O Partido Socialismo e Liberdade - O Globo



Excelentíssimo Senhor Presidente da Mesa Diretora do Senado Federal.

O Partido Socialismo e Liberdade – PSOL, partido político de direito privado devidamente registrado no TSE, com sede em Brasília-DF e com representação e liderança no Congresso Nacional, por sua respectiva Presidente Nacional abaixo subscrita, vem diante de Vossa Excelência, com fundamento no art. 55, II e § 2º, da Constituição Federal e do art. 13 e seguintes do Código de Ética e Decoro Parlamentar – Resolução do Senado nº 20, de 1993, apresentar

REPRESENTAÇÃO PARA VERIFICAÇÃO DA

QUEBRA DE DECORO PARLAMENTAR

Com relação ao Senador JOSÉ SARNEY, brasileiro, Senador da República pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB-AP) e Presidente do Congresso Nacional, pelas razões de fato e de direito adiante expostas:

Introdução

O Partido Socialismo e Liberdade desde o momento em que têm sido divulgadas a prática de atos secretos pela Mesa Diretora do Senado, tem procurado cumprir seu poder-dever constitucional de questionar e solicitar as investigações necessárias pelo Senado Federal, das sérias, inúmeras e reiteradas denúncias contra o atual presidente do Senado.

O Partido Representante é movido pela inteligência de que o art. 55 de nossa Constituição, inspirado no direito constitucional norte-americano, que fixa o poder disciplinar das Casas Legislativas como um mecanismo voltado não tanto para simplesmente punir um membro do Congresso, mas para proteger a integridade dado Senado, seus procedimentos, sua autoridade e sua reputação, ora colocada em questionamento.

Assim, entende e atua firmemente sob a ótica de que o art. 55, §2º da CF deseja, de modo equilibrado e justo, que os Partidos Políticos na democracia ajam como elo de integração entre o Estado e a sociedade. Compreende ainda de que o mencionado artigo, dentre outros direitos e deveres, distribuiu igualitariamente a prerrogativa de iniciar uma representação por quebra de decoro a um órgão estatal, a Mesa das Casas Legislativas, e a entidades de direito privado, intermediárias da sociedade, voltadas essencialmente para a política e para o proselitismo, os Partidos Políticos.

O exercício do direito-dever do PSOL, o qual não se abre mão, está calcado, pois, no sistema de proteção ao decoro e à ética parlamentar, que foi fixado de modo a não permitir que apenas um órgão ou pessoa tivesse a prerrogativa exclusiva de representar ou denunciar atos parlamentares indecorosos. Aliás, a própria democracia não se coaduna ao arbítrio, ao centralismo e a unilateralidade, quanto mais quando eivado de interesses outros que não os públicos.

Revestido, pois, destes valores e razões, é que o PSOL suscita esta Representação contra o Senador José Sarney.

os Fatos e Acusações Contra o Representado

Recentemente a impressa brasileira noticiou que o Senado criou cargos, concedeu benefícios e aumentou remuneração por meio de atos secretos, assim considerados por não terem sido publicados.

Segundo as notícias veiculadas diariamente, em todos os órgãos da imprensa brasileira, tais atos beneficiaram diretamente o Representado, em várias ocasiões, através de contratação de parentes e apadrinhados e da utilização de servidores do Senado para serviços particulares.

Além disso, os atos verificados estão compreendidos entre os anos de 1995 e 2009, período em que o Representado ocupou a presidência do Senado nos períodos de 1995 a 1997 e 2003 a 2005.

Tal fato é de suma importância porquanto o dirigente público tem o dever de zelar pela probidade e integridade do patrimônio público, respondendo não só pelos atos comissivos irregulares, como também pelas omissões em que incorrer na administração pública.

Não bastasse a obrigação de zelar pelos atos da Mesa Diretora, como dito acima, o Representado se beneficiou da não publicação de determinações que criaram obrigação pecuniária para o Senado Federal.

Segundo informação da Folha de São Paulo[1], ora anexada e o jornal Estadão[2], o Representado foi beneficiado com a nomeação das seguintes pessoas:

João Fernando Sarney, neto do Representado;

Vera Portela Macieira Borges, sobrinha do Representado;

Maria do Carmo Macieira, sobrinha do Representado;

Isabella Murad Cabral Alves dos Santos, sobrinha de Jorge Murad, que é genro do Representado;

Virgínia Murad de Araújo, parente de Jorge Murad, que é genro do Representado;

Nathalie Rondeu;

Luiz Cantuária;

Ivan Sarney;

Rosângela Teresinha Gonçalves;

Maria do Carmo de Castro Meira;

Shirley Duarte Pinto de Araújo;

Rodrigo Cruz;

Ricardo Araújo Zoghbi;

Luiz Fernando Zoghbi;

João Carlos Zoghbi Junior.

Diante de tais fatos, o Representado nada fez até o momento, se restringindo a discursar sobre o problema afirmando ser uma questão institucional. Não anulou os atos, não tomou medidas saneadoras, deixando de preservar o Senado Federal, bem como a integridade pública.

