Continental testa alga e pinhão para voar



Continental testa alga e pinhão para voar

quinta, 08 janeiro 2009. Valor Econômico   

Houston, a capital mundial da energia, com mais de 3 mil empresas ligadas ao setor de petróleo e gás, sediou ontem o primeiro vôo de uma companhia aérea americana com biocombustível, em mais uma etapa da busca da indústria de aviação por insumos menos danosos ao ambiente capazes de substituir os derivados de petróleo. O Boeing 737-800 da Continental Airlines decolou na manhã ensolarada de ontem, em Houston, com um de seus dois motores abastecido de uma mistura de 50% de biocombustível feito com algas e pinhão-manso e 50% de querosene de aviação (QAV) tradicional.

Foi a maior quantidade de combustível usada até hoje num vôo, sem passageiros, e a primeira vez que uma empresa aérea testou um insumo feito a partir de algas — uma das matérias-primas mais estudadas para produzir combustíveis alternativos. O teste, que durou cerca de duas horas, foi definido como uma mostra de que biocombustíveis são tecnicamente viáveis. Mas do ponto de vista econômico, mais alguns anos são necessários até que se possa abastecer aviões no dia-a-dia.

“O que estamos fazendo hoje é desenvolver o lado técnico. Feito isso, restam o lado econômico e a questão da produção da matéria prima”, disse Larry Kellner, CEO da Continental. “Mas estamos todos muito surpresos com a velocidade em que as coisas estão acontecendo.” Em cinco anos, diz ele, a Continental estará abastecendo pelo menos uma parte dos seus vôos com biocombustível.

A Continental, cuja sede é em Houston, é a terceira aérea mundial a voar com biocombustível, depois da Virgin e da Air New Zealand. A Japan Airlines será a próxima. No dia 30, a JAL fará um vôo com um Boeing 747 abastecido comum oitavo de combustível feito a partir de óleo de camelina (conhecida como falso linho).

Em fevereiro de 2008, a Virgin usou uma mistura de 80% de QAV (querosene de aviação) e 20% de óleo de babaçu e coco numa das quatro turbinas de um 747. O mesmo modelo de jato foi usado em dezembro pela Air New Zealand, mas desta vez com um dos motores preenchido com metade de QAV e 50% de óleo de pinhão manso (jatropha, em inglês).

No cenário mais otimista, a utilização comercial de novos insumos em aviões poderá ser realidade em três anos, segundo Jennifer Holmgren, responsável pela unidade de energias renováveis da UOP, empresa que desenvolveu a tecnologia para o refino dos óleos vegetais usados no teste. Ela diz que no primeiro semestre deste ano a UOP começará a licenciar sua tecnologia a refinarias. A produção de biocombustível aéreo em grande escala poderia, então, ter início sem grandes alterações na infra-estrutura já existente.

O passo seguinte será certificar o biocombustível para aeronaves de forma a garantir que ele atenda todos os padrões da indústria aérea. James Kinder, engenheiro sênior da fabricante de jatos americana Boeing, o processo ainda está no estágio de compilação de dados e passará por inúmeras avaliações até que seja licenciado, num prazo estimado em dois anos. “O biocombustível usado nos vôos é praticamente igual ao QAV”, diz Mike Epstein, líder de tecnologia da CFM, uma sociedade entre a General Electric e a Snecma que fabrica turbinas. “Alguns aspectos como a lubricidade precisam sermelhorados, mas não é algo difícil de ser feito.”

A grande barreira a ser transposta parece ser a produção de matéria-prima a um custo acessível e em quantidade suficiente para abastecer a indústria aérea. Combustíveis derivados de vegetais produzidos em larga escala, como o milho e a cana, estão fora de questão — também podem ser consumidos como alimentos e têm uma produtividade menor.

A grande aposta da indústria está nos biocombustíveis da segunda geração, que não competem com a produção de alimentos. O pinhão manso, por exemplo, não é comestível e cresce em regiões áridas. A alga, por sua vez, tem uma altíssima produtividade. Segundo a Associação Nacional da Alga, dos EUA, ela pode gerar até dez mil galões de óleo por acre, contra 250 do pinhão manso ou 50 da soja.

