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A potencialização do telejornalismo e a colaboração do público

A participação do “cidadão digital”

Renata ECHEVERRIA [1]

As pessoas não existem para servir à tecnologia, a tecnologia é que existe para servir às pessoas. A tecnologia que prospera é criada pelas necessidades culturais dos seres humanos. (...) o digital tornará a televisão ainda mais televisão. 2

Newton Cannito, 2010

Resumo: O artigo analisa a edição do dia seis de abril de 2010 do Jornal Nacional, da TV Globo e as edições dos dias 17, 18 e 19 de junho do NETV 2º Edição - telejornal de Pernambuco da Globo Nordeste, quando a Região Metropolitana do Rio de Janeiro e o município pernambucano, consecutivamente, foram inundados por fortes chuvas, provocando mortes, alagamentos, e deixando milhares de pessoas desabrigadas. O enfoque principal de análise nos dois telejornais são as inúmeras imagens enviadas pelo público/telespectador via celular, filmadoras e câmeras digitais para os Portais G1 e PE 360 Graus, os dois da Rede Globo e posteriormente exibidas nos telejornais. O trabalho analisará a participação do público/telespectador e discutirá como esta colaboração pode potencializar o conteúdo dos telejornais.

Palavras-chave: Jornalismo; Telejornalismo; Cultura Participativa; Convergência Digital; Potencialização.

1. Apresentação

Seis de abril de 2010. Um dia depois da enchente que paralisou a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, precisamente às oito horas e quinze minutos da noite, começava mais uma edição do Jornal Nacional. Mas o que se viu foi um telejornal diferente:

a tela da TV foi inundada, literalmente, por imagens enviadas pelos telespectadores, pelo público, vítima de uma das maiores catástrofes provocadas pela chuva que caía incessantemente na cidade. Podemos até afirmar que praticamente, pela primeira vez, a produção do Jornal Nacional abriu espaço para a participação do público. O Jornal Nacional entrou definitivamente na era da produção colaborativa? Não sabemos, mas o telejornal mergulhou fundo nas imagens enviadas pelos telespectadores. E a história do Jornal Nacional não seria mais a mesma. Mesmo que tardiamente, o telejornal mais visto do País, de acordo com as estatísticas do Ibope – Instituto Brasileiro de Pesquisa se rendeu à inevitável “cultura participativa”.

A expressão cultura participativa contrasta com noções mais antigas sobre passividade dos espectadores dos meios de comunicação. Em vez de falar sobre produtores e consumidores de mídia como ocupantes de papeis separados, podemos agora considerá-los como participantes interagindo de acordo com um novo conjunto de regras que nenhum de nós entende por completo. (JEKINS, 2008, p.28)

Este artigo pretende analisar esta edição do Jornal Nacional, assim como as edições dos dias 17,18 e 19 de junho, do telejornal de maior audiência da TV Globo Nordeste, em Pernambuco, o NETV- 2ª Edição, e apontar como a participação do público/telespectador, através dos meios digitais, pode enriquecer e potencializar a mídia televisiva. No nosso entendimento, o Jornal Nacional e o NETV deram um passo importante, que acredito sem retorno, para o que deve ser a televisão hoje. Onde não pode faltar o diálogo com novos fenômenos e novos conceitos em tempo de convergência digital. No decorrer deste artigo vamos tratar destes temas: conteúdo colaborativo, cultura da convergência, convergência digital e “cidadãos digitais”, conceituando-os na sua história e em seus caminhos percorridos, sempre inseridos no contexto atual de mudanças tecnológicas, especificamente na experiência de ver e fazer televisão. A nossa hipótese é como a mídia digital, que engloba um vasto conjunto de técnicas de captação, finalização, distribuição, recepção e reprodução de imagens e sons modifica e potencializa a experiência de ver e fazer televisão.

Sem esquecer às práticas do dia-a-dia na produção de notícias: o processo produtivo, desde a captação do acontecimento, passando pela produção, edição até a apresentação, práticas imprescindíveis para o fazer diário jornalístico. “A noticiabilidade está diretamente relacionada com os processos de rotinização e estandartização das práticas produtivas. Logo, trata-se de introduzir práticas produtivas estáveis, numa matéria prima (os fatos que acontecem no mundo, que é por natureza muito variável e difícil de prever” (VIZEU, 2000, p. 80).

