Resgate histórico do jornalismo brasileiro - Arquivo Público do ...

Mem?ria da Imprensa

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Resgate hist?rico do jornalismo brasileiro ? parte 1: Dos prim?rdios at? a Proclama??o da Rep?blica

Dirceu Fernandes Lopes (*)

A Imprensa no Brasil surgiu em 1706, em Pernambuco. Depois, em 1747, no Rio de Janeiro. Mais tarde, em 1807, em Vila Rica, Minas Gerais. Essas tr?s tentativas foram suprimidas por ordem do governo portugu?s. O objetivo da Coroa era manter a Col?nia atada a seu dom?nio, nas trevas e na ignor?ncia. Manter as col?nias fechadas ? cultura era caracter?stica pr?pria da domina??o. A ideologia dominante deveria manter o povo ignorante.

Em 1808, contudo, com a vinda da fam?lia real de Portugal para o Brasil, fugindo das for?as de Napole?o Bonaparte, Antonio Ara?jo, futuro Conde da Barca, mandou colocar no por?o do navio Medusa o material tipogr?fico que havia sido comprado para a Secretaria de Estrangeiros e da Guerra. No Brasil, mandou instalar o equipamento nos baixos de sua casa, no Rio de Janeiro. Em 31 de maio do mesmo ano, D. Jo?o VI oficializou a imprensa mediante o Ato Real.

Nascia, ent?o, a Imprensa R?gia, no Rio de Janeiro. Isso aconteceu 308 anos ap?s a descoberta do Brasil. At? ent?o, Portugal n?o permitia a instala??o da imprensa na Col?nia. Assim, no dia 10 de setembro, sa?a o primeiro n?mero da Gazeta do Rio de Janeiro, considerado por alguns historiadores o primeiro jornal brasileiro. No entanto, tr?s meses antes, surgia em Londres o Correio Braziliense, que, embora tenha nascido fora da Col?nia, ? apontado tamb?m por historiadores como o primeiro peri?dico do Pa?s.

Marcada pelo oficialismo e pela oposi??o, a imprensa brasileira viveu assim os primeiros anos. Durante o Brasil Col?nia apareceram no pa?s mais de 50 jornais, a maioria de dura??o ef?mera. A censura, que come?ara com a Imprensa R?gia, acabou em 1821, e procurou caracterizar, por?m, os chamados crimes de imprensa com puni??es.

Em 1811, a Imprensa R?gia publicava a primeira revista carioca, O Patriota. Tamb?m nesse ano surgia, na Bahia, a Idade de Ouro do Brasil, nos mesmos moldes da Gazeta do Rio de Janeiro, que defendia o absolutismo. A Idade de Ouro nascia para neutralizar o material contr?rio a Portugal, que chegava ao Brasil com a abertura dos portos.

Marcada pelo oficialismo e pela oposi??o, a imprensa brasileira viveu assim os primeiros anos. Durante o Brasil Col?nia apareceram no pa?s mais de 50 jornais, a maioria de dura??o ef?mera. A censura, que come?ara com a Imprensa R?gia, acabou em 1821, e procurou caracterizar, por?m, os chamados crimes de imprensa com puni??es.

Em 1811, a Imprensa R?gia publicava a primeira revista carioca, O Patriota. Tamb?m nesse ano surgia, na Bahia, a Idade de Ouro do Brasil, nos mesmos moldes da Gazeta do Rio de Janeiro, que defendia o absolutismo. A Idade de Ouro nascia para neutralizar o material contr?rio a Portugal, que chegava ao Brasil com a abertura dos portos.

(*) Possui gradua??o em Jornalismo pela Universidade Cat?lica de Santos (1966) e mestrado e doutorado em Ci?ncias da Comunica??o pela Universidade de S?o Paulo (1982; 1986). Atualmente, ? professor doutor da Universidade de S?o Paulo. Tem experi?ncia na ?rea de Comunica??o, com ?nfase em Jornalismo e Editora??o. Atua principalmente nos seguintes temas: jornalismo, jornal laborat?rio, ensino, aprendizagem, t?cnica laboratorial.

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Independ?ncia com liberdade de imprensa

A censura pr?via, que teve fim em 1821, j? tinha sido abrandada seis anos antes, em 1815, sendo permitida a publica??o livre de an?ncios, convites, letras de c?mbio e outros pap?is semelhantes. Com a liberdade de imprensa, surgiram v?rios jornais no Brasil. Boa parte desses peri?dicos procurava mobilizar a opini?o da Col?nia contra a domina??o portuguesa.

