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OS JOGOS COMO FERRAMENTAS DIDÁTICAS NO ENSINO A DISTÂNCIA NA UNIVERSIDADE DE FORTALEZA

Fortaleza – Ceará – Abril 2013

Andrea Chagas Alves de Almeida1 – Universidade de Fortaleza

andrea_chagas@unifor.br / andrea-chagas31@

Ticiane Soares de Morais2 – Universidade de Fortaleza

ticimorais@unifor.br / ticimorais@

Xênia Diógenes Benfatti3 – Universidade de Fortaleza

xenia@unifor.br

Métodos e Tecnologias

Setor Educacional Educação Superior

Classificação das áreas de pesquisa em EAD Nível Meso – Inovação e Mudança

Relatório de Pesquisa

Classe Experiência Inovadora

RESUMO

O trabalho aqui apresentado se caracteriza como um relato de experiência desenvolvido pelo Núcleo de Educação a Distância da Universidade de Fortaleza (NEAD), que em 2012 criou um jogo eletrônico para a disciplina de Empreendedorismo. O relato tem como objetivo apresentar o processo de criação e estruturação de um jogo e suas interfaces com a EaD e o Ensino Superior. A experiência de desenvolver um jogo no ambiente virtual agregou qualidade pedagógica ao processo didático da disciplina Empreendedorismo, bem como possibilitou a equipe aprofundar seus conceitos na área de gameficação. O desafio foi avaliado como importante para formação dos profissionais do NEAD.

Palavras-chave: Educação a Distância; Jogo; Design Instrucional.

1 – Introdução

Em outubro de 2012, o Núcleo de Educação a Distância da Universidade de Fortaleza (NEAD), aceitou o desafio de desenvolver os conteúdos da disciplina de Empreendedorismo4 em um novo formato metodológico. A inovação aconteceu em um primeiro plano com a definição de sua oferta a distância e, posteriormente, com a definição de que seus conteúdos seriam desenvolvidos por meio de um jogo eletrônico.

Os jogos eletrônicos são sem sombra de dúvida ferramentas que redimensionam a prática docente, bem como possibilitam desafios significativos à aprendizagem dos alunos, pois trazem situações (ou simulações) que desafiam amplas habilidades cognitivas, como: a análise complexa do evento proposto; a interpretação de dados, fatos ou contextos e a resolução do problema ou situação proposta. Além dessas habilidades, os jogos despertam mais interesse, atenção e motivação nos alunos, assim como explicita Waniewski (apud CAMPOS, 2012):

Uma das coisas mais poderosas que os jogos desencadeiam é o status de jogador. Como se fosse mágica, o “se sentir um jogador” empodera as pessoas que passam a correr riscos que não correriam na vida real. O medo de falhar não é um problema no jogo. Outra coisa interessante é o fato de o jogo passar uma sensação bem concreta do que é um sistema, de como operá-lo, e ainda de como tomar decisões e transformar o sistema.

Os conceitos e os objetivos da disciplina de Empreendedorismo articularam-se muito bem com a ideia do jogo como ferramenta de aprendizagem, pois nele o aluno desenvolve habilidades de gestão que essencialmente estão ligadas à criação e ao protagonismo empresarial. Dessa forma, compreendemos que as simulações desenvolvidas em um jogo trariam para o aluno contextos e experiências mais significativas para sua aprendizagem.

O trabalho, ora apresentado, tem como objetivo relatar o processo pedagógico de criação e desenvolvimento do Jogo de Empreendedorismo, que será implementado em agosto de 2013. As referências que subsidiaram a elaboração do jogo, bem como as etapas do trabalho desenvolvido serão apresentadas em três seções: na primeira serão apresentados os pressupostos conceituais que subsidiaram a organização do jogo; na segunda parte serão apresentadas as etapas e estrutura do jogo; e, por fim, na última etapa far-se-á as considerações acerca das conquistas e dificuldades encontradas na trajetória de trabalho.

2 – Referências Conceituais

As Tecnologias da Comunicação e Informação (TICs) estão presentes de forma massiva em nosso cotidiano e, consequentemente, não podemos ignorar seu papel nos espaços escolares e acadêmicos. Cada vez mais a internet e os artefatos tecnológicos tem se incorporado aos ambientes educacionais e trazem grandes contribuições aos processos de ensino e aprendizagem.

