc. Porém, no início dos anos 1990, a Internet surgiu como um novo veículo; criada, primeiramente, com fins militares e, posteriormente, para troca de dados entre cientistas.

Inventada pelo cientista inglês Tim Berners-Lee, através da Organização Europeia para a Investigação Nuclear (CERN), a World Web Wide, ou web, popularizou-se e explodiu no decorrer da década de 1990. Sua principal característica foi a troca de dados de maneira rápida e segura, interligando pessoas e sistemas por todo o globo.

No entanto, ainda havia restrições quanto ao seu conteúdo. As informações, nesse período chamado de Web 1.0, eram estáticas, ou seja, inalteráveis, sem qualquer possibilidade de interação ou atualização do conteúdo. Com isso, um usuário que entrasse em um site, por exemplo, não tinha motivos para retornar a ele, já que as informações contidas ali se mantinham inalteráveis. Da mesma forma, o usuário era sujeito passivo ao que era lido, servindo somente como receptor da mensagem transmitida pela rede, sendo um exemplo de emissores as empresas que hospedavam seus sites na web. Estas não possuíam ferramentas (e nem buscavam alternativas) de propagação de suas informações institucionais, bem como seus produtos e/ou serviços. As ideias nasciam e morriam no mesmo lugar.

Nesse período, o crescimento e a popularização da internet, visto o grande lucro que gerava, levaram várias empresas a investir no setor. Em contrapartida a esses altos investimentos, feitos na bolsa, o crescimento nessa área freou em meados dos anos 2000. Por conseguinte, os resultados desapareceram e os negócios online começavam a não dar resultados, culminando no estouro da bolha, em 2001.

4.1 – A REVOLUÇÃO FONOGRÁFICA E A AUTONOMIA NA WEB 2.0

Foi nesse período da web que surgiram as ferramentas que revolucionaram a indústria fonográfica: o mp3 e o Napster. Em 1997, após uma série de testes, o formato mp3 foi disponibilizado para uso global e, em seguida, a Sony Company criou um formato padrão, fazendo com que todas as empresas de música adotassem o mp3 também. No ano seguinte, já haviam players portáteis sendo produzidos neste formato; dois anos depois, em 2000, os players utilizando esta funcionalidade estavam espalhados pelos Estados Unidos.

Durante essa transição surgiu o Napster Network, em 1999, uma rede de compartilhamento P2P[7]. O software foi o primeiro a ser criado com esse fim, ganhando popularidade instantânea por permitir que o usuário seja tanto o receptor quanto o transmissor do conteúdo. Ou seja, era um sistema de “passe adiante”. O usuário fazia o download da música através do software, para, em seguida, compartilhá-la com outro usuário de qualquer parte do mundo, tornando-se um dos provedores do conteúdo. Tudo isso de forma gratuita. Esse sistema foi um dos pioneiros da era da globalização da informação, e isso, da mesma forma que o alavancou, também foi culminou em sua queda, pois causava grande prejuízo para as gravadoras de discos. Em 2001, por infringir várias leis referentes a direitos autorais, o Napster fechou após alcançar números impressionantes – foram mais de 8 milhões de usuários ativos, em 2001, compartilhando diariamente mais de 20 milhões de músicas.

Mas a revolução musical já havia começado. Aplicativos como Emule, Kazaa e Limewire fizeram com que o sistema P2P se consolidasse, culminando no BitTorrent, o mais eficiente dentre esses softwares, por permitir downloads em bloco, como álbuns inteiros de música e pastas de arquivos.

As empresas, por sua vez, numa tentativa de alavancar as vendas de músicas, passaram a vender as faixas dos álbuns separadamente na internet, com o objetivo de baratear o produto musical, em detrimento do que as gravadoras faziam, “empurrando” o álbum inteiro, com um custo final muito maior. A estratégia deu certo, e, hoje, muitas empresas lucram com isso. O resultado da evolução tecnológica pôde ser visto na segunda geração da internet, a web 2.0. Cada usuário da rede se tornou um produtor musical independente e também DJ, aproveitando-se de uma série de fatores: softwares sofisticados de produção e dissecação de áudio – algo bastante explorado pelos DJs –, livre circulação de conteúdo e conhecimento, formatos de áudio de qualidade, como o próprio mp3, serviços específicos de hospedagem (upload) e divulgação de arquivos e, claro, as mídias e redes sociais – itens fundamentais na propagação de informações pela internet, e fruto de sua evolução.

Nesta segunda geração, a interação manifestou-se como característica predominante. Além desta, muitas outras evoluções, tão importantes quanto, estabeleceram uma nova era da informação, como: abertura dos códigos de aplicativos usados na web, que, antes, eram mantidos com sigilo das empresas; possibilidade de o próprio usuário criar a informação a ser veiculada; interação com a fonte da informação.

Por isso, o ano de 2004 foi um marco para a internet e a tornou no que os indivíduos a conhecem hoje. Foi esse ano que se desenvolveu o conceito de Web 2.0; na época citada, também nasceu a rede social mais popular do mundo: o Facebook, que tornou popular o termo mídia social, tornando-o de fácil entendimento para todos. Deve-se ressaltar que o aparecimento do termo Web 2.0 não estabeleceu o momento do nascimento da interação e da mídia social, mas o nome foi dado devido a observações na mudança que a internet sofria na época. A web 2.0 apenas evidenciou um conceito que já existia antes do aparecimento das ferramentas tecnológicas e da internet, como destacou a pesquisadora Raquel Recuero (2008). De acordo com ela, a social media e grande parte de suas ferramentas está presente desde o começo da internet:

Mídia social, assim, é social porque permite a apropriação para a sociabilidade, a partir da construção do espaço social e da interação com outros atores. Ela é diferente porque permite essas ações de forma individual e numa escala enorme. Ela é diretamente relacionada à Internet por conta da expressiva mudança que a rede proporcionou. Mas não acho que seja, como muitos explicam, uma característica da chamada Web 2.0. Acho que foi sim, reforçada nos últimos anos, mas sempre esteve presente enquanto potencial da Internet (RECUERO, 2008).

Com essa nova forma de propagação da informação, o conceito de mídia transformou-se, dando origem, dessa forma, ao termo mídias sociais. O acesso às informações mudou do ponto de vista do receptor: o público, consumidor de informação e acostumado à passividade, depois da globalização – aliada à popularização e acesso à internet – passou também a produzi-la, tornando-se um emissor. As plataformas de redes sociais também tiveram papel fundamental na propagação de conteúdo audiovisual. O publicitário e especialista em marketing digital André Telles, em sua visão, recordou o ano de 2005, quando as mídias sociais eram enquadradas na categoria de “novas mídias”; as redes sociais, em consonância, recebiam a nomenclatura de sites de relacionamento. Ele atenta para o problema de, às vezes, as duas denominações serem confundidas e até serem consideradas sinônimas.

Devido a esse mal entendido, Telles aponta as diferenças, explicando o conceito de redes sociais, que nada mais é do que uma categoria das mídias sociais. As redes sociais são ambientes que têm como foco reunir as pessoas, chamadas de “membros”. Nelas, o usuário pode expor seu perfil, contendo: fotos, informações pessoais, vídeos, lista de amigos etc., além de reunir comunidades com as quais se identifica (TELLES, 2008).

Entre as redes sociais que ajudaram a difundir produções musicais independentes, está o MySpace, que converge perfeitamente texto e áudio. O Soundcloud, que permite fazer o upload de arquivos de áudio e os disponibiliza gratuitamente por meio de várias plataformas de mídias sociais, também se tornou uma importante ferramenta de divulgação na web.

O Myspace é uma rede social que integra várias mídias online. Nele, encontram-se ferramentas de blogs, criação de perfil de usuário, com postagem de fotos, descrições. Com isso, consolidou-se como a segunda maior rede social do mundo. Para tanto, seu diferencial, que o tornou tão popular, com mais de 100 milhões de cadastros, é a ferramenta que permite a hospedagem de músicas online. Dessa forma, é utilizado como site oficial para diversas bandas iniciantes, produtoras independentes e DJs, que disponibilizam suas músicas na internet gratuitamente; e até de artistas famosos, já que tem como característica o fácil manuseio e a plataforma multimídia.

4.2 – OS CAMINHOS LITERÁRIOS NA “ERA DO REMIX”

No que se refere ao conteúdo textual, existe uma complexidade teórica que engloba muito mais do que a questão do envolvimento da literatura nas mídias sociais, mas também pesquisas de percepção do usuário diante do texto literário em plataformas digitais, bem como adentra as discussões sobre a extinção da literatura impressa, a importância do autor, a desapropriação – ou não – do conhecimento e a abrangência dos acervos digitais. Outro ponto importante é a possibilidade das experiências capacitadas pelas novas tecnologias.

