Cocriação de valor : uma perspetiva das agências de ...

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Cocria??o de valor: uma perspetiva das ag?ncias de viagens independentes

J O S E F I N A O L ? V I A M A R Q U E S G O D I N H O S A LVA D O * [ josefina.o.salvado@ ] A N A M A R I A A LV E S P E D R O F E R R E I R A ** [ amferreira@uevora.pt ] C A R L O S M A N U E L M A RT I N S DA C O S TA *** [ ccosta@ua.pt ]

Resumo | O atual ambiente competitivo alterou a l?gica da cria??o de valor, deixando de se centrar unicamente na `cadeia de valor', interna ? organiza??o, para tamb?m absorver inputs da `constela??o de valor' externa ? organiza??o. Por isso, o novo paradigma de neg?cio das ag?ncias de viagens independentes (AVI) deve ser redefinido, procurando o refor?o das rela??es win-win com os seus parceiros operadores tur?sticos (OT). O prop?sito deste artigo ? identificar os atributos da constela??o de valor destes parceiros de neg?cio e medir a import?ncia do relacionamento quanto ? cria??o de valor. Existe uma perce??o das AVI, de que os OT investem mais em estrat?gias ligadas ? efici?ncia dos seus processos internos e menos em relacionamentos com parceiros e em cocria??o de valor. Assim, o objetivo desta investiga??o ser? construir um mosaico de ideias que possam explicar a realidade de cria??o de valor entre os parceiros das AVI, os OT e mobiliz?-los no incremento de novas maneiras de cocriar valor, j? que esta tend?ncia nortear? a pr?xima vaga de crescimento e de produtividade, na economia global. Palavras-chave | Cocria??o, Valor, Ag?ncias de viagens, Constela??o de valor.

Abstract | The current competitive environment has changed the logic of value creation, shifting focus from value chain to value constellations. The purpose of the travel agencies corporations must be redefined, as creating shared value and reinforcing the Win-Win relationships between partners, not just think about profit per se. The new independent travel agencies paradigm should be based on discovering new ways to create value, through tour operators value constellation attributes, because a perception exists that tour operators focus their strategy in internal procedures, instead of independent travel agencies value co-creation. So, we will build several ideas to explain the reality of value creation between partners. This will drive the next wave of productivity growth in the global economy. Keywords | Co-creation, Value, Travel agencies, Value constellation.

* Doutora em Turismo pela Universidade de Aveiro. Professora Auxiliar do Departamento de Ci?ncias da Educa??o e Patrim?nio da Universidade Portucalense. ** Doutora em Turismo pela Universidade de Aveiro. Professora Associada da Universidade de ?vora. *** Doutor em Turismo pela Universidade de Surrey (Reino Unido). Professor Catedr?tico da Universidade de Aveiro.

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1. Introdu??o

O atual ambiente competitivo alterou a l?gica da cria??o de valor, deixando de se centrar unicamente na `cadeia de valor' (interna ? organiza??o) para tamb?m absorver inputs das `constela??es de valor', externas ? organiza??o conforme preconizaram Prahalad e Ramaswamy (2004) e Castells (1999). Por isso, a distribui??o tur?stica (DT), deve descobrir novas formas de gerar valor nos seus neg?cios, refor?ando rela??es win-win de parceria.

Porter e Kramer (2011) argumentam que uma grande parte do problema reside no interior das organiza??es, ao permanecerem presas a uma abordagem ultrapassada de cria??o de valor. Para elas, este conceito ? olhado de uma forma redutora, salientando apenas a performance financeira, perdendo assim a perce??o das necessidades dos clientes e de todos os fatores que podem influenciar o seu sucesso de longo prazo. Consideram que as empresas devem ser criadoras de valor partilhado e n?o apenas de lucro. Esta tend?ncia guiar? a pr?xima onda de inova??o e de crescimento da produtividade, na economia global.