Os games educacionais fazem parte desses novos contextos de aprendizagem e são ferramentas que possibilitam a aprendizagem por meio da interação e da colaboração. Para Mattar (2010) a característica central do jogo é a interatividade e se a retirarmos ele deixa de ser jogo:

O que define um game é a necessidade de participação – se a interatividade é removida, ele deixa de ser um game. Games são escritos pelo jogador, não lidos. Um game é um sistema dinâmico explorável, mas que, ao mesmo tempo, de alguma maneira é também construído pelas escolhas livres do jogador. O usuário está, ao mesmo tempo, participando da construção do ambiente e percebendo o que ocorre ao seu redor (MATTAR, 2010, p.20).

Para Abt (apud MATTAR, 2010) os jogos são poderosas ferramentas de ensino e atendem a qualquer idade e a qualquer conteúdo. Trabalhar com jogos permite desenvolver conceitos e fatos de forma bastante eficiente, pois nos jogos existem estratégias de motivação e comunicação. Os desafios propostos nos jogos permitem o desenvolvimento de múltiplas competências, pois em um jogo os alunos fazem escolhas, determinam suas estratégias e muitas vezes são desafiados a mudar essas estratégias, tais competências desenvolvidas tornam o processo de aprendizagem mais lúdico e significativo, pois as situações permitem a articulação dos conceitos com as situações reais de sua aplicação.

Um game é estruturado por meio de uma “narrativa eletrônica” (MATTAR, 2010, p.21), nela seus autores criam os cenários, os contextos, as etapas e as instruções centrais que levarão os alunos ao protagonismo das ações propostas. A aprendizagem desenvolvida por jogos deve considerar o ritmo individual e as competências que o projeto pedagógico deseja trabalhar.

O projeto instrucional da disciplina de Empreendedorismo foi pensado por uma equipe de desenhistas instrucionais que procuraram combinar o uso das ferramentas comunicacionais com as tecnologias interativas a fim de promover um aprendizado eficaz, levando em conta características marcantes da EAD como a autonomia e a interatividade, como complementa Mattar (2007):

De qualquer maneira, a ideia da autonomia e independência do aluno era parte integrante do conceito de EaD, enquanto a ideia de interação não, mesmo porque não havia tecnologia capaz de reproduzir, a distância, a riqueza da interação em sala de aula. Com o desenvolvimento das tecnologias interativas, entretanto, esse cenário mudou radicalmente. (…) Entra aqui então o papel do design instrucional, que, (…) serve para organizar o conteúdo em experiências que efetivamente promovam aprendizagem (MATTAR, 2007, p.09)

Nesse sentido, foi criada uma arquitetura de roteiro específica para jogo, nela foram especificadas todos os elementos de sua formulação. A arquitetura de um jogo pode variar de acordo com o seu modelo e tipologia. Segundo Musburger (2008, p.183), “[...] o processo de escrita de roteiro para jogos muda à medida que novos roteiristas e desenvolvedores entram nesse campo e à medida que as novas tecnologias e métodos de produzir jogos mudam até se chegar à forma final do jogo.”

No que concerne a tipologia de games, Gibson (2009 apud Mattar, 2010, p. 22) destaca que há três modelos de jogos: os epistêmicos, os simuladores e os persuasivos. A estrutura proposta pelo jogo da disciplina de Empreendedorismo é do tipo Epistêmico, pois o cenário, contexto e situações estão ligados aos objetivos de formação indicados pelo projeto da disciplina. Nos jogos epistêmicos os conteúdos desenvolvidos se ligam às práticas profissionais e aos conhecimentos (epistemologia) da área trabalhada.

São games que ajudam o jogador a aprender a pensar como engenheiros, planejadores urbanos, jornalistas, arquitetos e outros profissionais inovadores. Com os games epistêmicos os jovens não precisam esperar o ensino superior ou o mundo do trabalho para pensar sua educação para inovação (GIBSON, 2009 apud MATTAR, 2010, p.22).

Segundo Mattar (2007), a educação a distância é uma modalidade de ensino onde professores e alunos estão separados e sua comunicação acontecerá por meio das tecnologias de comunicação. Nesse contexto didático, os jogos são ferramentas de ensino e aprendizagem que possibilitam e aproximam professores e alunos, portanto, encurtam as distâncias geográficas e possibilitam o fortalecimento da comunicação entre docentes e discentes.

Para superar a distância entre alunos e professores, no tempo e no espaço, a EaD utiliza-se de diversas ferramentas de comunicação. A relação entre alunos e professores, portanto passa a ser mediada pela tecnologia.(...) O que mudou com as novas mídias é que os alunos e professores têm a possibilidade de interação, e não apenas de recepção de conteúdos. Além disso, o aluno e o professor on-line aprendem a trabalhar com essas ferramentas, o que se constitui uma vantagem competitiva no mercado de trabalho atual (MATTAR, 2007 e p.08).

