EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR-PRESIDENTE …



EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR-PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS.

RAZÕES Nº 55/2010.

RECURSO ESPECIAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 68832-4/180 (200804639722)

AGRAVANTE : ALEX IVAN DE CASTRO PEREIRA FILHO

AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS

RELATOR : JD DONIZETE MARTINS DE OLIVEIRA

1 CÂMARA : 3ª CÂMARA CÍVEL

PROCURADOR DE JUSTIÇA: PEDRO TAVARES FILHO

2

Observação quanto ao prazo: Tendo em vista a ausência de intimação pessoal do Ministério Público quanto a decisão de fls. 304/319, mesmo após pedido de vista e reiteração deste (fls. 322), dá-se este Órgão por intimado na oportunidade em que teve acesso aos autos em Cartório, deles fazendo carga (11.03.2010 – fls. 323), momento em que se manifesta no prazo legal de 30 dias (15+15), com início em 12.03.10 e vencimento em 10.04.10 (sábado), devendo ser prorrogado para o primeiro dia útil seguinte – 12.04.2010 (segunda-feira) .

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, nos autos do Agravo de Instrumento em que é agravante ALEX IVAN DE CASTRO PEREIRA FILHO, não se conformando, data venia, com o V. Acórdão de fls. 272/285 e com o Acórdão dos Embargos de Declaração de fls. 304/319 que o integra, por entender que contrariam os artigos 17, § 7º, e 16, § 2º, ambos da Lei 8.429/92, vem, perante Vossa Excelência, no exercício das atribuições que lhe são conferidas por lei, com base no Artigo 105, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, na forma dos artigo 541 e seguintes do Código de Processo Civil, e dos artigos 255 e seguintes do Regimento Interno do Excelso Superior Tribunal de Justiça, interpor o presente RECURSO ESPECIAL, fazendo-o nos termos das razões anexas.

Recebido e processado na forma da lei, requer seja o presente Recurso admitido e encaminhado ao Colendo Superior Tribunal de Justiça.

Nestes termos,

Pede Deferimento.

Goiânia (GO), 15 de março de 2010.

PEDRO TAVARES FILHO

Procurador de Justiça

RECURSO ESPECIAL - ESTADO DE GOIÁS

Base Legal: Art.105, III, "a", CF - Contrariedade aos arts. 17, § 7º, e 16, § 2º, da Lei 8.429/92.

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS

RECORRIDO : ALEX IVAN DE CASTRO PEREIRA FILHO

COLENDO TRIBUNAL,

I - DOS FATOS:

ALEX IVAN DE CASTRO PEREIRA FILHO interpôs Agravo de Instrumento contra decisão liminar proferida pelo Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Itumbiara nos autos da Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa proposta pelo Ministério Público em seu desfavor.

A referida ACP foi manejada objetivando a anulação de contrato de prestação de serviços advocatícios firmado sem licitação pelo Município de Itumbiara com o escritório de Advocacia do qual o agravante é sócio (Alex Ivan de Castro Pereira Escritório de Advocacia S/S), bem como do seu aditivo e do acordo celebrado pelo referido Município com a CELG – Companhia Energética de Goiás, atos ensejadores de enriquecimento ilícito e prejuízo ao erário.

A decisão agravada, por sua vez, consiste no deferimento da liminar pleiteada pelo Ministério Público para determinar ao Secretário Municipal de Finanças, ou a quem o substitua, a abstenção de pagamento relativo à contratação dos serviços advocatícios aos beneficiários, a ser realizado somente por depósito judicial em conta vinculada, além da indisponibilidade dos bens e da quebra de sigilo bancário do requerido.

Em sua peça, aduziu o Agravante ser injusta e equivocada a decisão liminar e que a indisponibilidade dos bens e a quebra de sigilo bancário são medidas extremas e ilegais, pugnando, assim, pela sua revogação.

Instada a manifestar-se, a Procuradoria de Justiça, em parecer da Dra. Laura Maria Ferreira Bueno, afirmando a obrigatoriedade de licitação para a contratação em voga e a presença dos requisitos ensejadores da medida acautelatória, opinou pelo conhecimento e desprovimento do agravo (fls. 249/266).

