Livro “Combater em Moçambique; Guerra e Descolonização ...



Livro “Combater em Moçambique; Guerra e Descolonização” 1964-1975”

Na tertúlia “Fim do Império”, na Livraria/Galeria Municipal Verney, em Oeiras, promovida pelo núcleo local da Liga dos Combatentes e pela Câmara Municipal de Oeiras.

- Uma saudação muito especial para o Prof. Dr. Artur Anselmo, meu professor e orientador no Curso de Ciências da Informação da UCP, no início dos anos 90. Quero aqui recordar, que foi igualmente este ilustre mestre da Língua Portuguesa, que apresentou, na Biblioteca Municipal de Lisboa (Galveias/Campo Pequeno) o meu livro “Marcello e Spínola; a Ruptura; As FA.s e a Imprensa na Queda do Estado Novo Portugal 1973-1974, que tinha sido o meu trabalho de fim de curso. Tal ocorreu há já quase 16 anos.

- Agradecimento a todos os presentes …

Questões Prévias

Antes de entrar propriamente no conteúdo do livro que hoje é alvo de debate nesta tertúlia, quero referir três questões prévias.

A primeira tem a ver com a data em que, por coincidência, hoje nos encontramos (3.ª 3.ª feira do mês).

Como devem estar recordados em 16 de Março de 1974 (já lá vão 36 anos), verificou-se a arrancada frustrada da coluna das Caldas da Rainha, para Lisboa, esperando que outras Unidades do Norte do País o fariam igualmente. Alguns dos envolvidos estão aqui presentes…

Lembro que no ano passado decorreram igualmente neste concelho de Oeiras, mas em Carnaxide, localidade onde resido, algumas conferências sobre o 16 de Março e o 25 de Abril, por altura do 35.º aniversário do golpe de Estado, que derrubou o regime de Marcello Caetano.

A primeira dessas sessões foi um tanto agitada, porque elementos ligados ao Presidente da Associação 25 de Abril quiseram pôr em causa o comando daquela coluna pelo Coronel Armando Ramos; no entanto julgo que além do testemunho do próprio, o Coronel Silva Carvalho e o Major Caetano Barros, oficiais que seguiam na frente dessa tropa e lá presentes, desmascararam uma manipulação, que tem vindo a ser feita ao longo dos anos.

A segunda questão diz respeito à sessão anterior, no passado mês de Fevereiro, em que interveio o Coronel David Martelo, a propósito da sua obra “Mágoas do Império”, publicada em 1998, cinco anos antes deste meu trabalho.

Na resposta à questão que lhe colocara sobre o período de transição pós 25 de Abril, veio ler o que transcreveu de obras do General Pezarat Correia, onde este apenas salientou o sucedido em Angola, antes e depois da independência, onde confirmava ter sido dramático para Portugal, mas nomeadamente para aquele território, depois a braços com uma guerra civil de cerca de duas dezenas de anos.

Terá ocorrido algum erro de comunicação entre nós, pois o que eu lhe tinha pedido era um comentário sobre a actuação deste oficial nos meses em que lá permaneceu, até Dezembro de 1974, como braço direito do Almirante Rosa Coutinho. Faço este reparo porque, na minha opinião, Pezarat Correia, nos trabalhos que publicou posteriormente, viria apenas a descrever a sua versão, não assumindo, no entanto, a parte da responsabilidade da sua controversa intervenção directa no processo.

A terceira questão tem a ver com uma colaboração que recentemente dei na coordenação de um livro a sair em Maio próximo, na Fundação Gulbenkian, sobre a invasão da Índia em 1961, e que foi conduzida pelo nosso amigo e camarada Manuel Barão da Cunha.

Quando houve a necessidade de recolher um depoimento do Coronel Alexandre Lousada, que estivera naquele território nos anos 50, acabei por completar aquilo que escrevera sobre o acordo de Lusaka, de 7 de Setembro de 1974, no meu livro “Combater em Moçambique – 1964-1975 – Guerra e Descolonização”, hoje alvo de debate neste encontro.