Apesar de acreditar que o uso das ferramentas digitais pode potencializar a prática de ver e fazer televisão, não se pode deixar de reforça a importância das principais fases da produção diária da informação: a captação, a seleção, e a apresentação realizadas pelos profissionais do jornalismo. É como explica Vizeu (2000, p. 82), que a seleção das notícias é um processo complexo que se desenvolve ao longo de todo o ciclo de trabalho, realizado em diferentes etapas, desde as fontes até o redator, editor, e com motivações que não são todas imediatamente imputáveis à necessidade direta de escolher as notícias a transmitir. Acredito sim, num processo de fazer jornalismo/telejornalismo que incorpore às suas práticas produtivas, a participação do público, sem esquecer as atribuições do profissional como mediador principal da notícia, notícia como uma forma de ver, entender e perceber a realidade. Para nós, o jornalista tem a função de mediador, pois seleciona o que vai ser exibido e o que não será. Por isso, um dos objetivos deste trabalho é apontar alternativas para a “reconfiguração” da televisão na “Era da Convergência”, através da incorporação à prática dos profissionais de comunicação, o uso das ferramentas digitais.

Conceito de Convergência

Numa tentativa de definir o fenômeno vamos buscar na pluralidade de vozes as aparições e esforços para conceituar o termo. No livro Uma História Social da Mídia (2002), os historiadores Asa Briggs e Peter Burke afirmam que a partir da década de 1980 a convergência foi aplicada ao desenvolvimento tecnológico digital, à integração de texto, números, imagens, sons e a diversos elementos da mídia. “A palavra convergência foi sendo subsequentemente aplicada a organizações e processos, em especial à junção das indústrias de mídia e telecomunicações. Ela também teve empregos diversos e abrangentes em relação a sociedades e culturas”. (BRIGS & BURKE, 2002, p. 266).

Breve histórico da palavra Convergência:

• Boorstin (1978), no livro “A república da tecnologia” considera que existe uma ‘via expressa da informação’;

• A partir de 1980 é utilizada como referência ao conteúdo digital: texto, áudio, vídeo, imagens, sons;

• Que a “tecnologia dilui e dissolve a ideologia”;

• Revista Wired apresenta como “supervia expressa”, “Infobahn”, e outros nomes derivados do pensamento “rodoviário”;

• Em 1993 o presidente do USA, Clinton e Al Gorem usavam o termo na política;

• Pensava-se originalmente que a mudança para a TV a Cabo geraria mais opções de conteúdo com a quantidade de canais.

• Para Nicholas Negroponte, a definição da palavra convergência estaria aliada a confluência de tecnologias através da possibilidade de compartilhar a mesma natureza de código tecnológico – o binário – como língua universal de trânsito das diferentes modalidades sonoras, textuais e visuais. “Como bits são bits, duas consequencias fundamentais e imediatas poderão ser observadas quando todos os meios de comunicação forem digitais” (NEGROPONTE, 1995, p. 23).

• Para outros autores, convergência seria um fenômeno mais complexo que relacionaria as esferas tecnológica, empresarial, profissional, narrativa, social e política. Alguns autores relacionam convergência como sistema, outros como um processo, que consiste numa superação de estágios anteriores, não negando os que vieram antes, mas colocando-os numa perspectiva de convergência propriamente dita, de acumulação de antigas e novas experiências. (JENKINS, 2001).

