Clientelismo Eleitoral e Coronelismo Político: Estudo de ...



ALESSANDRO CAVASSIN ALVES

CLIENTELISMO ELEITORAL E CORONELISMO POLÍTICO: ESTUDO DE UM PEQUENO MUNICÍPIO PARANAENSE – 1992-2002

CURITIBA

2003

ALESSANDRO CAVASSIN ALVES

CLIENTELISMO ELEITORAL E CORONELISMO POLÍTICO: ESTUDO DE UM PEQUENO MUNICÍPIO PARANAENSE – 1992-2002

Monografia apresentada como requisito parcial à conclusão do Curso de Ciências Sociais, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná.

Orientador: Professor Adriano Nervo Codato.

Banca: Prof. Sérgio Soares Braga (Dep. De Sociologia) e Christine Chaves Alencar (Dep. De Antropologia)

CURITIBA

2003

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que contribuíram para a realização deste trabalho, aos meus colegas de classe e em especial ao professor e orientador Adriano.

Agradeço a minha esposa Gislaine, pelo apoio e comentários.

SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS 5

INTRODUÇÃO 7

CAPÍTULO I – CLIENTELISMO ELEITORAL E CORONELISMO POLÍTICO 10

1.1. O CONCEITO DE “CORONELISMO” 10

1.1.1. CORONELISMO, ENXADA E VOTO 10

1.1.2. O “CORONELISMO”: UMA POLÍTICA DE COMPROMISSOS 14

1.1.3. CORONELISMO E BARGANHA ELEITORAL 16

1.1.4. OUTRO FOCO DE ANÁLISE SOBRE O “CORONELISMO” 18

1.1.5. FIM DO “CORONELISMO”? 21

1.1.6. O ESTUDO DO CLIENTELISMO 24

CAPÍTULO II – O MUNICÍPIO DE ITAPERUÇU – ESTADO DO PARANÁ 29

2.1. UM POUCO DA HISTÓRIA DO MUNICÍPIO E SUA EMANCIPAÇÃO POLÍTICA 29

2.2. ECONOMIA 31

2.3. GRUPOS POLÍTICOS EM ITAPERUÇU 33

2.3.1. Grupo Político I - MANOEL JOEKEL 36

2.3.2. Grupo Político II - GENTIL PASKE DE FARIA 39

2.4. QUADRO DOS VEREADORES E OUTROS LÍDERES POLÍTICOS LOCAIS 41

CAPÍTULO III - POLÍTICA LOCAL, ESTADUAL E FEDERAL – UMA REDE DE COMPROMISSOS 45

3.1. TRANSFERÊNCIA DE VOTOS 46

3.2. COMENTÁRIOS SOBRE OS RESULTADOS ELEITORAIS EM NÍVEL ESTADUAL E FEDERAL EM ITAPERUÇU 50

CONSIDERAÇÕES FINAIS 53

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 57

ANEXOS 59

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Eleições Majoritárias de 1992 - Itaperuçu 35

Tabela 2 – Eleições Majoritárias de 1996 - Itaperuçu 35

Tabela 3 – Eleições Majoritárias de 2000 - Itaperuçu 35

Tabela 4 – Vereadores de Itaperuçu – Eleições Municipais de 1992 41

Tabela 5 – Vereadores de Itaperuçu – Eleições Municipais de 1996 41

Tabela 6 – Vereadores de Itaperuçu – Eleições Municipais de 2000 42

Tabela 7 – Eleição de 1994 - Presidente – Itaperuçu 47

Tabela 8 – Eleição de 1994 – Senador – Itaperuçu 47

Tabela 9 – Eleição de 1994 – Governador – Itaperuçu 47

Tabela 10 – Eleição de 1994 – Deputado Federal – Itaperuçu 47

Tabela 11 – Eleição de 1994 – Deputado Estadual – Itaperuçu _________________ 47

Tabela 12 - Eleição de 1998 para Presidente - Itaperuçu 47

Tabela 13 – Eleição de 1998 – Senador - Itaperuçu 48

Tabela 14 – Eleição de 1998 – Governador - Itaperuçu 48

Tabela 15 - Eleição de 1998 para Deputado Federal - Itaperuçu 48

Tabela 16 - Eleição de 1998 para Deputado Estadual - Itaperuçu 48

Tabela 17 - Eleição de 2002 para Presidente em Itaperuçu, 1º Turno 48

Tabela 18 – Eleição de 2002 para Governador em Itaperuçu, 1º Turno 49

Tabela 19 – Eleição de 2002 para Senador em Itaperuçu 49

Tabela 20 – Eleição de 2002 para Deputado Federal em Itaperuçu 49

Tabela 21 – Eleição de 2002 para Deputado Estadual em Itaperuçu 49

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Características do “coronelismo” e “clientelismo” 22

Quadro 2 – Resumo dos argumentos dos autores citados 25

Quadro 3 – Trajetória Política de Manoel Joekel 38

Quadro 4 – Trajetória Política de Gentil Paske de Faria 40

RESUMO

O presente estudo focaliza o município de Itaperuçu – PR, localizado na região metropolitana de Curitiba (37km da capital paranaense) e que contava com uma população de 19.134 habitantes (censo 2000). O objetivo deste trabalho é realizar um estudo do comportamento político local e um levantamento dos resultados eleitorais deste município (emancipado de Rio Branco do Sul em 10/12/1992) e estudá-lo à luz de algumas hipóteses clássicas da Ciência Política. Serão enfocadas as eleições municipais, estaduais e federais. Esses resultados serão enriquecidos por pesquisa de campo e entrevista com eleitores realizadas pelo autor. Dois conceitos chaves serão testados: o “coronelismo” e o “clientelismo” que, acredito, condicionam as eleições em Itaperuçu e o funcionamento desse micro-sistema político. O clientelismo é a forma tradicionalmente utilizada pelo líder político local para controlar o eleitorado e mantê-lo fiel e dependente da orientação política dele próprio ou de seu grupo restrito. Por outro lado, vigora nesse micro-sistema político uma forma modernizada de “compromisso coronelista”. Esses “coronéis” – as lideranças políticas locais – controlam os votos do município destinados principalmente a deputados estaduais e federais em troca de recursos orçamentários para obras públicas, conservando assim sua posição de liderança local. O chefe político torna-se assim responsável (“padrinho”) pelas vitórias eleitorais dos candidatos por ele apoiados, instaurando uma troca de proveitos entre o poder público estadual e federal com os debilitados governos municipais. Não só a questão eleitoral firma o “compromisso coronelista” atual, mas também a semelhança com a descrição coronelista de Victor Nunes Leal nos municípios na República Velha brasileira.

Palavras-chaves: política local; clientelismo e coronelismo; política paranaense.

INTRODUÇÃO

Este estudo se refere ao processo político-eleitoral em um pequeno município paranaense, Itaperuçu, situado a 37 km de Curitiba, no período de 1992 a 2002. Observei a prática corrente da política local e procurei entender o seu funcionamento e o seu significado.

Revisando a literatura sobre a política em pequenos municípios, destacou-se desde o início, o clássico estudo de Victor Nunes Leal, “Coronelismo, enxada e voto. O município e o regime representativo no Brasil”[1], publicado pela primeira vez em 1949, em que o autor busca entender o funcionamento da política no interior do Brasil, na época da República Velha brasileira (1889-1930). Aí se encontra a definição mais clássica do fenômeno do “coronelismo”, atrelado a uma estrutura agrária latifundiária.

A leitura desse ensaio e, posteriormente, as observações e análises de dados recentes de Itaperuçu, mostravam semelhanças interessantes. Como poderia uma antiga forma de dominação política persistir, ainda hoje, em uma sociedade moderna como a brasileira?

Ao aprofundar a literatura sobre o assunto, deparei-me com a variação do uso e do sentido do conceito de “coronelismo” ao longo da história brasileira. Muitos autores, inclusive, consideram extinto tal fenômeno[2], enquanto outros buscam associá-lo às modernas estruturas de dominação no Brasil[3]. Nesse sentido, este trabalho busca analisar a variação do conceito do “coronelismo” na literatura política brasileira, tomando cuidado especial na sua definição e em sua possível aplicação à realidade atual. Procura-se também distingui-lo de outro fenômeno, denominado “clientelismo”.

Entender o que significa clientelismo foi outro passo desta monografia. Sabe-se que esta é uma estrutura que atravessa a história brasileira (NUNES, 1999); portanto, é tão antiga quanto o “coronelismo”, ou mais. Porém, são práticas políticas distintas. A primeira refere-se ao poder de mando de um chefe político em uma determinada localidade e sua barganha com o governo estadual e federal. A segunda, é uma estrutura que envolve um tipo de relação entre atores políticos que trocam benefícios por apoio político e votos (CARVALHO, 1997).

E a pergunta se refaz: estruturas tidas como arcaicas persistem no funcionamento de nossa democracia?

No capítulo I, busco comparar as características políticas dos pequenos municípios dominados por “coronéis”, descritas por Leal, com as observações e análises realizadas por mim, do município de Itaperuçu (1992-2002). Busco entender ainda, a variação do conceito de “coronelismo” na literatura especializada, na qual destacam-se dois autores em particular, Maria Isaura Pereira de Queiroz e Décio Saes. E, por fim, procuro distinguir “coronelismo” de “clientelismo”.

No capítulo II, traço um pequeno histórico do município de Itaperuçu e de sua economia, e analiso os seus personagens e grupos políticos, bem como suas estratégias e recursos políticos para manterem-se no poder. Faço algumas comparações com municípios do Nordeste e Sudeste brasileiro, apesar da dificuldade de se encontrar estudos políticos sobre pequenas localidades.

No capítulo III, estabeleço a rede de compromissos que se forma entre o poder local e o poder estadual e federal. Esse compromisso se dá através da “transferência de votos” por parte dos políticos locais para os políticos “graúdos” e do apoio que estes oferecem aos chefes políticos locais. Marcos Otávio BEZERRA (1999, p. 17) demonstra que, ao estudar esse compromisso entre parlamentares estaduais e federais com políticos locais, é importante analisar a dimensão sociológica dessas trocas, isto é, examinar “as mediações necessárias para que os benefícios sejam concedidos e os votos obtidos”. Na República Velha brasileira, esse era o “compromisso coronelista”.

O que proponho também é repensar o fim do “coronelismo”. É importante reconsiderar evidências políticas “arcaicas” que ainda persistem em municípios brasileiros, apesar da consolidação da democracia representativa, da urbanização, da expansão do trabalho assalariado, do voto livre etc. Talvez o “coronel”, latifundiário pré-capitalista, que controla trabalhadores dependentes em suas terras, não exista mais. O que observo é que as características descritas desse sistema coronelista continuam a existir, isto é: os currais eleitorais, a fidelidade ao “coronel” em época de eleição e a vinculação das escolhas nos vários níveis da eleição (estadual e federal), o “coronel” que apoia os candidatos governistas em nível Estadual e Federal dando-lhes votos em troca de recursos, o medo das pessoas em “desrespeitar o chefe”, o “coronel” que é visto como o único que pode trazer recursos ao município, prefeituras pouco técnicas, com o empreguismo e favoritismo, contra o concurso público e a burocracia etc (LEAL, 1997, cap. 1).

Olavo Brasil de Lima Júnior afirmou, com propriedade, que “os estudos abandonaram, mais recentemente, o município como unidade analítica” e que “(...) não se sabe ao certo, quão longe estamos dos ‘coronéis, das enxadas e dos votos’” (LIMA JR. 1999, p. 38). Daí a relevância do tema, pois há poucos estudos sobre o processo político nos pequenos municípios, bem como a descrição de como esses micro-sistemas políticos funcionam de fato.

Tendo como objetivo buscar identificar as relações de poder em nível local, as hipóteses de trabalho recaem sobre a sobrevivência de estruturas tidas como “arcaicas” na política brasileira.

A pesquisa empírica contará com os dados eleitorais coletados no Tribunal Superior Eleitoral do Paraná, com as informações obtidas na Prefeitura e Câmara de Vereadores de Itaperuçu e Rio Branco do Sul, em jornais locais e em entrevistas com políticos e eleitores no período de janeiro a outubro de 2002, além da bibliografia voltada ao tema.

O trabalho, a princípio, parte do seguinte esquema de análise[4]:

Esquema de análise 1

Relação de Relação de

“clientelismo” “coronelismo”

A relação de clientelismo faz com que muitos eleitores tornem-se fiéis aos chefes políticos municipais. Fidelidade que faz do líder político local um chefe supremo do município. Por sua vez, conseguem vincular essa lealdade às suas opções políticas estadual e federal, transferindo assim, uma porcentagem significativa de votos a esses políticos. Um esquema de poder local que lembra a relação de “coronelismo” da República Velha brasileira. No transcorrer do trabalho este esquema de análise será submetido a questionamentos e análises diversas sobre esse fenômeno, hipótese geral deste trabalho.

CAPÍTULO I – CLIENTELISMO ELEITORAL E CORONELISMO POLÍTICO

1.1. O CONCEITO DE “CORONELISMO”

O tema do “coronelismo” possui uma ampla bibliografia, tendo sido objeto de diversas análises interpretativas e estudos de casos. Procuro, neste capítulo, recuperar como alguns autores descreveram esse fenômeno, para assim buscar identificar ainda sua existência, ou não, na atual democracia brasileira. O “coronelismo” é uma prática política característica da Primeira República brasileira e chegando ao seu ocaso, segundo alguns autores, com o desenvolvimento urbano/industrial e o advento da ditadura militar de 1964. Mas, ao mesmo tempo, o senso comum ainda identifica alguns estilos políticos (em nível federal, estadual ou municipal) como “coronelísticos”[5].

O que seria, então, o “coronelismo”? Para responder a esta questão volto à leitura do clássico ensaio de Victor Nunes Leal agregando outros importantes trabalhos que no decorrer do capítulo serão apresentados.

1.1.1. CORONELISMO, ENXADA E VOTO

Leal, descreve este fenômeno da seguinte forma:

“O “coronelismo” é sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terra. Não é possível, pois, compreender o fenômeno sem referência à nossa estrutura agrária, que fornece a base de sustentação das manifestações de poder privado ainda tão visíveis no interior do Brasil” (LEAL, 1997, p.40)

As idéias destacadas deste conceito são que o “coronelismo” é um compromisso entre chefes políticos locais, os coronéis, e o poder público (estadual e federal). O coronel, como senhor de terras, pertence a uma estrutura agrária latifundiária, e numa base de “troca de proveitos” com o governo, mantém sua base de dominação nas pequenas localidades com “manifestações de poder privado” e, por sua vez, sustenta com votos o governismo.

Um possível esquema de análise deste fenômeno seria:

Esquema de análise 2:

Em seu ensaio, Leal descreve os principais traços da vida política dos municípios do interior e como se dá a liderança do coronel como chefe político local. Algumas destas características se assemelham muito às existentes nos pequenos municípios atuais. São elas[6]:

• A liderança indiscutível do coronel no âmbito local, “...que comanda discricionariamente um lote considerável de votos de cabresto. A força eleitoral empresta-lhe prestígio político, natural coroamento de sua privilegiada situação econômica e social de dono de terras.” (LEAL, 1997, p. 42). Ele pode ainda ajuntar a si médicos, advogados, cartorários, entre outros, comandando-os e mantendo seu controle sobre toda a localidade ou até mesmo região[7].

• O coronel exerce ampla jurisdição sobre seus dependentes, compondo rixas e desavenças e até arbitrando sobre os casos, e que os interessados respeitam. Possui extensas funções policiais com o auxílio de empregados, agregados ou capangas. Isto devido à qualidade de ser proprietário rural. A violência faz parte das atividades do “coronelismo” (LEAL, 1997, p. 42)[8].

• Diante da massa pobre, o coronel é rico. Por isso se apela a ele nos momentos de “aperto”. Mesmo que muitos coronéis, na realidade, não possuam uma condição financeira que lhes possa conferir o título de ricos, Leal mostra que o povo local, paupérrimo, vê no coronel uma pessoa que possui condições de ajudá-los e de lhes socorrer “nos momentos de apertura” e outras necessidades (LEAL, 1997, p. 43-44)[9].

• “São, pois, os fazendeiros e chefes locais quem custeiam as despesas do alistamento e da eleição. Sem dinheiro e sem interesse direto, o roceiro não faria o menor sacrifício neste sentido” (LEAL, 1997, p. 56). As despesas eleitorais que descreve Leal referem-se ao alistamento eleitoral e ao custeio das despesas em geral nos dias de eleição. Para a época, as eleições eram realizadas nas sedes dos municípios, tendo os eleitores rurais que se deslocarem até a sede, tendo que estar, geralmente, um dia antes do pleito e voltar para casa noutro dia após a eleição. “É, portanto, compreensível que o eleitor da roça obedeça à orientação de quem tudo lhe paga, e com insistência, para praticar um ato que lhe é completamente indiferente” (LEAL, p.56-57).[10]

• É pelo chefe político local que vêm o “progresso”, as poucas melhorias do lugar (a escola, a estrada, o correio,…) “tudo exige o seu esforço, às vezes um penoso esforço que chega ao heroísmo… é com elas que, em grande parte, o chefe municipal constrói ou conserva sua posição de liderança” (LEAL, 1997, p.58). É importante observar que, mesmo os municípios sendo pobres, o coronel deve “conservar sua posição de liderança” realizando obras públicas para manter seu poder e, assim outro “coronel” ou líder não tome seu lugar[11].

• “Há ainda os favores pessoais de toda ordem, desde arranjar emprego público até os mínimos obséquios” (LEAL, 1997, p.60)[12].

Em nota de rodapé, Leal descreve uma “lista incompleta” desses favores pessoais, e que considero atualíssimos na política em Itaperuçu, demonstrando portanto que muitas das observações do autor em 1949 são ainda vigentes num pequeno município da Região Metropolitana de Curitiba[13].

• Outra característica é o “... Paternalismo, com a sua recíproca: negar pão e água ao adversário. Para favorecer os amigos, o chefe local resvala muitas vezes para a zona confusa que medeia entre o legal e o ilícito, ou penetra em cheio no domínio da delinqüência, mas a solidariedade partidária passa sobre todos os pecados uma esponja regeneradora. A definitiva reabilitação virá com a vitória eleitoral, porque, em política, no seu critério, ‘só há uma vergonha: perder’. Por isso mesmo, o filhotismo tanto contribui para desorganizar a administração municipal” (LEAL, 1997, p.60)[14]. Portanto, a desorganização dos municípios, segundo Leal, proveria da “incultura” do interior com a falta de funcionários permanentes, burocratizados, gerando anarquia administrativa, do filhotismo “que convoca muitos agregados para a ‘gamela’ municipal”, e, por fim, da “utilização do dinheiro, dos bens e dos serviços do governo municipal nas batalhas eleitorais” (LEAL, 1996, p.61). Há claramente aqui a confusão entre público e privado. O coronel seria como que o dono da prefeitura, do município, das coisas públicas, nomeando seus “agregados” para os cargos públicos e utilizando do erário da forma que lhe convém, sem prestar contas. Perseguindo os adversários políticos, principalmente nos períodos que precedem às eleições. Os “inimigos” políticos são extremamente discriminados, como bem descreveu o autor. Esta característica é comum ainda hoje, não só a nível municipal, mas em todos os âmbitos da política brasileira[15].

