TIAGO BARCELOS



UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Departamento de Comunicação Social

CENÁRIO TELEVISIVO:

Linguagens múltiplas fragmentadas

Camila Gonzaga

Laura Baptista da Silva

Rayssa Fonseca

Tiago Barcelos Pereira Salgado

Belo Horizonte

2009

TEMA GERAL

No terceiro capítulo do livro Cenário televiso: linguagens múltiplas fragmentadas, Cardoso (2009) contextualiza o espaço do cenário na imagem televisa. Para tanto, recorre a dois operadores analíticos: tipologias cenográficas e topologia. O primeiro se refere ao agrupamento de diferentes características semelhantes entre cenografias de eventos diferentes, que por sua vez, orientam determinadas configurações espaciais. O segundo delineia o local de encenação.

A partir de uma proposição de que a televisão se compõe por uma série de linguagens, a discussão se pauta em torno da questão: de que forma as tipologias influenciam a configuração do espaço de encenação?

O primeiro apontamento diz respeito ao cenário no espaço/tempo, que se configura, segundo Garcia Jiménez, de acordo com certas dicotomias, como interior/exterior, natural/artificial, urbano/rural, entre outras. Eugeni aponta que a representação televisiva resulta da superposição dos planos de construção da cena e direção da cena. Nesse sentido, é possível determinar as diferentes configurações de estrutura do espaço televiso segundo a: topologia do cenário; modalidade de conexão; dinâmica. A definição do estilo do cenário se deve à: disposição dos elementos arquitetônicos e cenográficos; escolha das cores; aplicação das luzes. Dessa maneira, “um exame baseado na perspectiva semântica exige a observação das características estruturais e estilísticas de programas específicos pertencentes a gêneros também específicos.” (CARDOSO, 2009, p.65).

O segundo apontamento se refere ao cenário como fundo. Tal termo aponta que o cenário não é a principal atração, sua função é valorizar os gestos, os movimentos e a fala do profissional do vídeo. Ele estabelece, assim, relações de linguagens com signos visuais, verbais e sonoros, de modo que em cada cena não se estabelece uma hierarquia entre esses elementos, mas sim uma inter-relação sígnica. “A significação se dá pelas relações temporais estabelecidas.” (CARDOSO, 2009, p.68). A figura se encontra, a princípio, em frente ao fundo, tendendo a ser a parte inferior do espaço cênico. Arbheim destaca que a figura pode assumir a função de fundo e vice-versa.

Embora, a princípio, o cenário absorva naturalmente, pela percepção humana a característica de fundo é importante considerar que como o sentido se dá pela relação espaço-temporal através dos elementos cenográficos, o cenário pode se transformar em figura, uma vez que o espaço televisivo possui movimento e o movimento permite a inversão de representação entre figura e fundo.

Essa movimentação se dá pelas relações de planos apresentados antes e depois de uma determinada cena, é essa relação temporal, que constrói o lugar do cenário, juntamente com o modelo de plano escolhido. Mesmo que o cenário na lógica física (externa ao televisivo) visto como fundo, o recorte do plano pode trazê-lo a frente dos demais elementos, inclusive da figura, variando de acordo com a intenção simbólica da cena a ser apresentada.

Quando falamos a respeito da relação sígnica intencional criada pela montagem do cenário, é possível, ainda analisar a construção desse cenário desenvolvido por profissionais que baseiam sua organização prevendo a percepção humana. Por meio do ground do telespectador e o sentido final que se quer propiciar a ele, é possível prever um conjunto de técnicas manipulativas a fim de se criar um resultado o mais próximo do esperado a partir do estudo da percepção humana. Cardoso (2009), cita o resumo do conceito de pensamento gestáltico proposto por João Gomes Filho (apud CARDOSO 2009, p. 70) “Não vemos partes isoladas[...] nossa percepção é resultado de uma sensação global, as partes são inseparáveis do todo.” Desse modo, qualquer alteração em uma das partes resulta na modificação do todo assistido. O profissional que cria a cena tem a visualização das partes como instrumentos de construção do sentido, podendo adaptar elementos com objetivo de dar ênfase a um ou outro aspecto. Enquanto o telespectador constrói o sentido do que está sendo apresentado, exatamente pelas ênfases colocadas através do conjunto de técnicas televisivas

O terceiro aspecto relata os elementos de configuração do cenário. Tais elementos como equipamentos, materiais, técnicas e procedimentos no processo de criação cenográfica televisiva são contextualizados historicamente a partir do teatro.

As principais conclusões nesse capítulo indicam que apesar de predominar uma certa organização do espaço e certo registro de estilo em grande parte dos gêneros televisivos, de acordo com Orza, não é possível certa tipologia determinar certo programa. A fim de que possa atuar como forma simbólica, o cenário depende, ainda, de relações de significado que estabelece com outros elementos de cena, como música, texto, contexto etc. O papel que o cenário tem a cumprir se baseia nos conceitos de figura e fundo, sendo compreendido como elemento de significação do texto televisivo.