Como se vê, a palavra “convergência” foi empregada de diversas formas e abrangências e em relação a sociedades e culturas, inclusive na sociedade e cultura britânicas já na década de 1930: D. L. LeMahieu, no livro A Culture for Democracy (1988) escreveu um capítulo intitulado “Visão e som: estudos de convergência”. Jeremy Black escolheu “Convergência” como parte do título do seu livro Convergence or Divergence, Britain and the Continent (1994), sobre a Grã-Bretanha e a Europa e Boorstin, em seu livro The Republic of Technology (1978), usou a palavra num sentido mais amplo – “a tendência de tudo se tornar igual a tudo”. Como se vê a discussão sobre o conceito de “convergência” é antiga, mas a sua ampla significação e entendimento continuam muito atuais. Para Briggs e Burke (2020), à medida que a sociedade se tornava mais “móvel”, e eles citam que Boorstin pode ter pensado no transporte rodoviário da época. Dizia-se que as sociedades e culturas diferentes, que haviam começado suas jornadas históricas separadamente, estavam viajando juntas na mesma via expressa da informação.

Durante a década de 1960, o desenvolvimento de tecnologias para suprir esses serviços ainda estava em estágio experimental de laboratório, embora a teoria estivesse bem avançada, e mesmo durante a década de 1980, um período crítico, quando a gama de possibilidades começou a ser apreciada, ainda não havia certeza sobre que tipo de tecnologia teria sucesso. Parecia provável, mas não certo, que a tecnologia digital iria prevalecer na maioria dos ramos das comunicações, se não em todos. Ainda não existia o verbo “digitalizar”. (BRIGGS E BURKE, 2002, p. 267)

2. O modelo de produção colaborativa no conteúdo dos telejornais

“Nenhum de nós pode saber tudo, cada um de nós sabe alguma coisa; e podemos juntar as peças, se associarmos nossos recursos e unirmos nossas habilidades” (JENKINS, 2008, p.28). O autor deixa clara a noção de que a participação de cada um dos cidadãos no processo de emissão de informação pode ser uma forma de potencialização da produção de conteúdo no processo diário das rotinas jornalísticas e telejornalísticas. Mesmo concordando com o autor que a participação do público/telespectador potencializa o conteúdo do jornalismo/telejornalismo, é bom esclarecer que em nossa opinião, a participação do público não substitui o papel do jornalista como mediador. É função sim dos profissionais de jornalismo a mediação dos fatos. Acreditamos que nenhuma colaboração, por mais enriquecedora que seja, pode substituir a participação do jornalista que seleciona e escolhe a mensagem. É como afirma Lorenzo Gomis:

La actividade profesional de los periodistas em los medios consiste em uma interpretación sucessiva de la realidad social. Tal interpretación resulta posible gracias a la redución de la realidad a hechos que puedan comunicarse como noticias. Estas noticias, ampliadas por medio de reportajes y crônicas e comentadas em artículos, editoriales y debates radiados o televisados, forman la imagen cambiante de la realidad de que se serve el público para estar enterado, comentarla e intervir en ella y de que se sirven los mismos actores y protagonistas de lãs acciones sociales para lo mismo. Los médios actúam de este modo como mediadores generalizados. Esta es su función social. (GOMIS, 1991, p. 175)

Por isso, quando afirmamos no início do texto, a necessidade de uma “reconfiguração” do jornalismo/telejornalismo, não estamos abandonando uma das funções mais importantes da profissão: o jornalismo como um método de interpretação sucessiva da realidade social. “Tal interpretación resulta posible gracias a la reducción de la realidad a hechos que puedan comunicarse como noticias” (GOMIS, 1991, p. 203).

A edição do Jornal Nacional, do dia seis de abril, que detalharemos no decorrer deste texto, deixa bem clara a hipótese de como o jornalismo/telejornalismo ganham com a participação do público. Será que não seria oportuno incluir na pauta dos profissionais de comunicação a colaboração deste público/telespectador? Lemos (2007) afirma que as diversas manifestações socioculturais contemporâneas mostram que o que está em jogo com o excesso e a circulação virótica de informação nada mais é do que a emergência de vozes e discursos, anteriormente reprimidos pela edição a informação pelos mass media e que a nova dinâmica técnico-social da cibercultura instaura uma novidade radical na história da humanidade: “pela primeira vez, qualquer indivíduo pode, emitir e receber informações em tempo real, sob diversos formatos e modulações, para qualquer lugar do planeta e alterar, adicionar e colaborar com pedaços de informação criados por outros” (LEMOS, 2007, p.). É visível que uma nova relação entre as tecnologias e a sociabilidade proporciona uma mudança no comportamento do telespectador/usuário, alterando os processos de comunicação, de produção, de criação e de circulação de bens e serviços. Lemos chama a experiência desta nova configuração cultural de “ciber-cultura-remix”, que segundo ele se caracterizada por três “leis” fundadoras: a liberação do pólo de emissão, o princípio de conexão em rede e a reconfiguração de formatos midiáticos e práticas sociais. Neste artigo não vamos entrar em maiores detalhes sobre a cultura remix, mas vale destacar a modificação na paisagem comunicacional e social, na emergência de novas formas de consumo cultural e de novas práticas sociais.

