Os Voluntários Portugueses na Divisão Azul (1941-1943) Andreia ... - UP

Os Volunt?rios Portugueses na Divis?o Azul (1941-1943) ? Andreia dos Santos Diogo

Resumo Embora a estrat?gia pol?tica do governo portugu?s assentasse na neutralidade

perante o novo conflito mundial, alguns compatriotas n?o se fizeram reger por essa norma, tomando diferentes iniciativas. A Legi?o Portuguesa apoiava publicamente o ataque ao comunismo e, por conseguinte, o combate ? Uni?o Sovi?tica por parte da Alemanha. Foi neste contexto que v?rios portugueses se alistaram na Divis?o Azul, uma unidade de volunt?rios criada no pa?s vizinho com o objetivo de apoiar as for?as alem?s na frente de combate. O desejo de criar semelhante unidade em Portugal partia n?o s? do governo alem?o, mas tamb?m da Legi?o Portuguesa, no entanto, a sua cria??o nunca se chegou a verificar. ? sua espera na frente leste, estes portugueses encontraram temperaturas abaixo dos 50 ?C negativos, uma alimenta??o muito pobre, pouco descanso, onde nem existiam s?tios apropriados para tal, e in?meras baixas. Palavras-chave: Divis?o Azul; volunt?rios portugueses; Wehrmacht; II Guerra Mundial.

Abstract Although the political strategy from the portuguese government settled on

neutrality before the new world conflict, some compatriots didn't follow this standard, taking different initiatives. The Portuguese Legion supported the attack on communism publicly, and therefore, the fight against the Soviet Union by Germany. It was in this context that several Portuguese joined the Blue Division, a unit of volunteers established in Spain, to support the German forces in the combat. The desire to create similar unit in Portugal stemmed not only from the German government but also from the Portuguese Legion, however, a Portuguese Division was never created. Awaiting them at the eastern front, these Portuguese found temperatures below 50 ?C negative, very poor alimentation, little rest, where suitable places for that didn't existed, and numerous casualties. Keywords: Blue Division; Portuguese volunteers; Wehrmacht; World War II.

Introdu??o

A situa??o criada pela primeira guerra mundial era inst?vel, n?o se esperando que a paz durasse por muito tempo. Todos os partidos na Alemanha caracterizavam o

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Tratado de Versalhes como injusto e inaceit?vel. O Jap?o achava merecer mais do Extremo Oriente do que aquilo que as pot?ncias imperiais brancas lhe ofereciam e a It?lia tamb?m se sentia insatisfeita. Entre 1919 e 1930, a configura??o diplom?tica da europa opunha, assim, dois campos: o dos pa?ses vencedores e o dos vencidos. ? aplica??o literal das cl?usulas do(s) tratado(s), representada principalmente pela Fran?a, opunha-se o campo dos que tinham interesse na revis?o do(s) mesmo(s): a Alemanha principalmente.

Por proposta de Mussolini, deu-se a 29/30 setembro de 1938 a Confer?ncia de Munique, pois os checoslovacos n?o aceitavam as pretens?es alem?s quanto ao desmembramento do seu pa?s. Reuniu-se, assim, a Inglaterra, a Fran?a, a It?lia e a Alemanha. Esta confer?ncia, que exclu?ra os maiores interessados, a Checoslov?quia e a Uni?o Sovi?tica, acabaria por se revelar um fracasso para as democracias ocidentais face ? pol?tica expansionista alem?, uma vez que cederam ?s pretens?es do chanceler alem?o, Adolf Hitler. Procedeu-se ent?o ? divis?o da Checoslov?quia, pelo que a regi?o da Bo?mia e da Mor?via ficariam sob a posse da Alemanha. N?o satisfeito com esta partilha, Hitler ordena a invas?o do restante territ?rio da Checoslov?quia, em mar?o de 1939.

As democracias ocidentais rapidamente perceberam que esta quest?o s? se resolveria com interven??o militar, procurando para tal o apoio da Uni?o Sovi?tica, pedindo a esta que deslocasse tropas para as fronteiras polacas. No entanto, os diplomatas russos tamb?m negociavam, secretamente, com Hitler, tendo-se realizado nesta altura um pacto de n?o agress?o, o Pacto Germano-Sovi?tico. Quando a Alemanha invadiu a Pol?nia, as pot?ncias ocidentais reagiram, declarando aquela que seria a segunda guerra mundial.

