VARIABILIDADE, TENDÊNCIA, ANOMALIA E MUDANÇA CLIMÁTICA

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VARIABILIDADE, TEND?NCIA, ANOMALIA E MUDAN?A CLIM?TICA

Profs. Luiz Roberto Angelocci e Paulo C?sar Sentelhas

Material did?tico para uso exclusivo na disciplina LCE 306 ? Meteorologia Agr?cola Departamento de Engenharia de Biossistemas - setor de Agrometeorologia - ESALQ/USP - 2010

1. INTRODU??O

A varia??o espacial e a flutua??o temporal s?o caracter?sticas inerentes ao tempo e ao clima. A flutua??o temporal ? uma caracter?stica que deve ser discutida com maiores detalhes, pois o seu estudo nas mais diferentes escalas cronol?gicas permite compreender como era o clima terrestre no passado long?nquo (paleoclima), no passado recente e como o ? no presente, al?m de permitir, a partir de modelos, simular situa??es de clima no futuro. Para um melhor entendimento do estudo das flutua??es clim?ticas, ? necess?rio entender os conceitos de variabilidade, tend?ncia, anomalia e mudan?a clim?tica. Ao se referir ao clima, deve-se lembrar que est? se trabalhando com escalas de tempo de no m?nimo 30 anos, podendo estas serem prolongadas ? escalas t?o grandes, como a de eras geol?gicas.

A combina??o das escalas temporal e espacial dos fen?menos meteorol?gicos gera a variabilidade clim?tica, que se refere ?s flutua??es das condi??es meteorol?gicas e, por extens?o, das condi??es clim?ticas em torno da m?dia climatol?gica, como se observa na Figura 1 referente ? precipita??o pluvial anual de Piracicaba desde 1917.

Observa-se na Figura 1 que ? poss?vel detectar, em um determinado per?odo, valores crescentes (tend?ncia crescente), como ocorreu com a chuva anual em Piracicaba entre 1933 e 1943 ou decrescente (tend?ncia decrescente), como foi observada de 1996 a 2005. As tend?ncias, por ocorrerem em per?odos curtos, n?o devem ser confundidas com mudan?as do clima.

As vari?veis meteorol?gicas em determinado per?odo podem, eventualmente, sofrer uma flutua??o grande de um elemento em uma s?rie climatol?gica, ou seja, desvio acentuado do padr?o observado de variabilidade, caracterizando uma anomalia clim?tica. Esses eventos an?malos est?o normalmente associados a uma fator causal, os quais podem ter v?rias origens. O mais comum atualmente s?o as anomalias associadas aos eventos El Ni?o e La Ni?a. Na Figura 1 observa-se duas anomalias de precipita??o em Piracicaba, uma de 812 mm em 1921 e outra de 2018 mm em 1983.

Figura 1. Varia??o da precipita??o anual em Piracicaba, SP, a partir de 1917. J? mudan?a clim?tica ? um termo que designa uma tend?ncia de altera??o estat?stica significativa

da m?dia de um elemento climatol?gico ou de sua variabilidade em per?odos de tempo mais extensos, como d?cadas ou s?culos.

Deve-se ressaltar que n?o h? uma distin??o absoluta entre os termos variabilidade, tend?ncia, anomalia e mudan?a clim?tica, pois dependendo da escala de tempo de estudo, certa flutua??o que poderia ser considerada uma variabilidade numa escala de mil?nios, pode ser considerada uma mudan?a na escala de d?cadas ou s?culos. As Figuras 2 e 3 ajudam a entender isso, ao mesmo tempo que permitem uma vis?o da varia??o da temperatura global da Terra em v?rias escalas de tempo. As

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condi??es clim?ticas terrestres no passado podem ser inferidas por indicadores biol?gicos (f?sseis) ou inorg?nicos (minerais, sedimentos, paisagens trabalhadas por gelo), bem como por m?todos f?sicoqu?micos (exemplo, raz?o isot?pica O18/O16 de carbonatos de sedimentos ou em esqueletos de f?sseis), an?lise de an?is de crescimento de ?rvores. Nessas figuras a variabilidade ? dada em termos de oC em rela??o ? m?dia da temperatura terrestre global no in?cio do s?culo XX. Na Figura 3a ? poss?vel verificar a tend?ncia estimada por v?rios modelos clim?ticos da temperatura global da Terra nos ?ltimos dois mil anos, sendo que a partir de 1860, observa??es diretas da temperatura da superf?cie terrestre e a evolu??o das t?cnicas de observa??o permitiram uma estimativa mais confi?vel, mostrada na Figura 3 b.

