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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

ESCOLA DE TEATRO

LAIS SANTOS ALMEIDA

QUANDO EU ERA PEQUENO:

A CRIAÇÃO DRAMATÚRGICA DE ADOLESCENTES A PARTIR DA MEMÓRIA DA INFÂNCIA

Salvador

2015

LAIS SANTOS ALMEIDA

QUANDO EU ERA PEQUENO:

A CRIAÇÃO DRAMATÚRGICA DE ADOLESCENTES A PARTIR DA MEMÓRIA DA INFÂNCIA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentada à Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia, como requisito para a obtenção do grau de Licenciatura em Teatro

Orientador: Prof. Ms. Hayaldo Copque Fraga de Oliveira

Co-orientador: Prof. Dr. Paulo Henrique Alcântara

Salvador

2015

As minhas duas mães, Maria Francisca (mãe sanguínea) e Cintia Almeida (minha irmã e mãe de consideração), por sempre acreditarem nos meus sonhos e no meu jeito menina mulher de ser.

A minha linda e encantadora sobrinha Ananda que com seu jeitinho carinhoso me inspirou também para a escrita sobre infância.

Ao meu sobrinho Vitor que cuidei por muitos anos como se fosse meu filho e que de certa forma fez parte da minha infância estando presente nos momentos lúdicos.

A todos os indecisos que ainda não conseguiram achar seu caminho profissional. Não se preocupem, eu demorei, mas achei. Aqui está a prova. Vocês também irão conseguir!

AGRADECIMENTOS

Os agradecimentos são inúmeros...

A Deus, acima de tudo, porque sem ele nada sou. A fé que me move e me sustenta nesse mundo louco, cheio de desafios e obstáculos, só existe porque é nele que acredito. Agradeço a Deus, os espíritos de luz que me acompanham, em especial meu anjo protetor, e o espírito abençoado de Santo Antônio a quem sou devota.

Aos meus avôs maternos Marcos e Rosalina (em memória) que infelizmente não puderam conviver comigo, mas sempre estiveram me acompanhando espiritualmente e presentes no meu coração. A eles sou grata por manterem as tradições que foram passadas para a minha mãe e repassadas para mim. As memórias dessas vidas que não pude partilhar me acompanham através das lembranças e dos poucos costumes familiares que conseguimos manter. Acho linda a tradicional reza de Santo Antônio que meu avô realizava e em homenagem a essas memórias defendo essa monografia juntamente com a habitual oração da trezena, finalizando a minha defesa com muito orgulho e emoção. E grata pela imensa cultura familiar que foi construída por vocês.

A minha mãe Maria Francisca pela bela infância que tive e por eu ser quem sou hoje. A minha formação pessoal deve-se a você. Me orgulho da criação que tive. Não poderia ter melhores lembranças da infância, obrigada! Sou grata por cada brincadeira no quintal, cada história que ouvia no momento de dormir, pelas nuvens que ficávamos olhando deitadas no tapete e que se transformavam nos mais diversos formatos, pelas bonecas, por tudo! Por ter sido uma criança muito feliz! Te amo mãe!

A Cintia Almeida, minha irmã e mãe de consideração, eu não sei nem como agradecer o tanto que essa mulher já fez por mim. Sei que eu vim para a vida dela como filha, pois foi assim que ela me tratou e me trata até hoje. Se existe amor incondicional eis aqui a prova. Agradeço a essa linda mulher, delicada e carinhosa, tudo que tive e quem sou até hoje. Obrigada por ter me ajudado sempre e apoiado em todos os momentos, por ter me perdoado quando errei, por ser minha confidente e AMIGA de todas as horas. Amo você minha tchuca!

A minha irmã Adriana Almeida, obrigada por suportar, juntamente com minha mãe e Cintia, minhas crises de estresse e ansiedade nesses últimos meses. Sou grata por você entender minhas elucubrações e me apoiar profissionalmente me enviando as trezentas mil vagas de emprego e concursos que você fica sabendo. Te amo!

A meu pai Salvador, que com seu jeito sereno torce por mim em todas as circunstâncias. Um homem puro que me ensinou que a vida deve ser vivida com tranquilidade. Amo você meu pai!

A meu irmão Vagner, que também é meu pai de consideração, agradeço pelas brincadeiras na infância. Jamais vou esquecer dos lindos momentos de alegria empinando pipa, correndo pela casa, andando de bicicleta para ir a escola com a saia azul, do jogo de polícia e ladrão que gerou sua queda horrorosa em cima das garrafas de vidro, enfim obrigada pelos maravilhosos momentos lúdicos que construíram a minha infância. Te amo!

A minha cunhada Débora, agradeço por acreditar em meu potencial sempre e por ter tanto carinho por mim. Obrigada por me ensinar tanto e pelo jeito cuidadoso.

Ao meu tio e padrinho Aurino (em memória), que infelizmente teve que partir desta vida ano passado, agradeço pelo amor que tinha por mim. Mesmo com a distância do dia-a-dia lembrava-se de mim e estava torcendo por meu sucesso profissional sempre. Mais uma vitória alcançada e essa também é para você! Se não fosse seu incentivo talvez eu não tivesse persistido nesse caminho tão cheio de obstáculos e com fatores desestimulantes.

Aos meus parentes, tios, tias e primos que sempre torcem pelo meu crescimento profissional e estão presentes em muitos momentos, sejam eles de alegria ou tristeza.

A meu orientador Prof. Hayaldo Copque que me aturou durante todo esse tempo da produção do meu TCC me auxiliando com muito carinho e dedicação. Além de ter me acalmado em diversos momentos de crises típicas de quem escreve uma monografia. Obrigada Hayaldo, sem a sua orientação, conhecimento, competência e paciência eu não teria amadurecido tanto como pesquisadora. E sem os breves momentos de risos em meio a toda essa agonia eu não teria conseguido controlar a minha ansiedade e escrever o TCC.

A meu co-orientador Prof. Paulo Henrique Alcântara que com sua imensa paciência estimulou, a todo momento, a escrita da pesquisa. Com seu apoio e ampla sabedoria na área de dramaturgia e memória o meu TCC ficou mais completo. Sua contribuição foi delicada e pontual.

Ao meu ex-professor João Sanches, agradeço imensamente, pois ele foi um dos grandes incentivadores desse trabalho. Ele, involuntariamente, me ajudou a encontrar e definir meu objeto de pesquisa ao estimular a minha escrita em sala de aula. Obrigada também por aceitar o convite em participar da banca ampliando ainda mais minha experiência na área da dramaturgia.

A professora Adelice Souza que aceitou o convite para participar de minha banca e contribuiu muito com sua experiência e conselhos fazendo com que o meu trabalho ficasse mais rico.

Aos meus queridos alunos participantes da oficina que construíram comigo o meu objeto de pesquisa. Agradeço os aprendizados que partilhamos juntamente com as brincadeiras, segredos e sorrisos.

Ao Colégio Aliança por todo apoio para a realização dessa pesquisa. Principalmente minhas ex-coordenadoras e amigas, Jeronice Brito e Patricia Souza. E a colaboração fundamental da diretora professora Maria e a funcionária Aline, que cooperaram intensamente para o acontecimento da oficina. Agradeço também aos meus grandes amigos, professores do Colégio Aliança, que sempre estão ao meu lado, me apoiando. Jamais quero perder a amizade de vocês. Obrigada: Marcondes, Érica, João Gabriel, Frank, Ives, Bruno, Juliana e minhas tchucas, fofas, Ana Carla e Bárbara.

A todos os professores dos cursos de Licenciatura em Teatro e Bacharelado Interdisciplinar em Artes que ao transmitirem o seu conhecimento contribuíram muito com a minha formação, sem eles eu não teria chegado até aqui.

Aos funcionários da Universidade Federal da Bahia, especificamente Seu Geraldo e Val. Vocês foram pessoas importantes nesse processo de formação acadêmica. Sempre disponíveis e dispostos a ajudar. Com vocês aprendi mais ainda que solidariedade é essencial para a vida. Obrigada por tudo! Que a vida de vocês seja iluminada sempre, com muito sucesso, porque vocês merecem, são pessoas do bem.

A minha mais nova amiga Manoela que nos últimos meses tem escutado todos os meus devaneios e dilemas. Que tem sido mais que uma psicóloga ao me ouvir tanto. Que se tornou, aos poucos, uma grande amiga que também torce e se preocupa comigo. Uma pessoa de alma boa que desejo tudo de bom nessa vida. Espero que nossa amizade cresça cada vez mais e que tenhamos diversos momentos de risos. Obrigada por me aturar nessa loucura de TCC nesses últimos tempos.

Aos meus amigos incentivadores sempre presentes, dando amor e força, agradeço imensamente o carinho durante essa jornada, especialmente aos meus grandes amigos: Jamile Cruz, Joice Paixão e Vitor Carvalho. Sou grata por me aturarem nesses últimos meses me acalmando após as mensagens desesperadoras.

Por fim, agradeço imensamente a uma pessoa especial que entrou na minha vida a pouco tempo e me conquistou rapidamente tornando-se parte da minha história e sendo um grande incentivador, principalmente para a produção dessa pesquisa: obrigada Luan Spínola! Agradeço por me fazer companhia virtual nas madrugadas de escrita do TCC e durante meus momentos de ansiedade. Você estava ali, sempre presente, dando a maior força e acreditando em meu potencial! Amo você!

“...E o vento traz lembranças que ficou guardado na memória/ De uma infância que passou/ Saudade que bate no peito faz a gente chorar/ Saudade que vem e que vai como as ondas do mar/ Tempos bons que se foram e não voltam mais/ Ser criança é só uma vez e nunca mais”

(Tangela Vieira)

RESUMO

Este trabalho trata-se de uma monografia de conclusão de curso de Licenciatura em Teatro. O objetivo dessa investigação, dividida em três capítulos, foi pesquisar a criação dramatúrgica a partir da memória da infância através de uma oficina realizada com estudantes do Colégio Aliança, na faixa etária dos 11 aos 16 anos, no bairro de Brotas, em Salvador. A finalidade da oficina foi incentivar e desenvolver a criação dramatúrgica coletiva, o que resultou em uma mostra teatral. Tal Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) utilizou para o processo teorias e metodologias baseadas nos estudos de Stanislavski; as propostas de Beatriz Cabral; os jogos teatrais e improvisações de Viola Spolin; algumas das ideias de Maria Eugênia Milet e Paulo Dourado; e os jogos de Augusto Boal. Além de outros teóricos que norteiam a pesquisa, como Henri Bérgson. Dessa forma, foi realizada a investigação e dividida em quatro etapas.

Palavras-chave: Dramaturgia; Memória; Infância; Teatro;

SUMÁRIO

1. APRESENTAÇÃO.................................................................................................11

2. MEMÓRIA, INFÂNCIA E TEATRO .......................................................................15

2.1 MEMÓRIA ...................................................................................................15

2.2 INFÂNCIA ...................................................................................................20

2.3 TEATRO E MEMÓRIA ...............................................................................24

3. AS PRODUÇÕES TEXTUAIS................................................................................27

3.1 EM MINHA VIDA ........................................................................................27

3.2 DRAMATURGIA EM SALA DE AULA .......................................................28

4. QUANDO EU ERA PEQUENO – A EXPERIÊNCIA .............................................35

4.1 PRIMEIRA ETAPA – O ENCONTRO..........................................................37

4.2 SEGUNDA ETAPA – O SURGIMENTO......................................................41

4.3 TERCEIRA ETAPA – A CONSTRUÇÃO....................................................45

4.4 QUARTA ETAPA – A MOSTRA ................................................................48

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................50

REFERÊNCIAS ....................................................................................................55

ANEXOS .............................................................................................................. 60

1. APRESENTAÇÃO

O caminho foi árduo e pedregoso. As indecisões foram inúmeras. As crises de ansiedade e nervosismo foram constantes. Mas com muita garra eu consegui chegar até aqui. Em um simples estalo, dentre as diversas possibilidades do teatro, encontrei a minha área de pesquisa: a dramaturgia. E fui atrelando a isso todos os meus desejos.

Sou bacharel em Jornalismo e em Artes e sempre desejei unir todas as minhas áreas de estudo em meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) da Licenciatura em Teatro, mas não sabia como. Desde meu ingresso no curso de licenciatura fiquei confusa sobre o quê pesquisar. Surgiram muitas ideias, vontades e curiosidades até que no quinto semestre apareceu o componente Criação coletiva de texto, que despertou em mim o interesse pela dramaturgia. Apesar de estruturas completamente diferentes, eu novamente me vi na situação da escrita de texto, como no jornalismo, e enxerguei a possibilidade de unir em uma só pesquisa as minhas áreas de estudo. Juntamente com as práticas de estágios em sala de aula apareceu uma curiosidade: “como nasce a dramaturgia em sala de aula?”. E assim surge a motivação desta pesquisa.

Junto a isso escolhi como tema norteador a infância, já que sempre gostei de trabalhar e estar em processos que envolvessem essa temática, pois o assunto me encanta. No meu ponto de vista é importante resgatar as lembranças da infância, principalmente as brincadeiras, em meio a tantas tecnologias.

Para completar os meus anseios, atrelei o estudo da memória no teatro a essa pesquisa, porque ao participar de processos teatrais envolvendo o trabalho da memória percebi o surgimento de diversas expressões corporais e vocais, personagens e histórias resultantes do percurso de todos os envolvidos, inclusive do meu. Sendo assim, defini como tema central dessa pesquisa a criação dramatúrgica a partir da memória da infância.

Essa pesquisa é de caráter prático e qualitativo baseada na experiência de docência exercida por mim no sexto semestre do curso de Licenciatura em Teatro da Universidade Federal da Bahia, como atividade do componente Didática e Práxis do Ensino de Teatro II. E foi fundamentada na leitura de estudiosos na área dramaturgia, do teatro e da memória como Beatriz Cabral, Konstantin Stanislavski, Henri Bergson, entre outros teóricos.

Após ter tido experiências com Ensino Médio, Fundamental I e Infantil, ao invés de escolher uma série, resolvi optar por realizar minha pesquisa com a faixa etária dos 11 aos 16 anos, que equivale à idade com a qual mais me identifico para trabalhar. O estágio foi realizado com alunos do Colégio Aliança, no bairro de Brotas, em Salvador. A oficina foi realizada durante 18 encontros, às segundas e quartas, no período de 29 de setembro a 05 de dezembro de 2014, das 14h às 17h, totalizando uma carga horária de 54 horas, sendo alguns encontros realizados em outros dias e horários.

O objetivo dessa investigação foi pesquisar sobre a criação dramatúrgica a partir da memória da infância buscando responder o seguinte questionamento: “Como se dá a criação dramatúrgica a partir das lembranças da infância com alunos de 11 a 16 anos?”. Tendo isto como base, já cheguei ao sexto módulo desejando explorar esse tema na disciplina de estágio como forma de prática da minha pesquisa de TCC.

No quesito prático, a finalidade foi incentivar e desenvolver a criação dramatúrgica a partir de técnicas e jogos teatrais coletivos e individuais os quais resultariam em uma mostra teatral. E, através disso, levar os estudantes a conhecer convenções teatrais por meio dos trabalhos criativos; incentivá-los ao trabalho em equipe e respeito ao próximo, assim como a apreciação e discussão sobre as cenas apresentadas em sala de aula resultantes da atividade do dia; promover a discussão e reflexão sobre o tema da oficina: memória e infância; incentivar a criação de roteiros e textos teatrais a partir de jogos e improvisações; criar um trabalho cênico e dramatúrgico de caráter coletivo a partir do que cada aluno ofereceu durante a oficina e desenvolver uma montagem resultante da criação dramatúrgica coletiva feita em sala de aula para que fosse apresentada em forma de mostra.

Partindo desses pressupostos, esta pesquisa utilizou, como estímulo para o processo das construções dramatúrgicas, metodologias baseadas nos estudos de Stanislavski sobre memória emotiva proposto no livro Preparação do ator. Acredito que o trabalho baseado na memória emotiva de Stanislávski contribuiu muito para a criação dramatúrgica dos alunos, fazendo-os ativar o imaginário a partir das lembranças da infância. As propostas de Cabral fundamentadas no Drama como método de ensino também serviram de apoio para minha pesquisa. Os jogos teatrais e improvisações de Viola Spolin, presentes nos livros Jogos teatrais na sala de aula, Improvisação para o teatro e Jogos Teatrais: o fichário de Spolin, foram utilizados como estímulos para a criação cênica e dramatúrgica. Assim como algumas das ideias de Maria Eugênia Milet e Paulo Dourado contidas no Manual de criatividades e os jogos de Augusto Boal do livro 200 exercícios e jogos para o ator e o não-ator com vontade de dizer algo através do teatro. Soma-se a essa pesquisa o estudo da memória baseado no livro Matéria e Memória de Henri Bergson e a observação rotineira de alguns aspectos da infância.

Como a memória pode ser ativada através das práticas teatrais? Ao resgatar a infância de adolescentes através de lembranças é possível contribuir para um eventual aperfeiçoamento na formação desse jovem? Como a criação dramatúrgica pode surgir a partir de um trabalho temático feito em grupo? As relações entre teatro e memória são estimulantes para a criação de dramaturgia?

Todos estes questionamentos influenciaram o andamento da minha pesquisa e, por consequência, a criação dramatúrgica dos alunos, pois a partir do momento em que eles ativam o seu imaginário para a criação de narrativas os estudantes desenvolvem seus potenciais artísticos. Afinal “o contexto da ficção permite focalizar ou desafiar aquilo que é normalmente aceito sem questionamentos, tudo o que devido à rotina é assumido sem maiores reflexões” (CABRAL, 2012, p.12), ou seja, a relação com o imaginário proporciona aos alunos uma maior liberdade de criação e facilita a abordagem de temas e/ou situações reais presentes em nosso cotidiano.