Após regular trâmite, o Egrégio Tribunal de Justiça conheceu do recurso e, contrariando o parecer ministerial, deu-lhe provimento para anular a decisão e, por conseguinte, afastar as medidas constritivas nesta deferidas, tudo sob o fundamento da ausência de notificação do requerido para oferecimento de manifestação prévia ao recebimento da inicial, nos termos do art. 17, § 7º, da Lei 8.429/92, além da alegação de que a quebra do sigilo bancário, prevista no art. 16, § 2º, da mesma Lei, e a indisponibilidade de bens são medidas extremas dependentes de fatos e provas verossímeis. Eis o teor da ementa:

AÇÃO CIVIL PUBLICA POR IMPROBIDADE. LIMINAR. MEDIDAS CONTRITIVAS. CONTRADITORIO E AMPLA DEFESA. VIOLAÇÃO.

1 - A FALTA DE NOTIFICACAO DO REQUERIDO PARA APRESENTACAO DE SUA DEFESA PRELIMINAR, PRECEDENTEMENTE AO DESENCADEAMENTO DO PROCEDIMENTO NA ACAO ORIGINARIA (ART. 17, § 7 DA LEI N.8429/92) CONFIGURA A NULIDADE DOS ATOS JUDICIAIS A PARTIR DAI EMANADOS, POR OFENSA AOS PRINCIPIOS DO CONTRADITORIO E AMPLA DEFESA (INC. LV, ART. 5, CF/88).

2 - A QUEBRA DO SIGILO BANCARIO PREVISTA NO ARTIGO 16, § 2, DA LEI N.8429/92, E A INDISPONIBILIDADE DE BENS, SAO MEDIDAS EXTREMAS QUE SO SE JUSTIFICAM QUANDO CALCADAS EM FATOS E PROVAS VERODDIMEIS, NAO PODENDO SE CONSISTIR EM MEDIDAS DE ANTECIPACAO DE JULGAMENTO QUANDO NAO AMPARADAS NO DEVIDO PROCESSO LEGAL (DUE PROCESS OF LAW).

3 - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Irresignado com os termos da decisão retro, o Ministério Público opôs embargos de declaração, com pedidos de uniformização de jusrisprudência, efeitos infringentes e prequestionamento, informando a contrariedade da decisão ao artigo 17, § 7º, da Lei 8.429/92 e às próprias decisões das demais Turmas da Corte Estadual que entendem não haver motivos para a decretação de nulidade do processo pela falta de oitiva prévia do requerido quando a ação encontra-se lastreada por inquérito civil ou procedimento administrativo, como é o caso dos autos, pois conforme asseverado, a notificação prévia somente se faz necessária para evitar o ajuizamento de ações temerárias.

Todavia, o Sodalício Goiano, após apreciar os embargos, negando-se à prestação jurisdicional, rejeitou-os nos seguintes termos:

EMBARGOS DE DECLARACAO COM PEDIDO DE UNIFORMIZACAO DA JURISPRUDENCIA. AUSENCIA DOS VICIOS ESPECIFICADOS NO ART. 535 DO CPC. REEXAME DE QUESTAO DECIDIDA. PREQUESTIONAMENTO. I- NAO HA COMO PREVALECER O PEDIDO DE UNIFORMIZACAO DA JURISPRUDENCIA DO TRIBUNAL DE JUSTICA QUANTO A MATERIA EXPOSTA NO § 7º DO ARTIGO 17 DA LEI 8429/92 POR NAO CABER O REFERIDO INCIDENTE SOBRE MATERIA QUE JA FOI JULGADA, OU SEJA O PEDIDO DEVE SER FORMULADO ANTES DE ENCERRADO O JULGAMENTO DA QUESTAO CONTROVERTIDA. II- AINDA QUE OS EMBARGOS DE DECLARACAO TENHAM POR OBJETIVO A MODIFICACAO DO JULGADO, DEVEM SER OBSERVADOS OS LIMITES TRACADOS NO ART. 535 DO CPC. III- AUSENTES QUAISQUER DAS HIPOTESES PREVISTAS NO REFERIDO ARTIGO NAO SE ACOLHEM OS EMBARGOS DE DECLARACAO, MESMO PARA EFEITO DE PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS CONHECIDOS, MAS REJEITADOS.

