Jornalismo Ambiental no rádio educativo: a experiência do ...



Jornalismo Ambiental no rádio educativo: a experiência do programa Ambiente Vivo

Reges Toni Schwaab[1]

Resumo:

Este artigo lança olhar sobre a trajetória do programa Ambiente Vivo, veiculado pela rádio educativa UNIJUÍ FM, de Ijuí/RS, costurando relações entre as características do rádio educativo e do jornalismo ambiental atuais. Avalia também as pautas construídas, a partir de uma análise teórica sobre o tema. Apesar de ser um programa de jornalismo especializado, o Ambiente Vivo busca ser especializado não na linguagem, mas a partir do argumento, ao tratar dos paradigmas ecológicos, da ação do homem e da visão de futuro para o planeta. Este trabalho apresenta-se na perspectiva das Ciências Sociais e pensa a ação jornalística dialógica e sistêmica, capaz de superar o modo de pensar fragmentário. O Jornalismo Ambiental no rádio não se sustenta apenas como um sistema perito ou cartesiano. Precisa ser integrador e mais compreensível, pois comunica para um público heterogêneo, mesmo em programas direcionados.

Palavras-chave: rádio, programa educativo,jornalismo ambiental.

Na memória escondem-se segredos e significados e por ela tecem-se os fios da história. Antes de adentrar na discussão proposta neste artigo, torna-se obrigatório recordar um fato ocorrido há 30 anos no Rio Grande do Sul. Em 25 de fevereiro de 1975 o protesto do estudante universitário Carlos Dayrel, do curso de Direito da UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, impediu o corte de uma acácia que seria derrubada pela Prefeitura da capital gaúcha em virtude de uma obra viária. O protesto chamou atenção, aglomerou populares e ambientalistas no local. A imprensa estava presente e a imagem do estudante em cima da acácia correu o país, instigando reflexões e manifestações de apoio. O debate ambiental veio à tona, seja em conversas entre amigos ou na cobertura dos meios de comunicação; um verdadeiro marco na luta gaúcha pela preservação ambiental.

Este não foi um fato isolado, uma vez que, ainda nos anos 70, encontram-se outros exemplos, como a primeira polêmica ambiental envolvendo uma grande indústria no Rio Grande do Sul. A poluição empreendida pela fábrica de celulose Borregaard impulsionou o embrião do movimento ecológico gaúcho. E em meio à censura militar, a fábrica foi fechada (de dezembro de 1973 até março de 1974) e a discussão tornou-se pública, com o engajamento da imprensa na questão. Muitos dos jornalistas da época lançaram-se no tema, criando um espaço que foi aproveitado pelo movimento ambientalista para conscientização. A população da capital gaúcha questionou o processo de fabricação de celulose e também a grande quantidade de efluentes que eram jogados na água do Lago Guaíba pela empresa.

Nestes dois fatos estão sementes do que hoje denomina-se Jornalismo Ambiental[2] ou Ecojornalismo. Atuavam na época, nomes importantes do ambientalismo gaúcho, como o ativista José Lutzemberger, além de jornalistas que, anos mais tarde, formariam no Rio Grande do Sul, o primeiro Núcleo de Ecojornalistas do país. A degradação ambiental e a falta de especialização para cobrir jornalisticamente essas questões foram impulso para que um grupo de profissionais criasse a entidade. A idéia já vinha sendo gestada em 1989, quando ocorreu em Brasília um encontro da FENAJ – Federação Nacional dos Jornalistas, que sugeriu a criação, em vários estados brasileiros, de Núcleos de Jornalistas dedicados à questão ambiental. A tarefa foi cumprida no Rio Grande do Sul no ano seguinte, seguindo até hoje com atividades praticamente ininterruptas.

Por outro lado, é essencial lembrar que desde a década de 50 uma corrente do pensamento ecológico vem tomando forma. É a chamada cosmovisão contemporânea, do pensamento sistêmico, a qual ganha mais força em todo mundo a partir dos anos 70, impulsionada por uma série de movimentos de contra-cultura que passaram a difundir a teoria das redes de relações vivas, fundando um novo paradigma, no qual Terra não é um simples planeta com elementos separados, mas um sistema no qual interagem dinamicamente organismos vivos e não vivos, uma visão apresentada na contramão do cartesianismo e fruto de uma ecologização das sociedades.