A oficina foi composta basicamente de quatro etapas, sendo elas gradativas. A primeira etapa, denominada de O encontro, teve como objetivo conhecer o público alvo e traçar um perfil da turma para uma posterior conquista de respeito e confiança dos alunos. Esta fase foi o momento de encontro dos alunos comigo e com o teatro. Na segunda etapa, chamada de O surgimento, foram aplicados jogos e técnicas teatrais voltados para o tema “memória e infância” e a criação dramatúrgica. Nessa etapa iniciou-se e concluiu-se o desenvolvimento do texto, momento de surgimento das principais ideias e personagens que gostaríamos de ver em cena. Na terceira etapa denominada A construção, foi feita a construção cênica do texto escrito de forma colaborativa. Esta foi a fase dos ensaios, produção de cenários e decisões sobre figurino. A quarta e última etapa chamada de A mostra consistiu na apresentação da peça Quando eu era pequeno que aconteceu no Teatro Martim Gonçalves no dia 06 de dezembro de 2014.

Dessa forma, depois de realizada a oficina, fiz a junção da abordagem teórica com os resultados obtidos nas aulas e na mostra final. Além disso, registrei com fotos, vídeos e relatórios das aulas elaborados no formato de diário de bordo. E decidi dividir meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) em três capítulos. No primeiro capítulo abordei a memória, infância e teatro buscando apresentar alguns aspectos da memória aliados a prática teatral, além de falar sobre o meu público alvo e a infância. Já no segundo capítulo discuti sobre produções textuais em minha vida e a dramaturgia em sala de aula. No terceiro capítulo apresentei a minha experiência prática de forma analítica relatando as etapas.

2. A MEMÓRIA, A INFÂNCIA E O TEATRO

2.1. A MEMÓRIA

Às vezes não lembramos nem o que comemos no café da manhã, mas conseguimos recordar de fatos que aconteceram quando tínhamos quatro anos. A memória é um aspecto incrível que sempre me instigou. É interessante como ela é capaz de guardar algumas coisas que nem nós mesmos imaginávamos que estavam ali armazenadas.

Mas afinal o que é memória? Os conceitos apresentados pelo Dicionário Aurélio são inúmeros, porém a ideia principal apresentada por ele é que a memória é a “faculdade pela qual o espírito conserva ideias ou imagens, ou as readquire sem grande esforço” (AURÉLIO, 2008), ou seja, ao longo do tempo a mente humana armazena impressões, sentimentos e conhecimentos à medida que eles são produzidos, sendo estes modificados ou aprimorados quando outras coisas surgem e são guardadas na memória.

De acordo com Henri Bergson (1999, p. 84) “O passado sobrevive sob duas formas distintas: 1) em mecanismos motores; 2) em lembranças independentes.” Percebe-se a existência deste primeiro tipo nas próprias ações humanas que são feitas seguindo um mecanismo automático guardado pela memória em alguma circunstância passada. Já o segundo tipo busca no passado lembranças ligadas a sentimento e espírito. Porém, Bergson explica que tais memórias seriam teoricamente autônomas e surgem de modos distintos:

O passado parece efetivamente armazenar-se, conforme havíamos previsto, sob essas duas formas extremas, de um lado os mecanismos motores que o utilizam, de outro as imagens-lembranças pessoais que desenham todos os acontecimentos dele com seu contorno, sua cor e seu lugar no tempo. Dessas duas memórias, a primeira é verdadeiramente orientada no sentido da natureza; a segunda, entregue a si mesma, iria antes em sentido contrário. A primeira, conquistada pelo esforço, permanece sob a dependência de nossa vontade; a segunda, completamente espontânea, é tanto volúvel em reproduzir quanto fiel em conservar. (BERGSON, 1999, p. 97)

Contudo, eis que uma pergunta surge ao falar de memória: Já que a mente armazena nosso passado, por que, então, não lembramos exatamente de tudo que nos já aconteceu? Bergson apresenta a seguinte resposta para esse questionamento:

Essas imagens particulares que chamo mecanismos cerebrais terminam a todo momento a série de minhas representações passadas, consistindo no último prolongamento que essas representações enviam no presente, seu ponto de ligação com o real, ou seja, com a ação. Corte essa ligação, a imagem passada talvez não se destrua, mas você lhe tirará toda capacidade de agir sobre o real, e por conseguinte, conforme mostraremos, de se realizar. É nesse sentido, e nesse sentido apenas, que uma lesão do cérebro poderá abolir algo da memória. (BERGSON, 1999, p. 85)

A memória pode ser considerada um refúgio que armazena imagens da vida passada, afinal inúmeros são os acontecimentos registrados por ela. Como aponta Rogério Oliveira (2014, p. 12): “memória como armazenamento conceitual, em outras palavras, de imagens integrais de algo, tornando algo ausente, presente.” Ou seja, somente através das lembranças que é possível o resgate do que já aconteceu ao ser. Os emaranhados de sensações que deixamos de lembrar ficam armazenados na mente. Sobre isso Oliveira (2014, p. 12) completa: “a memória diz respeito ao elemento habilitado a despertar, na alma, a imagem perfeita de algo ou de uma sensação”.

Sensações das mais diversas possíveis, lembranças que registram datas, fatos e momentos vividos. Uma dessas fases da vida é a infância. Incrível como essa etapa inicial da vida humana fica registrada fortemente em quase todos. Afinal,

É na criança que se dá esse desenvolvimento da consciência. (...) Provém daí o fato de a criança também não ter memória no sentido usual, apesar da plasticidade e receptividade para as impressões de que está dotado seu órgão psíquico. Somente quando a criança começa a dizer "eu" é que tem começo a continuidade da consciência, já perceptível, mas por enquanto ainda muitas vezes interrompida. Nesses intervalos se intercalam numerosos períodos de inconsciência. Durante os primeiros anos de vida, percebe-se claramente na criança como a consciência se vai formando por um agrupamento gradual de fragmentos. Esse processo propriamente nunca cessa no decurso da vida inteira. (JUNG, p. 45, 46)

Por isso a experiência vivida na infância acaba sendo determinante para o desenvolvimento das pessoas, é a fase de formação do indivíduo que consequentemente irá influenciá-lo durante toda a vida. E é justamente por nunca cessar que a mente vai armazenando, cada vez mais, todos os acontecimentos. Cada um guarda em sua mente apenas o que lhe foi marcante na infância, porém, em sua maioria, as lembranças dessa época são fortes, sejam elas tristes ou alegres. Como declara Torino, as recordações são resultantes da vida em sociedade:

Os indivíduos não recordam sozinhos: as lembranças são frutos destes esquemas ou quadros adquiridos na convivência social (família, grupo profissional, classe social). A afirmação central de Halbwachs sobre a memória é a de que, quaisquer que sejam as lembranças do passado que possamos ter — por mais que elas pareçam resultado de sentimentos, pensamentos e experiências exclusivamente pessoais —, elas só podem existir a partir dos quadros sociais da memória, tendo como referencial as estruturas simbólicas e culturais do grupo (...) Portanto, a memória e sua relação com o tempo é vital ao ser humano; é essencial a sua identidade, pois, juntas, elas – memória e identidade – se tornam capazes de gerar sentido, organização social e unificação de um grupo, mantendo-o coeso e ancorado em referenciais simbólicos familiares a ele. (TORINO, 2013)

A passagem inicial do livro O Pequeno Príncipe ilustra como as lembranças podem fazer parte da construção pessoal e profissional do indivíduo. Às vezes, recordações que parecem tão insignificantes para uns são bastante relevantes para outros. O aviador, personagem da obra, mudou o rumo de sua vida porque foi reprimido em seguir a carreira de pintor quando criança e deste fato ele lembrava-se claramente até a vida adulta, como mostra o trecho abaixo:

Mostrei minha obra prima às pessoas grandes e perguntei se o meu desenho lhes fazia medo. Responderam-me ‘Por que um chapéu faria medo?’ Meu desenho não representava um chapéu. Representava uma jiboia digerindo um elefante. Desenhei então o interior da jiboia, a fim de que as pessoas grandes pudessem compreender. Elas têm sempre necessidade de explicações. As pessoas grandes aconselharam-me deixar de lado os desenhos de jiboias abertas ou fechadas, e dedicar-me de preferencia à geografia, à história, ao cálculo, à gramática. Foi assim que abandonei, aos seis anos, uma esplêndida carreira de pintor. Eu fora desencorajado pelo insucesso do meu desenho número 1 e do meu desenho número 2. (...) Tive de escolher uma outra profissão e aprendi a pilotar aviões (SAINT-EXUPÉRY, 1983, p. 09, 10)

Isso apenas ilustra que o ser humano registra em sua memória os fatos que lhes foram importantes. Mesmo tendo seguido a sua vida em outros estudos, o aviador, ao desenhar para o pequeno Príncipe, realizando um pedido do garoto, retira da mente a imagem dos dois únicos desenhos que havia feito quando criança. Portanto, o aviador acaba registrando para o pequeno Príncipe uma de suas memórias da infância, chegando a ser surpreendido pelo garoto que foi o único a decifrar rapidamente o seu desenho. Concluo deste exemplo que o presente do ser humano é impregnado de memória, mesmo sem que ele perceba. Essa é a denominada por Bergson como memória pura, as lembranças que estão no inconsciente humano, é a “operação prática e consequentemente ordinária da memória, a utilização da experiência passada para a ação presente.” (BERGSON, 1999, p. 84)

A mente do indivíduo preserva tudo que fez parte de seu passado e o que está no presente. Contudo, vale ressaltar que tais rememorações chegam até o ser da forma com que a sua imaginação lê o acontecimento. De acordo com Rogério Oliveira, o escocês David de Hume afirma que “uma impressão está retida na mente por obra conjunta da imaginação e memória” (OLIVEIRA, 2014, p. 13), porém elas se distinguem por serem de sistemas diferentes. A memória pertence a uma capacidade de preservar na mente algo que está diretamente relacionado com a origem de sua aparição para o indivíduo, ao contrário da imaginação que não possui uma procedência tão exata. Ela é fruto dos devaneios mentais do ser. Sobre isso Rogério Oliveira, ao falar da argumentação de David de Hume, completa:

a concatenação de ideias em uma lembrança reapresenta o modo mesmo como as impressões nos chegam e, desse modo, permitem conjecturas mais precisas. Mas, adverte ele que, a sintonia somente é possível com a intervenção da imaginação. (OLIVEIRA, 2014, p. 13)

Contudo, o campo da memória é escorregadio e perigoso. Os conceitos, às vezes, tendem a se mesclar. Memória, imaginação e inconsciente se interligam. Hume, por exemplo, acredita que a memória é mais vivaz que a imaginação e esta, por sua vez, cria coisas na mente. Já Bergson aponta a memória como integrante dos mecanismos sensório-motores.

E quando se trata de teatro, a imaginação só tende a contribuir e aprimorar a representação desses acontecimentos. Ainda mais quando se enxerga a memória relacionada ao aspecto sensitivo-motor, pois isso é pensá-la como elemento estimulante para a criação teatral, como foi o caso da oficina dessa pesquisa. Um exemplo foi o momento da aula em que os alunos, seguindo as minhas orientações, ficaram deitados, recordaram de um fato familiar marcante da infância e depois tiveram que apresentar esse acontecimento de forma cênica, fazendo com que essa sensação rememorada fosse representada pelo corpo naquele instante.

Dessa forma, aconteceu o que sinaliza o pensamento bergsoniano apontado por Rogério Oliveira (2014, p. 19): “um fato passado é lido no presente, com sensações igualmente presentes, a partir do que ele chama de elementos sensório-motores, que estão no corpo”. Ou seja, o ser humano ao lembrar-se de um acontecimento ativa, em alguns casos, a parte sensorial do corpo fazendo com que venham à tona as percepções de sentidos e motoras presentes em si.

Ao ativar o processo de rememoração, apesar de não haver uma fidelidade ao acontecimento original, ocorre uma pequena vivacidade do fato lembrado e, no meu ponto de vista, é justamente nesse aspecto que se encontra o segredo da utilização da memória pelo teatro, aproveitar essa energia sentida através das lembranças para a criação teatral, seja ela qual for. Sobre isso, Oliveira descreve o que Hume diz (2014, p. 24)

Para Hume, a memória é definida como uma espécie de ideia que, ao reaparecer na mente, conserva um grau considerável de vivacidade primitiva, sendo algo intermédio entre impressão e ideia, duas espécies distintas, às quais se reduzem todas as percepções humanas.

A percepção possui internamente uma grande carga de lembranças. Aliás, eu me arriscaria a dizer que a vida toda é impregnada de memórias. Sem elas talvez o ser humano pudesse, até mesmo, não possuir uma formação identitária. São as experiências vividas pelo indivíduo que o formam. E é perceptível que o presente das pessoas está carregado de vivências passadas armazenadas pela memória. Como confirma Bergson (1999, p. 84)

Na verdade, não há percepção que não esteja impregnada de lembranças. Aos dados imediatos e presentes de nossos sentidos misturamos milhares de detalhes de nossa experiência passada. Na maioria das vezes, estas lembranças deslocam nossas percepções reais, das quais não retemos então mais que algumas indicações, simples ‘signos‘ destinados a nos trazerem à memória antigas imagens.

Essas antigas imagens muitas vezes causam a impressão de que aquele tempo vivido foi perdido. E na verdade é justamente o contrário, a experiência vivida só acrescenta ainda mais carga de sentimentos, conhecimento e fatos ao indivíduo. A memória faz registros únicos e guarda com eles signos. Estes, por sua vez, podem ser sensíveis e originados de uma memória involuntária como declara Rogério Oliveira (2014, p. 40):

Nesse mesmo sentido, fala-se dos signos sensíveis, também caracterizados como signos de alteração e de desaparecimento. Sobre isso, Deleuze, cita o exemplo escrito por Proust, em que a botina e a lembrança da avó fazem sentir uma ausência dolorosa e constitui o signo de um ‘tempo perdido’ para sempre. Neste caso, o personagem, diante da botina, chora porque uma memória involuntária lhe traz a lembrança desesperadora da avó morta. Essa memória involuntária é uma sensação antiga que tenta se superpor, se acoplar à sensação atual, e a estende sobre várias épocas ao mesmo tempo.

Desse mesmo modo é a lembrança da infância, muitos podem ter a impressão de que foi um tempo perdido, já outros podem ter guardado em si como um momento feliz que causa saudosismo, entre outras sensações. Não se sabe o que pode surgir a partir das rememorações. “As imagens que parecem brotar da memória, em forma de lembranças, na verdade são copias, por assim dizer, de um real” (OLIVEIRA, 2014, p. 45).

Portanto, o trabalho com teatro a partir de atividades que mobilizam a memória dos participantes deve ser cuidadoso e atencioso, pois o processo criativo no caso desta pesquisa foi estimulado pela rememoração de fatos ligados a um tema específico assim como fez Lícia Sanchéz. A autora relata em seu livro A Dramaturgia da Memória no teatro-dança como utilizou a memória para construir coreografias:

O processo criativo ocorre por meio da memória via pensamento; memória que não é somente involuntária (segundo entendemos), e aqui estamos falando que existe um componente voluntário que, contudo, não anula o espontâneo. No momento em que o artista consente em direcionar um tema para a criação, aciona-se o desejo e a memória é sacudida. O que põe a memória em movimento é a intenção de “criar”, expressão do pensamento artístico vinculado a um estímulo. Assim, o que vem à tona no pensamento vem de forma “natural”, mas não é totalmente involuntário porque nela se insemina vontade de conceber. Não há, contudo, motivo para discordar de que a criatividade também pode vir pela memória involuntária [...]. Percebemos, no entanto, que, na Dramaturgia da Memória, especificamente, acionam-se os mecanismos da memória pela vontade. (SÁNCHEZ, 2010, p.92)

E foi dessa mesma forma que trabalhei na oficina desta pesquisa. Buscando ter cautela e estimulando a rememoração da infância no intuito de criar. Procurando fazer com a memória da infância surgisse de forma natural, porém atrelada a vontade de escrever.

2.2 A INFÂNCIA

Quando me questiono por que resolvi pesquisar no meu TCC justamente sobre infância, noto que ela esteve sempre envolvida em minha vida. Desde adolescente, quando iniciei a minha vida teatral no curso de teatro do Projeto Ayrton Senna, em 2004, que venho trabalhando com o teatro para crianças. E, por coincidência, também me destaquei neste curso com a escrita dramatúrgica. Na época, nos foi dado o tema da diminuição da maioridade penal, que estava em discussão, e a partir disso deveríamos criar uma peça. Em conjunto, a turma decidiu trabalhar com os personagens de histórias infantis, os famosos contos de fadas. Lembro-me que adorei a ideia, realizar trabalhos voltados para o público infantil sempre me agradava. Ao fazer a personagem da bruxa Artemízia, na peça O julgamento de João e Maria, percebi o quanto o teatro era tido como verdade para as crianças, ao invés de ser uma simples encenação, uma ficção. Por se tratar de uma vilã, o meu personagem causava nelas medo, repugnância e sentimento de repúdio. Quando entrava em cena e via a reação das crianças com o meu personagem, entendia que naquele momento eu estava, de certa forma, contribuindo com a formação daqueles indivíduos, com a construção de seus valores.

Depois de muitos anos voltei a trabalhar com o público infantil como atriz do teatro Gil Santana. Apresentei mais de 40 peças em um ano, chegando a participar de um Festival de Contos de Fadas. Consequentemente, o envolvimento com esse público infantil era grande, assim como a lembrança da minha infância fazia-se muito presente para a construção dos personagens, pois muitos deles fizeram parte da minha época de criança também.

