Revista Política e Planejamento Regional



Os discursos ambientais como legitimadores da remo??o de favelas no Rio de JaneiroThe environmental discourse supporting favelas’ evictions in Rio de JaneiroResumoO presente artigo prop?e um estudo sobre o uso do discurso ambiental na legitima??o de políticas públicas de remo??o de favelas na cidade do Rio de Janeiro. Esse discurso, enunciado pelas autoridades e veículos midiáticos, apoia-se em argumentos nos quais a defesa da natureza justifica a??es urbanas que acentuam o quadro de exclus?o vivido pelas classes baixas. Discute-se a ideia da favela como interferência na paisagem e o termo “área de risco”, difundidos como legitimadores de remo??es em localidades favelizadas. Estes discursos fazem parte de um repertório que se utiliza de uma suposta urgência de prote??o ambiental para defender a??es de remo??o em áreas de baixa renda. Por outro lado, as áreas de alto padr?o em sítios semelhantes aos considerados “de risco” permanecem intocadas. Tendo em vista tal contradi??o, é possível conjecturar que este apelo discursivo, dito ambientalmente correto, naturaliza políticas públicas de remo??o para a popula??o em situa??o favelada.Palavras-chave: Discurso ambiental, favela, remo??o.AbstractThe following article presents a study on how environmental discourse is used to authorize public policies in favelas in Rio de Janeiro, which include the favelas’ removals. The discourse, given by the media and the government, uses arguments on nature preservation to justify favelas’ inhabitants exclusion process. Therefore, the analysis approaches the idea of the favela as a negative interference in the city landscape and the concept of “risk areas”, both used by the media to legitimate favelas’ evictions. These discourses are part of a series of topics that use the environmental protection sense of urgency to justify these evictions. On the other hand, areas with similar environmental condition occupied by high-income classes remain untouched. By observing the existing contradiction in both discourses, it is possible to evaluate that the environmental approach gives to segregating public policies a higher acceptance, denying to favela’s inhabitants democratic access to the city.Keywords: Environmental discourse, favela, eviction.Introdu??oDesde meados do século passado e principalmente a partir dos anos 1960, a temática da preserva??o ambiental vem ganhando amplitude. A no??o desta como um problema a ser enfrentado pela humanidade se torna cada vez mais notória. Ainda que os movimentos ambientais tenham se iniciado há mais de dois séculos, sendo difícil precisar o momento em que surgem, n?o se pode ignorar a relev?ncia que o tema alcan?a perante a opini?o pública partilha-se a ideia de que a natureza, ao contrário do que se acreditava, n?o é capaz de absorver infinitamente a degrada??o causada pelas interven??es humanas. Universalmente a natureza mostra-se frágil, por sua aparência estática, sem possibilidades de defesa diante do maquinário humano que constrói as cidades e urbaniza o mundo.De fato, a segunda metade do século XX assiste ao desenvolvimento do capitalismo e, com ele, a novos surtos de urbaniza??o, agora uma urbaniza??o global (IANNI, 1997; HARVEY, 2011b), mais facilmente percebida desde 2007, quando a popula??o mundial se torna majoritariamente urbana CITATION ONU11 \l 1046 (ONU-Habitat, 2011). A nova urbaniza??o generaliza padr?es de vida social e cultural urbanos, produzindo novos espa?os e rela??es.S?o perceptíveis as consequências desse processo, que v?o desde mudan?as climáticas e impactos ambientais, até crises na distribui??o de alimentos, energia e água, na saúde, no mercado financeiro e na economia. A