O prop?sito deste artigo ser? discutir a import?ncia da cocria??o de valor na intermedia??o tur?stica (IT). Beaver (1993), Gee, Makens e Choy (1989), Holloway (1998), Laws (1997), Lickorish e Jenkins (2000) e Renshaw (1997) afirmam que existem dois grandes setores interdependentes dedicados ? IT: os OT e os agentes de viagens (AV). O foco ser? colocado no setor das ag?ncias de viagens independentes, onde se pretendem identificar os atributos da sua constela??o de valor e medir a import?ncia do relacionamento com os parceiros de neg?cio (OT).

Para ir ao encontro do objetivo deste artigo, efetuou-se uma primeira abordagem acerca do papel das AV na IT, seguindo-se a defini??o do conceito de cocria??o de valor e a sua aplica??o ao setor das ag?ncias de viagens independentes (AVI). Por fim, procedeu-se ? aplica??o do modelo de cria??o de valor percecionado (CVP) para as ag?ncias de viagens independentes e ? apresenta??o de um mosaico de ideias que podem explicar a realidade da gera??o de valor entre os parceiros, OT, e mobiliz?-los no incremento de novas maneiras de cocriar valor.

Fornecedor

Distribuidores

Intermedi?rios

Comp?s A?reas Hot?is Outros

Destinos

Presencial

GDS's DMS's

Operadores Tur?sticos

Agentes Viagens

TMC Agentes / Operadores

Especializados

Call Center

Websites Fornecedores

Mega Websites Viagem

Websites das Agencias Viagens

Tradicionais

Figura 1 | Modelo atual da distribui??o tur?stica (foco nos intermedi?rios).

Consumidores

Pacotes

Autocarro / Lazer

Corporativo

Outros

Internet Corporativa

Novos Canais PC's ITV Kiosks PDA's

Fonte: Adaptado de Lubbe (2000).

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2. O papel das ag?ncias de viagens na intermedia??o tur?stica

2.1. Principais players da intermedia??o tur?stica

Buhalis (2000, p. 114) sugere que "the principal role of intermediaries is to bring buyers and sellers together, either to create markets where they previously did not exist or to make existing markets work more efficiently and thereby to expand market size.". Portanto, atrav?s desta opini?o, ? reconhecida a import?ncia da DT na ind?stria do turismo. A figura 1 mostra uma complexa rede de players da moderna DT, na qual se inclui a intermedia??o tur?stica e os seus elementos constituintes, OT e AV.

Quanto ao primeiro agente de intermedia??o, o operador tur?stico, tem a fun??o de facilitar e ajustar as rela??es entre a oferta e a procura, contribuindo de forma complementar para o desenvolvimento tur?stico. ? assumido como um dos principais mediadores, pelo produto que elabora, pelo servi?o que presta, pelas marcas que cria, pela diversidade de experi?ncias que oferece, pelo financiamento que proporciona e pela especificidade que det?m. Podem ser considerados produtores ou grossista (ou organizadores ou organizador vendedor) quando desenvolvem processos de integra??o vertical e intermedi?rio tur?stico grossista quando se relacio-

nam com as ag?ncias de viagens, como parceiro de neg?cio criador de valor. De acordo com Salvado (2009, p.163) dos 70 parceiros fornecedores elencados, foram selecionados os `top 20' que laboram em Portugal, com destaque para a Soltour (11%), seguida quase no mesmo plano de import?ncia com 10%, o Mundo Vip, a Solplan e Iberojet, e com um peso de 8% a Nortravel, TAP, Soltr?pico, Sonhando, Travelplan, Transhotel, etc. V?rios destes fornecedores possuem sistemas de reserva, B2B (Business to Business), como ? o caso da Iberojet e da Transhotel, que disponibilizam o seu invent?rio ?s ag?ncias de viagens, para consulta de disponibilidade e efetuarem reservas.

Quanto ao segundo player da intermedia??o tur?stica, o agente de viagens ou retalhista (ou vendedor ou organizador e vendedor) a sua fun??o est? intimamente ligada ?s tend?ncias de crescimento do turismo e aos modelos da distribui??o. V?rias defini??es s?o propostas por distintos autores.

