Promotoria de Justiça Cível de São Vicente



   Promotoria de Justiça Cível de São Vicente

 

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA __ VARA CÍVEL DE SÃO VICENTE-SP

 

 

 

 

                                               O Ministério Público do Estado de São Paulo, por intermédio do Promotor de Justiça que esta subscreve, com atribuição na área da Defesa dos Direitos dos Consumidores, vem propor, com base no disposto no art. 129, inciso III, da Constituição Federal; e nos artigos 81 e 82, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal nº 8.078/90); no art. 5º, caput, da Lei Federal nº 7.347/85; e no art. 25, inc. IV, a, da Lei Federal nº 8.625/93:

 

 

                               AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO LIMINAR

 

                                               Em face de ALVES & JÚNIOR LOCAÇÕES DE VEÍCULOS LTDA. - ME, nome de fantasia “Líder Locações”, estabelecida na Rua Nossa Senhora de Fátima, nº 870, Chico de Paula, Santos/SP (fls. 181), CNPJ 08.986.892/0001-53, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas:

 

 

 

 

                                               I – Introdução

 

 

                                               Apurou-se que a empresa ré realiza, sem autorização, o transporte remunerado de passageiros no município de São Vicente.

 

                                               Constatou-se que a ré opera como se fosse uma associação de rádio táxi. Usando automóveis transporta consumidores de um ponto a outro da cidade ou da Baixada Santista, efetuando a cobrança conforme uma “tabela de preços” que criou.

 

                                               Além de atender a clientes que solicitam seus serviços pelo telefone também mantém veículos estacionados próximo a locais de grande movimento de pessoas como hospitais e supermercados, prestando serviços semelhantes àqueles prestados pelos táxis. 

 

                                               A empresa, contudo, não tem autorização para o exercício dessa atividade, o que torna ilícita sua atuação.

 

                                               A ilicitude da atividade, devidamente constatada, foi levada ao conhecimento da empresa. Foi-lhe concedida a oportunidade de celebrar compromisso de ajustamento de sua conduta à lei a fim de evitar a provocação do Poder Judiciário. No entanto, a empresa revelou não ter a intenção de, voluntariamente, adequar-se ao ordenamento jurídico em vigor, tornando inevitável o ajuizamento da presente ação.

 

                                               II. Dos Fatos

 

 

                                               Os fatos foram apurados no inquérito civil nº 112/07 (cópias em anexo).

 

                                               A instauração da investigação se deu em decorrência do recebimento de ofício encaminhado pelo Delegado de Polícia Diretor da 102ª Ciretran (fls. 05).

 

                                               A Autoridade de Trânsito, por sua vez, havia sido provocada pela “Associação dos Taxistas Rádio Táxi de São Vicente” (fls. 10).

 

                                               Narrou o presidente da associação que carros particulares estariam prestando serviços de táxi no município através de “organizações clandestinas, colocando em risco a vida das pessoas usuárias dos serviços... por não possuírem seguro específico para transportar passageiros, não estarem habilitados e não estarem autorizados pela Prefeitura Municipal.”

 

                                               O Delegado de Trânsito determinou o encaminhamento de peças à Promotoria de Justiça, ao Delegado Titular do Município, ao Comandante da Polícia Militar e ao Secretário de Transportes do Município (fls. 08/09).

 

                                               O Delegado de Polícia Titular do Município instaurou inquérito policial para apuração dos fatos (fls. 11).

                                               Representantes da Associação dos Taxistas e do Sindicato dos Proprietários de Transporte Alternativo de Passageiros foram recebidos neste Gabinete da Promotoria de Justiça e externaram sua preocupação com o incremento da atividade clandestina investigada (fls. 47/48).

 

                                               Na oportunidade foram fornecidos documentos:

 

                                               Foram apresentados panfletos anunciando os serviços da empresa “Líder – Locações de veículos e transporte de passageiros”, com a indicação dos números de telefone colocados à disposição dos consumidores e com os preços cobrados (fls. 49 e 51). Verifica-se que uma “corrida” na área insular de São Vicente custava, na ocasião, R$ 7,00 (sete reais).

 

                                               Foi fornecida certidão da Prefeitura Municipal dando conta que a ré não contava com autorização de funcionamento (fls. 50).