Observa-se que ao longo das eras geol?gicas foram estimadas flutua??es t?rmicas de at? cerca de 5oC, na maioria do tempo com temperaturas abaixo das observadas atualmente, mas com per?odos de valores superiores em 1oC em rela??o aos atuais. Apesar das aproxima??es dos modelos de estimativa e dos problemas de observa??o da temperatura da superf?cie de oceanos e continentes, que come?aram a ser medidas sistematicamente nos ?ltimos 150 anos, verifica-se que a Terra passou por um per?odo quente na idade medieval e por um resfriamento relativamente intenso entre os s?culos XVII e XVIII (pequena idade glacial). Embora a tend?ncia natural esperada seja o aquecimento no per?odo atual, ? preocupante a intensidade desse aquecimento, principalmente a partir de 1980, a uma taxa que se sup?e ultrapassar qualquer outra experimentada em milh?es de ano.

a

Varia??o de Temperatura (oC)

800.000

600.000

400.000

200.000

0

b

10.000

8.000

6.000

4.000

2.000

0

Anos

Figura 2. Varia??o estimada da temperatura global da Terra nos ?ltimos 900.000 (a) e nos ?ltimos 10.000 anos. (b) Fonte: Intergovernamental Panel on Climate Change Report, 1990.

Anos

Anos

(a)

(b)

Figura 3. Varia??o da temperatura global nos ?ltimos 2000 (a) e nos ?ltimos 150 anos (b), expressa pelas diferen?as (anomalias) em rela??o ? m?dia no s?culo XX. Na figura b as maiores flutua??es referem-se ao uso da m?dia anual (linha azul) e as menores ?s m?dias de q?inq??nios (linha vermelha). Fonte : Global Warming, Wikipedia, 2007.

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As causas da variabilidade do clima podem ser reunidas em tr?s grandes grupos: a) Terrestres A modifica??o da composi??o atmosf?rica, principalmente dos gases de "efeito estufa" absorvedores de ondas eletromagn?ticas longas emitidas pela Terra, por causas naturais ou antropog?nicas, ? considerado um grande fator de variabilidade clim?tica. A a??o antropog?nica est? presente pelas atividades industriais, queima de combust?veis f?sseis, atividades agr?colas em v?rios aspectos (modifica??o do uso do solo, desmatamento, irriga??o por inunda??o, etc.), A modifica??o da concentra??o dos gases de efeito estufa ? considerada por muitos cientistas como um fator determinante de aquecimento global, com consequ?ncias sobre o clima, efeitos esses que podem durar s?culos. Para esses cientistas, o CO2, por exemplo, seria um dos gases mais ponder?veis nesse caso, porque a varia??o da sua concentra??o na atmosfera tem sido muito grande ao longo do tempo (Figuras 4a e 4b), sendo que por a??o antropog?nica, os n?veis atingidos nos ?ltimos 250 anos n?o t?m precedentes nos ?ltimos 400.000 anos. Outros gases de efeito estufa absorvedores de ondas eletromagn?ticas na banda acima de 3.000 nm s?o o metano (CH4,) o ?xido nitroso (N2O) e os clorofluorcarbonos (CFC). A modifica??o da concentra??o de oz?nio, absorvedor na banda do ultra-violeta, tamb?m pode exercer efeito no balan?o de energia radiante na Terra. A Figura 3 apresenta a tend?ncia de aquecimento acentuado da Terra no s?culo XX, com sua acelera??o maior a partir de 1980. Tem-se real?ado a rela??o entre a acelera??o do aquecimento e as a??es humanas, principalmente as que contribuem para o aumento dos gases de efeito estufa na atmosfera. As atividades humanas a partir da Revolu??o Industrial (meados do s?culo XVIII) t?m contribu?do para alterar a concentra??o de gases de efeito estufa na atmosfera e para modificar as condi??es de cobertura de superf?cie, que afetam o balan?o de radia??o na superf?cie Outra causa natural pode ser o vulcanismo, que libera cinzas e poluentes (sulfetos, por exemplo), afetando o balan?o de energia, normalmente com tend?ncia de resfriamento pela atenua??o da radia??o solar, o que n?o seria uma justificativa para o que vem ocorrendo em termos de aquecimento global.

Figura 4. Varia??o estimada da concentra??o de CO2 na atmosfera terrestre nas eras geol?gicas (superior) e nos ?ltimos 50 anos (inferior). O quadro inserido na figura inferior refere-se ?s varia?~~oes m?dias sazonais em um ciclo anual. Fonte: Global Warming, Wikipedia, 2007.