Mas, se v?rios jornais defendiam a Independ?ncia, outros procuravam combat?-la. Nesse per?odo, a imprensa se caracterizava por ser excessivamente doutrin?ria, relegando a informa??o para segundo plano. Outro ponto fundamental dos jornais era a linguagem violenta. Um dos que ficaram mais conhecidos por essa marca foi A Malagueta, que teve seu redator, Lu?s Augusto May, espancado por ter criticado o Minist?rio Imperial liderado pelos irm?os Andradas. Lu?s Augusto teve suas m?os aleijadas.

Em 1821, nascia o Di?rio do Rio de Janeiro, precursor dos atuais jornais informativos, o primeiro a publicar not?cias do cotidiano, deixando de lado a tend?ncia doutrin?ria dos outros ?rg?os. Seu conte?do era voltado para furtos, assassinatos, divers?es, espet?culos, observa??es meteorol?gicas, correio, an?ncios de venda de escravos, leil?es, compras, vendas, achados e alugu?is. Passou a ser chamado de Di?rio do Vint?m, pelo baixo pre?o, e Di?rio da Manteiga, porque publicava os pre?os desse produto. Circulou at? 1878.

Tamb?m em 1821 surgiu, na Bahia, o Di?rio Constitucional, primeiro peri?dico criado no Brasil para defender os interesses brasileiros. O jornal apoiava a maioria brasileira na Junta Provisional, que substitu?a o governador baiano. Essa Junta era formada pela maioria de portugueses e tinha o apoio de ?rg?os oficiais, conhecidos como ?ulicos, principalmente o Seman?rio C?vico e Idade do Ouro do Brasil. O Di?rio venceu essa primeira campanha eleitoral da imprensa brasileira.

Com a Independ?ncia, a imprensa intensificou a luta pela normaliza??o da vida pol?tica no Imp?rio, pregando ordem, liberdade e respeito ? Constitui??o, influindo no curso dos acontecimentos. Com o fim da Gazeta do Rio de Janeiro, em 1822, foram criados diversos jornais da Imprensa ?ulica, entre eles o Espelho, que transcrevia jornais de Lisboa e publicou v?rios artigos de D. Pedro I, considerado um jornalista panflet?rio, irreverente e pol?mico, que publicava artigos inflamados contra seus advers?rios. D. Pedro utilizava v?rios pseud?nimos: Simpl?cio Maria das Necessidades, Sacrist?o da Freguesia de S?o Jo?o de Itabora?, O Inimigo dos Marotos, Piolho Viajante, O Anglo-Man?aco, O Espreita, O Ultrabrasileiro, O Filantropo e o Derrete Chumbo a Cacete.

O fim da censura n?o impedia que a Corte tentasse manter a Col?nia sob seu dom?nio, utilizando a imprensa. Para cada jornal que nascia na oposi??o, surgiram muitos outros combatendo a Independ?ncia.

Barata, exemplo de resist?ncia

Entre os muitos jornalistas punidos por irrever?ncia ou inj?ria ao governo colonial, estava o baiano Cipriano Barata. Nascido em 1762, em Salvador, Barata estudava na Universidade de Coimbra em 1789, quando acontecia a

Revolu??o Francesa. A primeira vez que manteve contato com a imprensa foi com a distribui??o de panfletos durante essa Revolu??o, agitando a burguesia contra a monarquia. Ativista da Conjura??o Baiana e da Rep?blica em Pernambuco em 1817, depois deputado constituinte em 1823, Barata estreava, em 9 de abril desse ano, com o jornal Sentinela da Liberdade na

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Guarita de Pernambuco. Este defendia a Independ?ncia com mudan?as radicais e era contra a escravatura.

O jornal sa?a ?s quartas-feiras com linguagem vigorosa e cr?tica, mostrando as podrid?es do poder. Preso em v?rias oportunidades por desafiar e denunciar as mazelas do regime, na medida em que mudava de pris?o, Barata soltava um novo jornal. Assim, criava o jornalismo do c?rcere. O Sentinela da Liberdade, que por tantas vezes teve suas edi??es interrompidas, recebeu v?rios complementos em seu nome, de acordo com o lugar em que Barata esteve preso: Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco, Sentinela da Liberdade na Guarda do Quartel General, Sentinela da Liberdade na Guarita de Villegaignon.