São modos de pensar que passam a gerar novos conceitos, como o Desenvolvimento Sustentável e a Educação Ambiental, catapultados para o vocabulário usual, principalmente a partir da RIO 92[3], a Conferência Mundial sobre Biodiversidade e Desenvolvimento Sustentável desenvolvida no Rio de Janeiro pela ONU – Organização das Nações Unidas, em 1992.

Hoje, as atividades de jornalistas ligados à questão espalham-se por várias meios, apesar do ainda pouco espaço destinado ao tema ambiente na mídia. O Núcleo de Ecojornalistas do RS, por exemplo, mantém um site[4] de notícias na Internet e também está ligado à produção do programa Sintonia da Terra, apresentado todas as sextas-feiras pela manhã, na rádio da UFRGS.

Este preâmbulo é importante para dizer que a experiência do programa que analisar-se-á aqui tem raízes em questões anteriores a ele, seja em fatos como os citados acima e em reflexões teóricas contemporâneas sobre meio ambiente e jornalismo especializado. Nosso objetivo é apresentar como foi embasada a experiência de um programa sobre meio ambiente no rádio, desenvolvido desde 2001 no município de Ijuí, interior do Rio Grande do Sul. Desde a sua criação, a UNIJUÍ FM, emissora da RTVE – Rádio Televisão Educativa UNIJUÍ, adotou o meio ambiente como um dos temas prioritários da programação jornalística, definindo inclusive um espaço específico na grade de programação para ele, o programa Ambiente Vivo.

Jornalismo Especializado e seu papel no rádio

A essência do jornalismo, na definição dada por Beltrão, prega que o mesmo existe a partir do público, para o público e pelo público (1992). Marques de Mello (1985) também concebe o jornalismo como um processo social, uma vez que o homem sempre teve vontade, interesse e aptidão para saber o que se passa, tendo a informação como requisito para a sociabilidade. O jornalismo também surgiu como reflexo das exigências sócio-culturais crescentes, “que se manifestaram na nascente engrenagem burocrática, nas operações mercantis e financeiras que movimentavam as cidades, na circulação mais rápida das idéias e dos inventos, que tornaram a reprodução do conhecimento um fator político significativo” (Mello, 1985, p.12), atendo-se ao real e exercendo um papel de orientação racional.

Bahia (1990, p.67) acrescenta que o jornalismo, além de difundir informação, deve promover o bem comum e estimular a troca de idéias, pois é seu “dever mostrar a realidade por trás da aparência”. Pela grande difusão da comunicação, as matérias jornalísticas constituem-se muitas vezes na única fonte de conhecimento para a grande massa, o que aumenta a responsabilidade do jornalista. A sociedade necessita de um fazer dotado do que se pode chamar de intencionalidade pragmática, tendo o texto jornalístico especializado a função de criação/transmissão de conhecimento.

Assim, academicamente poderia-se definir o jornalismo especializado como grau de profundidade quase que máxima, da informação sofisticada, trabalhada e distante, por sua vez, da generalização. Mas pensar em um sujeito jornalista transformador, não apenas detentor de saberes, mas instituidor de conhecimento pelo seu trabalho diário transcende esta adjetivação posta acima, ainda mais penando no exercício do jornalismo especializado como inerente ao exercício do jornalismo.

Ao transpor este pensamento para o rádio, pode-se afirmar que o jornalista deve cumprir este papel, seja produzindo programas especializados ou na programação geral. Por trabalhar com informação gerada pelos atores sociais, o jornalista deve ser um profissional que possa dar conta de conteúdos especiais, criando ordem e permitindo um diálogo entre o fato e o receptor, uma vez que, “de um modo geral a ciência vai renunciando à tendência de interpretar o todo da realidade a partir das suas partes, de se fixar nos parâmetros de saberes institucionalizados. Há um movimento que questiona antigos conceitos e busca, através da reflexão crítica, uma ampliação dos horizontes” (Vieira, 1998, p.14).

Atualmente, vivemos num tempo que impõe questões de caráter complexo, múltiplo e contraditório. A especialização tem a tarefa de interpretar e produzir sobre este mundo, não apenas olhando para pontos específicos, mas fazendo as relações necessárias. Configura-se, ainda, um papel de estabelecer a centralidade da imprensa nos processos contemporâneos da sociedade, tendo como desafio o ordenamento da informação disponível para proporcionar a reflexão. Não mais numa lógica do local para o local, mas do local para o global, fruto também do advento e disseminação das tecnologias aplicadas à comunicação e dos novos suportes midiáticos para a informação.