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Outra causa de origem terrestre ? a modifica??o dos tipos de nuvens formadas. Uma hip?tese ? que um aquecimento do planeta poderia originar nuvens mais espessas, com maior absor??o e reflex?o de ondas curtas, diminuindo a incid?ncia de radia??o na superf?cie e tendo a??o de realimenta??o ("feedback") negativa sobre o aquecimento global. Diz-se que h? um efeito de realimenta??o porque uma conseq??ncia original do aquecimento, nesse caso o aumento da nebulosidade, contribuiria a seguir para um efeito tamb?m sobre o balan?o de energia radiante. A realimenta??o ? positiva se refor?a o efeito de aquecimento, ou negativa se contribui para o resfriamento. No caso das nuvens espessas, a realimenta??o ? negativa porque elas contribuem para a diminui??o da irradi?ncia solar e, consequentemente, em certo grau, com um efeito contr?rio ao aquecimento. No mesmo sentido, pode se falar na modifica??o das condi??es da cobertura da superf?cie terrestre, como por exemplo, o derretimento do gelo. O albedo (poder refletor ou refletividade da superf?cie para ondas curtas) da neve ? bem maior do que o da ?gua l?quida, e o derretimento do gelo teria um efeito alimentador positivo sobre o aquecimento global, pela maior absor??o de radia??o pela superficie com ?gua l?quida. Modifica??es de origem antropog?nica da superf?cie terrestre (desmatamento, urbaniza??o, substitui??o de um tipo de cobertura por outra, etc.) podem causar realimenta??o positiva ou negativa, dependendo do tipo de modifica??o.

Outro causa de modifica??o clim?tica, que pode ser considerada em termos de eras geol?gicas, ? a modifica??o da distribui??o de continentes e oceanos. Cita-se, tamb?m, a modifica??o temporal do campo magn?tico da Terra (paleomagnetismo) como um poss?vel causador de mudan?as clim?ticas por afetar a localiza??o dos p?los magn?ticos do planeta.

b) Astron?micas

O valor da inclina??o (atualmente de 23o27') e da posi??o do eixo da Terra em rela??o ao plano da Ecl?ptica n?o ? constante, mas varia lentamente, considerando-se que as varia??es extremas sejam da ordem de 1,3oC, negativo ou positivo, em rela??o ? m?dia de 23,3oC na escala de 1.000.000 de anos. Considera-se que essa varia??o seria muito maior se n?o houvesse o efeito gravitacional da presen?a da Lua. As varia??es da inclina??o do eixo determinam modifica??es espaciais e temporais na irradi?ncia solar da superf?cie terrestre, mais acentuadas quanto maior a latitude e poderiam contribuir para modifica??es clim?ticas em longas escalas de tempo.

c) Extra-terrestres

Uma causa classificada nesse grupo ? a varia??o da atividade do Sol, medida pelo n?mero de manchas na sua superf?cie. Por registros do n?mero de manchas desde o s?culo XVI, ? poss?vel deduzir que do in?cio das observa??es at? aproximadamente 1700, o n?mero delas foi muito pequeno, indicando uma diminui??o da atividade solar, que aumentou entre 1700 e 1780, caindo novamente at? cerca de 1820. H? cientistas que consideram essas varia??es como o fator determinante das mudan?as clim?ticas, conforme discutir-se-? no item seguinte.

2. O AQUECIMENTO GLOBAL E A MUDAN?A (VARIA??O?) CLIM?TICA RECENTE

2.1 As evid?ncias do aquecimento global recente, as predi??es para o futuro e os questionamentos

O aquecimento global recente da Terra est? no centro de uma das grandes pol?micas da ci?ncia, pois a complexidade do assunto do ponto de vista cient?fico ? intensificada pelas implica??es s?cioecon?micas e pol?ticas das decorrentes mudan?as clim?ticas que podem afetar toda a humanidade. A preocupa??o com a modifica??o da composi??o dos gases de efeito estufa, principalmente pela a??o do Homem e seu poss?vel efeito no aquecimento global, seguida das conseq??ncias clim?ticas desse fato, come?ou a ganhar relev?ncia na d?cada de 1970, levando ? cria??o em 1988 do Painel Intergovernamental sobre Mudan?as Clim?ticas (IPCC, na sigla em ingl?s) pela Organiza??o Meteorol?gica Mundial (OMM, ?rg?o da ONU), em conjunto com o Programa das Na??es Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), congregando hoje cerca de 2500 cientistas e t?cnicos das mais diferentes forma??es no estudo do tema, com participa??o aberta para todos os pa?ses membros da OMM e do PNUMA.