• Diz o autor: “E assim nos aparece este aspecto importantíssimo do “coronelismo”, que é o sistema de reciprocidade: de um lado, os chefes municipais e os “coronéis”, que conduzem magotes de eleitores como quem toca tropa de burros; de outro lado, a situação política dominante no Estado, que dispõe do erário, dos empregos, dos favores e da força policial, que possui, em suma, o cofre das graças e o poder da desgraça” (LEAL, 1997, p.63-64). Com isto se dá o compromisso coronelista de transferir aos candidatos do oficialismo seus “magotes de eleitores”.

“A essência, portanto, do compromisso “coronelista” – salvo situações que não constituem regra – consiste no seguinte: da parte dos chefes locais, incondicional apoio aos candidatos do oficialismo nas eleições estaduais e federais; da parte da situação estadual, carta-branca ao chefe local governista (de preferência o líder da facção local majoritária) em todos os assuntos relativos ao município, inclusive na nomeação de funcionários estaduais do lugar” (LEAL, 1997, p.70).

Eis, de forma sucinta, as idéias de Leal sobre a vida política do interior do Brasil na Primeira República, e os seus reais representantes, os “coronéis” e algumas comparações com Itaperuçu.

1.1.2. O “CORONELISMO”: UMA POLÍTICA DE COMPROMISSOS[16]

Ampliando a reflexão sobre este fenômeno trago outras definições e análises, como a de Maria de Lourdes Monaco JANOTTI (1981, p.7), em que o “coronelismo” é o “poder exercido por chefes políticos sobre parcela ou parcelas do eleitorado, objetivando a escolha de candidatos por eles indicados”[17]. O “coronelismo”, segundo a autora, poderia ser identificado desde o tempo do Império, mas teve seu apogeu na Primeira República Brasileira (1889-1930).

O termo coronel originou-se como título honorífico concedido pela Guarda Nacional, mas pouco tendo a ver com a carreira militar. Era dado geralmente aos grandes donos de terra, como o senhor de engenho ou fazendeiro de gado – componente dominante da classe dirigente do Brasil agrário, e que por sua vez era o chefe de determinada localidade. Mas, este título poderia ser dado também a membros de outras classes sociais, tais como comerciantes, advogados, médicos, padres etc. (PANG, 1978, p.19).

O Presidente Campos Salles adotou em seu governo (1898-1902) a chamada “Política dos Governadores”, que consistia numa troca mútua de favores entre o governo federal e os governadores dos estados: o presidente da República apoiava os governadores dos estados e estes apoiavam a política do presidente. Os governadores por sua vez ligavam-se aos coronéis, que “comandavam o ‘eleitorado de cabresto’ e, portanto, eram os lídimos integrantes do pacto. Conseguiriam os votos e, em troca, reconheciam-lhes a autoridade política” (JANOTTI, 1981, p.37). Os “coronéis” tornaram-se importantes neste jogo, devido a fraqueza financeira dos municípios, a decadência dos próprios senhores de terra e a necessidade de manterem-se no poder.

Estes “coronéis” passavam então a exercer um poder de mando muito grande sobre os municípios:

“O município era o baluarte político-administrativo de um coronel. Na maioria dos estados era a unidade administrativa e legislativa mais baixa da federação brasileira (...). Era lá que o coronel lutava com seus rivais para manter o domínio político dos processos administrativos e legislativos. De modo geral, um coronel era o principal chefe de um município e de vez em quando chegava ao cargo de deputado ou senador e governador de estado” (PANG, 1978, p.31).

O coronel era identificado como “um chefe político, de reconhecido poder econômico, que conseguira apoio e prestígio junto ao governo estadual, na razão direta de sua competência em garantir eleições situacionistas” (JANOTTI, 1981, p.41).

Resumindo, o “coronel” seria então o chefe político local, encontrado principalmente na época da Primeira República, que ligava-se com os governos estaduais, em troca de liberdade de ação e que transferia “votos de cabresto” aos candidatos do oficialismo.

Levanto agora a questão da barganha eleitoral (clientelismo) e as práticas do “coronelismo”. Até que ponto nós podemos associá-las? O “coronel” precisa ou não da barganha para manter-se no poder? Se ele se utiliza do clientelismo para conseguir votos, seria então um “coronel”? Se o “coronel” é o chefe local absoluto, a lista de favores que presta a sua comunidade pode ser considerada barganha?

1.1.3. CORONELISMO E BARGANHA ELEITORAL

Analiso o importante estudo de Maria Isaura Pereira de QUEIROZ (1997) sobre suas interpretações sociológicas acerca do “coronelismo”. Para a autora, o “coronel” era uma espécie de “elemento sócio-econômico polarizador” do município ou região, no qual as pessoas se identificavam, isto é, “fulano é gente do coronel tal”. Assim também, em nível estadual, os “coronéis” eram referências nas suas determinadas localidades. Portanto, os “coronéis se constituíam realmente em chefes supremos tanto de toda a sua parentela, quanto das parentelas aliadas” e, por vezes, de toda região. E eram pontos de referências aos governos de Estado[18].

Queiroz define o “coronel” principalmente pelas suas características políticas, pela quantidade de votos de que dispunha no momento das eleições. E demonstra como o “coronel” conseguia os “seus” votos. Primeiro, pela sua capacidade de mando, controle que tinha sobre o “curral eleitoral”, mesmo que utilizando do “bico de pena” para obter a maioria dos votos. Segundo, pelos “cabos eleitorais que eram elementos de ligação indispensável entre o coronel e a massa de votantes”. E, por fim, pela barganha eleitoral. Cito a autora:

“A exigência de um coronel para que seus apaniguados votem em determinado candidato – imposição muitas vezes sem apelo – tem como contrapartida o dever moral que o coronel assume de auxiliar e defender quem lhe deu o voto. São estes os aspectos específicos do jogo eleitoral brasileiro, desde que a República os estendeu a todos os cidadãos alfabetizados: votar num candidato indicado por um coronel não é aceitar passivamente a vontade deste; é dar conscientemente um voto a um chefe poderoso, de quem já se obteve algo, ou se almeja obter algo. O voto é, pois, consciente, mas orientado de maneira diversa do que o voto de um cidadão de sociedade diferenciada e complexa; no primeiro caso, o voto é um bem de troca; no segundo caso, o voto é a afirmação pessoal de uma opinião” (QUEIROZ, 1997, p. 163).

Neste parágrafo destaca-se a barganha eleitoral como parte integrante das práticas de mando do “coronel”, isto é, o voto está associado à proteção que os “apaniguados” recebem, em agradecimento a favores recebidos, ou mesmo, a algo que almejam. O voto é um “bem de troca”[19].

Queiroz fundamenta a estrutura coronelístca na posse de bens de fortuna, isto é, não é necessariamente a questão da terra que faz um “coronel”, mas principalmente sua riqueza. Como exemplo, cita Delmiro Gouveia, pioneiro da industrialização do Nordeste, um “coronel” que ascendeu mediante a aquisição de bens de fortuna no comércio. “Em suma, na estrutura coronelística, somente os indivíduos bem aquinhoados de fortuna herdada ou adquirida tinham possibilidades de fazer favores e granjear clientela” diz a autora, e portanto, serem senhores absolutos para comandarem a política em determinada região.

Esta interpretação, que associa “coronel” e barganha eleitoral, também é encontrada em Janotti. Para a autora, o “coronel” era o “protetor natural” da comunidade “solidamente enraizada na proteção e na lealdade, a sociedade rural repousava na troca de favores, de homem para homem. O coronel oferecia proteção e exigia irrestrita adesão”; e ainda: “todos deviam seus cargos ao chefe, haviam sido indicados ou eleitos por ele; prefeitos, vereadores, soldados, etc.” (JANOTTI, 1981, p.56-58). O “coronel” oferece algo, e os seus “subordinados” lhe obedecem (como por exemplo: votando em quem o “coronel” manda). Igor de Rennó MACHADO (1997)[20] também identifica, numa pequena comunidade mineira, um determinado chefe político, “Coronel Antônio”, como um líder político local que utiliza da barganha para manter sua liderança.

Uma análise interessante deste processo barganha/“coronel” é encontrada no estudo de Marcos V. VILAÇA e R. Cavalcanti de ALBUQUERQUE (1978), em que se demonstra o processo de ruptura da sociedade agro-pecuária do Nordeste brasileiro através de quatro casos de domínio econômico, social e político do “coronelismo”. A análise evidencia a decadência dos “coronéis” diante do “processo de penetração do moderno em estruturas sociais anquilosadas”, e como estes chefes locais “lutam para sobreviver politicamente” e se manter no poder: abrindo escolas, encomendando folhetos em sua glória, apoiando rádios, jornais. Estas barganhas se davam em função “da modificação do sistema de relações sociais e econômicas que o motiva” isto é, o voto de cabresto passa a ser substituído pelo voto mercadoria, e isto vai provocar o declínio político do “coronel”.

“O voto começa a ser favor; de favor se torna objeto de negócios. E o que era antes doado pelo matuto e trocado pelo coronel com os políticos de seu partido, por prestígio, empregos, até por secretarias de estado, passa a ter, com a libertação progressiva do eleitor, o seu preço. Se o voto do coronel era antes como seu gado, mercadoria que ele exportava, agora também é mercadoria que lhe é vendida em troca de favores, roupa, sapatos, empregos. À medida que as eleições se processam, o mercantilismo externo do voto a que se acostumara o coronel, quando o utilizava em troca de vantagens e mesmo de dinheiro, se comunica internamente dentro do sistema. As vontades, que antes o matuto simplesmente cedia, passam a ser vendidas e trocadas, não sem alguma reação por parte do chefe que assim vê abrirem-se os seus currais eleitorais. E as eleições, nos municípios do coronel, começam a ser “dispendiosas”. O processo eleitoral, com efeito, como que se comercializa em suas duas fases: do coronel para os seus candidatos e, posteriormente, do coronel para com o eleitorado, que se contagia com a mercantilização externa do voto; ou do coronel intermediário no negócio de votos para deputados federais, senadores e governadores e receptáculo, ele próprio, dos votos à deputação estadual, ou a prefeito” (VILAÇA; ALBUQUERQUE, 1978, p. 39-40; grifo meu).

Esse parágrafo revela algo importante na compreensão do fenômeno do “coronelismo”. Os autores demonstram no estudo de caso que fazem nos anos de 1960-70, que os “coronéis” tem de conviver com uma nova realidade social e econômica, entre elas, a mercantilização do voto. O voto que era antes simplesmente “doado pelo matuto” como lealdade ao chefe político, com a liberação progressiva do eleitor passa a possuir “o seu preço”. O voto que não era uma mercadoria, agora passa a ser, gerando a fonte da decadência dos coronéis. Teoricamente o “coronelismo” não utiliza da barganha como fonte de seu sustentáculo, mas sim da fidelidade do eleitor para com o coronel. Este ponto será melhor desenvolvido por Décio Saes.

1.1.4. OUTRO FOCO DE ANÁLISE SOBRE O “CORONELISMO”

Décio SAES (1998, p.85) assim define o “coronelismo”: “De um lado, a base infra-estrutural (dimensão econômica): o proprietário de terras tem um poder econômico sobre o trabalhador a quem cede a posse da terra. De outro lado, o traço superestrutural que lhe corresponde (dimensão ideológica): a dependência pessoal, cujo fundamento é a cessão da posse da terra, exprime-se ideologicamente como obrigação subjetiva de lealdade para com o senhor da terra, ou, num nível mais diretamente político, como fidelidade ao chefe local”. Duas características importantes desta definição: a dimensão econômica, da propriedade da terra e a dimensão ideológica, dependência e fidelidade dos trabalhadores da terra ao “coronel”.

O auto discute, então, o conceito de “coronelismo” apresentado por ele e compara-os com as percepções de Raymundo Faoro e de Maria Isaura P. de Queiroz. E descreve algo importante que deve ser discutido neste trabalho: se realmente os chefes políticos locais, no caso especial deste estudo sobre o município de Itaperuçu, podem ou não serem considerados “coronéis”?

Cito integralmente Saes:

“Relembremos nossa formulação restritiva: a capacidade de manipulação eleitoral do coronel deriva fundamentalmente de relações de dominação e dependência pessoal. Este é o sentido da frase de Raymundo Faoro: “O coronel, antes de ser um líder político, é um líder econômico” (R. Faoro, Os donos do poder, p.622 da 2ª edição – citado por Saes). Outras modalidades de interpretação da capacidade de manipulação eleitoral do coronel encontram-se, entretanto, em nossa literatura sociológica. Na mais importante dessas interpretações (Ver, por exemplo, colocações contidas no importante ensaio de Maria Isaura Pereira de Queiroz, “O coronelismo numa interpretação sociológica”, já citado – citado por D. Saes), a manipulação eleitoral é encarada como o resultado de uma troca de favores entre iguais: o coronel presta favores materiais ao votante em troca do seu voto. Como encarar essa interpretação? Antes de mais nada, parece indubitável que, na prática, o coronel presta freqüentemente favores materiais aos trabalhadores que se encontram em sua esfera de influência. Todavia, o problema está em saber se são esses favores que garantem a vinculação do trabalhador à vontade do coronel. Se se responder afirmativamente à questão, a idéia de imposição do voto ao votante terá sido substituída pela idéia de barganha em torno do voto; e as relações de dominação e dependência pessoal não mais deverão ser consideradas a base social do coronelismo. Essa perspectiva de análise subestima a base pré-capitalista do fenômeno do coronelismo; tal tendência não passou desapercebida a Raymundo Faoro, que adverte: “...(no coronelismo) não se compra o voto, ainda não transformado em objeto comercial, só possível a barganha entre partes livres, racionalmente equivalentes” (Os donos do poder, p.634 da 2ª edição – citado por D. Saes). Não se pode, evidentemente, negar a existência do fenômeno da barganha eleitoral; trata-se, todavia, de um fenômeno político distinto do coronelismo, e que se desenvolve exatamente ali onde as práticas do coronelismo nunca se consolidaram, ou onde o coronelismo já decaiu em razão da desagregação das relações de dominação e dependência pessoal. Tal fenômeno se exprime, basicamente, como uma relação entre o cabo eleitoral e a sua clientela: uma troca de favores econômicos por favores políticos, de vantagens materiais por votos. A distinção entre coronel e cabo eleitoral, estabelecida com clareza por Paulo Singer (Ver Paulo Singer, “Política das classes dominantes” in Octavio Ianni et al., Política e Revolução social no Brasil, Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, p. 71-78 – citado por Décio Saes), não corresponde portanto à distinção entre campo e cidade; nas áreas rurais em processo de transformação (dissolução dos laços fundados na terra), o coronel vai desaparecendo, e pode ser substituído pelo cabo eleitoral” (SAES, 1998, p.94-95).

Para Saes, a capacidade de manipulação eleitoral que detém o “coronel” provém de sua base social que são as relações de dominação e dependência pessoal, devido a laços fundados na propriedade da terra, numa base pré-capitalista, em que o voto ainda não é objeto comercial. A barganha eleitoral é um fenômeno distinto do “coronelismo” e que se desenvolve onde as práticas do “coronelismo” nunca se consolidaram ou quando se desagregou as relações de dominação e dependência pessoal.

O autor delimita o campo de ação do “coronelismo” quando salienta que: “A existência do cabo eleitoral rural não nos deve fazer cair na tentação de, por um jogo de palavras, criarmos o coronelismo urbano: isto é, um coronelismo sem coronel, dotado de uma base social diferente da propriedade da terra, por exemplo, uma fábrica. Essa idéia esvazia e formaliza o conceito de coronelismo, ao abstrair a sua base social específica (relações de produção pré-capitalista no campo); ao mesmo tempo em que interpreta a personalização das relações sociais dentro de uma indústria e o estilo paternalista de direção empresarial (fenômenos extremamente modernos não só pela sua eficácia, como também pela sua concepção) como vestígios da forma de dominação tradicional, característica do campo” (SAES, 1998, p.95-96). Portanto, considerar o fenômeno fora de sua base econômica (o latifúndio com funcionamento pré-capitalista) seria um erro de interpretação.

Sobre a questão da violência, a imposição do voto ao votante pelo “coronel”: “Vê-se, portanto, que o fundamento das práticas do coronelismo não é a violência, abstratamente concebida, exercida pelo coronel sobre os seus dependentes; e sim a dominação pessoal, que não exclui o emprego da violência dentro de certos limites, fixado pela própria necessidade de reprodução da dominação ideológica (de tipo pessoal). Em suma, nem a barganha, nem a violência podem substituir (ou coexistir com) a dominação pessoal como fundamento das práticas do coronelismo” (SAES, 1998, p. 97).

Essa idéia mostra um outro foco de análise do “coronelismo” que é a sua distinção da barganha eleitoral. Pois onde a barganha existe como forma predominante de ação aí o “coronelismo” inexiste ou se desfez. Constata-se que se considerar que o “coronelismo” ainda subsiste, ele teria de estar sustentado na grande propriedade da terra com base pré-capitalista e com agregados totalmente dependentes do senhor da terra. A meu ver, algo inexistente no Brasil. No próprio estudo de Leal se tem explicitamente estas dimensões da base social da grande propriedade da terra e a conseqüência da fidelidade por parte dos trabalhadores para com o coronel, a quem tudo lhe devem. Como Saes adverte seria mesmo um erro pensar o “coronelismo” nos dias atuais. Porém, e esta é a hipótese deste trabalho, evidências importantes no cotidiano do poder local, fazem do tema do “coronelismo” algo presente nessas relações de dominação.

Antes de resolver este problema, outro autor que, também distingue barganha eleitoral de “coronelismo”, é Paulo Singer que assim define o fenômeno:

“O coronel é o nosso político tradicional. Normalmente é um grande fazendeiro. Dentro do latifúndio, o senhor possui autoridade indiscutida e quase ilimitada. É obedecido incondicionalmente por agregados, arrendatários, parceiros e colonos, assim como por capatazes, administradores e também pelos membros de sua própria família. Nenhuma oposição lhe vem de baixo. No plano político ele é o chefe absoluto de sua clã. Só se lhe pode opor um outro coronel, de força e prestígio equivalentes.

“O objetivo de cada coronel é obter favores do governo estadual ou federal; crédito nos bancos oficiais, moratória para suas dívidas, concessão de novas terras ou cargos públicos para si ou para membros da clã.

“Uma das características importantes do coronel é a lealdade à clã política (...) É importante notar que esta lealdade é pessoal, não ideológica. Ela se refere a pessoas, não a princípios. Ela constitui uma emanação do sistema de relações servis, ainda sobreviventes no latifúndio” (SINGER, 1965, p.72-73).

