Universidade Federal da Bahia
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO — Jornalismo
A RELAÇÃO ENTRE AS POLITICAS DE CULTURA E DE TURISMO
NA CIDADE DE ILHÉUS
Aluna — Joana Fialho Magalhães
Orientador — Antônio Albino Canelas Rubim
Projeto Experimental em Comunicação
2003.1
"E, de repente, o avião se desviou da rota para o sul, e a cidade apareceu ante os olhos dos viajantes. Agora não voavam mais sobre o mar verde. Primeiro foram os coqueiros e logo depois o morro da Conquista. O piloto inclinava o avião e os passageiros que iam do lado esquerdo podiam ver, como num postal, a cidade de Ilhéus se movimentando. Descia em ruas pobres e ziguezagueantes pelo morro proletário, se estendia rica entre o rio e o mar em avenidas novas, cortadas na praia, continuava na ilha do Pontal, em casas de jardins alegres, subia mais uma vez proletária pelo morro do Unhão, casas de zinco e de madeira. Um passageiro contou os oito navios do porto, fora os grandes veleiros e as inúmeras pequenas embarcações. O porto parecia maior que a própria cidade."
JORGE AMADO, São Jorge dos Ilhéus,
Periperi, Bahia, janeiro de 1944,p.1
Dedico este trabalho à Ilhéus, cidade que tenho apreço desde minha primeira infância, sendo fruto da sua miscigenação cultural através dos meus bisavós, Marie e Moise Hage (libaneses), Magda Weyll (filha da indígena Inês e do alemão Peter Weyll)
e Eustáquio Fialho (baiano),
como contribuição para uma reflexão sobre a sua dinâmica política.
Inicío os meus agradecimentos ao meu mestre,
Antônio Albino Rubim,
que desde o princípio na Facom,
me acolheu de forma estimulante e carinhosa,
resultando na orientação deste projeto. A sua firmeza ao me conduzir,
me animar e me apoiar neste longo percurso, foi fundamental para atingir essa meta.
Aos entrevistados
que foram essenciais na construção deste trabalho, superando os obstáculos
da escassez de documentação e de informações sobre o tema.
À minha família, esteio verdadeiro do meu viver.
Ao meu marido, Marcelo,
que abriu mão do nosso convívio, por três anos, mesmo em momentos difíceis,
fortalecendo com a sua cumplicidade ainda mais o nosso amor e união.
Ao meu pai, Sérgio,
atento, preocupado e incentivador amoroso da retomada
da minha carreira e do meu sonho profissional.
À minha mãe, Ângela,
fonte eterna de minha seiva vital,
e apoio inigualável na conclusão do meu curso e deste trabalho.
E ao seu companheiro Pancho
que me acolheu num momento essencial, dando força a mim e a este trabalho.
Aos meus irmãos, Julia e Tiago, portos seguros do meu amor.
Aos meus avós, Juca e Jorge (in memorian), e Luisa e Loura,
pelo enraizamento do valor à família e à vida.
Aos meus sogros, Ziza e Magalhães, e ao meu enteado Luca,
pelo carinho, compreensão e eterno apoio ao meu marido
sem os quais não haveria força para esse projeto.
Aos meus amigos, que sempre foram inspiração para a construção
de uma vida companheira.
Agradeço a Deus pela oportunidade de conclusão deste projeto
e peço a sua bênção para essa nova etapa que se inicia.
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ……………………………………………………. 5
ILHÉUS E REGIÃO ……………………………………………… 7
- Aspectos Históricos ……………………………………… 8
- Região Cacaueira ………………………………………… 13
- Aspectos Econômicos …………………………………… 16
- Aspectos Sociais ………………………………………… 22
- Aspectos Políticos ………………………………………. 27
- Aspectos Culturais ……………………………………… 29
TURISMO ………………………………………………………….. 34
- No Mundo, No Brasil e Na Bahia ………………………. 35
- Nova Opção Para o Desenvolvimento ………………….. 45
- Na Região Cacaueira …………………………………… 48
- Estrutura dos Orgãos de Turismo …..…………………… 53
- Políticas e Estratégias ……………………………………. 60
- Ações em Desenvolvimento ……………………………... 75
CULTURA …………………………………………………………... 84
- Gestão e Políticas Culturais no Brasil .................................. 85
- Gestão e Políticas Culturais na Bahia .................................. 96
- Gestão e Políticas Culturais de Ilhéus .................................. 107
INTERSEÇÃO ENTRE AS POLÍTICAS DE CULTURA
E DE TURISMO …………….………………………………………. 127
- Cultura Como Diferencial Para o Turismo ............................ 128
- Ponto de Interseção ............................................................... 131
- Perspectivas de Desenvolvimento da Cidade ....................... 137
- Ilhéus e a Retomada do Desenvolvimento ........................... 142
REFERÊNCIAS E FONTES BIBLIOGRÁFICAS……………… 150
INTRODUÇÃO
Ilhéus. Ali tudo começou, ainda nos tempos da Capitania de São Jorge dos Ilhéus: as disputas, as conquistas, os desbravamentos, as plantações. Cidade histórica, ‘metrópole’ da região cacaueira, eixo da civilização do cacau, situada na micro-região sul do Estado da Bahia, após a derrocada do “fruto de ouro”, caminha a passos curtos, desestimulada, ou melhor, estimulada apenas com as pequenas altas do cacau ou pelos bons resultados das clonagens cacaueiras. Após 40 anos de crescente crise financeira, a região e a cidade buscam saídas para a recuperação da sua economia.
Entre tantas alternativas, o turismo é apontado como uma possível solução para o desenvolvimento de Ilhéus e adjacências, por sua rica cultura cacaueira difundida internacionalmente através de seus escritores, Jorge Amado e Adonias Filho, além de dispor de áreas ecológicas privilegiadas com uma rica vegetação remanescente da mata atlântica e quilômetros de praias. O turismo, que hoje é reconhecido mundialmente como vetor de atração de divisas para as cidades ou regiões, pode vir a ser um fator de extrema importância para Ilhéus, que ainda se recupera da crise do cacau e busca lentamente a diversificação da sua economia para alcançar o desenvolvimento. A cultura regional, as antigas fazendas, os monumentos, as edificações, e a sua cultura imaterial (cenário das obras literárias que relatam a atmosfera da cidade quando esta despontou internacionalmente) são valores fundados no tempo áureo do cacau, e poderão ser a ‘âncora’ da proposta turística.
“A Relação entre as Políticas de Cultura e de Turismo na cidade de Ilhéus” é uma monografia sobre as políticas públicas de cultura e de turismo da cidade de Ilhéus, que visa analisar especialmente as relações existentes entre elas e verificar a potencialidade dessas duas áreas como propulsoras do desenvolvimento da região. Uma reflexão que se desenvolve em torno da seguinte questão central: Como se articulam as políticas de cultura e de turismo em Ilhéus? Respostas a esta questão irão afirmar ou negar as seguintes hipóteses:
- A relação entre as políticas de cultura e de turismo em Ilhéus se dá de forma superficial, sem a articulação de um plano estratégico, pois as ações das secretarias não têm articulação entre si.
- As secretarias de cultura e de turismo de Ilhéus, além de não terem projetos em comum, sequer têm o poder de decisão e de implementação de ações que venham a alavancar esses setores, uma vez que estas áreas não são consideradas prioritárias pela administração do prefeito Jabes Ribeiro.
- Apesar da cultura aparecer no discurso do prefeito como um elemento de importância estratégica para o turismo de Ilhéus, na prática isso não se verifica.
- A secretaria de cultura, não tendo um plano consistente para o seu desenvolvimento, resume a política cultural do município à produção de eventos.
- Os principais atrativos turístico-culturais ilheenses, como áreas de visitação da cultura cacaueira, o centro histórico e os cenários que inspiraram os romances de Jorge Amado, são utilizados e mantidos inadequadamente.
O objetivo central deste trabalho é buscar uma compreensão sobre o atual estágio de desenvolvimento das políticas de turismo e de cultura na cidade, como elas operam, como se relacionam, identificando os principais agentes que estão envolvidos nesse processo. Pretende-se ainda investigar particularmente três aspectos: os projetos criados e apoiados pelos poderes públicos para o desenvolvimento dos setores cultural e turístico; o papel e a importância dos atrativos culturais para a captação de um fluxo turístico significativo para a cidade; e a eficácia dos planos estratégicos adotados pelos governantes do município e do Estado para o turismo e a cultura.
No primeiro capítulo são apresentados, sinteticamente, os aspectos históricos, econômicos, sociais, políticos e culturais que constituem a região e definem o atual contexto, no qual as políticas públicas são elaboradas e atuam. O segundo capítulo aborda como a atividade de turismo se desenvolve na cidade de Ilhéus. No terceiro capítulo são estudados a gestão e as políticas culturais dos três níveis de governo – federal, estadual e municipal. No quarto e último capítulo pretende-se analisar a interseção das áreas de cultura e de turismo na cidade de Ilhéus, projetando-se a sua possível contribuição para o desenvolvimento da região.
ILHÉUS E REGIÃO
“ Cacau tinha visgo, agarrava nos pés. Sinhô Badaró dizia sempre nas conversas de noite. João Magalhães comprou uma pensão, nada mais tinha a ver com Ilhéus, não possuía mais terras, nenhum cacaueiro, tudo que lhe restava dali era o papagaio Chico, cuja voz estrídula e acre atravessava a pensão dando ordens a inexistentes trabalhadores, cantando cantos de trabalho nas roças, chamando galinhas para comer milho, inùltilmente, gritando aquela frase do capitão João Magalhães : - Don’Ana, vamos enriquecer de nôvo… ”
JORGE AMADO, São Jorge dos Ilhéus,
Periperi, Bahia, janeiro de 1944,p.334.
ASPECTOS HISTÓRICOS
1500. Pedro Álvares Cabral « acha »[1] o Brasil e apresenta ao mundo essa nova colônia portuguesa. Entre 1534 e 1536, a Colônia é redimensionada em quatorze Capitanias Hereditárias, delegadas a pessoas de prestígio da corte portuguesa. As capitanias de Porto Seguro, São Jorge dos Ilhéus e da Baía de Todos os Santos, séculos mais tarde formarão o Estado da Bahia. As duas primeiras capitanias, talvez por serem constituídas por florestas fechadas sub-equatoriais, abrigavam grande número de indígenas selvagens, dificultando a sua ocupação e o seu desenvolvimento.
A cidade de Ilhéus foi sede da Capitania de São Jorge dos Ilhéus, doada em 1534 por D. João III a Jorge de Figueredo Correia, que a vendeu em 1560 a Lucas Giraldes, integrante de uma família de banqueiros italianos. As constantes apropriações de terras indígenas para o plantio e a construção de povoados, os muitos aprisionamentos e a excessiva exploração do trabalho indígena para a extração de madeiras de lei e do plantio da cana-de-açúcar, geraram violentas revoltas e ataques dos habitantes nativos. As rebeliões e os massacres indígenas provocaram uma grave crise no sistema produtivo, que os tinha como principal mão-de-obra, pois os proprietários de engenhos da região dispunham de poucos recursos financeiros para a compra de escravos africanos. Antônio Guerreiro de Freitas descreve este quadro, em Caminhos ao Encontro do Mundo, quando cita Pero M. de Gândavo:
“(...) em 1576: apesar do grande potencial da terra, só havia oito engenhos em funcionamento devido aos constantes conflitos com os grupos indígenas” [2].
E Gabriel Soares de Souza:
“Não há aqui mais que seis engenhos e estes não fazem açúcar nem há morador que ouse plantar canas porque em indo os escravos ou homens ao campo não escapam a estes alardes com medo dos quais foge a gente dos Ilhéus para a Bahia …” [3]
Entretanto, os índios não foram os únicos empecilhos para o desenvolvimento econômico da capitania. Segundo Freitas (2001), existem ainda três fatores importantes a serem considerados: a floresta densa e grandiosa; a inexistência de portos naturais com condição de atracação; e o fato da vila de Ilhéus ser cercada por um rio de perigosa barra, o que dificultava ainda mais a aproximação das naus ao continente.
Já no início do século XVII, a Capitania de Ilhéus entra em falência, o que provoca o despovoamento da região. Segundo Fernão Cadim, também citado por Freitas (2001), restavam em Ilhéus nessa época apenas cinquenta habitantes e a ocupação do interior não se estendia a “mais de meia até uma légua, e pela costa, de cada parte, duas ou três léguas” [4]. A Capitania em 1620, foi arrematada em hasta pública pela futura esposa do Conde de Castanheira, tendo sido a sua sede saqueada por holandeses em 1637, quando levaram além de pau-brasil e da sua produção açucareira, pertences dos moradores. Em 1669, o Governador Conde de Castelo-Melhor intervém na região, decretando a “Guerra Justa” aos índios e mandando degolar todos os resistentes. No final do século XVII, a região torna a sofrer um declínio com o deslocamento de seus colonos para a região do Rio de Contas, ao norte da Capitania, motivados pela descoberta de ouro nessa localidade.
A partir de 1753, a Capitania vira Comarca da Capitania da Baía de Todos os Santos, à qual passa a ser subordinada. A crise vivida pela colônia brasileira a partir de 1760, com a redução da produção de ouro em Minas Gerais, exigiu a busca de novas alternativas econômicas, nos anos seguintes, terminando por beneficiar Ilhéus, com algumas ações adotadas: a liberação de terras através de uma agressiva política indigenista; a criação de novos aldeamentos com o objetivo de fornecer mão-de-obra aos colonos; e o combate aos índios dos sertões.
No início do século XIX, a situação econômica de Ilhéus e de toda a região se agrava com a redução da produção agrícola, que tinha ainda como base produtos de subsistência (farinha de mandioca, café), a extração de madeira e a pesca. Mais uma vez, fica constatado o desinteresse da Metrópole por esta região, que vive num quadro de pobreza, conforme registro feito em Memória sobre a Comarca de Ilhéus, pelo ouvidor Lisboa, em 1802,
“ O ouvidor atribuía esse quadro de pobreza à falta de braços para o trabalho na agricultura e de rotas comerciais, indicando que, devido à estagnação e à marginalização econômica, os agricultores de Ilhéus não podiam ter acesso à mão-de-obra africana e que o número de índios aldeados não era suficiente para viabilizar a expansão das atividades econômica ” [5].
Após a transferência da Corte para o Rio de Janeiro, em 1808, aumenta a política de incentivos à exploração de novos espaços e produtos no Brasil. A partir deste ano acontece a abertura de novos portos, a quebra do exclusivismo colonial, e a produção brasileira, que antes era quase que totalmente exportada, volta-se para o mercado consumidor interno. Neste momento, a política de conquista de terras é fortalecida e finalmente Ilhéus entra em uma nova fase.
Em 1817, já se encontra registro do cultivo de cacau na região, além da plantação de cana e da extração de madeira. Entre 1841-1842, o papel do índio começa a se transfigurar de empecílho a aliado do crescimento. O governo estimula a criação de colônias estrangeiras através de incentivos financeiros visando especialmente efetivar aldeamentos indígenas. Antônio Gurreiro de Freitas (2001) exemplifica esta questão quando afirma que: “(…) o Orçamento da Província para os anos de 1841-1842 previa a destinação de pensão anual de ‘1: 000$000 a qualquer indivíduo nacional e estrangeiro que fundar nas margens do rio Pardo e do Jequitinhonha uma aldeia contendo mais de 20 famílias de índios selvagens’” [6]. A formação das colônias passou a ser mais comum a partir de 1850, com a regulamentação da Lei de Terras, que associa a questão fundiária ao aumento da imigração estrangeira.
A primeira colônia em Ilhéus foi criada em 1822 por Peter Weyll, atraindo a vinda de diversos alemães. Os colonos europeus são responsabilizados, por muitos historiadores e observadores, pelo início do plantio do cacau. Ilhéus, depois de séculos, começa a se estabelecer como uma das principais cidades da Bahia, destacando-se à nível nacional, como sede da civilização do cacau.
No final do século XIX, num cenário de transformação política de Império para República, e acompanhando uma nova fase de tentativa de diversificação para o desenvolvimento econômico do Brasil, a região cacaueira se afirma na Bahia como a mais promissora. Através de incentivos do governo para a atração de mão-de-obra para a zona, é constituída uma fronteira agrícola, criando-se uma imagem positiva da região.
Adonias Filho em Sul da Bahia: Chão de Cacau (Uma Civilização Regional) (1978) cita o cultivo cacaueiro como exemplo de desenvolvimento regional democrático, por ter sido iniciado por “guerreiros desbravadores das terras”, e por utilizar mão-de-obra livre, de trabalhadores assalariados, independentes, portanto, passíveis de ascensão social: “(…) é o democratismo o que realmente sobressai como o comportamento. A oportunidade para todos, que fez nascer o coronel do desbravador humilde e sem nome, permitiu que esse coronel se tornasse um agente antifeudal, antiaristocrata e antiescravocata(…)” [7].
Entretanto, Freitas (2001) tem uma visão diferente desse mesmo período. Ele ressalta os interesses manipuladores da campanha de atração de mão-de-obra,
“(…) é possível afirmar que a crença nas possibilidades de todos terem acesso aos bens ilimitados e ao enriquecimento era, na verdade, mais uma imagem ideologicamente construída e alimentada pelos segmentos dominantes do que uma realidade concreta. A manipulação deste tipo de informação também envolvia os setores governamentais e estava mais associada aos interesses dos grandes proprietários rurais do que dos imigrantes (…) ” [8].
De todo modo, o que se conclui é que, naquele momento em que a lavoura cacaueira ainda não estava estruturada, a possibilidade de conquista e de aquisição de terras era maior. Quem tinha coragem e garra de enfrentar as intempéries da floresta, os ataques de índios e as doenças, garantia o seu pedaço de chão. No entanto, depois das terras conquistadas, outros problemas surgiam e apenas quem tivesse influência e dinheiro para superar a longa espera da primeira colheita - de quatro à oito anos – conseguia se firmar.
Pode-se observar, que o governo central da província continuava sem considerar a região de Ilhéus como prioritária para os seus investimentos. O cacau, até 1860, era uma espécie restritamente cultivada em áreas de umidade excessiva, como os vales dos rios. Neste ano são introduzidas na região espécies cacaueiras mais resistentes, que possibilitaram a expansão do cultivo para outras áreas. A partir deste período, o cacau se consolida como produto de exportação, a região passa a ter um regime de produção comercial com a monocultura do cacau e o apoio da mão-de-obra de imigrantes estrangeiros, baianos e sergipanos.
É importante destacar os aspectos geográficos e climáticos, fundamentais para que este fruto se desenvolvesse tão bem nessa região, como explicita o geógrafo Milton Santos:
“ O cacau é fruto que possui uma ecologia vegetal das mais exigentes, daí explica-se a sua preferência e adaptação nas terras do sul da Bahia, onde as suas necessidades são todas supridas. Gostando de umidade, tanto do ar, quanto do solo, ambos requisitos são aí satisfeitos, pela abundância das chuvas, presentes durante todo o ano e alcançando aproximadamente dois metros anuais, com cerca de 202 dias chuvosos” [9].
Para o historiador Antônio Guerreiro de Freitas (2001), o período de implantação do cacau vai de 1890 a 1920 e provoca rápidas mudanças ecológicas e econômicas na região, com grandes desmatamentos, plantações extensivas do cacau e uma grande absorção de imigrantes. Assim a região cacaueira vai costruindo a sua identidade.
REGIÃO CACAUEIRA
Estudiosos identificam que a delimitação da região cacaueira não se dá apenas por aspectos geográficos, históricos ou antropológicos, mas também pela cultura do cacau que chega para reconfigurar além da economia, as relações sociais, políticas e culturais, injetando dinheiro, mão-de-obra e pessoas de diversas partes do mundo neste espaço da Bahia. Para Milton Santos, por exemplo, “O cacau é, como produção agrícola, o responsável por inúmeros dos traços da fisionomia do seu ‘habitat’, tanto no aspecto econômico, como no social, e até mesmo, no psico-social” [10].
Antes de traçarmos os limites da região, vale considerar o que observa Francisco de Oliveira em Eligia para uma Re(li)gião[11], de que só é possível identificar determinada região através de um quadro de referências que inclua outras ‘regiões’.
Em 1957, o geógrafo Milton Santos em Zona do Cacau, identifica desta maneira a região cacaueira:
“Assim podemos considerar como da zona cacaueira os municípios de Alcobaça, Belmonte, Boa Nova, Canavieiras, Caravelas, Coaraci, Ibicaraí, Ilhéus, Ipiaú, Itabuna, Itacaré, Itajuípe, Ituberá, Jequié, Maraú, Nilo Peçanha, Mucuri, Porto Seguro, Prado, Santa Cruz Cabrália, Ubaitaba, Ubatã, Una e Uruçuca. Da classificação oficial retiramos o município de Cairú, que nada produz e os de Valença e Taperoá, de produção menor que 25 mil arrôbas” [12].
Segundo o próprio geógrafo, na classificação oficial de 1955, constam apenas as cidades sublinhadas mais Camamu e Ibicaraí. Se formos analisar esta listagem atualmente, perceberemos que algumas cidades como Porto Seguro e Jequié fazem parte de outras regiões, pois se organizaram de formas distintas econômica, política e socialmente, uma através do turismo e outra pelas indústrias têxteis e a criação de gado. Além disso, novos municípios foram criados nesse meio século.
A classificação da região hoje, segundo o Governo do Estado (Superintendência de Estatísticas e Informações), é Região Litoral Sul, com os seguintes municípios: Aiquara, Almadina, Apuarema, Arataca, Aurelino Leal, Barra do Rocha, Barro Preto, Buerarema, Cairu, Camacan, Camamu, Canavieiras, Coaraci, Dário Meira, Floresta Azul, Gandu, Gongogi, Ibicaraí, Ibirapitanga, Ibirataia, Igrapiúna, Ilhéus, Ipiaú, Itabuna, Itacaré, Itagi, Itagibá, Itaju do Colônia, Itajuípe, Itamari, Itapé, Itapitanga, Ituberá, Jitaúna, Jussari, Maraú, Mascote, Nilo Peçanha, Nova Ibiá, Pau Brasil, Piraí do Norte, Presidente Tancredo Neves, Santa Cruz da Vitória, Santa Luzia, São José da Vitória, Taperoá, Teolândia, Ubaitaba, Ubatã, Una, Uruçuca, Valença e Wenceslau Guimarães. Como se observa nos mapas abaixo, nem todos os municípios localizados na Litoral Sul fazem parte da região geoeconômica regida pela cacauicultura.
Não é por acaso que a composição da região cacaueira identificada por Milton Santos em 1955 sofre alterações na atual reconfiguração das regiões econômicas do Estado da Bahia, que distribui as cidades citadas pelo geógrafo em três regiões: a Litoral Sul, o Extremo Sul e o Sudoeste. A Bahia está hoje subdividida em quinze regiões econômicas, como mostra o mapa a seguir:
[pic]
Fonte: sei..br
Francisco de Oliveira explica dessa forma, o processo de formação das regiões:
“O que preside o processo de constituição das ‘regiões’ é o modo de produção capitalista, e dentro dele, as ‘regiões’ são apenas espaços sócios-econômicos onde uma das formas do capital se sobrepõe às demais, homogeneizando a ‘região’ exatamente pela sua predominância e pela conseqüente constituição de classes sociais cuja hierarquia e poder são determinados pelo lugar e forma em que são personas do capital e de sua contradição básica” [13].
A partir da sua compreensão sobre a formação de uma região, o economista considera que a Bahia não deveria fazer parte da região Nordeste, pois embora ali predominasse inicialmente o mesmo modo de produção do Nordeste, a cana-de-açúcar, a classe social proprietária não detinha os mesmos poderes dos outros estados que compõem a região. Enquanto naqueles as grandes famílias senhoriais, o ‘baronato’ do açúcar (como o autor chama), tinham o controle do espaço em sua totalidade, na Bahia não existia essa relação de dominação .
ASPECTOS ECONÔMICOS
Quando o cacau surge como força produtiva e econômica, tudo passa a girar em torno dele. A região volta-se para a monocultura cacaueira, investindo-se cada centavo nas amêndoas do cacau. A partir de 1904, o cacau é o principal produto de exportação da Bahia, posição que manteve até os anos setenta do século XX.
As exportações cacaueiras cresceram ano após ano, contribuindo fundamentalmente para a receita estadual. Em 1957, Milton Santos afirma que a zona cacaueira da Bahia foi responsável por cerca de 95% da produção total de cacau do país, chegando a alcançar o 2° lugar na estatística mundial. As cidades de Ilhéus e Itabuna eram os destaques da região, responsáveis, cada uma, por mais de 400 mil sacos de 60kg de cacau. O geógrafo destaca o ápice do cacau na Bahia entre os anos de 1938 e 1955, merecendo destaque os anos de 1943 e 1954, quando as exportações atingiram 2.893.468 e 2.637.459 sacos de 60kg, respectivamente (dados do Departamento Estadual de Estatística da Bahia)[14].
O cacau chegou a ser responsável por mais de 50% das arrecadações estaduais, como destaca Milton Santos
“Tem o cacau, na economia do Estado, um papel de relevo, já que de sua cultura, direta ou indiretamente, beneficia-se o erário com muito mais de metade do seu orçamento, constituindo, por si só, o sustentáculo de sua vida econômica. As crises que o abalam – crises, aliás, muito comuns aos produtos primários – não se limitam à zona produtora, mas se refletem, indelevelmente, em todo o Estado da Bahia, cujas finanças também se regozijam com os seus períodos de bonança” [15].
Apesar da importância econômica da região para o governo estadual, alguns autores consideram que este nunca se determinou a criar uma infraestrutura equiparada à sua arrecadação, limitando-se a realizar ações isoladas como em 1931, com a criação do Instituto do Cacau da Bahia. Por sua vez, o Governo Federal, em 1957, implanta a Ceplac ( Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira) na região. O historiador Antônio Guerreiro de Freitas, em uma posição divergente, ressalta a importância dessas ações, avaliando que, das regiões da Bahia, essa foi objeto de intervenções mais sistemáticas do Estado, como a criação destes dois órgãos supracitados: “Nenhuma outra região baiana teve formas tão bem acabadas de intervenções, organismos regionais voltados para o estímulo da produção, para a questão tecnológica, para a questão dos meios de transportes, das vias de comunicação, como tem na região do cacau” [16].
Ainda que as ações do governo tenham priorizado a região cacaueira, como destaca o historiador, não se pode deixar de considerar que, ao longo dos anos, questões fundamentais como as dragagens periódicas da barra do rio, que dava acesso ao porto responsável pelo escoamento de todo o cacau, nunca eram feitas, o que aliás foi objeto de diálogo dos personagens de Jorge Amado em Gabriela, Cravo e Canela, escrito em 1958, quando menciona a falta de dragagem da barra e de reinvestimento na região dos lucros alcançados com as exportações do cacau:
“A conversa foi interrompida por apitos repetidos, breves e aflitos do navio. Houve um movimento de expectativa na ponte. Até os carregadores param para escutar.
- Encalhou!
- Porcaria de barra!
- Continuando assim nem navio da Bahiana vai poder entrar
no porto.
- Quanto mais da Costeira e do Lloyd.
Barra difícil e perigosa, aquela de Ilhéus, apertada entre o morro do Unhão, na cidade, e o morro de Pernambuco, numa ilha ao lado do Pontal. Canal estreito e pouco profundo, de areia movendo-se continuamente, a cada maré (….)
- Isso é revoltante – dizia o Doutor enquanto o grupo caminhava pela rua sem calçamento, contornando o morro. – Ilhéus produz uma grande parte do cacau que se consome no mundo, tem um porto de primeira, e, no entanto, a renda da exportação do cacau fica é na cidade da Bahia (…)” [17].
Os dois grandes investimentos dos governos estadual e federal na região, Instituto do Cacau da Bahia (ICB) e a Ceplac, respectivamente, têm as suas atuações severamente criticadas por diversos intelectuais e estudiosos da região. Apesar do Instituto do Cacau da Bahia ter sido criado em 1931, com o objetivo de amparar e defender a economia cacaueira, sob a forma de Sociedade Cooperativa e custeada pelos produtores de cacau, já em 1941 passou a não ser mais administrada pelos cacauicultores. José Fialho Costa reflete em Conjuntura Cacaueira do Sul da Bahia que o ICB, “(…) só trouxe sofridos e pesados prejuízos para a lavoura cacaueira, até o seu fim e, muito particularmente para o cooperativismo da região cacaueira da Bahia” [18]. O autor ressalta que o Instituto foi constantemente extorquido por seus administradores, que eram sempre indicados politicamente para o cargo. Essa situação é ratificada pelo tabelião e importante personalidade da cidade de Ilhéus, Sá Barreto, em entrevista a Freitas[19], quando afirma que o Instituto no início funcionou e que até a sua família foi beneficiada com obtenção de empréstimo, mas depois, apenas poucos, os coordenadores e apadrinhados, foram beneficiados. Ele ainda vai mais longe, revelando que o mesmo acontecia na Comissão Executiva da Ceplac, que proporcionava uma vida de luxo aos que dela participavam.
O historiador Antônio Guerreiro de Freitas observa que as cooperativas agrícolas não se desenvolveram bem na região cacaueira, nem na Bahia, atribuindo o seu fracasso ao individualismo das pessoas e às suas dificuldades de renunciar e de assumir um projeto coletivo. Segundo Freitas
“Ao invés de ter uma associação onde o princípio e o fim fosse a reunião de pessoas para atingir determinada meta, determinado objetivo, as pessoas vão se reunir (…) para tirarem vantagens, e assim, os sócios iam ficando pelo caminho. As taxas tiradas para gerenciamento, para gestão em geral, eram uma fortuna, terminavam por inviabilizar as cooperativas” [20].
A Ceplac é ainda mais criticada que o ICB, talvez por causa de sua dimensão nacional e de seus recursos internacionais. Freitas relaciona o fato da Ceplac ter sido muito criticada pelos cacauicultores à existência de uma taxa de retenção, que segundo ele se prestava, ou tinha a intenção de criar uma infraestrutura para a região através de organismos de desenvolvimento e pesquisa regionais, não tendo alcançado esse objetivo. Segundo o historiador, a Ceplac desenvolveu um diagnóstico e um estudo valioso sobre a região, mas ela não conseguiu fugir da cultura regional de visão de mundo, de gastos e de desperdícios: “(…) uma cultura extremamente individualista, pragmática, exclusivista, capitalista. As pessoas ao mesmo tempo que aspiravam intervenções, ações do Estado, viam isso com desconfiança, e muitas delas só queriam tirar vantagens” [21]. O sociólogo ilheense Milton Moura é mais radical na sua compreensão sobre a ação da Ceplac: “foi a grande mentira da história da região, por conta de enriquecer ainda mais os mais abastados, não dando acesso aos que realmente precisavam do seu apoio e orientação”[22]. Sá Barreto tem opinião semelhante quando afirma que: “a Ceplac não trouxe nada de louvável, tem lugares que o cacau híbrido dá um fruto enorme, mas com poucas amêndoas”[23]. Entretanto, quanto à taxa de retenção de 10%, Barreto discorda de Freitas, quando diz que os cacauicultores a aprovaram no momento em que esta foi transferida para a administração da Ceplac, pois, possibilitaria criar uma infraestrutura na região, como a criação da Universidade, a ponte Ilhéus-Pontal, e auxiliar na construção do porto. Sá Barreto considera importante a existência desta taxa:“(…) nós passamos a ter um governo paralelo que nos dava algum suporte contra o governo do Estado e o próprio governo federal (…)” [24]. Segundo o tabelião ilheense esta taxa foi remetida para a união na gestão de Delfim Neto à frente do Ministério da Fazenda, ocasionando o fim do órgão.
Por sua vez, o descendente da elite regional, Antônio Lavigne, também tabelião e fazendeiro, avalia que foi nefasta a criação da Ceplac e das taxas para a infraestrutura da região, pois a sua aplicação só foi bem efetuada na construção da universidade:
“A Ceplac é a própria praga da região. Ela foi criada em uma época de crise do cacau (…) Um bando de gente inútil que veio de fora para aqui, metido a ser elite em uma região onde não fez nada! (…) Gastaram muito dinheiro fora, pegaram o dinheiro daqui levaram todo para fora. A única coisa que investiram bem foi na universidade, a UESC, construíram com o dinheiro do cacau. Jogaram dinheiro fora no Porto, fizeram um porto sem seguir o projeto e está ai sendo dragado pela segunda vez. Seis milhões de reais para dragar. Na época o engenheiro do porto era Alfredo Cabutinho. Ele e sua equipe desviaram o dinheiro e viraram fazendeiro de cacau. O calado do porto atualmente é de 6, 7 metros! Tem navios que para entrar tem de esperar a maré encher!” [25]
O porto de Ilhéus, segundo Lavigne, nos projetos de Juscelino Kubitschek, ia ser o porto de Brasília, porque Ilhéus encontra-se no meio exato da costa brasileira, sendo o porto mais próximo da capital do país. Uma estrada de ferro ligaria Ilhéus a Brasília.
O fato é que a derrocada cacaueira aconteceu paulatinamente com as sucessivas crises, decorrentes de problemas climáticos, de quedas vertiginosas da cotação do cacau nas bolsas de Londres e de Nova York, do surgimento de outros mercados produtores no cenário mundial, culminando com o aparecimento da vassoura-de-bruxa, na década de 90, uma praga que quase exterminou a lavoura cacaueira e empobreceu de vez a região. Segundo dados do IBGE[26], o cacau em 16 anos caiu do primeiro para o quinto lugar no ranking dos principais produtos agrícolas, segundo o valor bruto da produção da Bahia. Enquanto em 1985, o cacau liderava as exportações do Estado e era responsável por 36,2% das exportações, em 2001 ele ocupa o quinto lugar, com uma participação de apenas 7,5%.
Diante dessa grave crise, que já dura mais de 13 anos, a cidade não consegue retomar o seu desenvolvimento, mesmo com a atuação da universidade, com a implementação do pólo de informática e do tímido marketing turístico. Nos últimos anos, de grave depressão econômica, ocorreram vários suicídios e um aumento expressivo da utilização de drogas pelos jovens ilheenses. Entretanto, todos continuam a acreditar que esta crise passe e que tudo seja salvo pelo cacau, novamente. Para o sociólogo Milton Moura, “O mundo do cacau já acabou faz tempo! Ninguém vende as roças porque hoje seriam muito baratas, e depois, para retomar a cacauicultura com a produção de um cacau resistente, tem que ver como o comércio das amêndoas está estruturado no mundo” [27]. Ainda segundo o sociólogo, com a clonagem, em dois anos se concluirá o mapeamento do genoma do cacau, e poderá ser conhecida a vunerabilidade do cacau, as razões do seu rápido florescimento, frutificação e morte. Enquanto este momento não chega, a sociedade regional se dedica à clonagem das plantações e às novas alternativas para o desenvolvimento econômico da região, como o pólo de informática, as novas indústrias e o turismo, com uma timidez que demostra uma grande dúvida quanto à escolha do caminho a seguir.
ASPECTOS SOCIAIS
Para se falar da configuração social da cidade de Ilhéus, é necessário retornar à Capitania de São Jorge dos Ilhéus. Esta foi formada inicialmente por indígenas e colonos portugueses. Mais tarde, o cultivo da cana-de-açúcar, atraiu alguns escravos para a região. A presença de africanos é comprovada por vários pesquisadores segundo comenta o sociólogo, Milton Moura, “Maryann Marrone, uma das grandes historiadoras do cacau hoje, detectou cemitério de escravos no rio Almada, e não era escondido, só que não em número tão expressivo como em toda zona da mata, e na região de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais” [28]. Para compreender a dinâmica social original da cidade, Freitas cita Spix e Martius:
“(…) atribuíam o atraso da vila à indolência, miséria, falta de educação e conformismo dos seus moradores, o que explicavam pela suposta ascendência indígena e de portugueses ‘da mais baixa extração’: marinheiros, carregadores e lavradores, todos eles aborrecidos do trabalho” [29].
Esta constituição original vai ser alterada muito mais tarde, com a iniciativa da província de atrair imigrantes para a formação de colônias estrangeiras e para a implementação de aldeamentos indígenas, através de incentivos financeiros e de liberação de terras, inicia-se a fase dos desbravadores de terras. Essas pessoas eram migrantes do sertão da Bahia e de Sergipe, que foram incentivados pelo governo a abrir a mata, expulsar os índios e plantar o cacau em terras, que conquistadas seriam suas. Adonias Filho[30] reflete claramente sobre este momento, afirmando que o próprio desbravador é quem vai atrás das suas terras, ele será o dono da propriedade cacaueira, sem nenhum intermediário. Depois deste movimento de abertura de terras e da plantação do cacau, não demora muito para que a região se desenvolva em uma nova dinâmica. De 1890 a 1930, o aumento demográfico é significativo. Forma-se também uma rede de profissionais (fiscais, funcionários públicos, comerciantes) em torno da cacauicultura, devido ao progresso crescente da exportação cacaueira.
A concentração da quantidade de terras é neste momento de fundamental importância para os fazendeiros, que lutavam entre si por mais um área para as suas plantações, garantindo a supremacia dos recém tornados coronéis do cacau, que já não mais habitavam as roças, mas a cidade. As informações dos pesquisadores são antagônicas, quanto à relação de conflitos na região. Enquanto Freitas[31] analisa que houve luta homem a homem e mais tarde a criação de vigilâncias armadas dos coronéis e de suas propriedades através de violentos jagunços, Adonias Filho[32] considera que não existiu este tipo de conflito na região e que os coronéis participavam de um sistema democrático cuja lei era a justiça, e seu braço direito, ilustres advogados. Este último justifica, sem muita consistência, a sua argumentação:“ As grandes lutas que se verificaram não foram motivadas pelo cacau, por ‘questões de terra’. O sistema judiciário, que sempre funcionou de fato, também se mostrava como mais um obstáculo sério para a guerra armada e a ocupação da terra pela violência” [33]. A verdade é que os historiadores falam de caxixes (nome emprestado de um macaquinho que rói o cacau, deixando o fruto bom por fora e por dentro vazio), mostrando que os coronéis na região faziam a sua própria lei com o uso de trapaças, artimanhas e negociatas. Sá Barreto, testemunha que no passado existiam muitos caxixes, tendo tido a oportunidade de assistir a julgamentos de crime de mando por disputa de terra. O tabelião ainda se lembra, na entrevista concedida a Freitas[34], dos nomes dos jagunços mais perigosos da região. Jorge Amado também destaca o problema da ‘injustiça’ regional em São Jorge dos Ilhéus: “Houve um tempo em que os coronéis eram donos da justiça. Condenavam e absorviam à vontade” [35]. O próprio romancista foi testemunha ocular de muitos crimes nas praças de Ilhéus, segundo registra Freitas em Caminhos ao Encontro do Mundo[36].
No início do século XX, quando a região se torna uma importante fronteira agrícola, além dela atrair pessoas de várias partes do Nordeste do país – em especial de Sergipe e de Alagoas –, se registra a chegada de imigrantes de nacionalidades européias e mais tarde do mundo árabe – turco, libanês e sírio – que vêm motivados pela oportunidade de atuar no comércio local, o que veio complementar a rede comercial necessária ao desenvolvimento da região. Entretanto, a maior parte da mão-de-obra imigrante não consegue um emprego fixo, já que a cultura cacaueira é baseada em temporões: fase de colheita, quebra do cacau, secagem das amêndoas e ensaque, seguida por limpeza das roças para o preparo do próximo temporão. Freitas assim descreve a precária situação dos imigrantes na região: “ (…) eram precárias as condições em que subsistia a força do trabalho, tanto no campo, quanto na cidade, submetida a toda forma de exploração, enfrentando duras condições para sua sobrevivência e da sua família” [37].
A estrutura residencial e os hábitos alimentares, até mesmo dos mais abastados, eram muito simples. Os patrões se ausentavam freqüentemente, por essa razão as casas sedes das fazendas não tinham nenhum luxo, servindo apenas para acomodar a família, que as visitavam cada vez mais esporadicamente. A região não produzia produtos de necessidades básicas em quantidade suficiente para toda a população, já que o centro das atenções era a plantação cacaueira. Portanto, tudo era importado e os valores das mercadorias eram altíssimos. Mais tarde, esse quadro começa a se modificar, pois com o aumento dos negócios os fazendeiros buscam melhorar a sua qualidade de vida, tanto na moradia quanto na alimentação. Freitas[38] constata, a partir de consulta à pauta de importação do porto de Ilhéus, que depois de 1926 se percebe um aumento de consumo de gêneros alimentícios como bacalhau e charque. Nesse momento, se constitui um sistema perverso de distribuição de produtos alimentícios. Os fazendeiros tinham em sua fazenda um barracão para a venda de produtos com preços superfaturados; como muitas vezes os trabalhadores não dispunham de outra forma para adquirir os seus alimentos, estes ‘colocavam na conta’ tudo o que precisavam, e no final do mês, muitas vezes, ficavam a dever ao coronel, se tornando ‘servo do senhor’, trabalhando por alimentação e ainda com altas dívidas para serem quitadas, estabelecendo-se e estreitando-se o que Freitas[39] chama de laços de dependência do empregado com o patrão.
