Vale mencionar que o romance, quando surgiu e divulgou-se ...



PADRE LOPES GAMA E O ROMANCE NO BRASIL

Hebe Cristina da Silva - Bolsista FAPESP – Mestrado IEL/UNICAMP

A ascensão do romance moderno na Europa setecentista ocorreu paralelamente ao surgimento de inúmeras discussões a respeito do gênero e da pertinência de sua leitura.[1] Conforme observa Márcia Abreu,

Proliferaram, nos séculos XVIII e XIX, textos teóricos e críticos, os quais se dividiam em duas posições extremas: identificar os defeitos estruturais dos romances e condenar os perigos que sua leitura representaria ou exaltar a “nova forma e glorificar as virtudes que dela adviriam. [...]

A leitura de romances traz à baila discussões de natureza ética, religiosa e intelectual, tanto mais acaloradas quanto mais se percebe a disseminação do gênero e sua influência sobre os leitores.[2]

Resumidamente, argumentou-se que o romance não era um gênero nobre, corrompia o gosto artístico e aviltava a moral:

Eu os vejo como um divertimento inocente, desde que se lhes dedique apenas algumas horas quando se deseja relaxar. Mas serão horas verdadeiramente perdidas aquelas que lhes forem dedicadas em detrimento dos estudos mais sólidos. A perda de tempo nem sempre é o maior perigo oriundo dos maus Romances. Neles, estragamos o gosto, criamos falsas idéias de virtude, encontramos imagens obscenas, sujeitamo-nos sem perceber; e nos deixamos amolecer pela linguagem sedutora das paixões, sobretudo quando o autor soube emprestar-lhes as cores as mais graciosas.[3]

Deve-se tanto cuidar nos livros que uma senhora lê quanto das suas companhias: pois, se se concede que a escuta freqüente de conversas licenciosas prepara naturalmente a mente para a aceitação de idéias corrompidas, não se pode negar que os livros nos quais o amor é o único tema e as intrigas amorosas a única ocupação dos atores sejam mais perigosos até mesmo que as más companhias, já que a narração de cenas lascivas poderia chocar os ouvidos ainda não endurecidos pelo vício, quando a representação ardente pintada num romance, e lida na privacidade do retiro, não pode deixar de excitar desejos e deixar vestígios impuros na memória.[4]

A opinião de que o romance era um “divertimento inocente”, aparentemente favorável a ele, traz fortes restrições: não é uma “literatura séria” e a “inocência” não é uma característica inerente ao gênero, podendo desaparecer caso se dedique muitas horas à sua leitura. O fragmento é bastante ilustrativo, trazendo vários dos argumentos utilizados na época com vistas a vetar a leitura de romances: a questão da utilidade (a leitura de romances seria uma perda de tempo), a questão estética (a leitura dessas obras estragaria o gosto) e a questão ética (os romances atentariam contra a virtude das pessoas, pervertendo a moral e os bons costumes). O argumento moral aparece em vários textos, parecendo ser um dos mais fortes; no segundo fragmento, temos a idéia de que o romance perverteria as senhoras tanto quanto ou mais que as más companhias, pois as cenas lidas ficariam gravadas na mente com mais facilidade.

Nem todos, entretanto, viam com maus olhos o novo gênero, já que muitas vozes levantaram-se para defendê-lo:

Como resposta aos críticos que acreditavam que a leitura dos romances conduzia ao pecado, os defensores do gênero tomaram o problema tal como formulado por eles – as narrativas promovem a identificação do leitor com as vidas dos personagens – mas inverteram o modo de avaliar tal situação. Enquanto os detratores atinham-se ao pecado que consistia imaginar-se no lugar de alguém que saía dos trilhos da virtude, os entusiastas dos romances viram aí um fato positivo pois, ao invés de conduzir ao erro, essa experiência ensinaria como evitá-lo, fazendo com que os leitores não tivessem que se equivocar em suas próprias vidas.[5]

Uma das vozes eloqüentes na defesa do romance foi a do polêmico Marquês de Sade que, ao defender o gênero, fala da sua utilidade e das características intrínsecas que poderiam beneficiar imensamente seus leitores:

Sendo o romance, se é possível exprimir-se assim, o quadro dos costumes seculares, para o filósofo que quer conhecer o homem, ele é tão essencial quanto a história, pois o cinzel da história só grava o que o homem deixa ver, e, então, já não se trata mais dele. A ambição, o orgulho, cobrem sua fronte com uma máscara que nos representa apenas essas duas paixões, não o homem. O pincel do romance, ao contrário, capta-o no interior... pega-o quando ele retira sua máscara, e o esboço bem mais interessante, é também mais verdadeiro: eis a utilidade dos romances.[6]

Percebe-se a concepção de que o romance tinha a característica peculiar de tematizar o homem em toda sua plenitude, possibilitando sua melhor compreensão porque captava seu interior, nem por isso deixando de ser verdadeiro. Diderot, leitor apaixonado de romances e admirador de Richardson, utilizou-se de uma linha argumentativa semelhante para defender o gênero, cuja abundância de detalhes propiciaria ao leitor a intimidade com as personagens e a possibilidade de sentir o impacto das experiências narradas[7]. Para ambos, a leitura de romances consistia numa experiência que de certa forma superava o contato com a realidade.

O apelo para o caráter real das narrativas também era uma forma de defender o gênero da acusação de ser mero produto da fantasia e de distanciá-lo do romance romanesco[8]. Os elementos que permitiram diferenciar romance moderno e romance romanesco possivelmente foram fixados em 1785, por Clara Reeves, com a publicação de The Progress of Romance:

Clara Reeves elaborou uma definição para o romance moderno que se repetirá com exaustão: uma narrativa, centrada na vida real, próxima do leitor no tempo e no espaço, que trata de coisas que podem acontecer a qualquer um em sua vida cotidiana, escrita em linguagem comum, elaborada de forma a convencer o leitor de que a história relatada realmente aconteceu e de modo a provocar reações de identificação, fazendo aquele que lê colocar-se no lugar do personagem e com ele sofrer ou se alegrar. Clara Reeves relegou a carga pejorativa associada ao termo fabuloso (mentiroso) aos romances romanescos[...][9]

No Brasil, aparentemente o romance chegou desacompanhado dessas discussões.[10] Elas parecem não ter existido nos periódicos criados no início do XIX, assim como as histórias literárias não mencionam a existência de polêmicas desse teor. No período colonial, Márcia Abreu localizou apenas um texto que aborda a leitura de romances: um comentário sobre a tradução para o português do romance Atala ou os Amantes do Deserto, publicado em 1812 pelo Correio Braziliense ou Armazén Literário:

A imensidade de novellas que se tem publicado durante o século passado, e neste, a insipidez, inutilidade, e muitas vezes depravação destas publicaçoens, tem feito characterizar esta sorte de composiçoens, como uma leitura somente propria de espiritos frivolos, e como um emprego inutil, quando naõ seja de consequencias funestas á moral do leitor. Naõ entram porém nesta classe as novellas fundadas em principio da verdadeira moral, e tendentes a inspirar no leitor as maximas de prudencia, e as regras de conducta, que se incluem nas paridades, e emblemas, que divertindo o espirito, formam o entendimento, e regem o coraçaõ. Taes saõ um Telemaco, um Feliz independente do mundo e da Fortuna; e tal he a Atala.[11]

Note-se que no meio de tantos livros destinados a “espíritos frívolos”, os que se salvam, segundo o autor, são aqueles fundados na moral. Vemos, então, o eco de uma das principais questões que aqueceram o debate acerca do gênero romanesco na Europa: a questão da moral. No entanto, o texto não generaliza a característica da “depravação” a todos os romances, já que chega mesmo a citar alguns que podem “inspirar no leitor as máximas de prudência e as regras de conducta”. O autor, portanto, não é contrário ao gênero em si, mas a algumas obras.