A complexidade do tema ? colossal, pois ele envolve n?o s? a atmosfera, mas tamb?m as superf?cies terrestres, ou seja, continentes, oceanos e a criosfera (gelo marinho e camadas de gelo das mais diferentes formas sobre os continentes), dos quais dependem as varia??es clim?ticas. Al?m disso, todos os processos s?o extremamente vari?veis no tempo, tornando o sistema relativamente ca?tico. A isso, associa-se a extens?o do sistema de estudo, n?o permitindo a reprodu??o dos fenj?menos atmosf?ricos em laborat?rio, ou seja, as mudan?as clim?ticas s? podem ser estudadas na escala natural,

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na qual ? imposs?vel realizar experimentos "in situ" simuladores dos efeitos de fatores atuantes no clima. Adicionalmente, deve-se registrar que h? falhas no conhecimento de como funcionam exatamente os sistemas clim?ticos.

Por esses motivos, lan?a-se m?o de estudos de paleoclimatologia e de climas passados para conhecer suas rela??es com a estrutura e composi??o dos sistemas que os determinaram (composi??o da atmosfera, distribui??o de oceanos e continentes, constitui??o geomorfol?gicas, etc.). Outro aspecto importante ? a observa??o meteorol?gica, que nos ?ltimos 150 anos, evoluiu muito, principalmente a partir da d?cada de 1970. Pela impossibilidade de experimentos "in situ" e pelos in?meros fatores envolvidos, a t?cnica de modelagem da varia??o clim?tica, principalmente voltada para o aquecimento global, tem sido usada para predizer as poss?veis condi??es clim?ticas at? o final do s?culo XXI.

Os dados do IPCC sobre temperatura global, medida a partir de 1860 (ver Figura 3) por cerca de 6.000 esta??es meteorol?gicas de superf?cie, com corre??o para efeitos de "ilhas urbanas de calor" indicam aumento m?dio da temperatura no s?culo XX de 0,6 oC ?0,2oC, sendo que no per?odo de 1906 a 2005 a tend?ncia foi de 0,74 oC ?0,18oC, com o maior aumento a partir de 1956. Deve-se ressaltar que essa tend?ncia varia espacialmente, sendo que no hemisf?rio norte e nas latitudes maiores h? evid?ncias de maior aquecimento.

Al?m dessa constata??o, o quarto relat?rio do IPCC (2007) aponta quais seriam as principais evid?ncias de que o aquecimento global pode estar mudando o clima terrestre, obtidas a partir de observa??es diretas do clima recente, resumidamente listadas a seguir:

Entre 1995 e 2006 ocorreram 11 dos 12 anos mais quentes desde 1850.

A concentra??o de vapor d'?gua atmosf?rico tem aumentado pelo menos desde 1980, sobre os

oceanos e os continentes, bem como na troposfera superior, pela maior capacidade de reten??o de vapor

d'?gua pelo ar, devido ao aumento de sua temperatura.

A temperatura m?dia global dos oceanos tem aumentado at? profundidades de 3000m, o que

contribui para a expans?o t?rmica e o aumento do n?vel dos oceanos.

As geleiras de montanhas e as superf?cies geladas t?m diminu?do nos dois hemisf?rios.

A Groel?ndia e a Ant?rtida tem apresentado perda de camadas de gelo, contribuindo para o

aumento do n?vel dos oceanos. A temperatura na regi?o ?rtica aumentou ? taxa duas vezes superior ? da

m?dia global nos ?ltimos 100 anos (? necess?rio informar que a temperatura na regi?o tem larga

variabilidade temporal; um per?odo mais quente j? foi observado de 1925 a 1945). No ?rtico, a ?rea de

gelo tem encolhido em m?dia 2,7%?0,6% por d?cada desde 1978, com acr?scimo maior no ver?o (at?

7,4% / d?cada). O n?vel dos oceanos tem aumentado ? taxa de 1,8 mm/ano a partir de 1961 (in?cio das

medidas), sendo maior a partir de 1993 (3,1 mm? 0,7 mm por ano). Estima-se que a eleva??o m?dia do

n?vel dos mares no s?culo XX chegou a 0,17 m. Observa??es de taxas similares ocorreram antes de 1961

e h? necessidade de observa??es de sat?lites por longo prazo para confirmar essa evid?ncia.

A precipita??o aumentou significativamente nas partes orientais da Am?rica do Sul e do Norte,

Europa Meridional, ?sia Central e Meridional. A freq??ncia de eventos de chuva tem aumentado na maior

parte das ?reas continentais, de forma coerente com o aquecimento e a maior quantidade de vapor d'?gua

da atmosfera. No Sahel, no Mediterr?neo, no sul da ?frica e partes do sul da ?sia, tem-se observado

diminui??o da precipita??o. Em outras regi?es n?o se tem observado tend?ncias de modifica??o das

chuvas a longo-prazo. Al?m de muito vari?vel, faltam dados de chuvas em algumas regi?es. H? certa

evid?ncia de mudan?a dos n?veis de precipita??o e evapora??o sobre os oceanos.