A idéia de Paulo Singer é que o “coronel” é aquele político que possui uma autoridade indiscutida, é obedecido por todos os seus e, portanto, não necessita do uso da barganha para se fazer obedecer, nem da violência. E a ligação entre “coronel” e o governismo estadual é indispensável na compreensão deste fenômeno.

* * *

Acima, foram resumidas duas análises distintas sobre o fenômeno do “coronelismo”. A primeira, que identifica “coronelismo” e barganha eleitoral, e a segunda, que diz não ser possível tal junção.

1.1.5. FIM DO “CORONELISMO”?

Para discutir o fim do fenômeno do “coronelismo”, destaco, entre muitos autores, o artigo de Francisco Pereira de Farias, Clientelismo e Democracia Capitalista: Elementos para uma abordagem alternativa[21], que chega à conclusão de que o “coronelismo”, como sistema político, não existe mais. Há sim a ascensão do clientelismo como prática política dominante.

FARIAS (2000), demonstra os aspectos desta mudança política e as “razões da ascensão do clientelismo” e a queda do “coronelismo”, principalmente através da transformação da estrutura agrária regional; da substituição da grande propriedade agrária pré-capitalista (absorvedora de um enorme contingente de trabalhadores dependentes ao dono da terra) pelas formas de propriedade capitalista, mais modernas, com menos trabalhadores; a modernização dos latifúndios; os projetos governamentais de apoio à pequena produção, isto é, agricultura familiar, projetos de empréstimo de dinheiro a pequenos agricultores, diretamente do governo federal; a urbanização X espaço rural (característica do “coronelismo”); a liberdade do mercado de trabalho X sujeição pré-capitalista do campo; as políticas comunitárias e clientelismo estatal, definido como “a modalidade de clientelismo na qual os ‘políticos de profissão’ distribuem recursos ‘públicos’ e favores ligados às instituições governamentais, em troca de sustento eleitoral’” (CACIAGLI, 1982: 326, citado por FARIAS). “Políticos de profissão” destinam recursos diretamente a comunidades e líderes comunitários em troca do voto, e não mais a “coronéis”.

Para compreender melhor os seus argumentos, elaboro um quadro síntese de como se dá esta transição do “coronelismo” para o clientelismo, em que as características da primeira coluna não mais subsistem nas práticas político-eleitorais de uma subregião do Piauí, local em que Farias faz seu estudo empírico:

Quadro 1 – Características do “coronelismo” e “clientelismo”

|CORONELISMO |CLIENTELISMO |

|Voto de cabresto: votar no “coronel” e nos candidatos apoiados por|Voto livre: Os eleitores podem desvincular o voto no candidato a |

|ele. |prefeito das opções partidárias desse candidato em outros níveis da |

|Há aqui uma fidelidade ao coronel que implica a vinculação das |eleição. Este voto se traduz, na maioria dos casos, no voto de |

|escolhas nos vários níveis da eleição. |barganha, que assume uma forma sofisticada através do associativismo |

| |(Associações locais dominadas por Cabos eleitorais). |

|Currais eleitorais |Multiplicidade de Partidos |

|governo x oposição; caráter não concorrencial |Pluralismo concorrencial |

|Local de votação: zona urbana |Local de votação: vários locais |

|Trabalhadores (eleitores) dependiam da condução, da roupa, da |Maior ação de cabos eleitorais, locais de votação espalhados por |

|alimentação geralmente oferecida pelos coronéis. As eleições como |todas as localidades do Brasil. |

|festas. E ainda havia o ‘bico de pena’ = fraudes eleitorais. | |

|Políticas Sociais |Constituição de 1988 |

|Municípios pobres e dependentes. O Coronel trazia recursos e fazia|Municípios mais autônomos, mais ricos. Prefeitura realiza as obras |

|obras. Uma associação entre os feitos públicos como obras do |para garantir o apoio de seus eleitores. |

|Coronel. | |

|Prefeituras pouco técnicas |Prefeituras mais técnicas |

|Empregos indicados pelo Coronel (filhotismo). Obras do Coronel. |Concurso público; obras feitas pela administração da Prefeitura |

|Favoritismo |Crescimento dos Partidos de Esquerda |

|Recursos estatais eram propriedades da facção governante, dos |Cabos eleitorais identificados com a política comunitária; a esquerda|

|Coronéis |fiscalizando as obras da Prefeitura. |

Fonte: FARIAS, (2000).

“Procuramos ilustrar o enfoque sobre o clientelismo com o estudo das práticas político-eleitorais em uma subregião do Piauí, cujo processo de mudança política é representativo do que vem ocorrendo em grande parte do Nordeste rural brasileiro. Chegamos à conclusão básica de que, na área pesquisada, impôs-se, na década de 1990, a desagregação do coronelismo (voto de cabresto, confusão entre as esferas pública e privada) e a sua substituição pelo clientelismo (voto de barganha, distinção normativa entre o público e o privado)” (FARIAS, 2000, p.53).

Fica claro, no estudo do autor, os aspectos da mudança política, com o fim do “coronelismo” e ascensão do clientelismo.

Por fim, para buscar delimitar esta discussão teórica, um artigo de José Murilo de CARVALHO (1997, p.229-250) sintetiza os conceitos: “coronelismo”, clientelismo, mandonismo.

O “coronelismo” é um sistema político, uma complexa rede de relações que vai desde o coronel até o presidente da República, envolvendo compromissos recíprocos. É historicamente datado: pertence à Primeira República Brasileira (1889-1930), com um sistema eleitoral específico e à decadência econômica dos fazendeiros. “Nessa concepção, o coronelismo é, então, um sistema político nacional, baseado em barganhas entre o governo e os coronéis”. José Murilo decreta o fim do “coronelismo” já em 1930.

O mandonismo “refere-se à existência local de estruturas oligárquicas e personalizadas de poder. O mandão, o potentato, o chefe, ou mesmo o coronel como indivíduo, é aquele que, em função do controle de algum recurso estratégico, em geral a posse da terra, exerce sobre a população um domínio pessoal e arbitrário que a impede de ter livre acesso ao mercado e à sociedade política” (CARVALHO, 1997, p.231-232).

E, por fim, o “clientelismo”: “De modo geral, indica um tipo de relação entre atores políticos que envolve concessão de benefícios públicos, na forma de empregos, benefícios fiscais, isenções, em troca de apoio político, sobretudo na forma de voto” (CARVALHO, 1997, p.233).

Carvalho, assim como Saes, diz que não se deve confundir clientelismo (barganha eleitoral) com “coronelismo”.

“Os autores que vêem coronelismo no meio urbano e em fases recentes da história do país estão falando simplesmente de clientelismo. As relações clientelísticas, nesse caso, dispensam a presença do coronel, pois ela se dá entre o governo, ou políticos, e setores pobres da população. Deputados trocam votos por empregos e serviços públicos que conseguem graças à sua capacidade de influir sobre o Poder Executivo. Nesse sentido, é possível mesmo dizer que o clientelismo se ampliou com o fim do “coronelismo” e que ele aumentou com o decréscimo do mandonismo. À medida que os chefes políticos locais perdem a capacidade de controlar os votos da população, eles deixam de ser parceiros interessantes para o governo, que passa a tratar com os eleitores, transferindo para estes a relação clientelista” (CARVALHO, 1997, p.233).

Paulo Singer ao descrever o cabo eleitoral, em substituição ao “coronel”, e posteriormente Francisco Farias ao aprofundar o tema, demonstram que até mesmo políticos estaduais e federais apoiam-se não mais em coronéis, mas em pequenos líderes que controlam algumas centenas de votos. “O deputado federal é, assim um dos elos superiores de uma rede de clientela, que passa por níveis intermediários até chegar ao cabo eleitoral e sua clientela local. Portanto, a política de clientela torna-se, em última análise, uma das formas de inserção dos capitalistas no campo da ação política” (FARIAS, 1999, p.4).

Outro fator que diferencia “coronelismo” de clientelismo é o emprego público. Na visão de José Murilo, no “coronelismo”, definido por Leal, o controle do cargo público é mais importante como instrumento de dominação do que como empreguismo. O emprego público adquire importância em si, como fonte de renda, exatamente quando o clientelismo cresce e decresce o “coronelismo”.

* * *

Enfim, o que tentei compreender é o significado do fenômeno “coronelismo”. E, para tanto, foi preciso analisar as interpretações dadas por diversos autores a esse problema. Após alcançar este objetivo, as perguntas que se impõem são: Persiste este fenômeno nos nossos dias? Pode-se identificar políticos atuais, como já faz o senso comum, como “coronéis”?

1.1.6. O ESTUDO DO CLIENTELISMO

Este trabalho também busca entender o conceito de “clientelismo”, através de outros autores. Inicio por Edson Nunes que identifica este tipo de fenômeno político como uma estrutura que atravessa a história brasileira:

“O clientelismo é um sistema de controle do fluxo de recursos materiais e de intermediações de interesses, no qual não há número fixo ou organizado de unidades constitutivas. As unidades constitutivas do clientelismo são agrupamentos, pirâmides ou redes baseados em relações pessoais que repousam em troca generalizada. As unidades clientelistas disputam freqüentemente o controle do fluxo de recursos dentro de um determinado território. A participação em redes clientelistas não está codificada em nenhum tipo de regulamento formal; os arranjos hierárquicos no interior das redes estão baseados em consentimento individual e não gozam de respaldo jurídico.

“Ao contrário do corporativismo, que é baseado em códigos formais legalizados e semi-universais, o clientelismo se baseia numa gramática de relações entre indivíduos, que é informal, não legalmente compulsória e não-legalizada” (NUNES, 1999, p.40-41).

A definição acima remete a um sistema de controle assimétrico, com redes clientelistas informais, sem regulamento, em que a amizade, as relações pessoais, o “jeitinho” são elementos importantes que a compõe.

Marcos Otávio BEZERRA (1999, p.16) destaca que os estudos sobre patronagem e clientelismo são submetidos a duas linhas de interpretação: 1ª) Ponto de vista das teorias modernizantes, em que estas relações são interpretadas como “tradicionais” e em vias de desaparecer com o surgimento de instituições políticas “modernas”. 2ª) São consideradas relações de complemento, adendum, que aparecem para cobrir lacunas (gaps) e falhas destas instituições políticas, e que também tendem a desaparecer. O autor, porém, analisa da seguinte forma estes conceitos: “A consideração da patronagem e do clientelismo como relações dotadas de uma certa autonomia e racionalidade é um passo importante para a análise aqui desenvolvida, uma vez que abre a possibilidade para se pensar nas trocas de serviços, favores, apoios, votos e lealdades entre parlamentares, lideranças políticas locais e autoridades governamentais não como sobrevivência de relações pretéritas ou mecanismos que cobre certas falhas, mas como relações constitutivas do universo político”.

Citando o autor:

“Como sugerido acima, estas análises têm dado destaque à idéia de que o clientelismo implica troca de benefícios públicos por apoio político e votos. Se o cálculo político-eleitoral é um dos elementos desta relação, ele, entretanto, não é o único presente. O fato da troca de benefícios e apoio (ou votos) constituir um momento de uma relação mais ampla entre os atores envolvidos ou instituir obrigações morais entre eles não são aspectos considerados. De modo geral, o que parece evidente é que predomina uma perspectiva, reducionista a meu ver, que tende a mercantilizar estas trocas. Elas são tratadas de modo mecânico, utilitarista e tornam-se uma espécie de toma-lá-da-cá. Desse modo, predomina a fórmula: benefícios públicos são retribuídos com votos.

“Neste caso, a dimensão propriamente sociológica dessas trocas é deixada de lado. Assim, as mediações necessárias para que os benefícios sejam concedidos e os votos obtidos não chegam a ser examinados. Entre outros aspectos, não é levado em conta o intervalo de tempo que existe entre a concessão dos favores ou benefício público e os votos, por conseguinte, as práticas – como as que são responsáveis pela demonstração de interesse na continuidade da relação (correspondências, pequenos favores, visitas etc.) – que se interpõem entre estes atos. Some-se a isso o fato de que ao se dar ênfase à troca de benefícios públicos por apoio e voto, ignora-se que a mesma ocorre num contexto complexo onde estão em jogo a busca de prestígio, poder e o cumprimento de obrigações formais e morais” (BEZERRA, 1999, p.16-17; o grifo meu).

Ao estudar as práticas políticas em Itaperuçu, procuro, assim como Bezerra alerta, salientar que é necessário não reduzir o clientelismo como simplesmente “benefícios públicos em troca de votos”. Mas observar as mediações, entre os políticos com os seus eleitores, que levam a esta mercantilização. São relações amplas entre os atores envolvidos que geram obrigações morais em que o voto é apenas uma conseqüência. Como afirma o autor, são as relações clientelistas mantidas por políticos, ao longo de toda sua carreira, que fazem instituir estas obrigações morais no eleitor para com este chefe político, da mesma forma que na República Velha o eleitor votava no candidato do “coronel” porque vivia em suas terras, lhe “devia a vida”. Hoje também, apesar da liberdade do voto, o chefe político local cria junto aos eleitores laços de dependência pessoal que devem ser analisados. Tendo em vista estes aspectos, o estudo de caso de Itaperuçu – Paraná (1992-2002), irá ajudar a compreender melhor o funcionamento principalmente destes pequenos micro-sistemas políticos.

Quadro 2 – Resumo dos argumentos dos autores citados

|Autor |Coronelismo |Clientelismo |

|Victor Nunes Leal | A essência do compromisso coronelista seria | |

| |o apoio dos chefes locais aos candidatos do | |

| |oficialismo nas eleições e vice-versa. (LEAL,| |

| |1997:70) | |

|Maria de Lourdes M. Janotti |Sistema em que o coronel exerce poder sobre | |

| |parcelas do eleitorado, objetivando a escolha| |

| |de candidatos por eles indicados | |

| |(JANOTTI, 1981:7). | |

|Eul-Soo Pang |“...é um exercício do poder monopolizante por| |

| |um coronel cuja legitimidade e aceitação se | |

| |baseiam em seu status...” (PANG, 1978:21) | |

|Maria Isaura P. de Queiroz |A estrutura coronelística é uma estrutura de | |

| |clientela política, do coronel para com seus | |

| |agregados e dos candidatos do oficialismo | |

| |para com o coronel. (QUEIROZ, 1997:157) | |

|Marcos V. Vilaça e R. Cavalcanti Albuquerque |Centrado na pessoa do coronel como senhor de |Principalmente “o voto mercadoria vai operar |

| |terras, chefe de homens e dono de decisões. |o declínio político do coronel. Valendo um |

| |Vive num sistema de fazenda mais ou menos |preço, se impessoaliza; é trocado pelo maior |

| |autárquicas. E que cede seus votos a |valor” (Ibid., p. 41) |

| |deputados, senadores... (VILAÇA; ALBUQUERQUE,| |

| |1978: 17,24,37) | |

|Décio Saes |“Um conjunto de práticas político-eleitorais |Para o autor a existência da barganha |

| |que participam... da dupla função do Estado |eleitoral contradiz a base sócio-econômica do|

| |burguês: desorganização das classes |“coronelismo” que são as relações de |

| |trabalhadoras e unificação da classe |dominação e dependência pessoal. (Ibid. p.95)|

| |dominante sob o comando hegemônico de uma de | |

| |suas funções” (SAES, citado por DANTAS, | |

| |1987:14 | |

|Paulo Singer |“...o objetivo de cada coronel é obter |“O político de clientela.... não passa de um |

| |favores do governo estadual ou federal... |cabo eleitoral suficientemente poderoso para |

| |lealdade à clã política... grande |conquistar algum cargo eletivo, embora, para |

| |fazendeiro... autoridade indiscutida e quase |tanto, ele possa contar com a ajuda de outros|

| |ilimitada...” (SINGER, 1967: 72) |cabos eleitorais” (Ibid, p. 77). |

|Ibarê Dantas |“Uma forma de representação política exercida| |

| |por determinados proprietários sobre os | |

| |trabalhadores rurais, ao tempo em que se | |

| |impõem como intermediário entre as massas do | |

| |campo e as oligarquias estaduais, tendo como | |

| |objetivo a manutenção da estrutura de | |

| |dominação. (DANTAS, 1987:18) | |

|Francisco Pereira de Farias |Argumento análogo ao de Saes (1998). “...é um|Os fundamentos do clientelismo devem ser |

| |fenômeno híbrido: em parte pré-burgues |buscados “na estrutura social particular que |

| |(manifestação, no plano político, dos laços |produz uma pobreza específica” numa relação |

| |de servilismo do produtor para com o dono dos|produzida por cabos eleitorais e pelo |

| |meios de produção), em parte burguês |clientelismo estatal. (Ibd., p. 50). |

| |(pressupõe a extensão do direito político a | |

| |todos os membros da coletividade) | |

| |(FARIAS,2000:51). | |

|José Murilo de Carvalho |Uma rede de relações complexa que vai do |Relação entre atores políticos que envolve |

| |âmbito municipal (coronel) até governo |concessão de benefícios públicos em troca de |

| |estadual e federal (CARVALHO, 1997:231) |apoio político (voto) (Ibid., p. 233). |

|Edson Nunes | |Um sistema político em que há desigualdade |

| | |hierárquica e financeira por parte dos |

| | |envolvidos e que acontece de maneira |

| | |informal. |

|Marcos Otávio Bezerra | |Relação dotada de certa autonomia que envolve|

| | |um sistema complexo de obrigações morais |

| | |entre os atores envolvidos. |

Como conclusão, fica clara a distinção dos dois fenômenos políticos. Porque a base social do coronel fundamenta-se, muito mais na relação de dominação, que gera dependência pessoal (SAES, 1998), do que na barganha eleitoral (QUEIROZ, 1997). Quando a barganha é utilizada, significa, principalmente, a desestruturação do “coronelismo”. Isto tudo num sistema rural, latifundiário, base econômica do “coronelismo”. A interpretação de Saes, nesse sentido parece ser bem mais coerente devido a inúmeros outros estudos que demonstram a maior importância da dominação como característica própria do “coronelismo”, do que da barganha. Porém, o que me chamou a atenção, dito no início deste trabalho, são as evidências políticas da Primeira República, descritas por Leal (1997) como características coronelistas, semelhantes ao processo político atual em Itaperuçu. Formando a hipótese desse trabalho, de que deputados estadual e federal, de preferência governistas, sustentam esse estilo de política, recebendo em troca, votos. Como exemplo, mesmo benefícios públicos de ordem estadual e/ou federal são manipulados pelo chefe político local[22] e posteriormente revertidos em votos aos candidatos por ele apoiado.

O próximo capítulo buscará entender como se estrutura os grupos políticos em Itaperuçu. Relatando um pouco da história do município, a economia e características em geral, como os resultados eleitorais municipais, o posicionamento dos vereadores, poderá se ter uma noção de como a política é dominada por grupos de indivíduos liderados por chefes políticos que, assim como advertia Leal, tornam-se chefes supremos da localidade.