A burguesia cacaueira se forma através da aproximação de duas classes - dos grandes fazendeiros e dos comerciantes exportadores - que em um dado momento começam a se fundir, por interesses convergentes, formando um único grupo. Os fazendeiros iniciam parcerias com os exportadores e estes buscam a aquisição de terras, através de empréstimos concedidos aos pequenos e médios produtores a juros altos, tendo a fazenda como hipoteca. Na maioria dos casos esses fazendeiros perderam as terras devido a uma série de intempéries do início de uma grave crise cacaueira, por volta de 1930. Adonias Filho em Sul da Bahia: Chão de Cacau relaciona claramente os fatores geradores desta crise: substituição das lideranças políticas e administrativas dos coronéis para profissionais liberais, a crise econômica mundial de 1929, o cansaço e o esgotamento do solo, a falta de assistência técnica, a ausência de assistência financeira, o sistema bancário deficiente e ultrapassado, o aumento e a flutuação dos preços internacionais. Jorge Amado em São Jorge dos Ilhéus, também retrata esse período,
“ Pequenos exportadores levavam o diabo quando grandes coronéis rompiam contratos de vendas de cacau, num caxixe bem feito, e os deixavam subitamente às voltas com a miséria. Êles não tinham raízes ali, haviam chegado depois que as árvores do cacau, plantadas sôbre sangue, tinham crescido e davam frutos de ouro. Eram adventícios, sem raízes na terra negra e fecunda. Carlos Zude sentia que era essencial possuir as terras. Só elas lhes dariam carta de cidadania na zona cacaueira, só elas poderiam ser garantia suficiente para os seus negócios” [40].
O enriquecimento rápido fez surgir um novo comportamento na elite da região registrando-se um consumo excessivo de supérfluos e a exposição vaidosa de riquezas pessoais. Assim foram valorizados: moda, alta-costura, banquetes com menu em francês, objetos pessoais e residenciais caríssimos que nem mesmo sabiam como utilizá-los, a exemplo dos inúmeros pianos de calda, que serviam normalmente de móvel de decoração nas mansões dos grandes coronéis.
Essa valorização do glamour levou a elite social e política da região cacaueira - os coronéis e suas famílias - a almejar residir em metrópoles e cidades mais desenvolvidas, proporcionando uma realidade mais ‘promissora’ para os seus descendentes, onde se pudesse ter acesso a uma formação. Diante disso, as famílias enviam inicialmente os seus filhos homens para as metrópoles, em seguida as filhas e as esposas e, por fim, o próprio coronel sai da região, deixando administradores, jagunços e capatazes para gerir os seus negócios. Através da transferência das principais famílias da zona cacaueira, em 1950, para cidades como Salvador e Rio de Janeiro, os seus recursos financeiros consecutivamente passaram a ser aplicados nestas metrópoles, empobrecendo a região socio-politico-cultural-economicamente. Poucos coronéis investiam na região e nas suas cidades. Coronel Misael Tavares, considerado o Rei do Cacau foi um caso excepcional em Ilhéus, pois se associou a diversas pessoas e empresas para criar os principais empreendimentos da região: a primeira indústria de cacau do Brasil, com Hugo Kaufmann; a empresa de água, com Gonçalves e Da Rin; o Porto, a Companhia Industrial, e o início da estrada de ferro, com Bento Berilo; liderou a construção da Catedral de São Sebastião e construiu o primeiro prédio com elevador do Nordeste para o Ilhéus Hotel, que funciona até hoje. Além destes empreendimentos, o Coronel Misael era proprietário de vários imóveis, incluindo um grande palacete, na cidade de Ilhéus.
A ausência dos grandes cacauicultores e de investimento dos seus recursos na região se tornou obstáculo para o seu desenvolvimento econômico e deixou lacunas na esfera política e administrativa e tornou-se portanto, necessária a busca de novos investidores e de lideranças políticas, o que ficou a cargo de profissionais liberais e de pessoas vindas de outras cidades. Ao ser observado o montante de recurso financeiro que circulava na região nos tempos áureos do cacau, pode-se responsabilizar também os fazendeiros pela falta de desenvolvimento da região cacaueira, que pouco contribuíram para modificar e modernizar as cidades, abandonando a região que os alimentava.
Antônio Guerreiro de Freitas[41], para exemplificar o poder e a riqueza que a sociedade cacaueira tinha, conta um fato em que foi envolvido pessoalmente, ainda menino e estudante de um colégio de padres muito conceituado em Salvador, o Antônio Vieira. Observava, naquela ocasião, que os meninos da região cacaueira chegavam sempre de avião, transporte que nunca era utilizado por crianças de outras cidades do interior da Bahia, com malas enormes, cheios de ternos e gravatas, com novidades que ainda não haviam chegado em Salvador, e mais ainda, com uma visão de mundo e uma mentalidade completamente diferentes. Isso decorria do fato de que, naquela época, os navios atracavam primeiramente na região do cacau, carregados de diversas novidades, para depois virem para a capital. Esta observação ilustra a definição de identidade regional de Pierre Bourdieu em O Poder Simbólico, segundo o qual se percebe as características de um determinado lugar através da linguagem, de comportamentos ou objetos específicos valorizados por seus habitantes:
“ (…) a procura dos critérios ‘objectivos’ de identidade ‘regional’ ou ‘étnica’ não deve fazer esquecer que, na prática social, estes critérios (por exemplo, a língua, o dialecto ou o sotaque) são objectos de representações mentais, quer dizer, de actos de percepção e de apreciação, de conhecimento e de reconhecimento em que os agentes investem os seus interesses e os seus pressupostos, e de representações objectais, em coisas (emblemas, bandeiras, insígnias, etc.) ou em actos, estratégias interessadas de manipulação simbólica que têm em vista determinar a representação mental que os outros podem ter destas propriedades e dos seus portadores” [42].
Até hoje permanecem os traços da elite cacaueira na região, como o seu orgulho que resistiu a todos os golpes. Mesmo com possibilidades de mudanças da crítica situação pessoal, através de financiamentos disponibilizados pelo governo federal, nem todas as famílias investiram nas roças de cacau, muitas delas compraram carros novos e fizeram viagens, utilizando esse dinheiro para manter o padrão de vida.
ASPECTOS POLÍTICOS
A falta de articulação e de representatividade política da zona cacaueira, motivada pelo individualismo de cada componente, que nutria como único objetivo o aumento do seu lucro pessoal, é apontada unanimemente pelos estudiosos da região como a principal causa da falta de apoio dos Governos Estadual e Federal à região. Milton Moura atribui a desarticulação política da região principalmente ao fato de que boa parte das lideranças políticas, econômicas e culturais vieram de fora, o que provavelmente não ofereceu condições para se criar uma espécie de cultura política do cacau. O sociólogo considera que, foi curto o tempo do apogeu do cacau para se consolidar uma cultura política: “Ilhéus não teve tempo de se constituir politicamente. O que são 40 anos?” [43]. O historiador Antônio Guerreiro de Freitas concorda com Moura, quando afirma que ao longo da história da região, e inclusive atualmente, “as lideranças políticas forjadas e consolidadas na região, boa parte delas não são grapiúnas (termo dado a civilização do cacau), são pessoas que se aproveitaram de circunstâncias favoráveis para se impor, para organizar politicamente partidos” [44]. Um exemplo disso foi o grande chefe político da região, Coronel Antônio Pessoa, que era de Vitória da Conquista.
Para se discutir essa questão da falta de representatividade política é necessário resgatar a discussão anterior, onde se percebe que os “limites” para a articulação política foram dados pela própria civilização cacaueira, que criou um ‘modo de vida’ individualista, ‘escravo’ da terra e dos seus frutos de ouro, onde era impensável se abrir mão de conquistas pessoais em nome do desenvolvimento regional. Os coronéis indicavam os seus protegidos para assumirem cargos da administração das cidades e para a política. Por outro lado, Ilhéus, cuja população sempre esteve conectada aos novos costumes e novas visões de mundo, foi um dos primeiros lugares a ter representantes do Partido Comunista Brasileiro e da Ação Integralista Brasileira (fascismo) por motivações antagônicas: os primeiros pela luta dos trabalhadores explorados (lavradores, estivadores) e os integralistas pela defesa da classe proprietária de terras e, principalmente, dos comerciantes exportadores, que em sua maioria eram imigrantes de outros países.
Diversas associações de classe começam a surgir na região, motivadas pela defesa dos seus direitos, como a União dos Carregadores de Ilhéus, a Associação dos Empregados no Comércio de Ilhéus, e a Sociedade Protetora dos Artistas e Operários de Ilhéus. Os estivadores, por exemplo, tinham um grande poder de negociação, uma vez que a paralisação de suas atividades poderia comprometer a qualidade e até a possibilidade de exportação das amêndoas, já que estas não podem ficar armazenadas por muito tempo no período de chuva.
A elite cacaueira, formada pelos grandes empresários da produção agrícola e do meio comercial, além de ter o poder de controle no interior da região, tenta exercer uma maior influência externa, buscando ter acesso ao centro de decisões, e em algum momento teve como objetivo ser a classe hegemônica estadual, o que nunca se concretizou, como afirma Antônio Guerreiro de Freitas, em Caminhos ao Encontro do Mundo[45]. O abandono da região, iniciado nos anos 50, e a luta separatista são dois movimentos que exprimem a insatisfação da elite com os resultados obtidos na região: o primeiro, motivado pela dificuldade em se inserir nos centros dos poderes estaduais e nacionais e o segundo por não se obter dos governos Estadual e Federal a atenção necessária para essa região que trouxe tantas divisas para o país.
O movimento separatista, que tinha como objetivo a criação do Estado de Santa Cruz, desligando a região do Estado da Bahia, aconteceu em dois momentos, como identifica o historiador Antônio Guerreiro de Freitas, “o sentimento separatista brota originalmente nos anos 1930 e 40, quando a região está no seu auge, no seu apogeu. (…) a elite não suporta mais rivalizar com Salvador e com o Estado da Bahia. Eles querem autonomia política” [46]. O segundo, em 1988, um projeto liderado por Fernando Gomes, quando a região já está em crise, em decadência. O primeiro contava com a representatividade legítima da região e o segundo expressava o desejo de uma parte inexpressiva da população e tinha como único objetivo, a oportunidade política do seu líder.
ASPECTOS CULTURAIS
A identidade regional cacaueira é formatada da segunda metade do século XIX até o século XX, a partir da monocultura cacaueira que cria, diante das necessidades de produção e das oportunidades geradas por ela própria, uma nova forma de relação do homem com o seu meio e dos homens entre si. Como vimos anteriormente, o enorme fluxo migratório que é atraído para a região, marca definitivamente a constituição da civilização cacaueira, como observa Freitas, “ O ser grapiúna é resultante de uma grande mistura. O ser grapiúna é uma síntese. É uma miscelânea realmente! E que é característica da fronteira agrícola, um lugar de rápida ocupação e exploração para onde corre todo mundo e ali se misturam” [47]. Segundo o historiador, essa população conseguiu sintetizar várias marcas fortes: uma expressão extremamente indígena, como a festa de São Sebastião; a presença forte do dendê baiano na culinária, aliás uma árvore que é utilizada para sombrear o cacau; a presença árabe na culinária, no falar, em práticas culturais de família; e ainda as marcas do sertão e do Nordeste. Para o sociólogo Milton Moura, a identidade cultural de Ilhéus é marcada pela literatura de Jorge Amado, sobretudo pelos personagens Gabriela e Nacib - um mundo da tropicalidade feliz. “Em Ilhéus, as pessoas estão felizes com o coqueiro, com a cordialidade”[48], comenta o sociólogo. Enquanto o historiador enfatiza a constituição social da região como formatadora da sua identidade, o sociólogo a identifica como resultante de um trabalho da mídia massiva, que através da obra de Jorge Amado afirmou-se no mundo com as suas personagens, histórias e sua forma de vida.
Os pesquisadores da história e da cultura regionais reconhecem unanimemente o legado cultural deixado pelos escritores e romancistas, Jorge Amado e Adonias Filho. O principal motivo deste reconhecimento é a revelação da região, dos seus sucessos e conflitos para o mundo. Freitas analisa, “Jorge Amado valoriza esses personagens regionais que são recorrentes na obra dele, são extremamente fortes, e acho que são verdadeiros. (…) Aqui ou acolá ele deve ter cometido algum exagero, mas é aquilo mesmo. (…) aquilo é a cara da região” [49]. Maria de Lourdes Netto Simões, no artigo, A Ficção da Região Cacaueira baiana: a questão identitária, contribui com esta discussão quando analisa que a literatura influenciou a identidade cultural da região do cacau, assim como foi por ela influenciada:“(…) o entendimento da literatura (…) é o de expressão artística comunicadora, inclusive influenciada e influenciadora da História”[50]. É interessante a análise feita pela professora do Departamento de Letras da UESC, da expressiva influência das mudanças econômicas na produção literária da região: “Até bem pouco tempo, quando eu escrevia sobre a Literatura desta Região referia-me a ela como sendo a Literatura da Região do Cacau ou a Literatura do Cacau. Hoje, não tão à vontade, pergunto-me se posso utilizar tais expressões diante do perfil sociocultural que vem assumindo esta região e dos caminhos temáticos que tal literatura tomou”[51]. Para Maria de Lourdes, inicialmente a literatura regional relatou o apogeu do cacau, a riqueza, os coronéis, posteriormente se sofisticou linguisticamente e com a derrocada cacaueira voltou o seu olhar para a releitura da saga do cacau, sob a perspectiva dos menos favorecidos, assim como fez Jorge Amado em Tocaia Grande.
É interessante ressaltar a observação de Freitas, que afirma que a identidade regional é antagônica à do Estado da Bahia: “ O desejo de ‘rejeitar’ ou de se ‘distanciar’ da Bahia, na busca da construção de uma identidade diferenciada do próprio Estado (…) terminou por provocar um distanciamento da burguesia cacaueira da sua base econômica (…)” [52]. A transferência das suas residências da região para o Rio de Janeiro, São Paulo ou até mesmo para outros países é resultante desse movimento. Milton Moura[53] observa que essa disputa com Salvador é intensificada pela presença da Petrobras na região cacaueira, que fazia com que o município de Ilhéus arrecadasse uma renda maior que outros municípios, inclusive Salvador. Para o sociólogo, ao se identificar com o Rio de Janeiro a região estava se identificando com a capital do Brasil, uma bela cidade que representava a modernização, enquanto Salvador era associada ao passado e a símbolos que a sociedade ilheense quer esquecer, como os traços da cultura escravagista.
Vale ressaltar que embora possa se encontrar descendentes da elite cacaueira em grandes capitais do país ou do mundo, muitos representantes de famílias tradicionais - como os Berbert, Tavares, Maron, Del Rey, Gedeon, Noremberg, Ocké, Chalhoub, Weyll, Hage, Kruschewsky, Ganem, Schaun e Medauar - ainda estão na região, como símbolo da credibilidade na lavoura e na civilização que constituiu. Antônio Lavigne, fazendeiro e descendente de uma família tradicional de Ilhéus, reconhece a permanência de representantes da elite na região: “ A sociedade de Ilhéus está aí lutando para refazer o cacau, tem muita gente trabalhando, lutando neste sentindo. As famílias estão aí, algumas saíram mas o básico está em Ilhéus” [54]. Pode-se comprovar estes dados pela própria presença dos Lavigne e dos Amorim, donos da Fazenda Primavera, uma antiga sesmaria, doada pelo rei de Portugal, que em 2016 completará 200 anos de produção. Segundo o seu proprietário Virgílio Amorim, “ é a única fazenda no Brasil que há sete gerações cultiva o mesmo tipo de cultura, o cacau” [55].
A monocultura cacaueira, segundo Freitas enraizou traços culturais na sociedade, “marcou todo um processo histórico vivido pela região, por aqueles que viram o sucesso e a crise, e marca ainda hoje a região do cacau porque as pessoas souberam que na história eles foram alguma coisa e hoje em dia estão diante de um dilema” [56]. O dilema que o historiador se refere é o de construir o novo ou resgatar as plantações de cacau. Representantes de organizações municipais e pesquisadores regionais têm a mesma opinião quanto à necessidade de diversificação da economia, no entanto, amenizam esse dilema, com uma compreensão de que na sua base estará ainda por muito tempo a lavoura cacaueira. Quem assume também esse discurso é o prefeito de Ilhéus, Jabes Ribeiro, quando afirma que mesmo que sejam abertas novas alternativas para o desenvolvimento, o cacau ainda constitui o eixo econômico da região,
“É muito difícil você substituir uma matriz econômica como foi o cacau. Tanto que para nós o fundamental é a recuperação do cacau. Pelo que ele representa, pelo que ele gera de riqueza. (…) Ilhéus está sendo preparada para ser melhor do que no apogeu do cacau. Porque nós vamos ter além do cacau, informática, turismo, serviços. A cidade está sendo montada para ter alternativas que possam dar sustentabilidade ao nosso desenvolvimento, mas com uma clareza muito grande, a recuperação da economia do cacau é fundamental para a recuperação econômica de Ilhéus e da região” [57].
A professora da UESC, Maria de Lourdes Netto Simões observa tanto a economia regional ainda baseada no cultivo do cacau, quanto os benefícios gerados pela crise cacaueira,
“ (…) a lavoura não desapareceu. Nós sabemos que o cacau está se soerguendo, graças a Deus. Acho que foi uma crise benéfica, porque fez com que a região acordasse, para enxergar, as outras potencialidades que ela tem. Por exemplo, diversificar a cultura (…) encontrar outros meios, valorizar outras formas (…) Por outro lado, as pessoas se tornaram melhores pessoas na medida em que deixaram de olhar só pra quantas arrobas ia dar e o dinheiro que isso resultaria e passaram a se enxergar como pessoas que tem anseios, preocupações, angústias. E passaram a buscar mais o SER em detrimento do TER. Acho que por isso a crise foi benéfica” [58].
O que se pode perceber é que, apesar da crise cacaueira ter promovido a descoberta de novas alternativas para o desenvolvimento econômico da região, apesar dela ter proporcionado o surgimento de um novo olhar sobre a ‘civilização do cacau’, o sentimento da população grapiúna permanece o mesmo e a sua maior esperança é de que os frutos do cacau voltem a ser de ouro, como antes. Enfim, o sentimento coletivo que foi retratado por Jorge Amado em 1964, na sua obra São Jorge dos Ilhéus, continua sendo o mesmo,“ Essas roças de cacau são o trabalho, a casa, o jardim, o cinema, tantas vêzes o cemitério dêsses homens. (…) O visgo de cacau, êsse mel que gruda aos pés e nunca mais larga (…)” [59].
Esse breve panorama histórico-político-sócio-cultural da região cacaueira cumpre o objetivo de traçar um perfil da região onde se insere a cidade de Ilhéus, permitindo uma compreensão das circunstâncias em que a sociedade ilheense foi fundada e do contexto onde são traçadas as políticas públicas do turismo e da cultura, objeto central de análise deste estudo. No cenário descrito, o turismo busca se consolidar como uma alternativa de desenvolvimento econômico, fundamentando-se na rica cultura da região, herança da civilização cacaueria, e nos símbolos que construiu durante o seu apogeu.
TURISMO
“ (…) por volta das três horas da tarde, o navio sueco, cargueiro de tamanho jamais visto naquelas paragens, apitou majestoso no mar de Ilhéus. (…) Os foguetes subiam, estouravam no céu. Apitavam dois baianos no porto, os búzios das barcaças e lanchas saudavam o cargueiro. Saveiros e canoas saíam fora da barra, afrontando o mar alto, para comboiar o barco sueco.
Atravessou lentamente a barra, dos seus mastros pendiam bandeiras de todos os países, numa festa de cores. O povo corria pelas ruas, reunia-se no cais. Formigavam as pontes, repletas de gente. (…)
À noite, desembarcados os marinheiros, a animação cresceu na cidade. Pagavam-lhes bebidas nos bares, levaram o comandante quase carregado em triunfo. Era um bebedor de trago forte, de experimentada aguardente nos portos dos sete mares do mundo.”
JORGE AMADO, Gabriela, Cravo e Canela,
Petrópolis, Rio de Janeiro, maio de 1958,p.361-2.
NO MUNDO, NO BRASIL E NA BAHIA
O turismo é considerado atualmente a maior indústria do planeta, seguida pelo setor do petróleo e pela indústria automobilística[60]. A expectativa da World Travel & Tourism Council (WTTC) para 2003, é que esta atividade faça girar no mundo US$ 4,5 trilhões na economia ativa e seja responsável por 10% dos empregos (diretos e indiretos), o que significaria uma participação de 14% no PIB mundial[61]. Em 36 anos, de 1965 a 2001, segundo dados da WTTC, os deslocamentos internacionais se multiplicaram em mais de seis vezes e as receitas diretas obtidas com gastos dos turistas nas localidades visitadas aumentaram em mais de 44 vezes, chegando a ser registrado um fluxo global de 688,6 milhões de turistas e uma receita cambial turística de US$ 472 bilhões, em 2001 [62].
A França é o país que mais recebe turistas no mundo, há mais de vinte anos consecutivamente, de 1980 a 2002, segundo o Anuário Estatístico da Organização Mundial de Turismo (OMT)/1999 e da WTTC[63]. Este país chegou à marca de 79,191 milhões de turistas em 2002, ficando muito à frente dos Estados Unidos (56,925 milhões) e da Espanha (51,760 milhões). Nesse período de 22 anos, os dez primeiros destinos turísticos mundiais concentraram-se predominantemente na Europa, embora tenha sido registrada entre 1990 e 1996, uma redução da sua representatividade de oito para seis países, quando a China e o México surgiram como pólos turísticos ascendentes. Entretanto, o país que mais atrai divisas internacional são os EUA, mesmo quando este ficou em quarto lugar no ranking dos principais países receptivo, (atrás da Espanha e da Itália), em 1985, e quando perdeu o segundo lugar para a Espanha, em 1998. Por exemplo, a receita cambial turística dos Estados Unidos em 1998 foi de US$ 7,4 bilhões, enquanto a França, primeira classificada, arrecadou menos da metade desse valor, US$2,97 bilhões, nesse mesmo ano.
O continente americano teve uma participação de 26,92% na receita turística mundial de 2002, com um montante de US$ 130 bilhões, graças à presença dos EUA nesse território[64]. O Brasil, que em 2002 recebeu 3,648 milhões de turistas[65], foi o quinto destino mais procurado deste continente (atrás dos EUA, Canadá, México e Porto Rico), ficando em 35° lugar no ranking do receptivo internacional. O país só alcançou uma melhor posição no ranking (29º lugar) em 1998, quando recebeu 4,818 milhões de estrangeiros e arrecadou US$ 3,6 milhões com esta atividade[66].
Mesmo com este fraco desempenho na disputa do mercado internacional, a receita gerada pelo turismo internacional no Brasil dobrou nos últimos 20 anos, segundo dados da Embratur: enquanto, em 1980 o país arrecadou com o turismo US$ 1,794 milhões, em 2001 esta arrecadação atingiu o valor de US$ 3,7 milhões. Segundo dados do Departamento de Aviação Civil (DAC), a América do Sul, a América do Norte e a Europa foram as regiões que mais emitiram vôos para o Brasil. Em 1999, a diferença do número de viajantes provenientes desses continentes é quase imperceptível, uma vez que nesse ano estiveram no Brasil 1,229 milhões de sul-americanos, 1,193 milhões de norte-americanos e 1,173 milhões de europeus[67].
É indispensável considerar, que existem fatores fundamentais para que o turismo se desenvolva e seja propulsor do desenvolvimento econômico de um país, como a qualidade de infraestrutura, a facilidade de atração de fluxos turístico de países e territórios vizinhos, e o equilíbrio do desenvolvimento social. Nos estudos sobre turismo, como ressalta o geógrafo Clímaco Dias[68], deve-se observar a “hierarquia dos lugares”. Ou seja, existe uma diferença muito grande entre o turismo praticado nas metrópoles mundiais (Nova Iorque, Londres, Paris), do turismo praticado em centros de menor importância, o que é gerado principalmente pela diferença da infraestrutura oferecida por esses lugares. Fatores como estrada, segurança, qualidade de serviços e condições sanitárias influenciam na escolha do destino pelo turista, que seria por sua vez um transformador do espaço visitado, em termos de geração de empregos e da produção de uma nova dinâmica econômica.
O geógrafo reconhece que“o turismo no Brasil é incipiente, se comparado com as estatísticas mundiais(…) Enquanto a Espanha recebe hoje 50 milhões de turistas, o país recebe três ou quatro milhões, quando a Argentina está economicamente bem!” [69]. Esta declaração destaca a importância dos países circunvizinhos para o desenvolvimento do turismo de um determinado lugar. A Europa é o continente mais visitado do mundo, pelo valor atribuído às riquezas culturais e históricas dos seus países, mas sobretudo porque é formada por algumas das nações mais ricas e desenvolvidas economicamente do globo terrestre, o que permite que os seus habitantes se visitem frequentemente. Assim, os alemães, seguido dos poloneses, americanos, ingleses, malasianos, franceses, italianos, russos, austríacos e húngaros são os povos que mais viajam no mundo[70]. Como se pode notar, a maior parte deles habita a própria Europa. No caso do Brasil, a situação é crítica desse ponto de vista, considerando-se que os seus países fronteiriços são pobres e estão vivendo graves crises econômicas, assim como o próprio país.
Deve-se considerar a dimensão de cada país, os países da Europa possuem tamanhos semelhantes (ou menores) a alguns estados brasileiros, podendo ser percorridos rapidamente e com baixo custo, pela curta distância. Para que, por exemplo, turistas de nações européias cheguem ao Brasil, os vôos têm duração mínima de seis horas e meia e máxima de 11 horas, o que encarece o custo com transporte. Mesmo para o turismo interno a dimensão territorial do país, semelhante à de um continente, dificulta o seu percurso de ponta a ponta.
Além da longa distância dos principais pólos emissores, e consequentemente dos altos custos das passagens, restam as questões sociais tão alardeadas nas manchetes de jornais em todo o mundo: falta de segurança física pelo alto índice de violência; a existência de doenças como a dengue, o tifo e a malária; o saneamento básico precário; e a rara infraestrutura à altura de consumidores de alto luxo internacional. Hélio Barroco, Coordenador do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, avalia: “O Brasil hoje poderia ser um grande receptor de turistas internacionais, se não tivesse tanta miséria e problemas (…) mas sobretudo se o governo (…) os deputados e senadores fossem muito mais conscientes sobre a importância do turismo, para que se tivesse a boa vontade política para a liberação de verba para projetos nesta área”[71].
O governo que teve início em 1° de janeiro de 2003, sob a liderança do ex-metalúrgico Luis Inácio Lula da Silva, renova a imagem do Brasil para o mundo, com os objetivos prioritários do equilíbrio social interno e da intensificação do comércio externo, em busca de um maior diálogo com as outras nações. Com o novo governo, o turismo poderá ser beneficiado através do fortalecimento das relações internacionais, uma vez que foi criado um ministério específico para o Turismo, que antes dividia a mesma pasta com os Esportes. Esta primeira ação do governo na área do turismo, demonstra a intenção do presidente de abrir uma ‘frente’ sólida para esta atividade. O turismo é reconhecidamente uma das áreas de maior geração de empregos no mundo contemporâneo e o presidente Luis Inácio Lula da Silva, que tem como meta do seu governo o aumento da geração de empregos, demostra acreditar nesta alternativa de desenvolvimento para este país, que possui 175 milhões de habitantes, dos quais mais de 45 milhões vivem abaixo da linha de pobreza.
O ministro do turismo, Walfrido Silvino Dos Mares Guia, no dia 15 de julho de 2003, durante a Jornada de Turismo Brasil-Espanha em Madrid, expôs a composição do seu ministério (Secretaria de Políticas de Turismo, Secretaria de Programas Regionais de Desenvolvimento e Embratur – Instituto Brasileiro de Turismo) e as principais metas do Plano Nacional de Turismo: criar três novos produtos turísticos de qualidade em cada estado; aumentar de 35 pra 65 milhões o número de desembarques em vôos domésticos; atrair 9 milhões de turistas estrangeiros por ano; gerar US$ 8 bilhões anuais em divisas; implementar 1,2 milhões de novos postos de trabalho; e criar condições para atrair investimentos diretos de mais de US$ 4 bilhões, até o ano de 2007. O ministro também anunciou, que a disponibilidade para financiamento do governo, em 2003, é de US$ 600 milhões, e que o seu planejamento tem como base cinco ações prioritárias: desenvolver produtos turísticos com qualidade, levando em conta as diversidades regionais, culturais e naturais; realizar investimentos em infrastrutura; criar condições para a realização de investimentos privados; estimular e facilitar o consumo do produto turístico brasileiro nos mercados nacional e internacional; e desenvolver e implementar um plano de marketing internacional. A gestão das ações do Ministério do Turismo brasileiro se dará sob formas de rede, que integrará o Forum de Secretários Estaduais de Turismo, o Conselho Nacional de Turismo e os Foruns Estaduais de Turismo[72].
Enquanto o turismo internacional não se desenvolve, o turismo interno no Brasil vêm aumentando gradativamente. Em oito anos, de 1993 a 2000, o número de pessoas desembarcadas dos vôos nacionais duplicou, passando de 13,095 para 28,521 milhões de passageiros. O Censo de 2000 aferiu que do total da população brasileira, 24% (40,730 milhões de indivíduos) viajou naquele ano. A pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), Estudo do Mercado Doméstico de Turismo no Brasil, de 1998, traçou um perfil do turista interno: de 30 a 40 anos; escolaridade até o 2º grau; uma renda média de R$1,8 mil; o meio de transporte mais utilizado é o ônibus; e hospeda-se na casa de amigos ou parentes. Vale ressaltar, que o turista disputado por todos os destinos turísticos do mundo é o da classe alta, um turista de alto poder aquisitivo, que consome da hospedagem e alimentação de qualidade à programas e produtos sofisticados, deixando uma boa quantia de dinheiro no lugar visitado.
O Nordeste do Brasil é a região do país que mais investe em turismo. Enquanto a participação do turismo no PIB do país é de 2,5%, na região Nordeste é de 6,32%, e de 5% no Estado da Bahia. No entanto, na opinião de alguns estudiosos, esse investimento não tem o retorno esperado. O geógrafo Clímaco Dias, comenta: “mesmo fazendo uma grande publicidade, como a Bahiatursa faz, gastando mais do que alguns ministérios do país, o turismo da Bahia não decola, assim como o turismo não decola no Brasil”[73]. Opinião semelhante tem Marcos Nunes Rodrigues, no seu artigo Da Baía de Todos os Santos a All Saints Bay: Glossas ao Plano Estratégico de Turismo da Bahia [74], quando destaca que nos últimos anos foram gastos mais de US$23 milhões só em publicidade no Estado da Bahia, entretanto “a curva de entrada de turistas estrangeiros na cidade (Salvador) nos últimos vinte anos não se alterou: é uma reta”[75].
O Estado da Bahia, de 1997 a 2000, teve uma queda de 107.140 para 62.967 vôos internacionais[76], o que representa uma redução de aproximadamente 41,23%. Segundo dados da Infraero, a Bahia foi o quarto destino dos vôos internacionais do país neste mesmo período, ficando atrás de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, tendo subido para a terceira posição, em 2002[77]. Com relação aos vôos nacionais, de 1998 a 2000, a Bahia passou do sexto para o quarto destino do país, estando à sua frente os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e o Distrito Federal[78]. Em 2001, a cidade brasileira que mais atraiu o turista estrangeiro foi São Paulo (3,193 milhões), seguida longinquamente pelo Rio de Janeiro (1,027 milhões) e Salvador colocou-se em quinto lugar, tendo sido visitada por 54 mil turistas estrangeiros naquele ano[79]. Vale ressaltar que estes dados divulgados da Infraero, 2001, retirados do site .br, não coincidem com o Estudo de Demanda Turística Internacional de 2002 da Embratur, para o mesmo período, que coloca a cidade de Salvador como a terceira mais visitada. Aliás, essa falta de precisão de informações é comum na área turística brasileira. De qualquer forma, o estado de São Paulo e a sua capital assumem a posição dianteira como maior destino nacional e internacional.
A pesquisa da FIPE, identifica que em 1998 a Bahia foi o quinto estado receptor de turista doméstico, responsável por 6,9% do receptivo (2,636 milhões de pessoas), e por 6,2% das receitas geradas pelo turismo (R$817,284 milhões)[80]. Em primeiro lugar destaca-se São Paulo com 18,7% do receptivo, ou seja, 7,144 milhões de pessoas, e 16,4% das receitas, R$2,161 trilhões. Salvador aparece também em quinto lugar (atrás de São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza e Recife) na lista das principais cidades-destinos do país com 1,6% dos turistas internos. Na Bahia, apenas as cidades de Salvador e Porto Seguro aparecem na classificação dos trinta primeiros destinos do país.
Paulo Gaudenzi, gestor da política de turismo do Estado da Bahia, há mais de 30 anos, desdobra o processo de desenvolvimento das políticas públicas, ao longo desse período, em quatro estratégias[81].
A primeira, o Plano de Turismo do Recôncavo, de 1971, tendo a Bahiatursa[82], o Conselho Estadual de Turismo e a Coordenação de Fomento ao Turismo (CFT)[83], como principais ‘alavancas’ do turismo estadual, começa a criar uma estrutura organizacional, um programa de pesquisas e um sistema de estatísticas gerenciais de turismo, além do inventário do patrimônio monumental do Estado e da criação de um sistema de classificação da hotelaria.
A segunda estratégia, Caminhos da Bahia, de 1979, previa a construção de hotéis e pousadas, ações de marketing e capacitação de recursos humanos nos municípios e localidades integrantes do programa, inaugurando o processo de interiorizarão do turismo, com doze cidades eleitas[84] para o marketing turístico, dentre as quais a cidade de Ilhéus. Uma estratégia vitoriosa, considerando-se que houve um aumento significativo do circuito de turistas no interior da Bahia[85] e que a Bahiatursa se fortaleceu, ao reunir sob a sua coordenação as funções do extinto Conselho Estadual de Turismo, da CFT, além de ter o comando da Emtur (Empreendimentos Turísticos da Bahia S.A.)[86] e da Conbahia (Bahia Convenções S.A.)[87].
A terceira estratégia, o Plano de Desenvolvimento Turístico da Bahia, de 1991, é baseado no Prodetur (Plano de Desenvolvimento do Turismo), cuja meta era retomar o crescimento turístico, pois, segundo Paulo Gaudenzi, a Bahia havia perdido posições no ranking nacional nos quatro anos anteriores. Este plano inclui a criação de uma nova geografia turística, a definição de um planejamento global de marketing, de capacitação de recursos humanos e a captação de recursos para investimentos em infraestrutura nas áreas turísticas. Em 1991, o Estado passa a ter uma nova divisão territorial, a do zoneamento turístico, concebendo inicialmente sete zonas prioritárias para investimentos: Costa dos Coqueiros, Baía de Todos os Santos, Costa do Dendê, Costa do Cacau, Costa do Descobrimento, Costa das Baleias e Chapada Diamantina[88]. Ilhéus, juntamente com Itacaré, Uruçuca Una e Canavieiras, compõem a zona turística da Costa do Cacau.
Nesse mesmo ano, que foi criado esse zoneamento, foi criado o Prodetur, que começou a atuar dois anos mais tarde, com o objetivo de possibilitar a auto-sustentabilidade dos municípios, através de apoios infra-estruturais, e estimular as organizações internas dessas zonas turísticas para a captação de eventos, divisas e fluxos constantes. Segundo dados da Bahiatursa, os investimentos realizados e projetados de 1991 a 2005 (projetado), em milhões de dólares, ficaram distribuídos da seguinte forma: Costa dos Coqueiros, 176; Baía de Todos os Santos, 986; Costa do Dendê, 121; Costa do Cacau, 213; Costa do Descobrimento, 209; Costa das Baleias, 93; Chapada Diamantina, 168; outros territórios, 244 [89]. A Costa do Cacau, portanto, recebeu o segundo maior recurso do Estado, enquanto zona turística.
Finalmente, a quarta estratégia, A Criação do Cluster de Entretenimento, de 2001, tem a cultura como o seu diferencial e incentiva o desenvolvimento do setor de entretenimento. O cluster do entretenimento consiste na formação de um conglomerado de empresas que tem como objetivo definir as políticas públicas de cultura e turismo, justificando-se esta estratégia pela facilidade de acesso a investimentos privados. Segundo Ricardo Ramos do Grupo Monitor – empresa de Michael Porter, especialista em estratégia e competitividade – contratado pela SCT para o desenvolvimento deste projeto na Bahia, o cluster é um conglomerado de empresas que atuam nas áreas de turismo e cultura e promovem a união dos dois setores, “ O envolvimento de empresários da hotelaria, agências de turismo, agências de táxi, com indivíduos que tenham terreiro de candomblé, com grupos musicais independentes e artistas irá favorecer a integração do turismo à cultura” [90]. Esta estratégia engloba uma série de ações dentre as quais se destacam: popularização do carnaval e da música baiana; realização de diversos festivais de música e artes; criação de novos pólos de visitação no Estado; criação do Pós-cultura; reforma e ampliação de oferta de teatros, implementação de agenda cultural[91]. Com a tentativa de implementação do cluster do entretenimento na Bahia fica visível uma política de gerenciamento da cultura pela iniciativa privada em função do turismo, e um ‘afastamento’ do Estado da gestão das políticas públicas nesta área, o que provocou severas críticas a essa estratégia. O cluster nunca foi colocada em prática na área de cultura, por pressões sofrida pela classe artística, entretanto, em turismo alguns conglomerados se formaram e atuam com sucesso, a exemplo do Convention Bureau de Salvador.
É importante considerar que estas estratégias tiveram continuidade, devido a permanência há doze anos do mesmo grupo político no poder. Em quinze anos, de 1986 a 2000, a política de turismo do estado da Bahia conseguiu ampliar a rede hoteleira baiana de 16.251 para 131.000 leitos, registrar um crescimento do fluxo de 2,098 milhões para 4,149 milhões, e multiplicar em mais de dez vezes os produtos-destinos-turísticos do estado[92].
Alguns estudiosos, chamam atenção para a composição e análise dos dados estatísticos do turismo na Bahia, observando, por exemplo, que apesar deste gerar muitos empregos, estes são na maioria das vezes precários, temporários, sem garantias sociais e com remunerações muito baixas. Clímaco Dias cita como exemplo os dados divulgados pela Emtursa (Empresa Municipal de Turismo de Salvador) sobre a geração de 125 mil empregos temporários no carnaval de 2002, sem destacar que 50 mil destes eram cordeiros (pessoas que ficam nas cordas dos blocos de carnaval protegendo e delimitando os espaços entre os associados e a população). O valor recebido pelo cordeiro, no carnaval da Bahia de 2002, foi de R$8,00 por dia. Um carnaval que gerou para Salvador, segundo este mesmo órgão, uma receita de US$268 milhões (nesta época R$536 milhões). Bob Fernandes cita os principais números da distribuição desta quantia, no artigo publicado na revista Carta Capital: US$ 112 milhões foram para os donos dos blocos, US$35 milhões para a indústria fonográfica, US$ 19 milhões para as companhias de bebidas, US$12 milhões para a propaganda, US$1,6 milhão para os camarotes particulares; sobraram US$ 11,7 milhões para o que o autor chama de ‘lenhados’, ambulantes, cordeiros, etc…[93] Isso demonstra a desigualdade social reproduzida muitas vezes por essa alternativa de desenvolvimento econômico e social chamada turismo.
O Brasil possui 1,241 milhões de pessoas empregadas na atividade turística, segundo os dados do MTE–RAIS 2000[94], que distribui os empregos da atividade turísticas da seguinte forma: em primeiro lugar encontra-se a área de alimentação, com 580.495 empregos, em segundo as atividades recreativas, com 245.965, e em terceiro os alojamentos, com 197.309. O Nordeste gera empregos nas atividades turísticas, em primeiro lugar na área de alimentação (72.746 pessoas), em segundo lugar em alojamento (43.109 pessoas), e em terceiro nas atividades recreativas (26.430 pessoas). A Bahia acompanha o Nordeste no primeiro e segundo lugares, 23.826 e 14.784 empregos, respectivamente, mas o terceiro lugar é ocupado pelos transportes rodoviários regulares, com 8.759 empregados. Esta pesquisa ainda identificou que a faixa salarial mais comum no turismo encontra-se entre 1,01 e 3 salários mínimos.
Quanto ao mercado profissional, Marcos Nunes Rodrigues ressalta um aspecto importante: cada vez mais as empresas exigem maior capacitação,
“ (…) as empresas hoteleiras atraídas para a Bahia são, basicamente, bandeiras estrangeiras e os empregos criados pelo setor implicam em maior qualificação da mão-de-obra, gerando uma conseqüente exclusão dos trabalhadores menos preparados (…) o turismo por si só não vai alterar o quadro de profunda desigualdade social do Estado” [95].
O panorama descrito mostra que os gestores, públicos e privados, do Brasil e da Bahia têm se empenhado em adotar políticas e medidas para as suas inserções na dinâmica mundial do turismo, como uma grande opção para o desenvolvimento econômico do país e do estado.
NOVA OPÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO
O turismo surge como alternativa para retirar cidades com economias combalidas, de diversas regiões do mundo, da depressão econômica, revalorizando o seu espaço físico-sócio-cultural através da ‘venda’ de partes dos seus territórios para a exploração de empresas, muitas delas multinacionais, que recebem incentivos do governo local, com o objetivo de atrair divisas com o fluxo turístico internacional. Mas, se o turismo aparece como um ‘salvador da pátria’ é preciso ter uma consciência crítica aguçada no ato de implementação de políticas e ações nessa área.
Para David Harvey, a recente mudança na forma de gerenciamento das cidades para a adoção de um modelo mais empresarial, deriva das dificuldades que atingiram as economias capitalistas desde a recessão de 1973. Uma crise que provocou, segundo o estudioso, “Desindustrialização, o desemprego, (…) a austeridade fiscal tanto a nível nacional como local, combinados com uma onda crescente de neoconservadorismo e um apelo muito mais forte (…) à racionalidade do mercado e da privatização” [96]. Harvey avalia que naquele momento de crise era necessário que os governos urbanos tivessem uma atitude mais inovadora e empreendedora, que estivessem abertos para explorarem diferentes meios para aliviar as condições difíceis e precárias das cidades e dessa forma assegurar um futuro melhor para suas populações. A nova gestão urbana, segundo Harvey, tem como uma das principais características a parceria público-privada, com a utilização dos poderes públicos locais para tentar atrair fontes externas de financiamento, novos investimentos diretos ou novas fontes geradoras de emprego. Harvey observa ainda em seu texto, Do Gerenciamento ao Empresariamento, que o empresariamento contribui para as crescentes disparidades de riqueza e renda, assim como para o aumento da pobreza urbana, notado até mesmo em cidades que apresentam crescimento acentuado.