Os vinte anos que separam a assinatura do Tratado de Versalhes do desencadeamento desta segunda guerra podem, ent?o, dividir-se em duas fases: o p?sguerra, verificado at? 1930, e o pr?-guerra, a partir de 1932-1933, anos onde come?am a ser vis?veis os sinais precursores do pr?ximo conflito. ? semelhan?a do primeiro, este novo conflito n?o resultou apenas de uma causa: a heran?a dos anos compreendidos entre 1919 e 1930 aliada ? crise econ?mica e aos regimes autorit?rios exerceram a sua quota nas origens de tal desordem.

Quase todos os Estados independentes se envolveram e aqueles que se viram arrastados, n?o pretendendo o conflito, fizeram de tudo para o evitar. No seio desses pa?ses, encontrava-se um que n?o era ocupado pela Alemanha e n?o sofria diretamente

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as amea?as da R?ssia e que, principalmente, n?o se sentia muito preocupado nem ansioso em participar neste novo conflito ? Espanha. Durante a primavera de 1936, a segunda Rep?blica Espanhola tinha sido desintegrada, num aumento de caos e viol?ncia. Consciente da sua d?vida com a Alemanha, Franco e R?mon Serrano Su?er, Ministro dos Assuntos Exteriores, planearam que uma divis?o de volunt?rios deveria participar nesta nova luta. A possibilidade de atacar o comunismo na sua pr?pria casa entusiasmou muitos jovens e ex-combatentes nacionalistas.

Desta forma, o presente trabalho de investiga??o focar? a sua aten??o nos portugueses alistados nessa divis?o de volunt?rios - Divis?o Azul. Para al?m de motiva??es pessoais, a escolha desta tem?tica como objeto de estudo deve-se ao fato de ser uma mat?ria ainda pouco conhecida e estudada. Se ? certo que existe um bom leque de bibliografia estrangeira1 que aborde quest?es da Divis?o Azul, a mesma n?o se mostra t?o espec?fica no que concerne ? presen?a portuguesa; por outro lado, a n?vel de estudos portugueses, estes s?o ainda mais raros, evidenciando-se, contudo, o recente contributo da investiga??o de Ricardo Silva.2 Como balizas cronol?gicas, o tema ser? analisado entre os anos de 1941 e 1943, uma vez ser o per?odo de a??o da unidade de volunt?rios. Para al?m de importante bibliografia, ao longo do processo de investiga??o, ser? usada como fonte prim?ria o di?rio Jornal de Not?cias, comummente designado por JN, e cuja observa??o emp?rica ? fundamental.

Por conseguinte, atrav?s desta investiga??o pretende-se compreender os motivos da cria??o da Divis?o Azul; entender o processo de alistamento; identificar nesse processo os volunt?rios portugueses; enumerar a naturalidade desses mesmos volunt?rios; esclarecer a posi??o da Legi?o Portuguesa perante o conflito e o alistamento de compatriotas; estabelecer uma cronologia da a??o militar portuguesa dentro da Divis?o; e analisar as baixas sofridas, com destaque para as portuguesas.

Assim, a organiza??o deste trabalho ser? feita atrav?s de momentos-chave da exist?ncia da unidade de volunt?rios: o primeiro, compreendendo a sua cria??o e alistamento; o segundo, marcado pela marcha at? ? frente, onde se verifica a instru??o nos campos militares; o terceiro, com a participa??o em diversas a??es na frente de combate e a descri??o das realidades a? vividas; e o quarto, no qual se verifica o

1 Como s?o exemplo os trabalhos de Ricardo Silva e a edi??o n? 21 de setembro de 2013 da revista Vis?o Hist?ria; Rusia No Es Cuesti?n de Un D?a... de Juan Blanco; o artigo de Francisco Gragera e Daniel Infantes, Los Voluntarios Portugueses en La Division Azul; e a obra Blue Division Soldier 1941-1945: Spanish Volunteer on the Eastern Front de Carlos Caballero Jurado. 2 Ricardo Silva ? mestre em Hist?ria Contempor?nea pela Universidade Nova de Lisboa com a disserta??o Portugueses na Wehrmacht. Os Volunt?rios da Divis?o Azul (1941-1944).