CAPÍTULO II – O MUNICÍPIO DE ITAPERUÇU – ESTADO DO PARANÁ

2.1. UM POUCO DA HISTÓRIA DO MUNICÍPIO E SUA EMANCIPAÇÃO POLÍTICA

O município de Itaperuçu está localizado a 37 km da Capital paranaense, Curitiba, fazendo parte de sua região metropolitana. Pelo censo de 2000, contava com uma população de 19.134 habitantes, sendo 3.025 habitantes da área rural. Itaperuçu foi criado pela Lei Estadual n.º 9.437 de 9 de novembro de 1990 (A data de comemoração municipal é 10 de dezembro), sancionada pelo governador Álvaro Dias, desmembrando-se do município de Rio Branco do Sul, após aprovação por plebiscito pela comunidade local. É instalada sua sede municipal em 1 de janeiro de 1993 (FERREIRA, 1996, p.355-6).

Em Itaperuçu, a princípio, o processo de emancipação deste distrito de Rio Branco do Sul se deu por iniciativa do deputado estadual Aníbal Khury e pelo então vereador de Rio Branco do Sul, Manoel Joekel, Presidente da Câmara, residente em Itaperuçu e único vereador do distrito na legislatura 1988-1991. Na década de 1990, inúmeros municípios surgiram no Paraná pela influência do Deputado Aníbal Khury. Após a aprovação por plebiscito realizado na localidade, o município foi criado.

Dados sobre o histórico do município:

“É antiga a movimentação no território do atual município de Itaperuçu, sendo contemporânea ao surgimento de Nossa Senhora do Amparo de Votuverava, no final do século XVII.

Os primeiros proprietários de terras, em áreas que compõe o território do município, foram Joaquim Cândido de Oliveira e as famílias Pedroso de Moraes, Furquim, Machado Cruz.

Em 1 de março de 1909, foi inaugurada a estação ferroviária de Itaperuçu. Com a chegada dos trilhos de aço do ramal ferroviário, um novo alento foi dado à comunidade.

Domingos Stocheiro foi o primeiro comerciante a se estabelecer na localidade, explorava o movimento do caminho das tropas que destinavam-se ao Açungui. Stocheiro veio da Itália no século XIX, mas permaneceu inicialmente em uma colônia agrícola no município de Morretes, posteriormente foi para Santa Felicidade e finalmente Itaperuçu.

Muitas famílias de origem italiana se fixaram na região, à procura de mais áreas, para desenvolverem atividades agrícolas e pastoris, especialmente a criação de mulas. Geralmente estas pessoas vinham de assentamentos específicos, especialmente escolhido pelo Departamento de Imigração do Estado. Desta fase, destacam-se as famílias Benatto, vinda de Santa Felicidade, Parolin e Stresser, vindas da Água Verde, e a família Johnsson, (e Cavassin)( que veio de Colombo.

A comunidade de Itaperuçu era freqüentemente visitada por mascates (comerciantes ambulantes de origem árabe), e muitos destes, gostando da região, e optavam por se estabelecer comercialmente na localidade. Tomaram esta iniciativa os Abdalla e Abrão. Jorge Abrão era antigo morador do Atuba, que mascateava em Itaperuçu.

Em 1942 se fixou em Itaperuçu, tendo comprado suas propriedades da família Soffiatti. Mais tarde passou a trabalhar com extração mineral. Gabriel Abdalla tornou-se o proprietário de terras do centro da vila.

Pela riqueza de recursos naturais da localidade, a década de quarenta registrou a vinda de inúmeras famílias. Estas pessoas dedicavam-se à extração mineral e preparação da cal. A construção dos fornos para o fabrico da cal, trouxe a família Bini. Na década de cinqüenta, as indústrias de cimento se estabeleceram na região. Em Itaperuçu fixou-se para a exploração do solo, a Companhia de Cimento Itaú, em 1972.

A primeira capela da povoação foi construída pelo pioneiro Ângelo Benatto, exatamente no local onde hoje está assentada a Igreja Matriz, que foi inaugurada em 1975” (FERREIRA, 1996, p.355). [23]

Itaperuçu pertenceu ao município de Rio Branco do Sul até 1993. O poder era exercido principalmente por famílias que moravam na sede de Rio Branco do Sul. Da história política de Rio Branco do Sul, consolidado município em 1947 desmembrando-se do município de Cerro Azul, poucos foram os moradores de Itaperuçu que chegaram a um cargo eletivo público. Não houve nenhum prefeito que morasse em Itaperuçu, e apenas três vereadores itaperuçuenses até 1992, Benedito Pedroso de Moraes (irmão do Prefeito José Pedroso de Moraes na legislatura 1969-1972), Zacarias Stresser e Manoel Joekel.

Através da leitura sobre a história de Rio Branco do Sul (FERREIRA, 1996, p.578-580; CONHEÇA RIO BRANCO DO SUL, 2001), constata-se que muitas das primeiras famílias de Itaperuçu eram descendentes de riobranquenses (como as famílias Pedroso de Moraes, Furquim, Stresser). Posteriormente, com famílias vindas de municípios vizinhos como Colombo e Curitiba, passou a se ter uma movimentação maior e participação política mais consistente, como é o caso de Manoel Joekel que chega a Presidente da Câmara na legislatura 1989-1992.

Itaperuçu, apesar de ter pertencido a Rio Branco do Sul, maior produtor de cimento na Região Sul do Brasil[24], ao que se percebe, sempre foi uma localidade considerada de baixo nível de renda e de economia rural.

2.2. ECONOMIA

A economia de Itaperuçu gira em torno do extrativismo vegetal: madeiras bracatinga e pinus, e de frutas como a ponkan; do extrativismo mineral: pedra para fazer a cal e cimento; e da agricultura. Portanto, predominância do setor primário da economia.

No interior, principalmente, existem reservas de árvores nativas, como a bracatinga, que é muito usada pelos fornos de produção de cal. Percebe-se que diariamente caminhões trazem a madeira cortada para fornos de cal principalmente de Almirante Tamandaré. Possui também grandes plantações de Pinheiros (Araucária) e reflorestamento de Pinus, muito usado para móveis e tábuas para construção civil e fornos de cal. No centro de Itaperuçu, no ano 2002, existiam mais de vinte serrarias que trabalhavam com a madeira do Pinus.

A agricultura também é importante na região. Os principais produtos cultivados são o feijão, milho, batata e ortifrutigrangeiros. Segundo dados da Emater, são ao todo 800 produtores rurais que tem como principais atividades o cultivo de milho e feijão para subsistência e cítricos para comercialização, constituindo a principal fonte de renda das propriedades. São trezentos produtores de cítricos (tangerina e laranja). A colheita estimada para o ano de 2002 foi de 22 mil toneladas, cerca de um milhão de caixas, muitas separadas para a exportação[25].

Itaperuçu conta com a fábrica de cimento Itaú, instalada em 1972, e que foi vendida ao Grupo Votorantim no final dos anos 80. A principal fábrica da Votorantim encontra-se em Rio Branco do Sul, e a fábrica de Itaperuçu funciona parcialmente, isto é, foi quase fechada após sua venda, e nos últimos anos voltaram a pôr em funcionamento os seus moinhos e o forno para produzir o cimento. O forno tem a capacidade para produzir 1.100 toneladas/dia de clínquer, matéria-prima para o cimento (CONHEÇA RIO BRANCO DO SUL, 2001, p.9).

Os fornos de cal, citados no início do capítulo, que motivaram com que algumas famílias viessem a Itaperuçu, não existem mais. Encontram-se ainda os “esqueletos” destes fornos, mas estão todos desativados. Os que persistem estão em Rio Branco do Sul, Almirante Tamandaré e Colombo.

A sede do município está numa região rodeada de morros. Entre eles está o morro do Mossunguê, o mais alto de todos da região metropolitana com 1.150 metros do nível do mar. O município é formado por um complexo de morros e serras, as principais são a Serra da Betara e Serra do Vuturuvu, e é cortado por alguns rios: Rio Açungui, Rio Tacaniça, Rio Capivara, Rio Ribeirinha, Rio Açunguizinho.

A maior opção de empregos no local ainda é a Prefeitura, são aproximadamente 400 a 500 funcionários municipais. Em média, as faixas salariais baseiam-se no salário mínimo (R$ 200,00 – duzentos reais) dado a grande maioria dos servidores municipais. Os professores municipais ganham em média R$ 250,00 (duzentos e cinqüenta reais), os diretores destas escolas municipais ganham em média R$ 400,00 (quatrocentos reais). A grande maioria dos funcionários municipais estão nesta faixa salarial. Os funcionários de confiança recebem ordenados por volta de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), e são o chefe de gabinete, o tesoureiro, o advogado; bem como os vereadores. Certamente, a Prefeitura detém uma grande porcentagem dos empregos, em relação ao total de empregos existentes no município, fazendo com que boa parte da economia das famílias gire em torno dos salários da Prefeitura.

Detalhe importante em relação ao empreguismo é de que a cada nova gestão, os prefeitos nomeiam novos funcionários públicos, muitas vezes demitindo os antigos. O órgão informativo do município de Itaperuçu, Jornal Novo Horizonte[26], publicou uma lista com 84 decretos de nomeação para cargos de confiança da administração 2001-2004. Mas sabe-se que existem, além destes editados no Jornal, outras nomeações como: guardiões de escola, eletricistas, operadores de máquinas, motoristas de ambulância, professores primários, secretários, etc. A cada novo mandato abrem concursos públicos. A edição n.º 66 (Fevereiro/2001), deste mesmo jornal, também publicou a anulação do concurso público n.º 001/99 de 11/12/1999, realizado pelo então prefeito Gentil Paske no final de seu mandato, tornando sem efeito todos os seus atos administrativos referentes ao concurso e os contratos dos servidores relacionados contratados. Com esta anulação, recolhe outros funcionários de acordo com a lei n.º 148/2001, editada no mesmo jornal e com novo concurso público[27].

O município também pode ser denominado de cidade “dormitório”, afinal muitos de seus munícipes apenas dormem em suas casas e passam a maior parte de seu tempo produtivo (emprego, estudo, lazer, compras) em Curitiba. Este dado pode ser inferido a partir dos inúmeros carros e ônibus que saem de Itaperuçu com destino a Curitiba. Os ônibus começam a levar os passageiros a partir das 4:50 hs da madrugada até 9:06 hs somando ao todo 16 viagens. Após este horário os ônibus partem de hora em hora. Existe ainda outro itinerário: Itaperuçu – Terminal Almirante Tamandaré, com ligação a Curitiba pelo sistema integrado, com ônibus a partir das 4:36 hs até 8:50 hs, somando ao todo 19 saídas de ônibus. Após este horário, o ônibus é de hora em hora também. Contando somente o horário de pico pela manhã e que cada veículo transporte 45 passageiros sentados e que todos os ônibus vão lotados, são aproximadamente 1500 pessoas que diariamente se deslocam para Curitiba. Destes, muitos são estudantes, muitos vão a passeio, mas a grande maioria sai para o seu dia de trabalho. A empresa de ônibus que presta este serviço é a Viação Sul.

Outros pontos importantes que se destacam: a presença de comércios em geral, de igrejas, sendo a grande maioria dos munícipes da religião católica. Como foi dito, a Igreja de São Pedro foi inaugurada em 1975, logo depois foi construída a casa do vigário paroquial, pois esta capela pertencia a Paróquia de Nossa Senhora do Amparo de Rio Branco do Sul. Somente com a emancipação do município é que Itaperuçu torna-se Paróquia e a Capela de São Pedro, Matriz, no dia 29 de janeiro de 1996, com a vinda do primeiro Pároco, Padre Luiz Fernandes de Souza Filho. Existem também igrejas protestantes que somam mais de 20 denominações diferentes na sede do município. É notável também o grande número de bares e a intensidade de bebidas alcoólicas em todo o município. O futebol também aparece com destaque, os times que se formam para campeonatos realizados por todo o município. Existem cinco escolas estaduais e muitas escolas municipais. Três festas são as mais importantes em Itaperuçu: a de São Pedro (29 de junho), a da emancipação do município (10 de dezembro) e a festa da Ponkan (junho)[28].

2.3. GRUPOS POLÍTICOS EM ITAPERUÇU

Existe no município uma dualidade política. Quando as pessoas se referem à política de Itaperuçu logo a figura de Manoel Joekel e Gentil Paske aparece. Fica clara a situação: são eles que comandam politicamente o município e ambos são “inimigos”, isto é, cada qual tem seu grupo e seus aliados.

Marcos LANNA (1995) destaca que a oposição entre dois grupos, “é fundamental nos estados nordestinos” (cf. LEWIN, 1987 para o caso da Paraíba, citado por LANNA, 1995, p.87), e como isso se dá também no nível local, “nos municípios assim como nos distritos, onde facções concorrentes são formadas a partir das alianças feitas no nível estadual (e vice-versa). Isto é, os grupos políticos locais definem-se em relação às posições assumidas por ‘políticos graúdos’, como deputados”. E ainda, “por outro lado, ‘facções surgem com a criação de município’, o que deve ser ‘correlacionado com a emergência de um coronel, que age ao mesmo tempo como líder civil e empresário’”(GROSS, 1973, citado por LANNA, 1995).

Lanna descreve o processo de emancipação política de São Bento, município pequeno do noroeste do estado do Rio Grande do Norte, litoral, com aproximadamente 10 mil habitantes. Destaco este estudo de Lanna devido a possibilidade comparativa entre um município nordestino e outro do sul do Brasil. Por exemplo, o autor cita como um determinado líder toma a frente do processo emancipatório, torna-se o líder-fundador, coordena as primeiras transformações da cidade, elege-se o primeiro prefeito e mantém sua liderança contra os adversários que começam a se formar. Processo idêntico se deu em Itaperuçu. É uma ação individual, que se utiliza do plebiscito como forma de legitimar o ato político. Em São Bento, o chefe político local chamava-se José Olympio, descrito como “raposa” política devido a sua habilidade no trato com as pessoas, com a lei e com os políticos estaduais. Possuía grande capacidade em obter votos e conseguir fidelidade da população, tendo localmente prestígio ao exibir a “força de sua influência e conexões”. O autor cita que J.O. era então “cabo eleitoral do governador Sílvio Pedrosa e do deputado Dinarte Mariz” e ao mesmo tempo conseguia fazer com que os seus eleitores fossem cabos eleitorais dele. “Dona Glória (funcionária pública do correio de São Bento, nomeada por J.O.) agia da mesma forma em relação a J.O., ainda que não tivesse plena consciência desse fato” (LANNA, 1995, p.89-90). A autoridade do chefe local é construída por meio de um tráfico de influências, criado a partir de trocas. Porém, Lanna não considera J.O. um coronel, mas sim um patrão. Esta descrição assemelha-se muito ao líder-fundador de Itaperuçu. E é importante para entender o processo de emancipação deste município. O líder-fundador foi Manoel Joekel, “raposa” política no seu trato com as pessoas e as leis, cabo eleitoral do deputado estadual Aníbal Khury, que por sua vez lhe apoiava na administração local, dando-lhe carta branca. Joekel consegue mobilizar pessoas da localidade para serem seus cabos eleitorais. A sua autoridade vai sendo construída, também, através deste tráfico de influências, criado a partir de trocas (favores). A oposição que surgiu foi encabeçada por Gentil Paske de Faria.

Os resultados eleitorais das eleições majoritárias em Itaperuçu, mostram os personagens políticos do município e seu desempenho eleitoral e conseqüentemente os grupos políticos que se formam em torno desses líderes.

Tabela 1 – Eleições Majoritárias de 1992 - Itaperuçu

|Candidatos |Votos |% votos válidos |

|PTB – Manoel Joekel |2.349 |35,72% |

|PMDB – Gentil Paske de Faria |1.853 |28,18% |

|PSDB – Benedito Pedroso de Moraes |1.722 |26,19% |

|PTR – José Ribeiro Neto |111 |1,69% |

|Votos Nominais |6.835 |91,77% |

|Votos Brancos |541 |8,23% |

|Total de votos válidos |6.576 | |

|Eleitorado |7.644 | |

Fonte: Tribunal Regional Eleitoral / PR

Na primeira eleição de Itaperuçu venceu o líder fundador Manoel Joekel e, em segundo lugar, Gentil Paske de Faria formará o grupo opositor ao líder fundador.

Tabela 2 – Eleições Majoritárias de 1996 - Itaperuçu

|Candidatos |Votos |% votos válidos |

|PSDB – Gentil Paske de Faria |4.995 |50,64% |

|PDT – José de Castro França |4.735 |48,00% |

|PSC – Darcy André Faria |134 |1,36% |

|Votos Nominais |9.864 |93,60% |

|Votos Brancos |369 |3,50% |

|Votos Nulos |306 |2,60% |

|Eleitorado |10.539 | |

Fonte: Tribunal Regional Eleitoral / PR

Nesse pleito, vigorando a lei da impossibilidade de reeleição, Manoel Joekel apoia José de Castro França, que perde por apenas 260 votos para Gentil Paske de Faria, que como prefeito, irá consolidar sua posição de liderança política local.

Tabela 3 – Eleições Majoritárias de 2000 - Itaperuçu

|Candidatos |Votos |% votos válidos |

|PMDB – Manoel Joekel |4.073 |36,01% |

|PSDB – Gentil Paske de Faria |3.963 |35,03% |

|PSC – Bento Ilceu Chimelli Junior |3.276 |28,96% |

|Total de votos válidos |11.312 |100,00% |

|Nulos |904 | |

|Brancos |202 | |

|Total de votos apurados |12.418 | |

Fonte: Tribunal Regional Eleitoral / PR

Na terceira eleição Manoel Joekel volta a vencer apesar de ser por uma diferença mínima o seu opositor. Mas quem assume a prefeitura é sua esposa, Rosa Chevônica Joekel. Nesta eleição surge Bento Ilceu Chimelli Júnior, filho do ex-prefeito de Rio Branco do Sul que obteve uma porcentagem significativa de votos.

Destaco agora, com mais detalhes, quem são esses personagens políticos de Itaperuçu-PR.

2.3.1. Grupo Político I - MANOEL JOEKEL

Manoel Joekel, morador de Itaperuçu, empresário madeireiro, é um político de tradição na região. Foi eleito como vereador pelo Município de Rio Branco do Sul para as legislaturas 1983-1987 e reeleito em 1988-1991. Líder fundador do processo de emancipação de Itaperuçu em 1990, quando era o Presidente da Câmara de Vereadores deste município. Primeiro Prefeito de Itaperuçu em 1992. Nas eleições de 2000 elegeu sua esposa Rosa Chevônica Joekel prefeita e seu filho José João Joekel vereador e presidente da Câmara Municipal de Itaperuçu. Outro fato é a presença de seu sobrinho vereador Josmar Ezekiel Joekel Vaz, na legislatura 1993-1996, e da cunhada de Manoel Joekel, Aracy Sabadin Vaz, eleita vereadora para o período de 2000-2004, mãe de Josmar E. Joekel Vaz.