É que este oficial, sendo um dos elementos que estiveram em Lusaka para assinar o acordo com a FRELIMO, acabaria por ser o único a enfrentar a ira de Samora Machel ao saber da sublevação da colónia branca, que estava a ocorrer nesse dia, 7 de Setembro, em Lourenço Marques. E isto sucedeu assim, porque ele apenas seguiria mais tarde directamente para Moçambique, enquanto os outros elementos já tinham partido para Lisboa. Como se devem lembrar, participantes e subscritores do Acordo de Lusaka eram: o Dr. Mário Soares, o Dr. Almeida Santos, o então Major Melo Antunes, os Comandantes Vítor Crespo, e Almeida e Costa, o Major Casanova Ferreira, e o Dr. Antero Sobral.

A actuação do Coronel Alexandre Lousada, que me referiu sumariamente, encontra-se descrita no Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa, de Janeiro/Dezembro de 2008, num artigo do Eng.º Monteiro da Silva, ex-administrador da gasolineira Sonap de Moçambique, completado com os comentários do General Sousa Menezes, então Comandante Militar, no período de transição. Assim, por coincidência acabei por aumentar o meu conhecimento sobre este caso e que tratara no referido trabalho, “Combater em Moçambique”

E, depois desta achega, que já tem a ver com o tema proposto, limitar-me-ei a destacar mais alguns aspectos, que poderão ser controversos e até episodicamente continuam a ser alvo de debate na Internet.

São eles a morte do líder e fundador da FRELIMO, Eduardo Mondlane, em 3 de Fevereiro de 1969, na Tanzânia, e o caso do assalto ao navio Angoche, na costa Norte de Moçambique, na noite de 23 para 24 de Abril de 1971.

Mas ainda antes deste dois casos chamo atenção para um outro aspecto também contemplado no meu livro, a propósito do já referido 7 de Setembro de 1974. Isto no intuito de avançar com pistas para os futuros investigadores.

Na minha opinião, além dos dois 7 de Setembro (Lusaka e Lourenço Marques), considerados por Freire Antunes no seu livro “Jorge Jardim; Agente Secreto”, e face a dados colhidos posteriormente, acrescentarei a minha perspectiva sobre acontecimentos previstos naquela época para esse mês de Setembro.

Assim existiria um planeamento de golpes para ser executado em Moçambique e Angola, respectivamente em 16 e 21 de Setembro, e que culminariam com o 28 de Setembro em Portugal. O objectivo seria travar a imediata entrega do poder apenas aos movimentos de libertação, como estava a ser negociado, em Moçambique, por Melo Antunes.

Este plano, que tinha sido referido por Rosa Coutinho numa entrevista que me deu para o meu livro “Equívocos e Realidades (1999), onde se limitou a reafirmar as informações recolhidas naquela altura (fins de Agosto, princípios de Setembro de 1974). Tal projecto já ele denunciara num colóquio do 10.º aniversário do 25 de Abril, promovido pela Associação 25 de Abril, na Fundação Gulbenkian, sem qualquer desmentido posterior.

Ainda sobre este caso lembro que quando entrevistei o meu amigo Coronel José Pais (já falecido) para aquele trabalho, ele considerou tal projecto como aceitável, face aos dados que dispunha e às pessoas envolvidas: Eng.º Sousa Machado, gerente da Companhia Mineira do Lobito, Carlos Vieira da Rocha, presidente da SHIP e muito ligado ao General Spínola, Viana Rebelo e o Coronel Santos e Castro. Como estarão recordados este oficial, mais tarde, comandaria uma coluna em direcção a Luanda e a quem elementos afectos aos EUA retiraram o comando, após o negócio da exploração do petróleo de Cabinda com o MPLA, que continuava instalado na capital depois da expulsão dos outros dois movimentos (FNLA e UNITA).

E José Pais teve uma reunião com estes elementos em Lisboa, na 1.ª semana de Setembro. Desse encontro resultou o embarque para Angola de um ex-militar “comando” (o meu ex-Alferes Marques Aparício), que pouco tempo depois acabaria por fugir deste território, escoltando até à fronteira o então Alferes Mil.º Jaime Nogueira Pinto e a esposa Maria José, por ele ter sido alvo de um mandado de captura…

Curiosamente, ainda há poucos meses tive a confirmação de que esse projectado plano em relação a Angola tinha sido comunicado por Vieira da Rocha a Altino de Magalhães, então nas funções de comandante militar de Angola.