Ao ingressar na Licenciatura em Teatro, o tema da infância envolve-se comigo de novo. A minha primeira mostra ao entrar no curso, referente ao componente Mostra Didática III, ministrado pela professora Celida Salume, foi baseada no livro infanto-juvenil Nina e o amor, do autor Oscar Brenifier. As cenas construídas em sala de aula eram, em sua maioria, baseadas nas memórias de nossas meninices. No estágio supervisionado realizado na Escola Estadual Manoel Novaes também surge, brevemente, essa mesma temática, mas agora eu exercia o papel de professora. E cada vez mais essa minha aproximação com a infância tornava-se mais forte. Depois de observar alguns dos meus alunos, percebi a diferença comportamental entre a minha adolescência e infância.

Na verdade, sempre recordo da época em que era criança com muito saudosismo. Foi uma época muito boa em minha vida, sinto falta. Lembro nitidamente dos acontecimentos, das brincadeiras, das cantigas. Lembro que não havia preocupação, que o meu problema era não poder brincar com a amiga, pois tinha que fazer o dever. Recordo como eram empolgantes, por exemplo, o esconde-esconde e o pega-pega com os colegas e as cantigas que cantávamos no intervalo. E quando paro para observar as crianças hoje em dia me pergunto cadê essas coisas? Tudo se perdeu? É a tal da infância perdida? Não, acho que não. Apenas o mundo em transformação. Mas seria tão bom se pudéssemos também relembrar esse lado lúdico.

Posso dizer que esse desejo ficou mais forte quando, certo dia, no intervalo do Colégio Aliança, algumas alunas resolveram levar elástico para brincar no recreio. Achei aquilo incrível, uma coisa diferente e incomum. Elas me chamaram para brincar e lhes apresentei outras formas da brincadeira. Elas ficaram mais interessadas pelo jogo e, quando me dei conta, elas já estavam recordando de diversas brincadeiras que se perderam no tempo. Foi quando percebi que mesmo em adolescentes, seres tão jovens, ao ativar a memória da meninice coisas inusitadas podem surgir. O processo de rememoração acontece de forma, às vezes, involuntária e não linear. Por isso a ocorrência de relatos diversos quando os alunos foram estimulados a lembrar de fatores da infância.

A minha infância foi muito prazerosa com muitas brincadeiras, cantigas e acontecimentos familiares. Com o passar dos anos percebi quantas mudanças ocorreram seguindo a “normalidade” da vida humana, contudo também notei que consequentemente coisas se perderam no caminho. Quando nos damos conta já estamos tão adultos e cheios de responsabilidade que aquilo que nos dava tanto prazer já não é lembrado com tanta frequência. “A infância é tomada como o amadurecimento da cognição humana e a vida adulta o seu retrocesso, como se anos de infância fossem desperdiçados quando ocorre a sujeição do homem grande ao mundo burguês.” (RAMIREZ, 2011, p. 131)

O que tenho registrado em minha memória como infância já não é a infância da geração seguinte. Esse é o que chamo de choque de gerações. Ao observar isso, principalmente na escola, compreendi o quanto seria interessante resgatar as memórias da infância desses jovens, afinal elas fizeram parte de sua formação pessoal e, portanto, continuará a contribuir com o seu desenvolvimento. Até porque os adolescentes dessa geração têm esquecido cada vez mais as brincadeiras que estimulam o contato físico e interação social como as cantigas de roda, que não foram presentes na vida de muitos desses jovens, e os jogos lúdicos, existentes na infância deles, trocando-as por algumas tecnologias que acabam isolando o indivíduo. Não que a tecnologia e seus avanços não tenham seu valor e prazer também. Mas, trazer à tona os fatos que fizeram parte da formação desses jovens pode estimular uma construção de um indivíduo mais social e humano.

A geração a qual me refiro foi denominada de Geração Z justamente por ser classificada como o grupo conectado com as tecnologias, como confirma as autoras Simone Beatriz Ceretta e Lurdes Marlene Froemming (2011, p. 19):

Ainda em fase de consolidação, a geração é conhecida como “Z”, porque a sua grande nuance é zapear. Zapear é um verbo utilizado para designar o ato de mudar constantemente o canal na televisão, geralmente através de um controle remoto, caracterizando o que a geração tem em comum, o ato de fazer várias coisas ao mesmo tempo [...] Esses adolescentes da Geração Z nunca conceberam o mundo sem computador, chats e telefone celular e, em decorrência disso, são menos deslumbrados que os da Geração Y com chips e joysticks. Sua maneira de pensar foi influenciada, desde o berço, pelo mundo complexo e veloz que a tecnologia engendrou.

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De acordo com a apresentação feita em abril de 2011 pela gerente de inteligência de mercado do IBOPE Mídia, Juliana Sawaia, a Geração Z agrega os jovens de 12 a 19 anos e equivale a 11,6 milhões no Brasil. Minha escolha para trabalhar com esses jovens justifica-se nas principais características que eles apresentam: mais da metade deles tem um videogame ou pelo menos joga na casa do amigo, primo ou vizinho, eles possuem alta afinidade por tecnologia e ouvem música constantemente sendo que 38% possuem o MP3 (SAWAIA, 2011, p. 06). De acordo com a pesquisa de campo feita com aplicação de questionários à adolescentes, realizada por Simone Beatriz Ceretta e Lurdes Marlene Froemming (2011, p. 19, 20), na Geração Z o convívio social é pouco, pois vivem com fone de ouvido e, portanto, ouvem pouco e falam menos ainda, tendendo ao egocentrismo. Além disso,

para mais da metade da Geração Z, a Internet é a principal fonte de entretenimento. Atividades online com grande afinidade na Geração Z: Jogos; Salas de bate-papo; Atualizar redes sociais com fotos/vídeos; Escrever em blogs; Baixar músicas. 71% usam frequentemente às redes sociais. (SAWAIA, 2011, p. 16).

Ou seja, a Geração Z vive com a cara no computador e compartilha pouco dos momentos de contato com outras pessoas. Por isso tendem a viver mais isolados, em um mundo virtual, sem muita comunicação verbal e possuem uma infância marcada pela presença da tecnologia e ausência das brincadeiras mais comuns das gerações anteriores. O que acaba acarretando no fraco desenvolvimento interpessoal desse adolescente que sofre com a falta de expressividade tanto na comunicação verbal como corporal. (CERETTA; FROEMMING, 2011, p. 20).

É na infância que se inicia o processo de desenvolvimento de conhecimentos e valores, é o momento em que a criança cria relações sociais e entende os limites para viver em sociedade. É o momento de formação de identidade e caráter do indivíduo. Sendo assim, o advento da tecnologia tem que estar de acordo com esse tipo de formação também. O ideal não seria mudar a geração que é mais online e antenada com as informações, mas sim aliar a essas qualidades o que a geração anterior praticava, como as cantigas de roda e algumas brincadeiras, contribuindo assim para a formação do individuo. Assim poderemos ter futuros adultos mais conscientes, social e politicamente.

Então fazê-los relembrar dos momentos da infância aliado a um trabalho teatral pode não só contribuir com a criação de personagens e texto, mas também pode cooperar bastante com a formação desses jovens.

2.3 TEATRO E MEMÓRIA

Por acreditar que o resgate das imagens, fatos, sentimentos, brincadeiras e cantigas da nossa infância podem contribuir com a construção do ser, escolhi trabalhar nessa pesquisa com memória da infância. Mas qual a relação de tudo isso com o teatro? Aliado a minha curiosidade e gosto pelo tema, percebi ao longo de minhas experiências teatrais que a memória colabora para a construção de cena, personagem, expressão vocal e corporal e texto, que é o aspecto aqui em estudo. Além disso, “o teatro é uma atividade artística que exige o talento e a energia de muitas pessoas – desde a primeira ideia de uma peça ou cena até o último eco de aplauso” (SPOLIN, 2005, p. 8), portanto é uma atividade que requer o trabalho em grupo, aspecto que também desejei abordar na parte prática desta pesquisa.

Resolvi trabalhar, especificamente, o método da memória emotiva apresentado por Constantin Stanislavski, porém ele trabalha com a memória para a construção de personagem e não de texto. Por isso eu utilizei a ideia de memória emotiva dele e apliquei nesta oficina para a criação dramatúrgica. Stanislavski aponta que a memória emotiva acontece quando o ator utiliza suas lembranças emocionais para a construção de personagem.

Do mesmo modo que sua memória visual pode reconstruir uma imagem interior de alguma coisa, pessoa ou lugar esquecido, assim também sua memória afetiva pode evocar sentimentos que você já experimentou. Podem parecer fora do alcance da evocação e eis que, de súbito, uma sugestão, um pensamento, um objeto familiar os traz de volta em plena força. (STANISLAVSKI, 1982, p. 207)

Partindo disso, trabalhei dessa forma, em sala de aula, na oficina realizada para esta pesquisa. Aliado a essa ideia eu utilizei estímulos diversos seguindo as propostas de Beatriz Cabral, pois concordo com sua ideia de que o drama “permite explorar questões e problemas centrais à condição humana, e oferece ao indivíduo a oportunidade de definir e clarificar sua própria cultura” (CABRAL, 2012, p. 11)

Entretanto, as sugestões do livro Drama como método de ensino, em alguns momentos, foram adaptadas para o contexto que vivia em sala de aula, pois às vezes as minhas atividades fugiam um pouco de sua linha de trabalho. Estimulei os alunos a lembrarem de sua infância utilizando músicas, objetos e relatos trazidos pelos próprios alunos ou levados por mim para a sala de aula. Por meio desses estímulos incentivava durante as aulas a construção de textos e personagens, assim, aos poucos, iria nascendo a dramaturgia resultante desse processo. Além disso, os jogos propostos por Viola Spolin e Augusto Boal, adaptados, serviram como contribuição para ativar essa memória da infância.

No livro A preparação do Ator, Stanislavski aponta que não se deve perder tempo com uma inspiração que ocorreu apenas em um breve instante e completa seu discurso dizendo que isso “é tão irrecuperável como o ontem, como as alegrias da infância, como o primeiro” (STANISLAVSKI, 1982, p. 214). Concordo com Stanislavski, um acontecimento e/ou sentimento é único, nunca acontece como na primeira vez. Porém, vale ressaltar que na experiência com os alunos do Colégio Aliança notei que a maioria conseguiu recuperar de forma bem próxima o sentimento de alegria que teve em algum momento da infância. Isso ocorreu quando fiz um exercício em que ao som de uma música eles deitavam-se e deveriam lembrar-se de momentos de felicidade da infância. Sendo guiados por minhas orientações eles foram recordando, escolheram uma ocasião que rememoraram e a representação cênica disso pareceu muito verdadeira a todos que assistiam. “A qualidade inesperada dessas erupções espontâneas de sentimento é uma força irresistível e comovedora” (STANISLAVSKI, 1982, p. 215).

À medida em que os alunos eram estimulados de diferentes formas, personagens, cenas e segredos da própria vida deles surgiam em sala. A exploração da criação partindo de lembranças influenciava também no comportamento do grupo fazendo-os ficar mais unidos a cada aula. Além disso, a elaboração de personagens e de texto tornava-se mais viva e verdadeira com o passar do tempo. Unir a memória da infância com o teatro causou também um possível crescimento, sensitivo-motor e/ou intelectual, dos participantes, já que de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) “o teatro promove oportunidades para que adolescentes e adultos conheçam, observem e confrontem diferentes culturas em diferentes momentos históricos, operando com um modo coletivo de produção de arte”.

O teatro, no meu ponto de vista, é um agente transformador. E durante esta oficina ele não só exerceu esse papel, como também, favoreceu a esses adolescentes “possibilidades de compartilhar descobertas, ideias, sentimentos, atitudes, ao permitir a observação de diversos pontos de vista, estabelecendo a relação do indivíduo com o coletivo e desenvolvendo a socialização” (BRASIL, 1997), como prevê os Parâmetros Curriculares Nacionais em relação ao ensino de teatro.

“A memória do teatro não é apenas ocidental, é universal” (ROUBINE, 2003, p. 194), afirma Roubine. Ele ainda completa dizendo que a memória não é uma atividade voltada para práticas esquecidas e sim um trabalho que “mobiliza também as lembranças vividas-sonhadas dos indivíduos.” (ROUBINE, 2003, p. 194). Pois, rememorar fatos de nossa existência e transferir para o teatro, independente da forma, é dividir com o público um pouco de nossa essência também. Afinal, “Todas as nossas experiências criadoras são plenas e vivas na razão direta do poder, acuidade e exatidão da nossa memória. Se for fraca, os sentimentos que desperta serão pálidos, porque não conseguem ultrapassar a ribalta” (STANISLAVSKI, 1982, p. 225). Portanto, o teatro e a memória podem construir uma relação íntima em um processo, sendo capazes de, juntos, obterem resultados inesperados.

3. AS PRODUÇÕES TEXTUAIS

3.1 EM MINHA VIDA

Antes da abordagem sobre a dramaturgia é importante relatar o seu conceito. De acordo com o Dicionário Etimológico (ANDERS, 2001), dramaturgia vem do grego dramatourgía e tem sua origem nas palavras gregas drama (dramatos), derivado do verbo drao, que significa ação e da palavra ergon que denota trabalho, sendo assim dramaturgia é a “ação de trabalhar fazendo dramas” (ANDERS, 2001). Porém, “antes de se referir ao texto, propriamente escrito ou falado, o conceito de dramaturgia está conectado com o processo de tessitura das ações” (SCHETTINI, 2008, p. 01)

Já segundo Patrice Pavis (1999, p. 113) “a dramaturgia, no seu sentido mais genérico, é a técnica (ou a poética) da arte dramática, que procura estabelecer os princípios de construção da obra”. Ou seja, dramaturgia é a construção de textos que parte da arte dramática, é a composição de uma história para o palco e quem a escreve recebe o nome de dramaturgo.

Dito isto, posso relatar agora como a dramaturgia surgiu em minha vida. As manias de adolescente de utilizar diários e fazer poemas e músicas sempre fizeram parte da minha rotina. O gosto pela escrita era constante e desde o meu primeiro curso de teatro, do projeto Ayrton Senna, estive envolvida com a produção de textos, especificamente a de peças de teatro. Quando iniciaram as reuniões para elaboração da peça e as cenas começaram a ser construídas, percebi que eu estava anotando tudo que ouvia e transformando em texto. A professora percebeu o meu interesse e me incumbiu de colocar no papel essa peça que nascia em sala de aula. Com auxilio da professora e contribuição dos colegas nosso texto nasceu: O julgamento de João e Maria.

Mais tarde, em outro curso, com Marconi Araponga, no projeto Da Página Ao Palco, além de aulas práticas, a oficina buscava estimular os alunos a adaptarem um texto literário para o teatro. A obra escolhida para esta oficina foi O largo da palma. O professor solicitou que os alunos levassem sugestões de roteiros teatrais de alguns capítulos do livro, nos deu a dica de como seria a estrutura desse roteiro, uma espécie de escaleta. Um dos meus roteiros foi escolhido e adaptado pelas sugestões dos colegas, afinal tratava-se de um texto coletivo. Nas reuniões eu involuntariamente anotei as ideias e novamente recebi a incumbência de organizar tudo no papel para o grupo. Cada vez eu me via mais envolvida com a escrita.

Posteriormente, estive ligada a escrita, mas desta vez era com os textos jornalísticos. Ao fazer jornalismo descobri outros formatos e me apaixonei mais ainda pela escrita, entretanto abandonei por um curto período a criação dramatúrgica. Me envolvi com teatro novamente no Bacharelado Interdisciplinar em Artes, escrevia peças esporadicamente para o estágio, porém só foi no curso de Licenciatura em Teatro que voltei a escrever peças com mais frequência. Desde a realização do componente de estágio no módulo 5 que surgiu o meu desejo de trabalhar com a dramaturgia em sala de aula. Todo esse estimulo partiu da disciplina Criação Coletiva ministrada pelo professor João Sanches que trouxe de volta o meu gosto pela escrita juntamente com uma curiosidade: Como nascia a dramaturgia em sala de aula? Como aluna do componente, estava sendo incentivada a escrever textos de teatro. Essa vontade nasceu em mim como em boa parte da turma. Começa assim o meu envolvimento com a dramaturgia em sala de aula.

2. DRAMATURGIA EM SALA DE AULA

Um questionamento surgia e crescia a cada aula da disciplina Criação Coletiva: como seria essa escrita de texto se eu estivesse ministrando uma aula de teatro? Como eu poderia trabalhar dramaturgia em sala de aula, já que é um aspecto que tanto me encantava?

Ao mesmo tempo em que estava sendo instigada pela dramaturgia em sala de aula, realizava o estágio no colégio Manoel Novaes com a minha colega de sala Jamile Cruz. A princípio não estava nos nossos planejamentos trabalhar por esse viés, porém meu envolvimento era tanto com a dramaturgia que surgiu o desejo de iniciar uma atividade com a turma. Dessa forma, estimulei os alunos a escrever peças de teatro. A memória ainda não estava presente nesta escrita, apesar de já existir a vontade de aliá-la ao planejamento. Incorporamos a escrita de textos com o estudo de materialidade[1], desejo de pesquisa de minha colega, e por meio disso os alunos foram estimulados a escrever peças de teatro.