Em 1996 Joekel não se candidatou, pois não existia a possibilidade de reeleição. Indicou a sua sucessão José de Castro França (“José Saruva”), que em 1988 havia sido candidato a vereador por Rio Branco do Sul junto com Manoel Joekel, tendo obtido 374 votos pelo PL, mas não se elegeu. Nesta eleição (1996), tendo José Saruva como candidato ao pleito majoritário, o grupo de Manoel Joekel perdeu por apenas 260 votos o controle da Prefeitura para Gentil Paske[29].

Nas eleições majoritárias de 2000, Manoel Joekel, renunciou dias antes da eleição em favor de sua esposa Rosa Chevônica Joekel (PSL). Na Urna Eletrônica, porém, fica a foto de Manoel Joekel, e dizem que muitos votaram nele sem saber que era sua mulher a verdadeira candidata. O candidato a vice-prefeito de sua chapa no ano 2000, será Benedito Pedroso de Moraes, ex-vereador de Rio Branco do Sul nas legislaturas 1969-1972, 1978-1982, 1983-1987 e candidato a prefeito de Itaperuçu em 1992.

FAMÍLIA JOEKEL

É uma família tradicional em Itaperuçu, que acredito por informações dos mais velhos da localidade, chegaram à região por volta da metade do século XX. Família de agricultores, assim como a família de origem polonesa dos Chevônica da sua esposa.

Manoel Joekel sempre esteve ligado à política, bem como sua esposa e seus filhos. A esposa, Rosa Chevônica Joekel, no primeiro mandato (1992-1996) foi Presidente da APMI (Associação de Proteção à Maternidade e Infância), junto com sua filha Rosângela Joekel. Foi neste período muito atuante na assistência social às pessoas carentes. O filho Sérgio Joekel foi Chefe do Departamento de Transportes. Em 2001, Rosa Joekel é a Prefeita, Manoel Joekel é Chefe de Gabinete (mas é, certamente, quem comanda a prefeitura, nos dizeres do povo), Rosângela Joekel é Chefe do Departamento de Finanças, Sérgio Joekel é Chefe dos Transportes. José Joekel (filho mais velho) foi eleito vereador e sua esposa Presidente da APMI juntamente com sua filha.

RECURSOS DE PODER: ECONÔMICO

Manoel Joekel é um grande proprietário de terras em Itaperuçu. Comercializa a fruta Ponkan da maioria dos produtores rurais. Possui uma serraria e seus funcionários trabalham desde o corte da árvore “pinus”, transporte, até a confecção de tábuas. Compra e vende lenha para fornos de Cal. Possui inúmeros carros e caminhões, e muitos funcionários. Age de forma assistencialista e faz pressão administrativa sobre seus funcionários, se acaso não concordem com suas idéias.

Manoel Joekel, porém, seria o político que mais se aproxima das características dos “coronéis” da primeira República, mas sua influência política é muito maior de que somente sobre seus agregados particulares, isto é, os que trabalham com ele. Ele consegue a fidelidade eleitoral de muitos eleitores em Itaperuçu, que lhe devem obrigações, confiam em sua capacidade administrativa, possuem para com ele uma dívida moral, gerando dependência pessoal. Os laços de dependência pessoal que consegue impor a muitos eleitores de Itaperuçu se dá pela prestação de favores, que por sua vez, cria estas relações de dominação.

PODER SIMBÓLICO

Manoel Joekel é um Chefe político tradicional, vencedor politicamente nas eleições, tinha o apoio do Deputado Estadual Anibal Khury, do Deputado Federal Luciano Pizzatto, e o Senador Roberto Requião o apoiou nesta última eleição a prefeito (2000). Com o falecimento de Khury, Nelson Justus é um dos deputados de apoio de Manoel Joekel no Paraná, e José Janene no nível Federal.

Apesar de ser católico, não é ligado diretamente à Igreja. O que se percebe é que está em contato com todas as Igrejas que o convidam para participar de alguma reunião, culto ou homenagem.

PODER SOCIAL

Ajuda nas aposentadorias, assina contratos de arrendatários, auxílio maternidade, benefícios a particulares com máquinas da prefeitura, sabe conseguir conciliar os empregos na prefeitura às diversas pessoas que prometeu: ao menos um da família acaba sendo empregado na prefeitura, mas há exemplos de famílias inteiras que tornam-se funcionários públicos municipais. Distribui favores em geral, mantém contato com seus eleitores, principalmente os mais necessitados, apadrinha casamentos, batizados, crisma, etc. Victor Nunes Leal já demonstrava estas características que o político local da República Velha deveria ter[30].

Quadro 3 – Trajetória Política de Manoel Joekel

|Ano |Cargo |Partido |Votação |Comentários |

|1983 |Vereador: Rio Branco do Sul | | | |

|1988 |Vereador: Rio Branco do Sul |PL |465 = 3,18% |A quarta melhor votação – Presidente da Câmara |

|1992 |Prefeito – Itaperuçu |PTB |2.349 = 35,72% |1º Prefeito do Município |

|1996 |Não se candidatou, e não possui nenhum | | |Não faz o sucessor José Saruva, que perdeu por apenas |

| |cargo público. | | |260 votos = 2,47% dos votos válidos. |

|2000 |Chefe de Gabinete |PMDB |4.073 = 36,01% |Elege sua esposa Rosa Joekel (PSL), pois ele renunciou|

| | | | |dias antes da eleição, em função da não aprovação da |

| | | | |prestação de contas de sua primeira administração. |

Fonte: TRE/PR - e Cartório Eleitoral de Rio Brando do Sul e Câmara de Vereadores de Rio Branco do Sul e Itaperuçu.

Dentre seus aliados políticos no município destacam-se: além de sua família, Paulo Sérgio Lopes Pereira, José Maria Costa, João Amadeu Stresser da Silva, advogado, Jamal Munir Bazk, médico, Jonas Costa Pereira, ex-funcionário do Tribunal Eleitoral da região, Lincon S. Sakamoto, “braço direito” na primeira administração, José Ribeiro Neto, presidente do PL. Estes são alguns membros importantes da equipe de Manoel Joekel.

2.3.2. Grupo Político II - GENTIL PASKE DE FARIA

Gentil Paske de Faria é natural de Itaperuçu e empresário madeireiro. Histórico Político: Candidato a vereador pelo PT, em Rio Branco do Sul (1988), foi o mais votado do partido, mas não se elegeu (333 votos); participava dos movimentos católicos de base em Itaperuçu.

Em 1992 sai como candidato a Prefeito pelo PMDB e obtém o 2º lugar. Tinha pouco apoio financeiro, mas conseguiu superar o ex-vereador de Rio Branco do Sul, Benedito Pedroso de Moraes (3º lugar), o que consolidou o seu nome para as eleições de 1996. Em 1996 elege-se prefeito, numa vitória apertada. Tendo como vice-prefeito Cezar Luiz Benatto (ex-candidato a vereador pelo PT em 1988, com 239 votos). Sua vitória se dá por uma melhor organização de sua equipe, apoio do deputado federal Basílio Vilani (PSDB) nas propagandas, a má administração de Manoel Joekel e a impossibilidade da sua reeleição.

Em 2000, perde a eleição por 110 votos apenas. Perdeu apesar de contar com a máquina administrativa, a aliança com José Saruva (candidato derrotado por ele nas eleições de 1996), contar com o apoio dos deputados Cleiton C. Kielse (estadual - PFL) e Basílio Vilani (federal - PSDB) e os irmãos Carlos e Íris Simões (PTB) e de vários grupos empresariais influentes da região como a Trombini e Sthatec.

Comenta-se que em sua administração (1997-2000) foram feitas muito mais obras públicas do que no passado (as obras públicas, como dizia Vitor Nunes Leal, são uma das formas de o “coronel” manter seu domínio político). Nas entrevistas, salientava-se que suas limitações foram a redução salarial dos professores primários, a demissão de muitos funcionários e discriminação das pessoas que eram do grupo opositor (Manoel Joekel), (aliás, problemas existentes também na administração Manoel Joekel –1992-1996).

FAMÍLIA PASKE FARIA

Paske Faria é uma família de agricultores do interior do município de Itaperuçu. E, como na administração anterior, os familiares do Prefeito vão trabalhar na Prefeitura. Sua esposa foi Chefe de Gabinete e Presidente da APMI (Associação de Proteção à Maternidade e Infância). Seu irmão Salvador Faria, Chefe dos Transportes, entre outros.

RECURSOS DE PODER: ECONÔMICO

Atualmente possui uma serraria, tratores, caminhões, terras e alguns funcionários.. Sua habilidade e persistência o fizeram um político e empresário madeireiro do município.

PODER SIMBÓLICO

Consolidou-se também como um chefe político, mas de menos tradição que Manoel Joekel. Formou sua equipe nos 4 anos de mandato como prefeito de Itaperuçu (1997-2000), tornou-se cabo eleitoral dos deputados estaduais Cleiton C. Kielse e Carlos Simões e dos deputados federais Basílio Vilani e Íris Simões. Era líder comunitário da Igreja Católica, mas depois de tornar-se prefeito não mais participou dessas atividades. Teve grande apoio da Igreja Quadrangular e Católica nas eleições de 1996.

PODER SOCIAL

Age de forma clientelista, procurando auxiliar as pessoas que o procuram, oferece emprego e benefícios na Prefeitura etc.[31]

Quadro 4 – Trajetória Política de Gentil Paske de Faria

|Ano |Cargo |Partido |Votação |Comentários |

|1988 |Candidato a Vereador – Rio Branco do Sul |PT |333 = 2,27% |Não eleito |

|1992 |Candidato a Prefeito – Itaperuçu |PMDB |1.853 = 28,18% |Não eleito. 2º lugar. |

|1996 |Prefeito de Itaperuçu |PSDB |4.995 = 50,64% |Venceu por apenas 260 votos do grupo político do |

| | | | |Manoel Joekel. |

|2000 |Candidato a Prefeito de Itaperuçu |PSDB |3.963 = 35,03% |Não eleito. Perdeu por apenas 110 votos. |

Fonte: TRE/PR e Cartório eleitoral de Rio Branco do Sul

Dentre seus aliados políticos no município destacam-se os seguintes nomes: Manoel Costa Lara, seu “braço direito”, Edvaldo Gonçalves, advogado; seu irmão Salvador de Faria, Moacir Gomes da Silva (indicado pelo empresário Horaci Santos – rede Multi Loja), Flávio da Silva Pereira, professor da rede pública estadual e que cuidava da parte burocrática das eleições, Nauf Abdala, médico e diretor do Hospital de Itaperuçu, emprestou uma ambulância para a campanha de 2000, Romário Matias, comerciante da região, chegou a ser chefe da saúde na ausência de médicos, Airton Cavalheiro, da igreja Assembléia de Deus, assessor Legislativo da Câmara Municipal de Vereadores (1997-2000). Estes são alguns dos nomes importantes da equipe de Gentil Paske.

Analiso agora a composição dos vereadores de Itaperuçu nos três mandatos desde a sua emancipação.

2.4. QUADRO DOS VEREADORES E OUTROS LÍDERES POLÍTICOS LOCAIS

Tabela 4 – Vereadores de Itaperuçu – Eleições Municipais de 1992

Candidato/Partido/Coligação: Manoel Joekel (PTB/PDT/PFL); Gentil Paske (PDS/PMDB/PSC); Benedito Pedroso de Moraes (PSDB/PST); José Ribeiro Neto (PTR)

|Vereador Eleito |Partido |Coligação |Votos |Percentual |

|Antônio Portes de Barros |PTB |Manoel Joekel |236 |3.42% |

|Genesio Clerice |PTB |Manoel Joekel |225 |3.26% |

|Jair Leonardo da Costa |PST |Benedito P. de Moraes |218 |3.16% |

|Vidal de Lara Costa |PMDB |Gentil Paske |180 |2.61% |

|João Bueno de Castro |PSDB |Benedito P. de Moraes |180 |2.61% |

|Josmar Ezekiel Joekel Vaz |PSDB |Benedito P. de Moraes |165 |2.39% |

|Juvenal dos Santos |PFL |Manoel Joekel |162 |2.35% |

|Ivo da Silva |PMDB |Gentil Paske |131 |1.90% |

|Adimir José Tomé de Oliveira |PSDB |Benedito P. de Moraes |164 |2.37% |

Fonte: TRE/PR

Pela coligação do candidato Benedito P. de Moraes são eleitos 4 vereadores, mas que, após as eleições, começam a apoiar o então Prefeito Manoel Joekel. Os vereadores Jair Leonardo da Costa e Antônio Portes de Barros irão apoiar Gentil Paske nas eleições de 1996. Os outros vereadores candidatar-se-ão pela coligação de Manoel Joekel.

Tabela 5 – Vereadores de Itaperuçu – Eleições Municipais de 1996

Candidato/Partido/Coligação: Gentil Paske (PSDB/PMDB/PPB); José de Castro França (PDT/PTB/PL/PFL); Darcy André Faria (PSC/PT)

|Vereador Eleito |Partido |Coligação |Votos |Percentual |

|João Lapola de França |PMDB |Gentil Paske |467 |4.70% |

|Jair Leonardo da Costa |PSDB |Gentil Paske |430 |4.32% |

|Osmario de Bonfim Castro |PTB |Manoel Joekel |301 |3.03% |

|Manoel Alves dos Santos |PFL |Manoel Joekel |293 |2.95% |

|Valdemiro Batista |PDT |Manoel Joekel |254 |2.55% |

|Edilson José Bueno |PMDB |Gentil Paske |310 |3.18% |

|Mauri Bortoluzzi |PTB |Manoel Joekel |229 |2.30% |

|Ivo da Silva |PFL |Manoel Joekel |187 |1.88% |

|Antônio Ferreira dos Santos |PMDB |Gentil Paske |243 |2.44% |

Fonte: TRE/PR

A coligação Manoel Joekel elege o maior número de vereadores, cinco. Inversamente, os vereadores eleitos por esta coligação, após as eleições, irão passar a apoiar o então prefeito Gentil Paske.

Ao final do mandato de Gentil Paske, o vereador Valdemiro Batista irá apoiar Bento Chimeli Júnior, alegando motivo de corrupção do prefeito Gentil Paske. E o vereador Manoel Alves dos Santos continua com Manoel Joekel. Os outros vereadores todos lançam-se pela Coligação Gentil Paske.

Tabela 6 – Vereadores de Itaperuçu – Eleições Municipais de 2000

Candidato/Partido/Coligação: Manoel Joekel (PMDB/PSL/PFL/PL/PPS); Gentil Paske (PSDB/PPB/PDT); Bento Chimelli Júnior (PSC/PT/PSB)

|Vereador Eleito |Partido |Coligação |Votos |Percentual |

|João Moraes de Lara |PPB |Gentil Paske |655 |5.56% |

|Osmário de Bonfim Castro |PSDB |Gentil Paske |610 |5.18% |

|Gerson Ceccon |PDT |Gentil Paske |567 |4.81% |

|Isael de Castro França |PDT |Gentil Paske |526 |4.46% |

|Manoel Alves dos Santos |PMDB |Manoel Joekel |480 |4.07% |

|José João Joekel |PSL |Manoel Joekel |403 |3.42% |

|Mauri Bortoluzzi |PPB |Gentil Paske |402 |3.41% |

|João Lapola de França |PPB |Gentil Paske |375 |3.18% |

|Aracy Sabadin Vaz |PFL |Manoel Joekel |231 |1.96% |

Fonte: TRE/PR

Gentil Paske e sua coligação elegem o maior número de vereadores porém a maioria deles irá apoiar Manoel Joekel. O que se percebe, de maneira geral, é o apoio dado pelos vereadores eleitos à administração municipal vigente, mesmo sendo eles eleitos por coligações contrárias[32].

Bento Chimelli Júnior e sua coligação não elegem vereadores por não atingirem os votos necessários da legenda. Faltou perto de 50 votos para completá-la. Alguns ex-vereadores apoiaram esta coligação: Antônio Portes de Barros, Genesio Clarice, Valdomiro Batista, João Bueno de Castro e Zacarias Stresser (ex-vereador por Rio Branco do Sul na legislatura1983-1987)[33].

Um terceiro grupo político também pode ser formado pelos filiados ao PT (Partido dos Trabalhadores de Itaperuçu), que junto com Bento Chimelli Júnior lançaram na coligação uma candidata a vice-prefeita: Mirian J. Bini Silla (PT), e obteve o vereador mais votado da legenda, José Augusto Liberato (416 votos e 6º mais votado do município) e ao todo, os cinco candidatos a vereadores do PT obtiveram 594 votos. Mirian J. Bini Silla é cartorária, membro atuante dos movimentos católicos, ex-presidente do Conselho de Segurança do município, atualmente é Diretora da Rádio Comunitária de Itaperuçu (FM 104,9). José Augusto Liberato, foi bancário do extinto Banestado, professor, atualmente é um profissional liberal. Junto com Mirian Bini Silla e Claudete Bini (Presidente do PT de Itaperuçu) e demais pessoas, fundaram o MEP (Movimento pela Ética na Política) em Itaperuçu, e procuram acompanhar o desempenho da Câmara Municipal de Itaperuçu. José Augusto Liberato candidatou-se pelo PT, a Deputado Estadual nas eleições de 2002. Foi o mais votado no município com 23,13% dos votos válidos de Itaperuçu, mas não foi eleito.

O PT de Itaperuçu, que possui ao todo aproximadamente 90 filiados, sendo 20 militantes, busca também estabelecer-se como uma nova liderança política.

As entrevistas com os petistas percebi que as críticas são feitas tanto para a administração Manoel Joekel quanto a de Gentil Paske. Cito alguns trechos: “A política em nosso município é apática com os sentidos voltados somente para os que se elegeram. Não dão importância a obras públicas, muito menos prestação de contas, nada se faz no sentido de minimizar a questão de desnível social, nada se projeta e como sempre nada há de novo”, fala um líder petista.

As entrevistas demonstraram também alguns eleitores descontentes com esta situação política em Itaperuçu. Em geral aqueles menos ligados aos dois candidatos (Paske e Joekel), têm uma atitude negativa em relação à política, um grande descontentamento para com os políticos locais em geral, em que a crítica maior é a falta de obras, “se elegem e não fazem nada, entram para o poder e esquecem do povo” como afirma um líder religioso. “Nenhuma ajuda. Eles acabam por prejudicar o crescimento do município” afirma um Diretor de Escola Estadual Pública. “Nós vemos tudo igual, nada muda, o nosso município não se desenvolve, pois precisamos de mais creches, segurança, pavimentação e muitas outras coisas, mas ninguém se mexe para fazer nada (referindo-se aos políticos). Eles começam a fazer somente no final do mandato, e nunca fazem nada direito”, diz uma estudante do Ensino Médio do bairro Capinzal.