Ao longo do século, algumas poucas vozes levantaram na imprensa argumentos contrários ao romance como gênero, ecoando argumentos utilizados pelos europeus, como no texto acima. Uma voz bastante eloqüente nesse sentido foi a do Padre Lopes Gama[12] (1793-1852), responsável por O Carapuceiro – Periódico sempre moral e só por accidens político, publicado no Recife pela primeira vez em 1832, o qual é definido por ele como “...um periódico que se dirige a corrigir os vícios ridículos.”[13]. Semelhante definição justifica a presença de inúmeros textos com teor moralizante em que critica os costumes da sociedade sua contemporânea.

As queixas de Lopes Gama quanto ao romance referem-se à inutilidade de sua leitura, principalmente para as mulheres, à corrupção da língua portuguesa como fruto das traduções dos romances europeus e, enfaticamente, à imoralidade que, ao seu ver, estava presente nessas obras e que, como uma espécie de vírus, contaminava toda a sociedade:

Em que se há de entreter esta santinha a noite inteira? Oh, essa é boa! E para que se compuseram as Mil e uma noites, os Mil e um quartos de hora, as Adelaides, o Menino da selva, as Joaninhas, e tantas novelas, cuja nomenclatura talvez exceda às bibliotecas do Vaticano e do Escorial? Em ler esses bons mestres de moral, na aquisição dessas idéias eróticas entretém-se a menina (muito proveitosamente) até meia-noite, hora da ceia, e daí para a cama. Em que se ocupa esta senhora toda a sua vida? Em nada. Pois não sabe coser, nem bordar, nem remendar? Nada disto: nunca tais grosserias lhe ensinaram. Saberá ao menos fazer torcida? É boa pergunta essa. Torcidas só fazem escravas, ou gente miserável. E sendo tão versada em novelas sentimentais, terá adquirido a habilidade de fazer charadas? Talvez que alguma mademoiselle Brumont lha tenha ensinado.[14]

O tom irônico denuncia a futilidade das mulheres que, ao ver do autor, não aprendiam tarefas necessárias e possivelmente cabíveis ao seu sexo, as quais lhes tornariam aptas para cuidar da casa, pois as julgavam “grosserias”. Tal quadro seria agravado pelo passatempo que as agradava: a leitura das novelas, das quais elas absorviam somente “idéias eróticas”. Insinua-se, assim, que tais mulheres nada sabiam de útil e prático, tendo sua vida e suas idéias resumidas ao conteúdo imoral que absorviam da leitura intensa de romances. É notável, no trecho, a colocação do autor referente à abundância de romances: a seu ver, os títulos excediam à biblioteca do Vaticano e do Escorial, o que indica a presença marcante de romances no país na década de 1830. A essência dessas queixas permanece nos textos que publicou na década seguinte, como podemos ver nos seguintes fragmentos:

As nossas meninas, geralmente falando, recebem uma educação meramente sensual. Todo o desvelo dos pais limita-se a fazê-las aprender a música, o piano, danças de todas as castas, a coser e bordar, ler e escrever, e a infundir-lhes nos tenros coraçõezinhos todo o gênero de vaidades. [...] O seu único recreio espiritual é a lição do imenso armazém das novelas. Perguntai-lhes pela história da criação do mundo, da queda de nossos primeiros pais, do dilúvio, da vocação de Abraão, da lei escrita, da vinda do Redentor, da sua vida, da sua paixão, morte e ressurreição, da vinda do Espírito Santo, da missão dos apóstolos, da miraculosa propagação do cristianismo, dos santos preceitos, dos sublimes conselhos do Evangelho etc. etc. Elas tudo ignoram, mas falai-lhes na Joaninha, na Adelaide, no Menino da selva, em Mil e uma noites, em Mil e um quarto de horas etc. etc., e pasmareis da sua erudição no gênero importante das novelas.