Entretanto, tudo isso surgiu num segundo momento. Por isso, antes de falar dos novos caminhos da literatura eletrônica até o remix literário, é preciso olhar para trás e entender a estrada percorrida.

4.2.1 – PLATAFORMAS NARRATIVAS

Para que isso acontecesse, houve uma introdução (adaptação) das narrativas no ambiente digital, por meio de plataformas diversas, a começar por sites e portais de informação, passando pontualmente pelas possibilidades da web 2.0, entre eles o blog e os sofwares wikis – atrelados ao conceito de hipertexto e, posteriormente, ao de hipermídia –, nunca perdendo o fio condutor moldado pela emissão/recepção, sinônimo da interatividade. Textualmente, vários aplicativos de emissão/recepção de informações apareceram na web, entre blogs, wikis e redes sociais.

Os softwares wikis fundem-se com o conceito de web 2.0. São colaborativos e podem ser definidos como uma produção de textos livres, publicados na web, com liberdade para que qualquer usuário modifique seu conteúdo, sem que este sofra qualquer tipo de repreensão, pois são eles mesmos os responsáveis pela criação do conteúdo e sua edição. Dessa forma, a veracidade e a qualidade do que está sendo transmitido na rede dependem da cooperação e bom senso dos internautas, já que não existe um processo de revisão. Entretanto, todos os dados ficam armazenados, possibilitando a recuperação de informações passadas. Funciona através de um sistema transparente, que exibe as atualizações feitas pelos colaboradores. Assim, a construção do conhecimento torna-se fluida, com modificações constantes, sem que a informação trave em apenas uma definição.

Sendo assim, é um exemplo perfeito da nova web 2.0, que baseia-se na internet feita pelos usuários e para os usuários, em que há interação e troca de informações online. Quando os wikis surgiram, foi ressaltado o perigo de sites que funcionam com base nesse software serem usados de maneira irregular. A explicação está no fato de que as informações contidas na web não são confiáveis, já que qualquer indivíduo pode se tornar um autor, a partir do momento que usufrui da liberdade de editar o texto. No entanto, a possibilidade de atualização constante, pelo contrário, torna a informação mais verossímil possível. Mesmo que um internauta tente “desinformar”, com dados errados, em pouco tempo, outro irá consertar o seu erro. Quando todos agem e interagem com o mesmo intuito, a tendência é que o texto escrito por meio de um wiki se torne cada vez mais confiável. Por isso a importância da participação dos usuários da internet na construção dos wikis.

O exemplo mais famoso de um site que utiliza este software é o Wikipedia, uma enciclopédia livre, escrita pelos próprios consumidores de informação que, especialistas (ou não) em assuntos diversos, também são autores. O Wikipedia, pela variedade de assuntos e porcentagem grande de informações críveis, é comparado à “Enciclopédia Britânica”.

Agrega-se ao conceito de wiki também o de hipertexto, que são textos produzidos em formato digital. Para que um documento digital seja considerado hipertexto, é essencial a presença de hiperlinks, que serve como ponte de ligação que interconecta um texto com outro relacionado ao mesmo assunto ou que possui um tópico em comum. O que destaca o hipertexto é o seu formato não linear. Ou seja, não há uma ordem imposta para leitura. O conjunto de textos na internet, dessa forma, funciona como um ambiente próprio onde a informação flutua.

A evolução, portanto, acontece naturalmente pela desapropriação do conhecimento. O compartilhamento das informações possibilita que as diferenças diminuam e todas as formas de cultura, informação e entretenimento geradas pela internet também sejam consideradas conhecimento. É isso que O teórico Pierre Levy aponta em seus estudos como “Inteligência Coletiva”, em que a inteligência encontra-se distribuída por toda a rede, online, e as redes de comunicação são tão importantes para o aprendizado quanto à leitura de livros de uma vasta biblioteca (1998, p. 28).

O blog foi uma dessas redes e possibilitou que qualquer pessoa se tornasse um escritor em potencial. Das páginas dos blogs muitos autores foram descobertos ou começaram suas carreiras, assim como, também nele, foram iniciadas diversas experiências eletrônicas, apesar de muitos serem olhados com certo receio pela crítica conservadora especializada na literatura tradicional, analógica, sem que esta percebesse que já estava envolvida também pela literatura eletrônica, computacional, como observou a pesquisadora Katherine Hayles (2009), e veremos mais à frente. Ela recorda que todos os livros impressos são arquivos digitais antes de se tornarem livros, estando a diferença somente no processo que torna a forma impressa no produto final (2009, p. 61).

O blog nasceu em 1997, e seu surgimento teve inspiração nos antigos fóruns e listas de discussão, bastantes utilizados na primeira fase da rede. Pode ser conceituado como o registro de informações relativas a um assunto específico, e organizado cronologicamente. O autor pode postar o que quiser no seu blog, seja vídeo, imagem ou texto; ou todos integrados; também é permitido a qualquer usuário da internet comentar sobre as postagens, possibilitando interação e discussão sobre qualquer assunto.

Nos três primeiros anos, não alcançou grande popularidade, até que a empresa Blogger inovou com a criação do permalink na ferramenta, que permitia o acesso direto às postagens, que, no modo antigo, era feito a partir da navegação livre e a atualização pela edição manual, com a informação sendo inserida nas páginas em HTML, sem separação com links. Com a mudança tecnológica, os blogueiros puderam usar o link direto, com uma URL que fazia referência direta à publicação que interessava ao autor, facilitando o acesso à informações específicas, sem precisar de o leitor procurar o arquivo no blog.

A partir do ano 2000, se tornou a principal referência de rede social da internet, continuando a ser bastante utilizado até os dias de hoje. Atualmente, é uma plataforma bastante explorada por empresas e meios de comunicação para divulgação de notícias e informações institucionais, mas mantém-se fiel ao proposto originalmente, utilizado também como diário. Além dessas funções, desempenha um importante papel na divulgação de produções literárias amadoras, sendo uma das principais ferramentas difusoras de textos narrativos na rede, e servindo como principal plataforma de adaptação do papel escrito para o digital. Foi posteriormente superado pelo Wordpress, atualmente o principal caminho para quem deseja publicar algo na internet, seja para se expressar ou criar conteúdo empresarial. O aplicativo possui recursos avançados de programação, com código aberto, sendo esse um dos seus principais trunfos.

4.2.2 – A CULTURA – OU A ERA? – DO REMIX

Em convergência com o discurso de “transformação online”, de experiências interativas e não lineares, está também o pensamento que reflete as impressões do teórico Lev Manovich (2005), que vislumbra outro aspecto para o século XXI. De acordo com ele, este início de século pode ser chamado de “Era do Remix”. Todas essas transformações citadas durante este capítulo fazem parte da cultura do remix, cuja alcunha se refere a todas as formas de interação e compartilhamento que dominaram a web 2.0, e no qual houve uma incrível disseminação de conteúdo, tanto autoral quanto apropriado de outros autores para, então, ser realizada uma transformação que acabaria influenciando nos rumos da sociedade (MANOVICH, 2005).

No século passado, dependíamos de uma estrutura centralizada para produzir e disseminar cultura. Agora, a cultura é livre, independente, criada por muitos para muitos, os quais, por sua vez, a transformam e a remixam para torná-la em algo novo.

A cultura do remix está atrelada ao conceito de ciberespaço, um ambiente novo no qual emergem novas práticas à sociedade. Manovich discorre sobre essa cultura, descrevendo a remixabilidade como o lugar para onde a informação vai, sofre modificações e depois é disseminada para outros destinos.

O drástico aumento na quantidade de informação, acelerado em muito pela internet, tem sido acompanhado por outro desenvolvimento fundamental. Imagine a água descendo uma montanha. Se a quantidade de água aumenta continuamente, vai acabar encontrando vários caminhos novos, e estes farão o mesmo, encontrando outros caminhos pela frente. Algo semelhante acontece com a crescente informação – esses caminhos estão todos ligados uns aos outros e vão a todas as direções: para cima, para baixo, para os lados. (MANOVICH, 2005)[8] [9]

4.3 – REMIX LITERÁRIO: UMA GRANDE EXPERIÊNCIA

A literatura gerada no computador possui certa carga de preconceito pelos que defendem a tradicional literatura. O argumento é o de que, da mesma forma que a nova era trouxe conhecimento, também possibilitou a chegada de conteúdo de péssima qualidade, propagado pela rede e sem nenhum controle. Esta é uma questão que até hoje é alvo de muitas discussões, mas se tornou mais amena nos últimos tempos, principalmente pela existência de experiências digitais de sucesso, como a do mashup literário – que originou livros best-sellers, como Lincoln, o Caçador de Vampiros, posteriormente transformado em filme.