Através do uso de materialidades em sala de aula, as cenas, os personagens e os textos surgiam. Contudo, notei que a temática de memória e infância estiveram presentes em breves momentos. Em uma das aulas solicitamos que os alunos levassem objetos relacionados à sua infância. No dia da atividade em sala cada aluno apresentou seu objeto, primeiramente sem falar o motivo pelo qual o escolheu, para que os colegas adivinhassem. Posteriormente cada um revelou a história do seu objeto da infância. Depois dividimos a turma em grupos a partir das semelhanças entre as histórias. A tarefa final da aula era unir as narrativas de cada objeto em uma criação dramatúrgica coletiva.

Após essa prática fui para o meu último estágio no sexto módulo desejando realizar um trabalho totalmente voltado para a criação dramatúrgica e conseguir responder aos questionamentos que haviam surgido. É assim que chego com a proposta de trabalhar com a criação dramatúrgica coletiva no Colégio Aliança a partir da memória da infância. Porém, surge uma dificuldade: como trabalhar criação dramatúrgica com adolescentes que nunca tiveram contato com o teatro? Assim iniciei meus estudos sobre escrita coletiva seguindo também as orientações que havia recebido no componente de Criação Coletiva, disciplina destinada a ensinar a “aplicação de técnicas e exercícios dramatúrgicos com o objetivo de estimular a elaboração, em grupo, de textos dramáticos.” (UFBA)

Quando se fala em texto de teatro, a princípio, eles eram classificados em tragédias e comédias possuindo características próprias tanto no formato literário como em sua representação cênica. Depois de alguns anos essa divisão deixou de ser rígida e obrigatória e os estilos passaram a se misturar em um mesmo texto. E assim, a dramaturgia foi sendo construída com características específicas de acordo com o autor, época, tema, gênero, local, entre outras diferenciações. Atualmente, o termo dramaturgia não se restringe apenas a escrita de textos de forma solitária. Hoje o dramaturgo não precisa assumir seu papel sozinho e o texto pode nascer de diversas formas:

Contemporaneamente, encontram-se espetáculos de diversos coletivos teatrais ou de criadores cênicos que reivindicam o desenvolvimento de uma “dramaturgia própria”: seja por meio de uma “dramaturgia corporal” sem necessariamente se ater à “composição de um personagem” no sentido psicológico; seja por conta de trabalhos que repousam sobre uma “dramaturgia do ator” que explora sua própria biografia como resíduo para cena; seja com encenações que são elaboradas segundo uma dramaturgia oriunda de “processos colaborativos”, entre outras denominações. Enfim, o emprego do termo dramaturgia não está mais restrito ao trabalho do autor dramático como agente criativo, e sim dissolvido entre a técnica de composição da própria cena e a concepção do que os atores “falam” sobre o palco em situação de exibição. (NETO)

Portanto, a dramaturgia ao longo dos anos transforma-se, modificando seu conceito e formato. Tradicionalmente existem vários procedimentos para produção de um texto teatral, de acordo com Pavis (1999, p. 113) até o período clássico os autores descobriam regras e formatos de escritas desses textos, depois as reuniam para outros dramaturgos. Todavia, não se pode dizer que há uma fórmula para escrita de textos teatrais, às vezes ele nasce na própria cena. Deste modo, o texto teatral pode surgir de diversas formas. Renata Pallotini (2006, p. 13), em seu livro O que é dramaturgia, afirma que a dramaturgia é um ato de criação que essencialmente não é regido por códigos ou padrões estabelecidos, mas sim por meio de uma relação dialética entre a imaginação e o mundo real.

Diferente da dramaturgia clássica, um tipo formal de construção dramática que segue um sistema lógico de regras e leis dramatúrgicas (PAVIS, p. 115), o texto coletivo nasce ao lado de duas tradições como aponta Magali Quadros (2007, p. 19, 20) a partir da citação de Molinari (2004, p. 23):

Molinari relata que, na segunda metade do século XX, em torno dos anos setenta, quem começava a fazer teatro na Itália se encontrava frente a duas grandes tradições: a tradição do teatro de direção e aquela do ator-autor. [...] Ao lado dessas duas tradições, explica ainda Molinari, havia o trabalho de grupos teatrais. No cartaz, a propósito do texto, se lia o nome do diretor ou, mais frequentemente, “elaboração coletiva” ou “trabalho coletivo”. Um grupo, com todas as atribuições próprias do fazer teatral, se mobilizava em torno de um tema, de um texto, de um autor, e elaborava aquele texto da proposta teatral, a escrita cênica.

As criações coletivas, que foi o caso da oficina desta pesquisa, servem como resultados dos desejos e ideias do grupo, portanto, é uma ferramenta da peça. Como confirma Roubine (1982, p. 76): “As criações textuais coletivas, pelo contrário, não pretendem ser outra coisa senão instrumento de um espetáculo”. A escrita coletiva é considerada um material transformável e produto de um grupo, porém não é um novo formato de criação dramatúrgica, mas sim uma adaptação de uma antiga tradição (Roubine, 1982, p. 77). Inclusive era muito comum, por exemplo, na Commedia Dell’arte onde o elenco adaptava o texto de acordo com as possibilidades cênicas, como afirma Roubine (1982, p. 77): “basta lembrar os roteiros da commedia dell’arte que os elencos utilizavam, nas suas peregrinações, com a maior das liberdades. Adaptando-os ao contexto político e social do momento e do lugar de representação”.

Contudo, a ideia de soberania do texto e da figura do dramaturgo também prevaleceu por muito tempo, possuindo uma encenação centrada apenas no texto. É somente nas décadas de 60 e 70 que acontece a quebra de padrões de escrita de texto dramatúrgicos e o fortalecimento do pensamento de coletividade. O dramaturgo também deixa de ter aquela imagem estereotipada de profissional que fica preso em uma sala escrevendo impetuosamente textos e mais textos. No Brasil, principalmente após a propagação de grupos de teatro, as peças começaram suas construções coletivas de texto. “Todos tinham igual espaço propositivo e de maneira consensual, decidiam o que ficava e o que não ficava na construção de ações.” (SCHETTINI, 2008, p. 02). Com o aparecimento da criação coletiva surgem outros requisitos, como a da existência de uma pessoa que faça a organização do conteúdo que o grupo deseja colocar no texto.

Muitos dos grupos encarregam uma pessoa de atuar como um mediador entre a cena e o texto, esta pessoa é responsável pela “textualização” da cena, participando e intervindo durante o processo de criação junto ao grupo – essa função é muitas vezes denominada pelo termo alemão dramaturg. [...] A dramaturgia, portanto, está intrinsecamente inserida nas outras funções, colaborando e recebendo colaborações de toda equipe criadora. Cabe ao dramaturgo ou dramaturg, a tarefa de organizar, cortar e fechar o material textual. (CARREIRA; SILVA, 2008, p. 03)

Dentro da oficina no Colégio Aliança posso afirmar que além de professora exerci esse papel, organizando um texto inédito a partir do que foi criado em sala de aula. Como a criação textual coletiva é mais complicada, ela necessita de recursos para acontecer como a improvisação, por isso utilizei nas aulas práticas jogos de Viola Spolin. Além de estímulos voltados para o tema com o intuito de que o texto seguisse pelo mesmo viés. O pré-texto proposto por Beatriz Cabral (2012, p. 12) foi outro método utilizado e que está associado ao drama como método de ensino, pois ele demarca e potencializa a produção da narrativa teatral em grupo.

“O processo colaborativo, ao contrário do que se possa supor, não elimina a ‘assinatura’, a identidade, o estilo do autor. As aspirações e inspirações surgem de todo o grupo, mas quem converte em texto é o autor” (MARTINS, 2010, p. 19) e foi exatamente desta forma que surgiu o texto Quando eu era pequeno. Reuni tudo que os alunos criaram em sala, sejam cenas, textos ou personagens, com as ideias que eles tiveram a partir das memórias de suas infâncias juntamente com as minhas memórias e anseios. Uma produção feita em conjunto que explico com mais detalhes no próximo capitulo.

Não há um receituário definitivo quanto ao modo de assumir a função de dramaturgo no contexto de um processo de criação que estabeleça fins pedagógicos como norteadores de sua realização. Há situações em que é necessário que o professor assuma a função com mais centralidade, há momentos em que o aluno pode, por assim dizer, “tomar as rédeas” e escrever os textos das cenas criadas, e há ocasiões em que ambos dividem partes ou mesmo a totalidade do estabelecimento dramatúrgico concernente a um dado percurso de criação teatral” (JÚNIOR; KOUDELA, 2015, p. 59)

Por isso afirmo que o texto foi resultado de um processo colaborativo, porém de minha autoria. Eu trabalhei a partir e com as colaborações dos alunos. De acordo com a teoria apresentada por Koudela e Almeida Júnior, no Léxico de Pedagogia do Teatro, a função que exerci foi de dramaturga, pois “no caso do dramaturgo, o que se trabalha, principalmente, ainda que não exclusivamente, é a relação entre o que se cria em termos de cena e o que se pode fixar em termos de organização textual escrita” (JÚNIOR; KOUDELA, 2015, p. 58). Os autores completam afirmando que o drama na educação possui algumas variações metodológicas que “partem de uma maior ênfase do professor na construção da narrativa (o professor como dramaturgo), na atuação (o professor como performer ou como personagem), ou na concepção cênica (o professor-encenador)” (JÚNIOR; KOUDELA, 2015, p. 55), sendo assim, o meu caso nesta pesquisa foi justamente o primeiro: o professor como dramaturgo.

Quanto se trata de sala de aula a criação coletiva é um ótimo recurso a ser utilizado, pois colabora com uma maior interação social entre os participantes, obriga um trabalho em equipe organizado e proporciona oportunidades de exposição de ideias e vontades dos alunos junto ao grupo. A escrita coletiva possui uma pedagogia, um meio para que aconteça de maneira fluida e satisfatória para os participantes.

Na direção de uma pedagogia em bases colaborativas parece que o fundamental seria evitar as fórmulas, já que o processo compartilhado deve se inventar à medida dos seus agentes e dos propósitos de intervenções artísticas que estes decidirem colocar em jogo (ABREU, 2010, p. 46)

Embora a criação a partir da memória seja uma das formas mais espontâneas no teatro em minha opinião, ela também é um trabalho desafiador, mesmo que exista um direcionamento temático, pois não se trata apenas de uma transmissão dos fatos armazenados na mente para o papel, mas sim de uma reconstrução da lembrança. Dessa forma, automaticamente e involuntariamente, o desejo do sujeito estará intrínseco nessa representação, ou seja, o fato recordado será contado da maneira como marcou a pessoa e não como ele ocorreu verdadeiramente, podendo não haver uma fidelidade na reconstrução do acontecimento. “A investigação de memórias fica dessa forma situada entre intenções e reconstruções” (CABRAL, 2012, p. 15). Sobre isso Sanchez completa:

No momento em que o artista consente em direcionar um tema para a criação, aciona-se o desejo e a memória é sacudida. O que põe a memória em movimento é a intenção de “criar”, expressão do pensamento artístico vinculado a um estímulo. Assim, o que vem à tona no pensamento vem de forma “natural”, mas não é totalmente involuntário porque nela se insemina vontade de conceber. Não há, contudo, motivo para discordar de que a criatividade também pode vir pela memória involuntária [...]. Percebemos, no entanto, que, na Dramaturgia da Memória, especificamente, acionam-se os mecanismos da memória pela vontade. (SÁNCHEZ, 2010, p. 92)

Na experiência dessa pesquisa o texto foi nascendo aos poucos, a cada aula. Baseado nas lembranças de cada aluno, eles construíam textos que relatavam momentos de suas infâncias e também escreviam sobre personagens criados a partir dessas memórias. Neste último caso, ao ler os textos era perceptível que estava presente nos personagens às experiências de cada aluno, eles representavam um momento da vida deles. É o que justamente confirma Martin Esslin ao falar do dramaturgo:

Um dramaturgo ao imaginar seus personagens e o diálogo que trocam, precisa, se ele realmente tem habilidade, penetrar nos sentimentos, nas reações, nos maneirismos individuais do modo de falar de cada personagem. Por outro lado, cada personagem que assim nasce da mente de seu criador, irá de algum modo corresponder e representar certos aspectos e elementos da experiência pessoal e da estrutura psicológica daquele dramaturgo. (ESSLIN, 1978, p.118)

Para a escrita de textos a ligação com o imaginário é essencial também. O dramaturgo necessita pensar como serão as cenas em sua mente para que nada seja esquecido daquilo que se deseja apresentar. E quando esta construção parte da memória, essa escrita passa a ser também um relato do acontecimento que, posteriormente, será representado por um personagem. Mesmo após modificações na dramaturgia, é como Aristóteles afirmou em sua poética:

Quando o poeta organiza as fábulas e completa sua obra compondo a elocução das personagens, deve, na medida do possível, proceder como se ela decorresse diante de seus olhos, pois, vendo as coisas plenamente iluminadas, como se estivesse presente, encontrará o que convém, e não lhe escapará nenhum pormenor contrário ao efeito que pretende produzir. (2001, p. 26, grifo nosso)

Unindo a essa construção, que busca os detalhes da rememoração, esteve presente nesta pesquisa a construção do texto coletivo, o método contemporâneo de produção de texto dramatúrgico que tem sido cada vez mais comum nos cursos e grupos teatrais. Adélia Nicolete, em sua dissertação de Mestrado intitulada Da cena ao texto: dramaturgia em processo colaborativo, fala sobre a criação do texto coletivo apresentando alguns modos de produção dramatúrgica. Um dos exemplos citados por ela assemelha-se bastante com o formato utilizado nesta pesquisa: “A elaboração do texto poderia ser feita por todos, por uma comissão ou por alguém destacado para tal. O grupo TUOV (Teatro União e Olho Vivo) e o Forja, ambos de São Paulo, dispunham de dramaturgos oficiais” (NICOLETE, 2005, p. 21). Ela ainda completa o discurso apresentando uma citação de Silvana Garcia que diz: “O esforço coletivo chega até determinada etapa e depois fica nas mãos de um indivíduo responsável pelo acabamento” (GARCIA, 1990, P. 146 apud NICOLETE, 2005, p. 21)

Neste caso da escrita ser realizada por apenas uma pessoa, o texto era assinado por apenas um responsável, porém o coletivo avaliava as versões podendo sugerir alterações até que, em grupo, chegassem a um texto final satisfatório para todos. E foi exatamente dessa forma que nasceu o texto Quando eu era pequeno: eu escrevi o texto unindo todas as ideias que surgiam em sala de aula e fui fazendo os ajustes com a colaboração de todos os alunos participantes da oficina até finalizarmos a nossa produção dramatúrgica.

4. QUANDO EU ERA PEQUENO – A EXPERIÊNCIA

A oficina que realizei nos meses de setembro a novembro de 2014 fortaleceu a minha pesquisa de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). O objetivo principal foi incentivar e desenvolver a criação dramatúrgica a partir da memória da infância, utilizando para isso técnicas e jogos teatrais coletivos e individuais com alunos da faixa etária dos 11 aos 16 anos do Colégio Aliança. A oficina foi uma atividade referente à disciplina de Estágio Supervisionado, do sexto módulo do curso de Licenciatura em Teatro, ministrada pela professora Célida Salume.

O Colégio Aliança fica localizado no bairro de Brotas em Salvador e oferece aulas para a Educação Infantil, Ensino Fundamental I e II. É uma instituição particular de pequeno porte, com uma média de 100 alunos no Ensino Fundamental II. Escolhi essa instituição para concretizar a minha pesquisa porque é o local onde já realizava estágio no turno matutino. O outro incentivo foi a disponibilidade do colégio e o desejo de alguns alunos em terem aula de teatro, já que a maioria não tinha tido a oportunidade de estar em contato com tal arte. Por isso as aulas foram ofertadas apenas para alunos do Ensino Fundamental II.

Tentei desenvolver as etapas do processo de acordo com o projeto de estágio, porém alguns acontecimentos mudaram o rumo da oficina. Por esse motivo algumas adaptações foram necessárias durante o processo. Como citam Maria Eugênia Milet e Paulo Dourado no Manual de Criatividade (1985, p. 22): “Cada aula é única. O mesmo planejamento aplicado em duas turmas vai ter resultados bem diferentes. As regras do jogo podem ser mudadas tanto por você, como por seus alunos.”, por isso a importância de flexibilidade do professor em relação às mudanças que podem surgir como aconteceu comigo nesse processo.

Primeiramente, ao traçar o perfil da turma percebi que a infância de tais jovens foi marcada por fatos diversos e, em sua maioria, tristes. Segundo, porque pretendia trabalhar com a caixa de estímulos[2] proposto por Cabral, já que possuía uma temática central que foi a infância, porém o próprio andamento da oficina fez com que essas construções narrativas surgissem de outra forma também e acabei não seguindo rigidamente os procedimentos dela. Muitas aulas foram planejadas baseadas em suas propostas, porém ao chegar na sala de aula a ideia era modificada pelos próprios alunos ou eles apareciam com outras demandas que me faziam abandonar ou modificar o plano de aula. Isso ocorreu, por exemplo, quando eles chegavam agitados demais e foi necessária a aplicação de atividades voltadas para o foco e concentração. Além disso, apesar de músicas e objetos terem sido levados para a sala de aula como forma de estímulo, eles não seguiam o padrão do método da caixa de estímulos. Terceiro, porque tive que adaptar a ideia de Stanislavski sobre memória emotiva, voltada à criação de personagem, para aplicação de escrita de texto teatral.