Ainda sobre os atos secretos, informa a imprensa brasilieira[3] que na gestão do Representado entre 2003 e 2005 foram criados 67 novos cargos, realizadas 65 nomeações e 18 exonerações.

Afirma ainda o jornal O Globo que “na véspera do Natal de 2004, a Mesa Diretora deu um presentão aos senadores: criou, por meio de ato secreto publicado no boletim 3146 S, 25 novos cargos no Órgão Central de Coordenação e Execução, ligado diretamente à Diretoria Geral e para o qual muitos senadores têm nomeado indicados políticos”.

Os atos secretos, como ficaram conhecidos pela opinião pública, teriam sido escondidos de forma propositada pelo Senado Federal, a mando dos ex-diretores da casa, Agaciel Maia e João Carlos Zoghbi, ligados diretamente a presidência do Senado.

Segundo o Correio Braziliense[4] norma editada pelo Representado dá amparo legal a nomeações de Agaciel. Diz o referido jornal:

“Em meio ao trabalho da comissão interna que apurou os atos secretos do Senado, o presidente José Sarney (PMDB) baixou norma pública que anistia nomeações e exonerações assinadas pelo ex-diretor-geral Agaciel Maia sem respaldo legal. Por 12 anos, Agaciel editou, mesmo sem poderes para tanto, atos para movimentar funcionários dos gabinetes dos integrantes da Mesa Diretora e das lideranças partidárias. Somente em maio passado, por meio do Ato nº 178, essa competência foi delegada ao diretor-geral. Sarney, portanto, legalizou mais uma situação que já existia na prática.”

Ainda, de forma contundente o jornal O Estado de São Paulo fez denúncia comprovada de que um servidor do Senado, de quem recebe os salários em torno de R$12.000,00, da confiança do Representado, presta serviços gerais na residência de Roseana Sarney, filha de José Sarney.

Mesmo tendo sido confirmada para o jornal O Estado de São Paulo, por Roseana Sarney, a denuncia de utilizar da prestação dos serviços do funcionário do Senado em sua casa, o Representado veio a público negar os fatos e se defender, em evidente ato de quebra de decoro parlamentar.

Fato de intensa gravidade envolvendo parente do Representado vem estampado em toda a imprensa brasileira, acerca do uso de influência para gerenciamento de empréstimos consignados.

Conforme cópia da noticia ora juntada[5], o neto do Representado, José Adriano Cordeiro Sarney, está entre os operadores de crédito consignado no Senado cuja atuação é alvo da Polícia Federal. A notícia apresenta detalhes da atuação do neto do Representado, a ausência de endereço da empresa.

É mais um assunto que denigre a imagem do Senado e envolve a responsabilidade de seu Presidente, o ora Representado José Sarney por atuação de parentes ou apadrinhados, conforme tem destacado a imprensa.

Contudo, há mais: o Sr. Luiz Carlos Zoghbi, ex-diretor de recursos humanos do Senado – cargo que ocupou por inúmeros anos e no período em foi presidente do Senado o Representado - foi acusado e afastou-se do cargo sob sérias acusações de (1) ter ocupado irregularmente imóvel funcional do Senado e (2) de ter operado esquema de fraudes em empréstimos consignados firmados com o Senado. As irregularidades administrativas e os eventuais ilícitos praticados em contra o Senado Federal, justamente em período de responsabilidade do Representado, indicam pelo menos ato omissivo pelo Representado e/ou de seus comandados, tudo a exigir completa investigação e responsabilização dos atores.

Do mesmo modo a enigmática participação do sr. Agaciel Maia, ex-diretor-geral do Senado, que possivelmente praticou os denunciados atos ilícitos de nomeação, de firma de contratos, realização de licitações e outros atos administrativos com a ciência e/ou a conivência de seus superiores.

Do Direito

Além de, na prática, o Representado incorrer na culpa in vigilando, pois não investigou, coibiu ou fez cessar as denunciadas ilicitudes praticadas. E culpa in eligendo, já que nomeou e manteve como diretores pessoas que notoriamente contrariaram os princípios da administração pública, especialmente o da publicidade, e que se envolverem em outros escândalos e acusações noticiadas pela mídia. E o grau de culpabilidade é maior por houve a delegação de poderes e a permissão para a prática de atos de grande significação social e econômica, como a de nomeação de servidores e realização de contratos. Ademais, numa tentativa de legalizar, retroativamente, atos irregulares, continuou o Representado a usar do expediente da delegação ao ex-diretor-geral.

É de José Cretella Júnior a lição de que “a omissão [administrativa] configura culpa in omitendo e a culpa in vigilando. São casos de inércia, casos de não-atos. Se cruza os braços, ou se não vigia quando deveria agir, o agente público omite-se, empenhando a responsabilidade do Estado por inércia ou incúria do agente. Devendo agir, não agiu, nem como bônus parter familiae, nem como bônus administractor. Foi negligente, as vezes imprudente, e até imperito. Negligente se a solércia o dominou; imprudente se confiou na sorte; imperito se não previu as possibilidades da concretização do evento. Em todos casos, culpa, ligada as idéias de inação, física ou mental”[6].

