RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA - Centro de Apoio ...
|PROPOSTA DE RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA |
Exposição inicial.
A alimentação e a nutrição constituem requisitos básicos para a promoção e a proteção da saúde, possibilitando a afirmação plena do potencial de crescimento e desenvolvimento humano, com qualidade de vida e cidadania.
A importância da alimentação está associada à sua capacidade de fornecer ao corpo humano os nutrientes necessários ao seu sustento e conseqüente sobrevivência. Para o equilíbrio harmônico desta tarefa é fundamental a sua ingestão em quantidade e qualidade adequadas, de modo que funções específicas como a plástica, a reguladora e a energética sejam satisfeitas, mantendo assim a integridade estrutural e funcional do organismo. No entanto, esta integridade pode ser alterada, em casos de falta de um ou mais nutrientes, ou por dificuldades geradas por problemas de saúde, com conseqüente deficiência no estado nutricional e necessidade de suplementação[1].
A legislação brasileira - Lei Federal 8080/90 – explicita a alimentação como um dos fatores condicionantes da saúde (art.3º, caput) e estabelece como uma das atribuições específicas do SUS a vigilância nutricional e orientação alimentar (art.6º). Portanto, ao Estado (gênero) cabe formular, avaliar e apoiar políticas de alimentação e nutrição, e, nos casos em que a alimentação tem status de fármaco (como é o caso das dietas enterais) tem o dever de fornecê-la de acordo com os princípios e normas do Sistema Único de Saúde.
Considerando:
1. que o artigo 196, da Constituição Federal, preconiza que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”;
2. o contido no artigo 197, da Constituição Federal, que estabelece que "são de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle”;
3. o art. 198, da Carta Magna, que determina que “as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: (...) II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais”;
4. a regulamentação desses dispositivos pela Lei Federal nº 8.080/90, que estabelece que a atuação do Estado, no que se refere à saúde, se efetiva através do Sistema Único de Saúde, e estipula, em seu art. 2º, que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”;
5. o art. 3º, caput, da mencionada Lei Orgânica, que dispõe que a “saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais (...)” e o art. 6º, onde estão estabelecidas como atribuições específicas do SUS “a vigilância nutricional e orientação alimentar“, bem como “o controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se relacionem com a saúde, compreendidas todas as etapas e processos, da produção ao consumo”;
6. que compete à direção nacional do Sistema Único da Saúde (SUS) “formular, avaliar e apoiar políticas de alimentação e nutrição”, conforme prevê o art. 16, inc.I, da Lei Federal 8080/90;
7. o teor da recente normatização do Ministério da Saúde, relativa à execução e financiamento da assistência farmacêutica na atenção básica, consubstanciada na Portaria nº 2.892, de 26 de novembro de 2009, que no § 2º, do art. 1º, explicita que “os medicamentos e insumos para o Combate ao Tabagismo e para a Alimentação e Nutrição integram o Componente Estratégico do Bloco de Financiamento da Assistência Farmacêutica”;
8. segundo a Portaria Ministerial nº377/1999, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, dieta enteral é o "alimento para fins especiais, com ingestão controlada de nutrientes, na forma isolada ou combinada, de composição definida ou estimada, especialmente formulada e elaborada para uso por sondas ou via oral, industrializado ou não, utilizada exclusiva ou parcialmente para substituir ou complementar a alimentação oral em pacientes desnutridos ou não, conforme suas necessidades nutricionais, em regime hospitalar, ambulatorial ou domiciliar, visando a síntese ou manutenção dos tecidos, órgãos ou sistemas". Dieta enteral pode ser indicada para adultos e crianças, dependendo do caso clínico[2].
