1a VARA CRIMINAL DA COMARCA DE NILÓPOLIS



SENTENÇA

Trata-se de ação civil pública promovida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, pela Ilustre Promotora de Justiça em atuação neste Juízo, em face de Município de Maricá, alegando, em síntese, que, de fato, o Conselho Tutelar deste Município não está devidamente estruturado e/ou equipado para um funcionamento satisfatório nesta comunidade.

Ressalta a representante do parquet que o Conselho Tutelar de Maricá carece de viatura, de equipe técnica e de equipamentos indispensáveis para o seu regular funcionamento, em prejuízo do direito à prioridade integral garantida às crianças e adolescentes e do direito à cidadania e dignidade da população infanto-juvenil. Salienta que o Conselho Tutelar de Maricá encontra-se funcionando de forma precária, em instalações com péssimas condições de ventilação. Salienta que os mais diversos problemas perduram por muito tempo, sendo certo que foram objeto do procedimento administrativo nº 04/08 que instrui a presente demanda. Requer que seja determinado ao réu, liminarmente, o seguinte:

1- Adequar o espaço já existente, através de obras, para que o mesmo comporte os cinco conselheiros tutelares trabalhando em conjunto; esteja em boas condições de iluminação e ventilação; tenha rampas de acesso à portadores de deficiência física; comporte dois sanitários (um para uso da população e um para uso dos funcionários); tenha salas para atendimento individualizado; tenha espaço com brinquedos, livros e alimentação adequada para crianças e adolescentes serem atendidos;

2- Providenciar a aquisição e fornecimento regular de material de escritório como papéis timbrados, canetas, mesas, armários, pastas, pastas de procedimentos, toner para máquina copiadora; tinta para a impressora, disquetes, grampo para grampeador, fita durex, elásticos, corretivo, caixa box, cadernos pautados, material de limpeza;

3- Entregar, imediatamente, o veículo doado à Prefeitura para uso exclusivo ao Conselho Tutelar. Caso não seja possível, pelo não funcionamento do veículo, que disponibilize outro carro para que fique, exclusivamente, em atendimento ao Conselho Tutelar até o conserto do veículo doado. Frise-se que deverá o réu providenciar motorista exclusivo e disponibilizar gasolina suficiente pára a manutenção das atividades em prol da infância e juventude;

4- Providenciar acesso à internet;

5- Providenciar aquisição de mais uma linha telefônica fixa para o Conselho Tutelar, além da já existente, bem como um telefone celular para cada Conselheiro;

6- Disponibilizar máquina fotográfica para registros necessários na área da infância;

7- Destinar dois técnicos, um assistente social e um psicólogo, devidamente capacitados, para a sede do Conselho Tutelar, no horário integral de seu funcionamento, bem como para a realização de visitas domiciliares e demais diligências, diariamente;

8- Destinar controle de ponto para verificar a freqüência dos Conselheiros Tutelares, Assistentes Sociais, Psicólogos e demais funcionários lotados no Conselho;

9- Equipar o Conselho Tutelar com uma máquina de xerox e fax.

Requer, ainda, enquanto não disponível a verba a ser incluída na Lei Orçamentária, sejam relocados os meios materiais e humanos necessários, dentro da própria estrutura do Município, a fim de que sejam cumpridas imediatamente as solicitações acima enumeradas. Requer, por fim, a cominação de multa diária, em caso de descumprimento da obrigação, no valor correspondente a 200 (duzentos) salários mínimos, que deverá ser revertida ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente.

Contestação do Município de Maricá às fls. 86/111, sustentando, em síntese, a competência exclusiva do Poder Executivo, bem como a impossibilidade de se obrigar o ente público a realizar obras, contratar pessoal, adquirir serviços, realizar compras, dentre outras medidas requeridas. Ressalta a aplicação do Princípio da reserva do possível, a impossibilidade de inversão do ônus da prova e violação ao princípio da eficiência e economicidade e a necessidade de previsão orçamentária. Requer a improcedência dos pedidos.

Réplica às fls. 113/119.

Na audiência especial, foi deferido o sobrestamento do feito, pelo prazo requerido pelo M.P., para cumprimento de todos os pedidos e exigências elencadas pelo Secretário de Assistência Social e Participação Popular, conforme ata às fls. 160/8161. Na oportunidade, foi requerido pelo Procurador do Município prazo para juntada de documentos comprobatórios, o que foi deferido pela MM. Juíza de Direito.