Os jogos se aplicam a qualquer modalidade de ensino, especificamente, no ensino a distância, ele contribui para interação do professor com seus alunos e torna a aprendizagem mais lúdica e aplicada.

3 – Metodologia e produto: o processo e a estruturação do Jogo do Empreendedor

A disciplina de Empreendedorismo ofertada pelo Centro de Comunicação e Gestão apresenta carga horária de 72 horas de trabalho e pertence a matriz curricular do curso de Administração, contudo, ela também pode ser cursada por outros cursos da Universidade. Quando a ideia de ofertá-la chegou ao NEAD, logo foi pensado na equipe que trabalharia nesse projeto, e após análise, foi definido que a equipe seria composta por: um coordenador pedagógico, um professor conteudista, um roteirista, dois designers gráficos, um editor de áudio e vídeo, dois editores de texto, um revisor de texto, um assessor pedagógico e dois técnicos implementadores de rede de informática.

No primeiro encontro da equipe foi feito um briefing5, e nesse momento o professor conteudista6 explicou os conceitos e fundamentos referentes ao conteúdo da área, bem como apresentou o projeto de ensino: unidades, objetivos, carga horária, dentre outros itens.

Após o briefing, a equipe se encontrou para fazer o brainstorming7, a fim de serem socializadas as ideias para a arquitetura pedagógica da disciplina. Muitas ideias surgiram, como: os possíveis formatos estruturais da disciplina e os temas que deveriam ser trabalhados, mas a ideia mais significativa foi a de desenvolver o conteúdo por meio de um jogo de tabuleiro online, no qual o aluno vivenciaria o passo-a passo de como ser um empreendedor.

Após a definição do jogo de tabuleiro como estrutura didática, a equipe teve sete outros encontros, onde neles houve a definição do argumento do jogo, de sua progressão/complexidade e dos desafios que o mesmo traria para os alunos. A equipe também analisou os diversos modelos de jogos de tabuleiros: os diferentes formatos, objetivos, dificuldades, obstáculos, facilidades e aspectos importantes que deveriam ser analisados nessa fase da implantação.

Nesse sentido, foi pesquisado e experimentados vários jogos online, a fim de se verificar a usabilidade das ferramentas de um jogo eletrônico. Tais participações permitiram: criar as regras do jogo, seus objetivos, as instruções, as etapas (evolução no jogo), a premiação, o conteúdo essencial8 e conteúdo extra9, e acima de tudo, dar flexibilidade ao aluno referente à sua área de formação. O material produzido foi consolidado em uma arquitetura de roteiro específico para jogos, que explica detalhadamente o passo-a passo do jogo, desde a sua concepção até elementos que compõem cenário, personagem, dentre outros itens. Essa arquitetura serve como guia para qualquer projeto relacionado a jogos.

Seguidos esses passos iniciais, o jogo foi estruturado em 6 fases cada fase corresponde a uma unidade do projeto de ensino da disciplina. O jogo apresenta uma progressão estrutural e contém cenários, fases, avatares, premiação, dentre outros elementos que caracterizam um jogo de tabuleiro.

A introdução de cada fase é feita por meio de uma história em quadrinhos (HQ). É nela que o aluno se familiariza com o ambiente em que se encontra dentro do jogo. A seguir a figura ilustrativa da primeira HQ:

Figura 1. História em Quadrinhos da fase 01 – Jogo do Empreendedor.

As fases contidas no tabuleiro foram estruturadas de forma que cada fase do jogo está integrada com a fase seguinte. A passagem de uma fase para outra não acontece eventualmente (por sorte ou azar), mas sim pela experimentação sucessiva das situações propostas. O objetivo principal das situações em cada etapa é promover a compreensão das competências e habilidades definidas para cada unidade por meio da interação efetiva dos conteúdos com o jogo.

O tabuleiro de cada fase é composto por casas de cores e cenários diferenciadas. O aluno obrigatoriamente passa por todas as fases e todas as casas sem um limite de tempo. As casas apresentam uma sequência lógica de resolução e cada uma delas foi estruturada a partir dos seguintes critérios:

• Casa amarela, de conteúdo essencial. Nessa casa, o aluno tem todo o conteúdo, que também é visto na nota de aula10 (conteúdo em PDF), mas de forma resumida. Após a leitura do texto da casa, o conteúdo é salvo em uma carta de baralho, que fica disponível na parte inferior da tela. A partir da fase seguinte as cartas de baralho estarão disponíveis em pastas separadas por fase.