Outros estudiosos advertem que o empresariamento urbano coloca claros limites ao poder, provoca a competição interurbana e promove projetos específicos para transformação das cidades, que muitas vezes exigem a reprodução repetitiva e em série de certos padrões de empreendimento, tornando efêmera toda vantagem competitiva dentro de uma rede de cidades. Ana Fani Alessandri Carlos, em O Consumo Do Espaço, analisa que o espaço urbano torna-se mercadoria e fica sujeito ao mercado, que provoca profundas mudanças sobre ele, “(…) inaugurando um movimento que vai do espaço de consumo (…) ao consumo do espaço. (…) espaços antes desocupados se transformam em mercadorias” [97]. Para a autora, o turismo é o principal responsável pela mercantilização do espaço urbano, produtor de pólos de atração e responsável pela invenção de lugares através do marketing e da comunicação, em uma ‘produção de aparências’.
Em Novas Contradições Do Espaço, Ana Fani Alessandri Carlos cita o exemplo do bairro do “Bexiga” em São Paulo, antigo bairro habitado inicialmente por imigrantes italianos, que hoje é um pólo de atração turística, formatado através da captura do que diz respeito à cultura italiana, e que não se diferencia de outras partes do mundo como o “Little Italy” de NovaYork ou o quadrilátero italiano em Amsterdã.
Ana Fani critica ainda a produção de não-lugares (simulações) pelo turismo. A criação de um mundo vazio de imagens, onde o espaço do turismo e do lazer são espaços visuais, presos ao mundo das imagens, que impõem a redução e a simulação. A geógrafa exemplifica
“ Disneyworld, Miami, Califórnia, que tem a pretensão de se constituírem enquanto ‘mundo em si’, com direito a um castelo que só tem fachada, o que significa a redução suprema do espaço à imagem da fechada, feita só para ser vista, a qual sem nenhum referencial, pretende copiar a arquitetura do castelo de Neuschwanstein, na Baviera, feito para o rei Ludwig II” [98].
Ana Fani cita exemplos brasileiros como o Beto Carreiro World, em Santa Catarina, e Aquiraz, no Ceará, cenário de uma novela que se transformou em um ‘lugar’. Espaços estes dominados por estratégias de marketing e que, segundo a geógrafa, ganham sentido enquanto centralidades de fluxo, atraindo consumidores - turistas do mundo todo.
Marcos Rodrigues, em Da Baía De Todos Os Santos A All Saints Bay: Glosas Ao Plano Estratégico De Turismo Da Bahia, observa que o empreendimento das cidades (ou melhor, as cidades dos empreendimentos), transforma a função de locais, antes fontes fundamentais de renda de sociedades litorâneas, como os portos. A partir da redução da sua capacidade de operação estes espaços têm sua venda justificada. Rodrigues cita como exemplo o porto de Salvador, que hoje opera com apenas 30% da sua capacidade, que foi reduzida após a construção dos portos de Aratu e de Ilhéus e do aeroporto de Salvador, informando que já existe um mega projeto da Secretaria da Cultura e Turismo do Estado para a transformação da Baía de Todos os Santos em uma grande área de lazer, a exemplo de várias cidades européias, norte-americanas e asiáticas.
Um exemplo de sucesso da conversão de um porto em local de entretenimento, citado por Rodrigues, foi a área portuária de Baltimore, que começou a sua transformação na década de 1960 com a realização da feira étnica, “Baltimore City Fair”: “ Com o assassinato, em 1968, do líder negro Martin Luther King, as tensões civis, principalmente raciais, eclodiram (…) Era necessária, para aqueles que investiram na cidade, (…) a construção de um símbolo que ligasse a cidade à idéia de comunidade. (…) foi a tentativa de abrandar as diferenças sociais entre raças, promovendo(…) a diversidade étnica”[99]. Essa feira recebe muito mais visitantes que o Carnaval da Bahia, desde 1973. Em seguida, foi construída no local a Harbor Place (no Inner Harbor, cais interno), um complexo que inclui inúmeros e variados equipamentos, com toda uma arquitetura projetada para funcionar como cenários espetaculares, lúdicos. Baltimore recebe atualmente dezoito milhões de turistas, mais que a Disneylândia. Rodrigues destaca com preocupação esta transformação bem sucedida das funções portuárias,
“O exemplo(…) de Baltimore aparece então como grande modelo a ser copiado em reconversões de cidades portuárias, que avançam esperançosas para o terciário como para uma tábua de salvação ao Titanic do moderno”[100].
Rodrigues acrescenta que mesmo com todos estes investimentos em Baltimore, questões sociais como a pobreza e a falta de habitação não foram resolvidas. O desnível social e o aumento da pobreza são as principais conseqüências sociais das cidades do empreendimento, identificadas também por Harvey em Do Gerenciamento ao Empreendimento.
O empresariamento urbano tem o turismo como a sua principal atividade, numa tentativa de retomada de desenvolvimento econômico das cidades, não apenas nas cidades européias e americanas, como tem sido uma opção pensada para algumas cidades brasileiras.
NA REGIÃO CACAUEIRA
O turismo ganha força como uma das opções de desenvolvimento econômico da região cacaueira, a partir da década de 90, após a grande crise da lavoura do cacau na Bahia, que segundo o economista Vitor Couto[101], foi ocasionada fundamentalmente, pelos seguintes fatores: grandes estoques mundiais de amêndoas; substituição e/ou redução nos “chocolates” e afins; entrada de novos concorrentes (Ásia-Oceania), com inovações tecnológicas e estratégias de redução de custos; reestruturação da lavoura e indústria processadora, principalmente da Costa do Marfim (maior produtor mundial); gestão ineficiente, conservadora e clientelista; desestruturação do ecossistema; clima adverso; doenças do cacaueiro; quedas do rendimento físico e da produtividade do trabalho; redução de preços e da produção; e baixo nível de escolaridade, principalmente na área rural.
Em Ilhéus, o elemento deflagrador da expansão do turismo foi a abertura da rodovia BR-116, a Rio – Bahia, que só foi asfaltada em 1963, seguida anos mais tarde pela construção da BR-101, litorânea, em 1973. Ilhéus foi uma das primeiras cidades do interior da Bahia a possuir aeroporto civil, a partir dos anos 50 se interliga à capital através de vôos regulares da aviação comercial. A expansão territorial do turismo em Ilhéus não se deu de forma planejada, mas de maneira espontânea. A hotelaria cresceu com o movimento do porto, com a produção do cacau, num período em que o turismo ainda iniciava. Uma prova disto foi a construção do Ilhéus Hotel por Misael Tavares um empreendimento que permaneceu dez anos fechado. Este e outros hotéis ficavam no centro, voltados para um atendimento ao movimento portuário. Quando a ponte Ilhéus-Pontal foi construída, muitos empresários resolveram construir hotéis do outro lado, como o Pontal Praia Hotel, atraídos pela proximidade do aeroporto. Em 1973, quando foi inaugurada a BA-001, que vai até Olivença e Canavieiras, o turismo se expandiu até esse novo núcleo. Ilhéus, que se voltava para o turismo urbano, sofreu um esvaziamento e não conseguiu desenvolver nenhum projeto que aproveitasse a estrada que vai até Olivença, margeada por belas praias.
Fazendo uma breve síntese do percurso da inserção da cidade de Ilhéus, nos planos do Governo da Bahia, é importante lembrar que em 1983, foi estimulada a utilizar a atividade turística para o seu desenvolvimento, como parte integrante do plano estratégico Caminhos da Bahia, inaugurado em 1979. Em 1991, foi indicada pela Bahiatursa como o produto âncora da zona turística da Costa do Cacau. Hoje, Ilhéus é o 2° destino do interior da Bahia, logo depois de Porto Seguro, mas com uma diferença significativa do número de visitantes: enquanto Porto Seguro recebeu 1,021 milhão de turistas, Ilhéus foi visitada por apenas 242 mil, em 2002. Os destinos Morro de São Paulo/Valença e Lençóis ocupam o 3° e 4° lugar, recebendo, respectivamente, 161 mil e 81 mil turistas.
Atualmente o parque hoteleiro do município de Ilhéus é composto por 134 empresas, subdivididas em 3 resorts, 16 hotéis, 103 pousadas e 12 chalés, albergues e campings, perfazendo um total de aproximadamente 8.000 leitos. A média das pessoas ocupadas nas empresas de turismo da cidade, registrada no Censo 2000, é de 6,28 pessoas (das quais 6,4% trabalham nas empresas de alojamento e alimentação), o salário médio é de R$390,66[102].
Para o Secretário de Turismo de Ilhéus, Romualdo Pereira, o turismo gera na cidade aproximadamente 2500 empregos diretos e 7500 indiretos, mas a qualificação do profissional de turismo em Ilhéus é muito questionada, inclusive a dos próprios hoteleiros, que são responsabilizados de terem investido em uma área que mal conhecem, e por serem, em sua maioria, aposentados. O prefeito Jabes Ribeiro acredita que, como muitos dos proprietários de pousadas e hotéis são pessoas vinculadas ao cacau, é necessária uma mudança radical do ponto de vista cultural, um processo de transição e amadurecimento, “ (…) com o cacau, essas pessoas muitas vezes ficavam em casa e o cacau estava crescendo na fazenda, no entanto o turista tem que se buscar, tem que se vender bem o produto, tem que ter qualidade, tem que ter serviço ” [103].
O ex-secretário de turismo de Ilhéus, Sérgio Barbosa, ao analisar o comportamento dos hoteleiros, considera que estes se acostumaram a uma concepção antiga de turismo, à concepção de que se deve cobrar tudo ao governo, “(…)Essa é uma concepção imatura da rede hoteleira, (…) na verdade, não são empresários hoteleiros, nem empresários do turismo. Eles são investidores que ouviram falar no boom do turismo, mas não têm uma concepção nem de hotel, nem de turismo ”[104]. Concordando também com esta visão, a pousadeira Elza Muniz[105] afirma que realmente existem muitos hoteleiros que não sabem como funciona a hotelaria, pois transformaram a sua própria casa em pousada ou hotel. No entanto, segundo ela, o problema maior é que isso dificulta a existência de uma consciência turística/hoteleira, de um trabalho de grupo, que poderia fortalecer a classe frente aos poderes públicos.
A cidade âncora da Costa do Cacau, Ilhéus, não aparece na lista dos trinta primeiros destinos do turismo interno do país, na pesquisa realizada pela FIPE em 1998, demonstrando que a cidade ficou com um percentual igual ou inferior a 0,06% do fluxo turístico nacional. Clímaco Dias comenta sobre a inexpressividade da cidade de Ilhéus como destino turístico, “Ilhéus é periferia da periferia (BAHIA) da periferia(BRASIL) do destino turístico mundial”[106]. No entanto, a assessoria de comunicação da Secretaria de Cultura e Turismo da Bahia, divulgou recentemente uma reação da atividade turística nessa cidade. Em quatro anos, de 1998 a 2001, Ilhéus teve um aumento de 17,2% em seu fluxo turístico. Enquanto em 1998 recebeu 225.180 visitantes, em 2001 foi visitada por 263.930 turistas. De todo modo, a receita total que o turismo trouxe para a cidade sofreu uma redução de 6% nesses quatro anos, chegando a registrar uma queda de 13,64%, em 1999. A maior entrada de dinheiro na cidade com a atividade turística, foi registrada em 1998, perfazendo um total de US$68,91 milhões[107].
O mais importante a considerar, é que a região cacaueira tem características interessantes para o desenvolvimento da atividade turística, como a preservação da mata atlântica que recobre a sua lavoura. Este diferencial regional é uma das grandes vantagens que a cultura cacaueira oferece à atividade turística, acrescido do seu rico passado cultural e histórico. As cidades da região cacaueira, Ilhéus em especial, têm portanto essa grande vantagem: possuem uma identidade cultural fundamentada na produção cacaueira, conhecida internacionalmente através da literatura de Jorge Amado e Adonias Filho. A identidade de uma cidade é de fundamental importância para o seu marketing, por constituir geralmente o foco central do planejamento turístico.
Para desenvolver esse planejamento, segundo Marcos Rodrigues[108], é preciso ter produto, preço, ponto de venda e promoção, e ter como principal objetivo a transformação de lugares em marcas, criando pólos de atração do capital. Rodrigues fala sobre um novo modo de pensar a cidade,
“(… ) Não mais o Plano Diretor moderno que pensa toda a cidade,(…) mas o chamado Planejamento Estratégico, de caráter (…) gerencial, que seleciona ‘a vocação’ do lugar e o especializa. E espera que as conseqüências econômicas da escolha, como uma espécie de metástase benigna, afete todos os outros aspectos da cidade” [109].
Ilhéus e região não têm necessidade de procurar uma ‘vocação’ a fim de desenvolverem a atividade turística, pois esta se apresenta imediatamente, associada à cultura cacaueira. Aliás, a Secretaria da Cultura e Turismo do Estado da Bahia dá vizibilidade a essa identidade, quando a denomina de Costa do Cacau.
Embora Ilhéus conte com esta grande vantagem, existem dois fatores que atrasam a atividade turística na região: o acúmulo de terras na mão de poucos (ocasionado pela cacauicultura) e o alto volume pluviométrico. A concentração de terras em poucas mãos, por um lado ajudou a preservar o ambiente ecológico, mas por outro emperrou a implantação de projetos na cidade, uma vez que a valorização das terras dificulta a negociação com grandes empresas turísticas internacionais, que ali pretendem se instalar. Sérgio Barbosa, ex-secretário de turismo de Ilhéus comenta,
“ Um único empresário suíço, comprou toda a orla marítima, o bar Vesúvio, e outros imóveis, até que o impediram de continuar comprando, porque ele acumulou tanto capital em forma de terra, que se quisessem implantar um resort tipo o Club Med, teriam que se submeter a ele”[110].
A segunda desvantagem, o alto volume de chuva, deixa vulnerável o turismo de toda a região, até os dias atuais baseado no Sol e Mar, que ocorre em curtíssimos períodos do ano, e corre o risco de ver prejudicado pelas chuvas o fluxo que ocorre de julho a agosto e no verão (janeiro a março).
Sérgio Barbosa comenta em A Expansão Territorial do Turismo na Bahia [111], que para se avaliar o tipo de atividade turística a ser desenvolvida, deve-se considerar as modificações que esta sofreu nos últimos anos. Ao contrário do que ocorreu inicialmente com o turismo, que de 1950 a 1980 atravessou uma etapa ‘fordista’[112], ou seja, não flexível, com a produção e consumo de produtos dirigidos a grandes mercados com pouca segmentação, de 1980 até os dias atuais, deu-se início à fase pós-fordista, caracterizada pela diversidade de motivações e pela preocupação com os impactos sociais, econômicos e ambientais ocasionados por essa atividade. Sérgio Barbosa, consciente desse novo momento, acredita que Ilhéus poderá desenvolver um turismo sintonizado com as tendências mundias, voltando-se para mercados extremamente segmentados.
Nesse sentido, o potencial para o desenvolvimento da atividade turística na região cacaueira é bastante rico, uma vez que existem possibilidades de ofertas diversificadas para mercados segmentados como: os turismo Sol e Mar, pelos seus 100 km de praias, com trechos concorridos e outros desérticos; o turismo cultural, explorando toda a riqueza da cultura cacaueira; histórico, por estar situado no sítio do descobrimento do Brasil; o turismo ecológico, pela biodiversidade proporcionada pela mata atlântica e pela Lagoa Encantada; o turismo rural, pela riqueza das fazendas cacaueira; o turismo de negócios, por ter o segundo maior centro de convenções do interior da Bahia; o turismo de balneário, por ter o Balneário de Tororomba, com as qualidades da suas águas comparada à de Vichy na França; o turismo náutico e desportivo, por possuir características espaciais/geográficas fundamentais para sediar competições mundiais e nacionais, que podem ser bem desenvolvidos inclusive na baía do Pontal, como de triathlon, natação, mountain bike, surfe nacionais e pesca; finalmente, o turismo de resorts, por possuir uma vasta extensão de terras situadas em locais privilegiados, ainda sem destinação precisa. O potencial turístico regional se multiplica quando agregamos as possibilidades turísticas de Ilhéus com as de outros municípios da Costa do Cacau, como Una, Canavieiras e Itacaré.
ESTRUTURA DOS ÓRGÃOS DE TURISMO
O turismo em Ilhéus se organiza através da Secretaria Municipal de Turismo (Setur) — antiga Empresa Municipal de Turismo de Ilhéus (Ilheustur) —, da Associação de Turismo de Ilhéus (Atil), do Conselho Ilheense de Turismo (Citur), e do Convention Bureau (organização que tem o objetivo de captar eventos para o Centro de Convenções), último organismo a ser criado (2000). A Setur é a organização mais importante dessa rede e tem como atual presidente, Romualdo Pereira, em sua segunda gestão no governo Jabes.
A antiga Ilheustur, que modificou o seu nome em 2002 para Setur, por questões administrativas, é a ‘agência’ municipal de turismo, que foi criada inspirada no modelo da Bahiatursa, para promover o município de Ilhéus, e tem como responsabilidade atrair investidores, captar recursos, planejar, conceber e executar projetos e atividades turísticas em Ilhéus. Na verdade, segundo depoimentos de algumas pessoas entrevistadas, todo o poder de decisão sobre metas e gastos financeiros está concentrada nas mãos do prefeito, que não dá autonomia aos secretários da pasta. Hans Schaeppi[113], por exemplo, hoteleiro há 30 anos, pioneiro do turismo ilheense, uma das pessoas mais importantes e atuantes nesta atividade na cidade, acredita que o prefeito Jabes Ribeiro encarrega os empresários de fazerem o trabalho que seria originalmente da Setur e libera poucas verbas para os gestores do turismo local, provocando um fraco desempenho deste órgão,
“(…) o prefeito entende que o empresário é que tem que promover. ‘Não dou um tostão!’, é o que ele diz, e acabou. A Ilheustur tem sido fraca. Nós tivemos Sérgio Barbosa, que foi um dos melhores presidentes, tivemos Salles, que era um camarada com prática de Aracaju, foi ele quem fez a praia de Atalaia. No entanto fracassaram. Fracassaram porque sem dinheiro nada funciona, não se trabalha” [114].
Os recursos repassados mensalmente pela prefeitura para a Setur, para o custeio do órgão, a venda do destino, manutenção e viagens, segundo o secretário Romualdo Pereira, é de cinquenta mil reais. Trabalha na secretaria uma equipe reduzida composta por menos de dez pessoas, dentre as quais apenas um técnico.
É importante observar que o prédio oficial da Setur, situado em um local estratégico para o atendimento turístico, na área central da cidade, em frente a uma praça de grande movimento — a Praça Castro Alves — foi alugado para atividades comerciais, há mais de seis anos, pela prefeitura. O funcionamento do órgão foi deslocado para um local próximo ao porto internacional, no final da Avenida Soares Lopes, a quase dois quilômetro do centro da cidade. Essa distância do órgão de turismo do eixo de circulação turística é questionada por muitos agentes turísticos, inclusive por um dos mais antigos, o Barão de Popoff,
“ É justo que uma cidade que queira ser turística, tenha o seu centro de turismo a 3km do centro da cidade? Cabe na cabeça de alguém um negócio desse? (…) E nós temos uma central de turismo que foi feita no tempo de Dário Luiz, que está alugada, até para amigos meus, mas está errado. Porque fazer isso? ”[115]
Cabe observar, que todos os empresários que se instalaram na sede da antiga Ilheustur são pessoas ligadas ao staff da prefeitura.
A este respeito, o Secretário de Turismo de Ilhéus informa que está implementando postos de informação turística em todas as áreas da cidade. No verão de 2003, foi colocado um posto temporário na Praia do Sul, em março foi inaugurado o primeiro posto permanente na Praça Dom Eduardo (centro da cidade) e está sendo construído um outro próximo a Itabuna, para dar suporte às pessoas que estejam chegando via terrestre. A Setur ainda pretende colocar um ponto de informações no Aeroporto Jorge Amado. Apesar de existir um posto turístico na rodoviária, cuja administração é privada, este quase não fica aberto.
A Associação de Turismo de Ilhéus, composta pelos empresários do trade[116] ilheense foi fundada há 13 anos. Durante anos funcionou muito bem, mas a crise do turismo em Ilhéus ocasionou a sua paralisação no começo de 2003, em decorrência de uma grande inadimplência no pagamento da taxa de contribuição mensal, que era de apenas R$ 15,00. Os hoteleiros não conseguiram manter as mensalidades em dia e assim tornou-se impossível pagar o salário do secretário e o aluguel do espaço. O trade turístico é composto por proprietários de hotéis, pousadas e afins, restaurantes, agências de viagens e locadoras de veículos. Enfim, todos os empresários que investem no turismo da cidade. Elza Muniz, pousadeira de Olivença, tem outra interpretação para a desativação dessa associação,
“ (…)a maior reação do turismo em Ilhéus foi fechar a Atil, porque era uma mentira (…)A gente vai para uma reunião, combina uma coisa e não acontece. Falta coragem para ir pedir ao Prefeito o que se precisa, (…) principalmente se existe ligação política( …)” [117].
O fechamento da Atil é compreendido por Elza como um ato de manifestação dos empresários do trade turístico ilheense, contra o descaso da prefeitura com a atividade: “Ninguém está pagando porque não está havendo retorno nenhum, nenhuma divulgação foi feita e não recebemos nenhuma ajuda da Prefeitura”.[118] No entanto, a pousadeira observa que a Prefeitura tem cobrado aos empresários do turismo as taxas (vigilância sanitária, ISS e outras) em dias.
A insatisfação dos empresários do trade com a administração pública e a desesperança na atividade turística têm como causas principais, segundo eles: o descaso do poder público; o fato de Ilhéus ser uma cidade tradicionalmente burguesa, fechada em seus valores, portanto o oposto do que o turista busca, que é a liberdade de expressão; e a acomodação ou ‘covardia’ dos próprios empresários do turismo, seja pela cultura cacaueira, da qual sempre se espera que caiam do céu os ‘frutos de ouro’, seja por uma tradição política das pequenas cidades brasileiras de perseguição política, caso alguém se coloque contra as ações ou linhas do governo.
A falta de união com a Prefeitura de Ilhéus é um dos principais fatores da indignação dos empresários turísticos ilheenses. Hélio Barroco, coordenador do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, analisa que isto ocorre por conta da falta de visão política da administração local, não somente do prefeito atual, e por isso não se consegue fazer parceiras com o trade: “ a prefeitura vive em conflito com os empresários do trade” [119]. Outro motivo apontado para esta desunião é a falta de compromisso com as decisões tomadas conjuntamente. A pousadeira Elza Muniz, uma das mais revoltadas com a ausência de fidelidade do governo com o grupo revela,
“ Não existe um compromisso. (…) É possível fazer um trabalho, mas não há uma integração entre as duas partes. Hoje não sei como está mais a Setur, porque estamos os empresários de um lado e eles do outro, todos estão perdidos, cada um cuidando de si” [120].
Elza Muniz, que foi administradora de Olivença durante dois anos, cita como exemplo uma solicitação feita por ela própria ao prefeito Jabes Ribeiro, durante uma reunião, que incluísse no orçamento de Ilhéus uma verba para terminar o calçadão de Olivença. Ele respondeu que não seria necessário incluir esse custo no orçamento, pois com pouco recurso esta obra poderia ser realizada rapidamente. No entanto, quatro anos se passaram e nada foi feito. A solução dada pela população de Olivença é que cada um dos moradores fez o pedaço de passeio na frente da sua casa, cada um diferente do outro.
Para que o turismo em Ilhéus se desenvolva, os agentes da área são unânimes em apontar o entendimento entre os setores público/privado, com papéis claramente definidos e um comprometimento sério entre a rede de empresários do trade turístico e o poder Municipal, como necessidade prioritária. Reconhecem que, para tanto, seria necessário um chefe do executivo com interesse no desenvolvimento desse importante setor da economia, que utilize as verbas da secretaria em prol do desenvolvimento específico do setor. O pousadeiro Leonardo Diniz, reflete que o discurso do governo de estímulo as parcerias tem servido apenas para calar a boca de muita gente, que deveria estar exigindo seus direitos. Diniz provoca,
“ (…) e mais ainda, deveria estar cobrando pelos deveres que os órgãos públicos têm de cumprir, principalmente na condução da coisa pública, saúde, limpeza urbana, educação, etc, etc..., Secretaria de Turismo, Opa!!!... eu falei Secretaria de Turismo... O que é isso mesmo?? Alguém poderia me explicar qual é mesmo sua função/obrigação?”[121]
A administração pública municipal é a mais criticada pelos empresários turísticos ilheenses. O maior motivo para isso é que os empreendedores percebem que nada está sendo feito, para que a atual situação de crise mude. Hans Scheappi considera que coisas simples não são feitas, como a conservação da estrada para a Lagoa Encantada, com apenas cinco quilômetros de extensão, “(...) os taxistas se negam a levar o turista lá, como aconteceu outro dia aqui, então poucas agências recomendam o passeio. É uma pena. É a maior atração ecoturística da Costa do Cacau“[122]. Concordando com essa opinião, Zaira Maria Garcia, sócia gerente do Village Indaiá, ainda acrescenta: “Para o turismo se desenvolver em Ilhéus, é preciso ter uma administração mais interessada, com cursos de preparação de mão-de-obra, e maior divulgação” [123].
A grave crise do turismo ilheense é preocupante para Schaeppi, diante das privações vividas pelos proprietários de pousadas de Olivença durante a baixa estação, porque às vezes ficam o mês inteiro sem receber um só hóspede. Muitos restaurantes, bons e tradicionais, fecharam nestes últimos dois anos, como Os Velhos Marinheiros, que tem em seu terreno o Obelisco, um marco histórico de Ilhéus. O empresário acredita que se o prefeito desejasse, tudo seria diferente: “Está faltando vontade do Prefeito, porque se ele tivesse vontade política de fazer o turismo crescer, do jeito que ele é inteligente, poderia fazer. Mas não há meios dele entender” [124]. A alternativa encontrada por muitos pousadeiros foi a busca de outras rendas, já que a atividade do turismo não tem oferecido perspectiva.
A falta de visão política sentida pelos empresários ilheenses é diagnosticada por Hélio Barroco como falta de capacitação dos administradores públicos. O coordenador do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC acredita que em Ilhéus e nos municípios da região, administradores assumem determinada função sem nenhuma experiência. Assumem toda a responsabilidade por conta das circunstâncias e não contratam pessoas que lhes dêem apoio, com consistência científica para se fazer o turismo. Barroco afirma que eles não utilizam os dados que a UESC produz, fundamentais para o planejamento turístico e para a formatação de produtos, como pesquisas sobre os turistas nas cidades da região: estudos sob o nível de renda, nível cultural e cidades de procedência.
No entanto, a falta de união de empresários do trade com a prefeitura não é o único fator negativo, segundo depoimentos, a própria classe hoteleira é desunida e por isso torna-se ainda mais fraca. Juntos poderiam ter força para organizar o turismo na cidade ou mesmo para reivindicar melhorias de forma mais organizada frente a prefeito, deputados e governador. Esta desunião é motivada, segundo os próprios empreendedores turísticos locais, pela acomodação dos empresários do trade com a situação crítica em que se encontram. Esta acomodação é avaliada pelo agente de viagens Barão de Popoff como fruto da monocultura cacaueira, para a qual ninguém precisava de ninguém,
“você colhia mil arrobas, eu colhia duas mil, o outro colhia quatro mil, nós vivíamos encastelados, dentro das nossas arrobas. Isso foi um negócio muito sério. E aí quando houve a derrocada do cacau, nós perdemos tudo e continuamos covardes, ou por falta de luta ou porque ninguém precisava de ninguém. Não se precisava lutar muito, o cacau foi uma coisa divina, você podia morar onde quisesse e pelo telefone mandava limpar as partes da roça que queria e no outro ano ele estava dando alguma coisa. Isso tornou Ilhéus uma cidade formada por pessoas que não reivindicam” [125].
A união das cidades turísticas da Costa do Cacau (Itacaré, Uruçuca, Ilhéus, Una e Canavieiras) é também uma saída, citada pelo secretário de turismo Romualdo Pereira, para o desenvolvimento da atividade na região. Segundo Pereira, Ilhéus já está realizando um trabalho em conjunto, dividindo os stands de feiras de turismo nacionais com cidades da Costa do Cacau. A Secretaria de Turismo almeja aumentar a permanência do turista na região, de 4 ou 5 dias, para 7 ou 8 dias, de forma que Ilhéus seja uma espécie de ‘cidade mãe’ na Costa do Cacau, pois trata-se de uma cidade maior, com uma maior estrutura, aeroporto, porto, e se beneficiaria com esta parceria com os outros municípios, que têm um potencial muito grande, sobretudo Itacaré e Canavieiras.
O Conselho Ilheense de Turismo (Citur) é formado pelos presidentes do Rotary, do Lyons, da Associação Comercial, e representantes turísticos locais. Mais do que uma representação do trade turístico, é uma organização ativa da comunidade ilheense, com ações voltadas para o turismo. Segundo seu presidente, Hans Schaeppi, o Citur funciona porque não depende de dinheiro. O Conselho faz os contatos de maior importância para a infraestrutura turística da cidade. Segundo Schaeppi, “(…) foi o Conselho que conseguiu praticamente a construção do Centro de Convenções, e agora está lutando pela reativação do Museu Regional do Cacau”[126].
O Convention Bureau de Ilhéus foi criado após a inauguração do Centro de Convenções da cidade, em 2000, em articulação da antiga Ilheustur (ainda sob a presidência de Sérgio Barbosa) junto a Secretaria da Cultura e Turismo do Estado, com o objetivo de captar eventos de grande porte, manter um calendário permanente de atividades neste centro e criar um fundo financeiro para o desenvolvimento da atividade turística na cidade. Hans Schaeppi[127], também integrante do Convention Bureau de Ilhéus, analisa que o Convention ainda não está dando certo por falta de dinheiro e de captação, mas que tem como estímulo o Convention Bureau de Salvador, que cresceu muito nos últimos dois anos e está funcionando muito bem. Segundo ele, Salvador hoje é o maior pólo do norte e nordeste de eventos, e o quarto do país em captação. Em três anos de ativação do Centro de Convenções de Ilhéus, o Convention Bureau da cidade captou poucos eventos nacionais e não criou nenhuma atração que assegurasse um fluxo turístico significativo.
A ineficiente atuação desse Centro é criticada por muitos. Sérgio Barbosa, ex-presidente da Ilheustur, avalia, “(…) o Centro de Convenções era para ter uma concepção moderna, como uma ferramenta, uma fábrica de eventos. Mas ele tem uma série de operários desqualificados, a produzir o nada” [128]. A equipe administrativa do Centro é formada por pessoas ligadas à prefeitura e ao seu ‘esquema’ político, e o calendário foi preenchido até agora, quase que totalmente, com shows, festas, formaturas e eventos locais.
POLÍTICAS E ESTRATÉGIAS
As ações da Prefeitura de Ilhéus voltadas para o desenvolvimento do turismo, tendo os governos federal e estadual como parceiros, serão o objeto central deste tópico. As políticas e estratégias atuais da municipalidade serão analisadas nos seguintes aspectos: Planejamento, Infraestrutura, Recursos Financeiros, Participação Comunitária e Promoção.
Planejamento
A política de turismo da Prefeitura de Ilhéus não é bem definida por seu prefeito, que ao ser interrogado sobre esta questão apresenta como resposta um elenco de ações e projetos isolados. O secretário de Planejamento do município, Antônio Vieira, tem discurso semelhante ao do Prefeito Jabes Ribeiro, sem qualquer referência a um planejamento ou a uma estratégia global de desenvolvimento turístico. No entanto, a Ilhestur elaborou em 2001 um plano estratégico de turismo de Ilhéus em parceria com a Zorthea Consultoria e Treinamento, uma empresa de consultoria da cidade.
O Plano Estratégico do Turismo de Ilhéus se resume a uma listagem bem feita de todas as necessidades da cidade para o desenvolvimento turístico, sem uma integração das diversas atividades através da definição de metas, estratégias e prioridades. Este plano prevê projetos para infraestrutura, fomento do turismo na cidade, criação de atrativos turísticos, estruturação e formatação de produtos turísticos, promoção da cidade, promoção de eventos específicos e convenções. Um projeto que levanta as ações necessárias, para que a potencialidade turística de Ilhéus seja explorada, já que a terra ‘jorgeamadiana’ tem um forte potencial turístico, com a possibilidade de desenvolver simultaneamente o turismo cultural, histórico, ecológico, rural, de eventos, de negócios, náutico, de pesca oceânica, e outros. Uma proposta que prevê também a integração da comunidade no processo de implantação das ações. O Presidente da Setur, Romualdo Pereira, destaca a importância do plano, “(…) fizemos um planejamento para tentar colocar o turismo dentro de uma linha de ação onde a gente possa desenvolver um trabalho mais profissional, porque as coisas estavam sendo feitas muito na base do amadorismo” [129]. No entanto, apesar de ter sido divulgado e disponibilizado no site do órgão de turismo do município, este plano estratégico nunca foi implementado.
Apesar da cidade estar sendo estimulada, há mais de vinte anos, para o desenvolvimento do turismo, a realidade não apresenta os resultados desses esforços. O Prefeito afirma que em Ilhéus todos são iniciantes nesta área, Prefeitura e trade, “acho que todos estamos aprendendo, não apenas o poder público, mas a própria iniciativa privada, o chamado trade turístico também enfrentou e vem enfrentado uma mudança cultural” [130]. A própria universidade foi apontada pelo prefeito como uma das instituições que também tem se esforçado no sentido de participar desta reflexão, mas de maneira incipiente.
O Prefeito Jabes Ribeiro, que já está no poder há sete anos consecutivos e anteriormente já esteve neste cargo por outros seis (de 1981 a 1986), reconhece que, na verdade, só despertou para a necessidade de tratar de forma profissional o turismo a partir da década de 90. Antes disso, o cacau resolvia tudo, supria todas as necessidades. Sérgio Barbosa, falando sobre sua experiência como secretário de turismo de Ilhéus, diz que o planejamento do turismo deve ser um consórcio entre o poder público e a iniciativa privada, e que foi testemunha de que o município tinha pouca concepção do território, do poder que exerce sobre o território e uma postura conservadora sobre esta questão, sobretudo porque, segundo ele, o poder municipal em Ilhéus está nas mãos de pessoas tidas como progressistas, mas que são tão conservadoras quanto foram os coronéis,
“ (…) A concepção do poder municipal é antiquada, é voltada para o assistencialismo (…) a idéia desenvolvimentista foi muito mais centrada na agricultura e na industrialização, no parque industrial. Muito antiquado. Mesmo para estes não se tinha uma concepção maior. As idéias de concepção do território de Ilhéus carecem de uma modernização de pensamento” [131].
Por falar em atitudes semelhantes aos dos antigos mandantes da região, Hélio Barroco, Coordenador do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, revela que recebeu muitas ameaças do prefeito Jabes Ribeiro por causa de suas pesquisas e posicionamentos sobre o turismo da cidade. Barroco conta que, certa vez, Jabes ligou para a Reitora da UESC, Rennè Albagli, dizendo que iria mandar dar uma surra nele, que estava desrespeitando a sua autoridade. Em outro momento, o prefeito tentou impedir a exibição do vídeo-documentário Praia dos Milionários[132], resultado de uma pesquisa da universidade sobre as condições de funcionamento das barracas e restaurantes de Ilhéus.[133]
A importância da existência de um projeto e da presença de um hábil coordenador no processo de captação de empreendimentos para uma cidade é destacado por Peter Hall, em A Cidade do Empreendimento. Hall fala de projetos bem sucedidos de recuperação de espaços urbanos, que atraíram um novo fluxo turístico e criaram uma nova base econômica nos municípios: a recuperação da orla marítima de Boston (Boston Waterfront) e o cais interno (Inner Harbor) de Baltimore. Nos dois casos, Hall observa que o agente chave em ambos projetos foi James Rouse, que liderava grupos financeiros de elite, e coordenava a revitalização de espaços urbanos. Assim, uma nova elite financeira tomou posse das cidades. O projeto de Rouse se diferenciava dos muitos outros que surgiam. Ele era realizado em um grande espaço na cidade que oferecia combinações de atividades, recuperava e reciclava antigas estruturas físicas para novos usos, e envolvia um comprometimento público e federal de grande porte. Uma verdadeira fórmula de sucesso que tinha em sua base a subvenção federal, uma nova visão de investimento do setor público sobre empreendimento lucrativo, e uma cooperação efetiva entre empreendedores dos setores público e privado. Em ambas as cidades, o projeto foi levado a termo por sagazes e bem estabelecidos prefeitos democratas, que mantinham boas relações com os bairros.
Em Ilhéus é necessária uma ação planejada e, talvez, até mesmo a utilização de uma estratégia radical, que Peter Hall recomenda, para redinamizar as cidades com economia combalida,
“(…) ‘nenhuma receita pode realmente operar milagres em certas áreas’(...) Se realmente quisermos socorrer as áreas intra-urbanas e as cidades em geral, talvez tenhamos que usar (…) um remédio extremo, a que eu daria o nome de solução Porto Livre. Áreas intra-urbanas, pequenas e seletas,(…) abertas a todo tipo de empreendimento, com um mínimo de controle” [134].
Hall cita ainda três elementos importantes para que as cidades possam voltar a produzir: abertura à imigração de empreendedores, burocracia reduzida, e a moradia no seio do empreendimento como uma opção. Um remédio heterodoxo, como ele intitula, que seria uma solução para a revitalização de uma área, entretanto, não para os males urbanos. Diz ainda que este seria“ um modelo, e modelo extremo, de uma solução possível” [135].
Nesse sentido, deve-se reconhecer que a Prefeitura Municipal de Ilhéus através da Ilheustur fez um esforço no sentido de elaborar um plano turístico para a cidade, em 2001, pois a partir daí poderia ter se dado início a uma fase de empreendedorismo no município. No entanto, pode-se claramente observar, que todos os prazos que constam nesse plano já foram extrapolados, o último seria no ano de 2002, e uma nova situação não se configurou. Ou seja, o plano não saiu do papel até hoje, a Prefeitura não contou com uma equipe capacitada para implementar esse amplo projeto.
Hélio Barroco, avalia que Ilhéus não passa hoje de uma cidade de veraneio, porque falta planejamento por parte do governo e por parte dos empresários, “(…) Ilhéus tem tudo para ser um local encantador, desde quando tivesse um projeto para curto, médio e longo prazo, com um equipe multidisciplinar. O problema de Ilhéus é falta de visão política, falta de investimento, porque não existe planejamento” [136].
A realização de obras em pleno verão é um fator muito observado como resultante dessa falta de planejamento e como falha da administração pública. Em plena alta estação, em 2003, não foram concluídas obras como o calçadão do Quarteirão Jorge Amado, previsto para ser inaugurado em agosto de 2002, e o Bataclan, prometido para o mesmo mês. A central de turismo passou onze meses sendo construída ao lado da Catedral e foi inaugurada em fevereiro. O Balneário Tororomba em Olivença estava fechado em pleno verão, porque estava sendo construída uma terceira piscina. O Teatro Municipal esteve fechado durante as férias. Atualmente, o único espaço municipal que está funcionando é a Casa de Cultura Jorge Amado. Outro exemplo de falta de planejamento é observado por Elza Muniz, a respeito do funcionamento do comércio e dos pontos turísticos, como a Casa Jorge Amado, no verão: “na hora que o sol fica mais brando, que o tempo está mais fresco para o turista ir às ruas, já fechou o comércio” [137].
Infraestrutura
Além do plano estratégico, existe a necessidade de uma boa infraestrutura em uma cidade que queira desenvolver a atividade do turismo. A Pesquisa de Demanda Turística de Ilhéus realizada pela Bahiatursa, em 2002, indicou que 93,7% dos brasileiros entrevistados já estiveram em Ilhéus, e a grande maioria destes acha que a cidade permanece igual à sua última visita, tendo sido esta mesma impressão de 41,4% dos baianos entrevistados. O aspecto que menos agradou aos turistas foi a limpeza pública, citada por 28,6% deles [138].
A região norte da cidade, que é habitada predominantemente pela população mais carente, tem sido a área mais privilegiada pelo governo municipal, sendo visível, nos últimos anos, a urbanização realizada pela prefeitura. A Orla Norte, foi recentemente pavimentada e iluminada, as cabanas de praias revitalizadas. Na Avenida Luis Eduardo Magalhães foram instalados equipamentos desportivos, restaurantes e ciclovia. As praças do centro da cidade foram recentemente equipadas com parques infantis (no segundo semestre de 2003). No entanto, na zona sul, a mais frequentada por turistas em Ilhéus, não há uma infraestrutura adequada à intensidade de seu movimento: só existe uma ponte interligando a cidade ao sul da Costa do Cacau; a pavimentação é precária; encontra-se também sem iluminação, segurança, acostamento, passeios ou barracas padronizadas. Um grave problema é que encontra-se nesta área, durante mais de 20 anos, o lixo da cidade (o ‘lixão’), que impossibilitou o Cururupe, cartão postal da cidade, de continuar a ser bem freqüentado e de atrair empreendimentos.
