O que é literatura - vestibulandoemxerem



O QUE É LITERATURA?

Literatura (li.te.ra.tu.ra) sf (lat litteratura) segundo o Michaelis - Dicionário da Língua Portuguesa - "é a arte de compor escritos, em prosa ou em verso, de acordo com princípios teóricos ou práticos. O exercício dessa arte ou da eloquência e poesia. O conjunto das obras literárias de um agregado social, ou em dada linguagem, ou referidas a determinado assunto: Literatura infantil, literatura científica, literatura de propaganda ou publicitária. A história das obras literárias do espírito humano. O conjunto dos homens distintos nas letras". 

Completa-se aqui com a definição com Afrânio Coutinho:

“A Literatura, como toda arte, é uma transfiguração do real, é a realidade recriada através do espírito do artista e retransmitida através da língua para as formas, que são os gêneros, e com os quais ela toma corpo e nova realidade. Passa, então, a viver outra vida, autônoma, independente do autor e da experiência de realidade de onde proveio.

Os fatos que lhe deram às vezes origem perderam a realidade primitiva e adquiriram outra, graças à imaginação do artista. São agora fatos de outra natureza, diferentes dos fatos naturais objetivados pela ciência ou pela história ou pelo social. O artista literário cria ou recria um mundo de verdades que não são mensuráveis pelos mesmos padrões das verdades factuais. Os fatos que manipula não têm comparação com os da realidade concreta.

São as verdades humanas, gerais, que traduzem antes um sentimento de experiência, uma compreensão e um julgamento das coisas humanas, um sentido da vida, e que fornecem um retrato vivo e insinuante da vida, o qual sugere antes que esgota o quadro. A Literatura é, assim, a vida, parte da vida, não se admitindo possa haver conflito entre uma e outra. Através das obras literárias, tomamos contato com a vida, nas suas verdades eternas, comuns a todos os homens e lugares, porque são as verdades da mesma condição humana.”

A LINGUAGEM LITERÁRIA

Antes de conhecermos as possibilidades de construção dessa linguagem, é necessário que fique clara a distinção entre denotação e conotação.

A palavra tem valor referencial ou denotativo quando é tomada no seu sentido usual ou literal, isto é, naquele que lhe atribuem os dicionários; seu sentido é objetivo, explícito, constante. Ela designa ou denota determinado objeto, referindo-se à realidade palpável.

|Denotação é a significação objetiva da palavra; é a palavra em "estado de dicionário.” |

Além do sentido referencial, literal, cada palavra remete a inúmeros outros sentidos, virtuais, conotativos, que são apenas sugeridos, evocando outras ideias associadas, de ordem abstrata, subjetiva.

|Conotação é a significação subjetiva da palavra; ocorre quando a palavra evoca outras realidades por associações que ela provoca. |

O quadro abaixo sintetiza as diferenças fundamentais entre denotação e conotação:

|DENOTAÇÃO |CONOTAÇÃO |

|palavra com significação restrita |palavra com significação ampla |

|palavra com sentido comum do dicionário |palavra cujos sentidos extrapolam o sentido comum |

|palavra usada de modo automatizado |palavra usada de modo criativo |

|linguagem comum |linguagem rica e expressiva |

|Para exemplificar, de maneira simples e clara, estes dois conceitos, vamos tomar a palavra cão: terá um sentido denotativo quando designar o|

|animal mamífero quadrúpede canino; terá um sentido conotativo quando expressar o desprezo que desperta em nós uma pessoa sem caráter ou |

|extremamente servil. |

|(Otto M.Garcia, 1973) |

Nas receitas abaixo, as palavras têm, na primeira, um sentido objetivo, explícito, constante; foram usadas denotativamente. Na segunda, apresentam múltiplos sentidos, foram usadas conotativamente. Observa-se que os verbos que ocorrem tanto em uma quanto em outra - dissolver, cortar, juntar, servir, retirar, reservar - são aqueles que costumam ocorrer nas receitas; entretanto, o que faz a diferença são as palavras com as quais os verbos combinam, combinações esperadas no texto 1, combinações inusitadas no texto 2.

|TEXTO I |TEXTO II |

|Bolo de arroz |Receita |

|3 xícaras de arroz |Ingredientes |

|1 colher (sopa) de manteiga |2 conflitos de gerações |

|1 gema |4 esperanças perdidas |

|1 frango |3 litros de sangue fervido |

|1 cebola picada |5 sonhos eróticos |

|1colher (sopa) de molho inglês |2 canções dos Beatles |

|1colher (sopa) de farinha de trigo |Modo de preparar |

|1 xícara de creme de leite salsa picadinha |Dissolva os sonhos eróticos |

|Prepare o arroz branco, bem solto. |nos dois litros de sangue fervido |

|Ao mesmo tempo, faça o frango ao molho, bem temperado e saboroso. |e deixe gelar seu coração. |