Tal literatura, a eletrônica, portanto, não deve ser vista como somente uma digitalização do texto impresso, e nem comparado com tal, por se tratarem de formas diferentes de ver o ambiente digital. Como definiu Katherine Hayles, em Literatura eletrônica: novos horizontes para o literário (2009):

A literatura eletrônica, geralmente considerada excludente da literatura impressa que tenha sido digitalizada, é, por contraste, nascida no meio digital, um objeto digital de primeira geração criado pelo uso de um computador e (geralmente) lido em uma tela de computador.

Ou seja, quando algo muda, tudo muda e se transforma em algo novo. As tecnologias digitais não são um tempero da literatura impressa. Elas agem independentemente dela, mas ao mesmo tempo andam juntas. Basta analisar a origem do que representa, em sua tradição, enquanto romance, pois “o romance foi o instrumento para representar uma subjetividade interiorizada baseada na relação entre som e grafia. À medida que as tecnologias literárias mudam, as subjetividades que elas representam e informam também mudam” (RAYLES, 2009).

Como vimos anteriormente, a intensa exposição a conteúdos novos por meio da internet está provocando uma explosão de criatividade, que terminam na criação de novas ideias, exclusivas ou não, em rede ou não.

Digitalmente, em questão de literatura eletrônica, são inúmeras as criações inovadoras e as possibilidades de experiências literárias. Algumas já se consolidaram no ambiente digital, como as narrativas hipertextuais, a literatura gerada pelo computador, os jogos com fundamentos literários – contornos épicos, começo, meio e fim –, a ficção interativa. Esta última está intimamente ligada ao remix literário por beber da mesma fonte, como veremos adiante.

Fora do mundo virtual, também é possível observar muitas experiências, que vem causando preocupação à tradição literária impressa. O medo, segundo observou Kathleen Fitzpatrick (2006), é de que os leitores sejam afastados dos livros por conta das novas experiências tecnológicas, como: obras cinematográficas, televisão, videogames e, principalmente, pela internet, além de celulares e mp3.

A temeridade é real e comprovada. Diversos estudos e livros apontam para uma diminuição na taxa de leitura, em proporção mundial, nos últimos quatro anos. No Brasil, por exemplo, um estudo encomendado pela Fundação Pró-Livro e pelo Ibope Inteligência, usando dados de até 2012, apontou uma queda no número de leitores: de 95,6 milhões, em 2007, para 88,2 milhões, em 2011, o que representa diminuição de 9,1%[10].

Outros alertas foram ligados por Nicholas Carr, autor de A Geração Superficial – O que a Internet Está Fazendo com Nossos Cérebros (2011). De acordo com Carr, a internet está transformando nossos cérebros, criando uma geração de leitores com pouca capacidade de concentração e compreensão de texto, exatamente pelo seu potencial dinâmico e interativo, que incentiva um número maior do que deveria de informações superficiais, e distrações. Com isso, em vez de explorar seu potencial, por meio do compartilhamento de informações e acesso a dezenas de dados diferentes por dia, a internet acaba minando a cabeça dos jovens, desviando-os de hábitos importantes, como a leitura e o estudo.

A forma como a Internet se desenvolveu tornou-a mais distrativa, exigindo às pessoas que retenham constantemente pequenas partes de informação e que monitorizem pequenas correntes de informação. Uma das grandes mudanças nos últimos anos, com o advento de novas redes como o Facebook e o Twitter - e isso combinado com o aparecimento dos smartphones e dos pequenos computadores - é que a forma como a Internet funciona mudou. Portanto, passamos do modelo de ir a uma página web ver o que tinha para oferecer para o modelo de informação que está a correr constantemente e que aparece de vários sítios: do SMS, do email, das atualizações do Facebook e dos tweets. Isso encorajou as pessoas a aceitar interrupções constantes, a fazer várias coisas ao mesmo tempo. Perdemos a capacidade de afastar as distrações e de sermos pensadores atentos, de nos concentrarmos no nosso raciocínio, ou seja, a forma como a tecnologia evoluiu nos últimos anos tornou-se mais distrativa; encoraja uma forma de pensar que é a de passar os olhos pela informação e desencoraja um pensamento mais atento. (CARR, 2011)[11]

Esse medo da obsolescência do livro impresso, todavia, aponta apenas para um único caminho, o que é um erro. A tecnologia pode até tornar o romance, como o conhecemos, num produto obsoleto, como mencionou Fitzpatrick (2006), mas não pelo potencial de outras ferramentas de varrê-lo para debaixo do tapete, e, sim, pela evolução, “pela explosão de criatividade em romances impressos contemporâneos”, como defende Hayles (2009, p. 165). Ou seja, o livro se tornaria obsoleto como uma televisão em preto e branco se tornou diante da invenção de sua versão a cores; a matéria, a essência, permanece a mesma.

O remix literário pode fazer parte dessa evolução, mas no momento caracteriza-se como uma nova experiência literária. Um destino inevitável para a literatura, pois, conforme afirmou Lev Manovich, o remix se tornou a base de muitas culturas e se manifesta em todas as formas de expressão artística, seja na arte, na música, no setor audiovisual, na arquitetura, no design etc. Na literatura, portanto, não é diferente, sendo, porém, um dos seus pilares, já que temos na escrita a base do conhecimento, em comparação a imagens e sons.

Em definição, pode-se dizer que o remix literário é a criação de textos narrativos ou literários para a qual se usa como fonte de conteúdo a recombinação de textos de variadas obras de inúmeros escritores. É feita uma seleção criteriosa desses fragmentos, a fim de executar uma edição que caracterize o texto como uma estrutura narrativa coerente. A partir dessas edições, podem nascer contos, microcontos, uma nova obra literária, poemas.

Estas edições levantam a reflexão do papel do leitor, que deixa de ser um mero espectador, para então interferir na obra, não somente de um, mas de vários autores. É como se, tocado pela angústia provocada pela já enraizada cultura do remix, o leitor sentisse a necessidade de fazer “algo” com tamanha quantidade de informação.

Foi o que aconteceu com Leonardo Villa-Forte, referência em remix literário no Brasil, que o assim se tornou por acaso – ele sequer tinha conhecimento de que esse tipo de experiência literária era feita, e em quantidade considerável, fora do país. Em entrevista ao portal Overmundo em 2011, Villa-Forte, com 26 anos à época, explica que o remix literário radicalizou no que diz respeito ao papel do leitor, mostrando que o mesmo possui agora liberdade de interferir numa obra, se assim desejar, para criar outra nova.[12]

Da mesma forma, também funciona como uma expansão do processo que originou a obra literária, everedando-a para outros caminhos, fazendo com que assim ela encontre novos adeptos. É como se um livro se multiplicasse em várias partes, e essas partes se tornassem pedaços de outro conjunto, que, por sua vez, estão espalhados pela rede ou em obras impressas.

Assim, o remix literário mostra que chegou para consolidar a convergência entre a literatura eletrônica, as tecnologias digitais, e as possibilidades experienciais na web e fora dela, numa época em que quase todas as expressões artísticas já se manifestaram dentro da cultura do remix. Em outras palavras, o processo que origina essa mistura pode se manifestar de todas as formas: internamente, dentro do próprio ambiente digital, assim como de fora para dentro (do impresso para o digital) quanto de dentro para fora (do digital para o impresso) – isso, claro, ignorando a ideia do impresso como expressão de literatura eletrônica. É uma relação cognitiva entre impresso e eletrônico. Portanto, essa convergência que o remix literário provoca tem relação com as características que possui em consonância com as da literatura eletrônica, da qual bebe da fonte. Ou seja, não é uma relação completa.

Como vimos, a literatura eletrônica é a literatura originada, concebida e executada no meio digital. Mas ela também se expande, à medida que provoca transformações sensoriais. Na literatura impressa funciona da mesma maneira, como uma malha de retroalimentação, na qual existe uma troca.