 

                                               Foi apresentada relação com as características dos veículos que estariam desempenhando a atividade clandestina (fls. 52).

 

                                               Tem-se, ainda, termo circunstanciado lavrado pelo Delegado de Polícia do 1º Distrito Policial contra motorista que exercia a atividade ilegal (fls. 55/58).

 

                                               Diante dos indícios demonstrando a veracidade da notícia trazida pela associação dos taxistas foi realizada reunião nesta Promotoria de Justiça com a presença, dentre outros, de representantes da Secretaria de Transportes e das Polícias Civil e Militar, que se comprometeram a intensificar as fiscalizações (fls. 69/70).

 

                                               Posteriormente, a Secretaria de Transportes encaminhou ofício narrando dificuldades que estaria encontrando para coibir a atividade clandestina (fls. 80/81) e encaminhando documentos demonstrando o resultado de suas investidas (fls. 105/128).

 

                                               A investigação prosseguiu visando identificar as empresas responsáveis pela atividade ilícita.

 

                                               Constatou-se, então, que a ré chegou a solicitar a emissão de alvará de funcionamento (fls. 129/165). Indicou como sendo sua atividade principal a “locação de veículos com motorista para transp passag” (sic – fls. 130).

 

                                               Registre-se que, da análise do contrato social original verifica-se que a empresa foi constituída tendo por objeto social a prestação de “serviços de locação e aluguel de veículos com motorista para transporte de passageiros, tripulações na área portuária e afins” (fls. 132).

 

                                               O pedido foi corretamente indeferido pela Administração Municipal. Na oportunidade consignou o Sr. Diretor de Transportes Básicos: 

“Vislumbra-se em nossa legislação municipal, o transporte individual de passageiros, em veículos de aluguel, o qual constitui serviço de interesse público. A exploração deste serviço de transporte de passageiros é realizada por meio de táxi.

...

A pretensão do Requerente é de equiparar-se à atividade já regulamentada por Lei, acima descrita, sendo certo que a sua não encontra respaldo legal, conforme requerido” (sic – fls. 146/147).      

 

                                               A empresa chegou a tentar alterar a decisão administrativa alegando alugar veículos com motorista para transportar passageiros “in loco que estão a caminho de festas, aeroportos, portos, entre outros, o que difere dos serviços efetuados pelos taxistas, que geralmente transportam um número menor de passageiros e possuem um ponto fixo, estabelecido pela própria Prefeitura de São Vicente para exercerem suas atividades” (sic - fls. 151).

Não convenceu a Administração Municipal conforme se observa a fls. 154/155 e 162/163. Desta última decisão destaca-se o seguinte trecho:

“Independentemente do que afirma o interessado, em mais uma de suas reconsiderações de que o transporte de passageiros será realizado para diversas cidades do litoral de São Paulo e Capital, difere do constante na propaganda da empresa que circula pela cidade em nome da Líder Locação, conforme documento que segue.

Verifica-se, portanto, de forma contundente, a tentativa de exploração de uma atividade já regulamentada na esfera administrativa, quer seja no transporte por meio de táxi, quer seja no transporte alternativo – modalidade Lotação (Lei 1660-A), sendo que em ambos serviços, a proporcionalidade de número de veículos por habitantes, já foi atingida” (sic – fls. 162/163).

 

                                               A Prefeitura Municipal intimou o responsável pela empresa para que encerrasse a atividade (fls. 160).

 

Ao que se tem notícia a ré conformou-se com a decisão administrativa, não tendo se socorrido do Poder Judiciário.

                                               A empresa “Líder”, notificada a prestar esclarecimentos, o fez através de Marco Antonio Alves Nascimento (fls. 187/188) que esclareceu que a empresa teria alterado seu nome social de “Miashiro & Nascimento Locações de Veículos Ltda.” para “Alves Júnior Locações de Veículos e Transporte de Passageiros Ltda.”, mantendo o nome de fantasia “Líder” e o mesmo número de cadastro na Receita Federal.

 

                                               Reconheceu que os panfletos juntados a fls. 79 e 83 (ora copiados a fls. 49 e 51) referem-se à empresa “Líder”.

 

                                               No entanto, asseverou que tais panfletos não mais estariam sendo distribuídos, pois a empresa não mais atenderia a clientes particulares, mas apenas a pessoas jurídicas, efetuando o transporte de seus empregados. Os veículos utilizados estariam sendo transferidos para o nome da empresa e não foram licenciados na categoria aluguel. Acrescentou ter transferido sua sede para Santos.  