|Quando pronto, retire os pedaços, desosse e desfie. Reserve. |Leve a mistura ao fogo, |

|Quando o arroz estiver pronto, junte a gema, a manteiga, coloque numa |adicionando dois conflitos |

|forma de buraco e leve ao forno. |de gerações às esperanças perdidas. |

|No caldo que sobrou do frango, junte a cebola, o molho inglês, a |Corte tudo em pedacinhos |

|farinha de trigo e leve ao fogo para engrossar. |e repita com as canções dos |

|Retire do fogo e junte o creme de leite. |Beatles o mesmo processo usado |

|Vire o arroz, já assado, num prato. |com os sonhos eróticos, mas desta |

|Coloque o frango no meio e despeje por cima o molho. |vez deixe ferver um pouco mais e |

|Sirva quente. |mexa até dissolver. |

|(Terezinha Terra) |Parte do sangue pode ser |

| |substituído por suco de |

| |groselha, mas os resultados |

| |não serão os mesmos. |

| |Sirva o poema simples |

| |ou com ilusões. |

| |(Nicolas Behr) |

Os textos informativos (científicos e jornalísticos), por serem, em geral, objetivos, prendem-se ao sentido denotativo das palavras. Vejamos o texto abaixo, em que a linguagem está estruturada em expressões comuns, com um sentido único.

|Canibalismo entre insetos |

|Seres que nascem na cabeça de outros e que consomem progressivamente o corpo destes até aniquilá-los, ao atingir o estágio adulto. ... |

|Esse é um enredo que mais parece de ficção científica. No entanto, acontece desde a pré-história, tendo como protagonistas as vespas de |

|certas espécies e as paquinhas, e é um exemplo da curiosa relação dos ‘inimigos naturais’, aproveitada pelo homem no controle biológico |

|de pragas, para substituir com muitas vantagens os inseticidas químicos. |

|(Revista Ciência Hoje, nº 104, outubro de 1994, Rio, SBPC) |

Além dos poetas, os humoristas e os publicitários fazem um amplo uso das palavras no seu sentido conotativo, o que contribui para que os anúncios despertem a atenção dos prováveis consumidores e para que o dito humorístico atinja o seu objetivo de fazer rir, às vezes até com uma certa dose de ironia.

Por exemplo, na propaganda de um ‘shopping’, foi usada a seguinte frase:

|O Rio Design Center acaba de ganhar um novo piso. |

|Marmoleum |

|o piso natural |

|(Revista Veja Rio, maio/junho,96) |

O anúncio tem aí um duplo sentido, pois transmite duas informações:

1. O Rio Design Center ganhou uma nova loja - PAVIMENTO SUPERIOR - onde estão à venda pisos especiais.

2. Nesta loja é possível encontrar o material para piso, importado da Holanda, que se chama Marmoleum.

Na frase que fecha o anúncio, desfaz-se a ambiguidade: "Venha até a (ao invés de o) Pavimento Superior e confira esta e outras novidades de revestimentos para pisos". Mas a frase de abertura faz pensar em outros sentidos: o centro comercial ganhou um novo andar, um novo pavimento, ou ganhou um revestimento novo em todo o seu piso, em todo o seu chão.

Os provérbios ou ditos populares são também um outro exemplo de exploração da linguagem no seu uso conotativo. Assim, "Quem está na chuva é para se molhar" equivale a "/Quando alguém opta por uma determinada experiência, deve assumir todas as regras e conseqüências decorrentes dessa experiência". Do mesmo modo, "Casa de ferreiro, espeto de pau" significa O que a pessoa faz fora de casa, para os outros, não faz em casa, para si mesma.

A respeito de conotação, Othon M. Garcia (1973) observa: "Conotação implica, portanto, em relação à coisa designada, um estado de espírito, uma opinião, um juízo, um sentimento, que variam conforme a experiência, o temperamento, a sensibilidade, a cultura e os hábitos do falante ou ouvinte, do autor ou leitor. Conotação é, assim, uma espécie de emanação semântica, possível graças à faculdade que nos permite relacionar coisas análogas ou semelhadas. Esse é, em essência, o traço característico do processo metafórico, pois metaforização é conotação".

A linguagem conotativa é, pois, importante ferramenta através da qual a linguagem literária se manifesta. Essa linguagem apresenta diferentes recursos expressivos, que serão analisados a seguir.