Ressalte-se, por oportuno, que a referida decisão foi proferida em 04 de agosto de 2009 e, entretanto, o Tribunal de Justiça dela deixou de intimar o Ministério Público, tendo este Órgão diligenciado sucessivas vezes por vista dos autos, sem, todavia, obter qualquer pronunciamento da Corte Local, motivo pelo qual somente teve ciência da mesma quando conseguiu fazer carga do processo (fls. 323), o que, naturalmente, atenta contra a garantia institucional do Ministério Público de ser intimado pessoalmente das decisões judiciais (artigo 236, § 2º, do CPC e 41, IV, da Lei 8.625/93), mormente em se tratando de recurso de sua autoria.

II - DO CABIMENTO DO RECURSO

É cabível o presente Recurso com base na alínea "a" do inciso III do artigo 105, da Constituição Federal, in verbis:

" Art. 105 - Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

III - Julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;"

Satisfeitos que se encontram os requisitos genéricos da tempestividade, legitimidade, interesse e adequação, e, ainda, os específicos de última instância e do prequestionamento, resta demonstrar a contrariedade à lei federal, nos termos seguintes:

III - DA CONTRARIEDADE À LEGISLAÇÃO FEDERAL

Dispõem os artigos indigitados:

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

§ 7o Estando a inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do requerido, para oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, dentro do prazo de quinze dias.

Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.

Art. 16. Havendo fundados indícios de responsabilidade, a comissão representará ao Ministério Público ou à procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a decretação do seqüestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público.

§ 2° Quando for o caso, o pedido incluirá a investigação, o exame e o bloqueio de bens, contas bancárias e aplicações financeiras mantidas pelo indiciado no exterior, nos termos da lei e dos tratados internacionais.

E o teor do Acórdão:

"Cumpre analisar, em sede de agravo de instrumento, os requisitos legais da Lei 8.429/92, e, inclusive se foi necessária à efetividade do provimento jurisdicional, as medidas judiciais de constrição no sentido de garantir o futuro ressarcimento ao erário que fora desfalcado pelos atos de improbidade.

Para o deferimento da medida em apreciação é necessário a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora, devendo haver indícios de que o poder público tenha sido defraudado patrimonialmente ou de que o acusado pelos atos de improbidade administrativa tenham se enriquecido em virtude do ato ilícito cuja prática lhe é imputada.

Conforme se verifica da documentação que instrui as razões recursais, antes do recebimento da petição inicial no feito de origem, não foi ordenada a intimação do recorrente para que, em 72 horas, se manifestasse sobre o pedido liminar formulado em sede de ação civil pública.

O que se percebe dos autos, foi o recebimento da petição inicial pela autoridade judicante, em abstração às disposições do §7º, do artigo 17 da Lei n. 8.429/92,

acrescido pela MP 2.225/2001, verbis:

(...)

A falta de notificação do requerido para apresentação de sua defesa preliminar, precedentemente ao desencadeamento do procedimento na ação originária, configura pena de nulidade, por ofensa aos princípios do contraditório e ampla defesa (inc. LV, art. 5º CF/88).

(...)

No caso dos autos, não vislumbra ter o procedimento judicial observado o contraditório preambular, em grave afronta ao princípio constitucional supra referido. Não se pode subverter a ordem do procedimento, decretando-se primeiro as medidas constritivas de direito para, somente ao depois, oportunizar o direito ao contraditório e a ampla defesa.

Por outro lado, a quebra do sigilo bancário prevista no artigo 16, § 2º, da Lei 8.429/92, e a indisponibilidade de bens, são medidas extremas que só se justificam quando calcadas em fatos e provas verossímeis, não podendo se consistir em medidas de antecipação de julgamento quando não amparadas no devido processo legal (due process of law), conforme já se pronunciou o

Colendo Superior Tribunal de Justiça: (...)

Com essas considerações, dou provimento ao recurso para anular a decisão judicial recorrida, afastando as medidas constritivas judiciais (restrição de pagamento de honorários advocatícios, quebra de sigilo bancário, indisponibilidade e sequestro de bens, etc.) tornando-as sem efeito, devendo a ação prosseguir, em seu rito ordinário, respeitados os princípios constitucionais do

contraditório e ampla defesa.”