Numa conversa no ônibus que leva à Curitiba um eleitor exclama que enquanto não surgir uma nova liderança política, os dois é que irão mandar, ora um, ora outro, e as coisas ficarão como estão. Em entrevista com um líder comunitário, esse se demonstra decepcionado com “estes” políticos que “não tem interesse de buscar o crescimento para o município”. FARIAS (2000, p.61) demonstra que os trabalhadores “têm um conhecimento dos mecanismos da manipulação do voto. A avaliação de que os políticos são na maioria ‘desonestos’, ‘interesseiros’, defensores ‘da panela deles’ indica uma percepção das formas pelas quais são eleitos”. Poderia então se perguntar, por que o eleitor de Itaperuçu vota nos grupos políticos vigentes no município, se a avaliação por parte de muitos da população às suas pessoas é negativa? Segundo FARIAS (Idem) “trata-se menos de um conformismo, resultado da ignorância, que de uma prática defensiva, pois não se vislumbra vantagens concretas em romper com os esquemas de manipulação” por parte dos eleitores.

Para Farias, claramente, a questão do voto consciente e livre está presente em todos os cidadãos eleitores do local estudado no Piauí e consequentemente para o Nordeste brasileiro. O que sustento, porém, é que nas entrevistas e conversas informais que coletei no período dessa pesquisa no município de Itaperuçu, o “voto de cabresto” continua a existir em boa parte da população local. Alguns, como visto acima, tem consciência da manipulação dos chefes políticos, porém, grande parte do eleitorado posiciona-se sempre em favor de um desses líderes e acaba votando “com ele” e “para ele” mesmo sendo a sua administração insatisfatória aos olhos de parcelas da população. As mediações criadas por esses políticos para com determinados grupos de eleitores faz com que relações de dominação e dependência pessoal sejam o elo de ligação entre eles, muito mais do que uma simples prática defensiva como interpreta Farias. É o que a literatura coronelista identificada como “gente do coronel fulano de tal”, “família do coronel sicrano” que, por sua vez, são fiéis e dificilmente mudariam seu posicionamento político.

Nesse sentido, o próximo capítulo procura avaliar como determinados políticos estadual e federal conseguem vencer as eleições em Itaperuçu.

CAPÍTULO III - POLÍTICA LOCAL, ESTADUAL E FEDERAL – UMA REDE DE COMPROMISSOS

Para entender a política em nível local, em especial no município de Itaperuçu, utilizo dois conceitos: clientelismo, entendido, de forma ampla, como relação assimétrica estabelecida entre pessoas (patrão e cliente) com poder diferenciado (econômico e político), prestígio e status. “Além disso, ela se distingue por ser uma relação do tipo pessoal (em que predominam os contatos face a face), pela troca de serviços e bens materiais e imateriais (gentilezas, deferência, lealdade e proteção)” (BEZERRA, 1999, p. 14), um clientelismo que implica troca de benefícios públicos por apoio político e votos, mas não só, pois como afirma Bezerra, não são simplesmente “benefícios públicos que são retribuídos por votos”, mas deve-se olhar a dimensão sociológica dessas trocas, que são as mediações que as envolvem, mediações que podem desfazer-se diante de determinadas situações, mas são estas mediações que fazem o clientelismo político obter racionalidade. E isto se dá ao longo de toda a carreira política do chefe local, durante o seu dia-a-dia, e não somente nas vésperas da eleição[34].

Outro conceito importante deste trabalho é o de “coronelismo”, um sistema em que “coronéis” comandam pequenos municípios, e têm a sua disposição eleitores fiéis que além de votarem para si e seus candidatos locais, votam também “com ele” em nível estadual e federal. Uma ligação entre o governo estadual e federal com os governos municipais. Como exemplo, Leal lembra que:

“A lista dos favores não se esgota com os de ordem pessoal. É sabido que os serviços públicos do interior são deficientíssimos, porque as municipalidades não dispõem de recursos para muitas de suas necessidades. Sem o auxílio financeiro do Estado, dificilmente poderiam empreender as obras mais necessárias, como estradas, pontes, escolas, hospitais, água, esgotos, energia elétrica. Nenhum administrador municipal poderia manter por muito tempo a liderança sem realizar qualquer benefício para sua comuna” (LEAL, 1997, p.65-66).

Esta, entre outras características descritas por Leal no capítulo I deste trabalho, demonstram a atualidade de seu ensaio. Hoje, os municípios do interior ainda não sobrevivem sem o auxílio do Estado, que por sua vez só é conseguido por intermédio da relação do político local com o parlamentar estadual e federal. Segundo Bezerra, no tempo em que Leal escreve suas análises, os recursos eram conseguidos diretamente do Estado; hoje, necessita-se da intermediação de um parlamentar, de preferência governista, para tal mediação ou de lobby (BEZERRA, 1999, p.256-7).

Em entrevista com um ex-funcionário da prefeitura, este relatou que com o auxílio de verbas estaduais e federais muitas melhorias foram feitas nos bairros de Itaperuçu. Estas verbas eram conseguidas através do Deputado Federal Basílio Vilani (PSDB), então membro da Comissão Orçamentária da União. Como exemplo, citou a creche no bairro Butieirinho, o Centro Poli Esportivo no bairro Santa Maria, uma ponte sobre o rio Açungui no interior do Município e demais obras. Algumas, cita o entrevistado, eram de verbas estaduais conseguidas através do Deputado Estadual Cleiton Kielse (PFL), como o asfalto no bairro Capinzal, etc.

Para Bezerra (1999, p.256) “o foco nesse lado da atuação parlamentar mostra que a partir do acesso às instituições do poder público, como o orçamento da União, são construídos os fundamentos do poder local do parlamentar e explicita-se o seu lugar na rede de relações que vincula políticos atuando nas dimensões municipal, estadual e federal”. Uma rede de relações, entre o político local e o político estadual e federal, construídas através de mediações diversas, como visitas, cartas, presentes, viagens, festas, que reflete no resultado eleitoral municipal, formando os “fundamentos do poder local do parlamentar”, mas principalmente, reforçando os fundamentos do poder do político local.

3.1. TRANSFERÊNCIA DE VOTOS

Nas tabelas abaixo demonstro como que a opção política dos dois principais líderes locais (no caso específico de Itaperuçu, Manoel Joekel e Gentil Paske) condicionam o resultado eleitoral no nível estadual e federal. Também destaco a presença de cabos eleitorais que trabalham em favor de outros candidatos e conseguem uma porcentagem significativa de votos, porém menor do que a obtida pelos principais líderes políticos do município (no caso destas tabelas, Vereador Osmário Bonfim, José Saruva, Evangélicos e o Grupo do PT).

As tabelas são divididas em Candidato, número de votos, porcentagem dos votos válidos e apoio recebido por parte de um líder ou grupo político de Itaperuçu. Quando a coluna de apoio estiver em branco é por motivo de não se identificar ao certo quem apoiou ou mesmo não haver um posicionamento especifico das lideranças políticas locais.

As tabelas trazem os resultados eleitorais dos candidatos mais votados no município de Itaperuçu. O critério adotado é o maior número de votos conseguidos e uma porcentagem significativa.

ELEIÇÃO 1994

Tabela 7 – Eleição de 1994 - Presidente – Itaperuçu

|CANDIDATO A PRESIDENTE |Votos |% |Apoio |

|Fernando Henrique Cardoso (PSDB) |3.438 |56,48 |Joekel e Paske |

|Luiz Inácio Lula da Silva (PT) |2.098 |34,47 |PT local |

|Orestes Quercia (PMDB) |140 |2,30 | |

|Eneas Ferreira Carneiro (PRONA) |130 |2,14 | |

Fonte: TRE/PR

Tabela 8 – Eleição de 1994 – Senador – Itaperuçu

|CANDIDATO A SENADOR |Nº de votos |% votos |Apoio |

|Roberto Requião de Mello e Silva (PMDB) |3.229 |34,31 |Joekel |

|Antonio Celso Garcia (PRN) |2.225 |23,64 | |

|Osmar Fernandes Dias (PP) |1.228 |13,05 | |

|José Carlos Gomes de Carvalho (PTB) |1.004 |10,67% | |

Fonte: TRE/PR

Tabela 9 – Eleição de 1994 – Governador – Itaperuçu

|CANDIDATO GOVERNADOR |N.º de votos |% votos |Apoio |

|Jaime Lerner (PDT) |3.594 |64,85% |Joekel e Paske |

|Alvaro Dias |1.349 |24,34% | |

|Jorge Samek |381 |6,87% | |

Fonte: TRE/PR

Tabela 10 – Eleição de 1994 – Deputado Federal – Itaperuçu

|CANDIDATO DEPUTADO FEDERAL |N.º de votos |% votos |Apoio |

|Luciano Pizzatto (PFL) |1.307 |32,72% |Manoel Joekel |

|Afonso Camargo Neto (PPR) |432 |10,84% | |

|Abeladro Lupion Mello (PFL) |430 |10,79% | |

|Paulo Roberto Cordeiro (PTB) |357 |8,95% | |

Fonte: TRE/PR

Tabela 11 – Eleição de 1994 – Deputado Estadual – Itaperuçu

|CANDIDATO DEPUTADO FEDERAL |N.º de votos |% votos |Apoio |

|Anibal Khury (PTB) |1.451 |28,10% |Manoel Joekel |

|Carlos X.. Simões (PFL) |1.184 |22,93% | |

|Horacio Rodrigues Sobrinho (PL) |979 |18,96% | |

Fonte: TRE/PR

ELEIÇÃO DE 1998

Tabela 12 - Eleição de 1998 para Presidente - Itaperuçu

|CANDIDATO PRESIDENTE |N.º de votos |% votos |Apoio |

|Fernando Henrique Cardoso (PSDB) |4.234 | |Joekel e Paske |

|Lula (PT) |2.771 | |PT local |

|Ciro Gomes (PPS) |320 | | |

Fonte: TRE/PR

Tabela 13 – Eleição de 1998 – Senador - Itaperuçu

|CANDIDATO SENADOR |N.º de votos |% votos |Apoio |

|Álvaro Dias (PSDB) |4.169 | |Joekel e Paske |

|Nedson L. Micheleti (PT) |2.292 | |PT local |

Fonte: TRE/PR

Tabela 14 – Eleição de 1998 – Governador - Itaperuçu

|CANDIDATO GOVERNADOR |N.º de votos |% votos |Apoio |

|Jaime Lerner (PFL) |3.535 | |Gentil Paske |

|Roberto Requião (PMDB) |3.178 | |Manoel Joekel |

Fonte: TRE-PR

Tabela 15 - Eleição de 1998 para Deputado Federal - Itaperuçu

|CANDIDATO DEPUTADO FEDERAL |N.º de votos |% votos |Apoio |

|Basílio Vilani (PSDB) |1.928 |28,91% |Gentil Paske |

|Luciano Pizzato (PFL) |995 |14,92% |Manoel Joekel |

|Isis Simões (PTB) |894 |13,40% |Gentil Paske |

|R. Stephanes (PFL) |539 |8,07% |Vereador Osmário |

|Padre Roque (PT) |305 |4,57% |PT local |

Fonte: TRE/PR

Tabela 16 - Eleição de 1998 para Deputado Estadual - Itaperuçu

|CANDIDATO DEP. ESTADUAL |N.º de votos |% votos |Apoio |

|Anibal Khury (PFL) |2.429 |32,35% |Manoel Joekel |

|Cleiton Kielse B. Crisóstomo (PFL) |2.384 |31,75% |Gentil Paske |

|Carlos X. Simões (PTB) |710 |9,46% |Gentil Paske |

Fonte: TRE – PR

ELEIÇÃO DE 2002

Tabela 17 - Eleição de 2002 para Presidente em Itaperuçu, 1º Turno

|CANDIDATO |N.º de votos |% votos |Apoio |

|PT – 13 – Lula |5959 |57,19% | |

|PSB – 40 – Garotinho |2219 |21,29% | |

|PSDB – 45 – José Serra |1892 |18,15% | |

|PPS – 23 – Ciro Gomes |334 |3,20% | |

|PSTU – 16 – Zé Maria |19 |0,18% | |

|PCO – 29 – Rui Costa Pimenta |2 |0,02% | |

Fonte: DivNet 2002 – Justiça Eleitoral, Sistema de Divulgação

Tabela 18 – Eleição de 2002 para Governador em Itaperuçu, 1º Turno

|CANDIDATO A GOVERNADOR |N.º de votos |% votos |Apoio |

|PMDB – 15 – Roberto Requião |3416 |31,87% |Manoel Joekel |

|PDT – 12 – Álvaro Dias |2960 |27,62% |Gentil Paske |

|PT – 13 – Padre Roque |2540 |23,70% |PT |

|PSDB – 45 – Beto Richa |1297 |12,10% | |

Fonte: DivNet 2002 – Justiça Eleitoral, Sistema de Divulgação

Tabela 19 – Eleição de 2002 para Senador em Itaperuçu

|CANDIDATO A SENADOR |N.º de votos |% votos |Apoio |

|PDT – 123 – Osmar Dias |4310 |22,36% | |

|PFL – 252 – Luciano Pizzatto |3544 |18,38% |Manoel Joekel |

|PT – 133 – Flávio Arns |2930 |15,20% | |

|PT – 131 – Edésio Passos |2816 |14,61% | |

|PPB – 111 – Tony Garcia |2602 |13,50% | |

|PMDB – 151 – Paulo Pimentel |2506 |13,00% | |

Fonte: DivNet 2002 – Justiça Eleitoral, Sistema de Divulgação

Tabela 20 – Eleição de 2002 para Deputado Federal em Itaperuçu

|CAND. A DEPUTADO FEDERAL |N.º de votos |% votos |Apoio |

|PPB – José Janene |1631 |14,60% |Manoel Joekel |

|PTB – Iris Simões |1376 |12,32% |Gentil Paske |

|PMDB – Reinhold Stephanes |1080 |9,67% |Vereador Osmário |

|PTB – Takayama |905 |8,10% |Evangélicos |

|PSDB – Afonso Camargo Neto |761 |6,81% | |

|PL – Justino[35] |662 |5,93% |Riobranquense |

|PT – Colombo |578 |5,17% |PT |

|PT – Assis |491 |4,39% |Sindicato Cresol |

Fonte: DivNet 2002 – Justiça Eleitoral, Sistema de Divulgação

Tabela 21 – Eleição de 2002 para Deputado Estadual em Itaperuçu

|CAND. A DEPUTADO ESTADUAL |N.º de votos |% votos |Apoio |

|PT – José Augusto Liberato[36] |2609 |23,13% |PT local |

|PFL – Nelson Justus |1957 |17,35% |Manoel Joekel |

|PMDB – Delegado Bradock |1937 |17,17% |José Saruva |

|PTB – Carlos Simões |1029 |9,12% |Gentil Paske |

|PDT – Vanderlei Iensen |303 |2,69% |Evangélicos |

|PMDB – Edson Strapasson |281 |2,49% | |

Fonte: DivNet 2002 – Justiça Eleitoral, Sistema de Divulgação

3.2. COMENTÁRIOS SOBRE OS RESULTADOS ELEITORAIS EM NÍVEL ESTADUAL E FEDERAL EM ITAPERUÇU

Sobre os resultados da votação para Presidente da República, Senador e Governador de 1998 e 2002, não havia uma tendência clara de apoio dos dois principais políticos citados de Itaperuçu (Manoel Joekel e Gentil Paske) a posicionarem-se a favor de um determinado candidato. Os estudos sobre pequenas localidades demonstram entretanto que o candidato majoritário apoiado é geralmente o governista, que para as eleições de 1994, 1998 e 2002, seriam, Fernando Henrique Cardoso, Jaime Lerner, Álvaro Dias, Luciano Pizzato, Osmar Dias. São estes políticos que eles indicariam, sem portanto entrarem em conflitos maiores sobre este apoio. Não se consegue identificar claramente o apoio dado por estes políticos locais, somente quando existe uma propaganda clara na casa do político ou com seus assessores, como é o caso da propaganda do candidato a Senador, em 2002, Luciano Pizzato, na casa de Manoel Joekel e seus correligionários.

Mas em relação ao apoio dado para Deputado Federal e Estadual, a “luta” eleitoral fica mais acirrada.

DEPUTADO FEDERAL: O então Prefeito de Itaperuçu, Gentil Paske (1996-1999), apoiou, nas eleições de 1998, o candidato a Deputado Federal Basílio Vilani, que já o tinha apoiado em sua candidatura a Prefeito (1996). Entre Vilani e Paske certamente criou-se uma relação política, que vai além da simples troca de favores, como descreve Bezerra[37]. E através desse deputado, verbas extras vieram para o município. Nesta relação política, como demonstra a tabela 15, Basílio Villani conseguiu quase 29% dos votos válidos para deputado federal em Itaperuçu em 1998. Esta porcentagem é significativa para nosso trabalho, pois demonstra a capacidade de “transferência de votos”[38] de Paske para o “seu” Deputado Federal. Considero, portanto, Paske, não um simples cabo eleitoral, mas um político influente que consegue mobilizar toda uma base eleitoral em favor de um candidato específico. Em 2002, Gentil Paske, fora da Prefeitura, consegue mobilizar votos para o candidato a Deputado Federal Iris Simões (PTB), sendo o segundo mais votado em Itaperuçu.

Um fato interessante é que nas eleições de 1994, Basilio Villani (PPR), candidato a deputado federal, obteve em Itaperuçu 11 votos (0,28%). Quatro anos depois, foi o mais votado do município.

Já o candidato a Deputado Federal Luciano Pizzatto (PFL) foi apoiado por Manoel Joekel em 1994, quando obteve 1.307 votos e em 1998 recebeu 995 votos. Pizzatto nas eleições de 2002, para Senador, foi o segundo mais votado do município. Nestas eleições, Joekel transfere seus votos para o candidato a deputado federal José Janene (PPB) com 1.631 votos. Porém, nas eleições de 1994 José Janene (PP) obteve 1 voto (0,03%). Portanto, um salto quantitativo.

É interessante observar também a atuação dos cabos eleitorais como descreve Paulo Singer (1967), importantes na compreensão do processo eleitoral. Por exemplo a organização dos membros do Diretório Municipal do PT de Itaperuçu apoiou em 1998 o candidato a Deputado Federal Padre Roque – PT que obteve 4,57% dos votos válidos. Em 2002 conseguiram 5,17% para o candidato Irineu Colombo (PT). Outro caso de transferência de votos é para Reinhold Sthephanes (PMDB), que obteve apenas 9 votos em 1994, mas com o apoio do vereador Osmário Bonfim obtém 539 votos em 1998 e 1.080 votos em 2002.

Esses dados demonstram o quanto é importante o apoio de um político local para que determinado candidato estadual ou federal possa ter uma porcentagem considerável de votos.