 

                                               A negativa do representante da empresa foi contestada por taxistas ouvidos neste Gabinete da Promotoria de Justiça.

 

                                               Assim, Benvindo Nery de Almeida (fls. 189) alegou verificar, diariamente, pessoas se utilizando de carros particulares para fazerem serviços de táxi. Os motoristas se utilizam de camisas verdes escuras. Os automóveis utilizados na atividade não são identificados. É comum vê-los estacionados nas proximidades do CREI e do supermercado “Fiel Barateiro”. De acordo com o declarante o que se comenta é que estes veículos seriam todos da “Líder”. Sente-se prejudicado com a atividade clandestina, pois paga impostos, necessita renovar seu alvará anualmente, submetendo seu veículo e o taxímetro a vistorias periódicas, além das fiscalizações rotineiramente realizadas pela Secretaria de Transportes.

 

                                              Acrescentou que os taxistas são cadastrados na Prefeitura Municipal, podendo ser identificados pelo consumidor caso este se sinta lesado de alguma forma. O mesmo, porém, não se pode dizer dos motoristas que prestam serviços para a empresa ré.

 

                                               No mesmo sentido tem-se o depoimento de Carlos Alberto de Jesus Líbano (fls. 193/194) que forneceu relação dos veículos utilizados pela ré. Acrescentou que funcionários do supermercado “Fiel Barateiro”, quando algum consumidor solicita um táxi, acionam a ré ao invés de solicitarem os serviços de um profissional em situação regular. Fez questão de enfatizar o risco para a população, apresentando matéria jornalística descrevendo ocorrência policial que, segundo o declarante, envolveria veículo utilizado no transporte clandestino (fls. 195). Apresentou, ainda, notícia enfocando o crescimento da atividade ilícita na cidade (fls. 196).

 

                                               Antonio Queiroz (fls. 197) também apresentou depoimento semelhante. Afirmou que veículos da empresa “Líder” têm sido utilizados em atividades semelhantes àquelas desempenhadas pelos taxistas trazendo prejuízos à classe e aos consumidores que não contam com a mesma garantia que teriam caso se utilizassem de profissional regularizado.

 

                                               Corroborando com os depoimentos já mencionados tem-se que Reinaldo Baltar Bezerra, também taxista, foi ouvido neste Gabinete da Promotoria de Justiça e esclareceu também notar, em seu dia a dia de trabalho, a existência de grande número de veículos particulares efetuando o transporte remunerado de passageiros como se táxis fossem (fls. 178).

As versões dos taxistas e do representante da ré eram inconciliáveis. A controvérsia foi sanada com o resultado da diligência realizada por Oficial de Promotoria (fls. 190) que, através do número de telefone constante num dos panfletos da “Líder” solicitou uma “corrida” e foi prontamente atendido tendo, inclusive, sido-lhe fornecido recibo e novo panfleto, com novos preços (fls. 191/192). A descrição do serviço deixa claro que a atividade equipara-se àquela exercida por taxistas.

 

                                               Não há dúvidas, portanto, que apesar da negativa da ré esta continua exercendo a atividade ilícita, o transporte remunerado de passageiros.

                           

                                               Outra empresa que se encontrava na ilegalidade optou por celebrar termo de compromisso de ajustamento de conduta à lei (fls. 182/183).

 

                                               À ré foi fornecida a mesma oportunidade (fls. 198). No entanto a empresa optou por insistir na exploração da atividade ilícita (fls. 180).

 

                                               Tendo em vista que as duas empresas identificadas no inquérito civil 112/07 adotaram posturas distintas, a investigação teve de ser cindida.

 

                                               Os autos originais foram arquivados e, ato contínuo, encaminhados ao E. Conselho Superior do Ministério Público para homologação, a fim de que o termo de ajustamento de conduta à lei ganhe eficácia (fls. 199/209).

 

                                               A fim de permitir a adoção das medidas cabíveis em relação à ré providenciou-se a extração de cópias das principais peças e o desentranhamento de termos de declarações e de reuniões a fim de permitir o ajuizamento da presente (fls. 185/186).