Segundo os atuais secretários do Turismo e de Planejamento da Prefeitura, Romualdo Pereira e Antônio Vieira, a situação precária da orla sul está com dias contados, pois além da retirada e transferência do lixão para um aterro sanitário na região de Itariri, na estrada de Uruçuca, cujo prazo máximo estipulado - final de março - já foi ultrapassado, está em andamento o Projeto Orla. Este projeto, que inclui a reurbanização do trecho que vai do Cururupe a Ilhéus, abrangendo toda a orla do Pontal, a construção de uma nova ponte e a criação de uma terceira pista na Avenida Soares Lopes. Segundo a Setur, o processo de licitação já foi finalizado, tendo sido ganho por duas grandes empresas de nível nacional, a Camargo Correia e a Odebrecht. Romualdo Pereira, secretário de Turismo de Ilhéus, afirma que, “ O Prefeito Jabes Ribeiro está trabalhando no sentido de viabilizar os recursos para que o projeto se concretize” [139]. A justificativa que a prefeitura oferece, para estar priorizando a zona norte, é que a área para urbanização da orla sul é muito maior, e consequentemente, o seu projeto muito mais caro.
Anualmente, doze navios turísticos atracam no Porto Internacional do Malhado, em Ilhéus, cada um com uma média de 1.700 passageiros, e 3.840 vôos aterrissam no Aeroporto Jorge Amado[140]. Embora se contabilize este número expressivo de chegadas, não há uma infraestrutura adequada nem pessoal qualificado para receber os turistas estrangeiros que chegam, principalmente no porto, que nem dispõe de uma área específica para o receptivo.
As dificuldades em dotar a cidade de Ilhéus de uma boa infraestrutura é destacada por Jabes Ribeiro: “O turismo é sem dúvida uma atividade que não se consolida de uma hora para outra. Mesmo Ilhéus tendo vocação natural para o turismo, teria de haver uma grande infraestrutura, pela sua condição geográfica, por suas belezas naturais” [141]. Jabes Ribeiro e os secretários de Planejamento e Turismo justificam esta falta com outra, a de recursos. Segundo eles, no momento em que se precisou mais investir, na década de 90, houve uma redução de arrecadação do município - sonegação de mais de 50% da taxa de IPTU, uma baixa arrecadação de ISS da hotelaria, enfim uma queda da arrecadação total, em termos absolutos, de 50%. Ilhéus tem hoje um ICMS equivalente à metade do que recebia na década de 80. Ilhéus, Itabuna, Jequié e Conquista, segundo o presidente da Setur, Romualdo Pereira, têm conjuntamente aproximadamente um milhão de habitantes, e um valor de ICMS menor do que a cidade de São Francisco do Conde, que tem 26 mil habitantes.
A crise financeira é apontada como causa principal dessa imensa dificuldade que vem atravessando o governo municipal em infraestrutura e alavancar projetos da cidade. O prefeito se defende,
“As demandas todas cresceram e a nossa capacidade de resposta ficou muito pequena em função da crise do cacau, que provocou diminuição profunda em nossa atividade econômica(...) já não se pode fazer muitas vezes nem o mínimo necessário. Por isso é fundamental ter uma grande articulação a nível de Estado e do Governo Federal” [142].
A esse respeito, Sérgio Barbosa comenta: “enquanto os empresários choram do poder municipal, estes choram do poder federal e do estadual” [143]. É de conhecimento geral que o governo federal (o Ministério do Turismo e a Embratur), o governo estadual (a Secretaria da Cultura e Turismo do Estado, e outros órgãos públicos) e bancos privados (nacionais e internacionais) disponibilizam linhas de créditos voltadas para o suporte da atividade turística, necessitando-se apresentar um projeto bem elaborado e, muitas vezes, uma contrapartida municipal ou estadual para obtê-los. O Governo da Bahia, por exemplo, segundo dados da Secretaria da Cultura e Turismo, oferece duas linhas de crédito: a Pró-Turismo, para construções, instalações, maquinário e equipamento, transporte rodoviário e marítimo para turistas, equipamentos para esportes e lazer, e pequenos terminais marítimos, onde o valor do financiamento pode chegar a 70% do total do investimento (60% no caso de hotéis e restaurantes); e a Pró-Bahia, que oferece isenção dos recursos de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para promover a instalação de novas empresas no Estado. Nesta última, o valor pode chegar a 75% do total do investimento, com seis anos para pagar, três de carência, e 12 a 25% de redução no ICMS para a taxa de energia elétrica[144]. Sérgio Barbosa exemplifica: “A concepção de desenvolvimento é semelhante à necessidade de um médico, depende do que você tem para saber em que médico você vai. Os programas de desenvolvimento também são assim (…) existem uma infinidade deles, cada um com uma finalidade (…)” [145].
Ainda para Sérgio Barbosa, atualmente assessor especial da Secretaria da Cultura e Turismo, quando Ilhéus começou a se voltar para o turismo não existia nenhuma concepção turística, “não tinha, e continua a não ter, porque o Prodetur I - Programa de Desenvolvimento Turístico, iniciado em 1991, rendeu muito pouco para Ilhéus”[146]. O Prodetur é um empréstimo que o governo do Estado faz junto ao BID – Banco Internacional de Desenvolvimento, para atender a um elenco de projetos desenvolvimentistas que se incluam na linha de financiamento desse banco. O BID liberou, em 1991, um total de US$400 milhões para o turismo no Nordeste, dos quais a Bahia recebeu US$140 milhões. Nestes vinte anos de incentivos, cidades como Porto Seguro, Lençóis e Valença souberam elaborar um plano para a criação de infraestrutura turística visando a utilização de verbas do Prodetur I. Ilhéus, por não ter naquela época uma concepção clara do que queria, foi muito pouco contemplada com esses recursos, obtendo verbas apenas para a construção de um Centro de Convenções e para executar parte do seu projeto de saneamento básico. Com o Prodetur II (2003), o município pretende conseguir investimentos para a construção da segunda ponte Ilhéus-Pontal, do Pavilhão de Feiras do Centro de Convenções, do anel rodoviário e para o saneamento básico da orla sul. A unidade executora do Prodetur na Bahia é o Sudetur (Superintendência de Desenvolvimento de Turismo da Secretaria da Cultura e Turismo do Estado da Bahia).
Recursos Financeiros
Com relação ainda aos investimentos da prefeitura no turismo, Antônio Vieira[147], o secretário de Planejamento do município, afirma, surpreendentemente, que é impossível quantificar os investimentos nesta área, pois, segundo ele, os gastos em outras áreas implicariam nesta também. Vieira revela que o orçamento mensal de Ilhéus é de R$8 milhões, mas o recurso para investimentos resulta praticamente em zero, pois ao tirar as obrigações de verbas tributárias, como FGTS e outros, folha de pagamento dos funcionários da prefeitura, sobra muito pouco, de R$600 a 700 mil, para fazer toda a manutenção da cidade, e o custeio da prefeitura. Por sua vez, Romualdo Pereira, da Setur, consegue quantificar os gastos com o turismo na cidade, afirmando que, em 2001, foram investidos no turismo de Ilhéus, incluindo o saneamento básico e a construção do Centro de Convenções, R$50 milhões, e em 2002, R$30 milhões. Ele faz ainda uma projeção dos gastos até 2004, de algo em torno de R$60 e 70 milhões, incluindo os recursos provenientes do Prodetur.
A iniciativa privada também é responsabilizada, quando o assunto é a falta de recursos. Poucos empresários locais têm verbas para montar empreendimentos capazes de alavancar o desenvolvimento turístico. Edney Espirito Santo, proprietário do Hotel Opaba e do Canabrava Resort, é um dos empresários mais empreendedores da cidade e está fazendo um investimento na Praia de Batuba em Olivença, que é visto como única saída para levantar o fluxo turístico da vila. O novo empreendimento (que engloba restaurante, bar e boate), deve ser inaugurado ainda no segundo semestre de 2003. Elza Muniz pousadeira de Olivença comenta, “se esse complexo turístico for inaugurado a gente vê uma saída para Olivença. (…) Se Edney não mudar o esquema...As perspectivas daqui acho que não são muito boas” [148].
Popoff constata que os prefeitos nunca acreditaram no turismo ilheense e nem fizeram com que esta atividade se expandisse na cidade, porque pouco investiram nela: “O turismo não decola, porque a cidade não decola, porque a prefeitura não faz com que a cidade decole. (…) um dia o Prefeito disse para um diretor da Ilheustur: - Se virem! Tenham idéias! ”[149] Agente de turismo há 27 anos, Popoff avalia que não se faz turismo através apenas de idéias, mas sobretudo com investimentos financeiros: “ (…) uma grande cachoeira, uma coisa bonita lá no meio do mato, se não gastar para abrir uma boa estrada, ela jamais será vista. Ela sozinha não faz nada (…)” [150].
As políticas públicas nacionais para o desenvolvimento do turismo, também são alvo de críticas da prefeitura de Ilhéus. A falta de apoio e de projetos do Ministério do Turismo e da Embratur, segundo Jabes Ribeiro, dificultam o trabalho local,
“Ilhéus tem potencial turístico, então porque não fazermos um projeto global e trabalharmos todos para que a cidade avance? Mas isso é o resultado de um país pobre, com municípios com poucos recursos, de uma iniciativa privada que quer resultados imediatos e por isso as coisas não andam na velocidade que nós desejaríamos” [151].
A ausência de visão turística do governo federal também é apontada por Romualdo Pereira,
“Não conseguimos ainda que o governo federal entenda que o turismo é uma coisa importante para a economia local. Ele não consegue nem fazer com que as férias escolares sejam compatíveis com o verão, pois no meio dele, o turismo é interrompido pela abertura do ano letivo e cidades como Ilhéus ficam vazias ” [152].
Entretanto, a política do governo estadual para o turismo é elogiada pelos gestores desta atividade. Romualdo Pereira acredita que a Bahia está muito desenvolvida e crescendo muito como destino turístico nacional, graças ao desempenho e ao trabalho continuado, de muito tempo de Paulo Gaudenzi, embora faça uma ressalva, “ sabemos que ainda falta muito para alcançarmos o que seria o objetivo de sermos um grande pólo turístico mundial” [153].
Participação Comunitária
A participação da comunidade é considerado de importância vital para o turismo de uma cidade, de uma região ou de um país, pois é através da comunidade que os projetos se sustentam e é para ela que se busca o desenvolvimento. O envolvimento da comunidade no desenvolvimento turístico é uma questão atual e muito polemizada por estudiosos e gestores turísticos. Elizabeth Loyola, pesquisadora e professora da Escola de Administração da UFBA, acredita que para existir um turismo sustentável tem de haver sustentabilidade social, “com a participação do cidadão no processo de desenvolvimento para assegurar um padrão negociado e mais estável de crescimento, e menos desigual em termos de renda e de qualidade de vida” [154]. A resistência ao desenvolvimento do turismo na cidade é destacada pelo secretário de Turismo de Ilhéus, Romualdo Pereira, que acredita que se o turismo fosse visto positivamente pela comunidade ilheense, poderia se consolidar como uma real solução para a economia local, “…se formos quebrando algumas resistências, se conseguirmos viabilizar alguns projetos importantes, como o da Lagoa Encantada e o da Avenida” [155]. Para o secretário, a quebra desta resistência através da conscientização da prefeitura, da comunidade, do empresariado e do próprio governo federal, de que o turismo é realmente um segmento importante da área econômica, seria fundamental para a estruturação da atividade turística na cidade e no país.
Salvador Trevisan, professor do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, crê que é preciso que a comunidade esteja preparada em dois aspectos: de preservar a cidade do visitante que não a respeite, e ao mesmo tempo valorizar a sua própria cultura, para não perder a sua identidade. Pesquisadores da Universidade de Santa Cruz defendem um turismo sustentável, onde haja o respeito ao cidadão, onde se considere os seus anseios e onde se faça uma administração e um planejamento participativos. Acreditam que só dessa maneira, as pessoas que forem resistentes ao turismo terão a oportunidade de mudar suas atitudes, uma vez que participarão das discussões sobre o destino da cidade. Maria de Lourdes Simões, por exemplo, ressalta o modelo de desenvolvimento turístico europeu, de sustentabilidade, do turismo interpretativo e da participação integrada com a comunidade. Ela acredita que se a comunidade não participar das decisões, os planejamentos não funcionarão, porque os seus resultados serão efêmeros e superficiais,
“É a comunidade que faz acionar e não tem sentido desenvolver um turismo na região se não for para beneficiar esta comunidade. Tem que fazer um turismo com cidadania, com inclusão, olhando a questão do cidadão, sobretudo dos excluídos, que podem ser incluídos nesse processo…” [156].
Maria de Lourdes analisa que a comunidade ilheense se retrai, porque ela não se sente ouvida nem respeitada, pois todas as decisões são tomadas de cima para baixo. Considera, portanto, que uma comunidade quer ter voz ativa nas decisões, porque é o seu cotidiano que está sendo decidido. A professora conclui a sua reflexão considerando que o poder público é circunstancial, ou seja, de quatro em quatro anos ele muda, e só a comunidade pode dar continuidade aos planejamentos.
Enquanto a secretaria de turismo de Ilhéus e os acadêmicos ilheenses acreditam que a participação da comunidade no processo turístico é fundamental, o geógrago Clímaco Dias tem uma opinião de que o apoio da sociedade de determinado destino turístico não é um fator necessário. Ele explica que a comunidade tende a conservar os seus espaços como preservação identitária, evita espaços turísticos, por terem fama de serem os mais caros e porque o turista geralmente tem uma atitude superficial, que é evitada pela comunidade local. Citando Renato Ortiz, ele estabelece uma diferença entre o turista cosmopolita e o turista de massa,
“O cosmopolita, quer apreender cultura e fazer o seu ‘cadinho’ de cultura. Ele pode ser encontrado num ensaio do Olodum ou numa cerimônia do candomblé sozinho. O turista de massa não, mesmo que vá ao candomblé, ele apenas consome aquela cultura, como um produto ou mercadoria, de forma descontextualizada. Leva um berimbau de Salvador, sem saber ao certo o que é. Com este turista a população evita contato e ele próprio não está interessado em conhecer as pessoas da cidade. Enquanto o outro se mistura um pouco na sociedade”[157].
A partir dessa reflexão, Clímaco Dias conclui que é muito difícil existir uma real interação entre o turista e a comunidade do local visitado, sendo esta uma utopia dentro dos padrões atuais.
Promoção
A promoção e divulgação da cidade de Ilhéus nos principais pólos emissores turísticos é o grande questionamento dos empresários do trade junto à prefeitura. Os empreendedores do turismo ilheense acreditam que isto seria de fundamental importância para fortalecer Ilhéus como destino. A Pesquisa de Demanda Turística de Ilhéus da Bahiatursa, realizada em janeiro e julho de 2002, com 527 entrevistados, identificou que 97% das pessoas que estavam visitando Ilhéus eram brasileiros e apenas 3% estrangeiros. Os principais pólos emissores nacionais de turista para a cidade são, primeiramente, o próprio estado, com 26,9%, seguido de São Paulo com 22,8%, Minas Gerais com 11,8%, e Distrito Federal com 11,6%. Os pólos internacionais mais importantes, Argentina, França e Estados Unidos tiveram participação igual, 0,6% do total.
Alguns pesquisadores da UESC discordam que a divulgação seja a ação turística mais importante e urgente a se realizar. Hélio Barroco conta que a Prefeitura de Ilhéus contratou uma empresa de Noberto Odebrecht, que trabalha com assessoramento de marketing turístico, para fazer um projeto de marketing para a cidade. Um pessoal que, segundo ele, nunca havia ido a Ilhéus. Barroco avalia que fizeram um excelente trabalho, mas que qualquer outra empresa faria, não reconhecendo portanto a necessidade de se ter contratado aquela empresa tão especializada e cara. Durante a exposição do projeto, em 2001, o professor criticou a precipitação da Prefeitura em encomendar essa proposta de divulgação, uma vez que não haviam produtos turísticos formatados, “(…) para mim vocês colocaram o carro adiante dos bois. Vocês vão vender o que, se Ilhéus não tem um produto turístico?” [158].
A atração de investimentos para o turismo é o resultado de uma série de fatores, pois os grandes empresários e as maiores empresas do setor são atraídos por locais que possuam as melhores infra-estruturas, onde o trade e a administração pública tenham desenvolvido eficientes estratégias para o turismo, e especialmente por incentivos oferecidos. Hélio Barroco cita exemplos de organizações que têm procurado investir na região, segundo dados do estudo de demanda da UESC, mas não conseguem se instalar,
“ o Senai trouxe um projeto pronto de um hotel-escola para a região, mais de U$5 milhões para a sua construção e pediu ao prefeito Jabes Ribeiro a doação de um terreno. O prefeito levou cinco anos para dar uma resposta e no final deu um terreno localizado no alto de uma serra. Não se sabe para onde foi o dinheiro e o hotel-escola” [159].
Em contraposição, a cidade de Una, situada próxima a Ilhéus, um lugar com praias belíssimas, oferece uma série de vantagens ao investidor. Além do Transamérica, um novo grupo acabou de se instalar na cidade, tendo conseguido trinta anos de isenção fiscal. O prefeito de Una está atualmente negociando com o governador Paulo Souto uma nova isenção para um grupo inglês, que está interessado em comprar uma ilha para construir um hotel com a capacidade para 2500 hóspedes e um campo de golfe, em sete quilômetros de praia. A perspectiva é que num futuro próximo o município de Una abrigue um pool de resorts de nível internacional. Barroco analisa que, “é preciso ter visão política para construir um destino turístico” [160].
David Harvey destaca a importância dos incentivos para uma cidade que queira atrair novos investimentos, “Atualmente, é muito difícil que qualquer empreendimento imobiliário de grande escala ocorra sem contar com uma substancial ajuda e incentivo por parte do governo local ou por parte de uma ainda mais forte coalizão de forças que constituam a gestão local” [161].
A posição da prefeitura quanto aos incentivos é dada pelo secretário de Planejamento da cidade, Antônio Vieira, “Incentivos para hotelaria é apenas no sentido de trazer o investimento, mas não oferecemos incentivo fiscais” [162]. No entanto, ao demonstrar interesse de trazer determinadas redes de hotéis, o secretário de Turismo de Ilhéus, Romualdo Pereira, tem outro discurso sobre o assunto,
“Nós estamos buscando hotéis de bandeira internacional, através dos incentivos fiscais da lei existente de dois anos de isenção de ISS, que só foi possível porque esta foi criada antes da Lei de Responsabilidade Fiscal. Com esta lei hoje, nenhum prefeito nem governador pode mais dar incentivos a empresários. É uma lei federal que proíbe terminantemente que seja feito este tipo de incentivo para o empresário se implantar” [163].
Como se pode observar, há uma séria divergência de opiniões no âmbito da Prefeitura de Ilhéus, quanto os rumos a serem tomados relativamente à concessão de incentivos fiscais.
Ainda sobre a falta de articulação no interior da Prefeitura no que se refere à captação de investimentos, o ex–secretário Sérgio Barbosa comenta sobre uma experiência vivida na sua gestão (1998 a 2000). Ele, que havia viajado à Espanha atrás de investimentos para a Bahia em 1997, organizou a visita de alguns empresários a Ilhéus, em 1999. Em 2001, estes espanhóis voltaram à cidade e Sérgio Barbosa já não era o presidente do órgão de turismo. Hoje, estes empresários estão investindo na Praia do Forte. Barbosa reflete, “(…) Praia do Forte que teve uma concepção de desenvolvimento de território, ganha um novo investimento” [164]. O ex-presidente da Ilheustur confessa que se movimentou para buscar estes empreendedores, mas que ficou isolado na secretaria de Turismo de Ilhéus durante a sua administração, ”como se a Ilheustur fosse quase um ‘calo’ dentro da administração pública da cidade”[165], pois em nenhum momento sentiu receptividade e conexão com o staff da prefeitura.
AÇÕES EM DESENVOLVIMENTO
As ações da prefeitura voltadas para o turismo de Ilhéus se constituem, até o momento, como projetos isolados: dinamização da Lagoa Encantada; implantação do Quarteirão Jorge Amado; recuperação da Orla Sul; revitalização da Avenida Soares Lopes e do Antigo Porto; e a produção de grandes eventos, como o São João de Olivença, o Festival do Camarão, e o Carnaval Cultural. A seguir, estas ações serão analisadas de forma agrupada, em função dos diversos segmentos do mercado turístico, com exceção do Turismo Cultural que será objeto de estudo da quarta parte deste trabalho.
Ecoturismo
A futura base da política de desenvolvimento turístico da Bahia é a política de proteção ambiental, segundo a Secretaria da Cultura e Turismo. Existem atualmente em todo o Estado: 25 APA’s (Área de Proteção Ambiental); 3 Parques Nacionais, 9 Estaduais e 7 Municipais; 5 reservas florestais, 2 estações ecológicas e 8 reservas florestais particulares. Segundo a Secretaria da Cultura e Turismo, todas estas áreas somadas (24.056 km2) eqüivalem à área total do Estado de Sergipe e ao dobro da área destinada à proteção ambiental pela Costa Rica, país exemplar em ecoturismo. Na Costa do Cacau estão a Reserva Biológica de Una, a Reserva Ecológica da Prainha em Itacaré, e as APA’s de Itacaré/Serra Grande e da Lagoa Encantada, em Ilhéus.
A Lagoa Encantada é considerada, por unanimidade, um produto turístico “perfeito”. O prefeito, o secretário de Planejamento e, principalmente, o secretário de Turismo, apostam neste produto e elegem-no como o ponto de partida do plano estratégico do turismo ilheense. Jabes Ribeiro afirma que já existe um projeto para a Lagoa, mas faltam recursos e empreendedores. As secretarias de Planejamento e de Turismo já terminaram o Plano de Referência Urbanística e Ambiental (PRUA)[166] da vila central da Lagoa Encantada, Areias, em parceria com a Sudetur. Atualmente, segundo os secretários Romualdo Pereira e Antônio Vieira, está sendo concebido o plano estratégico da Lagoa, com base naquele elaborado pelo PRUA, na tentativa de inseri-lo no conjunto de projetos já encaminhados, não só para o Prodetur II, mas também para outras linhas de financiamento, como a do Banco Mundial. Depois do plano de Areias, a equipe vai se concentrar no projeto dos povoados de Ponta da Tulha (na Praia do Norte) e do Rio do Engenho (no lado sul). O secretário Antônio Vieira explica, “(…) não é um trabalho rápido, porque as novas tecnologias e os próprios selos de referências dos planos diretores têm de ser trabalhados de forma interativa com a sociedade, com a comunidade organizada, o que requer audiências públicas, independentes de nosso trabalho na montagem destes planos” [167]. Romualdo Pereira avalia, “Tem que se dar as mínimas condições, inclusive ao povo da Lagoa Encantada, aos moradores, para que eles possam preparar a Lagoa como um produto turístico” [168]. O secretário de Turismo afirma que este plano é fundamental, pois através deste se tentará equipar a Lagoa segundo a formatação de um produto realmente turístico.
A Lagoa Encantada é um local que tem toda a potencialidade de ser um produto turístico, mas o professor Hélio Barroco orientou o Diagnóstico e Diretrizes para o Planejamento Ecoturístico da Lagoa Encantada, de Aline dos Santos Gomes, trabalho do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, que conclui que o produto Lagoa ainda não está formatado, uma vez que não existe um acesso de qualidade, nem infraestrutura no local. Barroco avalia, “Um produto turístico tem de ter todo um sistema de serviços organizado, que abrange da saída do hotel até o retorno do turista, incluindo ônibus, restaurantes, sanitários, barcos com motores silenciosos, etc” [169].
Turismo de Eventos
Quatro eventos merecem ser analisados com destaque, por serem potencialmente promissores para o turismo de eventos da cidade: a festa de São João em Olivença, o Festival do Camarão, o Carnaval Cultural e a Festa de Yemanjá. Os dois últimos serão vistos no próximo capítulo, pois antes de serem eventos turísticos, são eventos culturais.
Há três anos atrás, começou a festa de São João em Olivença, um projeto do ex-presidente da Ilheustur, Sérgio Barbosa. A vila é “um arraial” pela sua própria estrutura, porque tem uma grande praça com uma igrejinha. O São João de Olivença é semelhante a outras festas de pequenas cidades do interior da Bahia, com três grandes diferenciais: mais de 3.000 leitos em volta da vila, distribuídos em pequenas pousadas ou hotéis cinco estrelas; a Estância Hidromineral de Olivença; e a praia. Romualdo Pereira, analisa que cidades circunvizinhas como Ubaitaba, Amargosa, Ibicuí, não têm o que Ilhéus oferece, “ Quando se vai para estas cidades, tem que se dormir dentro do carro ou amontoado em uma casa superlotada e no chão, porque não tem onde ficar” [170]. O secretário entende que, para concorrer com as festas já conhecidas do interior, é preciso trazer grandes atrações para Olivença e vender este produto. A festa foi avaliada entre R$800 mil e R$1 milhão.
O Festival do Camarão é um outro evento que poderia atrair mais turistas, se não fosse divulgado apenas a nível local e tivesse a participação de cantores de projeção nacional. A promoção de verão da FM Sul, realizada por essa rádio local, tem muito mais público do que o Festival do Camarão, organizado pela Prefeitura de Ilhéus e sua Secretaria de Turismo. O mesmo festival realizado em Valença tem tido melhor receptividade, pois conta com a parceria da prefeitura com empresários locais. Hélio Barroco atribui os fracos resultados do evento de Ilhéus à omissão dos empresários locais, “falou em turismo, os empresários acham que a Prefeitura tem de fazer algo para eles lucrarem” [171].
Turismo Náutico e Desportivo
O turismo náutico teria um lugar especial e central para ser desenvolvido em Ilhéus, a Baía do Pontal (Foz dos Rios Cachoeira e Almada), mas não é o que acontece devido a poluição das suas águas e à falta de incentivos. O pousadeiro Leonardo Diniz diz que, “a baía poderia ser utilizada e incentivada, mas está abandonada e suja” [172]. O pesquisador Hélio Barroco lembra que quando a travessia Ilhéus-Pontal passou a fazer parte do calendário internacional, não pôde ser mantida na cidade devido à poluição das águas — o deságüe do rio Cachoeira na Baía do Pontal traz os dejetos de dezessete municípios. Hans Schaeppi chama atenção de que até Ubaitaba e Itacaré têm uma etapa de remo, e em Ilhéus não existe nenhuma forma de turismo náutico, um campeonato de regata, de caiaque ou de windsurf. Schaeppi acredita que, “depende da prefeitura ou da secretaria de Esportes conseguir realizar etapas nacionais ou competição” [173].
A Regata Salvador-Ilhéus 2003, assim como em todos os outros anos anteriores, foi realizada com recursos dos próprios participantes. O Festival do Peixe, de pesca de arremesso, foi extinto há três anos, e a etapa mundial de Triathlon extinto há quatro. A etapa do Super Surf 2002, campeonato nacional, foi transferido de Ilhéus para Itacaré, porque a prefeitura ilheense não arcou com as hospedagens. A pista de Montain Bike, esporte que tem a equipe da Bahia como a maior do país, está sem manutenção.
Pode-se afirmar, que o turismo desportivo não é uma prioridade para os gestores municipais, uma vez que nenhuma competição, nacional ou internacional, se realiza na cidade de Ilhéus.
Turismo De Balneário
A Estância Hidromineral de Olivença, mais conhecida como Balneário de Tororomba, é um local especial de Ilhéus pelo seu poder de atração turística. Recentemente o balneário passou um grande tempo fechado, desde outubro de 2002, tendo sido reaberto no início de janeiro de 2003 por imposição dos trabalhadores do local — baianas, garçons, dono do bar, mulheres que vendem cocada e todos que sobrevivem do seu fluxo turístico—, que de forma organizada pressionaram a prefeitura. Segundo Elza Muniz, a manifestação foi fundamental para a reabertura do balneário. A terceira piscina começou a ser construída em outubro/2002, ano eleitoral, e no verão/2003 se encontrava coberta por um tapume, porque a obra não havia sido concluída. Elza Muniz diz que, há muito tempo (durante a sua administração de 1997 a 1999), uma reforma era necessária no piso da piscina grande, que até hoje ainda não foi realizada,
“A parte de manutenção da piscina não é cara, e o Balneário de Tororomba é uma boa fonte de renda para Olivença. Quando eu fui administradora daqui, no verão, a gente conseguia tirar dali de R$12 a R$15 mil. E ainda continua sendo a melhor, porque todo mundo que vem aqui quer passar por lá. Tem gente que passa o dia inteiro, são ônibus e mais ônibus que param ali” [174].
A renda do Balneário é administrada pela prefeitura de Ilhéus, o que é muito criticado pela comunidade local, que considera a vila abandonada pelo prefeito de Ilhéus. Para se resolver os problemas de Olivença, não se sabe a quem recorrer. O administrador, Alcides Kruschewsky, diz que “não sabe de nada”, e a Ilheustur, diz que “não é com eles, é um problema do administrador”.
A infraestrutura de Olivença é precária: segurança quase não existe; há um posto médico, que não tem plantão, quem se acidenta tem que ir para Ilhéus; não tem nenhuma agência bancária e nem posto de gasolina. Quanto a segurança, Elza Muniz declara que, “(…) em Olivença temos dois soldados para a vila inteira, a muito custo, a comunidade ajudou a comprar uma moto. (…) Agora conseguiram um celular para os soldados, porque nem tínhamos como ligar para eles, uma vez que o telefone da delegacia estava cortado. Aliás, a delegacia não tem delegado” [175]. Enfim, a segurança é bancada pela população.
Turismo Rural
A Secretaria da Cultura e Turismo através da Bahiatursa criou, em 1998, o Programa de Turismo Rural da Bahia com o objetivo de estimular proprietários rurais a trabalharem o turismo como uma nova fonte de renda, integrando lazer e aprendizado, gerando empregos e renda, como uma forma de contribuir para fixar o homem no campo. Após a crise da região cacaueira, grande parte da população rural foi para a cidade em busca de emprego, causando sérios dandos sociais, econômicos e ecológicos-ambientais aos centros urbanos. Antônio Vieira, Secretário de Planejamento de Ilhéus, estima que existam 53 áreas ‘subnormais’ na cidade — ou seja, áreas que abrigam uma população que ganha menos de três salários mínimos e que tem problemas: de regularização da situação fundiária, está em zona de conservação permanente, ou é considerada área de risco. O estímulo estadual para a transformação das fazendas em produtos turísticos teve pouca aceitação em Ilhéus. Apenas as Fazendas Renascer (cenário da novela Global homônima), Tororomba e Primavera desenvolveram este trabalho, sendo que a Fazenda Renascer, foi desativada para visitação após o sucesso da novela.
A Fazenda Primavera, localizada no km 20 da estrada Ilhéus-Itabuna, é originalmente formada por duas sesmarias, uma de propriedade da família portuguesa de João Navarro de Amorim, e a outra da família alemã de Henrique Berbert. João Navarro de Amorim casou-se com Teodolinda Bebert, unindo as fazendas. O herdeiro, Virgílio Amorim, filho do Coronel Virgílio Amorim, grande proprietário de terras, dono desta que era a maior fazenda da região, foi quem deu início ao turismo rural no sul da Bahia, há 13 anos. No ano de 2002, o empresário e fazendeiro foi convidado pela Embratur para participar do planejamento nacional para turismo rural no Brasil, tendo sido o único produtor convidado para esse projeto.
Virgílio Amorim[176] conta que primeiramente investiu no turismo rural como uma alternativa de renda, já que o cacau não estava produzindo quase nada, e não com uma perspectiva do turismo, mesmo considerando que Ilhéus seja uma cidade turística. Amorim, revela que a fazenda vai completar 200 anos e tem atualmente quase 500 hectares. Na época de seu pai, eram mil e tantos hectares que produziam 40 mil arrobas de cacau por ano. Atualmente, produz em torno de duas a três mil arrobas de cacau, com perspectiva de aumento com a clonagem que está sendo feita.
A Fazenda Primavera tem um área restrita para a visitação. O passeio inclui o conhecimento da produção, do plantio, dos cuidados que o cacau precisa para produzir e as razões porque ele só produz em determinadas regiões do globo. Mostram em seguida uma plantação de cacau, a fermentação, a secagem e a parte de beneficiamento das amêndoas. Depois, realizam um pequeno demonstrativo de tudo o que se usa dentro de uma lavoura de cacau: a pá, a enxada, a explicação de como se faz a colheita, as cobras e o benefício de tê-las dentro de uma lavoura combatendo o rato jupará. Existe ainda o museu, que é a parte mais interessante, o seu diferencial, com documentos históricos.
O museu conta que a fazenda era uma sesmaria, doada pelo rei de Portugal, expõe a documentação histórica do rei, e um documento com selo olho de boi, que tem a assinatura do primeiro presidente do Brasil, Marechal Deodoro da Fonseca, além de objetos de família. O maior fluxo de turistas que a fazenda já recebeu foi na época da novela Renascer, até um, dois anos depois, mas foi progressivamente decaindo e agora se mantém estável. O ano de 2002 teve o menor fluxo dos últimos tempos. Em alguns meses recebeu em torno de 40 ou 50 pessoas, o que é muito pouco diante do fluxo da fazenda, que constantemente recebia ônibus de turismo e grandes grupos dos navios que aportam em Ilhéus.
Turismo Sol E Mar
Finalmente, a praia. O principal atrativo turístico da cidade - mais de 100 km de litoral – é muito criticado pela falta de projetos e de manutenção. A Pesquisa de Demanda Turística de Ilhéus, realizada pela Bahiatusa em 2001, constatou que 96,5% dos entrevistados que viajaram a passeio, vieram para a cidade atraídos pelos atrativos naturais. O atrativo natural que mais recebeu os turista em passeio foi o litoral, as praias, seguido ao longe pelo patrimônio histórico e o turismo rural.
Um trabalho da UESC, de 2002, o vídeo “Praia dos Milionários”, apresentado no 3° Plenário de Turismo e Desenvolvimento Regional, sobre as cabanas de praia da orla sul e restaurantes da cidade, demonstra a falta de qualidade dos seus serviços, tendo a sua publicação proibida pelo prefeito Jabes Ribeiro, por considerá-la difamatória. Hélio Barroco comenta a respeito dessa pesquisa, que “não se pode imaginar o que foi encontrado nessas cozinhas, nos refrigeradores e frigoríficos. (…) Eu tenho fotos que tirei da inspeção. Numa delas, o pessoal lava o caranguejo na água que desce do banheiro e coloca para cozinhar”[177]. O professor avalia que haja um despreparo dos cabaneiros para o turismo. Por isso, ele fez esse vídeo sobre as praias de Ilhéus, mostrando tudo que estava errado, com o propósito de avaliar com os cabaneiros a forma que estavam recebendo os turistas e demonstrar que assim não se traz turista de qualidade. Barroco apresentou o vídeo para os cabaneiros e refez com eles o mesmo percurso filmado, mostrando os problemas identificados. Segundo ele, algumas barracas melhoraram, mas o depósito de sujeira e o mal cheiro continuam, comprovando que não existe uma inspeção sanitária rigorosa na cidade de Ilhéus.
A praia da Avenida Soares Lopes é um dos belos cartões postais ilheense, por se localizar no seio da cidade. Ela vem se modificando ano após ano, com a construção do Porto Internacional do Malhado, porque o mar vem recuando e deixando cada vez mais uma enorme faixa de areia para se chegar até ele. Raimundo Kruschewsky Ribeiro, o Popoff, apresentou sugestões para a reativação da praia da avenida, publicadas na revista local “Folha da Praia”. Ele acredita que a praia da avenida Soares Lopes será de fundamental importância para o aumento do fluxo turístico da cidade, por aproximar a praia dos centros comercial, histórico e cultural. Popoff analisa que só existe o turismo por causa do comércio e que as praias ilheenses estão ‘ausentes’ do comércio de Ilhéus,
“ As praias do sul e norte só são usadas e habitadas nos seus feriados e finais de semana. Quando são usadas por milhares de pessoas o comércio está com as portas cerradas. O que é que deu a Ilhéus? Praticamente nada. (…) E o comerciante não ganhou um tostão. (…) o feriado para Ilhéus poderia ser uma coisa fantástica se a Praia da Avenida estivesse sendo usada”[178].
Além disso, o experiente Barão de Popoff argumenta que, para que o turismo em uma cidade aconteça é necessário que se eleja um lugar específico para o seu desenvolvimento. Para ele, a Avenida com a sua praia é a única saída para o turismo de Ilhéus, é o ‘lugar’ da cidade, ”Turismo é assim, você vai a uma cidade, ela não é toda turística, nem que seja Paris, ou Londres. Rio de Janeiro é Copacana, Ipanema, Leblon, você não fala em Bangu. (…) o turismo sempre é feito em determinados lugares, em pontos. E o ponto daqui, é a orla que nós temos” [179].
O professor Salvador Trevisan, acredita também na importância de um trabalho paisagístico na avenida, para se criar uma imagem da cidade, aproveitando características locais, “Esta região é riquíssima em flores ornamentais, que outras regiões não têm. O flamboyant, por exemplo, é um negócio que enche os olhos e não se explora isso. Se houvessem avenidas sombreadas com flamboyants, de dezembro até o final de fevereiro, teríamos um visual deslumbrante” [180]. O professor constata que nenhum setor cuida da paisagem da cidade, que não existem ações nesse sentido. Ao contrário de outras regiões, como o sul do país, onde é dispensada uma atenção especial a esse aspecto.
O secretário de Planejamento, Antônio Vieira, fala de dois projetos da prefeitura para a Avenida. Um, o projeto Burle Max, que pretende reiniciar o plantio das árvores dentro da área urbanizada, e outro, o Projeto Orla, que propõe uma ligação da Praia da Maramata à Praia do Cristo através de uma segunda ponte, com saída para uma terceira pista da avenida, esta mais próximo à praia, que interligaria a Soares Lopes, na altura do Centro de Convenções, à área norte da cidade. Este projeto prevê, portanto, a ligação da área sul à área norte, sem passar pelo centro da cidade. Num futuro longínquo, planeja-se uma terceira ponte ligando a Praia do Marciano à Barra de São Miguel. Antônio Vieira avisa que já está sendo estudado um edital de licitação, que será lançado em breve, para que se faça a ocupação de áreas voltadas para restaurante e lanchonetes, já previstas dentro do projeto. Mas Romualdo Pereira, da Setur, admite, “Uma coisa nós pecamos. Estamos começando um pouco tarde, mas temos que começar a povoar esta avenida, temos que trabalhar neste sentido” [181].
É preciso, ainda, considerar a pouca expressão do artesanato local, que poderia ser um produto diferencial, mas o que se encontra na cidade é o mesmo que se encontra em qualquer capital do país. A universidade propôs organizar gratuitamete uma oficina com os artesãos da Costa do Cacau, em parceria com o Instituto Mauá/Governo da Bahia e outras entidades, mas não conseguiu o apoio operacional das prefeituras da região.
Em resumo, constata-se que o turismo ainda está embrionário na cidade de Ilhéus, sem muita clareza sobre o caminho a ser percorrido. Isso demonstra que apesar da cidade possuir uma grande variedade de produtos a serem desenvolvidos e uma alta potencialidade turística, o avanço nesta área depende de um projeto bem planejado e de um trabalho bem direcionado e financiado, para que a cidade de Ilhéus se estabeleça como destino turístico. E antes de mais nada, tenha determinação e vontade política para desenvolver a cidade neste sentido.
CULTURA
“ Era comum se ouvir dizer que a cidade da Bahia não possuia nenhum teatro como o CINE-TEATRO ILHÉUS, de construção recente: (…) que a cidade tinha muito mais vida que a Bahia. Citavam-se cinco cinemas de Ilhéus, dois muito bons, o Ilhéus e o São Jorge, os outros três menos importantes, um dêles no morro da Vitória, outro em Pontal. Citavam-se também os cabarés, que então eram três, mas logo depois seriam cinco. Citava-se a Biblioteca da Associação dos Empregados no Comércio, dizendo-se que só a Biblioteca Pública da capital era superior.”
JORGE AMADO, São Jorge dos Ilhéus,
Periperi, Bahia, janeiro de 1944,p.68.
GESTÃO E POLÍTICAS CULTURAIS DO BRASIL
A cultura brasileira é apreciada internacionalmente por sua diversidade e beleza. A forma de ser brasileira se exprime no mundo com sua originalidade, seja através da música, da culinária, do futebol, da literatura, do cinema, da arte popular, da dança, da capoeira. De fato, a cultura sempre representou a principal imagem do Brasil no exterior e consolidou, em cada esquina do seu interior, o sentimento de pertencimento a este país. A própria formação multicultural da sociedade brasileira e a sua ‘miscigenação’ de crenças, ritos e tradições despertam o interesse do mundo em conhecer essa dinâmica de glocalização cultural nesse vasto país. Uma questão da atualidade e, no entanto, viva no Brasil desde que essa terra começou a existir para o mundo.
O ano 2003, despontou com uma enorme esperança para o povo brasileiro, sendo o início do governo de Luis Inácio Lula da Silva. Um trabalhador, sem nível superior, metalúrgico, líder sindical, que alcançou os seus objetivos e o cargo mais alto da política em uma democracia presidencialista. Antônio Albino Rubim, em seu artigo Governo Lula e Política Cultural: Sintonias e Desafios, analisa que “a eleição de Lula, independente de qualquer desdobramento que venha a ter seu governo, se constitui já em um ato de mudança”[182]. Rubim amplia a sua análise, afirmando que esta mudança ultrapassa o campo da política, citando a reflexão da deputada federal Luciana Genro: “sem dúvida, uma mudança política e cultural, sem precedentes na história brasileira”[183].