Com tais elementos nada deve admirar do que vai pelo nosso Brasil. Uma filosofia toda sensual tem-se embebido nos corações de uma grande parte de nós. Só aspiramos a gozos materiais, e daqui a razão suficiente da nossa tão geral imoralidade.[15]

Não sou do número daqueles que, supondo o belo sexo incapaz de grandes combinações intelectuais, ousam dizer que o maior talento de uma mulher apenas chega para arrumar bem um baú de roupas. [...] Já se vê, pois, que não reprovo, antes estimo, que se dê às mulheres a devida instrução, sem nunca perder de vista o respeitável mister, para que as destinou a natureza. Se eu fôra consultado por algum pai a respeito da educação literária de sua filha, eu lhe propuzera o seguinte programa. Antes de tudo, cumpre que a menina aprenda com clareza e método os rudimentos da religião. O estudo da própria língua parece-me, não só útil, senão indispensável [...]A menina deve também estudar a geografia, a história sagrada, alguma cousa da universal e com mais miudezas a história do seu país. Aprenda a música e o desenho; a respeito da dança, só tanto quanto seja bastante para dar garbo e airosidade ao corpo, exceto se a destinam para bailarina de teatro. Não faltam bons livros em que a menina se instrua ou recreie, e por isso não cessarei de reprovar a leitura das novelas. Estes livros são pela mor parte fúteis, e quase cifram-se em intrigas amatórias e, conseguintemente, são uma peste, são venenos, que em vasos de ouro se propinam à mocidade.[16]

No primeiro fragmento, datado de 1840, temos novamente a presença do argumento moral contrário à leitura de novelas, dessa vez associado ao argumento de que, devido à preferência por esse gênero, as mulheres desligavam-se da religião, não sabendo absolutamente nada a respeito da história sagrada. A presença dessa educação vista por ele como meramente sensual seria a causa maior da imoralidade que, a seu ver, perpassava toda a sociedade. Quatro anos depois, reincidem os argumentos contrários aos romances. Em um discurso que aparentemente tenta redimi-lo da imagem de alguém que menospreza a inteligência feminina, Lopes Gama louva a iniciativa de proporcionar-se educação às mulheres e sugere um roteiro de leituras que poderiam colaborar para o desenvolvimento pleno dessas habilidades inatas: primeiramente a leitura religiosa, seguida do estudo da língua e de geografia, história, música, desenho e dança. Veta, enfaticamente, a leitura dos romances, “livros fúteis” que eram um “veneno” para a “mocidade”.

Nesses textos, nota-se a luta de Lopes Gama contra a leitura de romances através da denúncia de seu conteúdo prejudicial à moral e atentatório à religião, ecoando as queixas feitas ao gênero em sua fase inicial por alguns europeus. Em outros textos, porém, essa condenação aparece baseada em argumentos ligados à situação especificamente brasileira. Para ele, a leitura de romances estrangeiros estava vinculada ao hábito dos brasileiros de tentar imitar os europeus, principalmente os franceses, algo que prejudicava a nação porque impedia seus habitantes de valorizarem tudo o que era nacional:

O que nos falta é melhor juizo para sabermos apreciar o que é nosso, e não querermos em tudo e por tudo, ser caturras dos franceses. O que nos falta é haver, quem faça instruir, antes de tudo, a nossa mocidade em a língua nacional; porque aquele que ignora inteiramente a sua própria língua, que desconhece o seu caráter, a sua índole, suas propriedades, seus idiotismos, nem sabe capazmente as estranhas, em sabe coisas que preste.[17]

Note-se a preocupação nacionalista do autor, que se mostra incomodado com o fato de seus compatriotas não se saberem apreciar o que era brasileiro. Essa postura indicava, a seu ver, a falta de um “melhor juízo”, o qual poderia ser obtido através do aprendizado da língua nacional, concebido como um bom caminho para resolver esse problema. Muitas de suas queixas referem-se à questão da língua, pois acredita que os brasileiros se preocupavam primeiramente em aprender idiomas europeus, deixando de cultivar a língua portuguesa e corrompendo-a devido ao seu mal uso. Além disso, as pessoas estariam tendo predileção pelo francês ou mesmo pelo uso de um português afrancesado:

D. MARIPOSA:

Olhe, amável primo: se eu fôra deputada e legislativa, propunha a indicação para que fôsse proscrita a língua portuguêsa ou, pelo menos, que só se falasse português afrancesado.