cidade se apresenta como um desafio e, especialmente, como local da busca por solu??es para os problemas que gera CITATION Bet10 \l 1046 (BETTENCOURT & WEST, 2010).Todavia, esse surto de urbaniza??o n?o resulta de uma busca por atender às necessidades das popula??es. O crescimento desenfreado das cidades envolve estratégias que absorvem o capital excedente usando o mercado da constru??o civil. O lucro sobre valores de troca é maximizado, independente das demandas por valores de uso, ou seja, sem atender as reais necessidades urbanas CITATION HAR15 \t \l 1046 (HARVEY, 2015). Como consequência revela-se um modelo de urbaniza??o extremamente irracional, no qual as atividades econ?micas exploram recursos naturais de forma nunca antes vista, sem contemplar a face humana do meio urbano. Para essa urbaniza??o, que constitui um sítio infindável de acumula??o de capital, popula??es inteiras podem ser atingidas de forma violenta em nome do lucro.A qualidade ambiental das cidades passa a ser, cada vez mais, um privilégio de poucos, sendo notória a forma desigual com que os problemas ambientais urbanos atingem diferentes camadas da popula??oCITATION Mar15 \l 1046 (FISZON, 2015). Evidentemente, o nível da precariedade socioambiental que resulta disso é muito mais alto dentre as popula??es mais pobres, já que habitam áreas menos protegidas e, portanto, mais sujeitas aos agravos ambientais CITATION Ped97 \l 1046 (JACOBI, 1997). A exclus?o, no entanto, irá ocorrer n?o apenas no acesso aos espa?os “verdes”, mas também nas próprias justificativas do discurso da preserva??o ambiental.“A cidade desigual é também problematizada por movimentos de justi?a ambiental e de denúncia de racismo ambiental (...) em defesa do igual acesso à prote??o ambiental e aos recursos urbanos como direito de todos os citadinos, seja em termos de nível de renda ou de origem étnica. Movimentos contra a ambientaliza??o da exclus?o denunciam a evoca??o de argumentos ambientais para legitimar remo??es de popula??es faveladas que, por sua vez, nunca foram atendidas em seu direito à moradia, dada a ausência histórica de políticas públicas habitacionais adequadas. ”CITATION ACS13 \p 243 \t \l 1046 (ACSELRAD, 2013, p. 243)A defesa da natureza, em toda sua aparente fragilidade, é usada para validar a??es que ocorrem dentro das cidades, tendo penetrado profundamente em toda a esfera da reprodu??o social contempor?nea CITATION Lim10 \t \l 1046 (LIMONAD, 2010). Ideias associadas à prote??o ambiental terminam por serem usadas como refor?o positivo para as mais diversas propostas e práticas no meio urbano. Consensualmente, proteger a natureza, ser sustentável e ambientalmente correto evocam a um comportamento dito responsável a ser almejado pela humanidade em nome de um pretenso bem comumCITATION Lim13 \l 1046 (LIMONAD, 2013). Interven??es urbanas articuladas a partir dessa argumenta??o se mostram mais facilmente aceitas, uma vez que s?o entendidas como parte da resposta à problemas que afetam a humanidade, sempre dentro de um discurso generalizante. Dentro desse contexto se faz necessário pensar a partir de uma perspectiva que n?o ignore a existência dos problemas ambientais, mas que traga para a discuss?o as variáveis sociais que interferem na constru??o do espa?o urbano.A discuss?o, portanto, n?o pode ficar restrita à sustentabilidade dos recursos e do meio ambiente, mas deve avan?ar sobre as formas de apropria??o e uso destes recursos e deste ambiente. Observa-se, a partir do entendimento das lutas sociais presentes nas cidades, a disputa entre os diferentes modos de apropria??o e uso da base material das sociedades. CITATION ACSSu \p 4 \t \l 1046 (ACSELRAD, 2004, p. 4)Nesse ?mbito, este trabalho