DEPUTADO ESTADUAL: O mais interessante gira em torno do apoio dado aos Deputados Estaduais. Nas eleições de 1998, Cleiton Kielse (PFL) obteve apoio de Gentil Paske e Anibal Khury (PFL) por parte de Manoel Joekel. Em 2002, Paske apoiou Carlos Simões (PTB) e Joekel apoiou Nelson Justus (PFL).

Para Deputado Estadual os políticos locais se empenham mais pela busca do voto de seus correligionários. O motivo talvez, destacado por BEZERRA (2000), é a maior proximidade entre eles, facilidade do contato, troca de favores diversos, verbas extras para obras, etc. Portanto, havia mais empenho e recursos financeiros aplicados nesta Campanha por parte dos políticos locais (pagava-se luz e água, promoviam-se festas e comícios, um maior número de propagandas destes candidatos circulava na cidade). Em 1998, no imaginário popular, os dois principais concorrentes a candidatos a deputado estadual em Itaperuçu, Cleiton Kielse (PFL) e Anibal Khury (PFL), eram inimigos, afinal “um era do Gentil e o outro do Manoel” como afirma um eleitor (detalhe: ambos candidatos concorreram pelo PFL, ambos eram “governistas” na época). Nesta disputa, eles conseguiram aproximadamente 64% dos votos válidos para Deputado Estadual em Itaperuçu. Gentil Paske “transferiu” 31% dos votos para Cleiton Kielse e Manoel Joekel “transferiu” 32% para Anibal Khury[39]. O que discordamos de Paulo Singer sobre a questão de cabos eleitorais, é reduzir toda a influência destes políticos e grupos locais e considerá-los meros cabos eleitorais de políticos “maiores”. É verdade que na República Velha um “coronel” chegava a transferir quase 90% dos votos da localidade ao seu candidato governista. Hoje as eleições são mais livres e competitivas, mas é a fidelidade ao “coronel” que ainda persiste, uma fidelidade que lhe garante “prestígio político” e transfere votos a candidatos governistas. É a continuidade do “voto de cabresto” em micro-sistemas políticos.

Alguns dados comparativos interessantes para deputado estadual em Itaperuçu. Em 1994 Nelson Justus (PTB), atualmente (PFL), obteve 12 votos. Em 2002 com a ajuda de Manoel Joekel obtém 1.957 votos. O mais interessante é o histórico da votação de Cleiton Kielse (PMDB em 1994, atualmente PFL), revelador no sentido da importância do apoio político. Em 1994 obtém 88 votos em Itaperuçu, em 1998, com o apoio de Paske, consegue 2.384 votos. Porém, e em 2002, sem o apoio desta liderança política local, volta a ter 93 votos. Nesta última eleição um carro de som do deputado Kielse jogava nas ruas propagandas e panfletos explicativos de todas as verbas e conseqüentes obras conseguidas por Kielse no período 1998/2002. Mesmo com todas estas informações os eleitores itaperuçuenses não votaram nele.

Anibal Khury (PTB/1994 e posteriormente PFL/1998) foi um político influente na região. Nas duas primeiras eleições do município, Khury foi o mais votado com 1.451 votos em 1994 e 2.429 votos em 1998. Inaugurou inúmeras obras em Itaperuçu como pontes, escolas, postos de saúde, numa rede de compromissos com o líder político local Manoel Joekel dando-lhe “carta branca” de atuação e, esse assim retribuía transferindo votos a esse político governista. Dizem que Nelson Justus assumiu o seu lugar em Itaperuçu, como deputado de apoio de Manoel Joekel.

Concluindo, retomo a hipótese inicial desse trabalho que é o esquema de análise 1, em que políticos locais mantém fiéis eleitores através da relação clientelista e consequentemente formando “cidadãos no cabresto”, que votam segundo sua indicação, caracterizando um comportamento eleitoral no estilo coronelista.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho é uma discussão com Victor Nunes Leal. A atualidade das características que Leal descreve sobre a vida política do interior do Brasil, o “coronelismo”, continuam a persistir em Itaperuçu - PR, região sul do Brasil, final do século XX. Os exemplos levantados por Leal, e as observações feitas em campo por mim, demonstram como as características do “coronelismo” são ainda determinantes na estrutura política do município estudado, mesmo que a literatura política atual a chame de “clientelismo”. E que a preocupação de Olavo Brasil de Lima Júnior sobre “quão longe estamos dos ‘coronéis, das enxadas e dos votos’” é real, e necessita de mais estudos e comparações entre estes micro-sistemas políticos.

Enquanto o estudo de Farias (2000) demonstra, a partir de pesquisa empírica em uma subregião do Piauí, na década de 1990, a desagregação do “coronelismo”, concluindo como sendo um quadro representativo do que vem ocorrendo no Nordeste rural brasileiro, esta monografia insiste em concluir ao contrário: as características “coronelistas” impõem-se à política nos dias atuais.

Sobre a teoria política, dois focos de análise sobre o “coronelismo” foram estudados, aqui sintetizados por dois autores em especial.

O primeiro, representada por Queiroz, o “coronel” utiliza-se da barganha para manter os votos de cabresto, gerando o dever moral também por parte do “coronel” em defender aquele que lhe deu o voto. E ainda, não necessariamente é a propriedade da terra a sua base social, mas sim, o poder econômico em geral.

E segundo, a interpretação de Décio Saes, que, para o autor, Queiroz reduz a manipulação eleitoral do “coronel”, como resultado da troca de favores entre iguais: o “coronel” presta favores materiais ao votante em troca do seu voto, o que seria uma interpretação errônea do fenômeno. Para o autor, no “coronelismo” o votante está ideologicamente imerso numa situação de obrigação subjetiva de lealdade para com o senhor da terra, e que, portanto, a troca de favores não é o fator condicionante do voto, mas sim, as relações de dominação e dependência pessoal. Esta seria a base ideológica do “coronelismo”, inseparável de sua base infra-estrutural, o latifúndio pré-capitalista, onde o proprietário de terras cede ao trabalhador a posse da terra e este se submete a uma fidelidade ao chefe local (SAES, 1998, p.85).

A interpretação de Saes, sem dúvida como já demonstrado, parece ser a mais próxima da realidade empírica dos estudos sobre “coronelismo”. Seria um erro, então, considerar a existência do fenômeno na presente história brasileira. Porém, e que considero relevante, são as relações ditas de dominação e dependência pessoal, que o autor caracteriza como a dimensão ideológica do “coronelismo”, parecem persistir em Itaperuçu. A dimensão econômica do proprietário de terras, que tem poder sobre o trabalhador a quem cede a posse da terra, não é mais visível. Mas a dimensão ideológica sim. As entrevistas demonstraram muito este aspecto de dependência que as pessoas tem para com os chefes políticos locais. Como exemplo, ao entrevistar um funcionário público da Prefeitura de Itaperuçu, ele respondeu que vê a política no município ainda “de uma maneira tradicional, onde o eleitor respeita a amizade, não levando em conta outros fatores como partidos e sua ideologia, planos de governo, isto sem contar a diferença cultural”. Há uma relação de dependência dos votantes para com o político local, construída ao longo de toda a sua carreira. Parece que institui-se uma obrigação subjetiva de lealdade, da mesma forma como o “coronel” tinha para com os seus agregados no tempo da Primeira República, provinda das questões materiais: favores, compra e venda do voto, empreguismo, etc., e também de fatores como compadrio, amizade, parentesco, etc.

O relacionamento que estes políticos tem com seus eleitores, através de todos estes exemplo citados acima, são fatos essenciais na análise da compreensão da política (BEZERRA, 1999). Se “coronelismo” é um termo que se refere a um fenômeno político passado, ao menos é uma espécie de “coronelismo” modernizado, com a existência de eleitores fiéis, muitas vezes mantidos pelo clientelismo e por fatores relacionais de mando, prestígio, amizade e parentesco.

Marcos O. Bezerra descreve este relacionamento entre políticos e seus eleitores da seguinte forma:

“A formulação de que a concessão de favores e serviços proporciona votos faz sentido na medida em que os favores concedidos e recebidos instituem entre os parlamentares e os beneficiados uma relação do tipo credor e devedor. (...) Assim, um eleitor ou liderança política que tem seu pedido atendido através da mediação do parlamentar sente, portanto, que tem com este uma dívida pessoal” (BEZERRA, 1999, p.117).

Esta “dívida pessoal” que o eleitor passa a ter com o líder político é perceptível nas conversas e entrevistas. Em uma conversa informal, uma eleitora disse ter votado em um político local por ter ganho telhas para a construção de sua garagem. Outra votou porque quando seu pai estava doente foi ele (o “chefe político”) que conseguiu uma ambulância para leva-lo ao hospital em Curitiba. Porém, esta é uma fidelidade que pode ser transitória, na medida em que, em outro momento, esta pessoa venha a receber um favor de outro chefe político. Mas o que se percebe é que, em geral, a fidelidade a um grupo político, liderado por um chefe local, é mais estável do que instável. Comenta-se com freqüência, quando o assunto é política, que famílias inteiras são de “fulano de tal” e “não mudam”, e que determinadas localidades de Itaperuçu, principalmente no interior, são redutos eleitorais de “ciclano”.

O clientelismo é utilizado, sem dúvida, pelos líderes políticos de Itaperuçu para manterem-se no poder. Ao redor de si, formam grupos fiéis, que sabem que com sua vitória aproveitarão melhor das possibilidades que a estrutura da prefeitura oferece. Para Karina KUSCHNIR (2000, p.140-1) “o clientelismo é um problema do ponto de vista democrático, pois opera sob o princípio da dádiva, implicando sentimentos de lealdade e empenho individual. O eleitor, ao invés de se identificar com seu grupo ou classe, como trabalhador e cidadão, se identifica como beneficiário de um político influente, tornando a política ‘inacessível sem a interferência das relações pessoais’. Tanto para o político quanto para o eleitor envolvidos, esse tipo de relação política é legítima e positiva”.

A observação de Karina Kuschnir mostra um dos sentidos da política, muitas vezes ocultado pelo ideal de uma democracia consciente e participativa que é a prestação de favores por parte do político em troca do apoio fiel do eleitor.

Outro ponto mencionado neste trabalho é a questão do “curral eleitoral” e do “voto de cabresto”. A fidelidade por parte dos eleitores para com políticos locais faz com que estes tenham uma determinada porcentagem de votos fixos e, por conseguinte, transferem estes votos aos políticos governistas, da mesma forma como um “coronel” da República Velha. Forma-se o seguinte esquema:

Esquema de análise 3:

Itaperuçu torna-se “curral eleitoral” de alguns parlamentares. É suficiente que esses políticos “graúdos” aliem-se aos chefes políticos locais para conseguirem votos e, em troca, sustentem o seu poder local. Resta saber como se chega a este apoio recíproco? Por exemplo, o que leva Gentil Paske apoiar em 1998 o deputado estadual Kleiton Kielse (PFL) e em 2002 apoiar o deputado estadual Carlos Simões (PTB)? E assim os demais apoios.

Outro ponto é a confusão entre o público e o privado, que ainda se verifica neste pequeno município. Os prefeitos são verdadeiros “donos” das Prefeituras e seus equipamentos. Utilizam dos bens públicos em benefício próprio. Como exemplo, o Prefeito de Itaperuçu, na gestão 1992-1996, montou toda a estrutura para comportar a Festa da Ponkan (pública) em sua propriedade particular[40]. Fato que se repetiu no ano de 2002 para a mesma festa. Outro, iniciou um açude (barragem) em terras de parentes, com máquinas da prefeitura, fato este denunciado no Ministério Público. Aqui também os exemplos de como são usados os bens públicos em questões privadas seriam inúmeros, assim como são os favores pessoais prestados aos eleitores.

A “ágora” grega, espaço público de discussão democrática e tomada de decisões por parte de todos os cidadãos livres e iguais, em favor dos destinos da polis, parece distanciar-se desta pequena localidade populacional. E ao contrário, a concentração do poder se dá nas mãos de poucos, que juntam-se ao redor de um líder. Os vereadores de Itaperuçu, ao longo da história política da localidade, sempre posicionaram-se a favor da administração vigente, mesmo sendo eleitos por coligações contrárias ao chefe do executivo.

A oposição organizada em partido político é de uma minoria de pessoas que pouco afeta a estrutura de poder. O que talvez “atrapalhe” quem manda é o seu grupo opositor, mas que age da mesma forma quando está no poder[41].

Enfim, o estudo de Marcos LANNA (1995), Igor de Rennó MACHADO (1997), Francisco Pereira de FARIAS (2000), Ibarê DANTAS (1987), entre outros, ajudam a perceber que não há diferenças gritantes entre os municípios do Nordeste, Sudeste e os do Sul do Brasil. As interpretações sobre os fatos podem ser divergentes, mas as estruturas de ações parecem semelhantes. E, principalmente, velhas estruturas de poder continuam a persistir na democracia brasileira, como é o caso das características descritas por Victor Nunes Leal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Conheça Rio Branco do Sul. Ano I, n.º1, agosto/2001, uma edição Jornal RAIO X. Rio Branco do Sul – PR.

DANTAS, Ibarê. Coronelismo e dominação. Aracajú, UFSE, PROEX/CE-CAC. Programa Editorial, 1987.

FARIAS, Francisco Pereira de. Clientelismo e Democracia Capitalista: Elementos para uma abordagem alternativa. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, N.º15/novembro 2000

JANOTTI, Maria de Lourdes Monaco. O Coronelismo: uma política de compromissos, São Paulo: Brasiliense. 1981

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Jornal Raio X da Região dos Minérios. Diretor: Rupert Mayer, Rio Branco do Sul - PR

KUSCHNIR, Karina. O cotidiano da Política. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2000.

LANNA, Marcos P. de. A dívida divina: troca e patronagem no Nordeste brasileiro. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1995

LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto: o município e o regime representativo no Brasil. 3.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.1997.

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MACHADO, Igor de Rennó. Dias em Movimento: Espaço e Poder numa “comunidade-dormitório” Mineira. Campinas: Unicamp, 1997. (Dissertação, Mestrado em Antropologia)

NUNES, Edson. “A Gramática Política do Brasil. Clientelismo e Insulamento Burocrático” 2ed. Jorge Zahar Editor. Rio de Janeiro. 1999.

OLIVEIRA, Ricardo Costa de. Análise dos Parlamentares Paranaenses na entrada do século XXI. Curitiba: APUFPR-Ssind, 2002.

PALMEIRA, M. e GOLDMAN, M. (orgs.). Antropologia, voto e representação política. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1996.

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QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. “O Coronelismo numa Interpretação Sociológica” in: B. Fausto. III. O Brasil Republicano. II1. Estrutura de Poder e Economia (1889-1930). Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 1997.

SAES, Decio. Coronelismo e Estado Burguês: elementos para uma reinterpretação. In: Estado e Democracia: Ensaios teóricos. Coleção Trajetória 1. 2.ed. Campinas: Unicamp, IFCH, 1998. Cap. 3.

SINGER, P. A política das classes dominantes. In: IANNI, O. (org.). Política e revolução social no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 1965.

VILAÇA, Marcos Vinicios. ALBUQUERQUE, R. Cavalcanti de. “Coronel, Coronéis” 2ed. Rio de Janeiro. Tempo Brasileiro; Brasília. Ed. Universidade de Brasília, 1978.

OUTRAS FONTES: Entrevistas com eleitores de Itaperuçu, políticos locais, realizadas pelo autor no ano de 2001 e 2002. Consulta ao Tribunal Regional Eleitoral / PR e seu site. Consulta a Câmara de Vereadores de Itaperuçu e Rio Branco do Sul.

ANEXOS

ANEXO 1: Foto de Manoel Joekel com deputados estaduais e federais na 9ª Festa da Ponkan de Itaperuçu, realizada em seu terreno. Exemplo da confusão do público com o privado nesse pequeno município.

Jornal Raio X n.º 78, 15/07/2002 – Rio Branco do Sul-PR

ANEXO 2: Foto da Prefeita Rosa Chevônica Joekel, do vice-prefeito Benedito Pedroso de Moraes, do líder religioso católico Diácono Antemar José Alves. Destaque para a presença do Deputado Estadual Nelson Justus e o representante do Deputado Federal José Janene, na comemoração dos 12 anos de emancipação política de Itaperuçu, com desfile. A mediação existente entre políticos estaduais e federais nos governos municipais.

Jornal Raio X, n.º 83, 14/12/2002. Rio Branco do Sul-PR.

ANEXO 3: Exemplos de decretos de nomeação para cargos na Prefeitura de Itaperuçu, gestão 2001-2004, renovando o quadro administrativo da prefeitura. Nesta e na próxima edição, somam-se 84 novas nomeações, revelando características como: empreguismo e baixa burocracia técnica nesse pequeno município.

Jornal Novo Horizonte, n.º 65, janeiro/2001 – Itaperuçu-PR

ANEXO 4: Decreto n.º 88/2001, da prefeita Rosa C. Joekel, considerando pela NULIDADE do concurso público n.º 001, de 11 de dezembro de 1999, realizado pelo então prefeito Gentil Paske de Faria. Os concursos públicos são realizados para legitimar novas contratações, mas, o que se nota é que não oferecem estabilidade em Itaperuçu.

Jornal Novo Horizonte, n.º 66, 1a15/02/2001, Itaperuçu-PR.

ANEXO 5: Panfleto provocativo lançado nas ruas pelo grupo contrário a atual administração Rosa Chevônica Joekel, no mês de setembro de 2002, vésperas da eleição para Presidente, Governador, Senador e Deputado Estadual e Federal.

ANEXO 6: Reportagem do Jornal Raio X, n.º 70 de 15/11/2001, p.12. “Prefeita Rosa Joekel consegue “Bolsa Escola” para 798 famílias de Itaperuçu”.

Este acontecimento mostra a extrema necessidade de auxílio das famílias de Itaperuçu, pois a prefeitura “pleiteava o benefício para 2.000 famílias”. O benefício federal reverte-se como esforço da administração municipal em atender a sua população.

ANEXO 7: IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de Itaperuçu.

Fonte: .br e/ou .br .

Demonstra o baixo desenvolvimento humano deste município paranaense.

ANEXO 8: Questionário aberto

Ao todo foram entrevistados 30 eleitores de Itaperuçu, no período de janeiro a novembro de 2002. Entre eles, funcionários públicos, ex-funcionários públicos, líderes religiosos, membros de diretórios partidários municipais, professores estaduais e diretores, eleitores em geral.

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[1] LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto. O município e o regime representativo no Brasil. 3ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1997.

[2] O ocaso do “coronelismo” é sustentado por Vilaça e Albuquerque (1978), Pang (1978), Dantas (1987), Carvalho (1997), Saes (1998), Farias (2000).

[3] Representantes da possível identificação do “coronelismo” com a política atual seriam: Janotti (1981), Queiroz (1997).

[4] Esquema proposto inicialmente por meu orientador: Adriano Nervo Codato (UFPR).