A literatura eletrônica estende as funções tradicionais da literatura impressa ao criar malhas de retroalimentação recursivas entre articulação explícita, pensamento consciente e conhecimento sensório-motor corporizado. As malhas de retroalimentação avançam em ambas as direções, subindo do conhecimento sensório-motor corporizado para a articulação explícita e descendo da articulação explícita para o conhecimento sensório-motor. Enquanto a literatura impressa também funciona desse modo, a literatura eletrônica realiza a função adicional de entrelaçar modos humanos de conhecimento com cognição da máquina (HAYLES, 2009, p. 141).

Em consequência, essa relação, no final, termina por gerar frutos, que fazem essa ligação. São intermediações entre os processos digitais e analógicos. São desses processos que nascem experiências como o remix literário, uma das manifestações mais claras da evolução da relação entre o real e o virtual; o escrito e o digitado; a interação e troca de informações; enfim, da “era do remix”.

A literatura eletrônica promove intermediações entre código de computador e linguagem unicamente humana, processamento digital e análogo, e meio impresso e formas de mídia eletrônica. A intermediação facilita o ciclo recursivo ao reapresentar materiais em uma mídia diferente, alterando os modos de entrada de dados sensoriais durante o processo. Essas alterações envolvem diferenças nos tipos de conhecimento representado (...). O ciclo recursivo implica não apenas que A interage com B, mas também que essa transformação retorna de modo que B afeta A, cuja mudança logo modifica B, e assim por diante. A mudança em qualquer parte catalisa mudança em toda a parte, resultando tanto em uma nova compreensão das respostas corporizadas quanto em novas avaliações da prática técnica (iDEM, p. 142 e 143).

Além de ser uma experiência entre o digital e o impresso, o remix literário é um reflexo dos novos tempos. Isso é o que o difere de experiências semelhantes realizadas há 30 anos ou mais. Mesmo assim, não se devem ignorar os exemplos de remix literários, provenientes de épocas passadas, mas que recebiam outro nome. Além disso, todos os casos podem ajudar a explicar de forma mais simples como funciona o remix literário na prática, fora do ambiente teórico.

É o caso do escritor modernista Mário de Andrade, considerado um dos pioneiros, senão o criador, do remix literário no Brasil. Em 1926, em sua chácara no interior de São Paulo, acompanhado de diversos livros, anotações em papel e recortes de jornal, o escritor se concentrou em muitas leituras, e numa dessas – o ensaio do etnógrafo alemão Theodor Koch-Grunberg, Do Roraima ao Orenoco – encontrou a fonte de inspiração para seu próximo romance, o qual decidiu que seria folclórico. Bebendo de trechos de livros de Capistrano de Abreu, Pixinguinha, Couto Magalhães e Pereira da Costa nasceu Macunaíma, a obra prima e Mário de Andrade, cujo texto testava várias combinações e disposições de palavras vindas das obras as quais lera[13]. O modernista gastou apenas seis dias na escrita de seu livro, um remix literário, que na época não tinha um termo como esse para se caracterizar, mas foi uma criação consciente e de método e técnica estabelecidos por ele.

Como uma expressão da literatura, o remix ainda não atingiu seu potencial. Entretanto, são vastas as experiências no Brasil, muitas delas distribuídas pela rede, em sites especializados ou em blogs que arriscam essa experiência. Num nível mais profundo e estabelecido, podemos encontrar apenas o mashup literário, uma forma de remix que se consolidou. Mas para entendê-lo, antes é preciso explorar sua prática mais crua e conceitual, de experimentação, que pode ser encontrada tanto no Brasil quanto fora.

4.3.1 – REMIX LITERÁRIO BRASILEIRO: MIXLIT

Entre essas experiências de remix literário no país está o pioneirismo de Leonardo Villa-Forte, fundador do site MixLit, especializado nesse novo tipo de narrativa literária. O Mixlit[14], hospedado no Wordpress, publica periodicamente textos de remixes literários enviados por adeptos do estilo. Além de publicar diversos textos narrativos com o objetivo de divulgar o projeto nacional, Villa-Forte vê no portal uma forma de homenagear seus escritores preferidos. Ele explica um pouco do trabalho realizado no MixLit, a começar pelo objetivo do projeto:

Criar textos narrativos/literários a partir da seleção, edição e recombinação de trechos de diversas obras de diferentes escritores. Geralmente são pequenos contos, coerentes e homogêneos, sempre citando todas as referências de onde saíram os trechos, como o autor, nome da obra, editora, ano, e tradutor no caso de ser obra estrangeira. É uma forma de radicalização da figura do leitor, e procuro ressaltar a sua liberdade e o seu papel ativo na criação de sentido de um texto. (VILLA-FORTE, 2011)[15]

Em seguida, o escritor explica o potencial expansivo que o site possui. A ideia é tanto divulgar autores clássicos quanto novos autores, de forma que os fragmentos de textos utilizados de cada autor funcionem como uma espécie de propaganda ou promoção. Dessa maneira, a exemplo da metáfora usada por Lev Manovich (2004) para conceituar o “remix”, a narrativa remixada seria como a água de uma nascente que deságua em várias fontes diferentes, espalhando-se entre rios, mares ou lagos.

O projeto serve também como uma pequena homenagem a tantos escritores que admiro, dentre os quais alguns estão nos textos, e a tantos outros que ainda estão por conhecer. Gosto de pensar que há uma proposta de dessacralização da literatura, o que considero fundamental para que se amplie a superfície de contato entre a sociedade em geral e as narrativas literárias (IDEM)

Villa-Forte emenda:

No começo eu fazia os textos com o que eu estava lendo no momento, mas hoje acho que essa é a parte mais aleatória do processo. Às vezes escolho obras que estou lendo, às vezes outras que já li, outras vezes obras que quero ler, e outras vezes livros que sei que nunca vou ler. Geralmente são autores que ou já li alguma coisa ou já ouvi falar, mas volta e meia me dou a surpresa de usar um de quem não conheço nada. Tento usar tanto autores reconhecidos e já estabelecidos quanto gente nova e talentosa, porque gosto da ideia de divulgação de autores novos (IDEM).

Em comparação com sua experiência como escritor, principalmente na criação de contos, Leonardo Villa-Forte levanta uma questão importante, na qual sua opinião se torna vital para enfrentar alguns preconceitos sofridos por este tipo de narrativa. Preconceito este nascido de escritores que não veem com bons olhos essa experiência “não autoral”, exatamente por usurpar os direitos do criador da obra literária. Porém, o autor do projeto defende a experiência literária no que diz respeito ao limite da “cópia” sobre a obra de outrem, no capítulo à frente. Neste trecho seguinte, contudo, o escritor dá seu testemunho sobre as diferenças entre a construção feita a partir de suas próprias obras e a realizada por meio de um remix literário do MixLit.

Acho que a escrita de punho próprio é mais difícil. Quando escrevo diretamente, as palavras ainda não estão buriladas. Preciso fazer sair de mim, fisicamente, as frases, o sentido, o ritmo, o significado, e depois tudo isso passa por um processo longo de revisão e maturação. Quando vou a um livro, o texto ali presente já deve ter passado por todo esse processo e não posso mudar as suas palavras. Ou elas me servem, mesmo que editadas, ou não me servem. Já quando escrevo diretamente, há a tentação de ficar mudando eternamente o texto até mesmo nos seus elementos mínimos, com as palavras e as pontuações. A semelhança entre os dois é que sempre no meio da coisa pode-se descobrir que a história que será contada será outra, que a intensidade será deslocada para outro lugar e o foco sobre outro personagem ou ação. Mas isso, quando faço MixLit é um processo mais leve, no qual já entro completamente desarmado, sabendo que o que vai me guiar serão as conexões possíveis ou não de serem feitas, e que são elas que permitirão o que será contado ou não. De certa forma, acalma saber que tenho um material base do qual partir. Já quando vou escrever diretamente, há uma expectativa de controle soberano sobre o conteúdo, e a ideia consciente de que tudo depende de mim, o que até certo ponto é uma ilusão, e isso torna o trabalho um pouco mais penoso, apesar de às vezes ser árduo construir uma unidade no MixLit também (IDEM).

Para exemplificar o conteúdo do MixLit, segue um post contendo uma das experiências literárias de Leonardo Villa-Forte. Todas as postagens do site contêm narrativas experienciais, dentro das quais as citações são assinaladas e recebem as devidas referências no rodapé, sem excessão. Elas seguem o padrão já assumido por Villa-Forte, de divulgação envolvendo o “o que” e o “de quem” contidos no texto e respeitando seus direitos autorais.