Hoje, o presidente brasileiro é destaque internacional pela sua postura diante do mundo, por um lado se comprometendo em manter os compromissos financeiros estabelecidos por governantes anteriores, e por outro articulando acordos em prol das necessidades do Brasil e dos países do Terceiro Mundo. O desenvolvimento nacional através da cultura é um das prioridades do Governo Lula. Ao nomear o músico brasileiro, conhecido internacionalmente, Gilberto Passos Gil Moreira, como Ministro da Cultura, o Presidente da República fez um elo entre a cultura brasileira e o plano internacional. O Secretário-Executivo do MinC, Juca Ferreira, no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia, Conferência Estadual de Cultura do PT-BA, realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17 de outubro de 2003, testemunhou que Gilberto Gil vem tendo uma participação de destaque na construção desse governo de esquerda, “pessoas que criticaram a sua escolha, reviram as suas posições, inclusive publicamente, pela trajetória de Gil como músico, como alguém que contribuiu para um questionamento da cultura no Brasil e além disso, pelo seu capital político próprio capaz de alcançar fronteiras antes impensadas”[184]. No entanto, Ferreira adverte sobre as dificuldades encontradas, como a pequena capacidade de investimento do Estado, e a necessidade de modernização em todas as áreas do governo,
“ É preciso muita coragem para fazer este deslocamento que está sendo feito. Escola tem de ser mantida. Saúde também, mas cultura, não. Não existe essa consciência brasileira da necessidade disso. Cultura nunca alcançou a dimensão que precisaria ter. Cultura no Brasil tem de ser uma questão mais do que de governo, de Estado ”[185].
O sociólogo baiano, Gei Espinheira, participante da mesma mesa de debates, analisa que a esquerda sempre considerou a cultura como indispensável, fundamental para um povo, “a arte é a única possibilidade de completude do ser humano”[186]. Espinheira acredita que a cultura não pode ser privilégio, deve ser obrigação, e observa que isso é possível através da educação, “ que os nossos jovens obrigatoriamente leiam vinte livros ao ano, assistam quinze filmes, seis peças de teatro, assim se cria naturalmente um mercado ”[187].
O ministro em todos os seus discursos destaca a importância da cultura para este país e para a construção da sua imagem internacional. Para o ministro Gilberto Gil, existem duas coisas que chamam a atenção da “inteligência e da sensibilidade internacional”[188] para o Brasil: a Amazônia e a sincrética cultura brasileira, que a partir da sua gestão experimentará novos rumos, e terá espaço para a criatividade popular, para as novas linguagens, sendo o espaço ‘da memória e da invenção’[189]. O maior objetivo deste Ministério, segundo Gilberto Gil, é promover a recuperação da dignidade nacional interna e externamente, através da cultura, tomando-a como vetor de desenvolvimento,
“ À cultura, (…) cabe um papel de contribuir objetivamente para a superação dos desníveis sociais, mas apostando sempre na realidade plena do humano. (…) Como eixo construtor de nossa identidade, permanentemente alimentada pelos encontros entre as múltiplas representações do ser brasileiro e a diversidade cultural do planeta. Como espaço de realização da cidadania, de superação da exclusão social e da desigualdade, seja pelo que representa para o reforço da auto-estima e do sentimento de pertencimento, seja pelo que pode propiciar por conta das potencialidades existentes no mundo das artes, com inúmeras possibilidades de inclusão socioeconômica”[190].
Gilberto Gil, já no seu discurso de posse, em janeiro de 2003, definiu a direção da sua administração, afirmando que a política cultural do Governo Lula é parte do projeto geral de construção de uma nova hegemonia no país, de uma nação democrática, plural e tolerante, e que tem como uma das suas tarefas centrais tirar o Ministério da Cultura da distância em que se encontra do dia-a-dia dos brasileiros, sendo o seu compromisso torná-lo a casa da cultura brasileira. Antônio Albino Rubim ressalta que Lula, em seu discurso de posse falou em redescobrir o Brasil, e que essa atitude será vital na área da cultura, pois
“implica em assumir a identidade plural do país e a composição étnica, regional, social e cultural diferenciada que configura a experiência e a aventura chamadas Brasil (…) Encarar o país em sua complexidade, em sua diversidade e em sua profundidade pressupõe a descentralização das instituições e das ações sempre centradas no eixo Rio-São Paulo”[191].
O ministro Gilberto Gil acredita que a função do seu Ministério é de apoiar ‘homogeneamente’ a produção cultural do país e fazer com que ela chegue a todos, aos que vivem na periferia das grandes cidades e no interior do país, delimitando claramente o papel do Estado:
“Não cabe ao Estado fazer cultura, mas, sim, criar condições de acesso universal aos bens simbólicos (…) mas, sim, proporcionar condições necessárias para a criação e a produção de bens culturais (…) mas, sim, promover o desenvolvimento cultural geral da sociedade. Porque o acesso à cultura é um direito básico da cidadania (…) Porque ao investir nas condições de criação e produção estaremos tomando uma iniciativa de conseqüências imprevisíveis, mas certamente brilhantes e profundas (…) Na verdade, o Estado nunca esteve à altura do fazer de nosso povo (…)”[192].
A atuação do Ministério da Cultura deverá seguir os caminhos que o ministro apontou em sua posse, assumindo a responsabilidade como gestor, formulador e executor das políticas públicas brasileiras de cultura, utilizando-se de mecanismos fiscais, mas sempre atento para corrigir as distorções provocadas pelo mercado. Gilberto Gil alerta, “O Ministério não pode, portanto, ser apenas uma caixa de repasse de verbas para uma clientela preferencial”[193]. Segundo o ministro, a atenção do Ministério deverá se voltar para produções culturais esquecidas pelas antigas administrações e fundamentais para a cultura do país, “(…) é preciso intervir (…) fazer uma espécie de ‘do-in’ antropológico, massageando pontos vitais, momentaneamente desprezados ou adormecido, do corpo cultural do País. Enfim, para avivar o velho e atiçar o novo” [194].
As políticas culturais de Fernando Collor de Mello e de Fernando Henrique Cardoso são criticadas pelo atual ministro da Cultura, por artistas e estudiosos da cultura brasileira. Antônio Albino Rubim, Diretor da Faculdade de Comunicação da UFBA, demonstra que está afinado com o discurso de Gilberto Gil ao tecer uma crítica ao governo anterior (FHC), afirmando que o MinC estava sendo omisso, principalmente na medida em que deixava o poder decisório das políticas culturais nas mãos de agentes do mercado cultural, através das leis de incentivos.
Em 19 de agosto de 2003, em Foz do Iguaçu, falando para o Fórum dos Dirigentes Estaduais de Cultura, o ministro Gilberto Gil identificou três desafios centrais da sua administração: retomar o papel do Ministério da Cultura como órgão formulador e executor de uma política cultural para o país; fazer a reforma administrativa do órgão e a capacitação institucional deste para a operação de sua política cultural; além de obter os recursos financeiros indispensáveis à implementação desta política.
Quanto ao primeiro desafio, os atuais dirigentes do ministério deflagraram um amplo processo participativo com a realização dos seminários “Cultura Para Todos” visando a construção de uma política cultural ampla e inclusiva, elegendo como primeiro tema de discussão coletiva o financiamento público da cultura e as leis de incentivo. A Reforma Administrativa do MinC já foi aprovada pelo poder legislativo e uma nova estrutura está em fase de implementação (vide p. 92). Quanto ao último desafio, o ministro lançou palavras de incentivo, “(…) precisamos encarar essa questão com realismo e criatividade. Todos sabemos que a cultura dispõe de uma parcela muito pequena dos orçamentos da União, dos Estados e Municípios”[195]. Gilberto Gil afirmou neste encontro, que o almejado incremento de verbas para a Cultura não poderá ser imediato, mas adiantou que usará da criatividade para superar estas dificuldades, como a criação da Loteria da Cultura (em estudo pelo governo), selo-cultura, cartão-cultura. O ministro havia solicitado no discurso realizado para a Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados, de 14 de maio em Brasília, um aumento da participação do seu ministério no orçamento federal, de 0,2 para 1%, como os seguintes argumentos,
“(…) o MinC praticamente não dispõe de recursos para a implementação de suas políticas - situação agravada, presentemente, com o contigenciamento de mais de 51% dos seus recursos orçamentários, que reduziu nossas ações a tão somente custeio e manutenção.
(…) o Ministério da Cultura não pode continuar sendo uma peça lateral, decorativa, um arranjo floral de salões governamentais”[196].
O secretário-executivo, Juca Ferreira, no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia, admitiu que será difícil se implementar, à curto prazo, esse aumento de verbas no MinC: “é possível que só se consiga no último ano do governo Lula”[197]. Ferreira reafirmou que o orçamento do MinC foi enxugado, sendo hoje o menor do governo, e além de ser contigenciável, “quando o governo precisa de verbas — e sempre precisa — o recurso da Cultura é o primeiro a ser solicitado. Não temos acesso a quase nada”[198].
O secretário-executivo do MinC ressaltou positivamente a atitude de Gilberto Gil na sede da ONU, em tributo ao diplomata Sérgio Vieira de Mello e às outras vítimas do atentado à ONU em Bagdá, ao cantar tendo como parceiro no atabaque o secretário-geral da casa, Kofi A. Annan, comparando-a a dez anos de diplomacia, “foi um apoio a Kofi Annan, um incentivo à cultura de paz no mundo. Um episódio que foi destaque nos principais jornais mundiais. O Le Monde que normalmente não publica fotos, abriu um enorme espaço na primeira página para a imagem daqueles dois homens negros”[199]. Ao mesmo tempo, Juca Ferreira alertou para a possibilidade, que deve ser evitada, do compositor e ministro Gilberto Gil acabar se tornando o mobilizador cultural do governo, mas não conseguir implementar a sua política.
Partindo do conceito de que a cultura perpassa todos os domínios da vida – educação, saúde, etc – o Ministério da Cultura pretende desenvolver um trabalho de articulação das políticas e projetos com os demais Ministérios da República. O ministro, ainda em seu discurso de 19 de agosto, em Foz do Iguaçu, estimulou todos os Dirigentes Estaduais de Cultura presentes no Fórum a fazerem o mesmo, a trabalharem em conjunto com as outras secretarias — estaduais e municipais — de suas administrações, de forma transversal.
Finalmente, o discurso de 14 de maio de 2003, para a Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados, em Brasília, fala da cultura como espaço de realização da cidadania, de superação da exclusão social através da inclusão sócio-econômica, “a cultura tem de ser vista, também, em sua dimensão econômica. Em sua capacidade de atrair divisas para o país – e de, aqui dentro, gerar emprego e renda”[200]. Isso não é por acaso, considerando-se que no Brasil, um grande número de mão de obra é absorvido pela área de cultura no país. Nesse mesmo discurso, foi citada uma pesquisa encomendada, em 1998, pelo Ministério da Cultura à Fundação João Pinheiro, um dos poucos estudos existentes nessa área, o Diagnóstico dos Investimentos da Cultura no Brasil, que fez a seguinte constatação: já em meados dos anos 1990, havia 510 mil pessoas empregadas na produção cultural brasileira. Ou seja, um contingente 90% maior do que o empregado na fabricação de equipamentos e material elétrico e eletrônico; 53% superior ao da indústria automobilística e de autopeças; e 78% superior ao empregado em serviços industriais de utilidade pública. Chegou-se a gerar, em média, 160 empregos diretos para cada milhão de reais investido na economia da cultura. É importante destacar, que o salário médio nesta área corresponde ao dobro da média do conjunto das atividades econômicas do país. Ainda segundo essa pesquisa, em 1997, a cultura movimentou cerca de 6,5 bilhões de reais[201].
Estrutura
A estrutura administrativa do Ministério foi reconfigurada para um modelo considerado mais adequado à realização da política cultural a ser adotada nessa nova gestão. Como se pode observar nos organogramas a seguir, ocorreu uma mudança significativa. Anteriormente, o MinC era organizado em departamentos culturais, por área de atuação: Secretaria do Livro e Leitura, Secretaria do Patrimônio, Museu e Artes Plásticas, Secretaria da Música e Artes Cênicas e Secretaria do AudioVisual. A atual estrutura visa dar suporte à nova política cultural do Governo Lula, que concentra no Ministério o poder de decisão sobre as estratégias, as políticas culturais, o fomento, a distribuição dos recursos públicos e o incentivo à cultura, tendo sido criadas secretarias e diretorias específicas para essas finalidades.
Governo Anterior
Governo Lula
Os principais cargos do Ministério da Cultura são ocupados por baianos, a começar pelo próprio ministro Gilberto Gil e seus assessores diretos, embora expoentes da cultura no plano nacional também façam parte da equipe ministerial, a exemplo de Sérgio Mamberti (SP) e Antônio Grassi (RJ).
Políticas e Ações
As primeiras ações deflagradas pelo Ministério da Cultura foram dirigidas à reconfiguração do Programa Nacional de Apoio à Cultura, a Lei Rouanet, objetivando-se: a regulamentação do Fundo Nacional de Cultura, através do estabelecimento de critérios para a aplicação dos recursos; a ativação dos Fundos de Investimento Cultural e Artístico, que ainda não funcionam, embora tenham sido regulamentados desde 1995; e a revisão dos incentivos fiscais, que suportam a ação do mecenato.
O incremento à exportação dos bens e serviços culturais, que ainda é muito tímida, também está nos planos do novo MinC. Serão formuladas, através de uma parceria com o Ministério das Relações Exteriores, políticas culturais amplas e integradas, visando, por exemplo, uma maior produção e exibição de filmes e telenovelas no exterior, e a adoção de uma política cultural externa para a música. O trabalho para aumentar a participação brasileira no comércio internacional de bens e serviços culturais estará voltado, conforme o discurso de Gilberto Gil, “não apenas para a captação de divisas, mas, sobretudo, para a nossa afirmação nacional no mundo”[202]. O Ministro da Cultura acredita que esta ação será necessária estrategicamente “(…) a cultura de cada povo passou a ser vista como fator estratégico fundamental de afirmação interna e externa a cada nação”[203].
Quatro linhas de ação do Ministério, foram esboçadas no pronunciamento do Ministro da Cultura em Brasília, no dia 14 de maio, para a Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados. Uma delas é o projeto Refavela, um programa de apoio às iniciativas culturais que nascem nas periferias urbanas e no interior do país, e que oferece apoio institucional e técnico a artistas e produtores dessas localidades. Outra linha é dedicada ao Patrimônio, com o urgente soerguimento do Iphan — Instituto do Patrimônio Histórico Nacional —, e um amplo trabalho de conscientização dos brasileiros sobre a importância da preservação do patrimônio e do Programa Monumenta. As leis de incentivos à cultura - Lei Rouanet e do Áudio Visual – estão em vigor, mas em breve sofrerão modificações para corrigir as suas distorções, estando para isso sendo avaliada pelo MinC cada proposta feita no seminário “Cultura Para Todos” [204]. No plano externo, o MinC privilegiará uma visão de economia da cultura, a fim de promover a defesa ideológica e mercadológica dos bens e serviços da cultura brasileira.
É importante salientar, que os projetos e as ações ainda estão no papel, pois o MinC se encontra ainda numa fase de planejamento e organização de infraestrutura, não tendo sido ainda desenvolvido um plano integrado de cultura para o país. O secretário-executivo do MinC, Juca Ferreira, admite que“está quase tudo por fazer. É necessária a construção de uma política pública de cultura. Não temos ainda. Estamos utilizando o capital político de Gil para fazer discursos programáticos, para dar referências para a construção desta política. Vamos deflagrar um longo processo na discussão desta política” [205]. Deve-se lembrar que, no ano eleitoral de 2002, o partido de Lula, o PT realizou seis encontros nacionais sobre cultura nas cidades de São Paulo, Porto Alegre, Belém, Campo Grande, Recife e Belo Horizonte, que tiveram como resultado o Programa de Políticas Públicas e Cultura, Imaginação a Serviço do Brasil. Estes encontros tiveram por objetivo provocar a reflexão sobre um conjunto de temas, que terminariam por orientar a formulação de um Projeto de Políticas Públicas de Cultura para o Brasil. No entanto, este projeto não está sendo considerado, segundo afirma João Roberto Peixe, Secretário de Cultura de Recife e um dos colaboradores do projeto, que reinvidica, “é preciso dar uma resposta às pessoas que trabalharam neste projeto e também à sociedade civil que votou nele . Não é uma bíblia, mas ele aponta um caminho”[206]. Em complementação a este pensamento, o sociólogo Gei Espinheira reflete “a sociedade também precisa dar uma resposta ao governo de como ele quer que esta cultura seja gerida no país”[207].
No que se refere à definição de uma política pública de cultura, pode-se considerar que a área do audiovisual saiu na frente. No dia 23 de agosto, durante o encerramento do Festival de Cinema em Gramado, o ministro Gilberto Gil falou sobre as novas políticas para aquela área e no dia 13 de outubro lançou o Programa Brasileiro de Cinema e Audiovisual, no Palácio do Planalto, com a presença do Presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva, autoridades e profissionais do audiovisual. Na primeira ocasião, o ministro disse que a Secretaria do Audiovisual tem um plano de trabalho para a formação de técnicos e pessoal de cinema, televisão e vídeo. Além disso, anunciou os editais de concursos para 140 produções, incluindo longa e curta metragem, e roteiros. O Ministro Gilberto Gil acredita que,
“ um país sem cinema, um país sem filmes em circulação permanente e universal, é um país sem rosto e sem alma”. (…) Essa civilização tem a obrigação de fazer um cinema que tenha, para o século XXI, a mesma importância que o cinema americano hegemônico teve para o século passado”[208].
Em Gramado, o ministro assumiu o compromisso de que o MinC financiará diretamente a produção de filmes e o desenvolvimento de outras ações que não tenham a vocação do mercado, mas que precisam existir. O desejo do Ministro é que o Brasil produza cerca de 100 filmes por ano até o final do governo Lula. Exibir filmes nacionais ao maior número possível de brasileiros, para as comunidades mais afastadas, também faz parte do plano do MinC.
No lançamento do Programa Brasileiro de Cinema e Audiovisual o discurso do ministro da Cultura reafirmou a sua intenção de aproximar o cinema dos brasileiros do interior e dos menos abastados, e demonstrou preocupação com a qualidade dos programas televisivos: “Queremos maior acesso a programas de televisão inovadores e diferenciados. Queremos uma produção independente e regionalizada, capaz de projetar, em todas as telas, a multiplicidade que compõe nossa unidade como povo e nação”[209]. Naquela ocasião a Agência Nacional do Cinema (Ancine) foi transferida para o Ministério da Cultura, que terá o seu nome modificado para Agência Nacional do Cinema e Audiovisual (Ancinav), órgão regulador e fiscalizador da produção e da difusão de conteúdos audiovisuais.
No que concerne a esta monografia, interessa sublinhar a intenção do Ministério da Cultura de dirigir o seu apoio a agentes culturais do interior do país, através do projeto Refavela ; de estimular a regionalização da produção ; e de privilegiar a democratização do acesso à cultura.
É importante observar que os discursos do MinC do governo Lula têm um grande potencial de serem convertidos em ações, ao se levar em conta a histórica relação mantida pelo Partido dos Trabalhadores (PT) com a cultura popular e com as expressões artísticas mais sofisticadas do país. Por outro lado, é preciso chamar atenção sobre a realidade que está sendo enfrentada pelo atual governo, que leva o Ministério da Cultura a enfrentar quatro grandes desafios para a concretização da sua política:
- A capacidade do PT de conseguir um equilíbrio entre o mercado da cultura e as manifestações populares, da qual pretende ser porta voz ;
- A aguda crise fiscal do Estado gerando a falta de recursos do MinC, e sem os quais terá dificuldades de oferecer respostas ;
- A ineficiência do aparelho do Estado, com a presença marcante da burocarcia ;
- A falta de tradição democrática da sociedade na participação da formulação e da gestão da política de cultura.
GESTÃO E POLÍTICAS CULTURAIS NA BAHIA
A história da Bahia se atrelou à do Brasil desde o seu descobrimento, pois foi no seu território que se iniciou a construção do país. Portanto, desde os primórdios, a Bahia sempre foi uma referência cultural para brasileiros e estrangeiros. Além disso, importantes movimentos culturais nacionais tiveram origem no território baiano, ou se não, foram liderados e realizados por baianos, é o caso do Cinema Novo (Glauber Rocha), a Tropicália (Caetano, Gil, Gal, Bethânia), a Bossa Nova (João Gilberto); e mais recentemente o Axé Music (Daniela Mercury, Luis Caldas, Netinho, Durval Lélis, Ivete Sangalo, Chiclete com Banana). Esses e outros movimentos - na literatura, no teatro e na dança – se expandiram nos âmbitos nacional e internacional. Há pouco tempo, pode-se observar a presença crescente de artistas baianos no meio televisivo e artístico-cultural do sudeste, hegemônico em todo o país.
O tratamento dado à cultura pelo Governo do Estado se modificou, a partir de 1995, com a criação da Secretaria da Cultura e Turismo (SCT), que uniu as duas áreas sob a ‘batuta’ de Paulo Gaudenzi, profissional de confiança do Governo de Antônio Carlos Magalhães, com know how na área de turismo. Uma experiência nova para Gaudenzi que vinha de uma atividade com propósitos tão distantes da cultura, como ele próprio reconhece no seu discurso proferido na solenidade de recebimento do Título Honorífico da Academia de Letras da Bahia, em junho de 2000, publicado sob o título Cultura – de Neófito a Operário. No mesmo ano de criação da secretaria, Gaudenzi apresentou um plano em que, associando a cultura ao turismo, tinha como objetivo criar um diferencial para o planejamento estratégico turístico do Estado e, ao mesmo tempo, tornar o turista um consumidor adicional do produto cultural baiano.
O incentivo contínuo às criações e às produções culturais, juntamente com as obras de revitalização do patrimônio histórico, foram prioridades do Governo do Estado, visando resgatar o prestígio da cultura baiana nos cenários nacional e internacional. Assim, a SCT foi criada para reforçar o crescimento da Cultura e do Turismo, dois setores ativos do desenvolvimento econômico e social da Bahia. A Cultura especificamente é responsável por 4,6% do Produto Interno Bruto baiano[210].
Paulo Gaudenzi reafirma as quatro diretrizes da política de cultura do Estado, lançadas desde 1995, na publicação Cultura – de Neófito a Operário: promoção de eventos e dinamização cultural; desenvolvimento artístico e cultural; expansão e melhoria de equipamentos culturais; e preservação e divulgação do patrimônio histórico, artístico e cultural[211]. Além disso, o Secretário da Cultura e Turismo do Estado da Bahia cita as ações estratégicas, ferramentas fundamentais para a viabilização dos projetos culturais, que promovem a sustentabilidade das políticas públicas da secretaria e dos processos de desenvolvimento da cultura baiana: o Fazcultura, o Censo Cultural, o PIB Cultural e o Procultura.
O Fazcultura foi criado em dezembro de 1996 pelo Governo do Estado, através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura (Fazcultura), visando o incremento e a promoção do setor cultural. Através desse Programa, é concedido o incentivo de no máximo 5% do valor do ICMS, a ser recolhido pelas empresas localizadas no Estado da Bahia que patrocinem, a título de promoção, a pesquisa, o estudo e a edição de obras, a produção de atividades artístico-culturais nas seguintes áreas: artes cênicas, plásticas e gráficas, cinema e vídeo, fotografia, literatura, música, artesanato, folclore e tradições populares, museus, bibliotecas e arquivos. O referido valor de 5% não pode exceder os 80% do valor total do projeto a ser incentivado, e os 20% restantes devem provir de recursos próprios da empresa patrocinadora. Para Paulo Gaudenzi a lei de incentivo fiscal é uma medida estratégica, uma vez que está “contribuindo para ampliar as oportunidades de mercado aos produtores e novas condições de parceria com o empresariado, que passou a entender a cultura, também, como um fato econômico”[212]. Com o Fazcultura foi criada uma parceria entre Governo e iniciativa privada, viabilizando patrocínios a artistas e, ao mesmo tempo, garantindo a regularização fiscal de muitas empresas junto à Secretaria da Fazenda.
Segundo informações oficiais, entre 1997 e 2000 dos 2900 projetos inscritos, 1337 foram aprovados, sendo em sua maioria (430) projetos de Tradições Populares, a exemplo de festas juninas e carnavais. Em seguida os projetos musicais foram os mais aprovados (345), as artes cênicas (220), literatura (138), cinema, vídeo e fotografia (98) e bem imóvel, museu, artes plásticas e outros (106). Além da fase de aprovação dos projetos, é necessário que haja o comprometimento de patrocinadores. Em 2000, dos 273 projetos aprovados, apenas 90 foram patrocinados, ou seja, 33% do total, representando um total de investimento do Governo e da iniciativa privada, superior a R$ 10 milhões[213].
Apesar da reconhecida movimentação cultural provocada pelo funcionamento do Fazcultura há sete ano, uma série de críticas são formuladas a essa estratégia, assim como à Lei Rouanet, adotada pelo Governo Federal: uma política cultural regida pelo mercado, privilegiando a poucos (porque no mínimo é necessário ter o conhecimento da lei e saber como elaborar e dar entradas nos projetos). No caso da Bahia, houveram questionamentos ainda mais graves, relativos à utilização das cotas com projetos do próprio Estado, de prefeituras, de festas populares, e ao privilégio de algumas empresas na aprovação dos seus projetos e de expressões culturais que fazem parte da indústria cultural (a exemplo de bandas famosas da axé music).
Quanto ao I Censo Cultural, realizado entre 1996-1997, resultou num inventário dos bens materiais e simbólicos dos 415 municípios baianos, consolidados em 15 regiões econômicas do estado, de modo a permitir um conhecimento da dinâmica cultural do interior e o estímulo à preservação da memória e à difusão cultural. A partir desse mecanismo foram identificados e registrados os bens culturais mais representativos, envolvendo: patrimônio; manifestações artísticas e sócio-culturais; instituições e agentes culturais; equipamentos e espaços culturais; infraestrutura básica e serviços afins. Foram realizados levantamentos em todo o Estado e o resultado foi apresentado em uma edição de oito guias regionais (do Baixo Médio São Francisco, Recôncavo, Extremo Sul e Nordeste, o de Salvador, Região Metropolitana, da Litoral Sul e da Sudeste), e de um banco de dados na internet.
O PIB cultural é um programa de estudos dos indicadores culturais. O Procultura é um programa de fomento à indústria cultural, que integra um amplo sistema de benefícios financeiros, de crédito, locacionais e de insenções fiscais, semelhantes aos concedidos às indústrias de outros segmentos prioritários ao processo de desenvolvimento da Bahia.
Paulo Gaudenzi calcula que a Bahia investe mensalmente em cultura, aproximadamente R$4,4 milhões[214]. Dos 2519 equipamentos cadastrados pelo Estado, (16 antiquários, 239 arquivos, 638 auditórios, 813 bibliotecas, 108 casas de cultura, 60 salas de cinema, 53 editoras, 163 galerias de arte, 257 livrarias, 104 museus e 68 teatros) um terço está localizado em Salvador[215].
A Secretaria da Cultura e Turismo do Estado administra diretamente a Superintendência de Cultura, a Superintendência de Desenvolvimento de Turismo e o Arquivo Público do Estado da Bahia. Como órgão superior, possui na sua estrutura o Conselho Estadual de Cultura. Além desses órgãos, administra indiretamente o Ipac – Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia, que é responsável pelos museus (Museu de Artes da Bahia, Museu de Arte Moderna, Museu Abelardo Rodrigues e o Museu do Recôncavo Wanderley de Pinho), a Fundação Cultural do Estado da Bahia, que coordena as atividades do Teatro Castro Alves, a Fundação Pedro Calmon – Centro de Memória da Bahia, as Bibliotecas Públicas, a Bahiatursa e o Irdeb – Instituto de Rádiodifusão Educativa da Bahia.
Além dos recursos provenientes do Fazcultura e do Procultura, a Secretaria da Cultura e Turismo apoia diretamente artistas e/ou grupos culturais e artísticos, sendo 90% do seu apoio destinado a montagens, circulação e difusão de produções baianas e 10% ao apoio de espetáculos de outros estados e países. Foram criados projetos específicos de incentivo à música, literatura, dramaturgia e vídeo. Para incentivar a produção literária e o surgimento de novos escritores, apoiando a sua inserção no mercado editorial, criou-se o Prêmio Cultural de Literatura, realizado em âmbito nacional para textos inéditos; para incentivar a área musical implantou-se o projeto Selo Sons da Bahia, com o objetivo de resgatar e preservar a memória musical da Bahia, lançando no mercado CD'S institucionais; e na área do audiovisual apoiou-se a realização de três longa metragens de cineastas brasileiros, produzidos em terras baianas : "Tieta", "Central do Brasil" e "Guerra de Canudos".
A SCT desenvolve vários projetos e ações que têm visibilidade, principalmente na metrópole baiana, e outras ações que se estendem para o interior. Nesta monografia, pela sua temática, apenas as ações implementadas pela Secretaria voltadas para o processo de interiorização da cultura serão objeto de estudo. Mas antes de aprofundarmos no interior do Estado, deve-se destacar alguns projetos importantes para a cultura baiana, que têm Salvador como sede do seu acontecimento. Na área do patrimônio histórico, foi realizada em caráter prioritário a recuperação e a revitalização do Centro Histórico de Salvador, do Mosteiro de São Bento, da Catedral Basílica e da Igreja de São Francisco. Na área do patrimônio cultural, foram recuperados a Sala do Coro do Teatro Castro Alves (TCA) - maior palco da cultura baiana -, o Teatro Miguel Santana, Teatro Senac e Biblioteca Pública do Estado e construídos o Teatro XVIII, a Escola de Dança e o Museu Tempostal. A implementação de projetos como: o Pelourinho Dia & Noite, que transformou o Centro Histórico de Salvador num dos maiores centros de cultura da cidade; a Série TCA Grandes Concertos, que já atraiu mais de 300 assinantes com direito a cadeira cativa para espetáculos de música erudita; o Percpan (Panorama Percussivo Mundial), que anualmente reúne os melhores intérpretes mundiais do gênero ; o Expresso 2001, que leva cultura a vários bairros carentes da cidade; e o Julho em Salvador, que registra um público de 20.000 pessoas[216] e envolve uma vasta programação cultural no mês de julho, realizada nos museus Abelardo Rodrigues e de Arte Moderna, além do Palácio da Aclamação e da Biblioteca Pública do Estado.
Assim como no turismo, houve um momento em que estrategicamente a SCT criou um projeto de interiorização da cultura (Caminhos da Bahia), dirigindo uma série de ações para o interior do Estado, aproveitando-se da existência de 7 centros de Cultura no interior — Feira de Santana, Alagoinhas, Vitória da Conquista, Porto Seguro, Juazeiro, Valença e Itabuna — , que foram implementados na década de 80. O Governo do Estado vem tentando ativar as pautas desses centros, que ficaram durante anos ociosas, com espetáculos artísticos ou atividades da comunidade, oferecendo-se também oficinas permanentes, como a Viver com Arte. A fim de qualificar agentes e empreendedores culturais, respondendo a demandas locais e imprimindo uma nova metalidade no meio artístico-cultural, a Secretaria da Cultura e Turismo celebrou uma parceira com o Sebrae (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado da Bahia), levando ao interior do Estado o curso Como Viabilizar Projetos Culturais.
Quanto ao Patrimônio Histórico e Cultural do interior, foram recuperados pelo Estado : a Irmandade da Boa Morte, em Cachoeira ; a Matriz de Nossa Senhora da Purificação e Solar Bijú, em Santo Amaro ; a Casa dos Arcos, em Nazaré ; as obras de melhoria e pintura da fachada de 269 imóveis coloniais, no Centro Histórico de Lençóis ; a Casa Anísio Teixeira, em Caetité ; e o Casarão da Fazenda Curralinhos, no município de Castro Alves. A Secretaria da Cultura e Turismo mantém o Museu Aberlado Rodrigues, o Museu do Recôncavo Wanderley de Pinho (Caboto), o Parque Histórico Castro Alves (Cabeceiras do Paraguassu), e oferece apoio técnico e material ao Museu do Recolhimento dos Humildes (Santo Amaro)[217].
O projeto Chapéu de Palha é desenvolvido basicamente no interior do Estado, realizando-se oficinas em municípios baianos, como as oficinas de construção de texto de teatro nos municípios de Santo Antônio de Jesus, Guaratinga e São Francisco do Conde, tendo como objetivo estimular a criatividade e possibilitar o surgimento de novos grupos artísticos. A realização dos Salões Regionais de Artes Plásticas nos sete Centros de Cultura do interior e em Itaparica tem como objetivo apoiar e incentivar os artistas plásticos locais, possibilitando a abertura de um mercado de artes plásticas no interior do Estado. Além disso, uma programação cultural específica circula pelo interior da Bahia, como por exemplo em 2000 foram apresentados o espetáculo A Paixão de Cristo em Itabuna e Cachoeira, a Orquestra Cuba - Jazz em Itaparica, o show de Marilda Santana em Vera Cruz, além da organização do Festival de Inverno de Mar Grande, e do Festival de Música de Valença. A SCT também apoiou os Centros de Cultura do interior na realização de shows musicais com artistas de destaque estaduais como Edil Pacheco, Grupo Barravento e Carlinhos Cor das Águas, e apresentações da OSBA e do BTCA. Ainda no ano de 2000, em apoio ao Programa Fazcidadão, houve um projeto para a instalação de uma biblioteca básica em cada um dos 100 municípios mais pobres do Estado. Merece destaque o projeto Saveiro Literário, apoiado pela Petrobras, que leva literatura e outras expressões artísticas às populações ribeirinhas da Baía de Todos os Santos.
O Programa mais recente do Estado para a interiorização da cultura é o Bahia Vista por Dentro, implantado pela Secretaria da Cultura e Turismo (SCT), através da Superintendência de Cultura (Sudecult), a partir do segundo semestre de 2002. Esse projeto é voltado para o resgate do patrimônio histórico e cultural dos 417 municípios baianos, e já foi estendido a 33 cidades do Recôncavo, 13 do Litoral Sul, 8 do Médio São Francisco e 7 do Nordeste da Bahia. Esse Programa é destinado a dirigentes municipais, líderes culturais, religiosos, representantes do comércio e da indústria, educadores e estudantes dos municípios, e tem como objetivo a inclusão social, através da sensibilização das comunidades baianas para o desenvolvimento conjunto de ações de resgate e recuperação de seus bens materias e imateriais e conseqüente obtenção da sustentabilidade econômica, social e ambiental. Como parte do projeto, são realizadas dinâmicas de atualização e oficinas multiculturais de capacitação em edificações, manifestações culturais, culinária típica, artesanato, livros, saberes, contos e lendas em cada região do Estado. Na primeira fase são realizados encontros onde são discutidos os seguintes aspectos: recuperação do patrimônio histórico cultural, municipalização da cultura, bens tangíveis, bens intangíveis, memória, entre outros. Durante o encontro o participante responde a um questionário que aborda, por exemplo, quais são as atrações turísticas, vultos históricos, monumentos importantes, expressões artísticas, artesanato, costumes e "causos" da cidade. Posteriormente, é realizado um seminário, voltado para a definição de ações práticas em benefício do município. Para Sônia Bastos, Superintendente de Cultura da SCT, um dos pontos fortes do programa consiste em levantar a auto-estima de cada cidadão, através da valorização do patrimônio, das tradições, expressões artísticas e da união de todos em busca do desenvolvimento cultural, turístico e, sobretudo, humano[218].
O Programa Bahia Vista por Dentro ganha novo fôlego a partir da consolidação de programas no interior da própria Secretaria da Cultura e Turismo — Fundação Cultural do Estado, Irdeb, Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (IPAC), Fundação Pedro Calmon, Arquivo Público, Centro de Referência Cultural, Fazcultura, Biblioteca Pública do Estado — e com a celebração de parcerias com diversas instituições que já atuam no interior: Instituto Mauá, Sebrae, Senac, Centro Federal de Educação Tecnológica da Bahia (Cefet), Banco do Nordeste, Centro de Recursos Ambientais (CRA), Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional (CAR), Bahiatursa e Companhia de Desenvolvimento Urbano (Conder), além do Ministério da Cultura.
É importante observar que, diferentemente do turismo, o processo de interiorização da cultura não é baseado em estratégias pré-definidas, nem é bem estruturado. Por exemplo, como se pode observar, Ilhéus, terceira cidade mais povoada do interior da Bahia e terceiro destino turístico do Estado, não foi privilegiada com nenhumas das ações acima citadas. A presidente da Fundação Cultural de Ilhéus, Maria Luisa Heine afirma não conhecer nenhum destes projetos. No entanto, há possibilidade desse novo projeto, Bahia Vista por Dentro, vir a ser desenvolvido em Ilhéus e em outras cidades não contempladas com os centros culturais e com outros projetos do Estado.
Mesmo Ilhéus não tendo sido objeto das ações culturais do Estado, pesquisadores da cidade e da região têm contribuído para uma reflexão sobre a importância das políticas e estratégias culturais na Bahia. A professora do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, Maria de Lourdes Netto Simões, por exemplo, lançou uma proposta de Política Cultural para o Estado da Bahia no Caderno 2 do jornal A Tarde, de 5 de janeiro de 2003. Ela propõe algumas modificações e ações para a área de cultura do Estado. Segundo a pesquisadora, o Estado como indutor da cultura, deveria se basear em um planejamento participativo, com representatividade de segmentos sociais; adotar políticas que possibilitem a inclusão social e o respeito a diferença, priorizando ações educativas; políticas que, embora considerando o mercado, não submetam a cultura ao mesmo; revisão de políticas de financiamento da cultura através de renúncia fiscal (Fazcultura), corrigindo a concentração de projetos em determinadas regiões e o privilégio de determinadas categorias; criação de um Fórum Intermunicipal de Cultura, objetivando a democracia cultural e a democratização da cultura; promoção da integração entre municípios, visando dar acesso as atividades culturais a população; criação de Laboratório de Desenvolvimento Cultural Local, visando a identificar desafios apresentados nas políticas culturais desenvolvidas e gerar propostas para o desenvolvimento cultural do município, experimentar novos temas culturais de importância para a melhoria de vida dos cidadãos e novas metodologias de intervenção; criação do Conselho de Comunicação - representação de segmentos sociais visando à melhoria da comunicação, particularmente da TV .
Finalmente, o atual Plano Estratégico da Bahia lançado no dia 19 de agosto de 2003 pelo Governador Paulo Souto — é um plano sintonizado com os rumos do país e com o discurso do Governo Lula. O plano Bahia 2020 – o Futuro a Gente Faz define as atuais metas do governo, que têm como objetivo integrar as duas costas do estado (fluvial e atlântica) dinamizando a economia do semi-árido, fortalecendo as cidades de médio porte para atrairem novos investimentos, como também preservar e recuperar o patrimônio natural e cultural do Estado, elevando assim o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e a qualidade de vida dos baianos. Esse plano tem como foco central aumentar o IDH e incrementar a competitividade da Bahia. O secretário de Planejamento da Bahia, Armando Avena,explica,
“A idéia é que o estado possa, ao tempo em que aumenta os programas de combate à pobreza e de inclusão social, melhorar a infra-estrura logística, principalmente no que se refere a estradas e portos, e ainda atrair novas empresas, ampliando o seu perfil produtivo. É preciso também estimular o investimento em novos segmentos produtivos, tudo isso junto com uma política que gere emprego, renda e mais inclusão social”[219].
Para Avena, o Governador recomendou além de estimular o crescimento do semi-árido viabilizando economicamente a região, estimular mais o turismo, o lazer, a cultura, a pesquisa e o desenvolvimento. Estas são portanto as atividades consideradas importantes para o Estado. Nos termos do Plano Estratégico: “É prioridade absoluta avançar no combate à pobreza e às desigualdades sociais, ao tempo em que se consolidam ações voltadas para o pleno atendimento ao cidadão nas áreas de educação, habitação, cultura, saúde e segurança pública”[220]. No que se refere à área de cultura, o Plano Estratégico, no capítulo Riquezas da Boa Terra, fala tanto do patrimônio arquitetônico como do imaterial :
“(…) é preciso distinguir os instrumentos de preservação e a recuperação do patrimônio histórico e arquitetônico dos mecanismos voltados para o fortalecimento da herança cultural intangível. No primeiro caso, deve-se garantir a conservação e restauração do patrimônio físico, que não apenas incorpora a riqueza histórico-cultural do povo baiano, mas também viabiliza o aproveitamento pleno do imenso potencial turístico do Estado. A herança de conhecimentos, valores e tradições que fortalece a identidade cultural da Bahia, por sua vez, merece também atenção, além dos motivos acima mencionados, pela sua capacidade de garantir a coesão social”[221].
Nesse sentido, uma meta importante é preservar as manifestações culturais locais e valorizar o conhecimento popular como meio de fortalecer a inserção social. No Plano Estratégico é observado que “as metas de expansão da economia devem levar em conta os riscos associados à perda de identidade cultural e à degradação do patrimônio construído, atentando para a necessidade de intervenções voltadas para a sua recuperação/ revitalização”[222]. A nova estratégia de preservação do patrimônio cultural engloba, segundo o documento, o patrimônio físico e o acervo tangível e intangível da Bahia, envolvendo, além de Salvador, outras cidades históricas.
Através desta nova perspectiva estadual, Ilhéus precisa projetar as suas necessidades e se colocar nesse cenário, buscando conquistar um reconhecimento do Estado da sua importância no cenário histórico e na identidade cultural da Bahia.
Vale chamar atenção para os seguintes fatos: este tópico foi formulado com base no discurso oficial do Governo da Bahia, colhido através de relatórios e planos de ação, sem ter tido tempo de checagem e questionamento das informações contidas nestes documentos; além disso, é importante considerar que as políticas estaduais de cultura vigentes, apesar de movimentarem culturalmente a Bahia, estão intrínsecamente ligadas ao movimento político que está no poder há doze anos consecutivos, o Carlismo, que sempre manipulou os processos culturais baianos em função dos seus interesses políticos e econômicos (como por exemplo, a utilização do Fazcultura para beneficiar prefeituras de partidos da coligação no poder), através de um discurso avançado de cultura e num tratamento superficial das tradições culturais da Bahia.
