PROCESSO DE ENVELHECIMENTO E SUA RELAÇÃO COM A MORTE ...

PROCESSO DE ENVELHECIMENTO E SUA RELA??O COM A MORTE: percep??o do idoso hospitalizado em unidade de cuidados

semi-intensivos

Gabriela Rodrigues Zinn1 Beatriz Aparecida Ozello Gutierrez2

Resumo

O objetivo deste estudo ? compreender o processo de envelhecimento humano e sua rela??o com a morte sob a percep??o do idoso hospitalizado em unidade de cuidados semi-intensivos. Realizou-se uma pesquisa qualitativa segundo a an?lise de discurso tem?tica. Desvelaram-se aspectos positivos e negativos nesse campo de investiga??o, de acordo com a hist?ria pessoal, cren?as e valores de cada idoso. Destaca-se a import?ncia de valorizar as experi?ncias de vida dessa popula??o. Palavras-chave: Envelhecimento. Morte. Idoso.

1 Introdu??o

O envelhecer e o morrer s?o fen?menos inerentes ? vida em todas as suas formas; por?m, as interpreta??es e os sentimentos que envolvem tais temas variam de um ser humano para outro.

Dentre as muitas defini??es de envelhecimento, temos que este ?

[ . . . ] um processo seq?encial, individual, acumulativo, irrevers?vel, universal, n?o-patol?gico, de deteriora??o de um organismo maduro, pr?prio a todos os membros de uma esp?cie, de maneira que o tempo o torne menos capaz de fazer frente ao estresse do meio ambiente e, portanto, aumente sua possibilidade de morte (ORGANIZACI?N PANAMERICANA DE LA SALUD, 2003, p. 30).

1 Enfermeira Especialista em Enfermagem Gerontol?gica e Mestre em Psicologia da Educa??o. Docente do Curso de Enfermagem da Universidade Paulista. E-mail: gabriela.zinn@

2 Enfermeira Doutora em Enfermagem pela Escola de Enfermagem da Universidade de S?o Paulo (USP). Docente do Curso de Gerontologia da Escola de Artes, Ci?ncias e Humanidades da USP. E-mail: biagutierrez@ .br

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Ressalta-se nesta defini??o a rela??o entre o envelhecimento e a morte, na qual o envelhecer ? descrito de forma a lembrar um caminhar para o fim da vida.

Ao contr?rio da afirmativa anterior, a morte pode ser compreendida n?o como um ponto final na exist?ncia, e sim como um elemento constitutivo dela. Assim, "O morrer sempre ser? considerado um desafio a ser vencido e n?o um momento da exist?ncia humana, que vivido com autenticidade, ? a express?o m?xima da liberdade do ser." (BOEMER, 1985, p. 58). O envelhecimento e a morte s?o fen?menos que envolvem sentimentos variados e que s?o contextualizados conforme os m?ltiplos aspectos da vida humana.

O n?mero de idosos no Brasil e no mundo ? cada vez mais significativo como descrevem v?rias pesquisas; somando-se a esse fato, a ?rea de sa?de vem se preocupando progressivamente com essa faixa et?ria, em busca de um caminho para promover a sa?de dos idosos da forma mais adequada (CAMACHO, 2002; FREITAS et al., 2002).

Dessa forma, acreditamos que a compreens?o acerca da finitude na perspectiva do idoso, o qual vive o processo de envelhecimento e est? na imin?ncia da morte, ? um passo importante para fomentar a reflex?o, buscando uma forma positiva de lidar com tais quest?es: envelhecimento e morte.

Considerando que a enfermagem tem como filosofia assistir o paciente holisticamente, uma vez que este cuidar abrange as necessidades relacionadas aos aspectos f?sicos, emocionais, sociais e espirituais; esse trabalho busca a reflex?o sobre as percep??es dos pacientes idosos acerca do seu processo de envelhecimento e sua rela??o com a morte na tentativa de propiciar a melhor qualidade de assist?ncia.

Diante do exposto, os resultados do presente estudo poder?o subsidiar novas formas de abordagem ao idoso, considerando o aspecto emp?tico, de se colocar no lugar, de olhar por meio do olhar do outro em busca da valoriza??o do ser humano, no caso, do ser idoso.

Destaca-se que a empatia acontece quando a pessoa que assume o comportamento emp?tico percebe os sentimentos da outra pessoa e relaciona esses sentimentos com a perspectiva e o contexto desta, comunicando a seguir a sua compreens?o (EGAN, 1994).

O presente estudo tem como objetivo compreender o processo de envelhecimento humano e sua rela??o com a morte, sob a percep??o do idoso hospitalizado em unidade de cuidados semi-intensivos.

Refletindo sobre os temas envelhecimento e morte e, relacionando-os com a viv?ncia de idosos hospitalizados em unidade de tratamento semi-

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intensivo, que poderiam estar mais pr?ximos desta reflex?o, decidimos pela realiza??o do presente estudo.

2 M?todo

Trata-se de um estudo descritivo-explorat?rio de cunho qualitativo. Como referencial te?rico para os procedimentos de coleta e an?lise dos dados, utilizamos o trabalho de Minayo (1999), que discute a pesquisa qualitativa em sa?de.

Ap?s a aprova??o do projeto pelo Comit? de ?tica e pelo Comit? de Pesquisa da institui??o envolvida no estudo, a pesquisadora abordou idosos hospitalizados, esclarecendo-os sobre os objetivos do estudo, a voluntariedade de participa??o e a garantia do anonimato, verbalmente e em forma de documento. Ap?s os esclarecimentos, verificou-se o interesse dos sujeitos em participar, e os que concordaram assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, iniciando-se, dessa forma, a coleta de dados.

