Senna, Jose Julio



Senna, Jose Julio. " Intervenções no câmbio e seus efeitos". São Paulo: Valor Econômico, 12 de Julho de

2001. Jel: G

Intervenções no câmbio e seus efeitos

Jose Julio Senna

As intervenções do Banco Central no mercado de câmbio tornaram-se o assunto do momento mas, na verdade, já constituíam tema relevante desde o mês de março, quando o Banco Central começou a manifestar descontentamento com o preço do dólar.

Na prática, existem duas formas de intervenção: a esterilizada e a não esterilizada. Na primeira, a venda de dólares em mercado é compensada por uma compra de títulos, de modo a que se mantenha inalterado o mercado monetário. Na segunda, permite-se a contração do estoque de moeda e a conseqüente alta dos juros, ou altera-se diretamente o nível do juro.

A experiência tem demonstrado que, qualquer que seja o caminho escolhido, não se pode contar com o sucesso das intervenções. A primeira opção, na verdade, é quase sinônimo de insucesso. Para que se aumente a probabilidade de êxito, é fundamental que se faça a escolha pela intervenção não esterilizada. A razão é simples, e pode ser assim resumida. Quando as autoridades decidem vender divisas e preservam, ao mesmo tempo, o curso da política em vigor, a mensagem é uma só: estamos descontentes com o nível do câmbio. Quando, além de vender divisas, as autoridades modificam a política econômica, duas mensagens são transmitidas: o patamar do câmbio não nos satisfaz e estamos tentando alterar o curso dos acontecimentos.

Ao que parece, foi esta última a opção feita pelo Banco Central, quando deu início às intervenções, em março. As vendas de dólar e de papéis cambiais curtos foram acompanhadas de uma mudança de 50 pontos na taxa básica de juro. Em tese, essa alta ajudaria a conter o déficit em conta corrente e reduziria a inflação, fatores estes que seguramente estavam por trás (inter alia), e ainda estão, da depreciação do real. Tal estratégia voltou a ser praticada nos dois meses seguintes, compondo a primeira etapa da política de intervenções. Como o câmbio passou de R$ 2,10 para R$ 2,48 em meados de junho, a tentativa não se mostrou bem sucedida.

A fase seguinte teve início com o aumento da taxa Selic em 150 pontos, em 20 de junho. Dando-se continuidade à política em vigor, de deixar claros os vínculos entre intervenção e mudança de fundamentos, pôs-se em prática, imediatamente, uma estratégia pesada de vendas de divisas. Ao mesmo tempo, anunciaram-se um esforço adicional de mobilização de recursos externos, que permitiriam uma atuação mais agressiva do Banco Central, e novas mudanças de fundamentos, incluindo-se a redução de impostos sobre as exportações e o fim da CPMF em aplicações financeiras, o que acabou não se concretizando. Até aqui, estávamos diante de uma reprodução da primeira etapa, em escala mais significativa.

A segunda etapa, porém, não se limitou a representar uma dosagem maior dos medicamentos. O Banco Central fez também uma aposta (de alto risco), na medida em que deixou clara a sua intenção de reverter as cotações do dólar, furando o que seria uma "bolha especulativa". Ao mesmo tempo em que seassegurava a disposição de "irrigar" o mercado, argumentava-se que o preço da divisa estava exageradamente elevado. Como em todo processo de depreciação os fatores explicativos costumam ser a piora dos fundamentos e movimentos especulativos, o que se buscava com a aposta era justamente testar a importância relativa desse segundo componente. Na medida em que a especulação fosse relevante, as cotações do dólar cairiam, de modo sustentável, diante da ação do Banco Central.

A experiência internacional tem demonstrado também que as chances de sucesso nas intervenções no câmbio crescem quando o componente especulativo da depreciação tem peso expressivo. Uma vez constatado que este não parece ser o caso atual, fazia sentido alterar (novamente) a estratégia. De fato, para que insistir no "cabo-de-guerra" com o mercado, tentando-se reverter aqueda do real, se esse processo parece resultar de fatores objetivos, que não se reverterão a prazo curto? Às autoridades monetárias cabia reconhecer que dificilmente conseguiriam mobilizar recursos externos em volume suficiente para enfrentar as conseqüências de uma deterioração de fundamentos.

A terceira etapa das intervenções constitui, justamente, um reconhecimento do que se disse acima. Ao confirmar que o lote disponível para venda é de US$ 6 bilhões, o Banco Central sinaliza que há limites para a sua atuação. A mensagem básica, a nosso ver, parece clara: o montante anunciado é a contribuição que se pode oferecer, diante dos atuais problemas de balanço de pagamentos. E o suprimento será linear, exatamente para que as cotações flutuem, em consonância com o regime em vigor. Naturalmente, não é possível descartar novas medidas, sempre na tentativa de reforçar a saúde do sistema econômico, podendo envolver o FMI.

Por fim, o que se depreende desses desdobramentos é que, para ser coerente, o Banco Central dificilmente promoverá um choque de juros. Se a questão se resume a uma piora dos fundamentos, uma alta forte da taxa Selic só contribuiria para agravar o quadro existente. Se a meta de inflação deste ano for ultrapassada, não será um grande problema, desde que não se esmoreça na luta pelo cumprimento dos números de 2002.

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