Novos documentos juntados pelo Município de Maricá às fls. 162/180.

Ofício do Conselho Tutelar às fls. 183/186, acompanhado dos documentos de fls. 187/201, acerca do atendimento das exigências elencadas em audiência.

Manifestação do Ministério Público às fls. 203-verso, reportando-se aos termos da inicial.

Em provas, manifestação do Município réu à fl. 205-verso.

Decisão saneadora à fl. 205-verso, na qual foi deferida a prova documental requerida pelo réu, bem como concedido prazo para juntada do rol de testemunhas.

Novos documentos juntados pelo Ministério Público às fls. 206/212.

Despacho à fl. 216, determinando a intimação pessoal do Município, na pessoa do seu representante legal, para ciência da decisão saneadora, bem como para se manifestar sobre os documentos de fls. 206/212.

Certidão de intimação positiva à fl. 220.

Manifestação do réu às fls. 222/223, salientando sua desistência da produção da prova testemunhal outrora requerida, requerendo o julgamento da lide.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

Trata-se de ação civil pública para cumprimento de obrigação de fazer instaurada pelo Ministério Público do Estado do Rio de janeiro, no ano de 2008, em face do município de Maricá. Em síntese, dentre outros aspectos, a presente ação civil pública tem como objetivo principal compelir o referido município a aparelhar e atender às necessidades para o regular e satisfatório funcionamento do Conselho Tutelar de Maricá.

Não há questões preliminares a analisar, já que a preliminar suscitada na contestação foi rechaçada na decisão de fl. 205-verso, devidamente publicada a fl. 213, com intimação pessoal conforme fl. 220, decisão esta em face da qual não foi interposto recurso.

Ressalte-se que o réu, apesar de devidamente intimado, desistiu da produção de outras provas, requerendo o julgamento da lide no estado em que se encontra, como se nota de fl. 222/223.

Ab initio, cabe lembrar que este juízo é competente para processar e julgar esta demanda, em razão do disposto no artigo 148, inciso IV c/c 209, ambos da lei 8060/90.

Antes de passar à análise do meritum causae propriamente dito, entendo importante trazer à colação alguns dispositivos pertinentes à matéria ora tratada.

Com efeito, a constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 227 prega que:

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Artigo 6º:

“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

Por sua vez, o Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8069/90) assim dispõe:

“Artigo 86:

A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. (Grifo nosso).

Artigo 88:

São diretrizes da política de atendimento:

I- Municipalização do atendimento;

II- ...

III- Criação e manutenção de programas específicos, observada a descentralização político-administrativa;

IV- Manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente”. (Grifo nosso).

Artigo 98:

As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta lei forem ameaçados ou violados:

I- Por ação ou omissão da sociedade ou do Estado.

II- ...

III- ...”.

Artigo 131:

O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta lei.

Artigo 134:

Lei municipal disporá sobre local, dia e horário de funcionamento do Conselho Tutelar, inclusive quanto a eventual remuneração de seus membros.

Parágrafo único: Constará da Lei Orçamentária Municipal previsão dos recursos necessários ao funcionamento do Conselho Tutelar.

Por sua vez, as diversas atribuições do Conselho Tutelar estão elencadas no artigo 136 do mesmo diploma legal.

Finda a instrução, infere-se que ainda não foi providenciado, por parte do réu, o devido aparelhamento do Conselho Tutelar, o que acaba por inviabilizar o seu adequado funcionamento. Apesar do que fora firmado na audiência cuja ata se encontra às fls. 160/161, o município não atendeu integralmente a todos os itens objeto da presente demanda, como se pode notar do teor de fls. 181/202, 204/212 e 217.

Estão acostados aos autos diversos ofícios através dos quais se noticia que o veículo destinado ao Conselho Tutelar de Maricá possui diversos defeitos, expondo a risco de vida todos os que nele são transportados (Fls. 35/38), o que acaba também por inviabilizar o cumprimento das diligências necessárias, inclusive a entrega de notificações e respostas a ofícios de diversos órgãos. Em razão dos constantes problemas com o veículo, não há como atender a diversas denúncias envolvendo crianças e adolescentes em situação de risco. E não é só. Em uma das fiscalizações de Conselhos Tutelares realizadas pelo Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça da Infância e Juventude, foi constatado que o ambiente do Conselho Tutelar de Maricá é péssimo, pois as salas são pequenas e não possuem janelas, sendo certo, ainda, que o referido Conselho não possui equipe técnica. Da mesma forma, o ofício de fls. 58/59 informa a necessidade de se aparelhar o Conselho Tutelar com materiais de escritório, linha telefônica, impressora, máquina de Xerox, cursos de capacitação, máquina fotográfica, equipe técnica, dentre outros itens.