Os ventos de oeste (circula??o geral) t?m-se intensificado a partir de 1960, nos dois hemisf?rios.

Nos ?ltimos 50 anos tem-se observado mudan?as das temperaturas extremas (m?ximas e m?nimas)

, com menor freq??ncia de dias e noites frios e de geadas, e maior de dias e noites quentes e de ondas

de calor.

H? evid?ncia de aumento de atividade cicl?nica intensa no Atl?ntico Norte desde 1970, relacionada

ao aumento da temperatura da superf?cie do oceano, bem como alguma evid?ncia de aumento dessa

atividade em outras regi?es. A variabilidade temporal e a qualidade dos registros de ciclones tropicais

antes de 1970 n?o permitem ter uma tend?ncia clara do ocorrido at? esse ano.

N?o foi poss?vel detectar mudan?a: a) na amplitude de varia??o di?ria de temperatura (as tend?ncias

s?o muito vari?veis de uma regi?o para outra); b) em fen?menos de pequena escala (tornados, granizo,

raios e tempestades de areia; c) na extens?o do gelo oce?nico da Ant?rtida (mostra variabilidade

interanual e mudan?as localizadas, sem tend?ncia estat?stica significativa).

Desse quarto relat?rio de 2007 do Painel Intergovernamental para a Mudan?a Clim?tica (IPCC) extraiu-se um documento dirigido aos formuladores de pol?ticas ambientais, informando que:

a) A concentra??o dos gases de efeito estufa na atmosfera (principalmente di?xido de carbono, metano e ?xido nitroso) tem aumentado desde 1750, em grande grau por a??es antropog?nicas, originando um "for?amento radiativo" positivo da Terra. O for?amento pelo CO2 aumentou de 20% de 1995 a 2005.

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b) O aumento de aeross?is na atmosfera (sulfatos, C org?nico, carv?o, nitrato e poeiras) tem um efeito contr?rio (for?amento radiativo negativo), mas que representa apenas cerca de 20% daquele dos gases de efeito estufa.

c) As mudan?as de oz?nio troposf?rico, principalmente pelas emiss?es de ?xido nitroso, mon?xido de carbono, halocarbonos (clorofluorcarbonos, por exemplo) tem um efeito de for?amento radiativo positivo, equivalente a cerca de 1/8 daquele dos gases de efeito estufa acima citados.

d) Mudan?as do albedo (refletividade de ondas curtas) pela modifica??o de coberturas da superf?cie terrestre tem for?amento positivo (igual a cerca de 1/10 daquele dos gases de estufa) e a deposi??o de aeross?is sobre neve tem for?amento negativo (cerca de 1/20 daquele dos gases estufa).

e) Mudan?as da emiss?o solar tem causado for?amento radiativo positivo (equivalente a cerca de 1/20 daquele dos gases de efeito estufa).

Os relat?rios do IPCC s?o redigidos com base nos estudos de cerca de 1200 cientistas no mundo e procura fazer uma avalia??o do conhecimento atual sobre o assunto. Nesse quarto relat?rio (o pr?ximo est? previsto para 2013), os cientistas procuraram deixar claro que ? inequ?voca a tend?ncia de aumento da temperatura e que das for?antes que a causam, aquelas de origem antropog?nica s?o as determinantes. Afirmam, tamb?m, que o maior conhecimento do sistema clim?tico e a possibilidade de elaborar modelos preditivos confirmam a tend?ncia de aquecimento global a longo prazo, que seria irrevers?vel por s?culos, mesmo que as for?antes de origem humana fossem diminu?das a partir de agora.

O que se procura nas predi??es do clima futuro (considera-se que ? poss?vel fazer a modelagem nesse caso para um per?odo m?ximo de um s?culo) ? projetar cen?rios de emiss?es dos poluentes e seu controle, bem como da modifica??o de uso dos solos, para se estimar as conseq??ncias clim?ticas. Devese considerar, tamb?m, que efeitos de realimenta??o ("feedback") no sistema clim?tico, discutidos acima, complicam as predi??es. Pela complexidade do clima, ? muito dif?cil estimar o grau de modifica??o dos regimes de chuvas e de ventos, inclusive quanto ? distribui??o espacial dessas modifica??es, pois se sabe que n?o h? uniformidade dos efeitos nas diferentes regi?es.