Assim a versão de que o 7 de Setembro poderá ter sido provocado para evitar a viabilidade de tais golpes, a iniciar nove dias depois, também poderá ser “aceitável”. Lembro que o despoletar da acção que levou à ocupação do Rádio Clube de Moçambique foi originada por uma viatura, que atravessou a cidade de Lourenço Marques, levando a Bandeira Nacional a arrastar pelo chão.

Recorde-se também que apesar das insistências de António Champalimaud e outros elementos dos movimentos moçambicanos brancos, o Eng.º Jorge Jardim manteve-se de fora de tal tentativa frustrada. Talvez ainda não tivesse perdido a esperança de vir a dialogar com a FRELIMO de Samora Machel.

São os dados sobre este tema, que considero de interesse deixar aos futuros investigadores.

Outros Casos Controversos

Em relação à morte de Eduardo Mondlane, pode-se verificar num site moçambicano (//macua.) que continuam a existir grandes polémicas sobre a intervenção de elementos da FRELIMO no atentado que o vitimou.

Foi lançado no mês passado, em Lisboa, o livro “Eduardo Mondlane -. Um Homem a Abater”, resultado de uma tese de doutoramento do Dr. José Manuel de Jesus. Nele são repescadas as informações sobre ligações de uma rede de extrema-direita ao atentado, já indicadas no meu livro.

No entanto este professor julgo que não faz referência ao testemunho de Óscar Cardoso, ex-Inspector da DGS, que tanto a mim, nos “Equívocos e Realidades” como a Bruno de Oliveira Santos (“Histórias Secretas da PIDE/DGS”/2000), confirma como sendo o autor material da encomenda-armadilha, o Inspector Casimiro Monteiro, que já tinha morto o General Humberto Delgado. Este testemunho é de certo modo fidedigno, pois ambos trabalhavam para os sul-africanos e Óscar Cardoso foi das últimas pessoas a estar com Casimiro Monteiro antes de falecer.

Curiosamente este inspector, no livro de Oliveira Santos, afirma textualmente:

“(…) A carta armadilhada que provocou a morte de Eduardo Mondlane foi preparada pelo Casimiro Monteiro, que era de facto um grande especialista em explosivos. Mas o Casimiro Monteiro não agiu sozinho; teve a colaboração do chefe de segurança de Mondlane, o Joaquim Chissano, actual Presidente de Moçambique. Portanto esse trabalho foi feito com a própria FRELIMO, que estava muito interessada em eliminar Mondlane.”

Caso Angoche

Um outro tema que tem sido abordado de maneira diferente ao longo dos anos foi o assalto ao navio Angoche. As famílias dos tripulantes têm andado, até mesmo depois do 25 de Abril, a fazer as mais diversas diligências, para tentar apurar o ocorrido naquela noite de 23 para 24 de Abril de 1971 e o que sucedera aos seus familiares.

Até no lançamento deste livro (Maio de 2003, em Lisboa) fui abordado pela viúva do comandante Bernardino, na tentativa de saber o que se passara com os tripulantes.

Na minha opinião, como deve ter sido uma retaliação clandestina contra Moçambique por parte das autoridades tanzanianas, com o apoio da URSS (utilizando um submarino) e do PCP, por meses antes, numa operação igualmente clandestina, elementos portugueses e sul-africanos terem liquidado uns tantos pescadores e afundado um navio de pesca daquele país, percebe-se que ninguém tenha querido esclarecer o sucedido. E até tenham lançado pistas falsas, como a FRELIMO ser acusada de ter levado os tripulantes para a Tanzânia e onde permaneceriam num campo de prisioneiros. E estas notícias não foram desmentidas pela outra parte. Julgo que até terão convencido o Dr. Mário Soares a fazer diligências junto dos tanzanianos, a seguir ao 25 de Abril, para os encontrar.