A cibercultura tem criado o que se vem chamando de “citizen media”, ou “mídia cidadão”, onde cada usuário é estimulado a produzir, distribuir e reciclar conteúdos digitais, sejam eles textos literários, protestos políticos, matérias jornalísticas, emissões sonoras, filmes caseiros, fotos ou música. Os “citizen media” são pessoas que colocam “their versions of events through images and video taken on mobiles or eyewitness accounts on blogs. The internet is giving people a voice, to self-publish, and to rapidly share what you say in ways never quite possible before.” Acontecimentos recentes como os Tsunamis, e os atentados em Londres mostraram a força desses “cidadãos digitais” (LEMOS, 2005, p. 7-9).

São esses cidadãos digitais que operam agora numa nova estrutura que Lemos denomina de “cultura pós-massiva”, das redes, sites, blogs, troca de fotos, vídeos e música. As novas tecnologias de comunicação estão favorecendo mudanças de hábitos e novos costumes. Explica Lemos (2007), um movimento de recombinação cultural em um território eletrônico em crescimento planetário:

A cibercultura instaura assim uma estrutura midiática ímpar (com funções massivas e pós-massivas) na história da humanidade onde, pela primeira vez, qualquer indivíduo pode produzir e publicar informação em tempo real, sob diversos formatos e modulações, adicionar e colaborar em rede com outros, reconfigurando a indústria cultural. (LEMOS, 2007, p.35-48)

Henry Jenkins, no livro Cultura da Convergência, alerta para a importância da circulação de conteúdos, por meio de diferentes sistemas midiáticos, e destaca a participação ativa dos consumidores: “A convergência representa uma transformação cultural, à medida que consumidores são incentivados a procurar novas informações e fazer conexões em meio a conteúdos midiáticos dispersos” (JENKINS, 2008, p. 28). Nos exemplos utilizados deste artigo, o consumidor/telespectador/público, com uma câmera digital, filmadora ou celular, apreendeu a imagem, registrou o acontecimento e capturou flagrantes numa escala infinitamente maior que as equipes de telejornais da TV Globo espalhadas pela Região Metropolitana do Rio de Janeiro e interior do estado de Pernambuco. A importância das inúmeras imagens recebidas pelos Portais G1 e PE 360º Graus e exibidas nos dois telejornais mudaram o antigo “padrão global” de se fazer telejornalismo. Despertaram discussões e debates entre os profissionais sobre questões como convergência, potencialização pela digitalização, tecnologia e interatividade. Por isso sentimos aqui a necessidade de se voltar um pouco no tempo e discutir alguns destes termos em seus contextos históricos e sociais.

3. O surgimento do “cidadão digital”

Só em 1993, a digitalização começou a ficar corriqueira. A palavra “interatividade”, segundo Asa Briggs e Peter Burke, era usada não apenas em relação à televisão, mas a muitos instrumentos utilizados em lojas, museus e salas de aula.

Para um biógrafo participante dos “arquitetos da rede”, Robert H. Reid, a interatividade na televisão era o “estratagema final da Grande Convergência ainda no início da década de 1990. Ela traria o vídeo por assinatura em grande escala a milhões de pessoas”, sua infra-estrutura seria “interada com sistemas de transações de marketing que pulariam na jugular da indústria biliardária de catálogo”. (BRIGGS E BURKE, 2002, p.267).