busca reunir estudos acerca do discurso ambiental a pesquisas sobre políticas públicas de remo??o de favelas. Concentra-se majoritariamente em a??es perpetradas na cidade do Rio de Janeiro nos últimos anos, e na forma como essa conduta é apresentada pelo discurso midiático.O discurso da preserva??o ambiental no meio urbanoA vulnerabilidade do meio urbano às altera??es climáticas e aos danos ecológicos é facilmente reconhecida, com seus efeitos sendo diretamente sentidos pela popula??o. Os chamados eventos extremos acontecem em todo o mundo com danos socioambientais dramáticos, CITATION ABR101 \l 1046 (ABRAMOVAY, 2010) com as cidades constantemente sujeitas a inunda??es, nevascas, desabamentos de constru??es e deslizamentos de encostas.No contexto urbano brasileiro esses eventos s?o notórios com a maior frequência de enchentes, deslizamentos de encostas e desmoronamentos, que se tornam visíveis ao provocarem o bloqueio de vias de circula??o e danos materiais. As crises no abastecimento de água e energia, dificuldades na gest?o de resíduos sólidos e de despejo adequado do lixo s?o constantes, além dos efeitos sentidos na qualidade do ar e da água ao afetarem a saúde da popula??o.Esses efeitos, sem dúvida, repercutem nas cidades, mas é inaceitável pensar que seus impactos s?o distribuídos de forma indistinta. S?o aqueles que habitam as áreas mais frágeis, em geral mais distantes dos centros e com menor acesso à infraestrutura, que sentem mais intensamente os resultados dos agravos ambientais.Essa divis?o resulta justamente desse modelo de urbaniza??o exploratório, no qual as popula??es excluídas do processo de acumula??o capitalista n?o encontram possibilidade de participa??o na cidade formal.A ausência de políticas sociais e a regula??o do espa?o urbano por um mercado imobiliário excludente, fazem com que a invas?o de terras urbanas no Brasil seja estrutural e institucionalizada (MARICATO,2012). A falta de alternativas habitacionais torna inviáveis outras solu??es, principalmente a partir dos anos 1950, com a intensifica??o do processo de urbaniza??o.O comprometimento ambiental gerado a partir dessa din?mica urbana mostra-se cada vez mais insustentável, gerando uma crise de legitimidade das próprias políticas urbanas, que se revelam incapazes de contornar os riscos presentes nas cidades. Como esclarece Acselrad (1999), há uma concep??o culturalmente construída do risco, ou do que s?o áreas de risco, que transparece a desigualdade no acesso aos servi?os urbanos. As áreas menos atendidas por investimentos públicos, ser?o, consequentemente, as mais afetadas pelos riscos causados pela imperícia técnica.A favela como interferência na paisagemHá mais de 100 anos, desde o surgimento da primeira favela no Rio de Janeiro, a amea?a de remo??o é um fantasma presente no cotidiano dos moradores de áreas favelizadas. No contexto contempor?neo, esse fen?meno parece seguir a lógica no reordenamento urbano experimentado pela cidade. A atual administra??o municipal, sob a tutela de Eduardo Paes (2009-2016), ressuscitou a política da remo??o de favelas, que foi notória durante os governos de Pereira Passos (1902-1906) e Carlos Lacerda (1961-1965). Foram removidas mais de 37 mil pessoas de suas casas, sendo Paes o prefeito campe?o de remo??es, em compara??o às 31 mil de Lacerda e 20 mil de Passos (FAULHABER, 2012).Fênomeno recorrente em diferentes momentos do processo de urbaniza??o do Rio de Janeiro, as remo??es voltam a ser uma prática, na atual gest?o, “para uma suposta valoriza??o da cidade” (FAULHABER, 2012, p. 37), expondo a face da “limpeza urbana-humana” norteada pelas áreas de interesse imobiliário.Ao longo do século XX, diversas medidas higienistas foram executadas