Os jogos de Spolin e alguns de Boal acabaram sendo um incentivo maior para os processos das aulas, pois através deles incentivava a escrita e rememoração dos fatos. Como, por exemplo, a simples atividade Quem iniciou o movimento?, proposta no livro Jogos teatrais: o fichário de Viola Spolin (2001), que é uma brincadeira da infância deles conhecida como cacique. No jogo, os alunos permaneceram em círculo e, um jogador sai da sala e um líder escolhido pelo grupo inicia os movimentos que devem ser repetidos por todos. Ao voltar para a sala o aluno deve descobrir quem é o líder. Dessa forma, essa atividade de teatro fez os alunos se lembrarem da infância e trabalhou com aquecimento corporal, olhar e agilidade. Além disso, utilizei também diversos jogos do Manual de Criatividades, como o jogo da cantiga em que cada participante sugere uma canção para ser cantada e dançada por todos.

Por fim, outra alteração de rumo da oficina que ocorreu foi a inserção, proposta pelos alunos, da breve discussão sobre família e mundo tecnológico acrescentada ao texto juntamente com o tema central de infância e memória. Isso foi bastante relevante para a minha pesquisa já esse público alvo trata-se da Geração Z, marcada pelo uso frenético da tecnologia. Tratar desse assunto na peça contribuiu para uma abordagem sobre eles dentro do espetáculo e também uma forma de fazê-los perceber o quanto esse mundo “online” está impregnado em suas vidas. Essa visão proporcionou aos alunos a possibilidade de desfrutar de outros meios de entretenimentos e interação social, como a brincadeira do esconde-esconde que foi realizada em uma das aulas.

Para a realização da oficina foi feita uma seleção onde houve vinte inscritos no total, porém primeiramente apenas treze compareceram nos primeiros dias da oficina. No decorrer da mesma surgiram mais três alunos totalizando dezesseis, contudo dois destes não puderam participar da mostra por motivos pessoais, mas estiveram presentes em todas as aulas participando ativamente na construção dramatúrgica.

No total, as aulas de teatro foram realizadas para 16 alunos do colégio Aliança no período de setembro a dezembro de 2014. Para a coleta de dados foram utilizados os seguintes instrumentos: diário de bordo, fotos, relatos orais nas aulas e observação dos participantes nos quesitos presença, participação, desenvolvimento, criatividade, relação com o grupo e criação dramatúrgica.

Mesmo com todos os ajustes necessários, foi possível alcançar boa parte do planejamento, trabalhando a expressão corporal e vocal, interpretação de texto, construção de personagem e principalmente a criação dramatúrgica coletiva que resultou em uma mostra satisfatória para todos os envolvidos.

4.1 PRIMEIRA ETAPA – O ENCONTRO

Nas primeiras aulas, como nem todos do grupo se conheciam apesar de estudarem no mesmo colégio pela manhã, apliquei exercícios que contribuíram para uma maior interação entre eles. Além disso, tais atividades, ao mesmo tempo que mostravam aos poucos como funcionava uma aula de teatro proporcionou-lhes uma maior intimidade com essa área. Afinal, essa etapa buscou preparar os alunos para que eles pudessem alcançar um bom desempenho durante o processo, fazendo diminuir as barreiras individuais e coletivas, sejam elas físicas ou psicológicas. O intuito dessa etapa foi também realizar esse encontro comigo e com o fazer teatral. Por esse motivo denominei a primeira fase de O encontro. Esta etapa foi a mais longa, durou cerca de um mês e meio, setembro e parte de outubro.

Logo na primeira aula, ao promover o jogo do Hope[3], foi perceptível como tudo parecia tão novo e atraente para os participantes da oficina. Nesse mesmo dia já foi possível aplicar uma atividade voltada para a infância. Solicitei que os alunos deitassem, repousassem e depois aos poucos pedi que eles se lembrassem de um fato marcante da infância. Após o exercício, em silêncio, convoquei-os a levantar e escrever tal lembrança. A maioria se empolgou na escrita e textos enormes foram produzidos. Foi assim que surgiram as primeiras narrativas relacionadas a infância. Uma das alunas, S. C.[4] de 13 anos, me chamou atenção nessa aula porque durante o exercício de rememoração ela começou a chorar incontrolavelmente. Eu pedi que levantasse, mas ela não queria parar o exercício. Somente através de sua escrita percebi o que se passava. S. C. perdeu seu pai quando era criança e não conseguia superar isso. Mas, de acordo com a declaração da própria aluna, com o andamento das aulas ela começou a lidar melhor com a situação e com seus sentimentos guardados.

Também nesse primeiro encontro nasceram alguns acordos de grupo, como manter em segredo tudo que era revelado em sala de aula, já que eles se dispuseram a contar fatos íntimos da vida pessoal. Isso foi bem interessante como professora, pois ativava automaticamente a confiança em grupo. Percebi o que Spolin (2007, p. 32) aponta: “Através do foco entre todos, dignidade e privacidade são mantidos e a verdadeira parceria pode nascer.” Claro que essa declaração de Spolin refere-se a um jogo, mas entendo dentro desse discurso que através de outro método aplicado isso também apareceu.

Como essa etapa era de preparação foi importante que ela durasse mais tempo, por volta de um mês. Nesse período os jogos de Spolin de preparação contribuíram bastante para uma formação corporal dos alunos ativando todos os sentidos como a audição que foi trabalhada no jogo Ouvindo o ambiente sugerido no fichário de Spolin. A atividade funcionou da seguinte forma: todos permaneceram deitados e silenciosamente de olhos fechados por um determinado tempo ficaram ouvindo os sons do ambiente imediato. Desse modo, os participantes ganharam uma maior percepção auditiva do próprio local de aula.

As atividades de preparação física foram as mais diversas possíveis indo do aquecimento através de caminhada pelo espaço com diferentes modos de andar até brincadeiras da infância que são considerados jogos teatrais como o Chicotinho queimado, apontado pelo fichário de Spolin. A atividade funciona da seguinte maneira:

os jogadores sentam-se em círculo, voltados para o centro e iniciam batendo palmas ritmadamente. Sorteia-se um jogador para ser o menininho que dará voltas em torno dos parceiros sentados em círculo. Ele vai abandonar, no chão, atrás de um dos parceiros na roda um objeto qualquer. O menininho age dissimuladamente, não deixando que o parceiro, atrás de quem foi abandonado o objeto, perceba. [...] Só o ritmo acelerado das palmas indica que o objeto já foi abandonado. Quando o objeto for percebido, o jogador na roda levanta, pega o objeto e tenta alcançar o menininho antes que esse tenha dado uma volta completa no círculo e tenha se sentado no lugar que antes lhe pertencia. (SPOLIN, 2001, A96)

Esse tipo de jogo, além de ser um aquecimento ativo, trabalha com a questão da competição, atenção, ritmo e acaba sendo uma forma de retorno à infância, pois fez os alunos lembrarem como se sentiam e como realizavam tal brincadeira, a exemplo o jogo Batatinha Frita que realizamos em sala de aula a partir dos que eles recordaram. Sendo assim, eles também rememoraram outros divertimentos como o esconde-esconde, cacique, coelho na toca, telefone sem fio, entre outros jogos recomendados pelo Manual de criatividades. Alguns destes foram colocados em prática durante a oficina e outros eles relataram em textos ao escrever sobre sua infância ou criarem personagens a partir disso.

A animação em realizar as atividades teatrais sempre foi constante e tornou-se crescente. Por isso, diferente dos primeiros encontros, a conversa e falta de concentração dos participantes começaram a ser frequentes nos meados dessa etapa devido a grande quantidade de energia dos alunos e a união do grupo. Contudo, quando alertei a turma sobre a dispersão eles tentaram se conscientizar e mantiveram um bom comportamento. Aproveitei e lhes mostrei a importância do foco no teatro através de exercícios de concentração, afinal como aponta Spolin (2001, p. 29):

Foco é a pausa, um ponto de partida para tudo. Todos se encontram pelo FOCO. A instrução ajuda os jogadores a encontrar/manter o FOCO que coloca o jogo em movimento e todos se tornam parceiros ao lidar com o mesmo problema de diferentes pontos de vista.

Vale ressaltar que essas conversas não influenciaram no andamento da oficina, pelo contrário, no decorrer do processo o grupo foi se mostrando cada vez mais disponível, participativo e engajado nos exercícios e jogos, bem como nas discussões ao final de cada aula, cada um atendendo as propostas com seu nível de participação. Afinal como declara Dourado e Milet:

Como nem todas as pessoas são iguais, os níveis de participação podem variar. Não se deve esperar a mesma resposta de alunos diferentes, pois existem diversas formas do aluno manifestar seu interesse. Ou seja, uma postura, aparentemente ativa, não é o único indicador do grau de interesse e concentração, nem do envolvimento da criança na atividade. (1985, p. 23)

Outro ponto observado nessa primeira etapa era a dificuldade que alguns alunos tinham de se expressar tanto oralmente como na escrita. Em toda aula reuniões eram realizadas para avaliar as atividades do dia, a participação deles e discussão coletiva sobre os desejos da mostra para uma posterior construção do texto. Apesar de pequenas produções estarem sendo realizadas durante as aulas, inclusive enquanto uns escreviam diversas linhas sobre a sua infância outros não passavam de uma, eles raramente recusavam-se a escrever.

Entre os momentos mais significativos dessa primeira etapa esteve a aula de integração com sequência de massagem e descontração proposto por Boal (1989, p. 58). Parte dessa atividade segue as mesmas orientações do pêndulo proposto no Manual de Criatividades. O exercício consistiu em colocar os alunos em círculo com um voluntário ao centro e este permaneceu de olhos fechados, pés juntos e ficou em uma posição em que seu corpo oscilou, caindo para todos os lados possíveis. Enquanto isso, o grupo em volta aparou o colega colocando-o em pé novamente. Tal atividade “se trata de um exercício de confiança e responsabilidade, e que o grupo deve fazer com que o colega do centro não sinta medo de deixar o seu corpo cair, confiante de que alguém vai apará-lo” (DOURADO; MILET, 1985, p. 118).

Outro momento essencial para o seguimento da oficina e inicio da segunda etapa foi a produção de pequenas escritas em algumas aulas voltadas à descrição de momentos da infância e/ou descrição de personagem a partir do que eles lembravam, assim como a criação de cenas improvisadas com os mesmos. Este trabalho com a memória era feito em boa parte das primeiras aulas da seguinte maneira: os alunos deitavam-se e ao som de uma música ou som ambiente; seguindo as minhas orientações, eles eram indicados a lembrarem de algum momento da infância que às vezes eu especificava ou não; depois disso, eles iam se levantando silenciosamente e partiam para a escrita do que rememoraram sem dialogar com ninguém. Em seguida, as lembranças eram compartilhadas por meio de leitura, apresentação cênica individual ou em grupo ou criação de personagem a partir daquele texto.

Sendo assim, essa primeira etapa foi marcada pela forte interação do grupo, adaptação às aulas e empolgação com os exercícios, um verdadeiro encontro com tudo que estava envolvido na oficina. Assim como as descobertas sobre o fazer teatral. Eles aprenderam sobre a respiração no teatro, as posições no palco, os planos e caminhos no espaço, a dicção e puderam mostrar um pouco da sua infância fazendo relatos, escrevendo pequenos textos e levando objetos e/ou músicas para a sala de aula bem como propostas de brincadeiras, dando início assim a segunda etapa.

4.2 SEGUNDA ETAPA – O SURGIMENTO

Apesar de terem ocorrido construções textuais na primeira etapa e pequenos exercícios voltados para a temática da infância, o enfoque ainda não caía sobre a construção dramatúrgica. Foi justamente na segunda etapa que começou a nascer o texto da mostra, por isso denominei tal fase de O surgimento. Esta etapa mescla um pouco com a primeira e durou cerca de um mês, final de outubro e início de novembro. Um trabalho mais centrado no campo da escrita e teatral iniciou-se. Passei a explicar também, de forma teórica, as funções existentes em um teatro: de iluminador, cenógrafo, produtor, entre outros. Explanei para os alunos, brevemente, o funcionamento de um grupo teatral e as técnicas de escrita de peças.

A escrita aconteceu em grupo, porém eu servia como orientadora dessa construção e também autora do texto. Entretanto a opinião de todos tornou-se fundamental para a produção da peça, afinal

Um relacionamento de grupo saudável exige um número de indivíduos trabalhando interdependentes para completar um projeto, com total participação individual e contribuição pessoal. Se uma pessoa domina, os outros membros têm pouco crescimento ou prazer na atividade, não existe um verdadeiro relacionamento de grupo (SPOLIN, 2006, p. 8)

E meu intuito não era esse, pelo contrário, o trabalho coletivo, no meu ponto de vista é até mesmo mais prazeroso e enriquecedor, ainda mais quando se trata de uma escrita dramatúrgica.

Essa etapa, a princípio, só se referia a criação de narrativa cênica a partir do que surgiu em sala nos processos anteriores. Porém, ainda se fez necessária a aplicação de jogos e técnicas teatrais. Além disso, foi reforçada a questão da infância com a execução de mais brincadeiras, propostas tanto por mim como por eles. No quesito da infância, em uma das aulas, houve um resgate das cantigas que inclusive é uma atividade apresentada no Manual de Criatividades. Nessa fase também passei a ter mais participação no processo de memória e infância. Esse recurso foi um aspecto muito interessante, pois, como há uma diferença de idade entre nós, as minhas brincadeiras e cantigas não possuíam o mesmo formato que a deles, algumas canções ganharam ritmos diferentes, por exemplo, e automaticamente muita coisa tornou-se novidade. A partir do momento que entrava no jogo havia uma maior relação de confiança com os alunos e eles pareciam mais dispostos a participar, sem acanhamento. Ao mesmo tempo, o formato diferente que trazia da brincadeira deixava-os mais curiosos com a proposta.

Outra forma que utilizei, além das brincadeiras, foi a execução de músicas da infância dos alunos ou da minha durante as aulas e a utilização de objetos marcantes da infância dos alunos levados por eles para a aula. Além disso, o breve trabalho a partir da ideia de memória emotiva de Stanislávski em uma das aulas influenciou na criação dramatúrgica dos alunos, fazendo-os desenvolver seus potenciais artísticos e ativando os seus imaginários para a criação de narrativas. Partindo de lembranças da infância eles construíram, de forma descritiva e cênica, personagens que foram apresentados em sala nas improvisações feitas nas aulas.

De acordo com Zaltron (2010, p. 01), Stanislavski propõe trabalhar a partir das subjetividades interiores, ou seja, do “crer para agir”, por isso focou na memória emotiva. Para ele a memória emotiva justifica internamente as ações do ator em cena e traz para ela uma maior veracidade, pois a sensação para o ator é de estar vivendo novamente aquela emoção. Porém, na verdade tal sentimento está sendo utilizado pelo personagem naquele momento. Trata-se de uma reativação das subjetividades internas através da memória, neste caso das lembranças da infância, para uma posterior inserção desta recordação na ação física.

Portanto, tal fase buscou um trabalho mais enfático no campo da dramaturgia, dando inicio ao processo de escrita coletiva que, por sua vez, estava sendo estimulada pela memória da infância, fator de grande importância para o processo criativo, seja ele cênico ou escrito, como aponta Sanchez (2010, p. 95):

Quando um estímulo é proposto em um processo criativo, parte-se intencionalmente para a reflexão sobre este. Essa atitude é um convite a manifestação da memória, à reação ao estímulo, trazendo lembranças de imagens vividas ou imaginadas, ativadas com determinada intenção. Nesse momento várias zonas da memória são acionadas, chegando aos campos em que repousam os tesouros das inumeráveis imagens de toda espécie de coisas introduzidas pelas percepções. As primeiras intuições organizam-se pela ação do pensamento, visto que os sentimentos são manipulados de propósito.

Por esse motivo foi possível observar em diversas cenas apresentadas em sala de aula a presença do estado emocional do aluno assim como a inserção de fatos do dia-a-dia, como violência, problemas familiares e desigualdade social. Nessa segunda etapa também foram utilizados com mais proeminência a respiração diafragmática, exercícios corporais e vocais e construção de personagem.

A aula mais marcante dessa fase foi quando minha orientadora de estágio, professora Celida Salume, esteve presente para observação, pois isso os deixou empolgados e nervosos ao mesmo tempo. Nessa aula um dos exercícios que ajudou bastante para o desenvolvimento dos alunos foi a atividade da projeção vocal com o auxílio do elástico juntamente com o trabalho de lembranças de músicas da infância. Em dupla, os alunos esticavam ou aproximavam o elástico um do outro e trabalhavam a projeção vocal a partir dessa movimentação cantando músicas da sua infância, ora todos juntos, ora em instantes separados, fazendo-os explorar o sentido auditivo e a atenção no colega. Por meio desta atividade surgiu uma das músicas presentes na mostra final que foi a canção Brincadeira de Criança (1997) do grupo Molejo.

Outro acontecimento significativo foi a atividade do Guia de cego do Manual de Criatividade. Em duplas, um colega conduzia o outro e cada cego possuía um guia que conduziu um passeio pela instituição. Posteriormente, os papéis foram invertidos. Neste dia foi possível explorar o ambiente escolar para além da sala de aula, praticando o exercício por todo o pátio do colégio e fez com que os participantes reconhecessem objetos e pessoas, ativando assim o tato, e trabalhando com a confiança no companheiro de sala.

Contudo, o fundamental dessa etapa foi a construção final do texto. Tendo como base todas as narrativas, cenas e personagens criados em sala de aula foi possível criar o texto final da mostra unindo à ideia inicial de montagem com as propostas de temáticas dos alunos.

Como lembranças vivas provocadas na memória pelos impulsos interiores, o drama e, consequentemente, a dramaturgia, seria o processo consciente que manipula essas lembranças vividas, compondo sequências de ações com o significado da interpretação sobre um tema. (SANCHEZ, 2010, p. 96).