[5] Em entrevistas com eleitores de Itaperuçu, alguns identificavam os chefes políticos locais como “coronéis”, ou afirmavam que a política local era de estilo coronelista.

[6] Estes elementos levantados por Leal, dos traços políticos dos municípios em que os “coronéis” comandam, serão importantes na compreensão deste fenômeno, pois nos ajudarão a formar um conceito mais apurado sobre o “coronelismo” e assim compará-lo com as características de políticos atuais e perceber a persistência ou inexistência deste fenômeno. As características descritas por Leal a seguir serão comentadas em notas de rodapé para mostrar sua incidência ou não, em especial no município em que estudo, Itaperuçu – PR.

[7] Este primeiro aspecto, descrito acima por Leal, é incidente em Itaperuçu (1992-2002), como demonstra as tabelas do capítulo 3 deste trabalho. A força eleitoral dos políticos locais, isto é, sua capacidade de transferir votos aos políticos estaduais e federais, lhes confere importante “prestígio político”. E ainda, conseguem, no município, ao comporem forças com médicos, advogados, religiosos de diferentes igrejas, estabelecer uma rede de relações em que lhes proporciona um grande número de votos de cabresto.

[8] As funções policiais em Itaperuçu, sem dúvida, são influenciadas pelos chefes políticos locais, que muitas vezes determinam a indicação do delegado de polícia civil, dos funcionários da delegacia e chegam a libertar presos a pedidos de seus correligionários. Sabe-se inclusive da existência de capangas particulares que defendem os interesses destes chefes políticos.

[9] Percebi através da observação e de entrevistas que as pessoas identificam os chefes políticos de Itaperuçu como “ricos” e recorrem a eles para pedir inúmeras coisas como: emprestar dinheiro, descontar cheques, pedir alimentos, remédios, manilhas, telhas, tijolos, passagem para Curitiba ou outras localidades, levar ao hospital, ajuda para o casamento etc. O povo paupérrimo vê nesses líderes políticos pessoas capazes de resolver os seus problemas. Muitas vezes estas pessoas não são atendidas diretamente por estes líderes políticos, mas são encaminhadas para órgãos da Prefeitura, ou mesmo a órgãos públicos estaduais. Aí se compreende, como afirma Leal, os votos de cabresto, resultado desta organização econômica. Como demonstra os dados do IDH (Índice de desenvolvimento Humano), Itaperuçu é um dos municípios mais pobres do Paraná, encontra-se numa das últimas posições no ranking dos municípios paranaenses: 381, com renda per capita de R$133,47, medida no ano de 2000, inferior ao salário mínimo. (Fonte: .br/ IDH dos municípios paranaenses).

[10] Hoje as urnas estão em todas os locais, inclusive nos lugares rurais. Em Itaperuçu, porém, a prática de se levar o futuro eleitor para “tirar o título de eleitor” é freqüente. Alguns pais inclusive encaminham seus filhos em idade de votar a esses políticos ou seus assessores. Sabe-se que muitos políticos fazem este e outros favores referentes à documentação dos cidadãos itaperuçuenses, como por exemplo: aposentadoria, carteira de motorista, de reservista, de identidade, CPF, registro de nascimento etc. Observei que, muitas vezes, o primeiro documento do cidadão de Itaperuçu, fora sua certidão de nascimento, é o título de eleitor.

[11] Esta é uma característica importante. O líder político local, mesmo o coronel, deve fazer “obras” no seu município. Em Itaperuçu, constatei, através das entrevistas, que as pessoas relacionam as poucas melhorias no município identificado-as ao prefeito, ou acusando-o de “não fazer nada”.

[12] A questão dos favores pessoais é essencial. Ela é um fator existente no município de Itaperuçu, que cria laços de dependência pessoal, de dívida moral, que gera eleitores fiéis aos líderes políticos locais. Como exemplo: chega ao ponto de um eleitor, em conversa comigo, criticar um destes líderes pela sua má administração, mas afirmar que “mesmo assim vota nele”, pois lhe deve muitos favores. Os exemplos são múltiplos neste sentido, em que os eleitores demonstram sua lealdade ao líder político pois lhe devem favores. A hipótese que se discute é a de que o “coronel” de Itaperuçu talvez não tenha um grande latifúndio, mas tem a Prefeitura que garante o salário, o remédio, a ambulância, enfim, fornece o que o senhor de terras dava aos seus agregados. A literatura considera, de modo geral, esta relação de troca como clientelismo político. Destaco, porém, que também o “coronel” utiliza da concessão de favores para criar uma condição de dependência pessoal. Em relação aos favores o estudo de Karina Kuschnir demonstra que a identidade do político é construída através da obrigação de atender aos “seus” eleitores. Para a autora, “a obrigação de atender deriva justamente da necessidade de construir, confirmar e sustentar essa posição de status social diferenciado. O reconhecimento depende de haver uma oferta contínua de atendimento, que confirme a identidade do político como alguém que detém os acessos – um bem extraordinário, fora do alcance das demais pessoas” (KUSCHNIR, 2000, p.136). Enfim, a política acaba se restringindo a favores e obras, como afirma Moacir Palmeira (PALMEIRA (1998) citado por BEZERRA (1999)). Favores e obras constroem a identidade do político, fator não desprezado no estudo de Leal.

[13] Citarei a nota de rodapé de LEAL (1997) n.º 37 na íntegra, pois constato que ainda são os mesmos favores pessoais prestados pelos chefes políticos de Itaperuçu: “Eis aqui uma lista incompleta: arranjar emprego; emprestar dinheiro; avalizar títulos; obter crédito em casas comerciais; contratar advogado; influenciar jurados; estimular e “preparar” testemunhas; providenciar médico ou hospitalização nas instituições mais urgentes; ceder animais para viagens; conseguir passes na estrada de ferro; dar pousada e refeição; impedir que a política tome as armas de seus protegidos; ou lograr que as restitua; batizar filho ou apadrinhar casamento; redigir cartas, recibos e contratos, ou mandar que o filho, o caixeiro, o guarda livros, o administrador ou o advogado façam; receber correspondência; colaborar na legalização de terras; compor desavenças; forçar casamentos em casos de descaminhos de menores, enfim uma infinidade de préstimos de ordem pessoal, que dependem dele ou de seus serviçais, agregados, amigos ou chefes. Quando o chefe local é advogado, médico, escrivão, sacerdote, etc. muitos desses serviços são prestados pessoalmente, mediante remuneração irrisória, ou inteiramente gratuitos. Entre os favores da situação local tem ocupado lugar de destaque a condescendência fiscal. Segundo o depoimento do Deputado Luís Cedro, em 1934, “o imposto no município tem grande desvantagem: é a preferência que se estabelece por ocasião dos lançamentos, as preferências locais que se vão estabelecer entre os correligionários e os adversários” (Anais, XI, p. 557 – citado por LEAL)”. É possível encontrar na prática política de Itaperuçu cada um dos favores acima citados, com algumas modificações, como trocar animais por carros, estrada de ferro por ônibus etc.

[14] O filhotismo foi constatado por mim, nas entrevistas com eleitores de Itaperuçu, como prática ainda operante, gerando, a cada mandato político, funcionários novos na administração pública. Como exemplo foi me relatado que uma parente de um prefeito passou por inúmeros cargos administrativos com o objetivo de “experimentar trabalhar em vários locais diferentes”. Apesar do concurso público, a cada novo mandato, renova-se o pessoal administrativo, professores primários, serventes, motoristas, secretários etc.

[15] Em Itaperuçu há dois grupos rivais, liderados por dois políticos (descritos no próximo capítulo). Quando um está no poder, isto é, na administração da Prefeitura, o outro, e seu respectivo grupo, é totalmente marginalizado. Acontece, algumas vezes, que partidários de um grupo, por inúmeras pressões, acabem migrando para o outro grupo. O que se destaca, porém, é que “negar pão e água ao adversário” é prática corrente no município estudado. Em nota de rodapé (n.º36), Leal descreve os detalhes da hostilidade entre grupos rivais. Por exemplo: manifesta-se na ausência de relações sociais entre eles, na mudança de nomes de logradouros e de obras ou estabelecimentos públicos, atos de provocação como panfletos, rigor fiscal aos adversários, sabotagem, e muitas outras. Um Diretor de Escola Pública Estadual deixa clara esta rivalidade em sua entrevista: “Itaperuçu possui dois grandes ‘caciques’, e o que tudo indica é que continuarão se alternando no poder. Nenhum dos dois visa o coletivo de Itaperuçu, mas sabem exatamente onde estão seus eleitores favorecendo-os e perseguindo os adversários, o que forma um forte espírito de equipe e um desejo de vingança que é mais forte que a razão”. Outro exemplo deste conflito: ao término da gestão 1992-1996, o grupo político derrotado deixou a prefeitura totalmente sucateada, seus equipamentos, carros etc. Da mesma forma, ao final do período 1997-2000, o grupo derrotado deixa a prefeitura “saqueada” com destaque nos jornais e telejornais da região em 2001.

[16] Subtítulo baseado no livro de: JANOTTI, Maria de Lourdes Monaco. Coronelismo: uma política de compromissos. São Paulo: Brasiliense. 1981. Coleção Tudo é História.

[17] Minha hipótese é de que em Itaperuçu os chefes políticos locais “possuem” parcelas do eleitorado controlando assim os votos destas pessoas.

[18] A observação de Queiroz é válida hoje se pensarmos que os políticos dos pequenos municípios são pontos de referência das localidades em que governam. Dentro destes também encontramos expressões: “aquele é gente de fulano de tal”, “este é nosso” etc., vinculando as pessoas a determinados grupos, liderados por um chefe político.

[19] Em Itaperuçu, no trabalho de campo que realizei, nas observações e conversas com os eleitores, percebi claramente esta característica descrita por Queiroz. O voto no chefe político local, ou num candidato por ele apresentado, “tem como contrapartida o dever moral que o coronel assume em auxiliar e defender quem lhe concedeu ou deu o voto”. Há, claramente, uma rede de relações que o chefe político mantém com seus eleitores e que permite esta troca mútua.

[20] MACHADO, Igor J.R. Dias em Movimento: Espaço e Poder numa “comunidade dormitório” mineira. Campinas: Unicamp, 1997 (Dissertação de Mestrado em Antropologia do IFCH – Unicamp). O autor descreve a trajetória de Antônio, considerado o “coronel” da cidade, do Distrito de Dias, devido sua capacidade de controle dos votos e de mando sobre grande parte das pessoas. Controle que provêm de seu poder econômico, que se baseia na compra do café bruto dos agricultores da região e que beneficia em sua máquina. Diz o autor: “a influência sobre esse eleitorado fazia dele um mediador político de grande prestígio na política mineira regional, tendo colocado a sua base política local a serviço de vários figurões da política estadual...” (MACHADO, 1997: 73).

[21] FARIAS, Francisco Pereira de. Clientelismo e Democracia Capitalista: elementos para uma abordagem alternativa. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, n.15. (2000). O que irei analisar é como Farias descreve esta transição do “coronelismo” ao clientelismo, mostrando, e é o que nos interessa, o fim do “coronelismo”.

[22] Cf. Anexo 6 – Benefício Federal: Bolsa-Escola entregue pela prefeita, reforçando a mediação de dependência das pessoas mais pobres, para com o líder político.

( A citação da família Cavassin não está no texto original de João C. V. Ferreira e foi acrescentada por mim. Pois, os Cavassin, naturais da Itália, vieram para o município de Colombo – PR no final do séc. XIX. Eram famílias numerosas e por volta da década de 1920/30, João Cavassin, recém casado com Pedrina Giacomitti, compra terras em Itaperuçu e torna-se também um dos primeiros moradores da localidade dedicando-se a agricultura, ao cultivo da erva mate, fumo, vinho e da extração da madeira para a estação ferroviária e fornos de cal.

[23] Infelizmente, existem muitas famílias pioneiras que não são citadas neste texto de João C. V. Ferreira, bem como maiores detalhes da participação destas famílias na construção do município de Itaperuçu. Também outros fatos históricos relevantes ficaram fora.

[24] “A marca Votoran, inconfundivelmente associada a cimento e argamassas de alta qualidade, exerce forte liderança, com participação de 42% no mercado cimenteiro do Brasil... Acumulando experiência de cinco décadas, alta tecnologia e qualidade nos serviços de pré e pós-venda, a Cimento Rio Branco S/A é líder na Região Sul, com participação de 66% no mercado” (CONHEÇA RIO BRANCO DO SUL, 2001, p.9).

[25] Fonte: emater. / Emater – Notícias da Extensão Rural. Técnico agropecuário da Emater local: Mario Donizeti da Silva.

[26] Jornal Novo Horizonte. Edição: janeiro 2001 n.º065 e fevereiro 2001 n.º066 – Ano VII. O Jornal Novo Horizonte foi fundado na Primeira Gestão do Município de Itaperuçu como órgão oficial de divulgação, mas foi fechado na administração Gentil Paske. Foi reaberto novamente em 2001 e é financiado pela Prefeitura e seu diretor é Luiz Antônio Ribeiro.

[27] Com este exemplo pode-se discordar da análise de Francisco Pereira de FARIAS (2000) de que as prefeituras estão mais burocratizadas, independentes da influência dos mandos do chefe político. Ao contrário, persiste o que Leal identificava no seu ensaio, a característica do filhotismo nas administrações públicas do interior.

[28] Na rua principal, antiga Av. Rio Branco, hoje denominada Av. São Pedro, devido à Matriz São Pedro, encontramos a Igreja católica, o cartório, seis lojas de artigos em geral, um módulo policial, a delegacia, uma loja de material de construção e móveis, duas lojas de móveis, duas de roupas, duas farmácias, uma borracharia, um açougue, duas panificadoras, um posto de gasolina, dois cabeleireiros, uma sorveteria, cinco bares, sendo dois com lanchonetes, um com movimento maior aos sábados e domingos à noite, um posto da Sanepar e o prédio da prefeitura, alugado.

[29] José Saruva, porém, e que é interessante destacar, é um político que não tem a mesma reputação e influência que o Joekel, pois após esta eleição em que perdeu, aliou-se a Gentil Paske nas eleições de 2000, sendo candidato a vice-prefeito. Os dois perderam o pleito para Joekel, porque os votos conseguidos por Saruva como candidato a prefeito de 1996 eram do Manoel Joekel.

[30] Diante destas características de Manoel Joekel, se utilizo a interpretação sobre o “coronelismo” elaborada por Maria Isaura Pereira de Queiroz, Manoel Joekel seria, seguramente, um “coronel”, no final do século XX, na região sul do Brasil. Com sua base social, utiliza da troca de favores para conseguir a manipulação eleitoral, mantendo-se no poder, através da dependência pessoal de muitos eleitores de Itaperuçu, para com sua pessoa e transferindo votos aos políticos governistas que apoia. Ao utilizar a interpretação de Décio Saes, Manoel Joekel não seria um “coronel”, afinal mercantiliza o voto e sua base social não é exclusivamente a posse da terra com agregados que lhe obedecem sem necessidade da compra do voto. Seria um eficiente político clientelista local e excelente cabo eleitoral dos políticos governistas que lhe garante o poder local em Itaperuçu.

[31] Gentil Paske é um político que não se aproxima do estilo “coronel” devido a sua tradição política de membro de associação de base católica, de candidato de um partido de esquerda (PT) no final da década de 1980, somente depois filiando-se a partidos governistas e, posteriormente, ir adquirindo características que o fizeram um político de referência no município, construindo inclusive um número grande de eleitores fiéis, como foi identificado em entrevistas com pessoas que se diziam seus eleitores. E a e sua capacidade em transferir seus votos a políticos estaduais e federais que apóia, como demonstra os resultados das eleições de 1998 e 2002 em Itaperuçu.

[32] Esta parece ser uma característica da política dos pequenos municípios, a não existência da oposição firme, os vereadores eleitos são sempre “governistas”, isto é, apoiam o atual prefeito, mesmo este sendo eleito por coligações adversas, e estar em partidos que a nível nacional diferem em suas posições ideológicas.

[33] Poderia se dizer que Bento Júnior, filho do ex-prefeito de Rio Branco do Sul, Bento Chimelli, formaria um terceiro grupo político em Itaperuçu, mas existe alguns problemas do tipo: ele não mora na localidade, trabalha em Almirante Tamandaré na fábrica de cal de seu pai, não mantendo muito contato com a população em geral. Seu pai possui muitas terras em Itaperuçu, inclusive uma usina hidrelétrica, que gera energia para sua fábrica.

[34] Karina KUSCHNIR (2000) também identifica estes laços criados dia-a-dia do político para com os cidadãos, quando estuda a vida de um Deputado Estadual do Rio de Janeiro e sua filha vereadora.

[35] Justino Costa Rosa é natural de Rio Branco do Sul, município vizinho de Itaperuçu, e portanto um candidato local a deputado federal.

[36] José Augusto Liberato é natural de Itaperuçu. Pela primeira vez o município tem um candidato próprio para disputar um cargo de deputado estadual. Fato curioso é que conseguiu superar os candidatos de Manoel Joekel e Gentil Paske, com uma expressiva votação.

[37] Marcos Otávio Bezerra (1999) descreve que estas mediações entre políticos locais e parlamentares federais, devem ser analisadas de forma bem mais ampla do que a simples troca de favores. Paske, por exemplo, foi várias vezes a Brasília, Vilani sempre comparecia nas festas municipais, obtinha verbas federais extras para construção de obras destinadas ao município, portanto, havia uma relação de apoio recíproca, apesar de assimétrica.

[38] “Transferência de votos” significa neste trabalho uma característica do “Coronelismo” em que o Coronel possui um “lote de votos de cabresto” que destina aos políticos governistas por ele apoiado. São os eleitores fiéis do Coronel, fidelidade mantida por favores, cargos públicos, parentesco, etc.. Esta idéia de eleitores fiéis encontra-se no Cap. 1 deste trabalho, de forma mais detalhada.

[39] Detalhes interessantes da política local: Após a divulgação do resultado houve uma carreata da “turma do Manoel” pela vitória “suada” de Anibal Khury pela diferença de 45 votos sobre Cleiton Kielse. A passeata, que contou com “gasolina de graça”, foi também em protesto contra a morte do sobrinho do Joekel (Josmar Joekel – vereador 92-96) assassinado dias antes da eleição (de 1998) por um cunhado do Paske. Motivo alegado: discussão política.

[40] Cf. Anexo 1 – sobre a 9ª Festa da Ponkan de Itaperuçu.

[41] Cf. Anexo 5 – panfleto provocativo à administração de Rosa C. Joekel.

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Eleitores Fiéis

Governo Estadual, Federal e

Parlamentares

Prefeito (Chefe Político Local)

Eleitorado Rural

Estrutura Agrária Latifundiária

Governo

Coronel

Parlamentares Estaduais e Federais Governistas

Líderes Políticos Locais

Eleitores Fiéis

“voto de cabresto”

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