O que foi, o que virá

Houve um momento quando estava me aproximando dos trinta anos em que eu admiti que meu amor por aventuras já tinha acabado há muito tempo. Eu jamais iria fazer as coisas que havia sonhado1 quando topamos entrar na vida do outro.2 Eu percebia, e ela percebia que eu percebia, mas nenhum de nós dizia nada.3 Eu me lembro4: Empurro-a contra parede, tento penetrá-la, mas não consigo, então sentamos na privada e tento, mas também não conseguimos. Tentamos de todo jeito, mas não dá. Ela continua segurando meu pau como se fosse um salva-vidas, não adianta.5 A vela está quase a extinguir-se.6 Simplesmente não posso. Não poderei nunca mais.7

Tudo tem um fim; o mais amplo recipiente acaba ficando cheio.8 A vida é engraçada, não é?9 No fundo, uma questão de invenção, de inventar antes dos outros, de adiantar-se na criação de novas formas e de fazê-las sempre novas.10 Nem sei o que eu ainda estou esperando.11

1 Julian BARNES. O sentido de um fim. Tradução de Léa Viveiros de Castro. Rio de Janeiro: Rocco, 2012, p.101.

2 Fernando MOLICA. O livro branco (Vários autores. Organização de Henrique Rodrigues). Rio de Janeiro: Record, 2012, p.91.

3 Henry JAMES. A volta do parafuso – seguido de Daisy Miller. Tradução de Guilherme da Silva Braga. Rio Grande do Sul: L&PM, 2008, p.14.

4 Julian BARNES. O sentido de um fim, p.9.

5 Henry MILLER. Trópico de Câncer. Tradução de Beatriz Horta. Rio de Janeiro: José Olympio, 2006, p.22.

6 Graciliano RAMOS. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 1985, p.188.

7 Carson MCCULLERS. Conto: Wunderkind. Livro: A balada do café triste. Tradução de Caio Fernando Abreu. São Paulo: Círculo do Livro, 1987, p.102.

8 Robert Louis STEVENSON. O médico e o monstro. Tradução de Heloisa Jahn. São Paulo: Ática. São Paulo, 1996, p.90.

9 Scott ADAMS. Dilbert – Preciso de férias! Rio Grande do Sul: L&PM, 2010, p.84.

10 César AIRA. As noites de flores. Tradução de Paulo Andrade Lemos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p.57.

11 César CARDOSO. Conto: That’s all folks. Livro: É assim que o mundo acaba (Vários autores. Organização de Flávia Iriarte e Daniel Russel Ribas). Rio de Janeiro: Oito e Meio, 2012, p.30.

4.3.2 – MASHUPS LITERÁRIOS

Na música, sempre foi muito comum o uso de influências para novas criações. Foi assim que nasceu a música híbrida, mais presente no mercado alternativo, e que vem tomando o cenário mainstream. No entanto, essa influência sempre foi usada de maneira muito subjetiva, aplicada de modo a aperfeiçoar o estilo de algum autor. O autor de um mashup, por sua vez, não bebe somente da fonte, como aplica canções de artistas renomados em suas criações musicais. Ele utiliza de pedaços inteiros de uma canção, misturando-se a outras, para que, dessa forma, dê origem a algo novo.

Com a acelerada evolução das novas formas de criação, seria questão de tempo até que tal inovação chegasse à literatura. Da mesma forma que na música há a mistura de duas ou mais canções, no mashup literário há o envolvimento de duas ou mais obras literárias.

O mashup literário é uma derivação do remix literário, que possui conceituação definida, porém limitada. O remix literário trabalha somente com elementos peculiares, a fim de não corromper sua ideia inicial que trata de enriquecimento literário e experiências entre o digital e o analógico, entre a antiga e a nova web interacional. É avesso à intervenção da obra do autor, mas favorável à utilização livre dessa obra para alcançar emancipação literária na era digital. Portanto, há pouca ou nenhuma interferência, de modo que, em contrapartida, há a utilização de inúmeros elementos – autores – na formação da narrativa.

Já o mashup literário é uma nova forma de explorar essa experiência, pois lida exatamente com seus frutos. Em vez de brincar com as palavras, ele brinca com histórias completas e as recria, interfere nelas, a ponto de, no final, elas serem recontadas, transformando-se em outra. Não existe o “a+b = ab”, mas sim o “a+b = c”.

Assim, o mashup literário, em diferença ao remix literário, representa a consolidação deste último, sendo, ao mesmo tempo, fruto e “mostragem” da experiência que se transformou. Reiterando: o mashup literário é produzido a partir de produtos consolidados, são projetos prontos, com objetivos, que alcançam os meios e fins preestabelecidos.

Exatamente por se apresentar pronto, o mashup literário pode ser mais facilmente explicado através de seus exemplos. Entre um dos expoentes do estilo está Orgulho e Preconceito e Zumbis (2010)[16], baseado na obra de Jane Austen, e misturado com a inclusão peculiar de zumbis pelo escritor Seth Grahame-Smith, responsável pela transformação do clássico numa aventura de terror.

Na história, a protagonista Elizabeth Bennet precisa aprender a lidar com os problemas da aristocracia de sua época, em plena Inglaterra do início do século XIX. Os dramas envolviam temas como a cultura da época, a educação recebida por todos e a opressão ao sexo feminino. Com a mistura de Grahame-Smith, ela se torna uma guerreira especializada em artes marciais, que tem a missão de eliminar a raça zumbi que tomou conta do vilarejo de Meryton, ao sul da Inglaterra. Com ela, está seu par romântico, Sr. Darcy, companheiro na caça aos mortos-vivos.

Com esse mashup, Grahame-Smith, que dividiu a autoria do livro com Jane Austen, deu o pontapé inicial para sua carreira decolar, aproveitando-se do status de “domínio público” da obra. O escritor foi responsável também por outro grande sucesso literário: Abraham Lincoln – Caçador de Vampiros, recentemente transformado em filme e com grande venda nas bilheterias.

No Brasil, também temos bons exemplos de mashups literários. Todos eles homenageiam autores clássicos da literatura nacional, como Machado de Assis (Dom Casmurro e O Alienista), José de Alencar (Senhora) e Bernardo Guimarães (Escrava Isaura). As obras, após as misturas, e agora com coautores, viraram, respectivamente: Dom Casmurro e os Discos Voadores, de Lucio Manfredi; O Alienista Caçador de Mutantes, de Natalia Klein, Senhora, a Bruxa, de Angélica Lopes, e Escrava Isaura e o Vampiro, de Jeovane Nunes. Todas as obras foram publicadas pela Editora Leya (2011)[17].

Eis um exemplo dessa experiência no trecho retirado do mashup literário feito a partir do livro de Machado de Assis, Dom Casmurro e os Discos Voadores, criado por Lucio Manfredi:

Capitu caminhou até a orla do mar, o mar que até então estivera tranquilo, espelho noturno a recolher a luz da Lua, mas que de repente pusera-se agitado, inquieto, as ondas turbilhonando à distância, numa linha perfeitamente reta do ponto onde Capitu, imóvel, contemplava a agitação com olhos de ressaca. E dentro do remoinho fez-se uma luminosidade crescente, como se o Sol subisse das profundezas do oceano. Mas o Sol é redondo e o que se ergueu dentre as ondas tinha a aparência achatada de dois pratos colados, um de boca para o outro. Um disco, enfim. Um disco, tal e qual descrevera a falecida Sancha, tal e qual vislumbrara tio Cosme, como que surgido para vingá-los de todos os que haviam duvidado de suas palavras, entre os quais contava-me eu, ora atônito, hirto, qualquer incredulidade esquecida diante do portentoso espetáculo". (MANFREDI, 2011)[18]

5. A QUESTÃO DOS DIREITOS AUTORAIS

A humanidade vive em constante evolução e, assim como ela, o modo como a sociedade é moldada também se altera. Ou seja, o que é certo hoje, amanhã pode ser o errado ou simplesmente uma ideia considerada ultrapassada. Da mesma forma, as leis também podem sofrer mudanças e serem revistas, caso seja reconhecida uma real necessidade de transformações.

A Legislação Brasileira sempre manteve uma postura tradicional no que diz respeito à questão do direito autoral; ou seja, desde a época do Império existe uma lei que protege o autor e sua obra. Mas a legislação sofreu modificações através dos tempos para se adaptar às mudanças sociais e às novas necessidades vividas pela sociedade, tanto dentro quanto fora do Brasil. Assim, o país pode refletir em suas leis as transformações que acontecem em todo o mundo de maneira que possa obedecer a regras internacionais. Da mesma forma, também pode discordar delas.