9. que, diferentemente do que fez com os insumos e fármacos de combate ao tabagismo e alguns contraceptivos, a citada Portaria nº 2.982/09 deixou de regulamentar e/ou disciplinar, em seus anexos, o assunto relacionado à alimentação e nutrição;
10. a considerável demanda de questionamentos encaminhados ao Ministério Publico Estadual (Promotoria Proteção à Saúde Pública de Curitiba e Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Proteção à Saúde Pública, pelos órgãos de execução do Ministério Público do interior do Estado), no sentido de esclarecer regulamentação e nesta a responsabilidade pelo fornecimento de Dietas Enterais (incluído nesta categoria o leite especial), no âmbito do SUS [3];
11. o conteúdo da Nota Técnica nº84/2010-CGPAN/DAB/SAS/MS, da Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde, que explicita que “o Sistema Único de Saúde- SUS não dispõe de programa para dispensação de Leites Especiais e Dietas Enterais e não possui legislação ou protocolo específico para esta questão, sendo necessário que o assunto seja avaliado pelas três esferas de gestão do sistema no sentido de estabelecer políticas que orientem a solução de demandas como esta, a curto, médio e longo prazo”.
12. que, ainda, na citada Nota Técnica, o departamento especializado em alimentação e nutrição do Ministério da Saúde reconhece a “necessidade de organização de serviços estruturados baseados em Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas nos estados e municípios, como passo inicial para consolidação de um fluxo de triagem, diagnóstico, tratamento, dispensação de produtos e acompanhamento destes pacientes na rede pública de saúde, como exemplo do que já ocorre em alguns municípios como Aracaju e Curitiba”.
13. não ser recente a ausência de regulamentação sobre o assunto (quase três anos), eis que a Portaria Ministerial nº 3.237, datada de 24 de dezembro de 2007, revogada pela já mencionada Portaria 2.892, de 26 de novembro de 2009, também não definia critérios e responsabilidades para o fornecimento de dietas enterais;
14. o disposto no artigo 127, da Constituição Federal da República, que dispõe que “o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis";
15. que compete ao Ministério Público da União, conforme disposto no art. 6º, inc. XX, da Lei Complementar nº75/93, “expedir recomendações, visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como ao respeito, aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover, fixando prazo razoável para a adoção das providências cabíveis”;
16. o contido nos artigos 129, inciso II, da Constituição Federal, e 120, inciso II, da Constituição do Estado do Paraná, que atribuem ao Ministério Público a função institucional de “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia”;
17. a disposição do artigo 27, parágrafo único, inciso IV, da Lei Federal n.º 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, o qual faculta ao Ministério Público expedir recomendação administrativa aos órgãos da administração pública federal, estadual e municipal;
o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (e MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ), respectivamente representados pelo doutor ____________ e pelo (doutor __________) no uso de suas atribuições legais, resolvem:
RECOMENDAR
ao doutor JOSÉ GOMES TEMPORÃO, d. Ministro de Estado da Saúde, para que determine, através do Departamento de Atenção Básica – Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição, ou ao órgão que couber, divulgando o presente ato, o estabelecimento de critérios e responsabilidades para o fornecimento de dieta/nutrição enteral (inclusive, leite especial) pelo Sistema Único de Saúde, no prazo de até noventa dias.
Outrossim, estabelece-se o prazo de cento e vinte dias, a contar do recebimento da presente, para que a d. autoridade comunique as providências determinadas para a sua observância.
Comunique-se, enviando cópia da recomendação, ao Conselho Nacional de Saúde.
Data
Assinaturas
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[1] MOURA, M.R.L. & REYES, F.G.R. Interação fármaco-nutriente: uma revisão. Rev. Nutr., vol.15, no.2, p.223-238, maio/ago, 2002.
[2] Para adultos, é indicada em casos de AVC, doenças desmielinizantes, anorexia nervosa, neoplasia de esôfago, perfuração traumática de esôfago, doenças inflamatórias intestinais, Síndrome do Intestino Curto, fístulas digestivas, queimaduras e alguns tipos de câncer. Em crianças, é indicada em casos de anorexia, tubo gastrointestinal funcionante, mas incapaz de se alimentar VO, necessidade de alimentação noturna, necessidade de gotejamento contínuo após diarréia grave, estados hipercatabólicos, motilidade gástrica prejudicada, refluxo gastroesofagiano, pneumonia aspirativa e vômito.
[3] A fim de averiguar essa questão, em 20 de abril do ano em curso, foi instaurado pela referida unidade ministerial, o Procedimento de Acompanhamento e Verificação nº60/2010.
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