O quarto capítulo - O Cenário nos Gêneros Televisivos – apresenta, por meio de uma classificação em nove gêneros (Teledramaturgia, Telejornalismo, Auditório e Variedades, Game Show e Reality Show, Entrevista, Humor e Infantil. Musical e Videoclipe, e Programa Educativo) os cenários na configuração de espaço técnicos específicos, que o utilizam como elemento de significação.

Percebe-se, segundo Cardoso (2009), que a diversidade acaba por extinguir a idéia de gêneros, a digitalização dos meios imprime um caráter de personalização. Composições e estilos cenográficos são criados a partir de tendências televisivas, a que muitas vezes os próprios profissionais precisam se subordinar. Embora a divisão em gêneros televisivos para o estudo do cenário seja uma maneira de se organizar e uma tentativa de categorizar estes, o próprio autor ressalta o cuidado necessário nesta divisão de gêneros, pois não se sabe bem quantos são. Como os cenários são influenciados por tendências televisivas, há a constante mutação e atualização de estilos. Considerando que gêneros surgem, se estabelecem na televisão e evoluem, podendo perder as características primeiras e se modificando com o tempo, os pesquisadores do meio nem sempre conseguem acompanhar as mutações. Segundo Santaella citada por Cardoso (2009, p. 124), “tentar estabelecer uma especificidade para um meio como o vídeo [...], acrescido de uma enorme capacidade de transmutação plástica, poderia se correr no erro de se almejar uma pureza que este meio não possui.”.

REFLEXÃO DO GRUPO

Partindo da metodologia do material lido, entendemos que o capítulo três voltou-se à construção de um arcabouço teórico e o quarto - O Cenário nos Gêneros Televisivos - se dedicou a exemplificação. É com foco nesse último capítulo – buscando, claro, os subsídios teóricos – que desenvolveremos nossa reflexão.

Os exemplos apresentados no texto, na forma de gêneros televisivos, não vão, em sua maioria, apresentar conceitos explícitos já trabalhados pelos outros autores, propostos na disciplina Estética da Televisão, mas eles são facilmente identificados. Quando Cardoso (2009), por exemplo, se apropria da história evolutiva dos gêneros televisivos, focando nos cenários, se observa as características que Eco (1984) usou para traçar épocas televisivas (Paleotelevisão e Neotelevisão).

Contextualizando a caminhada dos telejornais, o autor apresenta, em 1950, um telejornalismo que pode ser comparado com o rádio na TV, falavam de coisas do mundo, externas, não tinham um cenário produzido, tratava-se de um fundo neutro, único, patrocinado ou ilustrado. Esse espaço cenográfico está diretamente ligado ao que Eco (1984) chamou de inocência, na Paleotelevisão. O espaço não era aproveitado, não auto-referenciava a tevê.

O capítulo – O Cenário nos Gêneros Televisivos – relata também a relevância das telenovelas da TV Globo, um dos pilares da programação dessa emissora, e que ajuda a destacar a transição para Neotelevisão, além de abrir espaço para identificar o que Gubrecht (1998) chama de “realidade preferencial televisiva”. Destacando que uma telenovela, atualmente, utiliza os mais diversos recursos para imprimir uma sensação naturalista, a realidade.

A telenovela, em seu contrato pré-existente com o telespectador, produz uma realidade desse gênero, a realidade televisiva e o cenário faz parte dessa produção do real. Em Caminho das Índias, novela da TV Globo, exibida em 2009, por exemplo, se vê o real indiano sob uma ótica produzida, as mazelas são escondidas e dá espaço ao belo, o atrativo, um cenário real ideal, produzido.

Nessa construção do real, informação se mistura com ficção e entretenimento, criando diálogos com o receptor. A realidade da tevê se aproxima da realidade cotidiana, cria relações de identificação com os telespectadores e o cenário é um dos principais elementos na construção dessa identidade. E, então, estamos presente naquela realidade televisiva, a “realidade preferencial televisiva”, segundo Gubrecht (1998), que ainda nos observa a passagem da TV de apresentadora – Paleotelevisão - à construtora da realidade – Neotelevisão.

Refletindo a cerca das características das minisséries, segundo Cardoso (2009), é possível destacar a riqueza de detalhes desse segmento da teledramaturgia. Cenários que resgatam épocas e marcos da história e da literatura, trazendo para a cena, cada vez mais, o visível. O que nos remete a perspectiva didática apresentada por Oliver Fahle (2006) para demonstrar a passagem entre as diferentes imagens, como essa foi sendo cada vez mais atravessada pelo visível, de maneira que a mise-en-scène complexificou-se ao expor a cena e o fora da cena em um mesmo contexto de apresentação. E, ainda, a possibilidade de apreensão por parte do público, que teve seu olhar reeducado, um público habituado ao teatro, um universo de recursos restritos, condicional ao visível, é, então, levado para a televisão e com o passar do tempo transformado, enriquecido, produzido, midiatizado.