Isto aparece claramente quando o rádio é capaz de abordar questões ambientais globais sob a ótica do que as populações fazem localmente e que reflexos têm estas ações no plano global. E quando consegue explicar fenômenos globais que possam ser entendidos como algo de responsabilidade de todas as pessoas e países, uma vez que o espaço do ambiente não é o geográfico, delimitado pelo ser humano. Hoje, com as tecnologias disponíveis e a digitalização dos processos torna a tarefa ainda mais fácil para o rádio.

Ambiente: Vez e Voz

O físico Fritjof Capra, autor de “O Tao da Física” e “O Ponto de Mutação”, propõe um reforço à estrutura de comunicação e uma democratização do acesso aos veículos e à informação. Isso significa também que os profissionais da imprensa deverão mudar seu modo de pensar – fragmentário, desenvolvendo uma nova ética profissional baseada na consciência social e ecológica. Coloca-se como necessária a formação de mais jornalistas engajados, com capacidade para criar e evoluir, capazes de produzir através do jornalismo contribuições para a consciência crítica da sociedade. Jornalistas que pensem a comunicação como de caráter dialógico, embasada, opinativa e propositiva, na qual o Jornalismo Ambiental surge como especialização a partir do argumento.

Afirmando isso, o criador do pensamento sistêmico propõe um reforço à estrutura de comunicação e uma democratização do acesso aos veículos e à informação. A atuação dos jornalistas também requer revisão, para poder atuar neste novo sistema.

Isso significa também que os jornalistas deverão mudar, e seu modo de pensar, fragmentário, deverá tornar-se holístico, desenvolvendo uma nova ética profissional baseada na consciência social e ecológica. Em vez de se concentrar em apresentações sensacionalistas de acontecimentos aberrantes, violentos e destrutivos, repórteres e editores terão de analisar os padrões sociais e culturais complexos que formam o contexto desses acontecimentos, assim como noticiar as atividades pacíficas, construtivas e integrativas que ocorrem me nossa cultura. Prova de que este tipo maduro de jornalismo é socialmente benéfico e pode ser também um bom negócio é o número crescente de veículos alternativos de informação eu promovem novos valores e estilos de vida” (Capra, 1982, p.400)

Fazer este entrelaçamento levanta a necessidade de uma formação do jornalista que não reforce o estigma de que meio ambiente é sinônimo de fauna e flora. Geralmente ambiente é notícia quando o planeta pede socorro, quando mais um acidente ecológico aconteceu, quando se vende madeira ilegalmente ou, ainda neste barco, com matérias jornalísticas enfocando a contemplação da natureza, bem-vinda muitas vezes apenas como contemplação, como entretenimento. A informação de tragédias, ainda que indiretamente sensibilize uma parcela da população e cobre atitudes de autoridades, é pouco reflexiva em relação às causas e possíveis alternativas para o que se apresenta, trazendo uma visão fragmentada da questão.

O programa Ambiente Vivo da UNIJUÍ FM

Na bibliografia existente sobre o rádio no Brasil, não são numerosos os espaços dedicados à radiodifusão educativa. Há de se observar que o tema “rádio no Brasil”, após 80 anos do veículo no país, ainda guarda muitos pontos a serem abordados, abrindo páginas para verificar principalmente as experiências com o rádio nas cidades do interior. Possibilidades múltiplas de análise, assim como a história construída pelas rádios educativas na atual fase deste veículo, nas emissoras surgidas nestes últimos dez anos, incluindo aí as rádios ligadas à Universidades.

Entre os artigos mais recentes dedicados às questão, está “Rádio educativo: uma escola de vida e cidadania”, de Marlene M. Blois, integrante do livro “Rádio – Sintonia do Futuro”. A autora refaz um percurso da história das rádios educativas, dividindo-a em seis fases, indo até 1995. Exatamente a partir daí surgem novas experiências, visto que, até meados da década de 80 ainda persistiam as “aulas pelo rádio”, numa mistura de educação formal/informal, ainda enraizada nos ideais de Roquete Pinto, cunhados na década de 20, nos primórdios do rádio, que nasceu, educativo por excelência.

O certo é que não se tem um modelo a ser seguido, apenas orientações de legislação atribuídas pelos órgãos competentes. Ao colocar no ar suas 24 horas de programação diária, a UNIJUÍ FM – 106.9[5] criou seu estilo. Esta rádio educativa está inserida no contexto da UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul e é mantida, assim como a Universidade, pela FIDENE – Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste do Estado, com sede em Ijuí/RS.