Sendo assim, utilizei o estudo da memória emotiva, que ativa a criação de personagem a partir de lembranças do próprio ator, com os alunos adaptando o conceito para a produção dramatúrgica. Nessa fase, estimulei veementemente as lembranças dos fatos da infância por diversos meios: cantigas, brincadeiras, relaxamento, objetos e músicas, e sempre após esse processo de rememoração eles escreviam o que haviam lembrado. Eu recolhia todas as escritas feitas em sala e no diário de bordo ou anotava o que era relatado. Aos poucos fui unindo as problemáticas presentes nessas memórias em um único texto. As discussões ficaram centralizadas em torno da importância da infância e do saudosismo pelas brincadeiras e cantigas. Voltado para isso, a peça fala sobre uma loja de brinquedos tradicionais abandonada devido ao frenético desejo das crianças por tecnologias. Temática também proposta pelos alunos.

Dessa maneira, nasceu nessa etapa a peça Quando eu era pequeno. O espetáculo fala da loja de brinquedos Sintonia. A mesma encontra-se abandonada porque as crianças só querem saber das tecnologias e videogames da loja que foi aberta em frente. Com isso, Sintonia, que ganhava vida toda a noite, fazendo os seus brinquedos falarem e dançarem na maior alegria, encontrava-se agora sempre fechada. Até que certo dia o dono da loja vai até a empresa pegar um documento e acaba não fechando a porta direito. O menino Pedro, que estava na loja de videogames, vê o acontecimento. Espertamente consegue enganar os pais, que estavam fascinados pelas tecnologias, e entra na loja. Fica triste ao ver tantos brinquedos abandonados e quebrados. Senta-se, começa a chorar cantando a música da sua infância e de repente todos os brinquedos ganham vida. O garoto fica encantado com a mágica da loja, os brinquedos ficam felizes com a presença de uma criança e cada um conta sua história. Até que o garoto tem uma brilhante ideia que irá solucionar o problema da Sintonia: cantar para as crianças, que estão na loja da frente, uma música da infância delas no intuito de atraí-las para a loja. O que Pedro não sabia era se aquilo tinha sido realidade ou apenas um sonho, pois ele acabou dormindo dentro da loja e quando acordou estava tudo parado.

Alguns dos personagens dessa história nasceram em sala de aula nas improvisações apresentadas como o robô, a bailarina, o soldado e o garoto. Vale ressaltar que tais improvisos foram feitos a partir das lembranças da infância, especificamente dos brinquedos que eles gostavam. Outros personagens surgiram dos próprios brinquedos que os alunos levaram para a sala de aula ou relataram em textos. A minha memória foi inserida no texto através dos nomes dos personagens que eram de pessoas que haviam marcado minha vida. Além disso, uma das músicas da peça foi uma canção importante da minha infância. Contudo as outras músicas foram também originadas das memórias dos participantes.

4.3 TERCEIRA ETAPA – A CONSTRUÇÃO

Esta foi a etapa que definiu tudo para a mostra final: cenário, personagens, figurino, participantes, ensaios extras, entre outros fatores. Praticamente, essa fase durou quase todo o mês de novembro. Por se tratar da formação do espetáculo tal fase denominou-se A construção. Primeiramente, dos dezesseis participantes, apenas o aluno L. H. informou que não poderia participar da mostra devido a um compromisso pessoal, mas confirmou que gostaria de continuar participando das aulas e acompanhar os ensaios, tentando colaborar com o que fosse possível. Dessa forma, o aluno acabou exercendo a função de assistente nos ensaios, com participação ativa.

Posteriormente, na última semana de aula, mais precisamente no antepenúltimo ensaio, a aluna L. C. deixou de participar da oficina por proibição de sua mãe porque a aluna foi para a recuperação de uma disciplina no colégio. Essa saída, como não foi avisada com antecedência, prejudicou um pouco o grupo, pois substituições tiveram que ser feitas de última hora sendo que a aluna participava dos ensaios e possuía um personagem de relativa importância na peça.

Com personagens já definidos foi possível trabalhar com mais ênfase na construção de corpo e voz de cada um, assim como na marcação e colagem de cenas. O trabalho com a projeção vocal tornou-se mais severo e alguns ensaios passaram a acontecer em diversos ambientes da escola com o intuito de trabalhar a adaptação com o espaço e voz. Devido às faltas de alguns alunos fez-se necessário em esporádicos ensaios a substituição de personagens. Isso de certa forma facilitou o trabalho com a improvisação e possíveis alterações em caso de desistência como ocorreu com a aluna L. C.

O texto teve que sofrer modificações. A peça, que terminava com os personagens cantando com o intuito de trazer as crianças da outra loja para a Sintonia, foi modificado. Em reunião ficou acordado que o personagem Pedro dormiria na loja e quando acordasse não saberia se aquilo tinha sido um sonho ou não. Essa sugestão foi dada também remetendo à obra Alice no país das maravilhas (1951) que também serviu de incentivo para a oficina. Filmes como Peter Pan (2003), Toy Story (1995) e A loja mágica de brinquedos (2007) foram fontes inspiradoras para a escrita coletiva. Assim como referências da minha adolescência e infância dos alunos.

Diversos estímulos voltados para a temática da infância foram trabalhados na oficina. Um deles foram os filmes das histórias de Peter Pan: a obra Hook - A Volta do Capitão Gancho (1991) protagonizado pelo ator Robin Williams e o longa-metragem Peter Pan (2003) protagonizado por Jeremy Sumpter. A história possui diversas vertentes atreladas ao seu contexto, entre as principais estão a questão da criança que foge dos seus problemas e não amadurece e o fato do personagem não querer crescer e desejar viver para sempre como criança mostrando assim o quanto esta fase, mesmo com alguns problemas ocorridos, pode ser marcante, importante e prazerosa para o ser humano. Peter Pan conta a história da criança que se sente rejeitada pela família ao ver que foi substituído por outro depois de ter voltado da viagem até a Terra do Nunca. Sentindo-se abandonado pelos pais, Peter volta para a Terra do Nunca e junta um grupo de crianças para viver nessa ilha onde eles nunca crescem e a infância nunca acaba. Ao descartar a idade, Peter Pan torna-se exemplo para os jovens que amaram sua infância e desejavam ficar jovens, assim como os Meninos Perdidos, nomes dados ao grupo de garotos que vivem com Peter. Por esse motivo, a história apresentada no filme Peter Pan também foi instrumento utilizado para a parte prática dessa pesquisa, assim como material de estudo para os alunos.

Além disso, o trabalho com a temática da infância ajudava-os a recordar dos bons momentos vividos já que muitos alunos vivenciaram cenas de violência e tráfico no próprio ambiente familiar e/ou no local onde moram. Um exemplo de atividade exercida foi o que nomeei no processo de “dia das brincadeiras”, onde cada um propôs um jogo ou cantiga da infância e todos participavam da proposta. Sendo, em sua maioria, moradores da parte periférica do bairro de Matatu de Brotas e redondezas, alguns tinham dificuldade para ir até a escola devido a acontecimentos de violência próximos as suas residências ou por não ter companhia para voltar, o que tornava mais perigoso o retorno. Alguns deles possuíam uma infância marcada pela rejeição ou ausência do pai, pela convivência com irmão usuário de drogas, por não aceitarem a educação religiosa da sua família, dentre outros aspectos.

Por isso trabalhar com a infância os fez perceber que eles também guardavam boas lembranças do que viveram e ajudava-os a esquecer dos problemas vividos chegando a aliviar a mágoa que tinham dessa época. Outros alunos, por outro lado, eram marcados mais pelas pequenas paixões, pelas brincadeiras, pelos desenhos animados e pelas músicas, contudo todos tinham armazenado em suas mentes algo importante daquela época. Um ambiente com apenas 16 alunos, mas com diferentes experiências e as mais variadas memórias.

Com o andamento dos ensaios o final foi sendo modificado gradativamente. O cenário e figurino foram os elementos mais demorados para serem definidos. Como esclarecido no início da oficina, o figurino seria responsabilidade dos alunos. Em acordo na sala de aula, todos preferiram escolher cada um a sua roupa e construir um cenário coletivamente. Eu fiz as devidas propostas de trajes para que não houvesse problemas, pois “nada é mais destoante em uma produção do que trajes que saltem aos olhos dos espectadores, mas os atores e outros elementos não”. (JÚNIOR; KOUDELA, 2015, p. 78). Mas, os alunos só alugaram e/ou fizeram os figurinos na última semana de aula.

Quanto ao cenário, a proposta era utilizar caixas de papelão forradas de papel presente para que as mesmas lembrassem uma loja de brinquedos. Cada um ficou responsável por conseguir três caixas, inclusive eu. Depois eles deveriam construir essas caixas em casa ou na escola. Todavia, essa confecção demorou um pouco para acontecer. Foi necessária uma cobrança mais severa para que eles iniciassem a produção das mesmas. Por isso o cenário também só foi finalizado na última semana de aula, o que foi bastante arriscado, pois a cenografia é a “grafia (ou pintura) da cena” (JÚNIOR; KOUDELA, 2015, p. 29). Portanto,

é um elemento sólido do espetáculo e da concretização da cena. E que qualquer elemento, seja ele uma cadeira simples ou uma casa de madeira, muda de dimensão quando no espaço cênico, ganhando um significado diferente do que carrega no dia a dia (JÚNIOR; KOUDELA, 2015, p. 30)

Por isso, as mudanças cenográficas que surgem durante os ensaios devem ser imediatas. Como foi o caso da escada utilizada no espetáculo. Inicialmente, apenas uma escada ia ser utilizada no cenário para a personagem da feiticeira, entretanto, depois surgiu a proposta da princesa também usar. Logo, assim que a modificação aconteceu teoricamente, os ensaios também sofreram alterações cenográficas. Os elementos de cena também foram conseguidos pelos participantes.

A dispersão tornou-se constante em alguns ensaios e novamente foi preciso chamar atenção deles. Houve uma dificuldade em manter o foco, com a aproximação da data de apresentação os alunos pareciam mais agitados. Após uma conversa mais séria eles começaram a se conscientizar do papel que estavam exercendo e da importância que aquilo tinha para eles. Com isso o grupo conseguiu se controlar mais e todos se empenharam para que tudo desse certo. A marca dessa etapa foi a forte união dos participantes para obter uma boa mostra.

4.4 QUARTA ETAPA – A MOSTRA

Esta fase é marcada pelo ensaio no teatro e pela apresentação dos alunos no dia 06 de dezembro. Portanto, essa foi a etapa final que durou apenas dois dias. Os participantes tiveram a possibilidade de conhecer e ensaiar no Teatro Martim Gonçalves, localizado no bairro do Canela, em Salvador, mesmo local onde está situada a Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia. Isso foi fundamental para muitos deles, já que a maioria nunca tinha ido a um teatro. Os alunos também conseguiram assistir ao ensaio da turma de minha colega Jamile Cruz e nesse momento fizeram muitos questionamentos sobre as posições que deveriam permanecer, assim como voz e corpo no palco. Por isso quando foram ensaiar houve uma maior facilidade para posicionamento e projeção vocal. Apesar de ter sido rápido, o ensaio neste ambiente contribuiu muito para o desempenho na mostra. Esta etapa marca a finalização do processo, sendo o ensaio no dia 05 e a apresentação no dia 06 do mês de dezembro, os dois no teatro Martim Gonçalves. Nos dois dias tivemos o apoio do transporte do colégio.

A mostra extrapolou o tempo estimado porque em nenhum ensaio tínhamos conseguido passar a peça toda com as músicas e nem com o vídeo de abertura. Sendo assim a mostra durou em média trinta minutos. Chegamos cedo ao teatro e antes da apresentação foi possível passar a peça novamente, porém o aluno B. V., devido ao nervosismo, chorou por ter errado uma cena nessa passagem. Tive que sair da cabine de som para ir acalmá-lo. Realizou-se a concentração no camarim e depois todos foram para as suas devidas posições. Fui surpreendida com o desempenho deles. Estavam falando alto e de forma segura.

Contudo em alguns momentos os alunos esqueceram o texto que justamente referia-se a fala da personagem da aluna L. C. que foi substituída. Mas de forma inesperada e sagaz o aluno G. C. reconstitui a cena entrando em momentos que não estavam previstos para o seu personagem. Foi perceptível que ele buscou ajudar os colegas e recompor a cena sem mostrar ao público o deslize da turma. E de forma também brilhante o grupo seguiu a sua improvisação até retomar ao texto. Isso mostrou como o grupo estava unido e pronto para improvisar. Enfim, no final tudo deu certo e muitos estavam satisfeitos: eu, alunos, professores e público em geral.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa partiu do seguinte questionamento: “Como se dá a criação dramatúrgica a partir da memória da infância com alunos de 11 a 16 anos?”. Tendo isto como base, realizei uma oficina com a finalidade de incentivar e desenvolver a criação dramatúrgica a partir de técnicas e jogos teatrais coletivos e individuais os quais resultariam em uma mostra teatral.

Para o processo das construções dramatúrgicas esta pesquisa utilizou metodologias baseadas nos estudos de Stanislavski sobre memória emotiva proposto no livro Preparação do ator; Nas propostas de Cabral fundamentadas no Drama como método de ensino; Nos jogos teatrais e improvisações de Viola Spolin, presentes nos livros Jogos teatrais na sala de aula, Improvisação para o teatro e Jogos Teatrais: o fichário de Spolin; Nas ideias de Maria Eugênia Milet e Paulo Dourado contidas no Manual de criatividades; E nos jogos de Augusto Boal do livro 200 exercícios e jogos para o ator e o não-ator com vontade de dizer algo através do teatro. Além disso, somei a essa pesquisa o estudo da memória baseado no livro Matéria e Memória de Henri Bergson.

Dessa forma, descobri que a criação dramatúrgica a partir da memória da infância se dá de forma espontânea em sala de aula. Os jogos, por mais que não sejam voltados para isso, quando direcionados para esse intuito, funcionam de forma positiva, ainda mais por se tratar de um trabalho temático e específico da criação dramatúrgica. O trabalho baseado na memória emotiva de Stanislávski contribuiu muito para a criação dramatúrgica dos alunos, fazendo-os ativar a memória da infância e desenvolvendo seus potenciais artísticos.

O estudo da memória, da infância e da dramaturgia contribuiu para responder a pergunta norteadora da minha pesquisa. Sem entender essa Geração Z e sem o conhecimento sobre a memória, eu não conseguiria descobrir como a dramaturgia nascia na sala de aula. Pois, foi a inter-relação desses elementos que proporcionaram a produção textual através de uma prática. Mesmo que algumas dessas teorias tenham sido adaptadas durante o processo prático, elas não foram descartadas, e sim redimensionadas e/ou aperfeiçoadas de acordo com as necessidades da turma. Isso contribuiu mais ainda para minha vida como pesquisadora, pois me fez conhecer melhor as teorias de minha pesquisa sem imposição das mesmas aos meus alunos e conhecendo seus limites. Afinal, como foi o caso desta investigação,

O professor de teatro, de modo particular, necessita dispor de um repertório de conhecimentos de dramaturgia e textos dramáticos (incluindo, com a devida ênfase, a produção brasileira), a fim de que possa orientar processos criativos que se deem sob sua responsabilidade (JÚNIOR; KOUDELA, 2015, p. 59)

A experiência dessa pesquisa foi a realização de um sonho. Ver alunos, que sempre quiseram fazer teatro, no palco do Teatro Martim Gonçalves, brilhando, foi muito gratificante. Ler os diversos diários de bordos e ver depoimentos como: “foram as melhores tardes deste ano” (G. C.), “se não fosse suas aulas eu entraria em depressão” (M. C.), “foi uma terapia para aqueles que precisavam” (H. S...), entre outros testemunhos, me deram orgulho de cursar Licenciatura em Teatro. Estimular a escrita em sala de aula apenas comprovou o gosto que as pessoas têm em escrever. Elas só necessitam receber estímulos para colocar isso em prática. Quando isso acontece, diversas produções textuais nascem, como foi o caso desta investigação. Portanto, tal pesquisa, além de caráter terapêutico, foi uma contribuição para o desenvolvimento da cognição dos estudantes. A realização da criação dramatúrgica de forma pedagógica me fez perceber a contribuição social que o teatro pode exercer na formação do aluno, como confirma Júnior e Koudela:

Por isso, o conhecimento teórico e a experimentação prática, o exercício da função dramatúrgica, tornam-se, ou deveriam tornar-se, prioridades curriculares nesse nível de ensino. Em contexto de ensino/aprendizagem teatral que se dão fora da escola, em contextos de educação não formal (tal como na ação cultural, entre outros), os processos de criação dramatúrgica adquirem um relevo marcante, pelo fato de poderem torna-se modo de expressão fundamental do universo dos participantes, sem se perder de vista a possibilidade de sua problematização propulsora de reflexão e ação, para além da formação artística e estética. (JÚNIOR; KOUDELA, 2015, p. 59)

Durante o processo, os desafios foram inúmeros, entre eles: manter o ritmo das aulas para que elas não se tornassem cansativas, adaptação de planos de aula aos alunos e espaço disponível, o estabelecimento de uma relação afetuosa, cuidadosa e de respeito com os participantes, entre outros fatores.

