Na televisão nas décadas de 1960 e 1970 Resumo

Encontro Nacional de Pesquisa em Comunica??o e Imagem - ENCOI

24 e 25 de novembro de 2014 ? Londrina, PR

As transforma??es do telejornalismo brasileiro e a influ¨ºncia da ditadura militar

na televis?o nas d¨¦cadas de 1960 e 19701

Ana Carolina Felipe Contato2

Resumo: Em mais de sessenta anos de presen?a da televis?o no Brasil, o meio

eletr?nico se tornou a mais popular forma de entretenimento e informa??o entre os

brasileiros. Observando as transforma??es dos telejornais em rela??o ao formato e

linguagem desde os anos 1950 at¨¦ a atualidade, busca-se por meio de estudo

bibliogr¨¢fico e entrevistas com profissionais que fizeram parte da hist¨®ria do

telejornalismo em nosso pa¨ªs, verificar quais foram as principais mudan?as. Al¨¦m disso,

destaca-se a influ¨ºncia da censura do Regime Militar nas d¨¦cadas de 1960 e 1970 na

produ??o e exibi??o de notici¨¢rios enquanto fator coercitivo para a livre veicula??o da

informa??o.

Palavras-chave: Hist¨®ria do telejornalismo; telejornalismo e Ditadura; Ditadura Militar

Brasileira.

Abstract: In more than sixty years of television existence in Brazil, the electronic

media has become the most popular form of entertainment and information among

Brazilians. Observing the transformation of TV news, regarding the format and

language from the 1950s to the present, we try to ascertain what major changes have

happened by means of literature research and interviews with professionals who have

been part of the history of news broadcasting in Brazil. Besides, there was a major

influence of the censorship of the military regime in the 1960s and 1970s that interfered

in the production and display of news while coercive factor for the free propagation of

information.

Keywords: History of news broadcasting; Dictatorship and news broadcasting;

Brazilian Military Dictatorship.

1. Introdu??o

Dentre os mais populares meios de comunica??o de que disp?e o povo

brasileiro, certamente a televis?o desfruta de lugar de destaque, pois ela ¨¦, como

acredita Ana Paula Goulart (2010), a principal op??o de entretenimento e de informa??o

1

Trabalho apresentado no GT 1- M¨ªdia e Conflitos, do Encontro Nacional de Pesquisa em Comunica??o

e Imagem ¨C ENCOI.

2

Docente da Faculdade Pit¨¢goras de Londrina. E-mail: ana.contato@.br

1

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da grande maioria da popula??o do pa¨ªs. O ¡°brinquedo mais fascinante do s¨¦culo XX3¡±

tornou-se mais que divers?o e passou a exercer fun??o informativa. Al¨¦m disso, a partir

de 1950 quando a pioneira TV Tupi foi inaugurada, a realidade brasileira passou a ser

engendrada e balizada tamb¨¦m pelo novo meio.

Muitos s?o os fatores que, combinados, tornaram-na bem-sucedida no

Brasil: ¡°a m¨¢ distribui??o de renda, a concentra??o da propriedade das emissoras, o

baixo n¨ªvel educacional, o regime totalit¨¢rio nas d¨¦cadas de 1960 e 70, a imposi??o de

uma homogeneidade cultural e at¨¦ mesmo a alta qualidade da nossa teledramaturgia¡±.

(REZENDE, 2000, p. 23). De fato, as novelas televisivas s?o destaque na programa??o

de boa parte das emissoras abertas no pa¨ªs, no entanto, ¨¦ o telejornalismo quem desfruta

de credibilidade junto ao p¨²blico e aos anunciantes4.

O telejornalismo, presente desde o in¨ªcio do meio eletr?nico em nosso

pa¨ªs, passou a ser o principal mediador da realidade, ¡°promovendo desconex?es e

recomposi??es em rela??o ¨¤ realidade nacional¡± (BECKER, 2005, p. 13). Barateada, a

TV passou a fazer parte de aproximadamente 97% dos lares brasileiros e se consolidou

como meio hegem?nico de informa??o5.

Nestes mais de sessenta anos de presen?a da televis?o em nosso pa¨ªs,

muita coisa mudou ¨C formatos televisuais, tecnologia, linguagem. O presente artigo tem

como foco mapear tais transforma??es para que se possa compreender como a TV

contempor?nea p?de se configurar, al¨¦m de mostrar, por meio de depoimentos, a

influ¨ºncia que a ditadura militar teve na programa??o telejornal¨ªstica brasileira.

3

Termo empregado por Marialva Barbosa em Hist¨®ria da Televis?o no Brasil, 2010, p. 31

O intervalo comercial mais caro na Rede Globo ¨¦ do Jornal Nacional, seguido dos demais telejornais da

emissora: no JN, o anunciante desembolsa R$ 571.500,00 por comerciais de 30 segundos com tr¨ºs

inser??es semanais. Dados dos sites

e

. Acesso em 15 de outubro de 2013.