O Sentinela da Liberdade inspirou a cria??o de dezenas de outros jornais com esse nome pelo pa?s. Barata foi um dos pioneiros da liberdade de imprensa e, em 1823, escreveu:

Toda e qualquer sociedade onde houver imprensa livre, est? em liberdade; que esse povo vive feliz e deve ter alegria, seguran?a e fortuna; se, pelo fato contr?rio, aquela sociedade ou povo que tiver imprensa cortada pela censura pr?via, presa e sem liberdade, seja debaixo de que pretexto for, ? povo escravo que pouco a pouco h? de ser desgra?ado at? se reduzir ao mais brutal cativeiro.

Em 1825, depois de ser preso na Fortaleza do Brum, em Recife, por participar da Conjura??o do Equador (uma rebeli?o que reuniu v?rios estados do Nordeste contra D. Pedro I), Barata publicou um jornal com o t?tulo: Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco, atacada e presa na Fortaleza do Brum, por ordem da For?a Armada Reunida. Alerta!

Em 1835, Barata escrevia o seu ?ltimo Sentinela da Liberdade, aos 75 anos. O jornal durou 13 anos, mas outros apareceram em todo o pa?s, mesmo depois de sua morte em 1? de julho de 1838.

Pasquins: jornais ou panfletos?

Outubro de 1822, um m?s depois da proclama??o da Independ?ncia, a liberdade de imprensa volta a ser cerceada. O clima agitado da ?poca provocou o aparecimento dos pasquins, com caracter?stica panflet?ria e linguagem violenta que chegava ? cal?nia e ao insulto pessoal. Seu conte?do refletia o ardor das fac??es em diverg?ncia. Liberais e conservadores travavam verdadeira guerra de palavras, utilizando os pasquins que, geralmente, tinham vida ef?mera.

Os pr?prios t?tulos demonstram o que eram os jornais: O Enfermeiro dos Doutos; O Palha?o da Oposi??o; O Grito dos Oprimidos; O Burro Magro; O Brasil Aflito; O Caolho; O Torto da Artilharia; O Soldado Aflito; O Crioulinho, e muitos outros. Pelos t?tulos, d? para perceber que, frequentemente, os pasquins recorriam ao preconceito, ? alicia??o das for?as armadas e aos apelidos.

Em agosto de 1827, a censura voltou a ser abolida. Isso provocou o aparecimento de novos jornais pelas prov?ncias. Nesse ano, surge o Farol Paulistano, primeiro jornal da Prov?ncia de S?o Paulo. Geralmente, os peri?dicos eram do tipo pasquins, que refletiam o interesse das autoridades, de intelectuais ou de alguns grupos. Tamb?m tinham vida ef?mera.

Em 1829, come?ou a circular o segundo jornal da Prov?ncia de S?o Paulo: o Observador Constitucional. Em 20 de novembro de 1830, Jo?o Batista L?bero Badar?, fundador do jornal, foi assassinado. Antes de morrer, deixou uma frase que refor?a sua resist?ncia ao governo portugu?s: "Morre um liberal, mas n?o morre a liberdade."

As for?as pol?ticas da ?poca eram divididas em tr?s grupos: direita conservadora; direita liberal; e esquerda liberal (exaltados). A direita conservadora publicava os ?rg?os da Imprensa ?ulica,

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como Di?rio Fluminense, Jornal do Commercio e O Analista. A direita liberal utilizava seus jornais, como a Aurora Fluminense e a Astrea, para combater os excessos do governo e a prega??o violenta da imprensa liberal de esquerda. J? a esquerda liberal era respons?vel pelos pasquins, que n?o poupavam os inimigos.

Enquanto os pasquins tinham vida curta, os ?rg?os da imprensa conservadora tinham sempre vida longa, como o Di?rio de Pernambuco (criado em 1825 e que existe at? hoje), o Jornal do Commercio e o Correio Paulistano, entre outros. Entre 1832 e 1833, sa?ram do prelo 35 peri?dicos: 14 defendiam o governo e 21 faziam guerra aberta. A imprensa refletia as contradi??es sociais e pol?ticas, al?m de influir no andamento dos acontecimentos.

A partir de 1837, a imprensa come?ou a utilizar a caricatura e, tr?s anos depois,

passou a circular no Rio de Janeiro A Lanterna M?gica, marcando o in?cio das publica??es ilustradas. A partir da metade do s?culo XIX, o Imp?rio se consolidou e a imprensa pol?tica, representada, principalmente, pelos pasquins, esmoreceu. Com a organiza??o urbana, que come?ou a se formar, a imprensa refletiu as transforma??es da ?poca. Em 1852, sai o Jornal das Senhoras, com sonetos, cartas de amor e moda.