Em linhas gerais, não havia motivos para preocupação até o aparecimento de novas formas de produção, como o remix, que, desde os anos 1970, vem provocando uma série de reflexões sobre o conceito de plágio e direitos de uso. Normalmente, sendo dono do conteúdo produzido, o autor tem o pleno direito de explorar sua obra comercialmente, proibindo terceiros de usufruir a mesma sem receber autorização.

Na música, nas artes, literatura, ou qualquer outro caminho de produção intelectual, individual ou não, os autores costumeiramente tiveram suas criações protegidas por lei, recebendo os devidos louros, seja por benefícios financeiros ou por meio de simples reconhecimento pela obra. Isso acontece graças a Lei de Direitos Autorais[19], cuja regulamentação pode variar de país para país. Algumas minúcias, porém, se mantêm inalteradas, como conceitos de direito moral e patrimonial.

5.1 – A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E A INTERNACIONAL

Antes de tudo, é preciso explicar o conceito exato de Direito Autoral. Pode ser definido como o conjunto de regras criadas para proteger os direitos do autor e dos que estão ligados a ele. Assim, fica assegurada que sua criação intelectual será devidamente creditada a ele e não será alterada sem a sua autorização, sob risco de pena ou multa ao infrator, garantindo ao autor, não em todos dos casos, remuneração por uso da obra.

Uma criação ou obra intelectual é a que vem do espírito. Sendo assim, não importa como sua produção ocorra desde que a ideia seja exteriorizada e não mantida apenas no campo das ideias.

Há para isso uma distinção entre os direitos morais e patrimoniais. O primeiro diz respeito à paternidade da obra. Ou seja, o autor tem o direito de reivindicar a autoria de uma obra, caso seja ele o autor da mesma, sem a necessidade de registros para tal. É um direito irrenunciável, sem poder abrir mão dele, muito menos vendê-lo ou transferi-lo. Com essa premissa, o autor pode fazer o que quiser com sua obra, tanto suspender sua veiculação, quanto cobrar seus direitos como criador intelectual como bem entender. Qualquer que seja ela, a obra deverá conter o seu nome; e seu conteúdo será apenas modificado mediante aprovação do criador.

Já no segundo caso, do direito patrimonial, a obra é considerada uma posse, quase um bem. Dá ao autor o direito de utilizá-la da forma que achar melhor, mesmo que isso traga eventuais prejuízos. Ele pode permitir que terceiros a usem, traduzam e a reproduzam, negociando sua utilização de forma integral ou parcial, de forma gratuita ou não. A grande diferença, porém, é que os direitos patrimoniais possuem um tempo-limite de desfrute. O autor é detentor do direito sobre a obra apenas durante determinado período, passando esse depois ao domínio público (dependendo do tipo de criação) ou sendo transferido a terceiros, seja por herança ou transferência. No Brasil, de acordo com as leis de direitos autorais, o livro se torna domínio público após 70 anos.

Existe uma gama de questões que envolvem os registros formais da obra e a comprovação de sua autoria, mas aqui está sendo tratada a utilização de obras registradas e assumidamente de outrem. Afinal, assim são feitos os remixes literários, frutos da “mistura” da criação de terceiros; e os musicais, que são as alterações feitas em uma canção – com autorização ou não – ou mistura dela com outras para adaptá-la a um novo público. De qualquer forma, portanto, os objetos serão obras de terceiros, sejam consagrados ou não. A única excessão se refere aos mashups literários, que mesclam obras de domínio público com textos autorais para formar uma nova obra de ficção.

Por englobar direitos de conteúdo cultural e artístico de todos os tipos, os direitos autorais são regulados e protegidos pela Constituição Federal, de acordo com as Leis 9.609 e 9.610, ambas sancionadas em 19 de fevereiro de 1998. A primeira lei se refere à propriedade intelectual de programas de computadores; já a segunda diz respeito aos direitos do autor e terceiros envolvidos a ele. Para complementar essas leis, há também decretos que reiteram a participação do Brasil em tratados internacionais para que haja convergência e respeito à legislação de outros países. Dessa forma, garante-se que obras criadas fora do país tenham os direitos protegidos em terras brasileiras e vice-versa.

5.2 – O REMIX E AS LEIS

Quando se trata de remix, tanto musical quanto literário, as leis de direitos autorais enfrentaram alguns desafios que perduram até os dias atuais. Porém, com as transformações ocorridas na sociedade a partir da década de 1970 – provocadas então pelo surgimento do remix na música – a lei passou a sofrer alterações. Mas foi preciso muitas discussões para que ela ganhasse um pouco mais de elasticidade. E, mesmo assim, ainda não há liberdade no que se refere aos direitos autorais na música, apenas uma aceitação em parte, tanto de artistas quanto de gravadoras.

De qualquer forma, as transformações foram consideradas um grande avanço. Elas ganharam força com a consolidação da cibercultura e da web 2.0. A internet e as redes sociais mudaram o conceito de propriedade, já que a informação passou a circular livremente pela grande rede.

A cultura do remix, ou seja, a mistura de informações técnicas, de culturas, influências musicais e artísticas fez perder força a ideia de “autor”. Mas não poderia acontecer de outra forma, como um fluxo impossível de ser interrompido. De acordo com o pesquisador Mark Amerika (2009)[20], “o remix combina com o mundo contemporâneo”, que, ele acrescenta, “se define pela desconstrução do escritor como um gênio individual e pela compreensão da obra como colaboração”. Isso, segundo, ele torna o remix tão antigo quanto novo, pois desde as colagens, lembra, essa técnica de mistura é empregada, mas com processos, formas e intenções diferentes.

Essa desapropriação intelectual que o remix produziu passou a travar batalhas com as grandes empresas detentoras dos direitos de propriedade das obras. O maior ícone dessa disputa foi o Naspter, programa de compartilhamento P2P já comentado no capítulo 4. Ele formentou a reprodução em massa de conteúdo musical na internet.

O remix musical, com isso, acabou ganhando força e se tornou um dos meios de reprodução de conteúdo mais populares por seu aspecto dançante que faz com que as músicas vão parar em discotecas em todo o mundo. Porém, em outras áreas, esse uso da propriedade intelectual ainda não é bem aceito.

O teórico Lev Manovich (2005) levanta essa questão quando fala sobre remixabilidade. Para ele, existe um paradoxo. No universo musical, o remix é aceito oficialmente, enquanto em outras áreas entende-se como violação dos direitos autorais, sendo tachado de roubo de propriedade intelectual.

Enquanto diretores de filmes, artistas plásticos, fotógrafos, arquitetos e web designers rotineiramente remixam trabalhos pré-existentes, isso não é admitido abertamente, e assim não existem termos apropriados para validar essas práticas como há na música. (MANOVICH, 2005)[21]

O interesse das grandes empresas que trabalham ou com conteúdo escrito, ou ligado às artes ou ao universo musical, obviamente, é financeiro. Só que nem todo autor trabalha visando ao lucro. Alguns disponibilizam suas criações – ou tentam – livremente para quem deseja ter conhecimento de sua obra.

Para tanto, foi criado o Creative Commons, em contraponto ao Copyright, mas com relação direta com o Copyleft. Em princípio, é necessário explicar o conceito de Copyright[22], que nasceu para proteger os direitos de autores e suas obras contra os impressores de livros, em 1709, na Inglaterra. O Estatuto de Anne, como é chamado, foi a primeira lei de copyright a privilegiar o autor, reconhecido como detentor dos direitos autorais e de reprodução de suas obras, com total controle sobre elas. Ele só perde os 100% de direito caso queira ceder para alguém ou a alguma empresa.

Ao passar dos anos, as leis evoluíram. No final dos anos 1980, o congresso americano promoveu um projeto que dizia que qualquer obra era protegida por lei automaticamente a partir do momento em que fosse criada. Foi um marco na legislação de direitos autorais. Deixou de serem necessários os trâmites legais para que um autor reivindique sua obra, bastando a ele ser o criador da mesma.

Na internet, por conseguinte, a lei é aplicada da mesma maneira. Ou seja, tudo que está lá, por mais que circule sem controle, possui um dono, detentor de direitos autorais de copyright. Portanto, quem compartilha qualquer vídeo, música, fotografia ou se apropria de um texto de terceiro, está cometendo um crime. Pois o autor tem o direito de explorar comercialmente sua obra, sem que outros o façam indevidamente.