GESTÃO E POLÍTICAS CULTURAIS DE ILHÉUS
A cultura sempre foi um aspecto diferencial na cidade de Ilhéus, seja pelo cultivo do cacau que trouxe consigo costumes e um novo modo de vida para a região cacaueira, seja pela miscigenação cultural característica de uma fronteira agrícola, provocada pela atração de povos de várias origens pelas novas terras e pelos “frutos de ouro”. Assim se formou a identidade cultural da região e a civilização grapiúna, imortalizada e divulgada para o mundo por um dos maiores expoentes culturais da região, Jorge Amado.
Mais do que em qualquer outro tempo, hoje a cultura e a história de Ilhéus têm importância vital para a retomada do desenvolvimento da cidade, seja pela valorização da auto-estima dos habitantes da região, pela possibilidade de criação de novos postos de trabalho, ou ainda pela atração de divisas com o fortalecimento desta atividade. Pensar Ilhéus sem o seu acervo cultural, sem a preservação do seu patrimônio, seria pensar em uma cidade sem ‘alma’, sem vida, sem essência. É impossível, aliás como em toda localidade, dissociar a cidade e o seu povo da sua cultura e dos seus costumes. O trabalho com a cultura é uma forma de devolver ao povo, aos habitantes locais a sua história, de reforçar a sua identidade e o seu valor no mundo contemporâneo.
O sucesso do desenvolvimento das atividades artísticas ilheenses praticamente se resume à literatura, tendo esta despontado para o mundo. As outras artes, como dependiam do interesse dos coronéis, tinham de fazer sucesso primeiramente fora da cidade, para depois serem valorizadas por eles. Segundo afirma Jorge Amado em São Jorge dos Ilhéus, “Os coronéis desprezavam os artistas até que êstes eram consagrados. Depois passavam a respeitá-los, a admirá-los de longe”[223]. Para o historiador Antônio Guerreiro de Freitas, a ausência de expressões artísticas na região é um reflexo da situação do país, “a região cacaueira, sob o ponto de vista artístico, representa o seu tempo”[224]. Freitas analisa que a única expressão artística que a região, no seu apogeu, poderia desenvolver seria a literatura - o romance regional e a poesia - o que aliás o fez de maneira ‘extraordinária’ [225], acompanhando o movimento artístico nacional que naquela época colocava em destaque os grandes escritores e romancistas regionais. O historiador acrescenta que no momento em que as outras formas artísticas (cinema, música e teatro) começavam a marcar o país, nos anos 50, o cacau já estava em crise. Após o movimento literário que divulgou os trabalhos de Jorge Amado, Adonias Filho, Hélio Pólvora, Cyro de Mattos, Sosígenes Costa, Jorge Medauar e Clodomir Xavier, outros escritores surgiram na região, mas nenhum de destaque nacional.
Apesar da Prefeitura não ter um catálogo dos equipamentos culturais e dos artistas locais, a Secretaria de Cultura e Turismo do Estado da Bahia, através do Censo Cultural de 1996 [226] identificou que em Ilhéus existem: 3 bibliotecas, 3 casas de cultura/ centros culturais, 2 salas de exposições, 5 museus (sendo que o Museu do Cacau está desativado), 2 teatros e 5 auditórios. Como o Censo foi realizado em 1996, não foram registrados os seguintes espaços culturais: o Teatro Pedro Mattos, o Centro Cultural de Olivença, a sala de exposições do TMI, entre outros. Quanto à comunidade artística foram registrados: 8 artesões, 55 artistas (sendo 17 músicos, 5 bailarinos, 4 artistas plásticos e 29 atores), 3 corais, 19 escritores, 8 grupos carnavalescos, 3 grupos de capoeira, 2 grupos de dança, 4 de teatro e 1 grupo folclórico. Uma vez que este Censo não sofre atualizações, encontrando-se defasado, nele constam artistas que já estão falecidos, como Équio Reis e Pedro Mattos, assim como não há registro do grupo Teatro Popular de Ilhéus.
É importante mencionar as ações desenvolvidas pelo governo Jabes Ribeiro ao longo de dois mandatos: a recuperação do Teatro Municipal de Ilhéus, a revitalização do Circo Folias da Gabriela, da Biblioteca Pública Municipal Adonias Filho, do Arquivo Público João Mangabeira, e a criação da Casa de Cultura Jorge Amado. O Carnaval Cultural, a Semana Jorge Amado de Cultura e Arte, o Memorial da Cultura Negra, e o itinerante Águia da Cultura são projetos em pauta atualmente
Estrutura dos órgãos de cultura
O órgão municipal responsável pela gestão cultural em Ilhéus é a Fundação Cultural de Ilhéus (Fundaci), que administra os seguintes equipamentos: Teatro Municipal de Ilhéus (TMI), Concha Acústica, Circo Folias da Gabriela, Casa de Cultura Jorge Amado, Biblioteca Pública Municipal Adonias Filho, Arquivo Público João Mangabeira, Centro Cultural de Olivença, Memorial da Cultura Negra, Bataclan e a biblioteca móvel Águia da Cultura.
Ainda na estrutura municipal há o Conselho de Cultura, que é formado por membros do poder público (representantes de algumas secretarias) e o mesmo número de conselheiros da iniciativa privada (de organizações como da Academia de Letras e do Instituto Histórico). A presidência do Conselho é ocupada pelo presidente da Fundação Cultural, atualmente, Maria Luisa Heine. Segundo ela, apesar do conselho ter um atrelamento ao poder municipal, algumas pessoas que fazem parte dele têm consciência de que as ações devem ser contínuas, independentemente do governo, em prol da cultura local, “eu tenho esta consciência, o presidente do Instituto Histórico também (…) é a gente ir buscando pessoas que tenham esta consciência”[227].
A Fundação Cultural de Ilhéus mudou de presidente recentemente, em julho de 2003. O presidente anterior, Hélio Pólvora, que estava a sua frente desde 1° de janeiro de 1997, pediu afastamento por motivos pessoais e foi substituído pela historiadora Maria Luisa Heine, que já fazia parte da Fundaci, tendo implementado o ensino da história de Ilhéus nas Escolas Municipais. A verba mensal destinada à Fundaci varia entre R$30 a R$50 mil, excluindo-se determinados projetos, como o Carnaval Cultural e o São João.
Assim como acontece na Secretaria de Turismo de Ilhéus, segundo depoimento do próprio Hélio Pólvora, todo o poder de decisão sobre metas e gastos financeiros está concentrado nas mãos do prefeito, que não dá autonomia ao presidente da Fundaci. Pólvora revela, “a prefeitura é realmente a planejadora, a definidora da política cultural”[228]. Maria de Lourdes Simões reafirma o pensamento de Pólvora quando comenta, “fica um pouco ao sabor das sensibilidades administrativas, porque a prefeitura, ao fim e ao cabo, é quem coordena essas coisas”[229]. A professora cita a gestão cultural da cidade de Itabuna como exemplo para a concretização de uma política cultural mais democrática, “ Itabuna tem um trabalho mais de base, porque se volta para a inclusão social, para o resgate dessa questão de cidadania, tanto que se chama Fundação de Cultura e Cidadania”[230].
Políticas e estratégias atuais
A falta de uma política e de uma estratégia para a área cultural é percebida pelos própios gestores de cultura do município. O ex-presidente da Fudaci, Hélio Pólvora, admite que não existe um planejamento da cultura em Ilhéus, que o programa cultural é executado na medida em que as necessidades vão surgindo, como as datas comemorativas, os lançamentos de livros, visitas de personalidades, realização de congressos e feiras — “O programa depende do surgimento destes eventos, surgimento espontâneo e natural”[231]. Pólvora testemunha que as ações culturais são planejadas a partir de sugestões de órgãos do governo do Estado, de seus canais de representação política, como também de sugestões do prefeito, secretários e dirigentes de órgãos da comunidade, “Não sei realmente se algum dia existirá oficialmente essa política cultural”[232]. O escritor e ex-presidente da Fundaci, criou eventos em homenagem aos aniversários de Castro Alves, Carlos Drummond de Andrade e Sosígenes Costa.
Essa falta de uma política cultural para a cidade de Ilhéus é vista com preocupação por estudiosos da área e pela comunidade artística. A professora da UESC, Maria de Lourdes Simões, e o dramaturgo e diretor da Casa dos Artistas, Romualdo Lisboa, têm opiniões semelhantes, pois consideram as ações municipais, relativas à cultura apenas eventuais. Maria de Lourdes observa que as ações são mais voltadas para a realização de espetáculos, eventos, festividade, do que para programas de inclusão social e de desenvolvimento artístico-cultural. A professora faz ressalva a alguns projetos que buscaram valorizar e resgatar a cultura local, como por exemplo, o seminário sobre Sosígenes Costa, “foi um trabalho importante porque resgatou um poeta que estava sendo pouco divulgado, quase se perdendo”[233]. A iniciativa de criação do Carnaval Cultural de Ilhéus, com o objetivo de resgatar os costumes carnavalescos, também é aplaudida por Maria de Lourdes. No entanto, isso não reduz a sua preocupação quando o assunto é planejamento cultural. Para a professora, um trabalho cultural sem a participação da comunidade é algo sem sustentabilidade cultural, porque as pessoas terão como único objetivo lucrar com esta atividade.
Romualdo Lisboa avalia que a grande dificuldade para se desenvolver atividades culturais na cidade é decorrente da falta de uma política pública, “Durante muitas campanhas políticas se discutiu o fazer, a elaboração de uma política cultural, mas nunca foi possível, ou se deixou tornar possível a implementação de uma política cultural”[234]. Lisboa acredita que uma política cultural deve estar pautada na diversificação, no direito de dar acesso a todas as pessoas para produzir e ‘apreender’ cultura. Ele condena a forma como é realizado o trabalho de formação nesta área pela Prefeitura de Ilhéus, trazendo pessoas de fora para fazer oficinas, porque depois estes profissionais vão embora e os artistas da terra ficam sem os recursos necessários para produzir seus trabalhos.
O diretor da Casa dos Artistas, centro cultural que tem o seu espaço cedido pela família Hans Koella[235] e o apoio da Prefeitura Municipal de Ilhéus, analisa que o poder público deveria ser o gestor da cultura local, que a Fundação Cultural deveria gerir a cultura do município, buscando o apoio da iniciativa privada para investir nesta gestão,
“É feito um faz de conta, tudo sai dos cofres públicos. Então vem um espetáculo de Salvador para comemorar o aniversário do Teatro e é o poder público que banca (…) Não existe na Fundação um setor de captação de recursos. O setor de captação que existe, sai da Fundação, vai ao gabinete do prefeito e pede dinheiro. O prefeito libera e eles gastam” [236].
A crítica de Romualdo Lisboa quanto à não existência de um departamento de captação de recursos na Fundação Cultural de Ilhéus é pertinente, porque além de não existir este departamento nem o de elaboração de projetos, os presidentes da Fundaci (tanto o ex, Hélio Pólvora, como a atual, Maria Luisa Heine) não deram prioridade em suas gestões à busca de independência da Fundaci, seja através da criação de mecanismos de captação semelhantes aos disponíveis pelos governos estaduais e federais, as leis de incentivos, seja através da busca de apoio da Secretaria da Cultura e Turismo e do Ministério da Cultura.
A experiência de Hélio Pólvora com a captação de recursos é traumática. O único projeto encaminhado por ele e aprovado pelo Ministério da Cultura, que pretendia trazer um companhia teatral de São Paulo para montar uma peça sobre um episódio histórico de Ilhéus — com um elenco de 15 a 16 pessoas, que teriam de ir de avião para Ilhéus com figurino e cenografia — na hora da emissão das passagens a equipe do Ministério disse que não havia dinheiro. Como tudo já estava agendado, Pólvora teve de realizar o evento às suas custas, “na base do sacrifício pessoal”[237], diminuindo os custos para conseguir trazer metade do elenco. Quanto ao Fazcultura, Hélio Pólvora critica a forma de funcionamento desta lei de incentivo, “eles criaram em torno disso intermediários que levam projetos e são responsáveis pela aprovação destes projetos”[238]. O ex-presidente da Fundação Cultural desabafa, “ É difícil fazer cultura no Brasil”[239].
A presidente da Fundação Cultural em exercício, Maria Luisa Heine, admite que não sabe como ter acesso ao Fazcultura, mas já tercerizou serviços de uma empresa de Salvador, do ator e produtor Paulo Atto, que ficará responsável pela elaboração e depósito no Fazcultura do projeto de um espetáculo, que deverá estrear no dia 28 de junho de 2004, aniversário da cidade. O projeto será semelhante ao Som e Luz realizado em Petrópolis, no Rio de Janeiro, mas em lugar da projeção de um vídeo documentário, será apresentado no centro histórico da cidade um espetáculo teatral sobre a história e a cultura de Ilhéus, com iluminação especial e a presença de artistas locais. É oportuno reafirmar, que o propósito da SCT de capacitar os gestores culturais do interior para usufruírem dos mecanismos de captação existentes, ainda não aportou em Ilhéus.
Neste momento, em que tanto o cenário federal como o estadual na área de gestão cultural começam a se redefinir - o primeiro com uma proposta inovadora, o estímulo da produção regional audiovisual (MinC), e o segundo com a reafirmação da prioridade à preservação do patrimônio (SCT) -, seria importante que a Fundaci estivesse preparada para esta captação de recursos e para o estímulo contínuo à produção local. Para Romualdo Lisboa da Casa dos Artistas, “Todas as pessoas são produtoras de cultura, mas do ponto de vista da arte, a gente precisa incentivar esses produtores culturais a produzirem arte”[240].
A falta de um público pagante também é um motivo destacado por Hélio Pólvora como obstáculo para se fazer cultura na cidade,
“Imagino que pela crise econômica que o país vive, as pessoas saiam pouco, desabituaram-se de sair de casa, e quando saem vão a um bar, tomar uma cervejinha, mas as pessoas não vão a eventos culturais, ouvir música, assistir a uma peça de teatro, e muito menos a uma palestra, a uma conferência. O público que se consegue reunir é muito difícil, pouco, escasso”[241].
A dificuldade de produzir cultura em Ilhéus é também percebida pelo experiente músico Itassucy, um dos poucos a sobreviver de cultura na cidade, “ Apoio foi a maior dificuldade que encontrei na minha carreira (…) ás vezes encontramos apoio até de gente de fora, que acredita no trabalho, mas aqui é uma dificuldade incrível” [242]. A importância de um plano cultural é citada por Itassucy, reconhecendo que todos ganhariam com o planejamento, além de proporcionar a união dos artistas locais. A falta de planejamento é justificada pela falta de recursos, por Hélio Pólvora e Maria Luisa Haine. Para Maria Luisa, a falta de dinheiro é o principal fator que impede a concretização dos projetos, mas ela acredita que a cultura pode ser trabalhada em vários níveis, “Existem algumas ações que podem ser feitas, que não dependem de recursos. Dependem da articulação, da vontade, e é nessa linha que estamos trabalhando”[243]. Maria Luisa Heine está na presidência da Fundaci desde 1° de julho de 2003.
Iniciativa de artistas também podem ir nessa direção, como é o exemplo do Teatro Popular de Ilhéus (TPI). Esse grupo foi criado, em 1995, por Équio Reis e após o seu falecimento está sendo coordenado por Romualdo Lisboa, que atualmente além de ser o diretor desse grupo teatral acumula a função de diretor da Casa dos Artistas. O grupo do Teatro Popular de Ilhéus é responsável tanto pela produção dos seus espetáculos quanto pela administração, manutenção, atendimento e limpeza da Casa dos Artistas. Équio Reis, através do Teatro Popular de Ilhéus teve a iniciativa de desenvolver uma política cultural independentemente do município. Romualdo Lisboa explica “o TPI é uma ONG que tem uma política cultural voltada para viabilizar, implementar ações diretas nos bairros, nas comunidades, e fazer com que isso gere, o que a gente chama de movimento cultural”[244].
O Teatro Popular de Ilhéus teve o seu projeto Rodando Ilhéus aprovado pelo Fazcultura. Um projeto que vai percorrer oito bairros da cidade com dois espetáculos, um infantil, o Ita e o adulto, Pega Pá Capá. Nessas comunidades, o grupo discutirá com os artistas locais, realizará uma série de encontros e seis semanas de oficinas de teatro, música e dança. Lisboa projeta, “No final destas oficinas queremos ter como resultado um espetáculo que seja a cara daquela comunidade. E estes espetáculos vêm ser apresentados no Teatro Pedro Mattos” [245].
A Casa dos Artistas e o Teatro Popular de Ilhéus têm mobilizado a cena cultural ilheense. Équio Reis, fundador do Teatro Popular, foi também um dos fundadores do Teatro Vila Velha, em Salvador, que neste momento desenvolve propostas semelhantes, de exercício teatral com grupos de teatros residentes, e trabalha com temáticas sociais (a exemplo do Bando de Teatro Olodum), além de articular o mesmo tipo de programação, de segunda a domingo (no caso de Ilhéus de segunda a sábado) com uma pauta de atividades artísticas diversificadas, uma a cada dia[246]. Aliás, os gestores da Casa dos Artistas se inspiram e sabem se utilizar de iniciativas bem sucedidas adotadas por espaços culturais soteropolitanos. Por exemplo, o layout da sua programação artística é idêntica à do Teatro XVIII. Segundo Lisboa, Aninha Franco ficou feliz com a iniciativa, “Aninha Franco disse, pô vocês copiaram mesmo, né? Bacana!” [247]
As semelhanças entre o TPI e o TVV não são por acaso e não param por aí, Romualdo Lisboa está diretamente em contato com o diretor teatral Márcio Meirelles, e já fazem há algum tempo intercâmbio de suas produções. Inicialmente, o TPI foi convidado por Meirelles para apresentar o espetáculo Esganarelo, O Corno Imaginário de Molierè no Teatro Vila Velha. Após esta apresentação, segundo Lisboa com casa cheia, ficou estabelecido um vínculo entre os dois centros culturais, “ele escreve um texto lá e manda para mim e eu escrevo um aqui e mando pra ele. A gente discute tudo o que a gente faz”[248]. O Teatro Popular de Ilhéus fez nova temporada no Teatro Vila Velha em Salvador, em junho/2003, com doze atores e o espetáculo Pega Pá Capá. Também foram selecionados pelo concurso nacional da Volkswagen, o Criação Teatral, e atendendo a várias regras do concurso montaram o espetáculo A Cantora Careca, de dez minutos, que também foi apresentado no Vila.
O próximo projeto do Teatro Popular de Ilhéus será a montagem de um texto de Bertold Brecht sob a direção de Márcio Meirelles e de Romualdo Lisboa, com temporadas simultâneas em Salvador e Ilhéus. Lisboa revela um sonho mais alto “existe a possibilidade da gente fazer uma montagem em Portugal ou na Itália, simultaneamente à Bahia. É um projeto que a Fundação Dante Aligheri, de Salvador, está tentando organizar pra gente”[249]. O diretor da Casa dos Artistas analisa que seria muito importante a montagem de um Brecht em Ilhéus, porque a cidade está em um momento político que necessita discutir assuntos que Brecht questiona.
O Teatro Pedro Mattos é um teatro de bolso, que faz parte da Casa dos Artistas, tem 80 lugares, e distribui a cada espetáculo 30 ingressos para as Escolas Públicas de Ilhéus. Os ingressos têm um preço de R$5, mas ao comprar o Ingressão (também uma fórmula utilizada pelo Vila Velha), R$15, o espectador tem direito a cinco ingressos para espetáculos diferentes e ainda a descontos em algumas lojas da cidade. Romualdo Lisboa revela que a média de venda por espetáculo é entre cinco a dez ingressos,
“ O público ilheense vem, mas as pessoas não estão habituadas a pagar por um espetáculo de teatro, porque o teatro sempre é visto como algo não profissional. É profissional quando o cara vem da Globo, e chega no teatro e cobra R$50 no ingresso, e as pessoas vão e pagam… mas como somos nós aqui, para eles é como se fosse uma brincadeira. O que me impressiona é que quando a gente chega no TVV a gente lota aquilo lá. As pessoas vem de todos os cantos para pagar o ingresso mais do que o dobro do que se paga aqui”[250].
Pelo valor do ingresso, pela média destes vendidos por espetáculos e pela quantidade de lugares disponíveis na platéia, dá para contabilizar que é impossível a Casa dos Artistas se manter apenas com a sua bilheteria. Apesar da Casa dos Artistas também arrecadar fundos com as mensalidades das oficinas livres de teatro adulto e adolescentes, R$50 por aluno, e dos cursos de instrumentos como violão, piano, teclado, bateria, violino, flauta transversal. Além disso, a Prefeitura de Ilhéus patrocina o material gráfico do centro cultural, a Secretaria de Educação ajuda com pessoal, vales transportes e pequenas ajudas financeiras.
Ações
As ações culturais no município de Ilhéus, após Maria Luisa Heine ter assumido a presidência da Fundaci, estão voltadas para a organização de oficinas em bairros populares, e para a formação de professores da rede pública afim de fortalecer o projeto do ensino da história de Ilhéus. Para Maria Luisa, “ Estamos fazendo menos eventos e privilegiando uma política de implantação de projetos culturais. Já que não temos recursos para eventos, estamos fazendo esta outra parte”[251]. A presidente da Fundaci pretende ainda em sua gestão, que durará um ano e meio, fazer um catálogo dos artistas ilheenses.
Quanto aos espaços culturais administrados pela Prefeitura de Ilhéus, encontram-se na sua maioria em estado precário e funcionando de forma insatisfatória: o Teatro Municipal de Ilhéus e o Circo Folias da Gabriela ficaram fechados em pleno verão de 2003; a Concha Acústica, sem mínimas condições de conforto, tem apresentado poucos eventos artísticos, sendo freqüentemente cedida para encontros religiosos. Aliás, não houve nenhuma programação cultural específica para estes espaços culturais, razão pela qual a administração da Prefeitura é muito criticada.
O Teatro Municipal de Ilhéus (TMI), antigo Cine-Teatro de Ilhéus, tem a sua pauta basicamente composta por espetáculos locais, especialmente nos últimos meses do ano quando é ocupada por espetáculos das escolas de dança locais. O TMI produz apenas um único projeto, o Projeto Seis e Meia, com músicos ilheenses, e que acontece uma vez por semana, em alguns meses do ano. No ano de 2002, o Municipal de Ilhéus recebeu 6 espetáculos nacionais, 2 estaduais, 35 locais e produziu 17 relativos ao Projeto Seis e Meia. Foram realizados, em média, 8 espetáculos por mês no teatro. Até 19 de setembro de 2003, foram apresentados 2 espetáculos nacionais, 3 estaduais e 26 locais. A presidente da Fundação, Maria Luisa Heine revela, “os projetos nacionais estão me preocupando, até porque há uma cobrança da população, e eu acho justo. A gente está aqui para atender ao que a população quer”[252]. Segundo Maria Luisa, o que realmente preocupa é o fato de não se ter dinheiro em caixa, mas existem alguns produtores que se oferecem para levar espetáculos para Ilhéus apenas pela bilheteria. Hospedagem e alimentação, seriam de fácil permuta, as passagens poderiam ser barateadas com o desdobramento de bilhetes, embora deva-se considerar que o verão seja a pior época para se conseguir essas permutas e desdobramentos, por conta do aumento do fluxo turístico. De todo modo, a presidente da Fundaci faz planos de encerrar a sua gestão com “chave de ouro”, trazendo produções de fora para Ilhéus.
O TMI, apesar de ser um equipamento oficialmente ligado à Fundação, o ex-presidente da Fundaci, Hélio Pólvora, demonstra não estar a par do fechamento do Teatro no período de férias (meses de janeiro e fevereiro), “O Teatro é responsabilidade da Fundação. As pautas são agendadas com o nosso conhecimento. Aqui não consta que houve fechamento”[253]. Quanto a esta questão, Maria Luisa Heine adianta que já tem um projeto para movimentar o TMI nas férias com produções locais. Vale comentar que a direção do TMI, composta por Maurício Pinheiro e a primeira dama do município, Adriana Ribeiro, é muito criticada. O Barão de Popoff acredita que “ a mulher do prefeito, que está à frente do teatro, e a sua equipe não entendem de cultura” [254].
A ‘elitização’ do TMI é compreendida pelo diretor da Casa do Artistas, Romualdo Lisboa, “o TMI é um Municipal, e como todo Teatro Municipal, em todos os lugares do mundo, é um espaço que limita o trabalho, as possibilidades”[255]. No entanto, Lisboa aposta que o Teatro Municipal de Ilhéus pode ser popularizado, embora se volte para a elite, “o TMI ainda carrega a estigma de ser um espaço de elite. Apesar da elite de Ilhéus ser um ponto de discussão” [256].
A Concha Acústica também é alvo de muitas críticas, que tem se agravado com sua programação atual, que só promove shows evangélicos, por interesse da vice-prefeita, Ângela Correa de Souza. Além disso, dispõe de uma estrutura precária, ou seja, apenas uma caixa de palco sem nenhuma elaboração estética e um piso íngreme coberto por grama, que com qualquer chuva vira um monte de lama. Nunca houve um projeto de recuperação que buscasse um maior conforto para os espectadores.
O Circo Folias da Gabriela é um espaço considerado por artistas e público como um dos mais adequados para show, de médio porte, de Ilhéus. O circo atualmente está fechado, sem programação, e com a sua lona rasgada após as chuvas e ventos de inverno. O músico Itassucy questiona “acho que deveriam explorar mais o Circo Folias da Gabriela, que é um espaço maravilhoso, mas muito mal explorado. Poderiam fazer um projeto para o circo, não só de música, mas teatro e dança” [257].
A Casa de Cultura Jorge Amado, é situada em um palacete do começo do século, e foi inagurada em 1997. Essa Casa abriga peças do acervo de Jorge Amado cedidas por sua família, capas de livro, objetos de arte referentes a sua vida, e tem um parte destinada às obras de escritores locais. Segundo o ex-presidente da Fundaci, Hélio Pólvora, em seis anos de existência a Casa recebeu 70 mil visitantes com assinaturas registradas em livros de visitação, “É uma Casa, um projeto vitorioso”[258]. Ainda assim, há críticas ao seu horário de funcionamento, horário comercial, principalmente no verão, quando a cidade recebe um maior número de visitantes. Hélio Pólvora analisa que isto decorre de um problema trabalhista, pois os funcionários têm de cumprir horários e fora dele se é obrigado a pagar horas extras e a Fundação não dispõe de recursos. Maria Luisa Heine anuncia que está sendo pensada uma equação para esta questão. Ela avalia positivamente o desenvolvimento da equipe da CJA ,“é um trabalho que vem sendo muito bem feito”[259]. Ao contrário de Maria Luisa, o Coordenador do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, Hélio Barroco, faz severas críticas a esta instituição, “A Casa de Jorge Amado é uma vergonha. Acho até contra o nome de Jorge Amado, um renomado escritor, que deu seu nome e sua imagem para que Ilhéus utilizasse pelo resto da vida, entretanto isso não é aproveitado”[260].
A Biblioteca Pública Municipal Adonias Filho foi remanejada no ano passado para o prédio do antigo Grupo Escolar de Ilhéus, localizado na praça mais movimentada da cidade, a Praça Castro Alves. No mesmo prédio está localizado o Arquivo Público João Mangabeira, no qual constam documentos importantes, como a coleção do Diário da Tarde, de Ilhéus, e do Diário Oficial do Município, além de documentos oficiais e exposição de objetos de arte e documentos, como originais dos livros de Adonias Filho. Atualmente a Biblioteca Pública também está realizando seções de cinema e exposições para a população. O itinerante Águia da Cultura funciona como uma biblioteca móvel que circula pelos bairros do município, e realiza apresentações de teatro, capoeira e exibição de filmes.
O Centro Cultural de Olivença desenvolve um trabalho com a comunidade carente do vilarejo, sob a organização de Rogério Mattos. Todos os sábados são exibidas duas seções de vídeo, que segundo a presidente da Fundaci têm sido lotadas, cuja entrada é franca. Além da aproximação do cinema com a comunidade, estão sendo realizadas oficinas de balé, de teatro e de artesanato para a população local. É importante destacar que existe um outro centro cultural em Olivença, o Centro Cultural e Profissionalizante Fazenda Tororomba, que não depende de verbas municipais e desenvolve oficinas profissionalizantes com a população carente há pelo menos quatro anos, como oficinas de papel maché e de artesanato. O Memorial da Cultura Negra, inaugurado no final de 2002, ainda não se encontra em pleno funcionamento.
Finalmente, o Museu do Cacau, que abriga um acervo de documentação histórica valiosa da região e da cidade de Ilhéus, da fase dos frutos de ouro, está em precário funcionamento há cerca de cinco anos, desde o desabamento de parte do telhado do prédio que o abrigava. O Museu possui mais de 2500 peças, dentre estas quadros de artistas, documentos, mobiliário, cristais e até urnas funerárias da época pré-cabralina. Todas estas peças encontram-se embaladas e colocadas no auditório do prédio. O imóvel é da UESC e o acervo é da Secretaria de Agricultura do Governo do Estado, mas até hoje nada foi feito para a sua recuperação. Hans Schaeppi, como presidente do Conselho Ilheense de Turismo (CITUR), diz estar lutando pela reativação do Museu Regional do Cacau, “ ele tem de voltar a funcionar, estamos em uma campanha para revitalizá-lo, pois acabou, fechou. Já temos o apoio do Secretário de Agricultura para que o Museu volte a funcionar”[261]. O ex-presidente da Fundaci, Hélio Pólvora, vê como uma alternativa para a recuperação do Museu a reivindicação do governo municipal ao governo do estado no sentido de reaver o museu para o município a fim de recuperá-lo. A reportagem do jornal A Tarde, Memória do Cacau Está Encaixotada, de Jonildo Gloria, publicada no dia 25 de agosto de 2003, registra essa declaração da diretora do Centro de Documentação Regional da Uesc, Janete Macedo, “a universidade tentou várias vezes assumi-lo, por fim, a reitora Reneé Albagli propôs ao governo que assumisse a reforma total do prédio, para que a Universidade, aproveitando o acervo existente, iniciasse a implantação do ‘Museu da Terra e do Homem do Sul da Bahia’. Seria o Museu do Cacau de uma forma ampliada”[262]. Além das tentativas da UESC, o prefeito Jabes Ribeiro reivindicou que o acervo do Museu do Cacau de Salvador fosse transferido para Ilhéus, não tendo sido atendido. A presidente da Fundação Cultural de Ilhéus, Maria Luisa Haine, acredita que seja mais fácil conseguir a transferência do museu primeiramente para a Secretaria da Cultura e Turismo do Estado, para depois o município tentar reavê-lo. Os dirigentes do museu de Salvador não consideram que o museu de Ilhéus esteja fechado, mas sim em obras. No entanto, é de questionar como um museu pode estar aberto com todas as suas peças encaixotadas.
Patrimônio Histórico-Cultural
Ilhéus tem um rico patrimônio histórico-cultural, que engloba: igrejas seculares, como a Matriz de São Jorge (1556), a Capela Nossa Senhora de Santana (a terceira igreja mais antiga do país) e a Capela de Nossa Senhora das Vitórias (também uma das igrejas mais antigas do Brasil, construída na primeira metade do século XVI); imponentes palacetes, como o Palácio Paranaguá (1907) - sede da Prefeitura de Ilhéus, o Palacete Misael Tavares (1922) e o Palacete dos Berbert (construído no início do século XIX, uma réplica do Palácio do Catete, RJ); Convento e Igreja Nossa Senhora da Piedade (1916); Associação Comercial de Ilhéus (1932); Teatro Municipal de Ilhéus (1932), antigo Cine Teatro Ilhéus; Casa de Jorge Amado (1929); estátua de Sapho (início do século XX); e tantos outros patrimônios arquitetônicos e culturais, e monumentos que necessitam serem preservados, mantidos e revalorizados[263].
A preservação do patrimônio histórico-cultural nacional está em voga, após os pronunciamentos do Ministro da Cultura, Gilberto Gil, que expressaram como objetivo da sua gestão a preservação do ‘velho’ e a abertura ao ‘novo’. Também no âmbito estadual, o Plano Estratégico do Estado para a área cultural, menciona reiteiradamente a necessidade de preservação do patrimônio cultural material e imaterial. A historiadora, Maria Luisa Heine, que dedica a sua tese de mestrado ao Patrimônio Histórico de Ilhéus, e há anos vem reciclando professores municipais para o ensino da história de Ilhéus (conteúdo obrigatório a partir da aplicação da Lei Nizan Lima), sendo a atual presidente da Fundação Cultural de Ilhéus, tem a questão da preservação do patrimônio como algo fundamental para a cultura ilheense. Ela vem realizando seminários e palestras sobre esse tema para empresários, secretários, arquitetos, professores e estudantes, “as pessoas têm pavor da palavra tombamento porque eles acham que a gente quer tomar e que a gente tem a obrigação de cuidar. (…) Quero que as pessoas se convençam que elas vão lucrar, ter vantagens com isso”[264]. Maria Luisa reconhece que é preciso desenvolver um trabalho contínuo de conscientização da preservação do patrimônio. A professora do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, Maria de Lourdes Simões, concorda com o caminho iniciado por Maria Luisa, um trabalho de educação, mas considera necessário haver um planejamento, de preferência participativo, voltado para a preservação patrimonial.
O centro da cidade reúne a maior parte do patrimônio histórico-cultural de Ilhéus, no mesmo local em que funciona o comércio. A presidente da Fundaci considera que este é um dos grandes entraves para a preservação do patrimônio, pois os empresários querem sempre estar reformando as suas fachadas e interiores seguindo o ‘desenho da atualidade’ e chamando a atenção para as suas marcas. Em 2003, três imóveis dessa área sofreram transformações radicais: no terreno que existia a antiga prefeitura de Ilhéus — um prédio tombado, que foi demolido há oito anos sob protestos da população, na madrugada de um domingo — foi erguido um prédio moderno, como diz Maria Luisa, “totalmente desconectado do entorno”, que abriga uma agência de turismo e de câmbio, Encantur; o Magazine da Criança construiu uma enorme caixa com blindex na sua fachada; e a loja Topada, cuja reforma a presidente da Fundaci comenta “o arquiteto não poderia fazer aquele projeto, a PMI não poderia ter liberado, mas quando o fiscal foi até lá, já estava feito.”[265] Maria Luisa acredita que as pessoas estão mais atentas à descaracterização daquela área, mas considera: “ fica aquela coisa de amizade, se tem acordos financeiros eu não sei, mas o próprio fiscal não está convencido de que é importante a preservação.”[266] A presidente da Fundação está consciente de que existe uma tendência de modernização dos prédios e que por isso é necessária uma ação imediata antes que se destrua o conjunto patrimonial, “é preciso dar uma cara a este centro histórico e se a gente começar a derrubar não haverá mais centro histórico, porque ninguém vai derrubar o Palácio, a Casa de Jorge Amado, o Vesúvio, mas eles sozinhos não fazem um centro histórico”[267]. A Secretaria de Planejamento tem realizado reuniões com os comerciantes e o secretário Antônio Vieira disponibilizou, a quem quisesse fazer melhorias na sua fachada, um arquiteto da prefeitura, sem custos de execução da planta, para garantir a realização de projetos dentro dos padrões exigidos pelo patrimônio histórico-cultural ilheense. A historiadora Maria Luisa Heine analisa, “pela constituição de 1988, tudo que fale da história de um lugar é um bem cultural! Não importa se tenha pertencido a coronel ou trabalhador, se foi Casagrande ou Senzala, tudo é patrimônio cultural e precisa ser preservado”[268].
O projeto de reforma do bar Vesúvio também não teve o cuidado de preservar as suas características originais. Retiraram as madeiras antigas, colocaram um grande letreiro em neon, descaracterizando completamente a simplicidade do lugar. Maria Luisa Heine reconhece que a prefeitura e seus arquitetos não têm competência para esse tipo de obra, pois embargaram, interviram no projeto e mesmo assim, as características originais não foram preservadas, “ A prefeitura não está preparada para dar este suporte”[269].
A Catedral de São Sebastião, cartão postal da cidade, e marco da civilização do cacau está precisando de reforma e em julho/2003 ameçou ser fechada por falta de segurança. O ex-presidente da Fundaci, Hélio Pólvora, analisa “ A Catedral é de responsabilidade do arcebispado, evidentemente o governo municipal poderia fazer uma observação ou tentar um reparo. Quem sabe até uma apelação pela televisão”[270]. Atualmente a Catedral de São Sebastião tem a sua fachada dividida por duas pinturas de diferentes épocas e diferentes cores, branco (de baixo até o meio) e amarelo (do meio para cima). É perceptível que a tinta é de qualidade inferior e que não houve uma manutenção especializada.
Em Olivença, a Igreja Nossa Senhora da Escada estava com a sua fachada desabando no início do ano, mas o secretário de Turismo de Ilhéus, Romualdo Pereira, diz que apesar dela precisar de manutenção, e de ter recebido ajuda na sua reforma do ano anterior, não é considerada como uma obrigação da Setur. Segundo Romualdo, a Igreja tem a obrigação de cuidar do seu patrimônio e não o município, lembrando que essa igreja é tombada e quem deveria estar cuidando da sua recuperação seria o IPHAN,
“O ano passado nós fizemos a recuperação porque a situação estava muito difícil, um forro estava caindo do telhado e fizemos como uma ajuda, porque o padre nos solicitou. O IPHAN, (…) nos procurou e nos citou (…) não deveríamos ter mexido porque é patrimônio tombado. Ele não faz a sua parte e não permite que a gente faça a nossa”[271].
Eventos
Uma política de eventos é o que caracteriza a atuação do poder municipal de Ilhéus até o momento, integrando o calendário cultural da cidade, que se repete ano a ano. O Carnaval Cultural, a Festa de Yemanjá, a Puxada do Mastro de São Sebastião, a Semana Jorge Amado de Cultura e Arte, e o aniversário da cidade são os principais eventos de Ilhéus.
O Carnaval Cultural acontece no mesmo período do carnaval nacional e foi criado como alternativa ao carnaval de Salvador, com o propósito de resgatar as expressões antigas de carnaval, as antigas marchas de carnaval, os blocos de arrasto e de sujo. No entanto, é um evento muito criticado na cidade, principalmente pelos empresários do trade, porque apesar de levar este nome e ter como proposta o resgate cultural, os trios do carnaval tradicional permanecem no circuito. O Barão de Popoff argumenta,“ O cultural deveria ser com os blocos, as caretas, as batucadas de antigamente. A ‘cultura’ seria mostrar alguma coisa que se fazia, que se nasceu fazendo”[272]. A maioria dos blocos carnavalescos pararam de sair por falta de incentivo, pelos altos custos para se manterem. Popoff avalia, “Ao invés de se pagar aos trios, deveria se pagar para que os blocos saíssem. Dar os panos para a fantasia de todos e então iriam à rua. Nós veríamos então a cultura “[273]. Apesar das críticas esta é uma iniciativa de resgate cultural já destacada pela professora da UESC Maria de Lourdes Simões.
A festa de Yemanjá, realizada em Ilhéus no dia 2 de Fevereiro, é organizada simultaneamente por vários grupos, sobressaindos a do Terreiro de Mãe Laura, no Pontal. A Avenida 2 de Julho, normalmente abriga a festa das baianas do Terreiro de Dona Carmosina, que se prolonga até a frente da Catedral de São Sebastião e do Vesúvio. Também há homenagens no bairro de pescadores, Ponta da Pedra. Mas é no Terreiro de Mãe Laura que a maioria da população ilheense e visitantes se encontram. Esse terreiro prepara uma festa com atabaques, viola e samba de roda, em um barracão que sempre é enfeitado de azul e branco, com cestos para receber as flores e as oferendas à Rainha do Mar. Ainda no barracão, baianas oferecem banho de cheiro, quem deixa o seu presente é incensado e há um cesto para arrecadar fundos. A promotora desta festa, Mãe Laura[274], informa que o evento de 2003 foi feito inteiramente por sua própria conta, que até a viola foi ela quem contratou, e que perdeu o contato com a Setur, pois não tem mais com quem falar, ninguém a atende. Contraditoriamente a Setur, ao se pronunciar sobre a festa de Yemanjá, afirma que a Prefeitura participa da manifestação da Maramata, ao pé do Morro de Pernambuco, a mesma que Mãe Laura administra. Romualdo Pereira declara, “Ali nós fazemos um trabalho e investimos na festa, há alguns anos. Um investimento pequeno de uns R$8 mil, mas tem que ser feito porque é uma tradição. Montamos a infraestrutura, bandas, trio elétricos, barcos”[275]. Sobre as diversas festas na cidade, o secretário de Turismo diz que existe uma outra mãe de santo que tem uma política interna dela, que acha que a festa não deve ser no Pontal e quer fazer a sua homenagem, seguindo os preceitos da sua religião e do seu terreiro, solicitando um espaço e este é liberado. Essa festa é organizada por Lu Cerqueira, que se intitula a dona da festa de Yemanjá, junto com a mãe de santo Carmosina. A Setur diz que o investimento neste caso é delas.