As dificuldades apontadas tem levado a resultados discrepantes de proje??es do aquecimento global, como se v? na Figura 5, mostrando uma proje??o de aumento m?dio da temperatura global at? 2100 de 2oC (1,1o a 2,9oC) no melhor cen?rio e de 4oC (2,4oC a 6,4oC) no pior cen?rio, sendo que a distribui??o do aquecimento seria espacialmente heterog?neo, com maior aquecimento do hemisf?rio N.

Figuras 5. Predi??es de aumento de temperatura global da Terra at? o final do s?culo XXI, por diferentes modelos (a) e sua distribui??o espacial entre 2070 e 2100 (b). Fonte: Global warming. Wikipedia, 2007.

Um grupo de pesquisadores brasileiros fez recentemente uma predi??o para o nosso pa?s, para o mesmo per?odo. No melhor cen?rio, o qual contempla a??es para n?o aumentar a polui??o atmosf?rica por gases de efeito estufa, a temperatura passaria do atual valor m?dio para o pa?s de 25oC (dada pelas normais climatol?gicas de 1961-1990) para 26,3oC e no pior cen?rio, para 28,9oC no final deste s?culo. A Amaz?nia seria a regi?o mais afetada (aumento de 3o a 8oC e redu??o das chuvas de 10% a 20%). Para o Nordeste, a proje??o de aumento de temperatura ? de 2,2o a 4,0o C, no Pantanal de 3,4 a 4,6oC e na regi?o Sul de 2,3 a 3,5o C, respectivamente no melhor e no pior cen?rio.

A predi??o para a Amaz?nia ? alarmante, n?o somente pelos altos valores de aumento de temperatura e seus conseq?entes efeitos ambientais na pr?pria regi?o, mas tamb?m porque ela ? fonte de vapor d'?gua para outras regi?es do Brasil, principalmente o sudeste. Portanto, al?m do efeito sobre a

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diminui??o das chuvas na pr?pria Amaz?nia, o efeito do aquecimento e da diminui??o do transporte de vapor a partir da regi?o atuaria tamb?m sobre o regime de chuvas de outras regi?es do pa?s

Independente das incertezas, que os estudos sobre a varia??o clim?tica e suas conseq??ncias geram, a maioria da comunidade cient?fica tem se inclinado para a aceita??o das conclus?es dos relat?rios do IPCC, que servem de base inclusive para recomenda??es nas confer?ncias pol?ticas para o meio ambiente (Rio, Kioto, Copenhagen). No entanto, h? um grupo de cientistas, denominados genericamente de "c?ticos", que tem feito criticas e promovido um debate mais acirrado sobre os estudos e as conclus?es do IPCC. Parte deles aceita a conclus?o sobre o aquecimento global, mas questiona o alarmismo em rela??o ao assunto, porque muitas das previs?es das conseq??ncias do aquecimento global sobre as modifica??es clim?ticas, principalmente sobre os regimes de chuvas,vento e dos extremos clim?ticos, exigem muitos estudos voltados para o conhecimento desses efeitos e como isso se refletir? na resposta dos sistemas terrestres. Al?m disso, ? necess?rio ainda se saber mais sobre como a rela??o clima-oceanos ocorre, fator importane no estabelecimento das condi??es clim?ticas.

Um outro ponto questionado por esse grupo de cientistas ? sobre a confiabilidade das medidas de temperatura global. Ela ? determinada a partir das esta??es meteorol?gicas de superf?cie, parte delas com suas s?ries climatol?gicas afetadas pela presen?a de n?cleos urbanos pr?ximos a elas (para o que se tenta fazer uma corre??o nos c?lculos). A m?dia global ? calculada com divis?o do globo terrestre em faixas de 5o de latitude por 5o de longitude, sendo calculada uma m?dia ponderada mensal para as esta??es de cada sec??o, a qual ? comparada com a refer?ncia para o per?odo 1961-1990, tendo-se ent?o a anomalia para cada m?s e, a partir dela, a anomalia global anual. As cr?ticas centram-se na localiza??o das esta??es e dos problemas de sua manuten??o. Afirma-se que ? das 6.000 esta??es que mediam no passado deixaram de funcionar, al?m de haver propens?o de desativa??o preferencial daquelas situadas em maior latitude e altitude, contribuindo para aumento da tend?ncia da temperatura global. Outra fonte de erro pode ser a modifica??o das t?cnicas de medida desde 1860, Medidas de temperatura da troposfera entre 1000 e 8000 m de altitude, com uso de sat?lites e t?cnica que se estima ter precis?o de 0,01oC, mostram diverg?ncia com os dados obtidos a partir de superf?cie, com tend?ncia a indicar um aquecimento menor que o previsto a partir das esta??es de seuperf?cie, com discrep?ncias entre os dois tipos de medidas nas diferentes regi?es. Outro questionamento ligado a este ? se seria v?lido falar de uma ?nica temperatura global para um sistema t?o complicado como o do clima da Terra.