Fizeram parte desta pesquisa seis pacientes idosos internados na unidade semi-intensiva de um hospital universit?rio de S?o Paulo que, ap?s os devidos esclarecimentos, concordaram em participar de forma livre e que, para isso, possu?am sua capacidade cognitiva preservada. Foram consideradas as disponibilidades dos sujeitos em participarem do estudo e o per?odo de tempo dispon?vel para a realiza??o das entrevistas.

O n?mero da amostra n?o foi pr?-determinado conforme preconizado pelo referencial metodol?gico.

A caracteriza??o dos entrevistados que participaram da pesquisa foi a seguinte: a m?dia de idade foi de 78,7 anos, sendo o mais jovem com 66 anos e o mais velho com 91 anos; 50% eram do sexo masculino, e 50% do sexo feminino; 50% apresentavam o ensino fundamental incompleto, sendo o ensino m?dio completo o maior n?vel de escolaridade; 50% eram pacientes cir?rgicos, e 50% eram pacientes cl?nicos, sendo 50% da popula??o internada devido a eventos agudos, e 50% correspondiam a eventos cr?nicos; 66,6% dos entrevistados eram cat?licos, 16,7% esp?ritas e os outros 16,7% verbalizaram a cren?a em religi?es distintas.

Os discursos foram obtidos por meio de entrevistas individuais gravadas em fita cassete mediante o consentimento dos sujeitos.

A quest?o norteadora da entrevista foi: Considerando as fases do ciclo da vida (inf?ncia, adolesc?ncia, fase adulta e velhice); como o(a) senhor(a) vivencia o processo de envelhecimento?

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As entrevistas foram transcritas na ?ntegra e os discursos foram submetidos ? an?lise de conte?do e, portanto, recortados e compilados a partir das unidades de significado (categorias e subcategorias) segundo Minayo (1999).

3 Resultados

Para a realiza??o da an?lise dos dados obtidos, partimos da premissa de que os idosos compartilham a experi?ncia de estarem vivenciando o processo de envelhecimento e a finitude. A partir de tal constata??o, realizamos os recortes tem?ticos nas narrativas, visando ? an?lise cr?tica, e ent?o foram desveladas as categorias e subcategorias descritas a seguir.

3.1 O Processo de Envelhecimento

Os idosos convivem com cren?as sociais e estere?tipos que supervalorizam os pontos negativos da velhice, tais como: perdas fisiol?gicas, incapacidades funcionais, restri??es, d?ficit cognitivo, entre outros, muitas vezes, essa atmosfera negativista sobrep?e o lado positivo da velhice, marcado pela fase constitu?da por ganhos e experi?ncias compensat?rias.

3.1.1 Colhendo os Frutos: conseq??ncia de valores e atitudes

Inserido nesta tem?tica, encontramos os idosos percebendo o envelhecer como um fen?meno resultante das atitudes e valores cultivados durante a vida, colocados por parte dos sujeitos do presente estudo sob uma perspectiva positiva.

Eu nunca fiz mal a ningu?m, nunca maltratei ningu?m. Eu sou muito feliz! ? isso, foi assim a minha vida!

Servir o m?ximo, mas n?o como obriga??o. N?o beber, n?o ultrapassar as noites, e estar de bem com todo mundo... O envelhecimento ? conseq??ncia da sua vida mesmo, depende do seu comportamento.

O amor ? a base principal da gente! ? uma fase boa, porque eu trabalhei muito... Agora estou sossegada. Eu me sinto sossegada. Est? tudo bem.

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? relevante considerar as inova??es no curso da vida, pois esse reconhecimento pode direcionar as pessoas por novos padr?es de comportamento na maturidade e na velhice, e ainda propiciar a elabora??o de pol?ticas p?blicas condizentes com as mudan?as sociais e culturais da sociedade (GIELE, 1998).

3.1.2 Envelhecimento Feliz

Esta subcategoria referencia a alegria de ser idoso. Uma forma otimista e positiva de vivenciar o processo de envelhecimento.

Eu tenho alegria do envelhecimento. Para mim ? a fase melhor que eu estou passando, sabe? Fa?o academia de gin?stica, dan?o forr? na academia... Eu tenho alegria de viver, tenho muita alegria e quero dar alegria para as pessoas.

Destaca-se a percep??o de que os relatos positivos em rela??o ao envelhecimento emergiram de idosos que verbalizaram o passado de forma tranq?ila, ou relatando uma vida feliz ou com dificuldades superadas. Refor?ando o tema analisado anteriormente que revela o processo de envelhecimento como conseq??ncia do processo da vida, temos que: vida feliz = envelhecimento feliz.

3.1.3 Valorizando a Sabedoria

A sabedoria adquirida pela experi?ncia de vida ? valorizada pelos idosos, alguns verbalizaram diretamente esta afirmativa, mas a maioria demonstra isto nas entrelinhas, mostrando-se orgulhosos em contar passagens da vida, interessando-se por poder colaborar com a pesquisa e, muitas vezes, aconselhando a pesquisadora.

A verdade do conhecimento n?o pode ter outra fonte se n?o a confronta??o sistem?tica da l?gica e da experi?ncia, voc? com conhecimento voc? fala com l?gica, fala com experi?ncia, e outra coisa tamb?m, porque a nobreza ? definida pelas a??es de cada um...

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