a partir da premissa da favela como sujeira na paisagem carioca, legitimando a??es que incluem a expuls?o de moradores e demoli??o de constru??es, como solu??es urbanísticas e ambientais. (RODRIGUES, 2014)Reportagens como a publicada pelo jornal O Globo intitulada “Remo??es salvaram a paisagem da Lagoa – Cart?o postal do Rio poderia ter sido transformado em complexo de favelas com pelo menos 96 mil moradores” (Figura 1), apresentam um discurso que entende a favela como um corpo estranho, que foi eliminado da paisagem da Lagoa, bairro nobre da cidade do Rio de Janeiro, gra?as às remo??es.Figura 1: Manchete e imagem de reportagem retiradas do jornal O GloboFonte: O Globo 12 abril 2009, caderno Rio p. 15.A simula??o ilustrativa e o discurso jornalístico da referida matéria sugerem a favela como um elemento desagradável que insiste em assediar as belezas da Cidade Maravilhosa. A preocupa??o estética manifestada pelo jornal ignora a injusti?a e a brutalidade acerca da remo??o da Favela da Catacumba?, e a subsequente realoca??o dos antigos moradores do local para a Cidade de Deus.O discurso assume as remo??es como um fato histórico que teria salvo a paisagem da Lagoa. No entanto, pode-se indagar qual paisagem teria sido salva, visto que as edifica??es atuais e o parque florestal n?o existiam antes da ocupa??o da extinta favela, que remonta ao início do século XX. Sugere-se, a partir daí, que a atual paisagem possui maior valor que a suposta paisagem da antiga favela da Catacumba, representada na simula??o.Poderia se especular que, em uma perspectiva elástica da no??o do tempo, a reportagem tenta construir a ideia de que a destrui??o da favela salvou o que sequer havia sido erigido – a paisagem atual da Lagoa, com os seus prédios de apartamentos com o terceiro metro quadrado mais caro da cidade?. Nesse sentido, a utiliza??o do verbo salvar n?o tem o sentido de resgatar, e sim de remediar. Por essa leitura, à localidade foi curada da favela da Catacumba, para ent?o poder se tornar uma paisagem reconhecida como cart?o postal da cidade do Rio de Janeiro.Outra resposta possível para a quest?o colocada – qual paisagem da Lagoa foi salva? – será a da naturaliza??o da paisagem atual: diz-se que as remo??es salvaram a paisagem no sentido de que resgataram uma ambiência tida como natural e original, que fora deturpada pela favela. Assim posto, o verbo salvar pode expressar outra sensa??o temporal, agora ligada ao que teria existido no passado. A própria imagem que acompanha a matéria orienta a vis?o para esse sentido, a partir da oposi??o entre a satura??o da favela simulada e a serenidade produzida pela fotografia atual.Seguindo o raciocínio exposto, a forma como se noticia a remo??o da favela da Catacumba expressa, ent?o, um critério de valora??o da paisagem por um viés de prote??o do que é dito natural. A partir de uma vis?o idílica da natureza e dos seus símbolos (árvores, o “verde”, baixa densidade, etc.), que contrariam os valores simbólicos construídos socialmente sobre as formas urbanas das áreas favelizadas (desordem, alta densidade, intranquilidade, etc.). No entanto, a regi?o conhecida como Catacumba certamente foi modificada de sua forma natural pela a??o humana mesmo antes da expans?o urbana da cidade para a Zona Sul no século XIX, já que antes da chegada dos portugueses ao Brasil a encosta desse morro era o local utilizado pelos indígenas para enterrar os seus mortos (PREFEITURA DO RIO, 2014)A favela como área de riscoSeguindo a análise de reportagens, percebe-se a presen?a constante da referência às áreas de risco como parte do discurso ambiental. S?o assim denominadas as regi?es cujas condi??es ambientalmente frágeis p?em em risco n?o apenas a natureza como também a vida humana.