1. Metáfora: é o mais expressivo elemento em que se apoia a linguagem figurada. Trata-se da principal figura semântica, da qual as outras figuras podem aproximar-se, ou confundir-se com ela. Consiste na transferência de um termo para uma esfera de significação que não é a sua, em virtude de uma comparação implícita. Em outras palavras, é o deslocamento de um termo, ou de uma expressão, de sua área de significado normal para outra, processo de que resulta a produção de um efeito estético em que se faz presente o binômio denotação/conotação:

Perdi a chave do apartamento. [sentido denotativo]

Percebemos, enfim, a chave do problema. [sentido conotativo ou metafórico]

No dia seguinte, acordamos debaixo de um temporal [...]. Enfim a tempestade amainou. Confesso que foi uma diversão excelente à tempestade do meu coração." (Machado de Assis)

A metáfora pode ser caracterizada ainda pelas seguintes figuras:

1.1. Catacrese: é a metáfora mais comum, estereotipada, que resulta da ausência de um termo próprio para designar determinada coisa: pernas da mesa, cabeça de alfinete etc.

1.2. Personificação (ou animismo, prosopopeia): atribuição a seres inanimados de ações, qualidades ou sentimentos próprios do homem: "[...] o sol, no poente, abre tapeçarias..." (Cruz e Souza)

1.3. Hipérbole: figura do exagero; tem por fundamento a paixão, que leva o escritor ou o falante a deformar a realidade, glorificando-a ou amesquinhando-a segundo seu modo particular de sentir:

"Eu, somente eu, com a minha dor enorme, / Os olhos ensanguento na vigília!" (Augusto dos Anjos)

1.4. Símbolo: é a metáfora que ocorre quando o nome de um ser ou coisa concreta assume valor convencional, abstrato: Ele hesita entre a cruz [o cristianismo ou as virtudes cristãs] e os prazeres da vida.

1.5. Sinestesia: interpenetração de planos sensoriais. Fundem-se sensações visuais com auditivas, gustativas, olfativas, tácteis, num amálgama de efeitos expressivos:

"Por uma única janela envidraçada, [...] entravam claridades cinzentas e surdas, sem sombras." (Clarice Lispector)

2. Metonímia: emprego de um termo por outro, através de uma relação de dependência, que pode ser da causa pelo efeito, da parte pelo todo, do conteúdo pelo continente, da obra pelo autor, da causa pela consequência etc., e vice-versa:

a) o efeito pela causa: As cãs inspiram respeito (em vez de a velhice).

b) o autor pela obra: Ler Machado de Assis.

c) o continente pelo conteúdo: Tomar uma garrafa (de vinho).

d) a parte pelo todo: Completou quinze primaveras (por anos).

e) o singular pelo plural: A mulher tem sempre rara intuição (por as mulheres).

f) a característica pelo produto: "(Um homem) trazia um ferro na mão gotejando vermelho, uma faca de lâmina estreita ou um punhal" (Raul Pompeia). [No caso, vermelho = sangue.]

3. Antonomásia: substituição de um nome próprio por um atributo ou qualidade que lhe diz respeito - e vice-versa:

Já quiseram os Deuses que tivesse

O filho de Filipe, nesta parte,

Tanto poder que tudo submetesse

Debaixo do seu jugo o fero Marte.

(Camões) [No caso, "filho de Filipe" refere-se a Alexandre Magno.]

Observação: é também por antonomásia que a tradição literária e histórica concede títulos específicos a alguns homens célebres: Águia de Haia (Rui Barbosa); Boca do Inferno (Gregório de Matos); Poeta das Estrelas (Olavo Bilac) etc.

4. Sinédoque: na prática, confunde-se com a metonímia. Tal semelhança, inclusive, é objeto de discussão entre os gramáticos. Seria uma metonímia baseada na relação quantitativa entre o significado original da palavra usada e o conteúdo ou referente imaginado:

Braços para a lavoura (Onde "braços" substitui "homens" ou "trabalhadores").

5. Eufemismo- é o emprego de uma expressão suave e polida no lugar de outra considerada grosseira ou pouco polida. Ex.: José entregou a alma a Deus. Vestir um terno de madeira. Ele faltou com a verdade. Passar desta para melhor.

6. Antítese - é uma figura de estilo pela qual se salienta a oposição entre palavras ou idéias.

- Não existiria som, se não houvesse o silêncio, não existiria luz se não fosse a escuridão..." (Lulu Santos) Para dar maior realce às suas idéias, o autor utilizou expressões de sentido oposto, colocando lado a lado,  som / silêncio,  luz / escuridão.  Quando é usado esse recurso, ele recebe o nome de antítese.

7. Gradação é uma figura de estilo, relacionada com a enumeração, onde são expostas determinadas ideias de forma crescente (em direção a um clímax) ou decrescente (anticlímax).

Ex. Tudo começou no meu quarto, onde concebi as ideias que me levariam a dominar o bairro, a cidade, o país, o mundo... E a desejar o próprio Universo...

Meu caro, para mim, você é um simples roedor. Que digo? Um verme... Menos que isso! Uma bactéria! Um vírus!...

"O primeiro milhão possuído excita, acirra, assanha a gula do milionário." (Olavo Bilac)

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