5

Dados da Pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat¨ªstica referentes ao ano de 2011.

. Acesso

em 10 de outubro de 2013.

4

2

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2. Anos de chumbo: a influ¨ºncia da ditadura no telejornalismo

Dez anos ap¨®s a chegada do novo meio ao Brasil, novas emissoras foram

inauguradas e a programa??o jornal¨ªstica ganhara seus primeiros formatos pr¨®prios. Em

setembro de 1960 foi inaugurada a TV Cultura, canal 2 em S?o Paulo, sob o comando

dos Di¨¢rios Associados e ap¨®s inc¨ºndio passou a ser uma emissora p¨²blica em 1969.

Ainda em 1960 outras emissoras de destaque foram ao ar pela primeira vez6.

Carecendo de elementos que lhe dessem formato original, o telejornal

brasileiro alcan?ou patamar in¨¦dito com o Jornal de Vanguarda, apresentado pela TV

Excelsior e dirigido por Fernando Barbosa Lima. A equipe de produ??o,

majoritariamente formada por jornalistas vindos do impresso, era refor?ada por

colunistas como Mill?r Fernandes e Jo?o Saldanha, com locu??o de Cid Moreira e Lu¨ªs

Jatob¨¢. Em 1963, o TJ recebeu o Pr¨ºmio Ondas na Espanha, sagrando-se o melhor do

mundo, mas o golpe militar de 1964 fez com que a equipe o extinguisse ap¨®s o Ato

Institucional n? 5, que provavelmente censuraria seus conte¨²do e formato inovadores.

Embora n?o tenha sido apresentado por muito tempo, o Jornal de Vanguarda foi um

dos respons¨¢veis por romper com a linguagem radiof?nica predominante nos

telenotici¨¢rios brasileiros ¨¤ ¨¦poca. No est¨²dio havia v¨¢rios apresentadores e

comentaristas e era considerado um show de not¨ªcias, por¨¦m o telejornal teve problemas

com a censura e foi tirado do ar no momento da instala??o do Ato Institucional n? 5:

(...) todos n¨®s nos reunimos e resolvemos tirar o jornal do ar. Ach¨¢vamos que

um jornal que tinha ganhado tantos pr¨ºmios, que era um jornal t?o

considerado, com o novo ato institucional, cada dia ele teria que ser um

pouco pior. Afinal esse ato institucional veio para valer mesmo e para fechar

o pa¨ªs. A censura passou a ser muito forte e n¨®s mesmos decidimos tirar o

jornal do ar. Todos n¨®s nos juntamos e chegamos a essa decis?o, ou seja, uma

decis?o da equipe. Inclusive, a ¨²ltima frase do jornal, quando n¨®s est¨¢vamos

nos despedindo, dizia assim: ¡®um cavalo de ra?a a gente mata com um tiro na

cabe?a¡¯. E acabou o jornal7.

6

A TV Itapoan (de Salvador), TV Bras¨ªlia, TV R¨¢dio Clube (de Recife), TV Paran¨¢, TV Cear¨¢, TV

Goi?nia, TV Mariano Proc¨®pio (de Juiz de Fora), Tupi-Difusora (de S?o Jos¨¦ do Rio Preto). E, no ano

seguinte, seria a vez da TV Vit¨®ria, TV Coroados, TV Borborema (de Campina Grande), TV Alterosa

(Belo Horizonte), TV Bar¨¦, TV Uberaba, TV Florian¨®polis, TV Aracaju, TV Campo Grande e TV

Corumb¨¢ (BARBOSA, 2010, p. 21).

7

Fernando Barbosa Lima, em entrevista ¨¤ pesquisadora Florentina Neves Souza, em 1999.

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Para al¨¦m da exce??o que foi o Jornal de Vanguarda, o in¨ªcio da d¨¦cada

de 1960 foi marcado por poucas modifica??es na forma de apresentar o notici¨¢rio

televisivo. Guilherme Jorge de Rezende (2000) afirma que apesar dos avan?os, as

mudan?as de linguagem televisiva eram vis¨ªveis nas produ??es de entretenimento ¨C

novelas e shows. O telejornalismo continuava a padecer com a falta de um estilo

pr¨®prio.

O endurecimento da censura pelo Regime Militar estimulava a auto

coer??o por parte de emissoras e jornalistas e a ¨¦poca ficou marcada por um

telejornalismo chapa-branca8. Inim¨¢ Sim?es contribui com a discuss?o salientando que

enquanto os impressos Jornal do Brasil, Correio da Manh? e O Estado de S. Paulo

reagiam ao AI-5, na TV eram mostradas ¡°esp¨¦cies raras de baleias, inaugura??o de

usinas, crian?as acenando bandeirinhas, etc., resultado de uma linha editorial destinada

a compor cen¨¢rios edificantes¡± (SIM?ES, 2003, p. 72).