A proposta levada ao ar está intrinsecamente ligada à missão e visão educativa e de exercício da cidadania da Fundação mantenedora, sendo fruto de várias discussões, num processo que levou dez anos entre o pedido encaminhado aos órgãos competentes em Brasília e a outorga para o funcionamento. A UNIJUÍ FM já surge no seio das novas tecnologias[6], da digitalização e da segmentação de conteúdos.

Através da veiculação de uma programação radiofônica educativa e plural, busca refletir e ressignificar permanentemente o processo de desenvolvimento sócio-cultural da região de abrangência. Aliados à programação musical, os programas jornalísticos da UNIJUÍ FM procuram apresentar um estilo dinâmico, aberto e dialógico, aprofundando temas através da pesquisa e do debate. Na pauta diária são prioridade assuntos ligados à sociedade civil organizada, cultura, educação, saúde, cidadania, inclusão social e meio ambiente. A emissora busca aprofundar os temas através da pesquisa e do debate, levando em consideração que o rádio tem significativa contribuição a ser dada na produção de conhecimento sobre a realidade, sem levar em conta apenas a máxima da síntese, como modelo trazido para o Brasil na implantação do rádio, conforme Meditsch (2001).

Por estar inserido em uma proposta de rádio educativa pioneira na região, o programa Ambiente Vivo, apresentado como foco desta análise, seguiu o tripé estabelecido para a linha editorial da emissora, qual seja, a pesquisa, a pluralidade e a interatividade. Pela experiência do programa até hoje, os dois primeiros conceitos foram os mais aplicados, tendo a pesquisa como a base de todo o trabalho. Cabe, ainda, ressaltar que o Ambiente Vivo surgiu em meio à uma série de atividades que a UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul e outros setores da FIDENE, Fundação mantenedora da Universidade e da Rádio, realizavam (e realizam) na área ambiental, principalmente no que se refere ao reflorestamento.

De julho de 2001 até março de 2002 o programa teve uma hora de duração, intercalando material jornalístico com programação de música brasileira, principalmente de temática ecológica. Em março de 2002 o programa foi reformulado, passando a ter meia hora de duração, apresentando exclusivamente material jornalístico, através de boletins e entrevistas, reportagens especiais e informações veiculadas em quadros específicos, como as notícias da semana na área ambiental; indicações de leituras sobre os temas do programa no quadro Páginas Ambientais; e de sites, no Ambiente na Internet. Desde o início, o programa teve um jornalista[7] como produtor, editor e apresentador, também contando com a participação de repórteres da emissora em matérias especiais.

O programa Ambiente Vivo foi concebido e fundamentado na proposta de jornalismo ambiental que leva em conta a visão sistêmica e de interrelação entre todos os fenômenos e seres vivos. Num espaço semanal de meia hora, procura estabelecer conexões entre o local e o global, abordando, por exemplo, assuntos da pauta nacional e internacional com fontes locais e propondo discussão de problemas locais com fontes de outras cidades do estado e/ou regiões do país, que atuem em áreas correlatas ao tema discutido ou que tenham enfrentado o mesmo problema em seus municípios, como por exemplo a implantação da coleta seletiva do lixo em uma cidade.

Conforme defendido aqui, o jornalismo ambiental, por ser especializado, aceita a opinião e a argumentação como características. São, na verdade, pontos fundamentais do trabalho com o tema ambiental, uma vez que, para poder abordá-lo pelo viés radiojornalistico é preciso antes de tudo compreendê-lo, não sendo esta uma tarefa simples. A presença cada vez maior dos meios de comunicação na sociedade cria um novo espaço que deve ser definido na presença de seus componentes básicos: comunicação e educação. Neste sentido, entende-se que as rádios educativas cumprem um papel de formação dos cidadãos ao propor reflexões que visem a sustentabilidade. Este jornalismo especializado no rádio deve ser integrador na linguagem e na qualidade das mensagens enviadas ou produzidas, com um forte elo no ambiental, à luz dos questionamentos sobre os rumos da humanidade via paradigmas ecológicos.