TÍTERE:

Êle não é preciso que haja disposição legislativa ad hoc; as novelas, as traduções e os periódicos vão-nos fazendo êsse importante serviço.

D. MARIPÔSA:

Então, estou eu bem, que já tenho lido para mais de seis mil novelas. Sim, sim: novelas e quadrilhas hão de felicitar a espécie humana.[18]

O autor carrega a crítica à desvalorização da língua nacional criando uma personagem cujo desprezo pela língua portuguesa é tamanho que a leva a expressar o desejo de que ela não fosse mais utilizada no país ou que apenas se tolerasse seu uso mediante a mistura com o francês. Seu interlocutor dá-lhe a notícia de que tal desejo estava se fazendo realidade no país através das “novelas, traduções e periódicos”, o que a deixa imensamente feliz, já que era leitora assídua de “novelas” e estava, portanto, em consonância com as mudanças que ocorriam na sociedade. Nesse contexto, os romances estrangeiros eram maléficos não só pela ação perniciosa à moral e à religião, mas também ao idioma, visto que suas traduções colaboravam para a corrupção deste, pois estavam impregnadas de “francesismos”:

A mania das traduções, mormente de novelas, tem acabado de estragar a língua portuguesa. É indubitável que as línguas bem como as pessoas têm sua fisionomia própria e que a elocução varia na razão da índole e caráter de cada uma. Todos sabem que o francês em sua composição é monótono, não admitindo senão raras transposições. [...] Mas o que é que praticam pela maior parte os nossos tradutores de novelas francesas? Não fazem mais do que trasfegar, se assim me posso exprimir, os vocábulos franceses tais e quais para o português, assim pelo modo por que nas tipografias os tipos passam dos componedores para as galés. E o resultado é sair uma composição toda afrancesada e completamente ridícula.[19]

O autor acredita que as línguas tinham fisionomias próprias que deviam ser respeitadas; o francês, especificamente, seria “monótono” e possuiria características que não poderiam ser transpostas em traduções. Diante dessa dificuldade, os tradutores brasileiros incorporavam alguns termos franceses, gerando composições que considera “ridículas”. Assim, a corrupção do idioma nacional, fruto da falta de estudo da mesma pelos brasileiros, era completada pela circulação de obras em que prevalecia um “português afrancesado”.

Com base nas considerações de Lopes Gama, temos a imagem do Brasil como um país cujos habitantes buscavam “macaquear” os europeus, principalmente os franceses, o que os levava a desvalorizar as produções nacionais. Um fato que atestava essa postura era o modo como lidavam com o idioma nacional, o qual não era estudado com o devido afinco e era preterido em pról do aprendizado de línguas estrangeiras, o que fazia com que corrompessem a língua devido ao seu mau uso. A importação de romances estrangeiros ou a tradução dos mesmos colaborava para “estragar” a língua e também lesava a sociedade em outros âmbitos, já que utilizavam uma linguagem afrancesada para veicular idéias imorais.

Num contexto pós-Independência, essas considerações eram muito intrigantes. Afinal, um país recém-independente precisava afirmar-se perante as demais nações e, para isso, era necessário valorizar suas peculiaridades e construir uma sociedade propícia ao desenvolvimento material e intelectual. Nesses quesitos, o Brasil estaria aquém das expectativas, já que, segundo as observações de Lopes Gama, seus habitantes eram pouco nacionalistas e cultivavam a imoralidade. Esse quadro “alarmante” era, em certa medida, agravado pela leitura de romances, o que justificaria o empenho do autor em condenar a leitura desses textos em muitas das “carapuças” que distribuiu ao longo da primeira metade do século XIX.

BIBLIOGRAFIA

ABREU, Márcia. O Caminho dos Livros. Tese apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas como parte da exigência para obtenção do título de Livre docente. Campinas: 2002.