Desde 1973 na TV Globo, o Fantástico, designado pelo autor como revista eletrônica, faz parte de um gênero que tem por característica a variedade, a diversidade, consegue embutir outros segmentos televisivo no mesmo espaço. Um programa que nos permite observar o uso de estratégias televisivas, como a interação com o público, a diversidade de quadros, cenários que mudam, permitindo uma renovação visual, sensação de agilidade e novidade, particularidades estratégicas que nos levam a entender o zapping, de Beatriz Sarlo (1997). Segundo a autora, para conseguir prender a atenção do público, o programa evita pausas, configura-se pela velocidade das imagens e a brevidade dos planos. São, então, elementos, no caso analisado, como o cenário, que contribuem para despertar sensações que prendem os telespectadores àquele canal, àquele programa, evitando o zapping.

Ainda nesse caso, podemos considerar os programas que mesclam entretenimento e informação, o que dá origem ao termo infotainment (GOMES apud FRANÇA, 2009). O traço da televisão, de diversão, é tão marcante que chega a penetrar em campos tidos como sisudos como os da informação.

Ao abordar os programas de auditório e variedades, o autor afirma que um traço desses programas é o caráter auto-referencial, em que se utiliza o próprio conteúdo da televisão para a composição do texto dos programas, a principal característica da TV contemporânea (FECHINI apud CARDOSO, 2009). Programas como Vídeo Show, usam todo seu horário falando da programação da própria TV. Ao relembrarmos o conceito de Neotelevisão, consideramos uma TV que fala menos do mundo exterior e mais de si mesma, o que é o caso abordado.

Porém, podemos considerar ainda a pós TV, a TV Pigmaleão, em que se procura trazer o ordinário para a televisão, e os personagens são qualquer um que se torne televisivo. Em programas de Game Show e Reality Show, os personagens ganham vida própria. E a única diferença entre o que está na TV e o que a assiste está na tevisibilidade: “É assim que a televisão se torna o lugar mesmo de realização e consagração do valor maior da nova sociedade, que é o desenvolvimento pessoal e a autonomia individual” (FRANÇA, 2009, p. 29).

A TV "é um meio que vem se recriando continuamente enquanto linguagem, passível de diferentes usos, alojando práticas discursivas distintas, acolhendo múltiplos discursos" (FRANÇA, 2009, p.29), assim chega-se a conclusão de que a questão de gênero não se enquadra mais em uma análise televisiva, Cardoso (2009) ainda utiliza isso de uma forma didática.

A concepção de televisão trabalhada por Cardoso (2009) é voltada para semiótica, relação sígnica, simbólica, composição da cena. Ele considera a importância do cenário, apesar de estar ao fundo, e que é preciso ter sensibilidade para observar essa questão proposta pelo “fundo”. Já no conceito trabalhado no livro A TV em transição, as produções televisivas mudam junto com a cultura perceptiva do telespectador e o cenário acompanha essa evolução. O que se percebe, segundo Cardoso (2009), é que a diversidade acaba por extinguir a idéia de gêneros, uma vez que a digitalização dos meios imprime um caráter de personalização. Existem novos tipos de cenários digitais, que mudam instantaneamente, e parece que cada programa ganha um gênero próprio, ímpar, que não pode ser classificado.

REFERÊNCIAS

CARDOSO, J. B. F.. Cenário Televisivo: linguagens múltiplas fragmentadas. São Paulo: Annablume / FAPESP, 2009.

ECO, U.. Tevê: a transparência perdida. In: ECO, U.. Viagem na irrealidade cotidiana. Tradução Aurora Fornoni Bernardini e Homero Freitas de Andrade. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. p.182-204.

FAHLE, O. Estética da televisão. Passos rumo a uma teoria da imagem da televisão. In: GUIMARÃES, C., LEAL, B.S., MENDONÇA, C. C. (orgs.) Comunicação e experiência estética. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006. p.190-208.

FECHINE, Yvana. A Programação da TV no Cenário de Digitalização dos Meios: Configurações que Emergem dos Reality Shows. In: João Freire Filho. (Org.). A TV em transição: tendências de programação no Brasil e no mundo. 1 ed. Porto Alegre: Editora Sulina, 2009. p. 173-196.

FRANÇA, Vera. A televisão porosa: traços e tendências. In: João Freire Filho. (Org.). A TV em transição: tendências de programação no Brasil e no mundo. 1 ed. Porto Alegre: Editora Sulina, 2009. p. 27-52.

GUMBRETCH, H. U. Sua janela para o mundo ou como a mídia televisiva surgiu a realidade televisiva. In:. GUMBRETCH, H. U. Modernização dos sentidos. São Paulo: Editora 34, 1998. p.261-274.

SARLO, B. Cenas da vida pós-moderna. Intelectuais, arte e vídeo cultura na Argentina. Tradução Sérgio Alcides. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997.

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