A despeito da audiência conciliatória realizada no mês de novembro de 2009, às fls. 160/161, na qual foi requerido, pelo réu, o sobrestamento do feito por 180 dias, de forma a possibilitar o cumprimento de todos os pedidos da inicial, não se logrou êxito neste tocante. É que, após a referida audiência, mais precisamente em maio de 2010, o Conselho Tutelar enviou ofícios comunicando que estava deixando de atender às denúncias recebidas, uma vez que o carro recebido pelo Conselho estava sem condições de uso, bem como que diversas obrigações assumidas na audiência não tinham sido integralmente cumpridas pela municipalidade (Fls. 181/202 e 204). Por tais motivos, mormente tendo em vista o tempo decorrido entre a audiência e a presente data, assiste razão ao Ministério Público, quando afirma que não houve o pleno atendimento às necessidades pontuadas na inicial, às quais são minimamente necessárias ao bom funcionamento do Conselho Tutelar.

Partindo de tais premissas, conclui-se que não há, como alega o réu, qualquer invasão na discricionariedade do administrador. Como é de conhecimento geral, há limites à discricionariedade da Administração Pública. Mister se faz cautela quando se adota a expressão “discricionariedade”, pois, não raro, ela é utilizada como escusa para que a Administração Pública deixe de tomar providências positivas e imprescindíveis das quais não deveria se esquivar. Neste diapasão, não se deve olvidar que as políticas públicas fincadas no artigo 227 da Constituição da República são prioritárias e que eventual omissão neste tocante também se consubstancia em um desrespeito à norma constitucional, ainda que por via indireta.

Aliás, neste sentido já se manifestou o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de janeiro:

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|0038166-24.2008.8.19.0000 (2008.002.37423) |

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|1ª Ementa |

|DES. JOSE CARLOS PAES - Julgamento: 09/12/2008 - DECIMA QUARTA CAMARA CIVEL |

|AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INSTALAÇÃO DE UMA LINHA DE TELEFONIA FIXA E FORNECIMENTO DE VEÍCULO PARA APARELHAMENTO DO|

|CONSELHO TUTELAR.1. É dever do Estado assegurar que sejam garantidos os direitos fundamentais cujos destinatários sejam as crianças |

|e adolescentes nos termos do que dispõe o artigo 227 da CRFB/88. 2. In casu, compete ao Município de Nova Friburgo assegurar o |

|aparelhamento do Conselho Tutelar, a fim de viabilizar a implementação destes direitos.3. Diante da prevalência dos direitos |

|envolvidos, cabível a concessão da medida cautelar em face do Poder Público, uma vez que presentes os requisitos que autorizam a sua|

|concessão.4. Recurso que não segue. |

0000823-25.2008.8.19.0022 (2009.009.01161) - REEXAME NECESSARIO - 1ª Ementa

DES. JESSE TORRES - Julgamento: 13/08/2009 - SEGUNDA CAMARA CIVEL

“CRIANCAS E ADOLESCENTES EM SITUACAO DE RISCO

INSTALACAO E FUNCIONAMENTO DE ABRIGO

OMISSAO DA ADMINISTRACAO

CONTROLE JUDICIAL DE POLITICA PUBLICA

PODER DISCRICIONARIO

LIMITACAO

“APELAÇÃO. Ação civil pública. Controle judicial de política pública com assento na Constituição Federal. A tutela constitucional de políticas públicas impõe obrigações positivas de cuja execução os poderes administrativos não se podem esquivar. A norma da Constituição traça limites à discricionariedade administrativa. Existência de crianças e adolescentes em situação de risco social. Inexistência de abrigo público para dar-lhes acolhida. Prioridade a ser atendida pelo Município, no desempenho das políticas decorrentes do art. 227 da Constituição da República (é dever do Estado "assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão") e no art. 88 do Estatuto da Criança e do Adolescente ("São diretrizes da política de atendimento: I municipalização do atendimento". Pleito, formulado pelo Ministério Público, e sentença, que o acolheu, em sintonia com a orientação do Supremo Tribunal Federal: "A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional - qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental' (RTJ 185/794-796, Pleno). Inexistência de apelo voluntário. Confirmação da sentença, retificando-se, em reexame necessário, os valores da multa cominada para o caso de descumprimento da obrigação e da verba honorária”.