Outros eventos de caráter popular, como a Puxada do Mastro, a festa da Nossa Senhora de Santana no Rio de Engenho, e tantos outros, carecem do apoio da Prefeitura Municipal de Ilhéus, para que continue a existir a tradição local. A Igreja de Santana é tombada pelo IPHAN e em torno dela ocorre anualmente uma festa de iniciativa da comunidade, que como comprova Hélio Pólvora, presidente da Fundaci por seis anos e meio, “Nós não damos apoio (…) não há em torno da Igreja de Santana nenhum projeto especial”[276]. Quanto à Puxada do Mastro de São Sebastião, é uma festa que atrai pessoas de todo o mundo para Olivença pois se trata de um antigo ritual, que é descrito por Maria Luisa Heine em seu livro Passeio na Capitania de São Jorge como “resultado da cristianização de um ritual indígena. Assim os jesuítas atraíam os ‘selvagens’ para a fé cristã”[277]. A festa acontece na primeira semana de janeiro, e o seu ritual se inicia na aurora, ao som do sino da igreja, com a busca de um tronco na mata por um grupo de homens. Esses homens escolhem e decepam um tronco de madeira de boa qualidade, descascam-no e o puxam até a vila com uma corda. O almoço é levado para os homens na mata, que por volta das quatro horas retornam a Olivença arrastando o mastro. Após uma missa é trocado o mastro do ano anterior, se este estiver deteriorado. Caso o antigo esteja bem conservado, o novo que será queimado. O mastro é colocado na praça em frente à igreja e em seu cume ergue-se a bandeira do santo[278]. Esta festa é observada pela professora da UESC Maria de Lourdes Simões, “A Puxada do Mastro já não se faz como antigamente (…) hoje está tudo misturado com axé, com som muito alto”[279]. Antigamente, apenas uma zabumba acompanhava o ritual. A moradora e pousadeira de Olivença, Elza Muniz critica a falta de apoio a esta festa tradicional, “Quem sustenta a Puxada do Mastro hoje em Olivença são os moradores, que chegam na casa da gente pedindo um quilo de carne do sol, de feijão para fazer a comida do pessoal lá. Gente! Isso é uma tradição de Olivença”[280].
Na data comemorativa de elevação de Ilhéus a Cidade, 28 de junho, tradicionalmente se realizam festividades. Em 2002, foi essa a programação: exibição de documentário sobre o escritor Jorge Amado e show musical em comemoração ao quinto aniversário da Fundação Casa de Jorge Amado; show e entrega de Comendas de São Sebastião a personalidades que colaboraram com os programas culturais do Município, em um ato comemorativo do aniversário de reconstrução do Teatro Municipal; XV Festival de Criatividade Infantil, com a participação de estudantes, julgamento de pinturas e distribuição de prêmios e brindes; Inauguração da nova Biblioteca Pública Municipal Adonias Filho, com acervo de 22 mil volumes; e Inauguração do Arquivo Público João Mangabeira [281].
A Semana Jorge Amado de Cultura e Arte acontece na cidade há três anos, foi lançada em comemoração aos oitenta e oito anos do escritor Jorge Amado. Durante a semana, que acontece em torno da data do aniversário de nascimento do romancista (10/08), é realizada uma vasta programação. No ano de 2003, aconteceu na semana de 4 a 10 de agosto, e a sua programação foi assim composta: III Feira do Livro, lançamento de cd, lançamento de livro, Hora do Conto, Oficina de Teatro Infantil, palestra sobre a história de Ilhéus, Marinete de Tieta, abertura e exibição de filme na Terceira Mostra de Cinema (com exibição de documentários sobre a vida e a obra do escritor homenageado), Oficina de Jogos Pedagógicos, Oficina de Objetos Decorativos, lançamento de livro, e solenidade de entrega de Troféus Jorge Amado a personalidades [282].
Outros eventos, como homenagens a escritores como Sosígenes Costa, Carlos Drummond de Andrade e Castro Alves, dia da Cultura, do Índio, da Criança, da Mulher fizeram parte do calendário cultural de Ilhéus na gestão do escritor Hélio Pólvora. É necessário ressaltar a disposição da historiadora Maria Luisa Heine em manter esse calendário de eventos.
Por fim, é importante relembrar a formação social da cidade de Ilhéus: uma elite, cosmopolita, importadora e consumidora de cultura gerada fora da região, e uma vasta camada popular, que não tinha espaço social para que as suas manifestações criassem tradição. Essa desigualdade social tornou-se um fato ainda mais importante, na medida em que a ausência de um setor médio impossibilitou a valorização das manifestações populares e a produção de cultura.
INTERSEÇÃO ENTRE AS POLÍTICAS
DE CULTURA E DE TURISMO
“As cidades brasileiras não têm nenhuma deficiência que possa impedi-las de atrair turistas estrangeiros. Por que então eles não vêm? Talvez porque antes de vender condições objetivas de infra-estrutura, equipamentos e serviços, um país precise seduzir, convencer, atrair. Para isso, são fundamentais dois aspectos, a identidade cultural e a imagem internacional.”
MARCELO DANTAS. “Competitividade internacional em turismo: a identidade cultural contra o mito da qualidade dos serviços”. In: Revista Bahia Análise & Dados. Salvador: SEI, setembro 2001, p. 165.
CULTURA COMO DIFERENCIAL PARA O TURISMO
O mundo se interligou definitivamente com a globalização, através das redes de informação e de comunicação, que interconectam instantaneamente as diversas partes do planeta. Este novo ‘portal’ valorizou, ainda mais, as especificidades de cada povo, a identidade cultural de cada país, ressaltando a importância da diversidade cultural e ampliando consideravelmente os ‘limites’ do mundo em que se está inserido. A cultura nacional passou, mais do que nunca, a ser o ‘código’ específico de cada povo diante do mundo, a marca da sua identidade, e consequentemente passou a ter uma importância estratégica para o turismo, uma das atividades econômicas em maior expansão no mundo contemporâneo.
Assim, a identidade cultural tornou-se o grande diferencial para a atração de fluxos turísticos internacionais. Marcelo Dantas em Competitividade Internacional em Turismo: a identidade cultural contra o mito da qualidade dos serviços ressalta que, ao contrário do que se pensa, não é apenas a qualidade dos serviços de um país que garante o seu fluxo, “o turismo envolve componentes de subjetividade, de fantasia, de sonho, de significados simbólicos, que não respondem, necessariamente, a aspectos objetivos da realidade. (…) É o que a cidade tem, o que ela consegue significar no mundo que faz dela uma atração”[283]. O pesquisador analisa que Paris e Nova York são muito criticadas pelos seus serviços, no entanto, não deixam de ser as cidades mais visitadas do mundo. Até mesmo Marrocos, bem-sucedido destino turístico do Terceiro Mundo, tem fluxo garantido apesar dos serviços e pessoal desqualificados para atendimento ao turismo de alto poder aquisitivo, “ a oferta de serviços e seu padrão de qualidade estão abaixo de qualquer exigência do turista médio. (…) É difícil encontrar respostas fora dos aspectos culturais e de identidade nacional que tornam o Marrocos uma nação singular”[284].
Marcelo Dantas reflete que a principal estratégia utilizada pelos países mais visitados do mundo, para atrair o fluxo turístico, é a difusão da identidade e da cultura nacionais. Para exemplificar cita os Estados Unidos – primeiro do mundo em exportação de produtos culturais – que garantem a sua atração turística com os produtos da sua indústria cultural e do entretenimento como a música, a literatura, a televisão e o cinema. Tomando este mesmo exemplo, o Ministro da Cultura do Brasil, Gilberto Gil, no Festival de Cinema em Gramado, considerou que os Estados Unidos são responsáveis por 90% das produções audiovisuais exibidas no mundo e assumiu que está convicto de que é através desta arte que se afirmará a identidade brasileira para o mundo,
“ Este é o sonho, este é o objetivo, esta é a meta. O que temos de fazer, povo e governo brasileiros, porque podemos fazer, é materializar sonhos. Vamos materializar juntos este, o de um cinema que reflita a dimensão de nossa grandeza cultural, territorial e econômica, de uma expressão audiovisual que reflita e energize nossa consciência de nacionalidade e nossa soberania, que apresente com luz própria, para nós e para o mundo inteiro, a nossa maneira brasileira de ser ” [285].
Marcelo Dantas reflete ainda sobre a importância de se divulgar a identidade cultural de um país, “Esse tipo de construção de imagem é impossível de ser conquistado através dos instrumentos tradicionais de marketing e propaganda. Forma-se a imagem paulatinamente, através da afirmação de uma produção artística que se renova constantemente e consolida as conquistas” [286].
Na Bahia, o Governo apostando na configuração da identidade cultural do Estado, optou pela junção da Cultura e do Turismo em uma mesma secretaria (1995), acreditando com isso poder fortalecer esses dois setores, que tanto se desenvolvem atualmente no mundo, e criar vantagens para ambas atividades. Segundo Secretário da Cultura e Turismo, Paulo Gaudenzi, o turismo teria agenda cultural e a cultura teria um maior fluxo de público para os seus espetáculos, “ A cultura, hoje, tem no turismo um importante suporte de ampliação e fortalecimento e o turismo passou a interagir com a cultura, principal fonte de diferenciação do produto turístico Bahia, em uma relação de respeito às especificidades mútuas”[287]. Para o secretário, a união do turismo com a cultura é uma tentativa de fortalecer a identidade cultural baiana.
A região cacaueira possui um grande diferencial cultural e turístico que a destingue das outras regiões do Estado, por ter uma identidade enraizada nas suas plantações de cacau, no seu modo de produção, no seu modo de ser grapiúna, e, principalmente, por ter um divulgador mundial da sua cultura, através da literatura: o escritor, Jorge Amado. Foi ele que apresentou a Bahia para o mundo através de suas obras, como comenta Marcelo Dantas. Esse filho da região cacaueira é um dos autores brasileiros mais publicado no exterior, traduzido para mais de 30 idiomas em 52 países diferentes. Onze obras amadianas foram adaptadas para televisão e sete para o cinema.[288] Os romances de Jorge Amado serviram como um atrativo para Ilhéus e para a Bahia, é o que constata Reheniglei Rhem, “(…) uma divulgação colorida e temperada da cultura baiana, atraindo e direcionando para o turismo baiano um novo visitante, o leitor-turista” [289].
A professora do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC, Maria de Lourdes Netto Simões, confirma a idéia de Reheniglei Rhem explicando que primeiramente o leitor ao ler os romances de Jorge Amado passeia pela cidade oferecida pela ficção, como um leitor-turista e depois se mobiliza para conhecer a realidade, se tornando turista-leitor,
“viajando para re-conhecer e observar as re-significações daquelas cidades, antes ‘visitadas’ através da leitura. (…) Por sua vez, o habitante local (também leitor), sentindo-se um tanto dono da ‘marca’, busca explorar o que a obra produz. Faz a sua cidade re-ler a obra através de apelos semióticos. Estabelece ’pontes’ entre o imaginário e o real. Assim passa a acontecer uma relação entre os turistas e os locais; relação essa que tem, como interseção a obra amadiana. (…) Assim a cidade é tornada texto, re-lida”[290].
Enfim, Jorge Amado é um diferencial inquestionável na formação da identidade ilheense, pois a cidade além de possuir um rico patrimônio histórico-cultural tem o privilégio de ter como ‘narrador’ da sua história e dos seus costumes, um dos escritores brasileiros de maior projeção internacional. É importante saber valorizar a identidade cultural de Ilhéus, preservar o seu patrimônio e ‘capitalizar’ esse privilégio oferecido generosamente por seu filho, Jorge Amado.
PONTO DE INTERSEÇÃO
Apesar da precariedade na definição e na implantação das políticas de cultura e de turismo e dos órgãos responsáveis por essas atividades não desenvolverem projetos conjuntamente, pode-se identificar um ponto de interseção entre as áreas de cultura e de turismo na cidade de Ilhéus — um projeto que homenageia Jorge Amado e ressalta o patrimônio histórico e cultural da cidade, que foi cenário de alguns romances do escritor, como Cacau, Terras do Sem Fim, São Jorge dos Ilhéus e Gabriela, Cravo e Canela. A fim de valorizar a identidade cultural de Ilhéus, que tem como base a já comentada cultura cacaueira e a obra de Jorge Amado e na tentativa de impulsionar o desenvolvimento do turismo cultural em Ilhéus, uma das modalidades turísticas mais promissoras no mundo, foi lançado no ano 2000 o projeto Quarteirão Jorge Amado. Segundo as estatísticas européias e norte-americanas, pelo menos 19% das pessoas vão aos Estados Unidos para ver museus e teatros, e 32% dos turistas que vão à Europa são atraídos pela sua cultura [291].
A idéia de se criar um espaço temático inspirado na obra e na vida do escritor Jorge Amado é amplamente aplaudida pela comunidade artística e pelos empresários de turismo de Ilhéus, que percebem essa iniciativa como um bom estímulo para a intensificação do fluxo turístico. É opinião de diversos estudiosos de que não se pode trabalhar com o turismo sem relacioná-lo com os valores culturais, ou seja, com a identidade cultural de um local, e com as suas riquezas naturais, como única forma de promoção da sua própria sustentabilidade. O Quarteirão Jorge Amado, um projeto de Sérgio Barbosa, ex-presidente da Ilheustur, é uma parceria da Prefeitura Municipal de Ilhéus com o Governo do Estado e engloba o antigo porto, o comércio, o centro da cidade, parte da Avenida Soares Lopes e da Avenida 2 de Julho (onde se situa o Bataclan). As obras de recuperação do Quarteirão, da Praça J.J Seabra e dos calçadões foram licitadas por R$1 milhão, segundo a Secretaria de Planejamento do município. Esta quantia foi muito questionada pela população ilheense, diante da dimensão da obra e da simplicidade dos materiais utilizados nas construções e instalações. O calçadão e a praça, por exemplo, foram pavimentados apenas com cimento.
O Quarteirão Jorge Amado foi reinaugurado em junho de 2003, com a instalação de portais com a marca do empreendimento e com a entrega à população do calçadão do comércio. Ele reune praticamente todo o patrimônio histórico-cultural do centro da cidade. Este projeto conta com a aprovação dos pesquisadores da UESC, que consideram o romancista um grande ‘trunfo’ para a cidade, uma vez que a sua obra é conhecida internacionalmente. Na opinião da professora Maria de Lourdes, que tem um artigo sobre esse assunto[292], falta ainda um trabalho de interpretação do quarteirão e uma conscientização da comunidade para a sua importância,“Acredito que esta questão temática seja um foco central para a política de turismo da cidade, porque muitos turistas vêm para Ilhéus, porque leram Jorge Amado (…) O indivíduo na Espanha, na França, lê Jorge Amado e fica curioso em conhecer aquela cidade que ele descreve”[293].
Os professores do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC — Hélio Barroco, Maria de Lourdes Simões e Salvador Trevisan — têm opiniões semelhantes quanto à dinâmica cultural de Ilhéus, ressaltando que esta não pode ir a reboque da economia e do turismo, mas sim ao contrário. Aliás, é essa visão que garante a supremacia francesa e européia no panorama mundial no que se refere à atividade turística. Romualdo Lisboa, diretor da Casa dos Artistas, também se preocupa com a aliança que se possa fazer entre o turismo e a cultura, “a gente precisa ter cuidado pra não tratar cultura como um produto (…) quando a gente transforma arte em produto, ela se deteriora, porque vira mais um produto do capitalismo”.[294] Lisboa acredita que ao se valorizar e preservar a cultura local se está contribuindo consequentemente para uma nova mentalidade dos visitantes, “ as pessoas que vêm de fora para ver como é a nossa cultura, que eles tratem isso como um bem, e que tenham um sentimento de que não só estão pagando, mas contribuindo para que este bem permaneça vivo, pulsante, em constante ebulição” [295].
Apesar da Prefeitura de Ilhéus dar ênfase ao turismo cultural, na opinião da maioria das pessoas entrevistadas, os imóveis que constituem o patrimônio histórico do município não recebem a atenção necessária da prefeitura, sobretudo no que se refere à sua manutenção e à qualidade dos projetos de recuperação. Um exemplo disso é o Bataclan, como questiona Hélio Barroco,
“Aquilo é restauração? Vão fazer ali uma casa de chá. Por que não fazem um bar temático, com pessoas caracterizadas da época? As pessoas vem com aquele imaginário, pensando que vão ver um cabaré. Então a gente monta como nos outros lugares! Tudo isso é falta de criatividade, de planejamento, de boa vontade, de investimento ”[296].
O famoso Bataclan, a casa de mulheres que era ponto de encontro dos coronéis e de homens importantes da cidade nos romances de Jorge Amado, está há mais de três anos com a fachada recuperada, pintada de cor de rosa e com vidros fumê, mas teve as suas obras internas interrompidas por falta de verba. Embora o Bataclan seja tombado como patrimônio histórico pelo município, a responsável por sua obra de recuperação interna é Taty Bonfim, uma arquiteta da cidade, e não por técnicos especializados em recuperação patrimonial. Segundo o Secretário de Turismo de Ilhéus, Romulado Pereira, não seria necessário a realização do projeto por especialistas, pois está sendo preservada toda a antiga estrutura do Bataclan, “O que não podíamos é deixar como estava, caindo. A idéia é fazer um café, uma área cultural, museu, para chamar a atenção do turista, com uma parte de exposição”[297]. Essa reforma é uma parceria da prefeitura com a Petrobras, mas como os recursos iniciais não foram suficientes, a empresa patrocinadora está repassando mais recursos através do Fazcultura; a obra que tinha conclusão prevista para junho/2003, não foi iniciada até o momento. Quem coordena a obra de recuperação do patrimônio é o próprio secretário de planejamento do município, Antônio Vieira, que segundo a Presidente da Fundação Cultural, “não admite nem palpite” [298].
O antigo porto, que fará parte do Quarteirão após a sua recuperação, está situado na área nobre da cidade. Os seus históricos armazéns sem manutenção adequada estava servindo de refúgio para marginais e desocupados, e foram demolidos em junho/2003. Segundo Antônio Vieira, secretário de Planejamento, já existe um projeto de urbanização para essa área do antigo porto, que pertence à União e era ocupada pela Codeba (Companhia das Docas do Estado da Bahia) até recentemente, tendo sido passada para a prefeitura como forma de pagamento das taxas de IPTU atrasadas, pelo órgão estadual. Numa primeira etapa do projeto, está planejada uma área voltada para o lazer, com arborização, calçadões e zona de estacionamento. Numa segunda, estão previstas duas praças intercaladas no espaço urbanizado, com equipamentos infantis.
O projeto de reforma do cais do antigo porto é também questionado por Hélio Barroco, que considera o espaço com uma grande potencialidade turística e que já deveria estar restaurado, devido à sua excelente localização voltada para a baía. Barroco acredita que a construção de uma marina com saída de catamarãs para o Pontal, englobando um mini shopping e uma danceteria, seria uma alternativa de baixo custo e de grande efeito, pois agiria em efeito cascata, promovendo uma significativa transformação dos arredores. Contudo, em junho de 2002, a prefeitura divulgou um projeto no V Fórum de Compromisso com Ilhéus, que transformará aquela área em estacionamento, visando dar suporte ao comércio. Barroco lamenta, “Isso é um escândalo, uma agressão. Infelizmente temos de criticar uma ação como essa” [299].
Portanto, o Quarteirão Jorge Amado se constitui num projeto de revitalização do centro histórico e cultural de Ilhéus e como reflete Juliana Menezes, mestranda da UESC, “um dos seus objetivos é valorizar a cultura e preservar a identidade do local”[300]. Por outro lado, a arquiteta com especialização em Conservação e Restauração de Monumentos e Conjuntos Históricos, Mariely Santana analisa: “Para os gestores, esse processo tem como objetivo principal a salvaguarda do Patrimônio Cultural e a sua qualificação, para ser mais bem utilizado pela população e, principalmente, pelo turismo, fonte importante da economia mundial nesta transição de século” [301]. Mariely vai além quando ressalva a importância do Patrimônio Cultural para uma comunidade, para uma nação,
“Esses bens, por sua vez, são aqui entendidos como todas as manifestações de expressão produzidas pelo homem, às quais são atribuídas significados, funções e valores que identificam, personalizam uma comunidade. (…)Trata-se de bens que fazem parte de uma identidade local, uma fatia de memória coletiva que traduz uma maneira de viver, de se viver em comunidade”[302].
O cuidado em preservar o patrimônio cultural deve compreender a forma de utilização deste, sem que se transforme apenas em um cenário para espetáculo com fins turísticos ou como cópia de cidades e projetos turísticos americanos. A transformação do espaço urbano em espetáculo é analisado por Mariely Santana como um perigo de perda da identidade, “ a população local perde a sua identidade, as suas características” [303]. A pesquisadora que participou da algumas etapas da restauração do Centro Histórico de Salvador testemunha,
“ apesar do discurso em prol da preservação que se baseia na busca de identidade e reconhecimento das culturas locais, o que se observa é que as expressões culturais deixam de ocorrer de maneira expontânea e livre, passando a ser planejadas, subordinadas às políticas públicas, à iniciativa privada ou à parceria de ambas, que buscam cada vez mais atrair o turista”[304].
A constatação de Mariely aponta, na verdade, uma grave falha de grande número de projetos voltados para o turismo cultural. Isso também ocorre na estratégia do turismo ilheense, conforme identifica a pesquisadora da UESC, Juliana Menezes, que está dedicando a sua tese de mestrado ao Quarteirão Jorge Amado. Juliana observa que a tônica do Quarteirão é a sua exploração apenas para fins lucrativos, “ O Quarteirão está sendo explorado apenas sob o ponto de vista mercadológico, a cultura está sendo usada pela economia” [305]. Duas alternativas são apontadas pela pesquisadora para a preservação do patrimônio cultural ilheense: o planejamento turístico responsável e participativo; e a educação da população sobre a sua história e a sua cultura. Nessa última, inclui a importância de uma ampla difusão sobre os ícones que compõem e formam a identidade do lugar, “seria importante sensibilizar e informar a comunidade a respeito do valor cultural, social e histórico da obra de Jorge Amado. É preciso conhecer para poder valorizar e preservar” [306]. Complementando essa reflexão, vale destacar um comentário citado pela pesquisadora no seu artigo, extraído no documento « Passeio Histórico Para Estudantes » : “um povo conhecedor de sua cultura e de sua história é um povo que sabe perpetuar seus costumes, suas tradições, suas lendas. É um povo que aprende a preservar o patrimônio local porque reconhece um valor intrínseco” [307].
A educação para todas as camadas sociais da comunidade é o caminho apontado pela professora da UESC, Maria de Lourdes, como base do processo de mudança da região, com relação à cultura e ao turismo. Ela acredita que o cidadão ilheense precisa ser educado para receber o turista : “O leitor poderá vir procurar o Vesúvio para comer o bolinho da Gabriela, querer ver a Gabriela, mas ele vem ver o personagem, não o elemento real. Cabe ao cidadão que recebe esse turista ter este esclarecimento, é aí que entra a educação” [308]. Para ela, através da educação, a população local se motivaria a conhecer a sua cultura, as obras de Jorge Amado e estaria melhor preparado para receber e dialogar com o turista. Maria de Lourdes analisa que o Quarteirão só atingirá o seu objetivo se atender às expectativas da comunidade, contando com a sua participação e melhorando a sua condição de vida, “ e não simplesmente vindo a ser uma vitrine para o turista”[309].
Para Romualdo Lisboa, diretor da Casa dos Artistas, falta ao Quarteirão a presença da cultura da cidade e das personagens de Jorge Amado, “ uma idéia excelente, (…) mas ainda muito mal feita, muito mal acabada. Falta personalidade, falta se ver Jorge Amado. (…) Pintar as fachadas e fazer um passeio em qualquer lugar do mundo se faz, mas para personalizar como Quarteirão Jorge Amado, é necessário muito mais do que isso” [310]. No ano passado, o Teatro Popular de Ilhéus, também dirigido por Lisboa, fez uma proposta de personalização deste espaço através da encenação de um espetáculo intitulado Da História as Estórias de Gabriela e seu Amado, que começava em frente ao Palácio Paranaguá (sede da Prefeitura de Ilhéus) contando um fato histórico da cidade de Ilhéus e transfromava a Rua Jorge Amado no universo de Gabriela. O espetáculo contou com mais de cinquenta atores figurantes que trajavam roupas da época, movimentando o Quarteirão com os personagens de Amado. No entanto, a proposta de apresentação constante deste espetáculo não foi aceita pela prefeitura, segundo comenta Romualdo Lisboa.
Enfim, este projeto que converge os interesses e ações das áreas de cultura e turismo exprime a pouca consistência das políticas desenvolvidas pelo município nas duas dimensões.
PERSPECTIVAS DE DESENVOLVIMENTO DA CIDADE
Após a realização de 20 entrevistas com estudiosos e profissionais das áreas de turismo e de cultura, da análise de alguns textos sobre a estratégia de desenvolvimento de cidades e de publicações a respeito de Ilhéus, pode-se concluir que a retomada do desenvolvimento da cidade depende da diversificação das atividades econômicas naquela localidade. O fortalecimento do parque industrial, o redirecionamento da cultura cacaueira, a implementação de outros cultivos, e o planejamento e investimento no turismo são alternativas promissoras naquela região, sobretudo se atuarem de maneira coordenada, interligada, através de um planejamento estratégico.
Para a conclusão deste trabalho, nos restringiremos a tecer considerações sobre a atividade do turismo, objeto deste estudo, como proposta para o desenvolvimento do município de Ilhéus. Apesar de todas as estatísticas mundiais convergirem para o crescimento do turismo, na opinião de algumas pessoas da comunidade ilheense, este nunca representará uma opção de desenvolvimento para a cidade, porque acreditam que a força da economia da região é essencialmente agrícola, que esta ainda depende do cacau. Como diz Tom Lavigne, “Ilhéus é trabalho, não é festa!”[311] Além do cacau, apenas o distrito industrial é apontado, pela maioria dos fazendeiros, como uma possível alternativa de desenvolvimento. Com opinião oposta, a professora Maria de Lourdes considera que o turismo pode ser o ‘salvador da pátria’, o carro chefe para o desenvolvimento da cidade e para a melhoria da qualidade de vida de seus habitantes. No entanto, ela ressalva a importância da forma de se conduzir um plano estratégico de turismo, de maneira: que se assegure a participação efetiva da comunidade, que a cultura não seja tratada em função da economia, que se tenha respeito não só ao patrimônio material mas também ao patrimônio imaterial — tradições, costumes, expressões da cultura popular etc. Para isso, segundo Maria de Lourdes Simões, é necessário que a comunidade esteja envolvida num projeto participativo, fazendo com que o turismo aconteça de uma forma sustentável.
Finalmente, Maria de Lourdes acha que se pode esperar muito do turismo, desde que os planos turísticos estejam associados a projetos de educação:
“A educação da comunidade, formas de educação para o turismo, através de um turismo interpretativo, onde o turista venha e consiga reconhecer, identificar e respeitar a cultura local. E educação também dos cidadãos, no sentido de se criar ao mesmo tempo estratégias de recepção do turista e de cuidado com o patrimônio. A educação, inclusive do ponto de vista escolar, do currículo, das pessoas conhecerem a sua cidade, a sua história, o seu potencial, para poder entender que este potencial pode ser oferecido ao turista numa forma de troca, e não de uma simples venda de um produto, de qualquer jeito, mas uma venda com dignidade” [312].
Um turismo com qualidade, é o que defende a professora, não só em termos dos produtos que ofereça, mas em termos da forma de recepção do turista, respeitando-o. Como observa a professora, o turista deve respeitar a cultura local, mas o local também deve respeitar a diversidade cultural das pessoas que chegam à cidade.
O turismo certamente pode ser responsável pelo desenvolvimento de uma cidade, de uma região ou de um país, desde que sejam feitos altos investimentos e que se assegure o desenvolvimento de um trabalho a longo prazo — de dez, quinze ou vinte anos — para que se possa formatar e consolidar um destino turístico, como foi o caso da região do Caribe. A Jamaica, por exemplo, é o país que tem um dos maiores complexos de resorts voltados para receber recém-casados norte-americanos e se destaca pela qualidade dos seus serviços, utilizando-se helicópteros e barcos luxuosos para o transporte local. Por trás desse cenário, existe um grande investimento norte-americano.
O geógrafo Clímaco Dias tem uma opinião desestimulante quanto à participação do turismo na economia de uma cidade, acreditando que o turismo só apresenta resultados positivos nos países que têm uma economia forte,“O turismo não consegue cumprir as suas promessas, em qualquer canto. Ele cumpre promessas na Espanha, na França, em Nova York, que têm um turismo dinamizador. O turismo responde efetivamente em lugares em que a economia tem um dinamismo outro, em que ele passa a fazer parte desta economia” [313]. Dias desconsidera com esta declaração a contribuição desta atividade a economia de pequenos vilarejos e lugares turísticos, como Lençóis e Morro de São Paulo na Bahia.
De fato, muitos lugares vivem à base do turismo, mas este sempre exige muitos investimentos, infraestrutura nas áreas de transporte, comunicação, hospedagem e os próprios produtos turísticos precisam ter originalidade para atrair o turista. O turismo é uma atividade que se constrói lentamente, cujos resultados não são de curto prazo. Salvador Trevisan, filósofo e professor da UESC, destaca o tempo como uma questão fundamental para o turismo: “o tempo é necessário para que se planeje e se construa toda uma infra-estrutura, para que se atraia investidores e para se formar um quadro de profissionais competentes”[314].
Além desses aspectos fundamentais — como planejamento e recursos financeiros — estudiosos apontam novas direções para o desenvolvimento sustentável e para o fortalecimento de cidades. É o caso de Jordi Borja, em quem nos basearemos para uma breve análise da cidade de Ilhéus, não como uma receita a ser seguida mas para levantarmos questionamentos para o encaminhamento de uma estratégia para a cidade.
Em As Cidades e o Planejamento Estratégico: Uma Reflexão Européia e Latino-Americana, Borja faz uma reflexão sobre a importância crescente do papel das cidades no mundo atual. Cita como exemplo a Europa, cuja recessão econômica dos anos 70 provocou uma reação dos governantes locais e dos principais ‘atores econômicos e sociais urbanos’. Nesse caso, os governantes foram além de suas obrigações legais no esforço de atrair investimentos, gerar emprego e renovar a base produtiva da cidade, articulando-se aos ‘atores urbanos’ para promover as cidades.
Na Ásia, o papel econômico das cidades é evidente. Estatísticas demonstram que cidades como Seul, Taipé, Hong Kong, Cingapura, Bangcoc, Xangai, Hanói, têm os seus governos e o conjunto dos agentes econômicos agindo de forma complementar, todos voltados para o mercado externo. O autor comenta que, ao contrário do que acontece nas cidades européias, nas asiáticas o poder público desenvolve um modelo urbano de baixo custo financeiro, mas de alto custo social.
Nos Estados Unidos, Jordi Borja explica que as cidades têm desempenhado um importante papel na mudança política e na política econômica. Ele afirma que as gestões de Reagan e de Bush extinguiram grande parte dos serviços sociais que atendiam às necessidades mínimas de um terço da população e favoreceram a desindustrialização, o que gerou desemprego nas cidades, bem como a queda nas receitas dos governos locais. Algumas cidades americanas reagiram a isso, segundo o autor, e investiram em ambiciosos projetos estratégicos, numa cooperação público-privado, com uma combinação dos seguintes objetivos: crescimento econômico e desenvolvimento urbano, soluções para os problemas gerados pela degradação ambiental, pelas crescentes desigualdades sociais e pela insegurança citadina.
Já na América Latina, Borja analisa que os processos de democratização política e de descentralização do Estado revalorizaram o papel das cidades e dos governos locais. As grandes cidades latino-americanas emergiram, na década de 90, como atores políticos e econômicos, mas a consolidação desse processo dependerá da possibilidade de se estimular grandes projetos urbanos que contem com a participação ativa dos principais agentes públicos e privados e conquistem um amplo consenso dos cidadãos,
“As grandes cidades devem enfrentar cinco tipos de desafios: nova base econômica, infra-estrutura urbana, qualidade de vida, integração social e governabilidade. Em certas cidades, o sentimento de crise provocou reação conjunta do governo local e dos principais agentes econômicos, levando-os a empenhar-se na transformação da infra-estrutura urbana, o que facilitará a passagem do modelo industrial tradicional ao de centro terciário qualificado. A consciência de crise tem sido facilitada, em algumas cidades pela capacidade de atrair e saber utilizar um grande evento internacional (...) A exemplo de Barcelona que o seu planejamento urbano não seria o marco da sua transformação urbana sem as Olimpíadas de 1992 ” [315].
Da mesma maneira, grandes eventos e festivais de arte têm impulsionado o desenvolvimento de cidades, promovendo-a no cenário mundial e ao mesmo tempo criando oportunidade desta captalizar recursos para a sua modernização urbana. Estes festivais compõem uma agenda cultural internacional, cujo principal objetivo é proporcionar o intercâmbio entre artistas de diversas origens com os artistas da localidade promotora do evento, estimulando a sua criatividade e tendo como consequência natural um aumento do fluxo turístico no período da sua realização. Como exemplo, podemos destacar a Exposição Mundial, que teve a sua última edição em Lisboa, o festival de cinema de Cannes, a Bienal de Veneza, os festivais de teatro de Berlim e de Avignon, e o Carnaval de Salvador.
Considerando que Ilhéus encontra-se inserida no contexto da América Latina, sublinhamos uma análise feita por Borja ao comparar cidades Latino-Americanas com cidades européias,
“Com alguns anos de atraso (…) os desafios talvez pareçam muito maiores, mas a idéia é a mesma. O crescimento demográfico, a extensão da cidade não legal, o peso da marginalidade social, o déficit de infra-estrutura moderna e a fraqueza dos governos locais são elementos quantitativos bastante diferentes. (...)
Uma cidade competitiva deve ter capacidade de integrar, em termos sócio-culturais, a grande maioria de sua população. Hoje, as grandes medidas de caráter urbano– social são vistas como necessárias e urgentes e, portanto, suscetíveis de contar com apoios políticos e econômicos, aos quais, até há alguns anos, não tinham acesso” [316].
Mesmo considerando que a realidade da Europa e da América Latina são incomparáveis, com maiores dificuldades para aquelas sociedades que apresentam desequilíbrios sociais mais graves, o planejamento estratégico de cidades pode ser adotado, na medida em que ele é construído em torno dos seguintes parâmetros: um projeto de cidade baseado no desenvolvimento sustentável, com planejamento urbano, social, cultural, educacional e turístico, e, principalmente, com a participação de toda a comunidade.
ILHÉUS E A RETOMADA DO DESENVOLVIMENTO
Considerando que a região cacaueira encontra-se em crise há mais de uma década, não houve ainda um esboço de reação consciente à essa situação, nem por parte do governo local, que não procura estimular a diversificação dos investimentos, nem por parte dos agentes econômicos, que têm feito tímidos empreendimentos. Numa situação de crise como essa, como diz Jordi Borja, torna-se imprescindível uma liderança que coordene um projeto coletivo,
“Dificilmente pode-se reagir positivamente a tais desafios sem uma liderança personalizada. Em muitos casos a figura do prefeito é decisiva, como aconteceu nas cidades de Lisboa e Barcelona(...) Em outras não se tem tirado todo o partido possível de oportunidades excepcionais, precisamente pela falta de liderança local. A liderança local nem sempre corresponde, inicialmente, à autoridade política. Mas esta deve estar presente e contribuir para a construção de uma liderança conjunta”[317].
Em Ilhéus, não existe, pelo menos atualmente, a possibilidade de um trabalho conjunto do governo municipal com a sociedade. O prefeito não define metas claras, a não ser a da sua permanência no governo, o que o leva a concentrar esforços na construção de escadarias em bairros populares e em obras de contenção de encostas, obras importantes mas que objetivam sobretudo agradar ao eleitorado de baixa renda. No entanto, isso não garante a sua liderança entre aqueles que detém o poder econômico da cidade, nem em outras camadas, que não confiam nele. Aliás, o próprio prefeito não demonstra interesse em liderar um projeto planejado, que conduza a cidade a um desenvolvimento integrado, pois realiza ações isoladas e sem muita conexão entre elas. O que se observa é que a falta de uma liderança - seja personificada no prefeito, no seu partido ou na sua equipe de governo - enfraquece a cidade diante do Estado, do Governo Federal, das organizações mundiais e das grandes empresas, que são os agentes financiadores e investidores de projetos fundamentais para se deslanchar um processo de desenvolvimento.
Borja destaca que atualmente um projeto de transformação urbana resulta de três fatores: a sensação de crise, aguçada pela tomada de consciência da globalização da economia; um acordo entre atores urbanos, públicos e privados, em torno de uma liderança local (política e cívica); e a vontade conjunta e o consenso entre os cidadãos, para que a cidade dê um salto, tanto do ponto de vista físico como do econômico, social e cultural.
O que se observa em Ilhéus é que, recentemente, a crise financeira da região encontra-se um pouco amenizada pelo aumento do valor da arroba do cacau, mas ela continua presente e não foi capaz de provocar nas pessoas uma real conscientização sobre a necessidade da transformação urbana. O acordo entre as partes também ainda não se deu, e muito menos encontra-se configurada uma liderança local capaz de conduzir esse processo de mudança. Os cidadãos estão muito distantes do consenso e não pensam na cidade como algo seu e de sua responsabilidade.
O historiador Antônio Guerreiro de Freitas reconhece que, no caso de Ilhéus, é difícil se constituir um novo projeto de desenvolvimento que não seja através do cacau, “acho que este é um dilema que ainda vai sobreviver! Essa busca de um novo caminho, de se tentar correr o risco para ver se consegue alguma coisa ” [318]. No caso do turismo, Freitas analisa que este inicialmente vai requerer das pessoas uma renúncia e que, no caso de ser escolhido pela antiga civilização grapiúna como uma das alternativas desenvolvimentistas, “O turismo tem de ser um projeto constituído de forma coletiva, a monocultura foi uma construção coletiva, poucos se beneficiaram, mas foi uma construção coletiva !” [319]
Freitas observa que o cacau como monocultura acabou, e caso a lavoura continue a se desenvolver vai ter que conviver com outras atividades econômicas, inclusive com a industralização do próprio cacau. Vítor Athayde expressa uma opinião convergente à de Freitas ao defender em seu artigo, O Território do Cacau no Contexto da Mundialização, que o cacau apesar das suas crises está dando frutos e é ainda um dos principais produtos agrícolas da exportação baiana, embora precise se adaptar às novas transformações do mercado e voltar-se mais para o mercado interno,
“ a Região Cacaueira da Bahia não pode mais ser pensada do ponto de vista da monocultura, mas de um eixo dinâmico de investimentos que não são mais exclusivos ou dominados pelos interesses da lavoura. Ao contrário, a dinâmica regional segue
uma trajetória de diversificação, na qual se inclui a cadeia produtiva do cacau e do chocolate como complexo agroindustrial internacionalizado” [320].
Vale lembrar, que se a região cacaueira deseja recuperar a sua lavoura, o Brasil está se desenvolvendo na produção do chocolate, ocupando o quinto lugar como produtor mundial e o quarto como processador de amêndoas de cacau. Caso a opção seja a diversificação econômica, poderá retomar o seu progresso também através do turismo e da valorização da sua cultura, considerando-se que a cultura e o turismo constituem um eixo importante do desenvolvimento de cidades, de estados e de países, no mundo contemporâneo.
Nesse caso, a formulação de um plano estratégico torna-se indispensável para uma efetiva transformação da cidade e da sua imagem, devendo incluir a participação ativa dos poderes públicos e da iniciativa privada desde a sua formulação, e que este plano possa ser implementado rapidamente, como observa Borja :
“Em primeiro lugar, a definição de um projeto de futuro só será eficaz se mobilizar, desde já, os atores urbanos públicos e privados e se concretizar-se em atuações e medidas que possam começar a ser implementadas de imediato. Só assim poder-se-á verificar a viabilidade do plano, gerar-se-á confiança entre os agentes que o promovem e chegar-se-á a um consenso citadino que resulte em cultura cívica e patriotismo de cidade. Esta será a principal força de um plano estratégico.
Em segundo lugar, um plano estratégico deve construir e/ou modificar a imagem que a cidade tem de si mesma e a que se tem dela no exterior.
Finalmente, o plano estratégico questiona o governo local, suas competências e sua organização, seus mecanismos de relação com as outras administrações e com seus cidadãos, sua imagem e sua presença internacionais”[321].
A Prefeitura de Ilhéus elaborou um Plano Estratégico de Turismo há quase dois anos (Vide capítulo 2), e este, além de ter sido criado sem a participação dos empresários do trade turístico nem da comunidade, nunca saiu do papel. Nada do que foi planejado foi realizado. Um plano que começou errado desde a sua concepção, pois as opiniões e o envolvimento do empresariado e da população seriam de fundamental importância para o seu sucesso. Na área cultural nunca existiu um planejamento ou uma definição de políticas públicas.
Voltando aos estudos de Borja, em seguida ao planejamento estratégico, a promoção da cidade é um fator fundamental para garantir o sucesso do plano, devendo ficar a cargo do governo local, “O governo local deve ser capaz de dar resposta aos atuais desafios urbanos, de construir um projeto de cidade e liderá-lo, deve ser um governo que promove” [322]. O autor explica que, a promoção da cidade no exterior, associada a uma oferta de infraestrutura e de serviços, desenvolve uma imagem forte e positiva e atrai para a cidade investidores, visitantes e usuários capazes de consumir. Essa oferta, para Borja, não deve ser financiada, executada ou gerida, em sua totalidade, pelo governo local, “O papel de promotor consiste, precisamente, em criar condições propícias à atuação dos agentes públicos ou privados (via planejamento, campanhas políticas, compensações econômicas etc.)”[323]. Compete ainda à liderança do processo promover a articulação com outras esferas públicas e a cooperação com a iniciativa privada, como meio de realizar tanto a promoção externa, anteriormente citada, quanto obras e serviços que os déficits acumulados, as novas exigências urbanas, e a mudança de dimensão da cidade exigem.
Além da promoção externa, deve ser feita ainda, segundo Borja, uma promoção interna na própria cidade, para imbuir seus habitantes de um sentimento de pertencimento, de vontade coletiva de participação, de confiança e de capacidade de sonhar com o futuro da cidade. Essa campanha interna deve ser concretizada com obras e serviços visíveis, tanto de caráter simbólico quanto aqueles voltados para a melhoria da qualidade dos espaços públicos e para o bem-estar da população. Isto inclui todas as formas de resgate da identidade de uma cidade, de uma região. A inovação político-administrativa é outra ação a ser considerada, visando gerar múltiplos mecanismos de cooperação social e de participação do cidadão. O papel do governo local consiste, portanto, em grande parte, em estimular e orientar as energias da população para o bem-estar coletivo e a convivência cívica.