A oficina me trouxe alguns desafios pertinentes quanto a minha futura profissão. As aulas me possibilitaram refletir sobre a postura que devo ter em sala de aula e com os alunos, principalmente no quis diz respeito de entendimento do ser humano e seus problemas. Com essa pesquisa constatei o verdadeiro objetivo da Educação através da Arte apontada por Milet e Dourado:

No relacionamento professora-aluno a palavra da professora tem um peso e uma importância muito grande. Qualquer juízo de valor como feio-bonito, bom-mau, certo-errado, mesmo que não seja colocado como correção ou avaliação, pode projetar modelos de conduta, aos quais a criança vai tentar adaptar-se, fugindo assim à expressão genuína do seu verdadeiro universo. Este caso constituiria justamente o oposto dos principais objetivos da Educação através da Arte: O auto conhecimento e a livre expressão do indivíduo. (1985,p. 23)

No papel de professora pude perceber como foi imenso o desenvolvimento dos alunos tanto no comportamento como na expressão corporal e vocal. Alunos que não se expressavam e não sabiam lidar com seus próprios dilemas conseguiram alcançar pequenas transformações por meio das aulas de teatro. Vale ressaltar que foi essa prática que me ensinou a lidar com questões rotineiras e empíricas que podem vir a acontecer dentro de uma instituição de ensino ou oficina. Além disso, aprendi que existem outros fatores de influência no processo de ensino-aprendizagem dos alunos como a convivência familiar e a violência.

Percebi que o teatro pode ser um fator importante na vida de um adolescente, pois pode vir a colaborar com o seu desenvolvimento corporal e expressivo e estimular a sua criatividade. Por consequência, isso pode levar a uma formação mais sensível e posteriormente uma construção de um individuo que enxergue o mundo de forma diferente, com uma visão mais ampla. E acredito que ter promovido esta oficina para alunos que nunca tiveram contato com o teatro pode ter sido importante para o desenvolvimento deles. Vale ressaltar que a abordagem teórica aliada a essa prática fortaleceu também o campo de pesquisa na área de dramaturgia.

Mudanças significativas foram constatadas e pontuadas pela coordenadora do colégio e por alguns pais e professores. Eles relataram que alguns participantes da oficina haviam mudado de comportamento, pareciam mais calmos e animados com as aulas de teatro. Até os próprios alunos agradeceram pelas aulas e falaram que estavam mais unidos, que o teatro lhes proporcionou um maior círculo de amizade e a diminuição da timidez. Como mostra o relato presente no diário de bordo do aluno G. C.: “As aulas foram boas, foram quase uma terapia em grupo” (2014).

Dessa experiência no Colégio Aliança, o fator mais significativo foi perceber a importância das aulas de teatro na vida desses alunos. O quanto foi fundamental para o desenvolvimento deles tanto na escola como no ambiente familiar e social. O agradecimento não partiu somente deles, mas também de muitos pais. E ambos torceram para que as aulas continuassem. Fiquei muito surpresa com as declarações e mudanças positivas dos alunos. Assim como o meu envolvimento com o grupo e as aulas.

Outro fator importante da oficina foi a assídua presença dos alunos. A grande maioria comparecia as aulas, alguns faltavam apenas em época de avaliação no colégio. Mesmo não tendo uma participação muito ativa, a instituição também buscou contribuir com a realização das aulas cedendo espaço, equipamento de som, local para guardar cenário, alguns materiais para construção de cenário e transporte gratuito para os alunos nos dias de ensaio e apresentação no Teatro Martim Gonçalves. Além disso, a coordenadora prestigiou os alunos estando presente na mostra do dia 06 de dezembro.

A coordenação também incentivou solicitando que o grupo se apresentasse no dia 28 de novembro na festa de encerramento do ensino fundamental I. E isso foi fundamental para os alunos, pois serviu como uma espécie de ensaio aberto e lhes proporcionou uma maior noção sobre a apresentação.

A experiência prática foi marcante para mim tanto no quesito realização pessoal como pesquisa de trabalho de conclusão de curso. Ampliou os meus horizontes como pesquisadora e me ajudou a definir meu objeto de pesquisa que ainda estava amplo demais quando esta oficina foi realizada. A investigação me trouxe alguns desafios pertinentes quanto a minha profissão, eles me possibilitaram refletir sobre a postura que devo ter em sala de aula e com os alunos, principalmente no quis diz respeito de entendimento do ser humano e seus problemas.

Vale ressaltar que foi a prática profissional que me ensinou a lidar com questões rotineiras e empíricas. Além disso, aprendi a lidar com os fatores que influenciaram no processo de ensino-aprendizagem dos alunos como convivência familiar e violência. E apenas na oficina dessa investigação tive a breve oportunidade de correlacionar tudo isso com a teoria, tentando buscar o melhor de meu trabalho como educadora.

O mais gratificante de toda essa experiência não foi somente ter alcançado meu objetivo como pesquisadora e ter conseguido também construir um texto coletivo. Mas foi perceber como a memória, o teatro e a infância podem se relacionar de maneira produtiva e como é importante um trabalho de criação dramatúrgica em sala de aula. Afinal, conseguir trabalhar jogos teatrais, expressão corporal e vocal e ainda estimular a produção de textos teatrais colaborou, no meu ponto de vista, com o desenvolvimento sensitivo-cognitivo dos alunos por meio de uma criação dramatúrgica subjetiva a partir da memória. Rememorar os fatos e transformá-los em texto tornou-se tarefa prazerosa para os alunos. Percebi também que ao resgatar a infância de adolescentes através de lembranças foi possível contribuir para um eventual aperfeiçoamento na formação desses jovens.

Sendo assim, concluo que a criação dramatúrgica em sala de aula nasce de forma natural e contribui de forma positiva na vida dos alunos ajudando-os a dominar a própria língua. Ao ver a transformação que o teatro causou na vida desses alunos percebi a importância dessa pesquisa para a formação desses adolescentes. Fazê-los lembrar da infância também foi importante para a superação das dores e/ou problemas passados. Ou seja, ajudá-los, tornou a oficina mais que uma realização de um sonho, me fez perceber, mais ainda, o quanto é importante o meu papel de professora na sociedade e que mesmo em pequena quantidade é possível melhorar a vida desses jovens e crescer junto com eles, como foi o meu caso. Sem dúvidas essa pesquisa foi o ápice de meu processo educacional como estudante de licenciatura em teatro, tendo contribuído muito para o meu desenvolvimento profissional e pessoal.

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ANEXOS

TEXTO TEATRAL CONSTRUÍDO

Quando eu era pequeno...

Sinopse: A loja de brinquedos Sintonia encontra-se abandonada porque as crianças só querem saber das tecnologias e videogames da loja que foi aberta em frente. Com isso, Sintonia, que ganhava vida toda a noite, fazendo os seus brinquedos falarem e dançarem na maior alegria, encontra-se agora sempre fechada. Até que certo dia o dono da loja vai até a empresa pegar um documento e acaba não fechando a porta direito. O menino Pedro, que estava na loja de videogames, vê o acontecimento. Espertamente consegue enganar os pais, que estavam fascinados pelas tecnologias, e entra na loja. Fica triste ao ver tantos brinquedos abandonados e quebrados. Senta-se, começa a chorar cantando a música da sua infância e de repente todos os brinquedos ganham vida. O garoto fica encantado com a mágica da loja, os brinquedos ficam felizes com a presença de uma criança e cada um conta sua história. Até que o garoto tem uma brilhante ideia que irá solucionar o problema da Sintonia. O que Pedro não sabia era se aquilo tinha sido realidade ou apenas um sonho, pois ele acabou dormindo dentro da loja e quando acordou estava tudo parado.

Personagens:

Criança – MATHEUS: um menino alegre de 9 anos que consegue resolver todos os problemas com muito otimismo. Ele está triste porque as crianças estão deixando de brincar e abandonaram seus brinquedos

Bailarina e Mãe – SARAH: uma dançarina de balé clássico que vive dentro de uma caixinha de música. Equilibrava-se com delicadeza e dançava com os braços levantados. Ela gosta muito do que faz, porém certo dia ela se desequilibra e cai machucando uma das pernas. É o dia em que conhece o soldado de chumbo por quem se apaixona perdidamente

Soldado de chumbo e pai – GUSTAVO: porque possuía um defeito na perna ele foi devolvido para a loja de brinquedos. Sempre ficou abandonado no canto da loja, por isso o soldado era muito triste. Até o dia em que ele viu a bailarina dançando em sua caixa lindamente e apaixonou-se.

Robô e dono da loja – BRUNO: mesmo possuindo um jeito sério, ele é um ótimo amigo. É o salvador dos brinquedos. Por ser um robô muito inteligente ele consegue consertar os brinquedos com facilidade.

Marionete – MANOELA: uma boneca muito alegre e inteligente, porém passa por dificuldades para se locomover com todos os fios que possue e sem alguém para lhe ajudar a manusear.

Boneca de Pano – FERNANDA: com sua flexibilidade corporal a boneca de pano é linda, doce e animada. Porém algumas vezes ela fica triste por lembrar que foi abandonada por sua dona porque ela cresceu e não queria mais brincar de bonecas. Torna-se a melhor amiga do robô e da marionete.

Fada 1 – LUDMILA: uma fada muito esperta que adora brincar e unir pessoas. Fica de olho em tudo que acontece. Ela e o duende vivem aprontando e brigando.

Fada 2 – RAISSA: A irmã mais nova da outra fada. Morre de medo de fazer mágica e errar. Fica chateada com as coisas que a irmã mais velha apronta. Tenta ajudar a todos que precisam.

Duende – PABLO: garoto esperto, adora aprontar, mas é um ótimo amigo e está sempre pronto para ajudar. Com seu pó mágico ele faz bastante travessuras.

Boneca de porcelana – HELLEN: Delicada, gentil e tímida, ela é uma boneca indefesa que teme em ser quebrada. Porém com seu jeito delicado ela sabe como parar uma briga.

Princesa – JADE: a típica princesa indefesa do castelo, linda e delicada. Porém bastar mexer com seus amigos que ela deixa a delicadeza de lado e parte para a briga.

Barbie – ANALICE: ela vive super na moda. Adora se arrumar. Animada como sempre. Ela é uma barbie animadora de torcida e faz rima com tudo. Junto com a boneca de lata elas animam o ambiente.

Boneca de lata – MARIA EDUARDA: uma boneca brincalhona que adora zueira e animação. Seu sonho era ser animadora de torcida.

Ursinha de pelúcia – PERLA: a ursinha carinhosa que só fala se apertarem a sua mão. Ela morre de medo da feiticeira e é meio robotizada. Vive quieta num canto.

Feiticeira – IASMIN: uma feiticeira louca que prevê o futuro com exatidão, mas atrapalha-se em suas mágicas e às vezes faz o feitiço acontecer ao contrário.

CENA 1

(o menino desce as escadas do teatro, entra pela plateia junto com os pais. Diversas caixas e brinquedos estão espalhados pelo palco. A luz está fraca no palco, apenas no centro. Cena acontece em frente a boca de cena na parte da esquerda)

Mãe: Olha, Pedro, quantos jogos legais. Vários videogames. Olha esse..

Pai: Olha filhão... quanta tecnologia. Computadores...

Menino (desaminado): tá pai. Tô vendo...(olha para o outro lado). O que é aquilo pai?

Pai: aaahh isso aqui é... uma bela tecnologia.

Menino: Não pai... (olha para o pai, percebe que ele não está vendo, solta da mão dele) O que é aquilo? Parece uma loja...

Dono da loja: (de costas para a plateia. Usando uma capa. Pega uns documentos e sai pela direita do palco)

Menino: Tem alguém saindo de lá...(se aproxima da loja)

Menino (entra devagar e desconfiado): A porta está aberta. Será que posso entrar? (pausa). olha é uma loja de brinquedos. Mas porque ela está fechada? (se aproxima da loja) Meu pai nem viu que consegui engana-lo. Ficou lá na loja fissurado pelas tecnologias. Acho que não tem problemas (entra na loja, luz clareia um pouco) Nossa quantos brinquedos (pega alguns brinquedos no chão e olha) mas parecem que eles estão abandonados. Estão cheios de poeira e quebrados. Poxa que pena... (senta-se no chão) Porque isso está acontecendo? Porque meus amigos não querem mais brincar com eles? Porque só eu sinto falta das brincadeiras...dos brinquedos... dos ursos dançando no ar... (começa a chorar, depois canta) “...ursos dançam no ar, coisas de que me lembro e a canção de alguém foi...” (de repente a bailarina começa a cantar)

Bailarina: “...no mês de dezembro...”

(outros brinquedos começam a sair das caixas e cantar)

Feiticeira: ...dias de felicidade...

Boneca de porcelana: ....e os cavalos na tempestade...

Princesa: ...são imagens a dançar...

Boneca de pano: ...Que eu posso recordar...

(música Foi no mês dezembro. Os brinquedos vão surgindo um de cada vez das caixas e começam a dançar entre eles. Quando a música acaba)

Menino: Meu Deus! Os brinquedos ganham vida!!!

Fada 1: Sim. Nós, aqui, ganhamos vida.

Marionete: E estamos felizes em ver uma criança nesta loja.

Duende: Tem tempo que uma não vem aqui.

Barbie: Elas nos abandonaram.

Boneca de lata: Só se interessam pelas novas tecnologias.

Ursinha: Sendo assim o dono resolveu fechar a loja e não achou até hoje nenhum comprador.

Princesa: Agora a pouco ele veio aqui pegar os documentos da venda (triste)

Soldado: Estamos tristes porque as crianças estão crescendo, nos abandonando e não querem mais saber das brincadeiras.

Fada 2: Mas que bom que resolveu entrar, adoramos.

Robô: Seja bem vindo a loja de brinquedos Sintonia

Menino: obrigada. Poxa que pena... pois eu também estou muito triste sabia?!

Boneca de porcelana: O que foi, belo menino?

Menino: É que meus amigos não querem mais brincar. E só porque eu quero brincar eles falam mal de mim. Me deixam sozinho na escola. Mas eu gosto das brincadeiras, das cantigas de roda...

Feiticeira: Nós também adoramos. E sentimos muita falta das crianças

Menino: É... vocês gostam?! (os brinquedos afirmam com a cabeça) sabe qual a brincadeira que mais gosto?!

Todos: Qual?

Menino: Cabeça, ombro, joelho e pé.

Marionete: Sério?! Nós também gostamos muito. Vamos brincar?

Menino: Agora?

Fada 2: Sim, agora!

Menino: Vão todos participar não é?!

Ursinha: É um, dois, três e ...

Menino: Já!

(fazem a brincadeira entre eles e a plateia. Depois da brincadeira todos riem)

CENA 2

Princesa: Mas garoto, vem cá... você ainda não disse seu nome?

Menino: Ah! Meu nome é Pedro, mas eu também não sei o nome de vocês.

Robô: Ah! Eu sou o robô Magno, o que conserta tudo, inclusive panela velha.

Boneca de pano: Eu sou a boneca de pano Lilian, mas no momento não estou conseguindo me mexer muito bem, problemas na costura.

Menino: E você quem é? Você é tão bonita...

Boneca de porcelana: Muito obrigada, você é muito gentil ... eu sou Chi-ilu a boneca de porcelana

(o menino olha para o lado após ser cutucado. O duende está brincando com ele)

Menino: Mas quem me chamou...?! (vira-se para trás de vez e ver o duende)

Duende: Aaahhh você estragou a brincadeira.

Menino: (risos) quem é você?

Fada 1: Esse é o duende que mais apronta por aqui.

Duende: (mal humorado) meu nome é Peter.

Fada 1: E eu sou Buba, a fada mais esperta desta loja.

Fada 2: Mentira! A fada mais esperta sou eu...

Fada 1: Aahhh essa é minha irmã, Lala

Fada 2: Ooiii.... olha como ele é engraçado.. As bochechas dele são fofas (aperta as bochechas do menino)

Princesa: Pará com isso, Lalá. O menino vai ficar machucado (beija o menino que fica encantado). Seja bem vindo, eu sou Eva a princesa deste reino, ou melhor, desta loja.

(entram as torcedoras pulando. A fada 2 pula junto)

Barbie e Boneca de lata: A, A, A VIEMOS ARREBENTAR/ I, I, I NÓS SOMOS AS TORCEDORAS DAQUI.

Barbie: Oi, sou a barbie Alice.

Boneca de lata : E eu sou a boneca de lata Aluia

Barbie e Boneca de lata: Juntas nós animamos este lugar.

Menino: Ei e quem é aquela que está fazendo mágicas

(a feiticeira balbucia alguma coisa em voz baixa. O menino se aproxima)

Feiticeira: Droga, deu errado mais uma vez! (som de explosão)

Fada 1: Essa é a feiticeira Magnólia, ela faz feitiços, mas as vezes eles não dão certo. (risos)

Fada 2: (irônica) As vezes, não. Quase sempre, né irmã?!

Fada 1: É...

CENA 3

Menino: E aqueles dois ali, quem são? Nossa como eles se parecem com meus pais...

Fada 1: Ali são a bailarina e o soldadinho de chumbo

Fada 2: Ooowww eles são tão fofos. Mas a história deles não é a que você conhece não.

Menino: Não?! E como é...

Fada 2: Foi assim...

Fada 1: certo dia o soldado estava muito triste...

(os personagens ficam em volta observando e ficam só eles ao centro)

Soldado: Ai que droga, será que sempre vou viver abandonado aqui?! Como pode, eu, um soldado de guerra, desse jeito. Com essa perna defeituosa. É por isso que meu dono não me quis e me devolveu para essa loja (sai andando triste, até que ouve alguém cantando) mas o que é isso?! Estou ouvindo um som! (pausa) que voz linda! (procura pela voz, bailarina canta e dança ao centro do palco) Uma bailarina! Nossa como ela é linda!!! Vou lá falar com ela (sai andando, mas desisti) ai não vou não. Não tenho coragem! (a bailarina está dançando e de repente cai)

Bailarina: ai minha perna. Minha perna. Não consigo me mexer.

(soldado sai correndo em sua direção)

Soldado: O que houve princesa? Digo.. bailarina!