• Casa azul, de dicas e/ou sugestões. Nessa casa o conteúdo é extra, ou seja, o aluno recebe dicas e sugestões de acordo com o assunto daquela fase. O objetivo dessas casas são de incentivar o aluno a jogar ou ver outras ferramentas do estudo, como sites, textos e outros;

• Casa verde, das mídias. Nessa casa o conteúdo apresentado ao aluno é na forma de áudios e/ou vídeos, apresentando estudos de caso, entrevistas, cases, etc. Tais casas permitem ao aluno uma interação maior com os conteúdos;

• Casa vermelha, de desafio. Nessa casa estão os exercícios e aplicações do conteúdo. O objetivo dessa etapa é desafiar o aluno a testar seus conhecimentos e ver como está seu nível no jogo;

• Casa coringa, de premiação. Última casa do jogo sempre com um vídeo do professor conteudista da disciplina falando de forma interativa acerca dos principais assuntos abordados naquela fase, e incentivando o aluno a jogar a próxima fase. O conteúdo dessa casa também é salvo em uma carta de baralho.

Figura 2. Layout do tabuleiro da fase 01 – Jogo do Empreendedor.

O percurso desenvolvido pelo aluno sempre irá levá-lo a uma conquista. Nesse sentido o produto elaborado pelo NEAD cumpre uma função pedagógica de desenvolver aprendizagem através da relação teórico-prática, e de desenvolver as competências necessárias que o levam a experimentar o empreendedorismo na sua área de formação.

4 – Considerações Finais

Inserir os jogos no processo pedagógico é sem dúvida alguma ampliar o repertório de experiências e possibilidades de aprendizagem para os alunos, principalmente, quando falamos da aprendizagem de adultos, pois a Universidade tem exaurido a função pedagógica do ensino por transmissão, e pouco tem investido na experimentação e na aplicação teórico prática dos conceitos.

A experiência de desenvolver um jogo no ambiente virtual do UNIFOR online agregou qualidade pedagógica ao processo didático da disciplina Empreendedorismo, bem como possibilitou a equipe aprofundar seus conceitos na área de gameficação. O desafio foi avaliado como importante para formação dos profissionais do NEAD.

Outro desafio lançado pelo projeto foi o de integrar o trabalho da equipe, pois necessitávamos de mais tempo para o trabalho coletivo e para socialização das etapas. Esse desafio nos fez perceber o quanto ainda trabalhamos fragmentadamente e o quanto precisamos ainda superar esse modelo de trabalho, que isola as partes do todo.

Notas

1 Graduada no curso de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda, na Universidade de Fortaleza.

2 Graduada no curso de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda, na Universidade de Fortaleza

3 Doutora em Educação pela Universidade Federal do Ceará; pesquisadora nas áreas de didática, avaliação e planejamento educacional; professora e assessora pedagógica do NEAD da Universidade de Fortaleza.

4 Disciplina ofertada pelo Centro de Comunicação e Gestão da UNIFOR.

5 Segundo Sampaio (2003, p. 325) briefing é “resumo em inglês. [...] A base do processo de planejamento.”

6 Professor Conteudista: De acordo com a portaria nº 64/2008, o professor conteudista é o profissional que elabora e desenvolve o conteúdo do curso, disciplina ou treinamento de sua especialidade, para uso em Educação à Distância – EAD.

7 Para Sampaio (2003, p. 324) brainstorming é a “tempestade cerebral, em inglês. Técnica utilizada para gerar idéias [...]. Consiste em propor e relacionar todo tipo de associações que vierem à cabeça, sem nenhuma análise sobre sua pertinência, para avaliação posterior. Geralmente é feita por duas ou mais pessoas, em conjunto.”

8 Conteúdo produzido pelo professor conteudista abordando todos os assuntos descritos no plano de ensino.

9 Informações ligadas ao tema de empreendedorismo, por meio perguntas, dicas, sugestões, dentre outros. Conteúdos esses extraídos de sites, revistas, jornais e livros relacionados ao tema.

10 Arquivo em PDF que contém o conteúdo produzido pelo professor conteudista e editado pela equipe de desenvolvimento do NEAD.

Referências

Campos, Mariana, “O que os games tem a ensinar aos alunos”, São Paulo, Portal Porvir, Jornal Estadão, matéria publicada em 10 de setembro de 2012, disponível em: acesso em 14 de fevereiro de 2013.

Sampaio, Rafael, “Propaganda de A a Z”, 3ª Ed, Rio de Janeiro, Elsevier, 2003.

Maia, Carmem; Mattar, João. “ABC da EaD”, São Paulo, Pearson Prentice Hall, p.08-09, 2007.

Mattar, João. “Games em Educação: Como os nativos digitais aprendem”, São Paulo, Pearson Prentice Hall, p.20-22, 2010.

Musburguer, Robert B, “Roteiro para mídia eletrônica”, Rio de Janeiro, Elsevier, 2008.

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