GAMA, Lopes. O Carapuceiro: Crônicas de costumes. Organização Evaldo Cabral de Mello. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

___________. Textos Escolhidos por Luís Delgado. Rio de Janeiro: Agir, 1958. Nossos Clássicos, n.º 31.

MELLO, José Antônio Gonsalves de. O Carapuceiro: o padre Lopes Gama e o Diário de Pernambuco 1840-1845. Recife: FUNDAJ, Editora Massangana, 1996.

SADE, Donatien Alphonse François. “Nota Sobre Romances ou A Arte de Escrever ao Gosto do Público”. In: Os Crimes do Amor. Trad. Magnólia Costa Santos. Porto Alegre: L&PM, 2002.

VASCONCELOS, Sandra G. T. A Formação do Romance Inglês: ensaios teóricos, Tese de Livre-Docência apresentada à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. São Paulo: 2000.

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[1] Na Inglaterra, por exemplo, essas discussões tiveram berço nos prefácios e posteriormente ganharam espaço em periódicos, em revistas literárias e na correspondência de leitores. (VASCONCELOS, Sandra G. T. A Formação do Romance Inglês: ensaios teóricos, Tese de Livre-Docência apresentada à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. São Paulo: 2000, p. 98.)

[2] ABREU, Márcia. O Caminho dos Livros. Tese apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas como parte da exigência para obtenção do título de Livre Docente. Campinas: 2002, pp. 254/255.

[3] BRUZEN DE LA MARTINIÈRE. Introduction generale à l’étude des Sciences et des Belles Lettres, en faveur des personnes Qui ne saven que le François. La Haye: chez Isaac Beauregard, 1731, pp. 189-190. Apud ABREU, Márcia. Op. Cit., p. 257.

[4] “Character and Effect of Modern Novels”, London Magazine, 1773. Apud VASCONCELOS, Op. Cit., pp. 92-93.

[5] ABREU, Márcia. Op. Cit., p. 287.

[6] SADE, Donatien Alphonse François. “Nota Sobre Romances ou A Arte de Escrever ao Gosto do Público”. In: Os Crimes do Amor. Trad. Magnólia Costa Santos. Porto Alegre: L&PM, 2002, p. 46.

[7] DIDEROT, Denis. “Elogio de Richardson”. Apud: ABREU, Márcia. Op. Cit. Págs. 275 a 278.

[8] “A artilharia pesada dirigida contra a ficção se devia, segundo May, aos preconceitos estéticos e morais com que uma parte considerável da crítica encarava os romances romanescos, isto é, aqueles romances que, escritos ainda no século XVII, eram ridicularizados por aquilo que era interpretado como irrealismo e transgressão às regras do bom gosto e do bom senso. Durante praticamente toda a primeira metade do século XVIII, o romance, herdeiro dessa verdadeira cicatriza de origem, teria de se haver com seus opositores e críticos.” (VASCONCELOS, Sandra G. T. A Formação do Romance Inglês: ensaios teóricos, Tese de Livre-docência apresentada à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. São Paulo: 2000. Pág. 136).

[9] ABREU, Márcia. Op. Cit. Págs. 273/274.

[10] “As discussões críticas sobre o romance não parecem ter chegado ao Brasil – ao menos não há referência a qualquer dos escritos envolvidos na polêmica a favor e contra o novo gênero nos pedidos de autorização para a entrada de livros na cidade. Tampouco houve debates dessa natureza nos periódicos criados na cidade a partir de 1808.” (ABREU, Márcia. Op. Cit., p. 288)

[11] “Portugal. Atala ou os amantes do deserto, a armonia da religiaõ Christaã com as scenas da natureza, e paixoens do coraçaõ humano. Lisboa. 1810. 1 vol. em 12. p. 157.” Correio Braziliense ou Armazem Literario. Londres: W Lewis, Na Oficina do Correio Braziliense, St. John Square, Clerkenwell, outubro 1812, p. 590. Apud ABREU, Márcia. Op. Cit., p. 289.