Mas há o caso de o autor querer que a sua obra seja compartilhada e distribuída gratuitamente, sem restrições ou apenas com algumas exigências. Para atender esta demanda, foi criado o Creative Commons[23], com o qual o autor deixa claro que autoriza a reprodução de sua obra por meio de outros indivíduos, mas seguindo suas exigências para que possa ser compartilhada. Com isso, surgiu o embate entre o que é disseminado livremente e o que é controlado para não ser disseminado descontroladamente.

O projeto do Creative Commons foi criado por Lawrence Lessig, visando exatamente esse conteúdo digital que pode ou não ser espalhado. Dessa forma, houve uma flexibilização quanto ao conteúdo distribuído. Às vezes, o autor deseja que sua obra seja compartilhada, mas não permite alterações; ou ele permite que haja alterações, mas que a essência de sua obra seja mantida; ou não permite que seja explorado comercialmente; há casos também em que ele permite qualquer modificação em sua obra. Mas tudo isso fica detalhado através das atribuições dadas pelo Creative Commons.

O projeto pode ser considerado uma extensão do copyleft[24]. Ao contrário do copyright, no qual o autor se reserva no direito de proteger sua obra, uma obra de copyleft permite que ela seja copiada, modificada e redistribuída, em convergência com a era da interatividade e troca de informações na qual vivemos. A única exigência é que esse direito seja mantido em todas as futuras versões, sejam elas muito ou pouco modificadas. Portanto, se no copyright o autor se reserva o direito de proibir a reprodução de sua obra, no copyleft ele se utiliza desse direito para permitir a livre circulação da mesma. É preciso, portanto, que seja feita a perpetuação dessas alterações e distribuições; ou seja, uma vez liberada, a obra deve ser mantida livre.

Na literatura, a lei de direitos autorais protege o autor e suas obras através dos direitos morais e patrimoniais, apesar de o Brasil não possuir uma regulamentação específica voltada para o mercado editorial.

No que se refere ao remix literário, Leonardo Villa-Forte, usando como foco seu portal MixLit, não vê problemas em utilizar fragmentos de textos de outros autores. O escritor se protege argumentando que o projeto tem a intenção de divulgar escritores e não há ganho monetário envolvido. Além disso, tudo é creditado. Segundo Villa-Forte (2011)[25], a intenção não é se apropriar de nada, mas exatamente o contrário: de mostrar quem é o autor do texto mencionado.

(...) o MixLit é uma sequência de citações, como um dicionário de citações, e assim, tendo todas as referências explicitadas, não há problemas. Além de serem trechos tão curtos que não prejudicam em nada qualquer exploração da obra original, e de eu fazê-los gratuitamente, sem qualquer ganho pecuniário envolvido. Mais do que isso, acho que o barato do MixLit é exatamente isso, a declaração explícita da participação coletiva de vários autores num novo texto, a ideia simples e clara de um leitor agindo nas páginas daqueles tantos livros de tantos autores diferentes que ofereceram suas palavras a nós. Por isso, nunca pensei em dispor esses textos sem mencionar de onde saíram os trechos, nem tampouco inserir palavras escritas por mim entre aquelas encontradas nos livros.

O escritor chegou a essa metodologia de citações depois que decidiu se aprofundar nos estudos sobre a legislação brasileira. E chegou à conclusão que ainda falta clareza, principalmente no artigo 46 da Lei no 9.610[26], que trata das limitações aos direitos autorais. Em entrevista à repórter Luiza Miguez, do projeto Itaú Cultural[27], ele explicou que consultou o advogado Daniel Campello, um dos juristas que estruturaram a essa parte da legislação, com a Reforma da Lei dos Direitos Autorais[28] – que ainda não saiu do papel –, entre 2007 e 2010. Foi assim que Villa-Forte, com sua experiência em remix literário, acabou encontrando, mesmo sem querer, uma falha.

Quem detalhou este problema na Legislação Brasileira foi o advogado. Capello, mesmo com sua experiência, afirmou que precisou rever as leis e admitiu: falta uma atualização das leis de direitos autorais. “A consulta do Leo me obrigou a parar e estudar. Para lidar corretamente com o remix, dependeríamos de uma jurisprudência sobre o assunto que nós não temos.”

Ou seja, mesmo com o esforço para andar em sintonia com a legislação internacional, falta ainda ao Brasil atenção às questões que dizem respeito ao ambiente digital no qual vivemos. A sociedade brasileira, assim como o restante do mundo, está inserida na era da interação e do remix, mas está carente de todas as estruturas que protejam o interesse tanto do usuário conectado às novas tecnologias quanto do produtor de conteúdo, dono de propriedades intelectuais distribuídas pelas plataformas digitais. Dessa maneira, ela exibe claramente suas limitações.

Tanto que, em abril de 2012, em ranking (IP Watchlist 2012) divulgado pelo Consumers International (CI), organização mundial de auxílio ao consumidor, o Brasil ficou em quinto lugar entre os países regidos pelas piores e mais restritivas legislações de direitos autorais[29]. No total, foram reunidos 115 países com participação de mais de 220 entidades de defesa do consumidor. Os outros quatro piores (do quarto para o primeiro) são: Tailândia, Reino Unido, Argentina e Jordânia, que lidera a lista. Foram avaliados quesitos como: acesso dos consumidores a serviços e produtos culturais, exceções e limitações para uso educacionais de obras, efetiva proteção do autor, preservação cultural, acessibilidade, adaptação da lei aos novos modelos digitais e utilização privada dos bens culturais.

Guilherme Varella, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), um dos órgãos que participaram do rankiamento, esclareceu o fato de o Brasil ter subido uma posição no ranking em relação ao ano passado. Segundo ele, foram outros países que pioraram ou melhoraram, pois o Brasil, na verdade, estagnou, então não teria como alterar sua posição.

O advogado explicou que o país apresentou um projeto de Reforma da Lei de Direitos Autorais, mas seu anteprojeto ficou aberto para consulta pública em 2010 e não saiu mais do papel. Ele reiterou a necessidade da reforma acontecer logo para que os direitos de todos possam ser protegidos.

É essencial que a LDA seja reformada, de modo a equilibrar os direitos dos usuários e consumidores com os direitos dos autores. O acesso ao conhecimento, à cultura e à informação são direitos fundamentais não compatibilizados, na legislação brasileira, com os direitos dos criadores, que, de seu lado, não possuem efetiva proteção e garantia.

Sem essa reforma, portanto, um autor corre sérios riscos de não ter seus direitos protegidos de acordo com as necessidades da nova era. Da mesma forma, o usuário que pretende utilizar e compartilhar um conteúdo, possibilitando acesso a certo conhecimento, se possível.

Enquanto nada está definido, Villa-Forte prefere evitar o risco de ser confrontado por algum autor. Ao mesmo tempo, pretende levar à frente sua experiência com o remix literário; e foi assim que chegou ao método final utilizado no MixLit e também em outras plataformas. Quando se trata de publicação impressa, ele busca autorização do dono da propriedade intelectual; mas no caso da internet, ele prefere arriscar, apenas citando o nome do autor no rodapé do texto. Caso seja chamado nos tribunais, não poderia dizer que não estava ciente do risco. Ademais, não descarta a possibilidade: pode se tornar uma referência na mudança da legislação, que precisa urgentemente ser atualizada – ao menos para esclarecimento para aqueles que gostam dessa pequena mistura.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O remix literário é ainda uma experiência tanto na literatura impressa quanto eletrônica. Seu potencial depende das mesmas ferramentas que transformaram tantas outras em importantes técnicas e estilos utilizadas atualmente: criatividade e ampliação da discussão sobre o assunto.

Entre um dos exemplos bem sucedidos pode-se citar o mashup literário, que explorou a criatividade e se tornou moda no mercado literário, com publicações que venderam milhares de livros pelo mundo, tendo algumas obras se tornado até filme, como o já citado Lincoln, Caçador de Zumbis.

O principal o remix literário já tem: pessoas dispostas a levá-lo a sério, e a enriquecerem as discussões também sobre sua validade legal. Não dá para ignorar a questão dos direitos autorais e as implicações legais (ou ilegais) que carrega. O recorte de – apenas – fragmentos de textos de livros publicados para formar uma narrativa – por enquanto sem fins lucrativos – configura apropriação da obra de terceiros? Mesmo em forma de homenagem, divulgação ou apenas criatividade levada às últimas consequências?

Ainda se busca um consenso em relação a possíveis mudanças sobre esse assunto, tanto na legislação brasileira quanto estrangeira. Um dos que podem ajudar a levar essas conversas à frente é o criador do site pioneiro MixLit, Leonardo Villa-Forte, que, para se precaver, cita ao final de todas as suas publicações quais os autores utilizados para formar a narrativa literária.