Al¨¦m do Jornal de Vanguarda, outro programa tinha perfil editorial

contr¨¢rio ao governo. O programa de debate Pinga-Fogo, transmitido pela TV Tupi de

S?o Paulo exibia entrevistas e promovia discuss?es com pol¨ªticos e personalidades,

repercutindo entre intelectuais da ¨¦poca. De acordo com Edgar Amorim9, o programa

foi inovador porque al¨¦m de esmiu?ar fatos importantes da sociedade nacional,

introduziu a participa??o do telespectador, por telefone. Saulo Gomes 10 recorda que

Pinga Fogo

(...) era o programa de maior repercuss?o no Brasil. Todos os grandes

pol¨ªticos como Adhemar de Barros, Juscelino Kubitschek, Carlos Lacerda,

Carlos Prestes, Leonel Brizola, todos os grandes l¨ªderes da ¨¦poca civis e

militares estiveram neste programa. Foi realmente o maior programa de

entrevistas que j¨¢ se teve na tev¨º brasileira. O programa era semanal e de

longo tempo; se n?o me engano, tinha duas horas de dura??o e ¨¤s vezes pedia

at¨¦ mais tempo dependendo da import?ncia e da repercuss?o do entrevistado.

Tinha um ou mais entrevistados, era um esquema como se v¨º hoje no Roda

Viva, na Cultura, mas isto nasceu com o Pinga Fogo e tratando s¨® de

pol¨ªtica.

8

Express?o usada para designar o jornalismo que se exime de questionar o governo vigente.

Entrevista concedida ¨¤ pesquisadora Florentina Neves Souza, em 1999.

10

Jornalista profissional, Saulo Gomes iniciou sua carreira em 1956, na R¨¢dio Continental, no Rio de

Janeiro. Em 1961 transferiu-se para a TV Tupi.

9

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O jornalista acrescenta que al¨¦m de personalidades pol¨ªticas, o l¨ªder

esp¨ªrita Chico Xavier fora uma dos convidados mais representativos do programa:

Em 1968, em julho, e depois, repetindo a dose, em agosto de 1971, eu sugeri

e a casa aceitou, pois era um risco muito grande j¨¢ que a Igreja Cat¨®lica ainda

dominava o Brasil e dentro deste dom¨ªnio tinha a r¨¢dio, a televis?o e a

imprensa, a presen?a de um m¨ªstico na televis?o, o m¨¦dium Chico Xavier, de

Uberaba. E foi, at¨¦ o momento, a maior audi¨ºncia da televis?o registrada em

todos os tempos. N¨®s tivemos oitenta e seis pontos de Ibope, com apenas

onze por cento de aparelhos desligados, no programa Pinga Fogo, cujo

11

registro est¨¢ na Cinemateca Brasileira .

A segunda metade da d¨¦cada de 1960 foi marcada pelo boom de

aparelhos televisores por todo o pa¨ªs e pela inaugura??o em 26 de abril de 1965 da TV

Globo. Emissora de maior audi¨ºncia at¨¦ a atualidade, a Globo iniciou suas transmiss?es

voltada para as camadas socioecon?micas mais baixas e, como pontua S¨¦rgio Mattos

(2010), sua programa??o era composta por telenovelas, programas de audit¨®rio e filmes

¡°enlatados¡±, como ficaram conhecidos os produtos televisivos importados dos Estados

Unidos.

Foi em 1969, mais precisamente no dia 1¡ã de setembro que a exibi??o da

primeira edi??o do Jornal Nacional deu ao telejornalismo brasileiro novos par?metros

de formato. Viabilizado gra?as ao sistema de micro-ondas e a transmiss?o via sat¨¦lite, o

JN j¨¢ nasceu em rede e foi visto ao vivo por S?o Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte,

Curitiba, Porto Alegre e Bras¨ªlia. Apresentado por Hilton Gomes e Cid Moreira, o TJ

atingia, desde o in¨ªcio, ¡°aproximadamente 60 milh?es de brasileiros¡± (VIZEU, 2008,

p.54). Coutinho afirma que ¡°desde sua primeira exibi??o (...) o Jornal Nacional sempre

ocupou lugar de destaque na sociedade brasileira, podendo ser considerado como uma

esp¨¦cie de arena da vida p¨²blica no Brasil¡± (COUTINHO, 2012, p. 66).

Em 13 de maio de 1967 outra emissora que se tornaria relevante para o

cen¨¢rio telejornal¨ªstico do Brasil entrara no ar ¨C a TV Bandeirantes, pertencente ao

empres¨¢rio Jo?o Saad esteve, desde o in¨ªcio, ligada ¨¤s coberturas esportiva e

jornal¨ªstica, mantendo o telejornal mais antigo ainda em exibi??o no pa¨ªs, o Jornal da

Band. Antes chamado Jornal Bandeirantes, ele est¨¢ no ar desde a funda??o da emissora.

11

Entrevista concedida ¨¤ pesquisadora Florentina Neves Souza, em 1999.

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