Bailarina: Eu acho que machuquei minha perna

Soldado: Deixe-me ver.. com toda licença e respeito

(verifica a panturrilha da bailarina)

Soldado: Parece que não foi nada grave, acho que apenas uma câimbra, uma massagem resolve.

Bailarina: Ai..está doendo

Soldado: Calma já vai passar...está melhor?!

Bailarina: Sim..bem melhor! (estica a perna, faz menção de levantar-se e ele vai ajudá-la) Obrigada sol.. (vê o soldado, gagueja), soldado! (eles se olham, ela levanta) Nunca tinha visto um soldado por aqui.

Soldado: É porque cheguei hoje até essa loja.

Bailarina: Aahh.. seja bem vindo a loja de brinquedos Sintonia! Pena que ela está fechada e agora só serve para guardar brinquedos que não são mais usados.

Soldado: Uma pena mesmo...como é o nome da senhorita?

Bailarina: Me chamo Lua. E o senhor?

Soldado: Meu nome é Adiem, a seu dispor.

Bailarina: Olha, a perna ficou boa mesmo... (dança e sorri)

Soldado: Seu sorriso é tão resplandecente que deixou meu coração alegre.

Bailarina: (tímida) Obrigada soldado!

(se olham, música sentimentos são ao fundo)

Soldado: Você está ouvindo essa música?

Bailarina: Sim, estou.

Soldado: De onde será que ela vem?! Bem... mas não importa. A dama aceita dançar comigo?

(eles dançam a música e todos os brinquedos surgem também dançando. Aos poucos vão sumindo e voltando a cena anterior)

CENA 4

Fada 1: É... e foi assim que eles se conheceram.

Menino: Nossa que legal! (ele vê uma boneca ao canto chorando) o que houve com você?

Marionete: Eu sou Dinorá e fui abandonada aqui. Não consigo me mexer com esses fios e não tem ninguém para me manusear. Queria saber me mexer sozinha. (chora)

Menino: Olha se você quisesse poderia lhe manusear, sei mexer com marionetes, já tive várias. Mas já que não quer... podemos cortar seus fios. Irá lhe ajudar...

Marionete: (alegre e ansiosa) verdade.. boa ideia. Mas quem sabe cortar aqui?! Poxaaaa... acho que ninguém.

Robô: Eu, eu, eu! (bate no peito) Desculpe, defeito na pilha. Eu sei consertar. Posso lhe ajudar. Afinal sou eu que conserto todos os brinquedos aqui. Deite-se por favor.

Menino: Está vendo. Você vai ficar boa...

(ela deita-se e ele começa a cortar os fios. Música Admirável chip novo. Pausa)

Robô: Está doendo?

Marionete: Não... estou ansiosa para andar.

Robô: Ótimo. Já está quase acabando. (Música Admirável chip novo. Pausa) Pronto. Está pronta! (aos poucos a marionete levanta-se e começa a andar)

Menino: Viu, você conseguiu.

Marionete: Obrigada garoto. (chorando) Obrigada Magno!

Robô: de nada linda marionete...Ai meu Deus. Não chore. (chora mais forte) Calma. Cuidado Dinorá senão eu vou chorar e eu não posso chorar (choramingando)

Menino: Porque não pode chorar Magno?

Robô (melancólico): Porque não posso encostar na água, posso me enferrujar.

Marionete: Oowww não sabia..Desculpe

Robô (melancólico): Não se preocupe. É por isso que gosto tanto de ajudar a todos aqui. Me sinto útil, já que nem chorar eu posso.

Marionete: Não fale assim. Você é maravilhoso.

Menino: Concordo! Um grande amigo...

Marionete: E você é um garoto muito especial. (beija-o no rosto, o garoto fica besta) Você é um anjo.

Menino: Aaaahhhh (som de passarinho)

CENA 5

Boneca de pano: Ei, menino, acorda!

Menino: (assustado) Aaaiii. O que foi? Quem falou comigo?

Boneca de pano: Aqui! Olha.. aqui no canto. (vai até a boneca de pano)

Menino: O que você tem?

Boneca de pano: Meu rasgo aumentou. Não consigo mais levantar.

Menino: Vou chamar a feiticeira acho que ela pode consertar isso (sai andando)

Naaaooo. A feiticeira não. O robô, o robô sabe como resolver isso. Chame-o por favor.

Menino: Vou procura-lo. Já volto. (gritando) Magno! Magnoooo! MAgnooo. Cadê esse robô? Ele estava aqui agorinha. Senhora feiticeira, senhora feiticeira

CENA 6

Feiticeira: Um rabo de rato, língua de cobra e pelo de unicórnio. Pronto. Acho que agora vai dá certo. (som de explosão) droga! Errado de novo.. (choramingando) o que errei dessa vez?

Menino: O que foi, senhora Magnólia?

Feiticeira: Errei de novo a mágica. Quero fazer um feitiço para fazer as crianças gostarem da infância de novo e não consigo. Elas precisam voltar a brincar com os brinquedos.

Menino: Entendoo...

Feiticeira: Elas precisam brincar de correr (correm os dois) de girar (giram). Devem sorrir, brincar... ao invés de ficar nessas coisas aí...como é mesmo o nome?! Ap, uasse, what...

Menino: Aaahhh... what’s app. (ri)

Feiticeira: é.. isso aí. What’s app. É um tal de iphone pra lá, ipod pra cá.. e um tal de Lol, que eles passam o dia todo assim (imita uma criança jogando) na frente do computador.

Menino: (rindo) concordo com a senhora. Eu também gosto dessas coisas aí. Mas prefiro mil vezes uma brincadeira mais legal. Um esconde-esconde, por exemplo. Só que meus colegas não querem mais brincar. E meus brinquedos foram todos para o lixo, minha mãe disse que já estou muito grandinho para brincar de carro e boneco. Ela disse que brincar é coisa de criança.

Feiticeira: Aaaahhh é porque sua mãe não lembra mais como é brincar, mas aposto que se ela vinhesse aqui faria ela lembrar rapidinho com um feitiço

Menino: Não, acho melhor não, senhora Magnólia. Vai que a senhora transforma minha mãe em um urso, hein? (os dois riem)

Feiticeira: O caso é que na verdade todos estão tristes aqui.

Menino: Que pena, queria ajudá-los. Nossa, meu Deus. Esqueci dona Magnólia. A boneca de pano está esperando eu chamar o robô, tenho que correr.

Feiticeira: Vá, menino. Eu vou continuar meus feitiços....

Menino: Magnooo, magnoo!!!!!

Robô: Oi, aqui estou.

Menino: Magno, a boneca de pano precisa de ajuda rápido.

Robô: Pronto. Rápido e avante. (o robô ganha velocidade, mas a pilha dá problema. Ele para, o menino bate em suas costas, depois ele continua)

Menino: Ele foi embora sem mim. (entra a princesa e boneca de porcelana)

CENA 7

Boneca de porcelana: Pedrooo!

Princesa Oi. Já conheceu a loja toda?

Menino: Sim. Eu queria ajudar vocês, mas não sei como.

Princesa Calma Pedro. Já estamos felizes com sua presença

Boneca de porcelana: Você alegrou nosso reino.

Boneca de lata e Barbie: A, A, A FALOU EM ALEGRAR/ CHEGAMOS PARA ARREBENTAR.

Princesa: Chegaram elas as animadoras de torcida.

Barbie: Firmes...

Boneca de lata: E fortes. (pula e se bate com uma caixa cheia de roupas)

Barbie: Nossaaaaaa quantas roupaaassss...

Boneca de porcelana: Aaaahhh vamos experimentar?

Princesa: Já sei. Vamos fazer um desfile?

Boneca de lata Eu quero. Eu quero.

Menino: E eu fico aqui assistindo

(acontece o desfile com a música ela não anda, ela desfila)

Menino: (batendo palmas) muito bem! Estavam lindas!

Boneca de porcelana: Gostou?

Boneca de lata Minhas latas adoraram as roupas!

(todos riem. Boneca de pano aparece com robô e marionete)

Boneca de pano: Olha Pedro, fiquei boa.

Menino: Ah, que bom Lilian (abraça)

Boneca de pano: Obrigada Pedrinho! Obrigada também, seu robô

Marionete: Magno arrebenta

(As duas beijam-o no rosto. Ele se derrete e cai. Todos riem.)

CENA 8

Menino: Ei, quem é aquele?

Marionete: Aquela! É uma ursinha.

Robô: Mas ela só fala se você apertar a mão dela.

Menino: Humm, vou tentar.

(Duende corre e aperta a mão primeiro)

Duende: Aaahhh cheguei primeiro que você (dá língua)

Ursinha: Oi, eu sou a ursinha Líli

Menino: Aaahh duende, não tem problema.

Duende: Poxa, nem é bom te perturbar. Você é tão bonzinho. Vou embora (sai chateado para o lado oposto do palco)

(menino aperta a mão da ursa)

Ursinha: Oi, eu sou Líli (vira a cabeça para o menino). Quem é você?

Menino: Eu sou Pedro.

Ursinha: Você é a criança que vai nos salvar?

Menino: Salvar?

Ursinha: É. A feiticeira sempre fala de uma criança que vai nos salvar.

Menino: Uma criança?

Ursinha: Ela não te contou a profecia?

Menino: Não..

Ursinha: Certo dia, ela nos disse uma profecia. Ela estava lá, fazendo seus feitiços... (luz na feiticeira, no menino e na ursa. Os outros congelam e somem) e de repente.. (música de suspense) ela começou a falar bem alto.

Feiticeira: Um dia! No dia que a gente menos esperar uma criança irá nos salvar (cai)

Ursinha: Todos ficaram assustados. Foram até ela. Parecia que ela não lembrava de nada. Desde então ela tenta fazer um feitiço pra nos salvar e mudar as crianças. E eu fiquei morrendo de medo dela e resolvi ficar aqui no canto esperando este tal dia.

Menino: Oowww Líli, me desculpe, mas acho que não sou eu essa criança. Eu tenho a mesma vontade que vocês. Queria muito ajudar. Mas não sou capaz.

Ursinha: Que pena, garoto. Então ficarei aqui esperando. Obrigada por nos visitar.

Menino: Fique bem, senhora Líli.

CENA 9

(sai triste, chora no meio do palco, duende vê e vai falar com ele)

Duende: O que houve, Pedro?

Menino: A ursinha me falou da profecia

Duende: Aahhh! A tal profecia. Ah, Pedro fique tranquilo. Não acreditamos mais nisso. Sabemos que a feiticeira não gira bem da cabeça. Deve ter sido loucura dela.

Menino: Mas eu queria ajudar (chora)

Duende: Posso te contar uma coisa?

Menino: Pode (choramingando)

Duende: Também achei que a profecia ia se cumprir quando você chegou. E sinceramente eu ainda acho que você é a criança

Menino: Acha?

Duende: É... sabe Pedro.. eu apronto muito, adoro brincar. Mas também sei algumas coisas e senti que você é esse menino. Você só precisa acreditar em você! Que criança hoje em dia é igual a você e quer brincar?! Você pode achar a solução. Basta ouvir seu coração e acreditar aqui (aponta para o coração) no amor! O amor resolve tudo! (sai)

(cena acontece na boca de cena, foco no garoto)

Menino: Poxa. Queria tanto ajudá-los. Mas eu? Logo eu! O garoto excluído da escola! O que fazer? O duende disse para eu ouvir meu coração. Deixa eu me concentrar (pausa, som de coração batendo) Já sei! Claro, é isso! (sai correndo) Gente! Gente! Eu tive uma ideia. Venham aqui.

Todos: O que foi? o que houve?

Menino: As crianças não brincam mais, né? Mas porque elas não brincam? (os brinquedos fazem caras de pensativos) é óbvio: Elas não lembram mais como é brincar. Temos que lembrar a elas. Vamos cantar bem alto que elas vão lembrar das músicas que cantavam, das brincadeiras e vão vir correndo da outra loja para cá.

Feiticeira: Ótima idéia.

Ursinha: Adorei.

Soldado: Muito bem.

Boneca de pano: Mas que musica iremos cantar?

Menino: Essa aqui... (cochicham e depois cantam em roda)

(começam a cantar a música brincadeira de criança e aos poucos vão baixando o tom de voz. O menino dorme no meio da loja. Acorda de repente.)

Menino: Meu Deus! O que eu estou fazendo aqui? Acho que dormi na loja. Deixa eu ir embora. Meus pais já devem estar me procurando...

(brinquedos cantam Foi no mês de dezembro. Blackout)

CENÁRIO E FIGURINO

Elementos do Cenário:

• 2 escadas de abrir

• Caixas de papelão forradas de papel presente de criança (umas 30)

• Brinquedos (os mais variados)

• Um enorme caldeirão

• Varinha mágica

• Uma grande colher

• Pedaços de retalho e cordas

Concepções de figurino:

Criança – MATHEUS:

ROUPA COLORIDA. BERMUDA. BLUSA. BONÉ. TÊNIS

Bailarina e Mãe – SARAH: ROUPA DE BALÉ CLÁSSICO

Soldado de chumbo e pai – GUSTAVO: ROUPA DE SOLDADINHO DE CHUMBO

Robô e dono da loja – BRUNO: ROUPA METALICA PRATEADA E ROSTO PINTADO DE PRATA

Marionete – MANOELA: ROUPA TIPICA DO BONECA

Boneca de Pano – FERNANDA:

Fada 1 – LUDMILA E Fada 2 – RAISSA:

Duende – PABLO:

Boneca de porcelana – HELLEN:

Princesa – JADE:

Barbie – ANALICE:

Boneca de lata – MARIA EDUARDA:

[pic]

Ursinha de pelúcia – PERLA:

Feiticeira – IASMIN:

CARTAZ DE DIVULGAÇÃO DA MOSTRA

AVISO DA OFICINA

Projeto Teatro na Escola - Oficina de dramaturgia

O colégio Aliança, em parceria com a estudante de licenciatura em teatro Lais Almeida, oferecerá gratuitamente uma oficina de teatro para os alunos do Fundamental II. O intuito da oficina é fazer com o que o aluno compreenda que o teatro é um elemento da vida social e que ele é um meio de representar a vida e entreter as pessoas. Para isso está oficina irá trabalhar com expressão corporal e vocal, interpretação de texto, construção de personagem e principalmente a criação dramatúrgica.

As aulas serão ministradas durante os meses de setembro até novembro nas dependências do colégio nos dias de segunda e quarta a tarde das 14h as 17h10, com 10 minutos de intervalo. Para assistir as aulas o aluno deve realizar uma inscrição gratuita no colégio e passar por uma seleção. Ao final da oficina os alunos farão nos dias 29 e 30 de novembro uma apresentação teatral de 20 minutos no Teatro Martins Gonçalves localizado no bairro do Canela em Salvador, contudo os custos de cenário, figurino e transporte serão de responsabilidade dos alunos. Caso seja necessário acontecerão alguns ensaios no teatro antes da apresentação.

Os participantes devem obedecer às normas da instituição comparecendo as aulas com o fardamento da escola. A tolerância de atraso serão de 10 minutos e durante a oficina só serão permitidas 4 faltas justificadas com atestados, a partir da quinta falta o aluno é eliminado da oficina perdendo o direito de participar das aulas. Só poderão entrar na sala de aula os alunos que forem aprovados. Ocorrendo desistências na primeira semana outros alunos que participaram da seleção poderão ser chamados. O curso é extra-curricular, portanto é opcional.

Período de inscrição: 11 a 16 de setembro

Período de seleção: 17 de setembro das 14h às 17h

Previsão de inicio das aulas: 22 de setembro a 26 de novembro

Apresentação final: 06 e 07 de dezembro

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FICHA DE INSCRIÇÃO

Eu, _______________________________________________________________,

( ) pai ( ) mãe ( ) outro responsável, portador do RG_________________________, autorizo o aluno (a) _________________________________________________________

do _____ ano do Colégio Aliança a participar da oficina de dramaturgia do projeto Teatro na Escola, estando ciente de todas as normas da oficina.

Salvador,  _______ de _____________________ de 2014

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Assinatura do responsável

FOTOS NO CAMARIM

FOTOS DA MOSTRA

FOTOS NO COLÉGIO

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[1] "Usamos o termo MATERIALIDADE, em vez de matéria, para abranger não somente alguma substância, e sim tudo o que está sendo formado e transformado pelo homem. (...) Cada materialidade abrange, de início, certas possibilidades de ação e outras tantas impossibilidades." (OSTROWER, pg. 31, 32)

[2] A chamada caixa de estímulos também conhecida como o pacote de estímulo composto foi criado na Inglaterra por John Somers e é um método que “reúne um conjunto de artefatos [...] A história que desenvolve a partir dele ganha significados através do cruzamento de seu conteúdo e como os detalhes de cada um sugerem ações e motivações humanas” (CABRAL, 2012, p. 36).

[3] Hope é um jogo de aquecimento, concentração, foco e atenção. Os alunos ficam posicionados em roda e em posição de atenção. Um inicia falando o Hope de forma enfática e seguindo um determinado movimento que todos vão seguir, cada um na sua vez. O segredo do jogo é estar atento, pois tal movimento é passado para cada participante através do olhar. Você olha para o participante para quem deseja: enviar a energia, fazer o movimento e falar a palavra Hope, tudo ao mesmo tempo. Ou seja, o participante deve acompanhar o fluxo iniciado com o primeiro movimento. E assim por diante o jogo segue.

[4] Os nomes dos alunos não foram revelados com o intuito de preservar a integridade dos mesmos, por esse motivo utilizei siglas quando os cito durante esse trabalho.

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COLÉGIO ALIANÇA

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