IV - DAS RAZÕES DO PEDIDO DE REFORMA

O V. Acórdão contraria os artigos indicados ao revogar medidas legalmente concedidas, quais sejam, “restrição de pagamento de honorários advocatícios, quebra de sigilo bancário, indisponibilidade e sequestro de bens”, sob o fundamento de ausência de notificação do requerido para o contraditório preambular previsto no § 7º do art. 17 da Lei de Improbidade Administrativa.

Da análise do feito, observa-se que o caso em testilha revela duas situações distintas a merecer reparo.

Preliminarmente, consoante entendimento doutrinário e jurisprudencial, a exigência de oitiva prévia do requerido nas ações de improbidade, isto é, a apresentação de manifestação antes do recebimento da inicial, tem por finalidade oferecer subsídios ao magistrado, amparando-o para a decisão de recebimento da ação de forma a evitar demandas temerárias ou injustas.

Sua inspiração, como preleciona o emérito Procurador da República Ronaldo Pinheiro de Queiroz[1], adveio do procedimento especial dos crimes de responsabilidade dos funcionários públicos, também conhecido como crimes funcionais, previstos nos artigos 513 a 518 do Código de Processo Penal (CPP):

“Da mesma forma que o § 6º do art. 17 da LIA, o art. 513 do CPP exige que a queixa e a denúncia seja instruída com documentos ou justificações que façam presumir a existência do delito ou com declaração fundamentada da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas. De igual modo, o juiz notificará o acusado para responder por escrito (CPP, art. 514), que poderá ser instruída com documentos e justificações (CPP, art. 515, parágrafo único).

Analisando a ratio desse procedimento especial, Eugênio Pacelli de Oliveira anota que:

“(...) ao tempo do Código, havia uma significativa preocupação com a iniciativa penal instaurada contra servidores públicos, por crimes praticados contra a Administração. Diante das graves consequências e transtornos que uma ação penal dessa natureza pode causar ao desenvolvimento da atividade administrativa, entendeu o legislador de exigir um suporte mínimo de prova para o ajuizamento da demanda. Algo como a justa causa, como condição da ação (...)”

O mesmo autor anota que:

“Entretanto, e acertadamente, a jurisprudência sempre entendeu que esta exigência estaria superada quando a apuração inicial de possível delito fosse realizada por meio de inquérito policial, ocasião em que o inculpado (futuro acusado da ação penal) não seria surpreendido com o oferecimento da ação penal e poderia, quando possível, oferecer as provas da inexistência do crime.”

Nesses termos, conclui-se que a intenção da norma não é a garantia do contraditório (que será exercido amplamente no desenrolar de todo o processo, após recebida a inicial), mas sim a de evitar o nascimento de relação processual destituída de justa causa, devendo-se aplicar o mesmo raciocínio às ações de improbidade, a comprovar que a notificação prévia do requerido somente se mostra necessária em ações instruídas apenas com documentos e justificações, quando não há, de fato, aparato suficiente para o juízo de admissibilidade da inicial, como preleciona, ainda, o ilustre procurador:

“Igual raciocínio deve ser empregado no procedimento de improbidade administrativa, pois ubi eadem ratio, ibi idem jus. Principalmente pelo fato de que essa tese foi desenvolvida no processo penal, em que o bem da vida, a liberdade, é muito mais relevante do que o discutido na improbidade, razão pela qual não há como não adotar a dispensa de defesa preliminar quando a ação estiver embasada em inquérito civil, já com um suporte mínimo de prova.”

De fato, vê-se que realmente diversa é a situação das ações intentadas com escopo em inquérito civil ou em procedimentos instaurados pela própria administração ou por órgãos externos de controle, em que dispensado o rito do art. 17, § 7º, porquanto tais procedimentos se prestam ao mesmo fim da oitiva antecipada, ou seja, carrear elementos suficientes à comprovação da pertinência da demanda a fim de evitar o ajuizamento de ações destituídas de base razoável, como corroboram também os renomados doutrinadores Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves:

'Assim, a partir da ratio subjacente a toda norma que exige o estabelecimento de um contraditório preliminar, pensamos que a notificação prévia do réu para o oferecimento de resposta só será exigível em se tratando de ações instruídas por 'documentos ou justificação', o que significa dizer que lastreando-se a inicial em inquérito civil ou em procedimentos administrativos regularmente instaurados pela própria administração ou por órgãos externos de controle, tal omo ocorre relativamente ao Tribunal de Contas e às Comissões Parlamentares de Inquérito, não incidirá a regra do § 7º. Isto porque o inquérito civil e os procedimentos administrativos prévios – enfatize-se – já cumprem o papel de evitar o ajuizamento de ações temerárias, justamente o que se buscou coibir com a instituição da defesa prévia, merecendo ser ressaltado que este vem sendo o entendimento do STF e do STJ na seara processual penal quanto aos chamados 'crimes funcionais.'[2]