Um dos principais desafios do jornalismo ambiental é não se tornar refém apenas do factual, enfocando unicamente problemas e eventos da área. Desta forma, o Ambiente Vivo tem como propósito levantar periodicamente pautas sobre cotidiano das pessoas e da realidade da região de abrangência da Rádio. O programa aborda, ainda, os trabalhos realizados por instituições e organizações ligadas à questão ambiental, sejam órgãos governamentais estaduais ou municipais, ONG’s e instituições que trabalhem com o tema. O foco está voltado para uma compreensão dos assuntos por um viés sócio-ambiental, onde os variados pontos de vista possam ser apresentados.

A abrangência heterogênea do rádio também foi levada em conta na adequação da linguagem do programa em questão, buscando contrabalançar os termos técnicos com a linguagem cotidiana, explicando termos científicos sempre que necessário. Por estar inserido em uma proposta de rádio educativa, o Ambiente Vivo faz parte de um rol de programas especializados ou temáticos da grade de programação da UNIJUÍ FM. Neste sentido torna-se primordial dar o mesmo peso de importância aos dois tipos de público ouvinte: aqueles ligados à temáticas específicas (ambiente, cultura, gestão e cidadania[8]) e que, portanto, têm uma bagagem cultural ou um conhecimento prévio dos temas escolhidos como pauta, bem como o público em geral que se propõe a acompanhar a programação veiculada pela emissora. Ambos devem se sentir à vontade e instigados a acompanhar o que está sendo apresentado, o que é um constante desafio, pois “a evolução do rádio (...) aponta justamente para uma multiplicidade de utilizações do meio, expressa em diferentes formatos de programação dirigidos a públicos diversos” (Meditsch, 2001, p. 31).

Como exemplo desta proposta, escolheu-se dois temas bastante presentes no programa em 2004: resíduos sólidos e recursos hídricos. A pauta resíduos sólidos teve origem na demora na instalação da coleta seletiva no município de Ijuí. Foi explorada pela primeira vez em 2004 ainda no mês de fevereiro, em entrevistas com o governo municipal. O tema passou por análise de professores da Universidade e pessoas ligadas à AIPAN – Associação Ijuiense de Proteção ao Ambiente Natural. Logo após, em abril e maio, o Ambiente Vivo voltou a abordar o assunto pelo viés dos exemplos de cidades que já faziam a coleta seletiva do lixo e como construíram esta proposta. Em outras edições, foram explorados dados de pesquisas nacionais sobre separação do lixo, novamente colocando na roda a demora de uma definição da situação em Ijuí. Em junho o programa aproveitou a realização pela Universidade de um Fórum Nacional sobre Meio Ambiente para abordar o assunto com biólogos e ambientalistas. O tema dos resíduos sólidos aparece novamente em julho, quando o programa foi buscar exemplos como o da Ceagesp – Central de Entrepostos e Abastecimento de São Paulo, para discutir o desperdício e o reaproveitamento de resíduos orgânicos. A reportagem foi complementada por entrevistas com outras pessoas e profissionais que também tinham experiências na área, tendo sempre como preocupação a adequação da pauta à realidade local, como algo possível de também acontecer, por exemplo, no fundo do quintal de quem ouve o programa, como a técnica da compostagem, ou uma ação conjunta de um condomínio de apartamentos para separar o lixo seco do orgânico, pautas presentes em edições do programa também no segundo semestre do ano.

Estes assuntos fizeram parte de um esforço do programa para abrir espaço para assuntos da chamada agenda marrom, que é tida como uma das menos discutidas, incluindo aí a questão dos resíduos industriais, ao propor que empresas que solucionaram seus problemas com os dejetos, contassem a sua experiência, principalmente em setores considerados vilões. Sem descuidar da agenda marrom, a agenda verde e o eterno problema do desmatamento também esteve presente. No entanto, o tema mais recorrente no ano de 2004 no programa foi a questão da água.

O Ambiente Vivo propôs aos ouvintes um aprofundamento sobre o tema como uma espécie de antecipação das discussões que foram realizadas posteriormente, em novembro de 2004, na Conferência Estadual do Meio Ambiente no Rio Grande do Sul. Desta forma, de fevereiro até dezembro, pode-se dizer que pelo menos um programa de cada mês (são em média 4 edições mensais) preocupou-se com algum aspecto dos recursos hídricos. Esta empreitada começou com uma entrevista especial que apresentou aspectos relacionados ao Aqüífero Guarani e o futuro da maior reserva de água doce do planeta. Passou pelo uso racional da água em casa e no trabalho, poluição dos rios, ciclo das águas e alterações climáticas. O Ambiente Vivo ainda abriu espaço permanente para o Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Ijuí, que congrega dezenas de municípios da região de Ijuí, discutindo temas relacionados aos rios do noroeste do Estado e da Bacia do Uruguai.