Os historiadores citam ainda as ideias do intelectual e diretor do British Film Institute Anthony Smith quando ele afirma que as novas tecnologias tornariam possíveis opções individuais mais ricas sobre o que ver e ouvir e de quando vir e ouvir. Para ele as minorias passariam a ganhar influência quando somadas, sem levar em conta suas fronteiras. “Se essa escolha seria verdadeira ou benéfica, este era o tema de discussão, já que tanto ouvintes quanto espectadores passaram a ser vistos como “clientes”. (O mesmo ocorreu com os “cidadãos”.)” (BRIGGS E BURKE, 2002, p. 267).

É neste ponto que este trabalho ressalta a importância destes “cidadãos digitais” que estão ajudando a construir os jornais/telejornais de hoje. Público, telespectador? Não importa. São homens e mulheres que estão participando, colaborando. Enviando imagens de lugares aonde as equipes de telejornalismo não conseguem chegar. Nos 39 minutos e doze segundos da edição do dia seis de abril de 2010, do Jornal Nacional, nos cinco blocos que compõem o telejornal, a participação dos telespectadores se fez presente. Isto também ocorreu, em menor proporção, o número de imagens utilizadas foi bem menor, no telejornal local de Pernambuco, que tem duração de 14 minutos. No texto em “off” da segunda reportagem, do primeiro bloco do Jornal Nacional, podia se ouvir na voz do apresentador Willian Bonner: “fotos e vídeos foram enviados por moradores”. Na passagem do 1º Bloco o apresentador continuava: “desde o início da chuva, ontem à tarde, o Portal de jornalismo das Organizações Globo na internet recebeu muitos vídeos enviados pelo público. No G1, os cidadãos mostraram cenas assustadoras, muito antes que as equipes de reportagem pudessem chegar àqueles locais exatamente por causa das águas que bloqueavam os acessos”. “São flagrantes capturados por celulares, câmeras digitais, que retratam o caos e o desespero que tomaram conta da Região Metropolitana do Rio de Janeiro”, reforçava desta vez, a apresentadora Fátima Bernardes. Nos cinco blocos que compõe o Jornal Nacional foram utilizadas imagens enviadas pela população. (Ver Figuras: 1,2 e 3).

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(Figura 1: logomarca do Portal G1, exibida na edição do dia 06/04/2010, no jornal Nacional)

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(Figura 2: imagem enviada pelo telespectador do Rio de Janeiro e exibida na edição do dia 06/04/2010, no Jornal Nacional)

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(Figura 4: imagem enviada pelo telespectador do Rio de Janeiro e exibida no dia 06/04/2010, no Jornal Nacional)

Em pelo menos três edições do NETV 2ª Edição, dos dias 17, 18 e 19 de junho, as imagens enviadas pelo público foram veiculadas. O Portal PE 360ª Graus recebeu entre os dias 17 e 19, 186 imagens, entre vídeos e fotos, enviados pelos moradores das cidades atingidas pelas enchentes em Pernambuco. Ver (Figura 4).

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(Figura 4: imagem enviada pelo telespectador de Pernambuco e exibida no dia 18/06/2010, NETV – 2ª Edição)

4. Considerações sobre as novas relações entre tecnologia e sociabilidade

No livro A vida digital (1995), Negroponte já apontava mudanças radicais nos meios de comunicação de massa, prevendo que eles seriam redefinidos por sistemas de transmissão e recepção de informação personalizada. Para ele, a era digital estaria determinada por quatro características muito poderosas: a descentralização, a globalização, a harmonização e a capacitação.

Do mesmo como o hipertexto remove as barreiras das páginas impressas, a era da pós-informação vai remover as barreiras da geografia. A vida digital exigirá cada vez menos que você esteja num determinado lugar em determinada hora e a transmissão do próprio lugar vai começar a se transformar em realidade. (NEGROPONTE, 1995, p.159)

A nossa hipótese é que as possibilidades de uma experiência nova de fazer e ver televisão, seja um telejornal ou um programa de entretenimento, passam necessariamente pela utilização dos recursos permitidos pelas ferramentas digitais. “A era digital não é apenas a era da modernidade, do futuro. Ao contrário. O digital configura a era em que o tempo deixa de existir”. (CANNITO, 2010, p.78). O tempo, entendido aqui, como empecilho, dificuldade, barreira. O velho torna-se novo, as imagens antigas são recuperadas e eternizadas, as imagens produzidas de agora em diante poderão existir para sempre. (CANNITO, 2010, p. 78).