Em relação ao preço, Holmgren, da UOP, conta que 85% do custo do biocombustível é a matéria-prima. “Desde que ela custe o mesmo do que o galão de petróleo, o galão de biocombustível será competitivo”, diz. William Thurmond, diretor de pesquisa da Associação Nacional da Alga, diz que ainda não existe produção dessa matéria-prima em grande escala, o que dificulta a queda do preço. Mas as projeções apontam para um cenário otimista. Em 2007, segundo Thurmond, estimava-se um custo de US$ 3 mil por galão de óleo de alga. No início de 2008, a projeção havia baixado para US$ 250 e hoje fica entre US$ 8 e US$ 20. Ainda assim, é mais custoso do que o galão do petróleo, hoje em torno dos US$ 2.

“O importante é que, a longo prazo, explorar petróleo está ficando cada vez mais caro, ao passo que a produção de biocombustível só tende a baratear”, diz Sanjay Pingle, presidente da Terasol, empresa americana que forneceu o óleo de pinhão manso produzido no Brasil para os vôos da Continental e da Air New Zealand.

A ascensão recorde dos preços do petróleo ao longo de 2008 foi um importante motivador das pesquisas por insumos não-fósseis. Só o combustível responde por cerca de 40% dos custos operacionais das companhias aéreas e 31 delas quebraram em 2008, segundo a Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata). Outras dezenas de empresas foram obrigadas a aposentar seus aviões menos econômicos, o que resultou em encolhimento dos serviços e demissões.

A outra forte motivação para a busca de novas fontes de energia, necessariamente menos poluentes, é a pressão cada vez maior para que a indústria aérea reduza suas emissões de carbono, que representam cerca de 3% de toda emissão mundial. Em meados de 2008, as companhias aéreas espernearam para ficar de fora do esquema de comércio de carbono que começa a vigorar em 2012 na União Européia, mas o parlamento europeu votou maciçamente pela inclusão do setor. Nesse sistema, elas terão que pagar por qualquer emissão acima do limite — máximo de 85% de emissão em relação aos volumes registrados entre 2004 e 2006 —, o que daria uma conta de 3,4 bilhões só em 2012,

€ segundo uma reportagem do “Financial Times”. Embora a queima de biocombustível gere tanto carbono quanto o QAV tradicional, ela é compensada pela absorção de carbono da atmosfera por parte das matérias-primas vegetais durante seu crescimento.

Pelo menos dois grupos foram formados em 2008 para estudar novas fontes de energia, um deles pela fabricante de jatos européia Airbus e pela empresa aérea JetBlue, dos EUA, e outro encabeçado pela Boeing e mais nove empresas aéreas que juntas respondem por 15% de todo o uso de QAV no mundo, entre elas a própria JAL e a Air France-KLM.

Sem oxigênio e mais estável

Já existe tecnologia para transformar praticamente qualquer óleo vegetal em combustível de aviação, segundo a empresa americana de pesquisas em refino UOP. O processo desenvolvido por ela consiste em basicamente duas etapas. Na primeira delas, retira-se todo o oxigênio do óleo da matéria-prima vegetal.

Sem oxigênio, o combustível resultante fica estável. Durante a segunda fase, as moléculas com extensas cadeias de carbono são quebradas em moléculas menores e menos pesadas, o que é importante para reduzir a temperatura de congelamento do combustível. O querosene de aviação tradicional congela a 47°C negativos, enquanto a mistura de óleo de pinhão-manso e algas usada pela Continental congela a 54°C negativos.

A UOP começou a desenvolver a tecnologia de refino em 2006 para gerar combustível renovável para aviões militares dos Estados Unidos, por encomenda da Agência de Projetos de Pesquisa Avançada do departamento de Defesa americano (Darpa)

Roberta Campassi, de Houston

A repórter viajou a convite da Continental

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