Foi a ?poca da concilia??o, com o arrefecimento ou fim das lutas partid?rias. Come?ava a predominar o jornalismo mais conservador, exemplificado, principalmente, pelo Jornal do Commercio. Os peri?dicos atra?am o leitor com os folhetins, que contavam com a participa??o de escritores da ?poca, como Jos? de Alencar. Come?ava a crescer a imprensa abolicionista e afloravam os primeiros jornais com ideias republicanas.

Imprensa republicana e abolicionista

No per?odo que antecedeu a proclama??o da Rep?blica, surgiram jornais com tend?ncias republicanas e abolicionistas. Isso ocorreu por conta de jovens de fam?lias abastadas que iam estudar na Europa e voltavam ao Brasil com ideias novas e liberais, ideias republicanas. As dificuldades dos transportes e do Correio prejudicavam a chegada de jornais da Corte nas prov?ncias, o que provocava o aparecimento de mais peri?dicos no Interior. Os ideais republicanos conquistaram a imprensa. Jornais defendiam a Rep?blica e a liberta??o dos escravos. O Movimento Abolicionista era cada vez mais forte. Quintino Bocai?va, jornalista republicano, fez do jornal O Paiz, do Rio de Janeiro, uma tribuna para destrui??o do regime mon?rquico. Em 1875, nascia a Prov?ncia de S?o Paulo, que mais tarde passou a chamar-se O Estado de S. Paulo. A imprensa republicana j? contava com 74 jornais: 20 no Norte e 54 no Sul. Em

1891, surgia o Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro, montado como empresa. Trazia inova??es como distribui??o em carro?as e amplia??o dos correspondentes estrangeiros. Em 1895, era criado em Porto Alegre o Correio do Povo.

A imprensa destacava-se e recebia elogios. "Houve uma coisa que fez tremer as aristocracias mais do que os movimentos populares, o jornalismo" (Machado de Assis).

Foi na Primeira Rep?blica a funda??o da Associa??o Brasileira de Imprensa (ABI), que completou 100 anos em abril de 2008 com uma hist?ria de luta pela liberdade de imprensa. Em fins do s?culo XIX, a imprensa artesanal come?ou a ser substitu?da pela industrial. Em 1900, a Rep?blica e a imprensa estavam consolidadas. A imprensa torna-se empresa. O jornalismo individual estava superado. Mas, ao virar empresa, a imprensa fica sob o dom?nio do Estado e do Capital.

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Refer?ncias bibliogr?ficas

BAHIA, Juarez. Jornal, Hist?ria e T?cnica: As t?cnicas do jornalismo. 4. ed. S?o Paulo: ?tica, 1990. ______. Tr?s fases da imprensa brasileira. Santos: Presen?a, 1984. CAPELATO, Maria Helena R. Imprensa e Hist?ria do Brasil. 2. ed. S?o Paulo: Contexto;Edusp, 1988. FARO, Jos? Salvador. Revista Realidade: 1966-1968. Tempos de reportagem na imprensa brasileira. S?o Paulo: Ulbra; AGE, 1999. JORGE, Sebasti?o. A linguagem dos pasquins. [S. l.]: Litograf, 2000. MACEDO, Riopardense de. Hip?lito da Costa e o universo da liberdade. Porto Alegre: Sulina, 1975. MARCONI, Paolo. A censura pol?tica na imprensa brasileira: 1968-1978. 2. ed. S?o Paulo: Global Editora, 1980. MARKUN, Paulo (Org.). Vlado: Retrato da morte de um homem e de uma ?poca. 2. ed. S?o Paulo: Brasiliense, 1985. MELO, Jos? Marques de. Imprensa brasileira: Personagens que fizeram hist?ria. v. 1. S?o Paulo: Imprensa Oficial do Estado; Universidade Metodista de S?o Paulo, 2005. MOREL, Marco. Cipriano Barata. S?o Paulo: Brasiliense, 1986. RIBEIRO, Alex. Caso Escola Base: Os abusos da imprensa. S?o Paulo: ?tica, 1987. SODR?, Nelson Werneck. Hist?ria da imprensa no Brasil. 4. ed. Rio de Janeiro: Mauad, 1999. WAINER, Samuel. Minha raz?o de viver: Mem?rias de um rep?rter. 9. ed. Rio de Janeiro: Record, 1988.

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