 

(

 

                                               III. Do Direito       

 

 

                                               III.I. Do texto constitucional

 

 

                                               A defesa do Consumidor pelo Estado foi alçada a direito fundamental do cidadão (artigo 5º, XXXII, Constituição Federal).

 

                                               A defesa do Consumidor constitui-se, ainda, num dos princípios gerais da atividade econômica (artigo 170, inciso V, Constituição Federal). Cláudia Lima Marques, Antonio Herman V. Benjamin e Bruno Miragem lecionam:

 

“O consumidor foi identificado constitucionalmente (art. 48 ADCT) como agente a ser necessariamente protegido de forma especial” (“Comentários ao Código de Defesa do Consumidor” – Editora Revista dos Tribunais – 1ª edição – página 54).                              

                                                Nos termos do artigo 30 da Constituição Federal compete aos Municípios a organização e a prestação, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão dos serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial.

 

                                               A livre iniciativa é garantida pela Carta Magna com a ressalva dos “casos previstos em lei” (artigo 170, parágrafo único).  

 

                                               Mais adiante, o legislador constituinte incumbiu ao Poder Público a prestação de serviços públicos, diretamente ou sob regime de  concessão ou permissão (artigo 175).

 

                                               E, por fim, o artigo 178 prevê que “lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre...”

 

 

III.II. Da Legislação infraconstitucional

 

                                                       

                                               Seguindo determinação constitucional, o Código de Defesa do Consumidor estabeleceu normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social (art. 1º).

 

                                               Ensinam Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery (“in” Código de Processo Civil comentado, Editora Revista dos Tribunais, 3ª edição, p. 1348) que “as normas do CDC são ‘ex vi legi’ de ordem pública, de sorte que o juiz deve apreciar de ofício qualquer questão relativa às relações de consumo, já que não incide nesta matéria o princípio dispositivo. Sobre elas não se opera a preclusão e as questões que dela surgem podem ser decididas e revistas a qualquer tempo e grau de jurisdição”.

 

                                               Pois bem. É direito básico do consumidor a proteção à sua vida, saúde e segurança (artigo 6º, I, da Lei 8.078).

 

                                               Ademais, o Código de Defesa do Consumidor contém norma principiológica invocando seja observada, nas relações de consumo, a boa-fé, o equilíbrio, transparência e harmonia, respeitando-se a dignidade e os interesses econômicos do consumidor (artigo 4º).

 

                                               Nos termos do artigo 39, inciso VIII, da Lei 8.078/90, constitui-se prática abusiva a colocação no mercado de consumo de serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes.

 

                                               Antonio Herman V. Benjamin define prática abusiva como: “a desconformidade com os padrões mercadológicos de boa conduta em relação ao consumidor”. Destaca Gabriel A. Stiglitz para quem são “condições irregulares de negociação nas relações de consumo” para concluir que estas condições “ferem os alicerces da ordem jurídica, seja pelo prisma da boa-fé, seja pela ótica da ordem pública e dos bons costumes” (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto – Ada Pellegrini Grinover e outros – Editora Forense Universitária – 7ª edição – página 319).

 

                                               Conforme apontado pelo Delegado de Polícia Diretor da 102ª Ciretran (fls. 06/09) o Código de Trânsito Brasileiro dispõe, em seu artigo 135, que:

 

Art. 135. Os veículos de aluguel, destinados ao transporte individual ou coletivo de passageiros de linhas regulares ou empregados em qualquer serviço remunerado, para registro, licenciamento e respectivo emplacamento de característica comercial, deverão estar devidamente autorizados pelo poder público concedente.

 

                                               Mais adiante, o legislador do CTB estabeleceu que:

 

Art. 329. Os condutores dos veículos de que tratam os arts. 135 e 136, para exercerem suas atividades, deverão apresentar, previamente, certidão negativa do registro de distribuição criminal relativamente aos crimes de homicídio, roubo, estupro e corrupção de menores, renovável a cada cinco anos, junto ao órgão responsável pela respectiva concessão ou autorização.

 

                                               Ao disciplinar as infrações de trânsito o legislador incluiu:

 

                                               Art. 231. Transitar com o veículo:

                                               ... 

                   VIII - efetuando transporte remunerado de pessoas ou bens, quando não for licenciado para esse fim, salvo casos de força maior ou com permissão da autoridade competente:

                   Infração - média;

                   Penalidade - multa;

Medida administrativa - retenção do veículo; ...