O art. 2º do Código de Ética e Decoro Parlamentar, Resolução nº 20, de 1993, parte integrante do Regimento Interno, estipula que são deveres fundamentais do Senador, dentre outros os de:

“Art. 2º São deveres fundamentais do Senador:

I - promover a defesa dos interesses populares e nacionais;

II - zelar pelo aprimoramento da ordem constitucional e legal do País, particularmente das instituições democráticas e representativas, e pelas prerrogativas do Poder Legislativo;

III - exercer o mandato com dignidade e respeito à coisa pública e à vontade popular; (...).”

Por óbvio, ante a regra interna e regras de costume e de comportamento, o representado deveria ter respeitado as normas, e, no mínimo, zelar pelo prestígio e imagem do Senado Federal (art. 48, II do Regimento Interno do Senado).

O art. 55, II e parágrafo 1º da Constituição Federal estipula que:

“Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:

II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;

§ 1º - É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.”

Já o Regimento Interno do Senado, em complemento, determina no art. 32, II que:

“Art. 32. Perde o mandato o Senador (Const., art. 55):

II – cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;”

Como acima exposto, ante as denúncias dispostas na imprensa brasilieira indicam que os atos do representado podem vir a traduzir-se em abuso às regras de moralidade, probidade, boa conduta e respeitabilidade e, ainda, ferem a imagem e o prestígio do Senado Federal.

Do Recebimento da Representação Diretamente pelo Conselho de Ética

O art. 55, § 2º da CF atribui aos Partidos Políticos a prerrogativa de iniciar diretamente o processo de investigação da quebra de decoro.

No mesmo sentido é o art. 13 do CEDP que determina aos Partidos Políticos a prerrogativa de diretamente provocar o Conselho de Ética para a instauração do processo disciplinar, tudo em consonância ao mencionado dispositivo constitucional relativo ao decoro parlamentar.

Diz o caput do artigo 13:

“Art. 13. A perda do mandato será decidida pelo Plenário, em escrutínio secreto e por maioria absoluta de votos, mediante iniciativa da Mesa, do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar ou de Partido Político representado no Congresso Nacional, na forma prevista nos arts. 14 e 15 (Constituição Federal, art. 55, § 2º).”

Nos artigos seguintes é estipulado o procedimento do processo disciplinar, contudo indevida e inconstitucionalmente, a determinação de remessa à Mesa Diretora.

A provocação do processo contra senador que supostamente tenha quebrado o decoro não é prerrogativa da Mesa, que a comparte com os Partidos Políticos com representação no Congresso Nacional.

Sendo o Conselho de Ética do Senado o responsável pela verificação e instrução probatória acerca das eventuais práticas indecorosas, como auxiliar do Plenário do Senado (ex vi da Resolução nº 20), não cabe o longo e indevido procedimento de inical remessa à Mesa para depois ser recebido pelo Conselho.

Assim o PSOL, usando de suas prerrogativa constitucional de iniciar o processo disciplinar, requer o recebimento diretamente da presente representação pelo Conselho de Ética, com a devida instauração imediata do Processo Disciplinar para a investigação dos fatos narrados e relatos pela Polícia Federal.

Dos Pedidos

Diante de todo o exposto, Requer:

I – o recebimento da presente Representação pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar e a competente instauração do Processo Disciplinar, ante a suposta quebra de decoro parlamentar do Senador José Sarney, com a designação de relator;

II – a notificação do Representado no gabinete 06 da Ala Senador Afonso Arinos do Senado Federal, no Gabinete da Presidência do Senado Federal, ou ainda, se necessário, por Edital, para que responda, se lhe aprouver, a presente Representação no prazo regimental;

III – sem prejuízo da defesa técnica, o depoimento pessoal do Representado ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal;

IV – a investigação dos contratos e licitações realizados nos períodos de gestão do Representado;

V – a investigação do ato nº 178 que delegou, de forma retroativa, poderes ao Sr. Agaciel Maia, ex-diretor-geral do Senado;

VI – propugna-se pela produção de provas por todos os meios permitidos em lei, principalmente perícia contábil, formal e ideológica, dos eventuais documentos juntados aos autos;

VII – sendo necessárias ao deslinde dos fatos, requer-se a oitiva de testemunhas

VIII - ao final, a procedência da presente representação com a recomendação ao Plenário do Senado das sanções cabíveis.

Nestes termos, pede o deferimento,

Brasília, 30 de junho de 2009.

Heloísa helena Lima de Moraes Carvalho

Presidente do PSOL

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[1]

[2]

[3] ...

[4] ....

[5]

[6] In: “Tratado de Direito Administrativo”, Forense, Rio, 1ª ed., 1970, p. 210, n. 161.

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