Por enquanto, já é possível observar um ponto de evolução. A pesquisa e estudo sobre a viabilidade do remix literário no embate com a legislação brasileira – regida sob as Leis de Direitos Autorais 9.609 e 9.610 da Constituição Federal – deu destaque ao grande atraso do Brasil em comparações às leis internacionais. O país é o quinto colocado no ranking que dos países com as piores e mais restritivas legislações de direitos autorais. Foi encontrada uma falha, graças aos estudos de Villa-Forte, e o alerta foi ligado: é preciso questionar as nossas leis e, possivelmente, alterá-las de acordo com as mudanças vividas na sociedade. E a chegada da era do remix é uma delas.

Este trabalho de conclusão também se enriqueceu à medida que foi possível mapear os fundamentos do remix literário, desde a menor até a maior influência histórica: dos primeiros traços de colagem, há 200 a.C, na China, passando pelas expressões artísticas do início do século XX, com Picasso e Braque, até o remix criado por Tom Moulton, um produtor musical, que incrementou o mercado fonográfico na década de 1970; veio a revolução no mercado fonográfico, para em seguida ser iniciada a era das tecnologias de informação e comunicação, de interação e compartilhamento.

Tal mapeamento – visto o caráter contemporâneo das experiências interacionais – acabou se tornando um estudo inédito sobre a chegada da era do remix no século XXI e as transformações ocasionadas por ela. Entre essas mudanças, está o remix literário, assim como outras inovações híbridas desta época.

Se o remix literário veio para ficar, se é uma pequena curiosidade, um jogo, ou se é um pequeno passo para uma transformação cultural (e por que não autoral?) não é possível saber. Mas é uma mudança irreversível, sendo possível apenas analisar os fatos e fazer as prospecções.

Ao longo da história, muitos gêneros literários – como o romance policial, o folhetim e os quadrinhos – e inovações tecnológicas foram subestimados. Por isso, é preciso ir mais a fundo ao olhar para essa experiência literária. Uma das coisas que faz o remix literário ganhar destaque é sua característica organizatória. Na era do remix, há muita informação circulando, de todos os lados e para todos os lados. Um gênero, uma técnica, que consiga juntar toda essa informação numa narrativa, em vez de apenas absorvê-las, talvez mereça atenção.

O fato é que o remix literário não nasceu a partir de uma ideia: ele é, na verdade, uma consequência inevitável da convergência do grande fluxo de informação que circula no e entre os meios impressos e o digital. O remix literário nasceu da evolução das tecnologias digitais, da mudança no comportamento das pessoas no dia a dia, usuárias da rede e habitantes involuntárias do ambiente de cibercultura. O fluxo acelerado da informação que chega e logo se espalha, transformada e enriquecida, é característica do novo mundo no qual vivemos. Estamos na era do remix, como destacou o teórico Lev Manovich. Onde nada é puro, tudo é fruto da mistura. Algumas misturas são cognitivas, e algumas são apenas involuntárias. E essas misturas atingiram todas as áreas do conhecimento. Agora, chegou a vez da literatura.

7. REFERÊNCIAS

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BARTHES, Roland. A morte do autor. In: O Rumor da Língua. São Paulo: Martins Fontes, 2004. Disponível em:

CARR, Nicholas. A Geração superficial: o que a internet está fazendo com nossos cérebros. Rio de Janeiro: Agir, 2011.

COHEN, Renato. Performance como Linguagem. São Paulo: Editora Perspectiva, 2002. Disponível em:

COSTA, Cristiane. O DJ da literatura. 2011. Disponível em:

DUNBABIN, Katherine. Mosaics of the Greek and Roman world. Cambridge University Press, 1999. p. 5) ou (Zeitler, Barbara. Mosaic. In Wilson, Nigel Guy (ed). Encyclopedia of ancient Greece. Routledge, 2006, p. 482

FITZPATRICK, Kathleen. The Anxiety of Obsolescence: The American Novel in the Age of Television. Nashville: Vanderbilt University Press, 2006. Disponível em:

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HUIDOBRO, Vicente. El espejo de agua. Buenos Aires: Orión, 1916.

ISMAEL, J. C.. Collage em Nova Superfície. O Estado de S. Paulo, 1984, p. 9.

LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. São Paulo: Editora Loyola, 1998.

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MACCHI, Fabiana. Kurt Schwitters: o dadaísta que era merz. Sibila – Revista de Poesia e Cultura. Ano 4, n.7, setembro de 2004. Disponível em:

MIGUEZ, Luiza. Os DJs da literatura. Itaú Cultural. 2012. Disponível em:

MURRAY, Janet H. Hamlet no Holodeck: o futuro da narrativa no ciberespaço. São Paulo: Editora Unesp - Itaú Cultural, 2003.

RECUERO, Raquel. O que é mídia social? 2008. Disponível em:

RECUERO, Raquel. Redes sócias na internet. Rio Grande do Sul: Editora Sulina, 2011.

TELLES, André. A revolução das mídias sociais. São Paulo: M Books, 2010.

TORCZYNER, Harry. Magritte, Signes et Images. Paris: Draeger, 1977.

_________. 30 Days of Rock and Roll. 2013. Disponível em:

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[1] Ver sobre em

[2] Dunbabin, Katherine. Mosaics of the Greek and Roman world. Cambridge University Press, 1999. p. 5) ou (Zeitler, Barbara. Mosaic. In Wilson, Nigel Guy (ed). Encyclopedia of ancient Greece. Routledge, 2006, p. 482

[3] Ver informação completa

[4] Em alemão: An Anna Blume.

[5] Primeira parte da entrevista

[6] No original: “How I started my involvement in mixing, was, uh, back in '72, uh, I noticed there was a lot of frustration in the music. They were all 2-1/3, three minutes long, which you're basically playing 45s. And after three minutes, you know, the crowd didn't know whether to finish dancing to what they were dancing to, or try to be getting into something else. And I thought God, it would be great if you could extend that feeling. And uh, I went to a record company, because I used to be in the record business as a promotion man, and uh, I asked this friend of mine, May James, did she have an instrumental version of any of the songs that I particularly liked on that label. She said, well, sure I have one. And I took it home and re-edited it and put it together and they liked it so much they said, why don't you, um, try to do it for real in a studio. And I said, okay, it'll probably be fun. And uh, that's basically how it started.

[7] “P2P” ou “Peer-to-Peer” (do inglês: par-a-par), entre pares, é uma arquitetura de sistemas distribuídos caracterizada pela descentralização das funções na rede, onde cada nodo realiza tanto funções de servidor quanto de cliente.

[8] No original em inglês: The dramatic increase in quantity of information greatly speeded up by Internet has been accompanied by another fundamental development. Imagine water running down a mountain. If the quantity of water keeps continuously increasing, it will find numerous new paths and these paths will keep getting wider. Something similar is happening as the amount of information keeps growing - except these paths are also all connected to each other and they go in all directions; up, down, sideways.

[9] Texto disponível em DOCS/Remix_modular.doc.

[10] Estudo disponível em:

[11] Disponível em

[12] Entrevista disponível em .

[13] Texto disponível em

[14] Visite o site em

[15] Texto disponível em

[16] Livro disponível em:

[17] Informações das obras disponíveis em

[18] Trecho disponível em

[19] Ver legislação brasileira. Disponível em:

[20]

[21] Disponível em

[22] Ver

[23] Ver

[24] Ver

[25] Disponível em

[26] Ver

[27] Reportagem disponível em

[28] Ver

[29] Ranking disponível em

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Monografia de graduação apresentada à Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social, Habilitação em Produção Editorial

FUZIMOTO, Fabrício Yassuo Horita.

Remix Literário: uma grande experiência/ Fabrício Yassuo Horita Fuzimoto – Rio de Janeiro; UFRJ/ECO, 2013.

59 f.

Monografia (graduação em Comunicação Social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola de Comunicação, 2013.

Orientação: Cristiane Costa

1. Remix Literário. 2. Literatura eletrônica. 3. Novas tecnologias. I. FUZIMOTO, Fabrício (Cristiane Costa) II. ECO/UFRJ III. Produção Editorial IV. Remix Literário: uma grande experiência

Dedico esta monografia àqueles que me auxiliaram incondicionalmente, nas pequenas e grandes pretensões, e assim o farão por toda a vida: à minha mãe, meu irmão e minha namorada.

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