 

                                               Verifica-se que o legislador, em harmonia com o ordenamento constitucional, consagra o transporte de pessoas como atividade que depende de autorização do Poder Público. A medida visa preservar a integridade física e a vida dos passageiros bem como permitir a adoção de políticas públicas que envolvam o fluxo viário das cidades. Elevou o transporte remunerado sem autorização à categoria de infração administrativa, impondo multa e retenção do veículo.

 

                                               Em São Vicente foi regulamentado o transporte de passageiros. Os serviços são prestados por lotações e táxis.

Como a atividade desempenhada pela ré é de transporte individual de passageiros equipara-se ao serviço prestado pelos taxistas.

A atividade está prevista na Lei 1.802 (fls. 13/23).

 

                                               O legislador municipal reconhece que o transporte individual de passageiros é serviço de interesse público (artigo 1º).

O serviço somente pode ser executado mediante “prévia autorização da Prefeitura” (artigo 1º).

 

                                               A exploração do serviço é permitida apenas a pessoa física, motorista profissional autônomo residente no Município (artigo 2º).

                                               Para obtenção do “alvará de estacionamento” o motorista deverá estar inscrito no “Cadastro Municipal de Condutores de Táxis”, comprovar a propriedade do veículo a ser utilizado na prestação dos serviços, bem como ser habilitado à condução de veículos de aluguel (artigo 3º).

 

                                               Para obter sua inscrição no “Cadastro Municipal de Condutores de Táxis” o interessado deverá apresentar, dentre outros, “exame de sanidade e psicotécnico em vigor” e “folha corrida de antecedentes criminais” (artigo 5º), além de atender a outros requisitos definidos pela Lei 851-A, dentre estes, comprovar frequência a curso de direção defensiva (fls. 83/85).

 

                                               Os veículos utilizados deverão ser devidamente caracterizados (artigo 9º).

 

                                               Anualmente os taxistas devem providenciar a renovação de seus alvarás de estacionamento, apresentando os documentos exigidos pela Administração Pública (artigo 15).

 

                                               A legislação municipal em comento exige que os taxistas mantenham os veículos em “boas condições de tráfego” e que satisfaçam as “obrigações fiscais e previdenciárias” (artigo 28). Estabelece ser obrigação do taxista  tratar com polidez e urbanidade os passageiros, trajar-se adequadamente, dentre outras (artigo 29), prevendo punições para o descumprimento (artigo 31 e 32).

 

                                               A atividade está sujeita a cobrança de taxas (artigo 30).

                                                O número de veículos táxis em circulação obedece à proporcionalidade estabelecida em lei (Lei 117-A – fls. 34).

 

                                               A forma de cobrança, da mesma forma, é definida pelo legislador (Lei 2.115 – fls. 31, Decreto 2158-A – fls. 87).

 

                                               Os taxistas têm de observar restrições, inclusive, no tocante ao fumo e à publicidade em seus veículos (Lei 2.288 – fls. 33 e Lei 579-A – fls. 36/37).

 

                                               A prestação de serviços é fato gerador do imposto sobre a prestação de serviços de qualquer natureza, recolhido pelos taxistas.

 

                                               Registre-se que o legislador considera contravenção penal o exercício de profissão ou atividade econômica sem o preenchimento das condições legais (artigo 47 do Decreto-lei 3.688/41). Ainda na esfera penal, a conduta poderá se adequar ao disposto no artigo 195, III, da Lei 9.279 que dispõe que comete crime de concorrência desleal aquele que emprega meio fraudulento para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem.

 

                                               Constata-se, portanto, que a mera colocação no mercado de consumo de serviço em desacordo com a legislação constitui-se em prática abusiva que demanda intervenção do Estado em defesa do consumidor. Nessas hipóteses, o prejuízo é presumido, devendo a atividade ser interrompida.

 

                                               Ademais, o serviço que vem clandestinamente sendo prestado pela ré não fornece ao consumidor as garantias concedidas pelos profissionais autorizados pela Administração Municipal que devem comprovar o preenchimento de condições que demonstrem sua idoneidade e aptidão para o regular exercício da atividade, sem expor a perigo os passageiros ou a coletividade.