Outro tipo de questionamento ocorre sobre algumas evid?ncias propostas pelo IPCC, como a eleva??o dos n?veis dos mares, por exemplo, j? discutido acima como pass?vel ainda de confirma??o por medidas a longo prazo via sat?lites. H? hip?teses para explicar o derretimento de gelo marinho na regi?o ?rtica, que n?o seria causado por aquecimento, mas talvez por funcionamento de correntes mar?timas. Questiona-se se o derretimento do gelo marinho realmente modificaria o n?vel dos oceanos, ao contr?rio do derretimento do gelo continental, como por exemplo, da Ant?rtida, que aparentemente tem sido menos afetada pelo aquecimento, que poderia aumentar o n?vel dos oceanos caso estes fossem atingidos pela ?gua do gelo continental derretido . H? questionamento, inclusive, sobre a magnitude de aquecimento dos oceanos, que pelos c?lculos do IPCC, absorve 80% do calor gerado pelo aquecimento global. O questionamento dos "c?ticos" que traz maiores conseq??ncias para os aspectos pr?ticos dasmudan?as clim?ticas ? se realmente os gases de efeito estufa representam a principal for?ante do aquecimento global. A justificativa desse grupo ? que, se aceitos os valores de clima passado previstos pelos modelos de paleoclima, ? dif?cil encontrar uma rela??o entre a varia??o da temperatura e a concentra??o desses gases na atmosfera, principalmente o do CO2. Para esse grupo de cientistas, a principal for?ante seria a varia??o da atividade solar, para a qual mostra-se ter uma rela??o com o clima na Terra (acredita-se que essa foi a principal causa da pequena idade glacial nos s?culos XVII e XVIII). Entre meados da d?cada de 1940 e 1970, mesmo com o aumento da concentra??o do CO2, houve uma diminui??o da temperatura global, que levou ent?o os cientistas a crerem que estava o planeta entrando numa nova era glacial, mesmo com o aumento dos n?veis de gases de efeito estufa na atmosfera, o que se reverteu at? o final do s?culo XX, com o aquecimento.

Os cientistas "c?ticos" prev?em uma queda ou mesmo a revers?o pr?xima do aquecimento, pois o Sol est? entrando em per?odo de diminui??o de sua atividade. Por outro lado, o argumento de cientistas pr?-aquecimento ? de que o arrefecimento t?rmico nas pr?ximas duas d?cadas por essa for?ante (atividade solar), seria no m?ximo uma diminui??o de 0,3oC, insuficiente para reverter totalmente o processo. Ao argumento dos c?ticos de que os invernos mais rigorosos que aconteceram ultimamente nos Estados Unidos, Europa (e at? na China) seriam uma indica??o do per?odo de resfriamento que a Terra estaria entrando, cientistas apoiadores da tese do aquecimento argumentam que esses invernos mais rigorosos somente s?o decorr?ncia da variabilidade natural do clima, principalmente quanto a extremos. A defini??o se os gases de efeito estufa representam ou n?o a principal causa de mudan?as clim?ticas tem uma implica??o s?cio-econ?mica e pol?tica muito grande. Se positivo, o homem tornou-se o principal respons?vel por essas mudan?as e cabe a ele decidir as medidas para cont?-las, por medidas como mitiga??o, defini??o de metas para diminui??o da polui??o e da taxa de aumento da temperatura, redefini??o de uso da terra, etc. Caso os "c?ticos" estejam com a raz?o, tamb?m isso exigiria mobiliza??o

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dependente de um poss?vel grau de resfriamento causado pela diminui??o da atividade solar. Qualquer que seja a situa??o, mesmo com a maioria dos cientistas mostrando as evid?ncias do aquecimento global ao longo deste s?culo, h? um dilema que exige a diminui??o das incertezas sobre o funcionamento do sistema clim?tico, para que as decis?es sejam tomadas em maior base cient?fica, dentro de um contexto em que o embate pol?tico e econ?mico entre as na??es ser? sempre um pano de fundo.