Aproveitando eventos da área ambiental, a proposta do programa foi ouvir o maior número possível de autoridades e especialistas nestes encontros, porém, buscando provocar questões relacionadas aos principais temas da área, sem ficar preso à pauta do evento. Foi assim, por exemplo, quando reuniu presidentes de quatro comitês de bacia para discutir o futuro da água no Rio Grande do Sul e o papel das suas entidades, colocando ainda, no mesmo programa os questionamentos destes comitês ao Secretário de Obras do estado, uma vez que todos estavam reunidos em um Seminário da área na região.

Ampliar o espaço

O programa completa em julho de 2005 quatro anos de existência com a incumbência de conquistar novos espaços e ampliar a cobertura regional. Concretamente tem como aspecto positivo o fato da proposta ter sido preservada e aprimorada durante todo este tempo, sendo inclusive fonte para abastecer outros programas da emissora e instigar aos profissionais da emissora a trazerem a pauta ambiental para o exercício diário do jornalismo na UNIJUÍ FM, seja nos noticiários ou em programas ampliados de radiojornalismo, com espaços para entrevistas e boletins. Segue também responsável por alertar sobre as conseqüências da ação humana sobre a natureza, debatendo as grandes questões e propondo a reflexão sobre os pequenos atos de cada indivíduo, sempre através da argumentação e apresentação de idéias.

Pela grande difusão da comunicação, as matérias jornalísticas constituem-se muitas vezes na única fonte de conhecimento para a grande massa, o que aumenta a responsabilidade da produção, função que ganha ainda mais peso nas rádios educativas. A especialização toma o papel de interpretar e produzir sobre este mundo, não apenas olhando para pontos específicos, mas fazendo as relações necessárias. Configura-se, ainda, um papel de estabelecer a centralidade da imprensa nos processos contemporâneos da sociedade, tendo como desafio o ordenamento da informação disponível.

Estabelecer as conexões que expliquem o caminho para a sustentabilidade é fazer compreender a teia da vida. O Jornalismo Ambiental é portanto um agregador de conhecimentos, é sistêmico, complexo na essência, didático na recepção, responsável na elaboração. Não se sustenta apenas como um sistema perito, fragmentado ou cartesiano. Precisa ser integrador, mas compreensível, pois comunica para um público heterogêneo, mesmo em espaços especializados, o que, numa visão global, poderia ser pressuposto de qualquer emissora de rádio. A tarefa não é simples, mas parece não haver outro caminho, uma vez que a Comunicação, em sua essência, deve ser social.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[1] Jornalista, Mestrando em Comunicação e Informação/UFRGS e Coordenador Operacional de Radiodifusão da Rádio UNIJUÍ FM.

[2] A primeira entidade reunindo profissionais da imprensa, ocupados com a questão ambiental, surgiu na França, quando foi realizada em Paris a Conferência da Biosfera, em 1968. Nessa mesma época foi preso aqui no Brasil, pela Operação Bandeirantes, o jornalista Randau Marques, considerado o primeiro profissional da imprensa brasileira especializado em meio ambiente. Foi taxado de subversivo pelo conjunto de reportagens sobre contaminação de gráficos e sapateiros com chumbo, na cidade de Franca, São Paulo, berço dos curtumes. Em seu trabalho, abordou ainda a questão dos defensivos agrícolas e contaminação humana e do ambiente.

[3] Na Rio 92 muitos jornais, tevês e rádios tiveram que buscar soluções para cobrir o evento, pois não havia na época jornalistas com visão ambiental em número suficiente. Muitos biólogos e educadores que conseguiam entender e transmitir a dimensão da Conferência acabaram prestando serviços. Surgiram, em muitos jornais e revistas suplementos ou editorias especiais sobre ambiente.

[4] O endereço é .br

[5] A UNIJUÍ FM opera na freqüência 106.9 desde 21 de julho de 2001 e tem, atualmente, 1 Kw (1000 watts) de potência, abrangendo Ijuí e cerca de 30 municípios no entorno, integrantes da área de atuação da Fidene.

[6] A UNIJUÍ FM pode ser ouvida também via internet, através do site unijui.tche.br/rtve

[7] O programa é produzido e apresentado pelo autor deste artigo.

[8] Mais detalhes no endereço unijui.tche.br/rtve no link Programação.

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