 

                                               Devidamente identificados, os taxistas e condutores de lotação encontram-se sujeitos a diuturna fiscalização exercida pelos agentes de trânsito, medida de caráter repressivo e preventivo que reforça a segurança do consumidor. O mesmo não se pode dizer dos serviços prestados pela ré.

 

                                               O consumidor que se utiliza dos serviços da ré, no mais das vezes, desconhece estar contribuindo com atividade ilícita. Conforme se apurou, estabelecimentos comerciais como supermercados e pizzarias (fls. 184 e 193/194) estimulam a atividade que, assim, desenvolve-se com aparência de regularidade.

 

                                               O consumidor que se utiliza do serviço ilícito além de, sem o saber, ver-se privado das garantias previstas pelo legislador, expõe-se a situações constrangedoras, pois corre o risco de ter sua viagem interrompida pelo exercício das atividades fiscalizatórias da Administração Pública e das forças policiais, uma vez tratar-se de infração administrativa e penal.

 

O consumidor não tem como formalizar reclamações contra a ré e enfrentará dificuldades para processá-la na hipótese de ter sofrido algum prejuízo. Em razão da clandestinidade, seus veículos não são identificados.

Os panfletos divulgados pela cidade não contém maiores dados identificadores da empresa prestadora dos serviços, apenas números de telefone e endereço na rede mundial de computadores. Ocorre que ao se buscar acessar o endereço da internet divulgado no panfleto (.br) a conexão é encaminhada a página de outra empresa, sediada em Barueri (Av. Cachoeira, nº 174—Sala 01—Jd. Esperança — Barueri—SP    CEP: 06413-000).

                                               A forma de cobrança, ademais, é distinta da estabelecida pelo legislador municipal, que impõe aos taxistas a adoção de taxímetros, estabelecendo valores para a “bandeirada”, para o quilômetro percorrido e para a “hora lenta ou parada”, e às lotações, tarifas fixas.  A ré adota tabela que poderá implicar na cobrança de valores superiores àqueles que seriam cobrados pelos taxistas.

 

                                               A ré não convenceu a Municipalidade ao tentar obter autorização para desempenhar a atividade de “locação de veículos com motorista” por ter sido constatado não se tratar de locação de veículos, propriamente dita, mas de transporte remunerado individual de passageiros, conforme destacado pelas firmes decisões do Diretor de Transportes Básicos (fls. 146/147, 154/155 e 162/163).

 

                                               O erário público também é duplamente prejudicado com a atividade. A ré, além de não recolher o imposto que incide sobre os serviços que presta, ao retirar clientes dos taxistas causa redução dos tributos por estes devidos à Municipalidade.

 

                                               A Prefeitura Municipal não tem conseguido coibir a atividade ilegal, conforme se infere das declarações colhidas ao longo das investigações. Mesmo após ter-se instado a Secretaria de Transportes para que reforçasse a fiscalização, a atividade continua sendo desempenhada, conforme se extrai do relato dos taxistas ouvidos ao longo da investigação. A empresa investigada se recusa a obedecer, voluntariamente, ao ordenamento jurídico. Logo, imprescindível a atuação do Poder Judiciário.

 

                                               Consigne-se que a responsabilidade da ré é objetiva, conforme determina o artigo 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor. A teoria da responsabilidade objetiva dos fornecedores foi consagrada, ainda, no artigo 931 do Código Civil, aplicável à hipótese dos autos por força do disposto no artigo 7º  do CDCon.

 

 

 

                                               IV – DO PEDIDO LIMINAR

 

 

                                               Nos termos do artigo 84, parágrafo terceiro, do Código de Defesa do Consumidor:

 

                    “Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após, justificação prévia, citado o réu”.

 

 

                                              No caso dos autos, a violação à legislação é clara. Diante disso há de se assegurar, desde já, o respeito ao ordenamento jurídico.

 

                                               Registre-se que o pedido liminar nada mais é do que a determinação para que a ré respeite à lei.