Em Portugal o exerc?cio da atividade de ag?ncia de viagens e turismo encontrava-se enquadrado nas disposi??es do Decreto-Lei n? 263/2007 de 20 de Julho, que foi modificado pelo Decreto-Lei n.? 61/2011, de 6 de Maio. Em 2011 alteraram-se as regras dentro do setor, devido ? transposi??o da Diretiva Bolkestein, com consequ?ncias no exerc?cio da atividade das ag?ncias de viagens, sobretudo ao n?vel da concorr?ncia e da sua rela??o com o mercado.

Quadro 1 | Defini??o de ag?ncia de viagens.

B?dard (2001)

Ag?ncia de viagens ? a empresa comercial que fornece presta??es de servi?os tur?sticos que envolvem uma rede de produtos, tais como: transportes, alojamento, aluguer de viaturas, restaura??o, todo o tipo de bilhetes, organiza viagens ? medida individuais ou coletivas, ou ainda, viagens organizadas pelos operadores tur?sticos e o agente de viagens.

Wahab (1991)

As ag?ncias de viagens ocupam uma posi??o de lideran?a na ind?stria do turismo por impulsionarem o ato de viajar, e t?m como finalidade realizar viagens, informar, organizar e tomar todas as medidas necess?rias, em nome de uma ou mais pessoas que desejam viajar.

Pelizzer (1989)

As ag?ncias de turismo podem ser tanto empresas produtoras de servi?os, quanto intermedi?rias, ou seja, comercializam servi?os produzidos por outros operadores tur?sticos.

Cunha (2003)

Uma ag?ncia de viagens exerce as atividades de organizar e vender viagens tur?sticas; efetuar reservas em meios de transporte e em empreendimentos tur?sticos; e fazer a rece??o e a assist?ncia de turistas no momento da viagem.

McIntosh, et al. (2002, citado por A ag?ncia de viagens funciona como um mediador, na medida em que liga o produtor ao consumidor tur?stico. Abranja, 2005).

Fonte: Elaborado com base em B?dard (2001), Cunha (2003), McIntosh et al. (2002, citado por Abranja, 2005), OMT (2001), Pelizzer (1989) e Wahab (1991).

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Goeldner e Ritchie (2006) indicam tr?s fun??es gen?ricas destes profissionais: a fun??o produ??o, a fun??o de assessoria e a fun??o de media??o. A fun??o de produ??o tem por base a prepara??o e organiza??o t?cnica das viagens e permite adquirir servi?os tur?sticos distintos, combinando-os, para obter um produto final diferente e mais complexo. ? o caso dos pacotes ou viagens combinadas, que conjugam dois ou mais servi?os diversos como alojamento, transporte, restaura??o, anima??o tur?stica, visitas, entre outros, que s?o oferecidas ao cliente final a um pre?o global pr?-estabelecido. A fun??o de assessoria corresponde essencialmente ? atividade de obter informa??o alargada e segura sobre os destinos e o processo da viagem, exigindo dos profissionais compet?ncias de comunica??o e prepara??o t?cnica e cultural que lhes permita efetuar todas as etapas dos processos de reserva. A fun??o de media??o consiste em colocar em contacto a oferta e a procura de produtos tur?sticos. Estamos a falar na a??o de intermediar os prestadores dos servi?os de alojamento, transporte, espet?culos, restaurantes, entre muitos outros, com os potenciais clientes.

2.2. Sistemas de intermedia??o tur?stica

O sistema tradicional de intermedia??o tur?stica assenta num modelo linear, onde produtos e servi?os se encaminham do fornecedor para o consumidor, direta ou indiretamente atrav?s de intermedi?rios, tais como os agentes de viagens. Para Kabbaj (2003, p. 1011), o tradicional modelo de distribui??o revela uma linearidade de processos e rela??es, pois "In a linear or sequential model such as this, each actor can access/interact only with the next/precedent actor". O agente de viagens incorporado neste modelo de distribui??o desempenha fun??es de intermedi?rio do fornecedor, reunindo um portf?lio de produtos e servi?os, que entrega aos consumidores, transferindo simplesmente informa??o entre o fornecedor e o cliente, sendo por isso remunerado com uma comiss?o. Esta tradicional abordagem de comunica??o top-down entre stakeholders afasta a igualdade entre parceiros, causando por vezes conflitos ou situa??es de submiss?o.