Ementário: 45/2009 - N. 7 - 19/11/2009

Precedente Citado : STF AG REG no RE/SP,Rel.Min. Celso de Mello, julgado em 22/11/2005 e ADIN319/DF, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 03/03/1993.

O município de Maricá, em contestação, alega que, deve ser respeitada a independência e autonomia dos Poderes constituídos, pelo que não poderia o Poder Judiciário se substituir ao Poder Executivo, fazendo opções administrativas quanto à conveniência e oportunidade da realização de obras ou prestação de serviços.

Ora, não se trata, como alega o réu, de violação ao comando constitucional de separação dos Poderes supostamente oriunda da indevida interferência do Poder Judiciário na definição de políticas públicas de competência do Poder Executivo. Ao revés. O ente público tem sempre o dever de respeitar as normas constitucionais e, em caso de omissão, cabe, sim, ao Poder Judiciário agir. A adoção do sistema da unidade de jurisdição, concentrada quase que monopolisticamente no Poder Judiciário não deve inibir os órgãos julgadores, pois se assim não fosse, não haveria outra solução para a defesa dos administrados.

Segundo Diogo de Figueiredo Moreira Neto, “Sem a superação do tabu, inúmeras formas de violação indireta da legalidade, os vícios de legalidade, os vícios de finalidade apontados neste trabalho, ficariam irremediavelmente excluídos do controle jurisdicional, o que seria inadmissível no próprio sistema vigente (art. 5º, XXXV, da Constituição)”. A omissão do Estado, que, não raro, deixa de cumprir, imposições ditadas pelo texto constitucional, se consubstancia em comportamento grave. Sendo inerte, o Poder Público também desrespeita, ainda que por via indireta, a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência de medidas concretas, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental...Embora o núcleo de escolhas administrativas que atendam otimamente ao interesse público continue insindicável, os seus limites, não só podem como devem ser contrastados pelo Judiciário...A plena cognição dos fatos é indispensável para que o juiz dela retire o que é sindicável e o que não é sindicável: pois se alguém deve dar a última palavra sobre os limites da discricionariedade, há de ser o Judiciário....

Discricionariedade é a qualidade da competência cometida por lei à Administração Pública para definir, abstrata ou concretamente, o resíduo de legitimidade necessário para integrar a definição de elementos essenciais à prática de atos de execução voltados ao atendimento de um interesse público específico...Aceito, assim, que o respeito à finalidade é matéria de legalidade estrita, chega-se comodamente à conclusão de Caio Tácito de que a discricionariedade não é, realmente, um “cheque em branco”, mas tem limites, além dos quais sua ilegitimidade manifesta-se como ilegalidade. É o que se pretende demonstrar, estabelecendo as hipóteses em que o poder estatal a ser exercitado pela Administração pode ser abusado ou desviado ao arrepio do interesse público, cujo atendimento é sua própria justificação, a pretexto de manejo da discricionariedade”.(in Legitimidade e Discricionariedade, Neto, Diogo de Figueiredo Moreira, 4ª Ed., Ed. Forense, Rio de janeiro, 2002).

Qualquer norma que determine o contrário não pode, em hipótese alguma, se sobrepor ao que determina a nossa Constituição da República, mormente quando se tratam de direitos e garantias fundamentais relacionados a crianças e adolescentes.

Não merece prosperar a alegação da ausência de previsão orçamentária municipal, posto que, como bem observou a ilustre Promotora de Justiça que subscreveu a réplica, há pedido expresso na petição inicial de inclusão de proposta orçamentária compatível com as necessidades do regular e satisfatório funcionamento do Conselho Tutelar na lei Orçamentária municipal.

A alegação de escassez de recursos também não procede, já que não foi produzida qualquer prova efetiva neste sentido pelo réu, em descumprimento ao disposto no artigo 333, inciso II do C.P.C.