Dessarte, sempre que o juiz, de logo, convencer-se da plausibilidade jurídica da ação, mormente se lastreada em inquérito civil ou procedimento administrativo, deve receber a inicial, até mesmo em atenção ao mandamento constitucional da duração razoável do processo a determinar que se evitem incidentes desnecessários e inócuos, como, inclusive, entende o Superior Tribunal de Justiça.

Com base nesse entendimento, e estando a ação civil pública em voga fulcrada no Processo Administrativo n. 18195/07 do Tribunal de Contas dos Municípios Goianos e nos autos do Processo Judicial 200703815452 conforme se infere às fls. 41, mostra-se incorreta a decisão do Tribunal de Justiça ao anular o processo, especialmente as medidas constritivas, pela ausência de intimação do requerido para apresentação de manifestação prévia ao recebimento da inicial, se esta já se encontra instruída com elementos verossímeis da razoabilidade.

Nesse sentido, vê-se que a decisão prolatada no presente caso encontra-se dissociada até mesmo do entendimento assente da própria Corte Estadual:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACAO CIVIL PUBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSENCIA DE NOTIFICACAO PREVIA. NULIDADE PROCESSUAL RECHACADA. LITISPENDENCIA INEXISTENTE.

I - A NOTIFICACAO PREVIA TEM PREVISAO LEGAL PARA QUE O JUIZ, APOS A ANALISE DE MANIFESTACAO PRELIMINAR DO REQUERIDO, ADMITA OU NAO O PROCESSAMENTO DA ACAO, DE FORMA A EVITAR DEMANDAS TEMERARIAS E INJUSTAS. NAO SE HA DE TER POR NULO O PROCESSO, POR AUSENCIA DO CONTRADITORIO PRELIMINAR, SE SE FAZIA DESNECESSARIO O MESMO, HAJA VISTA QUE, NO CASO EM TELA, A PROPOSITURA DA ACAO CIVIL PUBLICA POR IMPROBIDADE ENCONTRA-SE LASTREADA POR INQUERIT O CIVIL, ESTE QUE TEM POR FIM O MESMO DAQUELE BUSCADO PELA NOTIFICACAO PREVISTA NO § 7º DO ART. 17 DA LEI N. 8.429/92, OU SEJA, O DE EVITAR O AJUIZAMENTO DE ACOES DESTITUIDAS DE BASE RAZOAVEL. NULIDADE PROCESSUAL INEXISTENTE. (...). (TJGO. 64233-4/180 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. 1A CAMARA CIVEL. DR(A). AMARAL WILSON DE OLIVEIRA. DJ 229 de 03/12/2008)

"ADMINISTRATIVO. ACAO CIVIL PUBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NOTIFICACAO PREVIA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. CONTRATACAO SUPERFATURADA DE MAO-DE-OBRA. PREJUIZO AO ERARIO. SANCOES ELENCADAS NA LEI 8.429/92. DOSIMETRIA DAS PENAS. PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE.

1 - A NOTIFICACAO PREVIA PARA OFERECIMENTO DE RESPOSTA SO SERA EXIGIVEL EM SE TRATANDO DE ACOES INSTRUIDAS APENAS COM DOCUMENTOS OU JUSTIFICACOES (ART. 17, PARAGRAFO 6, DA LEI N. 8.429/92), SIGNIFICANDO QUE SE AMPARADA A INICIAL DA ACAO CIVIL PUBLICA EM COMPETENTE INQUERITO CIVIL, NAO INCIDIRA A REGRA DO PARAGRAFO 7 DO ART. 17 DA LEI CITADA PORQUE O INQUERITO CIVIL CUMPRE O PAPEL DE EVITAR O AJUIZAMENTO DE ACOES TEMERARIAS, JUSTAMENTE O QUE SE BUSCOU COIBIR COM A INSTITUICAO DA NOTIFICACAO PREVIA. 2 - (...)." (TJGO. 4º CÂMARA CÍVEL. 95982-0/188 - APELACAO CIVEL. DES. BEATRIZ FIGUEIREDO FRANCO. DJ 14883 de 22/11/2006)