Mas uma nova economia surgiu ? escala global nas ?ltimas d?cadas. ? global porque as principais

Figura 2 | Modelo de intermedia??o tur?stica atual.

Fonte: Produ??o pr?pria com base em Castells (1999) e Prahalad e Ramaswamy (2004).

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atividades produtivas, o consumo e a circula??o, assim como os seus componentes (capital, trabalho, mat?ria-prima, gest?o, informa??o, tecnologia e mercados) est?o organizados em escala global, diretamente ou mediante uma rede de conex?es entre agentes econ?micos. Face a este enquadramento, Prahalad e Ramaswamy (2004) consideram que a competi??o em turismo alterou-se de `product and company centric' para `led innovations'. Em nosso entender e para o caso da intermedia??o tur?stica, o caminho da inova??o dever? seguir na dire??o do processo de cria??o de valor entre parceiros de neg?cio e mercado, numa base win-win.

Portanto, num ambiente competitivo onde o locus de cria??o de valor se transferiu do lado da oferta para o lado da procura, a estrat?gia n?o ? mais uma quest?o de posicionamento, ou de um conjunto fixo de atividades ao longo da cadeia de valor. Fruto da interatividade das tecnologias da informa??o e da comunica??o (TIC) e da Web, o paradigma competitivo das AV alterou-se de `sold to', centrado apenas na empresa (enfoque nas cadeias de valor e de oferta internas ? organiza??o) e no produto (organiza??o formal da viagem), para `selling with', orientando-se mais para o viajante e para o parceiro de neg?cio (como se observa na figura 2).

Este novo cen?rio exige um olhar atento aos movimentos externos ? organiza??o (constela??o de valor) e aposta no conhecimento das emo??es e experi?ncias do cliente/parceiro, de modo a construir um relacionamento win-win (cocria??o de valor). Assim, cada AV dever? construir o seu pr?prio modelo e processos de gera??o de valor, de modo a estimular ? cocria??o de uma oferta variada e diferenciada e ao uso de fluxos de conhecimento bidirecionais bottom-up e top-down com os seus consumidores/parceiros.

geradores de fragilidades, que podem ser colmatados com estrat?gias de cocria??o de valor entre parceiros. As carater?sticas mais not?rias deste setor envolvem: a diversidade de tipologias, a dispers?o geogr?fica, as formas de agrupamento, as atividades desenvolvidas, a dimens?o organizacional, entre outras.

De acordo com a Organiza??o Mundial de Turismo (2001), as ag?ncias de viagens diferenciam-se pela atividade e pela pr?pria dimens?o da oferta tur?stica, adotando distintas implanta??es no mercado, graus de integra??o horizontal e vertical, formas de atua??o e tamanho das pr?prias. A figura 3 apresenta dois grandes grupos de AV, as grossistas (ou OT) e as ag?ncias retalhistas.

A OMT (2001) menciona que os operadores tur?sticos ou ag?ncias grossistas criam os seus pr?prios produtos que, podem, englobar transporte, alojamento e servi?os complementares, disponibilizando-os ao consumidor, por um pre?o global. A maior parte destas ag?ncias organizadoras n?o tem rede de distribui??o pr?pria, sendo os seus produtos comercializados pelas ag?ncias retalhistas, que podem, desta forma, ser consideradas o canal mais imediato de distribui??o do produto tur?stico.

Em Portugal, o Registo Nacional de Ag?ncias de Viagens e Turismo (RNAVT), contabilizou 1.086 ag?ncias de viagens em 2012. A sua distribui??o por NUT II mostra Lisboa com o maior n?mero de empresas, o que revela uma distribui??o nacional n?o uniforme.

Quanto ? tipologia das atividades, o estudo da Associa??o Portuguesa de Agencias de Viagens e

2.3. Universo e carater?sticas das ag?ncias de viagens em Portugal

Neste subcap?tulo pretende mostrar-se o perfil das AV em Portugal, elencando alguns fatores

Fonte: Elaborado com base em OMT (2001).

Figura 3 | Tipologia de ag?ncias de viagens.

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