 

                                               Neste sentido:

 

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Objetivo - Coibir prática irregular de transporte clandestino de passageiros - Concessão de liminar, com arbitramento de multa pecuniária diária - Admissibilidade - Livre convencimento do Juiz - Recurso não provido (JTJ 212/193)

 

                                               Ante o exposto, requer-se seja concedida liminar para os fins de determinar à ré que:

 

                                               1) se abstenha de realizar atividade semelhante à de táxi, qual seja, o transporte remunerado de passageiros;

 

                                               2) se abstenha de divulgar, por qualquer forma, a atividade ilícita;

 

                                               3) tudo sob pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais);

Requer-se, ainda, como medida liminar, (4) seja determinado às operadoras de telefonia (Embratel ou Telefônica) e de rádio comunicador (Nextel), que alterem os números de telefone e do rádio utilizados pela empresa: 3203-4707, 3203-4790 e 7803-3861 – id 7*13495 (fls. 192).

O artigo 461 do Código de Processo Civil dispõe que, na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigações de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação “bem como determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento”.

No caso dos autos constatou-se que a ré se utiliza do telefone para atender aos pedidos de seus clientes.

Distribui pela cidade material de propaganda divulgando os números das linhas telefônicas e rádios comunicadores dos quais se utiliza para desempenhar sua atividade clandestina.

Sendo assim, com fulcro no dispositivo processual acima destacado, é mister determinar a alteração dos números utilizados pela ré.

A providência é importante para assegurar a cessação da atividade ilícita, diante das dificuldades em realizar sua fiscalização.

Além do que, facilitará a identificação do descumprimento da medida pleiteada no item “2” supra, uma vez que a divulgação de novos panfletos, com os novos números, tornará patente a afronta à vedação judicial.

 

V – DO PEDIDO

 

 

                                               Em vista de todo exposto, requer o Ministério Público, ao final, a procedência dos pedidos abaixo discriminados condenando-se a ré:

 

                                                1) em obrigação de não fazer consistente em não realizar atividade semelhante à de táxi, qual seja, o transporte remunerado de passageiros, até que, eventualmente, seja obtida a imprescindível autorização do poder público, com a prestação dos serviços por veículos adequados (táxis) e profissionais habilitados (taxistas);

 

                                               2) em obrigação de não fazer consistente em não divulgar, por qualquer forma, a atividade ilícita;

 

3) tornar definitiva a alteração dos números de telefone e rádio comunicador requerida no item “4” dos pedidos liminares;

                                               4) condenação genérica por danos materiais e morais causados aos consumidores, danos esses que deverão ser executados em processos individuais de liquidação da r. sentença que for proferida na presente, nos termos do artigo 95, do CDC.

 

                                               Em caso de descumprimento de qualquer das obrigações acima, requer-se seja imposto o pagamento de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a ser recolhida ao fundo de que trata o art. 13 da Lei Federal nº 7.347/85.

 

 

 

                                               VI – OUTROS REQUERIMENTOS

 

                                               Requer-se, outrossim:

 

                                               a) a citação postal da ré, na pessoa de seu representante legal, para, querendo, responder aos termos da presente, sob pena de revelia;

 

                                               b) seja determinada a publicação de edital na forma preceituada pelo artigo 94 da Lei no 8.078/90, a fim de que eventuais interessados possam tomar conhecimento do ajuizamento da presente ação;

 

                                               c) que todas as intimações do Ministério Público para os atos do processo sejam feitas pessoalmente (art. 236, parágrafo 2º, do CPC);

 

                                               d) a produção de todas as provas permitidas em direito, sem exceção de qualquer uma delas;

 

                                               e) o recebimento das cópias em anexo do Inquérito Civil n.º 112/07 como parte integrante dessa inicial;

 

                                               f) a inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor;

 

                                               g) seja observado o disposto no artigo 18 da Lei 7.347/85 e artigo 87 da Lei 8.078/90.

 

                                               Termos em que, atribuindo à causa o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais),

                                               Pede deferimento.

 

                                               São Vicente, 27 de abril de 2.009.

 

Rol de Testemunhas

1.     Durval Olegário da Silva – Presidente da Associação dos Taxistas Rádio Táxi de São Vicente – Praça Cora Coralina, nº 208, Catiapoã, São Vicente, fone (13) 3468-4840, fax (13) 3468-7738;

2.     Carlos Alberto de Jesus Líbano (fls. 193/194);

3.     Benvindo Nery de Almeida (fls. 189);

4.     Antonio Queiroz (fls. 197).

 

                                               JOSÉ ANTONIO CABRAL GARCIA

3º Promotor de Justiça

 

 

 

 

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