“As áreas ambientalmente frágeis – beira de córregos, rios, e reservatórios, encostas íngremes, mangues, áreas alagáveis, fundos de vale – que, por essa condi??o, merecem legisla??o específica e n?o interessam ao mercado legal, s?o as que “sobram” para a moradia de grande parte da popula??o. As consequências s?o muitas: polui??o dos recursos hídricos e dos mananciais, banaliza??o de mortes por desmoronamentos, enchentes, epidemias etc.”CITATION MAR12 \p 163 \l 1046 (MARICATO, 2012, p. 163)Assim, entende-se que a ocupa??o dessas áreas ocorre devido à ausência de op??es para aqueles cujo acesso à moradia formal está restrito ou impedido. Ocorre que, no discurso das remo??es, destaca-se a relev?ncia da prote??o dessas áreas frágeis, enquanto ignora-se os motivos que levam à tal forma de ocupa??o.A reportagem de janeiro de 2010 intitulada “Rio vai remover 119 favelas de áreas de risco em 2 anos“ (Figura 2), se apropria do termo “áreas de risco” para se referir às favelas que poder?o ser removidas pelo Estado.Figura 2: Manchete de reportagem retirada do jornal O GloboFonte: O Globo 01 jan. 2010 p. 1.Na mesma matéria Eduardo Paes declara: “Tem que acabar com a demagogia e retirar. N?o vamos fazer obras de milh?es para segurar algumas casas” (O Globo, 2010a). Aparece, novamente, a remo??o como uma medida administrativa necessária para a preserva??o ambiental das chamadas áreas de risco. O jornal manifestas, ainda, a opini?o de seu corpo editorial : “Desmistifica-se, afinal, o termo ‘remo??o’, para o bem de todos os cariocas. ” (O Globo, 2010a)Em 2010, segundo ano do primeiro mandato de Eduardo Paes, desastres decorrentes das chuvas de abril tornaram oportuno o argumento das “áreas de risco” dentro da política de remo??o de favelas. Essa argumenta??o justificou a retirada das edifica??es à ‘toque de caixa’, sem que houvesse uma prévia análise para distin??o entre áreas com risco de deslizamento daquelas situadas em terrenos estáveis ou consolidados. A manchete “Rio faz remo??o obrigatória em área de risco” (FOLHA DE S?O PAULO, 2010) revela o caráter de urgência dado às opera??es de remo??o.Figura 3: Manchete de reportagem retirada do jornal Folha de S?o PauloFonte: Folha de S?o Paulo, 12 abril 2010A “desmistifica??o” do termo “remo??o”, mencionada pelo editorial (O Globo, 2010a), se concretiza na fala do jornal e das autoridades, apresentando as políticas públicas de demoli??o de moradias em favelas como salutar para a popula??o que vive em áreas ambientalmente frágeis.A flexibiliza??o do discursoO discurso do risco, as preocupa??es com deslizamentos e, principalmente, a preserva??o ambiental permeiam a fala da mídia e de autoridades públicas sobre a quest?o das remo??es de popula??es desfavorecidas. Entretanto, os mesmos riscos n?o est?o presentes no discurso que promove a abertura das encostas para o mercado imobiliário, como revela a matéria “Paes quer flexibilizar ocupa??o de encostas”. (O GLOBO, 2010b)Figura 4: Manchete e imagem de reportagem retiradas do jornal O GloboFonte: O Globo 25 junho 2010, caderno Rio p. 21.A flexibiliza??o da ocupa??o das encostas se mostra mais aceitável quando se trata daqueles que por ela podem pagar. Um estudo realizado pelo Instituto Pereira Passos (IPP) em 2009, mostrava que 69,7% das áreas ocupadas acima dos 100 metros de altitude no município do Rio de Janeiro pertencem às classes média e alta. Por outro lado, as favelas ocupam aproximadamente 30% destas áreas, mas concentram 73,5% da popula??o que habita acima da cota 100.Baseado nesse estudo O Globo apresenta a reportagem “O morro n?o é só dos pobres – Ricos ocupam 70% das encostas acima de 100m, mas favelas concentram 73% da popula??o” (O