2.2. Impactos do aquecimento global e das mudan?as clim?ticas para a agricultura

Com a aceita??o pela maioria da comunidade cient?fica de que est? ocorrendo um aquecimento global que persistir? por longo tempo, com evid?ncias de mudan?as clim?ticas, in?meros estudos de simula??o dos seus efeitos sobre processos naturais e sobre atividades humanas tem sido realizados, como sobre aumento do n?vel dos oceanos e de fen?menos clim?ticos extremos, sobre os biomas, sobre a produ??o de energia el?trica, sobre doen?as (humanas ou n?o), sobre pragas, produtividade vegetal, balan?os h?dricos, zoneamento de culturas, etc. A bibliografia ? extensa e ainda com as ressalvas que existem sobre a validade das proje??es, ? interessante ter-se conhecimento de trabalhos dos efeitos das mudan?as clim?ticas sobre a agricultura. Concentrar-se-? aqui em algumas delas de maior interesse, principalmente as produzidas no Brasil. O livro de C. Rosenzweig e D. Hillel, "Climate change and the global harvest: potential impacts of the greenhouse effect on agriculture" (University Press, 324 p., 1998) ? uma obra em ingles, relativamente abrangente e num excelente n?vel para quem est? sendo introduzido no assunto.

No Brasil, deve-se citar o trabalho do Centro Nacional de Pesquisas de Inform?tica na Agricultura (CNPTIA), da EMBRAPA, que desenvolve um programa de estudos sobre o aquecimento global e a produ??o agr?cola do Brasil, em coopera??o com outras institui??es cient?ficas do pa?s, cujos resultados est?o dispon?veis no site http;//.br., incluindo-se a publica??o "O aquecimento global e cen?rios futuros da agricultura brasileira". Diante dos m?ltiplos cen?rios projetados para o aquecimento global em fun??o de atividades econ?micas, no citado estudo foram adotados dois cen?rios: um mais pessimista de aquecimento (cen?rio A2), com aumento entre 2oC e 5,4oC at? 2.100 devido ao crescimento cont?nuo da temperatura e dos gases de efeito estufa, pelo fato da economia mundial seguir as tend?ncias atuais, com implementa??o lenta de novas tecnologias, sem ado??o de padr?es mundiais; outro mais otimista (cen?rio B2) com aumento da temperatura de 1,4 a 3,8oC em 2100, com aumento menos acentuado da popula??o e, com o mundo com solu??es locais de sustentabilidade s?cioecon?mica e ambiental, e de mudan?as tecnol?gicas com menor emiss?o de gases de efeito estufa. As proje??es foram feitas para algod?o, arroz, caf?, cana-de-a??car, feij?o, girassol, mandioca, milho e soja, considerando a probabilidade de riscos para a agricultura, nos seguintes anos: 2020, 2050 e 2070. O estudo estima varia??o das ?reas com baixo risco clim?tico de cultivo no Brasil, portanto potencialmente aptas quanto ao clima, e projeta cen?rios pelos quais, com exce??o da cana-de-a??car e da mandioca, que apresentam proje??o de aumento da ?rea de baixo risco de plantio, para as demais regi?es citadas ocorreria diminui??o dessa ?rea de baixo risco (ou, raciocinando inversamente, aumentaria a ?rea de risco ponder?vel).

Um outro exemplo de aplica??o ? o trabalho de Wrege et al., "Simula??o do impacto do aquecimento global no somat?rio de horas de frio (NHF) no Rio Grande do Sul" (Revista Brasileira de Agrometeorologia, v. 14, p. 347-352, 2006), O n?mero de horas de frio ? um ?ndice bioclim?tico utilizado para caracterizar a disponibilidade de baixas temperaturas para esp?cies de clima temperado. Os autores do estudo simulam a modifica??o da distribui??o das ?reas com faixas de valores desse n?mero entre maio e setembro naquele estado, mostrando que com um aumento de 1oC nas temperaturas m?nimas haveria um aumento da superf?cie de ?reas dispon?veis para materiais menos exigentes em frio (abaixo de 350 horas anuais), com diminui??o da ?rea para os mais exigentes. Com um aumento das m?nimas de 3oC,desapareceriam as ?reas com mais de 350 horas anuais de frio e com um dr?stico aumento de 5,8oC n?o haveria mais ac?mulo de horas de frio no estado.

Steinmetz et al. (ANO???) publicaram o trabalho "Aumento da temperatura m?nima do ar na regi?o de Pelotas, sua rela??o com o aquecimento global e poss?veis consequ?ncias para o arroz irrigado no Rio Grande do Sul", (XIV Congresso Brasileiro de Agrometeorologia, CD, 2005), verificando que de 1897 a 2004 as temperaturas m?nimas tiveram tend?ncia de aumentar 1,0o C na m?dia anual, com acentua??o a partir de 1955 (aumento de 1,7oC), sendo que nos meses de dezembro a mar?o os aumentos foram ainda mais acentuados. Concluiram que se essa tend?ncia for mantida, a cultura do arroz irrigado no estado poderia ser beneficiada pela diminui??o de risco de frio na fase reprodutiva, mas prejudicada pelo decr?scimo do potencial de produtividade.

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