A mídia digital abre novos caminhos. Novas possibilidades de participação e produção de conteúdo. A convergência remodela tudo: uma imagem produzida originalmente para o cinema pode, com a tecnologia digital, ser exibida também no celular. “Não há mais sentido em separar as mídias, tudo é conteúdo digital e pode ser convertido em suportes diferentes” (CANNITO, 2010, p.44).

As possibilidades de ampliar o conteúdo que não foi produzido pelos jornalistas, à possibilidade de incluir imagens que não foram captadas pelas equipes de reportagem, podem mudar, no nosso entender, as rotinas diárias de produção dentro das redações. O especialista na fabricação da notícia, o jornalista, começa a criar novos hábitos de apuração que incluem a participação do telespectador. Imagens novas são inseridas, novos olhares, ângulos e abordagens serão possíveis com a colaboração do público. Mudam também os enquadramentos, os olhos do público/telespectador “reconfiguram” e modificam velhos padrões.

5. Concluindo

Apostar nestes recursos e nestas novas possibilidades, proporcionados pelas mídias digitais, possibilita cada vez mais a participação e/ou colaboração do público/telespectador. Participação que acredito ainda em fase quase experimental e muito aquém da sua verdadeira potencialidade. Homens e mulheres podem contribuir muito mais e de forma muito mais direta no processo de produção da notícia, como já dissemos, não substituindo o profissional de jornalismos, mas participando para o enriquecimento do conteúdo jornalístico de forma menos superficial. As poucas iniciativas deste tipo de participação, incentivadas pelas emissoras, como por exemplo o quadro “Bola Murcha e Bola Cheia”, que pertence ao programa Fantástico - revista eletrônica semanal da TV Globo, que une jornalismo e entretenimento – veicula imagens de jogos de futebol enviadas por telespectadores, onde são escolhidos os lances que mostram

Boas jogadas ou péssimas jogadas durante qualquer partida de futebol, no meu entender, são apenas táticas comerciais de atrair um público cada vez maior. Quando falo de participação destaco ser a verdadeira contribuição do telespectador os exemplos demonstrados nos dois telejornais citados neste texto. É deste tipo de contribuição/participação que acredito ser possível para o enriquecimento do conteúdo do jornalismo/telejornalismo. Contar com a informação enviada pelo “cidadão digital” seja ela em forma de texto, áudio ou vídeo, potencializa, no nosso entendimento, a experiência de ver e fazer televisão, aproximando o telespectador dos profissionais responsáveis pela produção da notícia. Não descartando as habilidades do especialista/jornalista em selecionar e escolher os fatos, imagens e informações relevantes que devam merecer ser exibidas. Como deixa claro Vizeu (2000), esses valores notícias vão definir quais os acontecimentos que são suficientemente interessantes, significativos e relevantes para serem transformados em notícias. “São as diferentes relações e combinações que se dão entre diferentes valores/notícias, que vão determinar a seleção de um fato. Outro aspecto a ser levado em conta é que os valores/notícia são critérios de relevância espalhados ao longo de todo o processo de produção. Ou seja, desde a captação até a apresentação da notícia” (VIZEU, 2000, p. 80).

As novas tecnologias propiciarão a participação cada vez maior do público, na produção, captação e apresentação da notícia. O novo profissional de jornalismo/telejornalismo terá que se adaptar a mudança. O conteúdo produzido tornará a televisão ainda mais televisão: televisão como experiência coletiva e dialógica. Televisão como a mais social das mídias, como aquele objeto luminoso no qual as pessoas sentam em volta para conversar, comentar e ouvir histórias.

Referências

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[1] Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e jornalista. E-mail: renataecheverria@.br

2 Cannito, Newton, A televisão na era digital: interatividade, convergência e novos modelos de negócio. São Paulo: Summus, 2010, p.16.

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