GLOBO, 2009)Figura 5: Manchete e imagem de reportagem retiradas do jornal O GloboFonte: O Globo 22 mar?o 2009, caderno Rio p. 17.A matéria faz um contraponto entre a ocupa??o das encostas pelos ricos e pelos pobres e as diferentes formas como s?o encaradas pela justi?a e pela opini?o pública. Seja informalmente ou com a conivência do poder público, a ocupa??o das encostas pelas classes mais abastadas se justifica a partir de uma dicotomia de que a favela é danosa ao espa?o, enquanto as casas de alto padr?o n?o o seriam.Tal argumenta??o aparece na matéria a partir do caso de um condomínio de classe alta, irregular e acima da cota 100, cujo processo de legaliza??o foi debatido na justi?a e apoiado pelo vereador Alberto Salles a partir de um projeto de lei. “Na justificativa da proposta ele (Alberto Salles) diz que o condomínio já existe há longo tempo e sua regulariza??o evitaria o nascimento de uma nova favela. ” Fica claro, portanto, que n?o se trata de debater a ocupa??o das encostas, mas de evitar sua faveliza??o.Considera??es finaisHá uma legitima??o de políticas públicas onerosas para as favelas da cidade do Rio de Janeiro através dos discursos ambientais, que s?o emitidos pela autoridade pública e por veículos midiáticos.Esta análise mostra nos discursos correntes um repertório de argumentos que se utilizam da consciência ambiental para legitimar a??es de remo??o e conten??o de áreas de baixa renda. Assim sendo, funcionam como um veículo de naturaliza??o de práticas que acentuam a desigualdade no direito à cidade. Ao mesmo tempo, este discurso n?o se articula da mesma forma quando se trata da proposi??o e manuten??o de áreas residenciais de alto padr?o em localidades semelhantes.Pode-se indagar até que ponto a área de risco e a qualidade da paisagem s?o conceituadas nestes discursos com base no nível social de quem a ocupa e a transforma. A partir desta contradi??o pode-se levantar a hipótese de que, mais do que o risco de desabamento, de danos ao meio ambiente ou altera??o da paisagem, o problema da ocupa??o de áreas ambientalmente frágeis é o próprio surgimento de favelas.A partir desses argumentos, s?o perceptíveis as contradi??es nos discursos empreendidos tanto pela mídia quanto pelo governo. ? possível conjecturar que este apelo, dito ambientalmente correto, naturaliza políticas públicas de segrega??o, que negam à popula??o em situa??o favelada o direito à cidade.Notas1 O terreno onde nasceu a Favela da Catacumba pertencia à Baronesa da Lagoa Rodrigo de Freitas, que transferiu, no início do século XX, a posse destas terras para os seus ex-escravos. O assentamento que ali surgiu deu origem, aos primeiros barracos que constituiriam a extinta favela. A posse do terreno por parte dos seus antigos moradores era legítima e, na década de 1970, sob o Regime Militar, o governo decidiu remover os moradores da Catacumba, substituindo a favela pelo Parque da Catacumba, que ocupa o local atualmente. (PREFEITURA DO RIO DE JANEIRO, 2014)2. Segundo o índice FIPE/ZAP de Janeiro/2016 (ZAP,2016) o metro quadrado da lagoa só perde em valor para Leblon e Ipanema, primeiro e segundo mais caros respectivamente.Referências bibliográficas BIBLIOGRAPHY \l 1046 ABRAMOVAY, R. Alimentos versus popula??o: está ressurgindo o fantasma malthusiano? Ciência e Cultura, 62, p. 38-43, 2010.ACSELRAD, H.. Discursos da Sustentabilidade Urbana. Revista Brasileira de Estudos Regionais e Urbanos, v. 1, p. 79-90, 1999._____. Sustentabilidade e articula??o territorial do desenvolvimento brasileiro. II Seminário Internacional sobre Desenvolvimento Regional. Santa Cruz do Sul, 29 set./01 out. 2004._____. Cidade-Espa?o Público? 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