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regresso a Espanha, marcado tamb?m pelas vicissitudes dos prisioneiros que permaneceram em cativeiros sovi?ticos.

1. Cronologia 1941

22 junho: Invas?o da Uni?o Sovi?tica, "Opera??o Barbarossa". 23 junho: Manifesta??es no centro de Madrid contra a Uni?o Sovi?tica. 27 junho: In?cio do alistamento. 1/2 julho: Fim do alistamento. 12 julho: Sa?da de Espanha do primeiro contingente de volunt?rios. 20 julho: Chegada ao acampamento de Grafenw?rh. 20 agosto: Sa?da do acampamento de Grafenw?rh e ida para a frente de

combate. 9 outubro: In?cio dos confrontos em Possad.

1942 13 janeiro: In?cio dos confrontos da batalha da Bolsa do Volkhov. 11 agosto: A Divis?o Azul muda de setor: de Volkhov para Leninegrado. 12 dezembro: O general Esteban-Infantes ? o novo comandante da Divis?o Azul.

1943 12 janeiro: In?cio da batalha do Lago Ladoga. 10 fevereiro: In?cio da batalha de Kranyj-Bor. 24 setembro: Franco decide retirar a Divis?o Azul da frente de combate. 7 outubro: A Divis?o abandona a frente. 29 outubro: O primeiro batalh?o de repatriados cruza a fronteira de Ir?n,

2. Estalar da Segunda Guerra Mundial

2.1. Rea??o Espanhola

Se na Pen?nsula Ib?rica, a not?cia da opera??o Barbarossa foi recebida com grande alegria, em Espanha o sentimento foi de aut?ntica euforia, realizando-se v?rias manifesta??es anticomunistas: "Em t?da a Espanha continuam a realizar-se grandiosas

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manifesta??es de solidariedade para com a Alemanha por ?ste pa?s ter declado guerra ? Russia".3

N?o havia pa?s menos agitado e apreensivo de enviar volunt?rios para o conflito, do que a Espanha, onde a maioria acreditava que o conflito teria come?ado nesse pa?s h? cinco anos atr?s: durante a primavera de 1936, a Segunda Rep?blica Espanhola tinha sido desintegrada, pelo que, em julho, as for?as nacionais do general Francisco Franco tomaram armas contra o Marxismo anarquista e ateu, que vinha amea?ando e destruindo as cren?as da Espanha cat?lica. A Espanha que saiu vitoriosa em 1939 sentia-se, assim, energicamente german?fila, sentimento que n?o fez mais do que aumentar com o come?o deste novo conflito militar.

A visita de Serrano Su?er a Berlim em setembro de 1940 marca o in?cio de um di?logo com vista ? entrada da Espanha no conflito mundial. Seria neste contexto que surgiria a ?Divis?o Espanhola de Volunt?rios (DEV)?, oficialmente enquadrada na Wehrmacht como ?Divis?o Volunt?ria Espanhola 250?, ou mais comumente ?Divis?o Azul?.

O chefe do Minist?rio dos Assuntos Exteriores disse aos representantes da Imprensa espanhola e estrangeira que era com a maior satisfa??o que o Governo espanhol via muitos milhares de espanhois acorrerem voluntariamente a oferecer-se para ir combater os russos, que foram os causadores da situa??o atual e que presentemente a Espanha se encontra e ainda da morte de meio milh?o de jovens espanhois, que generosamente deram o seu sangue precioso para salvar a Espanha do abismo em que ela se encontrava.4

2.2. Rea??o Portuguesa

No dia 22 de junho de 1941, Ant?nio de Oliveira Salazar recebe a novidade do dia: a t?o esperada luta contra o comunismo havia come?ado. A invas?o da Uni?o Sovi?tica era a luta que Salazar verdadeiramente desejava, uma vez que via na sua aniquila??o o maior dos golpes a desferir contra o comunismo e no seu alastramento pela europa.

A 1 de julho, Salazar encontra-se com o Bar?o de Huene, embaixador do III Reich em Portugal. A conversa girou em torno da recente invas?o da Uni?o Sovi?tica e a rea??o em Espanha, onde a forma??o da divis?o espanhola de volunt?rios foi utilizada

3 Jornal de Not?cias, 28 de junho de 1941, 2. 4 Jornal de Not?cias, 29 de junho de 1941, 2.

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