Tomando-se como base o que diz Borja, a promoção da cidade de Ilhéus não tem sido realizada em nenhum dos sentidos que seriam necessários para o seu desenvolvimento, nem externamente, fortalecendo a sua imagem para o mundo e a captação de investimentos, nem internamente, proporcionando a seus habitantes bem-estar e sentimento de pertencimento ao lugar. Este talvez seja um dos principais pontos de tensão entre os empresários do trade, que apontam uma necessidade de maior atuação do poder público, e a prefeitura de Ilhéus. Antes de se pensar nos escassos recursos, é importante perceber que a promoção é vital para o planejamento. A promoção da imagem da cidade é capaz de convencer os investidores e visitantes a virem até ela, além de resgatar e valorizar o cidadão local através do seu acolhimento e do partilhamento do seu espaço territorial.
Por outro lado, Carlos B. Vainer, em Pátria, Empresa e Mercadoria[324], afirma que sem consenso não há qualquer possibilidade de estratégia vitoriosa. Um plano estratégico supõe, exige e depende de que a cidade esteja unida, sem brechas, em torno do projeto. Em Ilhéus, atuam forças divergentes, mas o importante é se buscar a convergência, a união através de um projeto, de uma liderança que tenha a confiança da população, que valorize a cultura local, a sua história e o seu povo. Uma liderança que arrume a casa, cuide da sua história, da sua cultura e a embeleze para a população local e turística, que crie infraestrutura básica e dê apoio à população marginalizada, tentando incluí-la no processo de desenvolvimento. Assim, a comunidade, os agentes culturais e os empresários do trade seriam estimulados a reunir esforços em torno de um projeto comum, formulado de maneira participativa, tanto no âmbito da cultura como do turismo, voltado para o desenvolvimento da cidade.
A Universidade de Santa Cruz pode oferecer suporte para a formulação desse plano estratégico para a cidade, uma vez que professores, alunos e pesquisadores realizam permanentemente estudos sobre Ilhéus e sua região. Além disso, têm o conhecimento de teorias e exemplos de estratégias de turismo, de métodos de preservação do patrimônio cultural e de administração de cidades realizadas em todo o mundo. Falta apenas uma abertura do poder municipal para a celebração dessa parceria.
Finalmente, para dar início a esse processo de mudança, o fundamental é que todos se voltem para as necessidades da cidade, abrindo mão dos seus interesses pessoais, conscientes de que o desenvolvimento da cidade é um fator essencial para a sua própria qualidade de vida. Que cuidem do patrimônio cultural como dos seus próprios bens. É preciso que todos trabalhem voltados para um mesmo objetivo de desenvolvimento, com ações planejadas e convergentes.
Reconhecidamente o turismo associado à valorização da cultura local pode ser uma das alternativas para a retomada do desenvolvimento de Ilhéus, por sua privilegiada situação geográfica — uma ilha, rodeada por rios, pelo mar e por muita vegetação —, pela possibilidade de resgate da identidade cultural da região e por todas as potencialidades citadas anteriormente. Assim como aconteceu com o cacau, é necessário inicialmente se plantar, ou seja, fazer um investimento de maior porte na infraestrutura da cidade e definir políticas de cultura e de turismo, que com o tempo irão promover novos empreendimentos e gerar outros retornos, cabendo à prefeitura a manutenção e a ‘vigilância’ do sistema, bem como a intervenção na hora que se fizer necessária, como aos fazendeiros coube a poda e a administração do cacau. É preciso pensar na reestruturação da cidade, sem abandonar o cultivo cacaueiro. O turismo tem chance de dar retornos mais rápido em Ilhéus do que em outros lugares, uma vez que o destino Ilhéus é muito conhecido no Brasil e no mundo inteiro, graças à obra de Jorge Amado.
Ilhéus ainda não é uma cidade turística, não tendo se preparado ainda para o desenvolvimento dessa atividade. Uma comunidade com 222.127 habitantes não pode ficar parada, esperando o reflorescimento da cultura cacaueira. É preciso diversificar as possibilidades de crescimento econômico e social, oferecendo trabalho e uma vida digna ao seu povo. Para isso, se faz urgente a busca de alternativas, associadas à capacitação da população através da educação, de cursos universitários especializados. É importante promover o que há de mais salutar na convivência citadina, o diálogo, e a busca por um ideal de cidade, e se trabalhar conjuntamente para isso. É uma questão de escolha e de planejamento participativo.
Se o turismo de fato for escolhido como uma das principais frentes de desenvolvimento de Ilhéus pelas suas instâncias políticas, que se olhe para além da infraestrutura, tão necessária. Que se cuide do povo que dele vive, como as baianas de Olivença, como Tuti em sua travessia para a Lagoa Encantada, como a moça do pitú no Rio do Engenho e tantos hoteleiros e empresários do setor de alimentação. Que haja zelo pelo seu patrimônio histórico, cultural e ecológico, preservando-se as igrejas, os palácios, as matas, e, principalmente, que se valorize a saga do cacau, que através de Jorge Amado, poderá dar uma verdadeira originalidade ao turismo local. Quem sabe assim Ilhéus possa progredir rumo a um desenvolvimento integrado, projetando novamente a cidade e a região no cenário internacional.
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ENTREVISTAS
AMORIM, Virgílio. Cacauicultor e Diretor da TV Sul Bahia. Itabuna. 15/01/2003.
BARROCO, Hélio. Coord. do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC. Ilhéus. 17/01/03.
DIAS, Clímaco. Professor de Geografia da UFBA. Salvador. 23/10/02.
FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro de. Diretor da FFCH da UFBA.Salvador. 05/06/2003.
HEINE, Maria Luisa. Presidente da Fundaci e Historiadora. Ilhéus. 19/09/03.
ITASSUCY. Músico. Ilhéus. 31/06/03.
LAVIGNE, Antônio. Cacauicultor e Tabelião. Ilhéus. 14/12/2002.
LISBOA, Romualdo. Diretor da Casa dos Artistas e Dramaturgo. Ilhéus. 27/06/03.
MOURA, Milton. Sociólogo. Salvador. 04/06/2003.
MUNIZ, Elza. Pousadeira de Olivença. Olivença. 14/02/03.
PEREIRA, Romualdo. Secretário de Turismo de Ilhéus. Ilhéus. 06/02/03.
PÓLVORA, Hélio. Ex- Presidente da Fundaci. Ilhéus. 26/06/03.
POPOFF, Barão de. Agente de Turismo. Ilhéus. 21/01/03.
RIBEIRO, Jabes. Prefeito de Ilhéus. Ilhéus. 23/01/2003.
SCHAEPPI, Hans. Presidente do Citur e Hoteleiro. Ilhéus. 16/01/03.
SILVA, Sérgio Barbosa da. Ex- Presidente da Ilheustur. Salvador. 23/01/03.
SIMÕES, Maria de Lourdes Netto. Profª do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC. Ilhéus.17/01/2003.
_____________________ Ilhéus. 30/06/03.
TREVISAN, Salvador. Profº do Mestrado de Cultura e Turismo da UESC. Ilhéus. 17/01/03.
VIEIRA, Antônio. Secretário de Planejamento de Ilhéus. Ilhéus. 03/02/03.
DEPOIMENTOS
DINIZ, Leonardo. Pousadeiro. Depoimento via internet. Para tentar obter um número mais
representativo dos empresários do turismo ilheense, foram enviados e-mails para 86
dos seus representantes, com perguntas relativas a pesquisa, no entanto, apenas quatro responderam.
ESPINHEIRA, Gei. Sociólogo. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
FERREIRA, Juca. Secretário-Executivo do MinC. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
GARCIA, Zaira. Pousadeira. Depoimento via Internet.
MÃE LAURA. Mãe de Santo. Conversa. Ilhéus. 2/02/2003.
PEIXE, João Roberto. Secretário de Cultura de Recife. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
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[1] Referência à discursão atual sobre o “Achamento ” ou o “Descobrimento” do Brasil pode ser encontrada no artigo de GÓES, Synésio Sampaio. « Navegantes do Brasil » in Revista Oceanos, n° 39. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. Julho- Set, 1999, p. 34-52.
[2] GÂNDAVO, Pero M. de. Tratado da Terra do Brasil. Belo Horizonte, Itatiaia, São Paulo, Edusp, 1980. apud FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001, p.20.
[3] SOUZA, Gabriel Soares de. Tratado Descritivo do Brasil em 1587. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1938. apud FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001, p.20.
[4] CADIM, Fernão. Tratado da Terra e Gente do Brasil. Belo Horizonte, Itatiaia, São Paulo: Edusp, 1980. apud FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001, p.23.
[5] LISBOA, B. da Silva. Memória sobre a Comarca de Ilhéus.1802. Arquivo Histórico Ultramarino, Doc. 24002 In Inventário dos documentos relativos ao Brasil existentes no Arquivo de Marinha e Ultramar de Lisboa – BA ; Anais da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro: 1945. v.37. p. 455-9. apud FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001, p.42.
[6] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001, p.69.
[7] ADONIAS FILHO. Sul da Bahia: Chão de Cacau (Uma Civilização Regional). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p.106.
[8] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001, p.85.
[9] SANTOS, Milton. Zona do Cacau. Companhia Editora Nacional, São Paulo: Col. Brasiliana. Vol. 296, Biblioteca Pedagógica Brasileira. 2.ª edição.1957, p.17.
[10] SANTOS, Milton. Zona do Cacau. Companhia Editora Nacional, São Paulo: Col. Brasiliana. Vol. 296, Biblioteca Pedagógica Brasileira. 2.ª edição.1957, p.8.
[11] OLIVEIRA, Francisco de. Eligia para uma re(li)gião. Petrópolis: Vozes,1978, p.29.
[12] SANTOS, Milton. Zona do Cacau. Brasiliana, 1957, p.11. Grifos da autora.
[13] OLIVEIRA, Francisco de. Eligia para uma re(li)gião. Petrópolis, Vozes,1978, p.30.
[14] SANTOS, Milton. Zona do Cacau. Companhia Editora Nacional, São Paulo: Col. Brasiliana. Vol. 296, Biblioteca Pedagógica Brasileira. 2.ª edição. 1957, p.7.
[15] Ibidem.
[16] FREITAS, Antônio Guerreiro de. Entrevista. Salvador. 05/06/2003
[17] AMADO, Jorge. Gabriela, Cravo e Canela. 83ª edição. Rio de Janeiro, São Paulo: Ed. Record, 2000, p.21.
[18] COSTA, José Fialho. Conjuntura Cacaueira do Sul da Bahia. Salvador: Bureau, 1992, p.29.
[19] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro (org). Sá Barreto. Série Preservação da Memória Regional: Testemunhos para a História. Ilhéus: Editus, 2001.
[20] FREITAS, Antônio Guerreiro de. Entrevista. Salvador. 05/06/2003.
[21] Ibidem.
[22] MOURA, Milton. Entrevista. Salvador. 04/06/2003.
[23] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro (org). Sá Barreto. Série Preservação da Memória Regional: Testemunhos para a História. Ilhéus: Editus, 2001, p. 272-3.
[24] Ibidem, p. 273.
[25] LAVIGNE, Antônio. Entrevista. Ilhéus. 14/12/2002.
[26] Fonte: PAM/IBGE. sei..br/bahia_sintese/2002/ind_economicos/agropecuaria.htm
[27] MOURA, Milton. Entrevista. Salvador. 04/06/2003.
[28] MOURA, Milton. Entrevista. Salvador. 04/06/2003.
[29] SPIX, J. B. von, MARTIUS, C. F. P. Viagem pelo Brasil. São Paulo: Melhoramentos; Brasília: INI/ MEC, 1976. apud FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus. 2001, p.56.
[30] ADONIAS FILHO. Sul da Bahia: Chão de Cacau (Uma Civilização Regional. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
[31] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001.
[32] ADONIAS FILHO. Sul da Bahia: Chão de Cacau (Uma Civilização Regional. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
[33] Ibidem, p.78.
[34] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro (org). Sá Barreto. Série Preservação da Memória Regional: Testemunhos para a História. Ilhéus: Editus, 2001, p.52 e 115.
[35] AMADO, Jorge. São Jorge dos Ilhéus.17ª edição São Paulo: Livraria Martins Editora. 1958, p.299.
[36] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001, p.134.
[37] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001. p.106.
[38] Ibidem.
[39] Ibidem.
[40] AMADO, Jorge. São Jorge dos Ilhéus. 17ª edição São Paulo: Livraria Martins Editora. 1968, p.155.
[41] FREITAS, Antônio Guerreiro de. Entrevista. Salvador. 05/06/2003.
[42] BOURDIEU, Pierre. A identidade e a representação. Elementos para uma reflexão crítica sobre a idéia de região. In: O Poder Simbólico, Cap. V. Lisboa: Difel. Rio de Janeiro: Ed.Bertrand Brasil S.A., 1989, p.112.
[43] MOURA, Milton. Entrevista. Salvador. 04/06/2003.
[44] FREITAS, Antônio Guerreiro de Entrevista. Salvador. 05/06/2003.
[45] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001, p.130.
[46] FREITAS, Antônio Guerreiro de. Entrevista. Salvador. 05/06/2003.
[47] Ibidem.
[48] MOURA, Milton. Entrevista. Salvador. 04/06/2003.
[49] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Entrevista. Salvador. 05/06/2003.
[50] SIMÕES, Maria de Lourdes Netto. A Ficção da Região Cacaueira baiana: a questão identitária. uesc.br/projetos/literatura/litregiao.htm
[51] Ibidem.
[52] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Caminhos ao Encontro do Mundo. Ilhéus: Editus, 2001. p.152.
[53] MOURA, Milton. Entrevista. Salvador. 04/06/2003.
[54] LAVIGNE, Antônio. Entrevista. Ilhéus. 14/12/2002.
[55] AMORIM, Virgílio. Entrevista. Itabuna. 15/01/2003.
[56] FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Entrevista. Salvador. 05/06/2003.
[57] RIBEIRO, Jabes. Entrevista. Ilhéus. 30/01/2003.
[58] SIMÕES, Maria de Lourdes Netto. Entrevista. Ilhéus.17/01/2003.
[59] AMADO, Jorge. São Jorge dos Ilhéus. 17ª edição São Paulo: Livraria Martins Editora, 1968. p.106.
[60] Informações obtidas no artigo de Marcos RODRIGUES, “Da Baía de Todos os Santos a All Saints Bay” in Caderno CEAS. Salvador, Maio/Junho 2002, nº199. p. 37.
[61] Informações retiradas do site
[62] Adotaremos aqui a definição de turista da OMT (1974), segundo a qual um turista é aquela pessoa que, realizando uma viagem, passa pelo menos 24 horas e, no máximo, o período de um ano fora de seu lugar de residência, sem exercer trabalho remunerado no país ou local visitado.
[63] Informações retiradas dos sites .br e
[64] Informações retiradas do site .br
[65] É importante registrar a diferença de dados encontrada entre a WTTC e a Infraero, que identificou em 2002 a chegada de 4,630 milhões de turistas estrangeiros no país, perfazendo uma difereça de 980 mil passageiros em relação ao total registrado pela primeira.
[66] Informações retiradas do site .br
[67] Ibidem.
[68] DIAS, Clímaco. Entrevista. Salvador. 23/10/02.
[69] DIAS, Clímaco. Entrevista. Salvador. 23/10/02.
[70] Informações retiradas do site
[71] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus.17/01/03.
[72] Informações retiradas do site .br
[73] DIAS, Clímaco. Entrevista. Salvador. 23/10/02.
[74] RODRIGUES, Marcos. “Da Baía de Todos os Santos a All Saints Bay: Glossas ao Plano Estratégico de Turismo da Bahia” in Caderno CEAS. Salvador, Maio/Junho 2002, nº199. p. 40.
[75] Segundo o autor estes dados foram divulgados pelo professor Paulo Henrique, da Faculdade de Ciências Econômicas da UFBA, em palestra realizada no Museu Eugênio Teixeira Leal em novembro de 2002.
[76] Informações retiradas do site .br
[77] Os dados de 2002 são da Embratur e COINF/DPF, e foram retirados do site .br
[78] Segundo a Infraero, em 2000, vieram à Bahia 1,728 milhões de passageiros nacionais via aérea, enquanto 8,970 milhões foram para São Paulo.
[79] Dados da Infraero, 2001, retirados do site .br
[80] Diferentemente, desses dados obtidos no Estudo do Mercado Doméstico de Turismo no Brasil, FIPE, 1998, a Bahiatursa registra uma recepção de 3,520 milhões de turistas nacionais e uma arrecadação de R$ 1,115 bilhão no ano de 1998 (Revista Bahia Análises& Dados. Salvador, 2001. p. 35) . Em 2001 a Bahiatursa divulga que o Estado tem a segunda maior receita no turismo nacional, R$4,48 bilhões, atrás de São Paulo com R$7,81 bilhões de receita.
[81] Gaudenzi, Paulo. O Processo Evolutivo do Modelo de Gestão retirado do site sct..br
[82] Bahiatursa – Hotéis de Turismo do Estado da Bahia S.A - que anteriormente se limitava a construção e ampliação de hotéis e pousadas, neste momento é remanejada para a Secretaria da Indústria e Comércio, e assume a responsabilidade de implementar a política de turismo, passando a executar um amplo programa de treinamento de mão-de-obra e a desenvolver ações promocionais, prioritariamente no sul e no sudeste, além do trabalho de captação de investidores para o turismo do Estado. Em 73, altera sua razão social para Empresa de Turismo da Bahia S.A.
[83] Esta coordenação elaborou os planos de desenvolvimento da Baía de Todos os Santos, da orla de Salvador, de Ilhéus e de Porto Seguro.
[84] As doze cidades foram: Salvador, Itaparica, Cachoeira, Valença, Ilhéus, Porto Seguro, Lençóis, Ibotirama, Juazeiro, Paulo Afonso, Jacobina e Cipó com Jorro.
[85] Enquanto em 1979 a Bahia recebia cerca de 293 mil visitantes, em 1986, ela passa a receber 775 mil turistas, segundo os dados do Relatório de Atividades da Bahiatursa de 1986.
[86] A Emtur tinha como missão construir e administrar hotéis e pousadas.
[87] A Conbahia tinha por finalidade construir, comercializar e administrar o Centro de Convenções da Bahia.
[88] As setes zonas turísticas são assim compostas: a Costa dos Coqueiros (Jandaíra, Conde, Esplanada, Entre Rios, Mata de São João, Camaçari e Lauro de Freitas), a Baía de Todos os Santos (Salvador, São Francisco do Conde, Madre de Deus, Santo Amaro, Cachoeira, São Félix, Saubara, Maragojipe, Jaguaripe, Itaparica, Vera Cruz, Salinas das Margaridas), Costa do Dendê (Valença, Cairu, Taperoá, Nilo Peçanha, Ituberá, Igrapiúna, Camamu, Maraú), Costa do Cacau (Itacaré, Uruçuca, Ilhéus, Una, Canavieiras), Costa do Descobrimento (Belmonte, Santa Cruz de Cabrália, Porto Seguro), Costa das Baleias (Prado, Alcobaça, Caravelas, Nova Viçosa, Mucuri), e a Chapada Diamantina (Circuito do Diamante: Lençóis, Iraquara, Seabra, Palmeiras, Andaraí, Mucugê, Itaetê, e o Circuito do Ouro: Piatã, Rio do Pires, Abaíra, Érico Cardoso, Rio de Contas, Livramento de N. Senhora, Jussiape). Encontra-se em elaboração, atualmente o projeto de ampliação da atual linha de produtos, onde serão agregadas mais três áreas turísticas, denominadas de Caminhos do Oeste (Barreiras e Correntina), Chapada Norte (Morro do Chapéu, Jacobina, Miguel Calmon, Piritiba, Ourolândia, Campo Formoso, Miramgaba e Saúde) e Lagos do São Francisco (Paulo Afonso, Juazeiro e Sobradinho).
[89]SILVA, Sérgio Barbosa da. A Expansão Territorial do Turismo na Bahia. Trabalho apresentado durante a Semana Universitária a Unifacs de 2002. Salvador: UNIFACS, Outubro de 2002.
[90] Ricardo Ramos na Entrevista realizada por Carlota Gottschall ao Grupo Monitor com Rcardo Ramos e Bernd Freundt Pólo de Entretenimento na Bahia: uma proposta em debate. In : Revista Bahia Análise & Dados. SEI: Salvador. V.11, n.2. p.9.
[91] Gaudenzi ainda cita outras ações, que segundo ele merecem destaque: Investimentos em infraestrutura; Melhoria em educação e treinamento; Reforma do Centro Histórico – o Pelourinho; Construção dos centros de convenções de Porto Seguro e Ilhéus, e a ampliação do de Salvador; Campanhas de marketing no Brasil e workshop e feiras no exterior; Atração de grupos investidores e hoteleiros estrangeiros, a exemplo do Accor, Marriott, ClubMed, Pestana e SuperClubs.
[92] Os dados de 1986 foram retirados do Relatório de Atividades da Bahiatursa e os de 2000 da Revista Bahia Análises& Dados. Salvador, 2001. p. 54 (fluxos) e bahiatursa..br (leitos)
[93] Dados recolhidos do artigo de Bob Fernandes, Um Carnaval de Cordeiros in Revista Carta Capital. São Paulo: 20 de Fevereiro de 2002. p. 32 – 35.
[94] Informações retiradas do site .br
[95] RODRIGUES, Marcos. “Da Baía de Todos os Santos a All Saints Bay: Glossas ao Plano Estratégico de Turismo da Bahia” in Caderno CEAS, Salvador, Maio/Junho 2002, nº199. p. 40.
[96] HARVEY, David. “Do gerenciamento ao empresariamento: a transformação da administração urbana no capitalismo tardio” in Revista Espaço e Debate, nº 39, 1996. p.50.
[97] CARLOS, Ana Fani Alessandri. Novos caminhos da Geografia. O Consumo do Espaço. São Paulo: Editora Contexto, 1999. p. 174-175.
[98] CARLOS, Ana Fani Alessandri. SEABRA, O.C.L. (orgs.). O Espaço no Fim de Século: a nova raridade. Novas Contradições do Espaço. São Paulo:Editora Contexto, 1999. p. 67.
[99] RODRIGUES, Marcos. “Da Baía de Todos os Santos a All Saints Bay: Glossas ao Plano Estratégico de Turismo da Bahia” in Caderno CEAS, Salvador, Maio/Junho 2002, nº199. p. 35.
[100] Ibidem. p. 36.
[101] COUTO, Vitor Athayde. O Território do Cacau no Contexto da Mundialização. Leituras da Bahia I. Revista Bahia Análise & Dados. V9. N°4. Salvador: Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia, Março 2000. p.42.
[102] Dados do Censo 2000 de Ilhéus retirados do site .br
[103] RIBEIRO, Jabes. Entrevista. Ilhéus. 30/01/03.
[104] SILVA, Sérgio Barbosa da.. Entrevista. Salvador. 23/01/03.
[105] MUNIZ, Elza. Entrevista. Olivença. 14/02/03.
[106] DIAS, Clímaco. Entrevista. Salvador. 23/10/02.
[107] Dados fornecidos por Nice Melo, Assessora de Comunicação da Secretaria da Cultura e Turismo, em 18/12/02.
[108] RODRIGUES, Marcos. “Da Baía de Todos os Santos a All Saints Bay: Glossas ao Plano Estratégico de Turismo da Bahia” in Caderno CEAS, Salvador, Maio/Junho 2002, nº199. p. 37.
[109] Ibidem. p. 36.
[110] SILVA, Sérgio Barbosa da. Entrevista. Salvador. 23/01/03.
[111] SILVA, Sérgio Barbosa da. A Expansão Territorial do Turismo na Bahia. Trabalho apresentado durante a Semana Universitária da Unifacs de 2002. Salvador: UNIFACS, Outubro de 2002.
[112] Este termo provém do método de produção em série e inflexível criado por Henry Ford, utilizado em sua fábrica de automóveis Ford.
[113] Hans Tosta Schaeppi foi proprietário do Bahia Praia Hotel em Salvador e investiu no turismo de Ilhéus construindo o Ilhéus Praia Hotel, comprando o Pontal Praia Hotel, e criando a única fábrica de chocolate de Ilhéus da atualidade, a Chocolate Caseiro de Ilhéus.
[114] SCHAEPPI, Hans. Entrevista. Ilhéus. 16/01/03.
[115] POPOFF, Barão de. Entrevista. Ilhéus. 21/01/03.
[116] Grupo dos empresários que atuam na área turística.
[117] MUNIZ, Elza. Entrevista. Olivença. 14/02/03.
[118] Ibidem.
[119] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[120] MUNIZ, Elza. Entrevista. Olivença. 14/02/03.
[121] DINIZ, Leonardo. Internet Para tentar obter um número mais representativo dos empresários do turismo ilheense, foram enviados e-mails para 86 dos seus representantes, com perguntas relativas a pesquisa, no entanto, apenas quatro responderam.
[122] SCHAEPPI, Hans. Entrevista. Ilhéus. 16/01/03.
[123] GARCIA, Zaira. Depoimento via Internet.
[124] SCHAEPPI, Hans. Entrevista. Ilhéus. 16/01/03.
[125] POPOFF, Barão de. Entrevista. Ilhéus. 21/01/03.
[126] SCHAEPPI, Hans. Entrevista. Ilhéus. 16/01/03.
[127] Ibidem.
[128] SILVA, Sérgio Barbosa da. Entrevista. Salvador. 23/01/03.
[129] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[130] RIBEIRO, Jabes. Entrevista. Ilhéus. 30/01/03.
[131] SILVA, Sérgio Barbosa da. Entrevista. Salvador. 23/01/03.
[132] Vídeo apresentado no 3º Plenário de Turismo e Desenvolvimento Regional – UESC.
[133] Críticas severas aos governos de Jabes Ribeiro são feitas por Everaldo Almeida Valadares, em Ilhéus Hoje : Sem Gabriela, sem cravo e sem canela. Ilhéus, Bahia. Ed. O Ateneu Artes Gráficas Ltda., 2002.
[134] HALL, Peter. Cidades do Amanhã. A Cidade do Empreendimento - Cap. 11. p. 421.
[135] Ibidem.
[136] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus.17/01/03.
[137] MUNIZ, Elza. Entrevista. Olivença. 14/02/2003.
[138] Informações retiradas da Pesquisa de Demanda Turística de Ilhéus. Bahiatursa. Janeiro a Julho/2002.
[139] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[140] Dados fornecidos pela agência Espaço Turismo/Ilhéus.
[141] RIBEIRO, Jabes. Entrevista. Ilhéus. 30/01/03.
[142] Ibidem.
[143] SILVA, Sérgio Barbosa da.. Entrevista. Salvador. 23/01/03.
[144] Bahia, Secretaria da Cultura e Turismo. Investiments opportunities. Salvador, 1997. apud RODRIGUES, Marcos A. Nunes “Da Baía de Todos os Santos a All Saints Bay: Glossas ao Plano Estratégico de Turismo da Bahia” in Caderno CEAS, Salvador, Maio/Junho 2002, nº199. p. 33 - 42.
[145] SILVA, Sérgio Barbosa da. Entrevista. Salvador. 23/01/03.
[146] Ibidem.
[147] VIEIRA, Antônio. Entrevista. Ilhéus. 03/02/03.
[148] MUNIZ, Elza. Entrevista. Olivença. 14/02/03.
[149] POPOFF, Barão de. Entrevista. Ilhéus. 21/01/03.
[150] Ibidem.
[151] RIBEIRO, Jabes. Entrevista. Ilhéus. 30/01/03.
[152] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[153] Ibidem.
[154] LOYOLA, Elizabeth. Turismo e Desenvolvimento in Revista Bahia Análises & Dados, Salvador, SEI. V.11, N.2, Set./2001. p.66.
[155] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[156] SIMÕES, Maria de Lourdes. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[157] DIAS, Clímaco. Entrevista. Salvador. 23/10/03.
[158] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[159] Ibidem.
[160] Ibidem.
[161] HARVEY, David. “Do gerenciamento ao empresariamento: a transformação da administração urbana no capitalismo tardio” in Revista Espaço e Debate, nº 39, 1996. p. 54.
[162] VIEIRA, Antônio. Entrevista. Ilhéus. 03/02/03.
[163] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[164] SILVA, Sérgio Barbosa da. Entrevista. Salvador. 23/01/03.
[165] Ibidem.
[166] Pequenos planos diretores para orientar a ocupação do solo, levando em consideração o caráter ambiental.
[167] VIEIRA, Antônio. Entrevista. Ilhéus. 03/02/03.
[168] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[169] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[170] Ibidem.
[171] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[172] DINIZ, Leonardo. Internet.
[173] SCHAEPPI, Hans. Entrevista. Ilhéus. 16/01/03.
[174] Ibidem.
[175] MUNIZ, Elza. Entrevista. Olivença. 14/02/03.
[176] AMORIM, Virgílio. Entrevista. Itabuna. 15/01/2003.
[177] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[178] POPOFF, Barão de. Entrevista. Ilhéus. 21/01/03.
[179] Ibidem.
[180] TREVISAN, Salvador. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[181] TREVISAN, Salvador. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[182] RUBIM, Antônio Albino. Artigo Governo Lula e Política Cultural: Sintonias e Desafios. Jornal A Tarde. Carderno 2.
[183] Ibidem.
[184] FERREIRA, Juca. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA, realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
[185] Ibidem.
[186] ESPINHEIRA, Gei. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
[187] Ibidem.
[188] Termos utilizados por Gilberto Gil no seu Discurso de Posse em Brasília, em janeiro/2003 .
[189] Ibidem.
[190] GIL, Gilberto. Palestra na Catedra Siglo XXI- BID. Washington, EUA, 25 de Setembro de 2003. .br
3
[191] RUBIM, Antônio Albino. Artigo Governo Lula e Política Cultural: Sintonias e Desafios
[192] GIL, Gilberto. Discurso de Posse, Janeiro 2003.
[193] Ibidem.
[194] Ibidem.
[195] GIL, Gilberto. Discurso para o Fórum dos Dirigentes Estaduais de Cultura, de 19 de agosto em Foz do Iguaçu. Disponível no site .br
[196] GIL, Gilberto. Discurso para a Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados, de 14 de maio em Brasília. Disponível no site .br
[197] FERREIRA, Juca. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
[198] Ibidem.
[199] Ibidem.
[200]GIL, Gilberto. Discurso para a Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados, de 14 de maio em Brasília. Disponível no site .br
[201] Dados retirados do Discurso de Gilberto Gil para a Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados, de 14 de maio em Brasília. Disponível no site .br
[202] GIL, Gilberto. Palestra na Catedra Siglo XXI- BID. Washington, EUA, 25 de setembro de 2003. Disponível no site .br.
[203] Ibidem.
[204] O seminário Cultura para Todos foi realizado em várias capitais brasileiras, com o objetivo de se reunir os produtores culturais, empresários e artistas em torno de um debate democrático em busca de um novo modelo de financiamento da produção cultural.
[205] FERREIRA, Juca. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
[206] PEIXE, João Roberto. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
[207] ESPINHEIRA, Gei. Depoimento no seminário Políticas Culturais e Democracia no Brasil e na Bahia na Conferência Estadual de Cultura do PT-BA realizado na Faculdade de Comunicação da UFBA, no dia 17/10/03.
[208] GIL, Gilberto. Pronunciamento no encerramento do Festival de Cinema de Gramado. 23 de agosto de 2003. Disponível no site .br.
[209] GIL, Gilberto. Discurso no lançamento do Programa Brasileiro de Cinema e Audiovisual. Brasília 13 de outubro de 2003. Disponível no site .br.
[210] GAUDENZI, Paulo. Cultura de Neófito a Operário. Ed. Palloti. Salvador. Junho/2000. p.41.
[211] Ibidem. p.40.
[212] Ibidem. p.41.
[213] Site fazcultura..br
[214] GAUDENZI, Paulo. Cultura de Neófito a Operário. Ed. Palloti. Salvador. Junho/2000. p.58.
[215] Ibidem. p.60.
[216] Ibidem.
[217] Informações retiradas do site sct..br
[218] BASTOS, Sônia. Declaração na matéria Bahia Vista por Dentro vai atender mais 15 cidades publicada no Jornal Correio da Bahia, 22 de Maio de 2003.
[219] AVENA, Armando. Declaração na matéria Governador lança Plano Estratégico da Bahia publicada no jornal Correio da Bahia, 18 de agosto de 2003.
[220] Plano Estratégico da Bahia. seplan..br
[221] Ibidem.
[222] Plano Estratégico da Bahia. seplan..br
[223] AMADO, Jorge. São Jorge dos Ilhéus. 17ª edição São Paulo: Livraria Martins Editora, 1968. p.128.
[224] FREITAS, Antônio Guerreiro. Entrevista. Salvador. 05/06/03.
[225] Termo utilizado pelo historiador Antônio Guerreiro de Freitas para se referir a contribuição literária da região.
[226] Informações no site censocultural..br
[227] HEINE, Maria Luisa. Entrevista. Ilhéus. 19/09/03.
[228] PÓLVORA, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[229] SIMÕES, Maria de Lourdes. Entrevista. Ilhéus. 30/06/03.
[230] Ibidem.
[231] PÓLVORA, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[232] Ibidem
[233] SIMÕES, Maria de Lourdes. Entrevista. Ilhéus. 30/06/03.
[234] LISBOA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[235] O suiço, muito conhecido na região, foi interditado pela justiça, sendo forçado a parar de comprar imóveis e terras em Ilhéus. Além da sede da Casa dos Artistas, a família Hans Koella é proprietária do Vesúvio e do Hotel Jardim Atlântico.
[236] Ibidem.
[237] Expressão utilizada pelo escritor Hélio Pólvora em entrevista realizada em Ilhéus. 26/06/03.
[238] Ibidem.
[239] PÓLVORA, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 26/06/03.
[240] LISBOA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[241] PÓLVORA, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 26/06/03.
[242] ITASSUCY. Entrevista. Ilhéus. 31/06/03.
[243] HEINE, Maria Luisa. Entrevista. Ilhéus. 19/08/03.
[244] LISBOA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[245] Ibidem.
[246] Entre os meses de maio e junho, por exemplo, a programação da Casa dos Artistas foi a seguinte: as segundas foram alternadas entre Recitais de Piano, quando se falava sobre a vida e a obra do compositor escolhido daquela noite, e Leituras Dramáticas, de textos que não podem ser montado pelo grupo, ou por falta de elenco ou de financiamento; na terça o projeto Terças Musicais, com experientes e jovens músicos ilheenses; na quarta um forró com a banda Pega-pá-Capá, com direito a comidas juninas; as quintas Ifá – A Palavra Final, espetáculo de dança; as sextas o espetáculo teatral Pega Pá Capá; e aos sábados o espetáculo infantil, Ita – Um Tupinambá em Busca do Manto Sagrado.
[247] LISBOA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[248] Ibidem.
[249] Ibidem.
[250] Ibidem.
[251] HEINE, Maria Luisa. Entrevista. Ilhéus. 19/09/03.
[252] Ibidem.
[253] Ibidem.
[254] POPOFF, Barão de. Entrevista. Ilhéus. 21/01/03
[255] LISBOA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[256] Ibidem.
[257] ITASSUCY. Entrevista. Ilhéus. 31/06/03.
[258] PÓLVORA, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 26/06/03.
[259] HEINE, Maria Luisa. Entrevista. Ilhéus. 19/09/03.
[260] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[261] SCHAEPPI, Hans. Entrevista. Ilhéus. 16/01/03.
[262] GLORIA, Jonildo. Matéria Memória do Cacau Está Encaixotada. Jornal A Tarde. Municípios. 25/08/03.
[263] Dados encontrados no Livro Passeio na Capitania de São Jorge dos Ilhéus de Maria Luisa Heine. Secretaria da Cultura e Turismo, Salvador. 2002.
[264] HEINE, Maria Luisa. Entrevista. Ilhéus. 19/09/03.
[265] Ibidem.
[266] Ibidem.
[267] Ibidem.
[268] Ibidem.
[269] Ibidem.
[270] PÓLVORA, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 26/06/03.
[271] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[272] POPOFF, Barão de. Entrevista. Ilhéus. 21/01/03.
[273] Ibidem.
[274] MÃE LAURA. Conversa. Ilhéus. 02/02/03.
[275] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[276] PÓLVORA, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 26/06/03.
[277] HEINE, Maria Luisa. Passeio na Capitania de São Jorge. SCT, Salvador. 2002. p.45
[278] Dados retirados do livro de Nelson de Araújo, Pequenos Mundos : Um Panorama da Cultura Popular da Bahia.Salvador :Egba, 1996.
[279] SIMÕES, Maria de Lourdes. Entrevista. Ilhéus. 30/06/03.
[280] MUNIZ, Elza. Entrevista. Ilhéus 14/02/03.
[281] Dados retirados do Relatório de Atividades em 2002 da Fundação Cultural de Ilhéus.
[282] Informações retiradas do folder do envento III Semana Jorge Amado de Cultura e Arte.
[283] DANTAS, Marcelo. Competitividade Internacional em Turismo: a identidade cultural contra o mito da qualidade dos serviços. In: Revista Bahia Análise&Dados, SEI. Salvador, v.11, n°2 Setembro/2001 . p.162-163.
[284] Ibidem. p.163.
[285] GIL, Gilberto. Pronunciamento no encerramento do festival de Cinema de Gramado. 23/08/03.
[286] DANTAS, Marcelo. Competitividade Internacional em Turismo: a identidade cultural contra o mito da qualidade dos serviços. Revista Bahia Análise&Dados. SEI. Salvador, v.11, n°2 Setembro/2001 . p.166.
[287] GAUDENZI, Paulo. Cultura – de Neófito a Operário. Ed. Palloti. Salvador. Junho/2000. p. 42.
[288] Dados retirados do artigo de Reheniglei Rhem, O Eterno Retorno da Cultura do Cacau : História, Literatura, Imaginário.
[289] RHEM, Reheniglei . « O Eterno Retorno da Cultura do Cacau : História, Literatura, Imaginário » .In: Revista Águas do Almada Cultural, n°5, Junho/2001.
[290] SIMÕES, Maria de Lourdes. De Leitor a Turista na Terra da Jorge Amado. uesc.br/icer
[291] Informações cedidas pelo Coordenador do Mestrado em Cultura e Turismo da UESC, Hélio Barroco.
[292] SIMÕES, Maria de Lourdes. De Leitor a Turista na Terra da Jorge Amado. uesc.br/icer
[293] SIMÕES, Maria de Lourdes. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[294] LISBOA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[295] Ibidem.
[296] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[297] PEREIRA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 06/02/03.
[298] HEINE, Maria Luisa. Entrevista. Ilhéus. 19/09/03.
[299] BARROCO, Hélio. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[300] MENEZES, Juliana. Quarteirão Jorge Amado: Um Potencial a Ser Explorado. uesc.br/icer .
[301] SANTANA, Mariely. Patrimônio, Turismo e Identidade cultural. Revista Bahia Análise&Dados. SEI. Salvador, v.11, n°2 Setembro/2001 . p.169.
[302] Ibidem. p.171.
[303] Ibidem. p.172.
[304]SANTANA, Mariely. Patrimônio, Turismo e Identidade Cultural. In: Revista Bahia Análise&Dados. SEI. Salvador, v.11, n°2 Setembro/2001. p.172.
[305] MENEZES, Juliana. Quarteirão Jorge Amado: Um Potencial a Ser Explorado. uesc.br/icer
[306] Ibidem.
[307] Passeio Histórico para estudantes. Pauta, Ilhéus, p.17, junho/2001, n°17. Citado no artigo de Juliana Menezes, Quarteirão Jorge Amado: Um Potencial a Ser Explorado uesc.br/icer
[308] SIMÕES, Maria de Lourdes. Entrevista. Ilhéus. 30/06/03.
[309] Ibidem.
[310] LISBOA, Romualdo. Entrevista. Ilhéus. 27/06/03.
[311] LAVIGNE, Antônio. Entrevista. Ilhéus. 14/12/02.
[312] SIMÕES, Maria de Lourdes. Entrevista. Ilhéus. 17/01/03.
[313] DIAS, Clímaco. Entrevista. Salvador. 23/10/02.
[314] TREVISAN, Salvador. Entrevista. Ilhéus.17/01/03.
[315] BORJA, Jordi. As Cidades e o Planejamento Estratégico: Uma Reflexão Européia e Latino-Americana, Gestão Contemporânea. In: FISHER, Tânia (org.) Cidades Estratégicas e Organizações Locais. Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getúlio Vargas, 1996. p.82.
[316] Ibidem. p.84.
[317] Ibidem. p. 83
[318] FREITAS, Antônio Guerreiro de. Entrevista. Salvador. 05/06/03.
[319] Ibidem.
[320] COUTO, Vítor Athayde. O Território do Cacau no Contexto da Mundialização. Leituras da Bahia I. Revista Bahia Análise & Dados. V9. N°4. Salvador: SEI, Março 2000. p.50
[321]BORJA, Jordi. As Cidades e o Planejamento Estratégico: Uma Reflexão Européia e Latino-Americana, Gestão Contemporânea. In: FISHER, Tânia (org.) Cidades Estratégicas e Organizações Locais. Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getúlio Vargas, 1996. p.86.
[322] Ibidem. p.87.
[323] Ibidem.
[324] VAINER, Carlos B. Pátria, empresa e mercadoria: Notas sobre a estratégia discursiva do Plano Estratégico Urbano. In :A Cidade do Pensamento Único, Desmanchando Consensos. Petrópolis: Ed. Vozes, 2000. p.91.
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