"APELACAO CIVEL. ACAO CIVIL PUBLICA. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA DO PRESIDENTE DA CAMARA MUNICIPAL. PRELIMINARES AFASTADAS. COBRANCA DE PROPINA. PRATICAVEL. PROCESSO LICITATORIO FANTASIOSO NAO DEMONSTRADO. DESPESAS PUBLICAS. DESVIO DE FINALIDADE PUBLICA E SEM OBSERVANCIA DAS FORMALIDADES LEGAIS.

1 - A NOTIFICACAO PREVIA, COM EFEITO DE O JUIZ, APOS A ANALISE DA RESPOSTA DO REQUERIDO, ADMITIR OU NAO O PROCESSAMENTO DA ACAO, DE FORMA A EVITAR DEMANDAS TEMERARIAS E INJUSTAS, SE FAZ NECESSARIA, VIA DE REGRA, QUANDO ESTA NAO FOR PRECEDIDA DO INQUERITO CIVIL, JA QUE ESTE TEM POR FIM JUSTAMENTE EVITAR O AJUIZAMENTO DE ACOES DESTITUIDAS DE BASE RAZOAVEL. (...." (TJGO. 2º CÂMARA CÍVEL. 89191-1/188 - APELACAO CIVEL. DES. ALAN S. DE SENA CONCEICAO. DJ 14841 de 18/09/2006)

Na mesma linha, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. (...)AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. LEI 8.429/1992. DEFESA PRELIMINAR. INEXISTÊNCIA. EXORDIAL PRECEDIDA DE INQUÉRITO CIVIL. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO ACUSADO. PAS DES NULLITÉ SANS GRIEF. NULIDADE. NÃO-OCORRÊNCIA.

(...)A Ação Civil Pública é via adequada para demandas relativas à improbidade administrativa. Precedentes do STJ.

A defesa preliminar é oportunidade para que o acusado indique elementos que afastem de plano a existência de improbidade, a procedência da ação ou a adequação da via eleita. Nesses casos, o juiz rejeitará a inicial. Interpretação do art. 17, § 7º, da Lei 8.429/1992 em harmonia com o § 8º do mesmo dispositivo.

Hipótese em que ocorreu instrução administrativa prévia por meio de inquérito civil e o juiz, ao apreciar a exordial, verificou que havia no processo elementos sólidos para a sua convicção quanto às condições da ação.

A declaração da nulidade pela simples carência de defesa prévia, a par de ser um exagerado formalismo, agrediria a celeridade e a economia processual sem nenhum benefício real e legítimo às partes, exceto a procrastinação, que não pode ser agasalhada pelo Judiciário.

11. Recurso Especial parcialmente conhecido e não provido.(REsp 944.555/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/11/2008, DJe 20/04/2009)

Por outro lado, observa-se que também se equivocou a Corte Estadual ao exigir a oitiva prévia do requerido e a apresentação de provas verossímeis para o deferimento das medidas acautelatórias.

Ora, há muito se tem consagrado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que o deferimento do sequestro (art. 16, § 2º) e da indisponibilidade de bens (art. 7º da Lei 8.429/92) não dependem da oitiva prévia do réu na ação de improbidade, porquanto medidas manifestamente acautelatórias:

“A possibilidade de indisponibilidade de bens não está condicionada ao recebimento da exordial, tampouco à prévia manifestação dos réus. A natureza jurídica da indisponibilidade de bens prevista na Lei de Improbidade Administrativa é manifestamente acautelatória, pois visa assegurar o resultado prático de eventual ressarcimento ao erário causado pelo ato de improbidade administrativa. Assim, o pedido pode ser formulado incidentalmente na ação civil de improbidade administrativa ou medida cautelar preparatória, e deferido, mediante a presença dos requisitos autorizadores, antes mesmo da notificação do réu para a apresentação de defesa prévia.(REsp 1040254/CE, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 02/02/2010)