[12] Nasceu em 29 de setembro de 1871 no Recife, filho do cirurgião João Lopes Machado e de D.ª Ana Bernardo Lopes Gama. Em 1805 entrou para o Mosteiro de São Bento em Olinda, onde fez os primeiros estudos para, em 1807, ingressar na Ordem Beneditina no Mosteiro da Bahia, onde professou no ano seguinte. Em 1815 submeteu-se a exame para pregar no Mosteiro da Graça; em 1817 foi nomeado lente de Retórica do Seminário, sendo confirmado no cargo por Carta Régia. Nos anos de 1822 e 1823 lançou O Conciliador Nacional (primeira fase) e foi nomeado diretor e redator do Diário da Junta do Governo. Em 1825, redigiu e dirigiu, a partir de outubro, o novo Diário de Pernambuco e reeditou o Conciliador Nacional. No ano seguinte, foi nomeado visitador das escolas públicas e professor de Retórica do Liceu, incumbindo-se também da direção desse estabelecimento, que deixou de dirigir no ano seguinte por achar-se doente. Em 1829, colaborou no Diário de Pernambuco e lançou O Constitucional, tendo no ano seguinte lançado O Popular. Em 1832, publicou A Columneida, poema satírico contra a sociedade Colunas do Trono e do Altar e iniciou a publicação de O Carapuceiro. Em 1834, secularizou-se, deixando a Ordem Beneditina. Entre 1835 e 1839 exerceu cargos como docente e, em 1840, chegou ao Rio de Janeiro para ocupar a cadeira de deputado, como suplente. Nesse ano, começou a publicar em O Carapuceiro na Corte no periódico O Despertador, tendo reeditado O Carapuceiro em 1842. Em 1844 e 1845, respectivamente, inicia as publicações de O Pernambucano e O Sete de Setembro. Em 1846 assumiu a cadeira de deputado por Alagoas e publicou, no Rio, Lições de Eloqüência Nacional, que teve uma segunda edição no Recife em 1851. Em 1847 foi novamente diretor do Curso Jurídico até 1850, quanto retornou ao Liceu e, no ano seguinte, foi nomeado diretor-geral dos estudos na província. Em 1852 foi ao Rio de Janeiro, onde colaborou na Marmota Fluminense. Faleceu nesse mesmo ano no Recife. (Fonte: GAMA, Lopes. Textos Escolhidos por Luís Delgado. Rio de Janeiro: Editora Agir, 1958. “Apresentação”.)

[13] GAMA, Lopes. “O nosso gosto por macaquear.” O Carapuceiro, 14/01/1840). In: O Carapuceiro: Crônicas de costumes. Organização Evaldo Cabral de Mello. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, pp. 346/347.

[14] GAMA, Lopes. “O Vadiismo” . O Carapuceiro, 17/06/1837. In: O Carapuceiro: Crônicas de costumes. Op. Cit., pp. 197/198.

[15] GAMA, Lopes. “A estultice do bumba-meu-boi.” O Carapuceiro, 11/01/1840. In: O Carapuceiro: Crônicas de costumes. Op. Cit., pp. 336/337.

[16] GAMA, Lopes. “As Mulheres Literatas.” O Carapuceiro, 20 de janeiro de 1844. In: MELLO, José Antônio Gonsalves de. O Carapuceiro: o padre Lopes Gama e o Diário de Pernambuco 1840-1845. Recife: FUNDAJ, Editora Massangana, 1996, pp. 61/62. (A obra traz um noticiário e uma coletânea de artigos do padre Miguel do Sacramento Lopes Gama publicados no Diário de Pernambuco.)

[17] GAMA, Lopes. “As Meninas nos Bailes, Partidas, etc.” O Carapuceiro, 24/02/1844. O Carapuceiro, 20 de janeiro de 1844. In: MELLO, José Antônio Gonsalves de. O Carapuceiro... Op. Cit., pp. 82/83.

[18] GAMA, Lopes. “Quadrilhas e Pedacinhos de Francês.” In: O Carapuceiro, 06 de abril de 1842. In: GAMA, Lopes. Textos Escolhidos. Op. Cit., p. 89.

[19] GAMA, Lopes. “A linguagem bordalenga de muita gente.” O Carapuceiro, 19/10/1842. In: O Carapuceiro: Crônicas de costumes. Op. Cit., pp. 427/428.

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