Quem, em relação a este assunto, ler no meu livro o depoimento do Comandante Sérgio Zilhão e o do jornalista Martinho Simões, no livro “Jorge Jardim; Agente Secreto” de Freire Antunes, perceberá que, de facto, tratou-se de uma retaliação em relação à referida operação clandestina, meses antes. Orlando Cristina, entretanto mandado assassinar pela polícia secreta sul-africana e participante nessa operação (utilizando igualmente um submarino) é que contou àqueles elementos, ligados a Moçambique e a ele próprio.

E lendo, sobre o mesmo assunto, o depoimento do ex-Inspector Óscar Cardoso, no livro de Bruno Oliveira Santos (“Histórias Secretas da PIDE/DGS”, consegue-se aclarar a versão que atrás adiantei.

Afirma Óscar Cardoso:

“(…) Quem fez explodir os hélis de Tancos, fez explodir no Angoche. É que as duas explosões foram provocadas pelo mesmo tipo de explosivo e do mesmo lote.

“Nós tínhamos um laboratório de polícia no 3.º andar da António Maria Cardoso e que era dirigido pelo Dr. Carlos Veloso, que ainda é vivo. (…) Concluiu-se que as duas acções foram realizadas com o mesmo lote de explosivos. É evidente que o processo do Angoche desapareceu sem deixar rasto. (…)”

Se combinarmos estas declarações com as que Óscar Cardoso fez numa entrevista que me deu em 1996 (in “Equívocos e Realidades; Portugal 1974-1975), ficará mais claro o puzzle.

Afirma ele: “Nós estávamos convencidos de que estava envolvido o PCP, a URSS e alguns oficiais de Marinha e, nomeadamente o Vítor Crespo. A acção teria sido feita com um submarino soviético (os tanzanianos não tinham submarinos) (…)”.

E quando lhe coloquei a questão da retaliação respondeu:

“A Tanzânia não tinha capacidade para uma retaliação deste género. A sua posição seria de apoio à operação feita pela União Soviética/PCP.”

Vou terminar com a apreciação deste caso feita pela historiadora Dalila Cabrita Mateus, no seu livro “A PIDE/DGS na Guerra Colonial; 1961-1974”.

Esta autora, que se baseia nos arquivos da PIDE/DGS, existentes e restantes na Torre do Tombo, (onde eu também lá andei para o mesmo efeito) – recorde-se que elementos afectos ao PCP levaram cerca de 700 Kg destes arquivos para a URSS – vem apresentar uma versão um tanto estranha…

A certa altura afirma: “A PIDE/DGS não consegue descobrir o autor (ou autores) da sabotagem. Acusa então os «suspeitos do costume», neste caso a ARA e a FRELIMO.”

E mais à frente, depois de se referir às declarações de Óscar Cardoso, constantes do meu livro, e de considerar improvável a autoria da ARA/PCP, afirma:

“O mais provável é, pois, que a acção contra o Angoche tenha sido realizada por um qualquer franco-atirador. (…) numa óptica estritamente político-militar, tal acção constituiu um rotundo fracasso. Por um lado porque se limitou a atingir civis inocentes. Por outro lado, porque deixou perfeitamente intactas as armas e as bombas transportadas pelo navio.”

E por aqui me fico. Muito obrigada pela vossa atenção.

Depois destas pistas aqui lançadas estarei à disposição dos presentes para responder às perguntas que desejarem fazer e que eu souber ou me lembrar…

Oeiras, 16-3-2010

Cor. Manuel A. Bernardo

PS:

1. O Cor. Virgílio Varela que, no 16 de Março de 1974, ficou a comandar o Reg. Inf.ª das Caldas da Rainha, aquando da saída da coluna em direcção a Lisboa, tal o Cor. Casanova Ferreira, ambos presentes nesta tertúlia, confirmaram que o comandante dessa coluna foi o actual Cor. Armando Marques Ramos.

2. Informo que irei remeter este texto acabado de ler, à referida historiadora Dalila Mateus e ao Professor José Manuel de Jesus, autor do livro sobre Eduardo Mondlane, para eles o poderem confrontar com os seus dados.

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