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MEDIDA CAUTELAR. INDISPONIBILIDADE E SEQÜESTRO DE BENS. REQUERIMENTO NA INICIAL DA AÇÃO PRINCIPAL. DEFERIMENTO DE LIMINAR INAUDITA ALTERA PARS ANTES DA NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. POSSIBILIDADE. ARTS. 7º E 16 DA LEI 8429/92.(...) 1. É licita a concessão de liminar inaudita altera pars (art. 804 do CPC) em sede de medida cautelar preparatória ou incidental, antes do recebimento da Ação Civil Pública, para a decretação de indisponibilidade (art. 7º, da Lei 8429/92) e de seqüestro de bens, incluído o bloqueio de ativos do agente público ou de terceiro beneficiado pelo ato de improbidade (art. 16 da Lei 8.429/92), porquanto medidas assecuratórias do resultado útil da tutela jurisdicional, qual seja, reparação do dano ao erário ou de restituição de bens e valores havidos ilicitamente por ato de improbidade. Precedentes(...)(REsp 929.483/BA, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/12/2008, DJe 17/12/2008).

A título de argumento obiter dictum, cumpre destacar, a licitude da concessão de liminar inaudita altera pars (art. 804 do CPC) em sede de medida cautelar preparatória ou incidental, antes do recebimento da Ação Civil Pública, para a decretação de indisponibilidade (art. 7º, da Lei 8429/92) e de seqüestro de bens, incluído o bloqueio de ativos do agente público ou de terceiro beneficiado pelo ato de improbidade (art. 16 da Lei 8.429/92), porquanto medidas assecuratórias do resultado útil da tutela jurisdicional, qual seja, reparação do dano ao erário ou de restituição de bens e valores havidos ilicitamente por ato de improbidade. Precedentes do STJ: REsp 821.720/DF, DJ 30.11.2007; REsp 206222/SP, DJ 13.02.2006 e REsp 293797/AC, DJ 11.06.2001.(REsp 1085218/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/10/2009, DJe 06/11/2009)

Desse modo, mesmo que se possa cogitar a necessidade de defesa preliminar, é certo que, ainda assim, as medidas constritivas já deferidas não poderiam sofrer revogação pela exigência de notificação prévia, porque, conforme visto, dela prescinde.

Diga-se mais quanto a exigência de apresentação de provas contundentes para o deferimento do sequestro e da indisponibilidade de bens, se a Lei, ainda que se tratem de medidas excepcionais, exige apenas “fundados indícios de responsabilidade” e que o fato investigado seja capaz de ocasionar “lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito”, requisitos já regularmente verificados quando do deferimento das medidas liminares e, ressalte-se, não impugnados pelo Tribunal de Justiça.

Outrossim, não é dado ao Tribunal exigir mais do que a lei prevê, ainda que sob o fundamento da excepcionalidade das medidas, até mesmo porque prescindem estas da necessidade de apresentação de provas contundentes porque visam exatamente oferecer aparato para a propositura e desenvolvimento da investigação e carrear referidas provas para a legitimidade de eventual condenação (quebra de sigilo), além de resguardar o ressarcimento ao erário (indisponibilidade de bens), não se confundindo com o julgamento próprio da causa, razão porque não constituem antecipação do juízo de delibação, como afirmou a Corte Local.

Portanto, subsistindo os motivos legais para as medidas acautelatórias, impossível sua revogação pelos argumentos expostos pelo Tribunal de Justiça, o que, também sob esse prisma, culmina na necessidade de reforma do decisum para fazer sanar as violações aos preceitos retro mencionados e adequá-lo ao entendimento da Corte Superior.

V - DO PEDIDO

Dessarte, demonstrada a violação da norma legal, requer o Ministério Público do Estado de Goiás ao Eminente Ministro e à Colenda Turma, a quem couber o recebimento e o conhecimento do presente Recurso, que o admita, dele conheça e lhe dê provimento, para reformar o V. Acórdão recorrido, restaurando a eficácia das medidas deferidas in limine.

Termos em que,

Pede Deferimento.

Goiânia (GO), 15 de março de 2010.

PEDRO TAVARES FILHO

Procurador de Justiça

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[1] QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro. Algumas reflexões sobre a fase de defesa preliminar no processo de improbidade administrativa . Boletim dos Procuradores da República nº 16. Disponível:

[2] Impropriedade Administrativa, 3ª edição, Lumen Juris Editora, Rio de Janeiro, 2006, pág. 723

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