Com efeito, desde a propositura desta demanda, no ano de 2008, até os dias atuais, não houve alteração fática significativa, eis que ainda não foi evidenciado o regular e satisfatório funcionamento do Conselho Tutelar de Maricá, o que pode ser constatado através das inúmeras reclamações dos próprios Conselheiros Tutelares e da população local, como consta dos autos. Ora, se não houver uma resposta enérgica por parte do Estado-Juiz, a situação narrada não vai se alterar, o que aumentará brutalmente o risco a que estão submetidas diversas crianças e adolescentes que não podem contar com o apoio daqueles que mais deveriam lhes proteger, vale dizer, a família e o Estado.

ISTO POSTO, partindo da premissa que o funcionamento adequado do Conselho Tutelar é direito das crianças e adolescentes do município de Maricá, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para condenar o Município de Maricá, ora réu, a:

1- Incluir proposta orçamentária compatível com as necessidades para o regular e satisfatório funcionamento do Conselho Tutelar na Lei Orçamentária Municipal;

2- Adequar o espaço já existente, através de obras, para que o Conselho Tutelar de Maricá:

2.1- Comporte os cinco Conselheiros Tutelares trabalhando em conjunto;

2.2- Esteja em boas condições de iluminação e ventilação;

2.3- Tenha rampas de acesso a portadores de necessidades especiais;

2.4- Comporte dois sanitários, sendo um para uso da população e um para uso dos funcionários);

2.5- Tenha salas para atendimento individualizado;

2.6- Tenha espaço com brinquedos, livros, alimentação adequada para crianças e adolescentes que lá estejam para ser atendidos;

3- Adquirir e fornecer regularmente material de escritório, tais como papéis timbrados, canetas, mesas, armários, pastas, pastas de procedimentos, toner para máquina copiadora, tinta para impressora, disquetes, grampos para grampeador, fitas durex, elásticos, corretivo, caixa Box, cadernos pautados e material de limpeza;

4- Entregar o veículo doado à Prefeitura para uso exclusivo ao Conselho Tutelar, e, em não sendo possível a entrega deste veículo, que disponibilize outro veículo, para exclusivo atendimento ao Conselho Tutelar, inclusive providenciando motorista exclusivo, além de combustível suficiente para a manutenção das atividades em prol da infância e juventude.

5- Providenciar acesso à internet;

6- Adquirir mais de uma linha telefônica fixa para o Conselho Tutelar, além da já existente, bem como um telefone celular para cada Conselheiro Tutelar, a fim de que possam ser contactados com facilidade por qualquer cidadão e demais autoridades, para o perfeito funcionamento de seu trabalho;

7- Disponibilizar máquina fotográfica para registros necessários na área de Infância e Juventude;

8- Destinar dois técnicos, um assistente social e um psicólogo devidamente capacitados, na sede do Conselho Tutelar, no horário integral de seu funcionamento e também para a realização de visitas domiciliares e demais diligências, diariamente, de modo que o atendimento na área da infância jamais fique paralisado ou pendente, com a presença concomitante de técnicos na sede do Conselho e em diligências externas;

9- Destinar controle de ponto para verificar a freqüência dos Conselheiros Tutelares, assistentes sociais, psicólogos e demais funcionários lotados no Conselho Tutelar;

10- Equipar o Conselho Tutelar com uma máquina de Xerox e de fax.

Ressalto que, enquanto não for disponível a verba a ser incluída na Lei Orçamentária, deverão ser providenciados, por parte do réu, os meios materiais e humanos necessários dentro da própria estrutura do município, a fim de que sejam cumpridas, imediatamente, todas as determinações desta sentença.

Frise-se que o prazo para cumprimento de cada uma das obrigações descritas nos itens 3 a 10 desta sentença será de 60 (sessenta) dias, ao passo que o prazo para cumprimento do determinado no item 2 será de 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária equivalente a 200,00 (duzentos reais), para a hipótese de descumprimento de cada uma das obrigações ora determinadas, sendo que eventual multa será revertida ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente.

Sentença submetida ao reexame necessário, nos moldes do disposto no artigo 475, inciso I do C.P.C.

Remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça, com as homenagens de estilo.

Condeno o réu ao pagamento de eventuais despesas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais), obedecendo aos ditames do artigo 20, parágrafo 4º do C.P.C, verba esta que deverá ser revertida para o Fundo Orçamentário Especial do Centro de Estudos Jurídicos da Procuradoria Geral da Justiça do Estado do Rio de janeiro, como requerido pelo Ministério Público, na inicial.

P.R.I.

Maricá, 25 de outubro de 2011.

Juliane Mósso Beyruth de Freitas Guimarães

Juíza de Direito

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