AÇÃO ANULATÓRIA- REGISTRO DE NASCIMENTO- …



AÇÃO ANULATÓRIA- REGISTRO DE NASCIMENTO- DESCONSTITUIÇÃO DE DECLARAÇÃO DE PATERNIDADE.

Ação anulatória de Registro de Nascimento para desconstituir declaração de paternidade, art. 113 da Lei nº 6015/73 e arts. 344 e 348 do Código Civil.

 

Princípio constante do Código Civil de 1916 pater id est quem nuptiae demonstrant injustificável na sociedade atual.

 

Progresso científico — teste do DNA conduzindo à verdade real.

 

Argüição de decadência afastada por se tratar de erro substancial — falsidade ideológica — art. 178, § 3º Código Civil não se aplica.

 

Imprescindível a anulação do registro falso.

 

Confirmação do decisum de procedência do pedido anulatório.

 

Desprovimento do apelo da Curadoria Especial.

 

Acórdão

 

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Cível 2000.001.15793, em que é Apelante Diego Bernardo Nazareth e Apelado Heloisio Verginio da Silveira Nazareth.

 

Acordam os Desembargadores da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em conhecer e negar provimento ao recurso.

 

 

Voto

 

Adotada, como relatório, a parte expositiva do parecer da I. Procuradoria de Justiça, integra-se a este Voto.

 

Trata-se de ação anulatória de registro quanto a declaração de paternidade, que se iniciou como ação negativa de paternidade.

 

Nestes casos de anulação de registro de nascimento comprovadamente eivado de erro substancial decorrente de falsidade ideológica não incide nem a decadência, nem a prescrição, como tem firmado a Jurisprudência específica.

 

Alcançando o mérito, vê-se que a prova pericial, consistente no exame de DNA mostrou-se conclusiva a respeito da negativa afirmada.

 

Insurgiu-se a I. Curadoria Especial sob argumentação social fundada no Código Civil, todavia o princípio do pater id est quem nuptiae demonstrant, era adotado à época da edição do Código Civil de 1916, não se justificando que permaneça nos dias atuais em que o progresso científico dá oportunidade para que se afira a verdade real através do exame de DNA, que ostenta acerto de 99,99%.

 

Ignorá-lo seria o mesmo que fazer como o avestruz que esconde a cabeça na areia para não ver o perigo aproximar-se.

 

No caso em exame a própria mãe do menor não só reconhece seu erro, como afirma já ter cientificado a criança desde os quatro anos que o ora autor não é seu pai verdadeiro.

 

Lamente-se que a falsidade ideológica no caso tenha atingido menor de idade, entretanto, manter o erro substancial em vigor prejudicaria ainda mais o menor. É bom que ele saiba o que não deve ser feito e que há correção.

 

Com efeito, o direito ao reconhecimento do estado de filiação é personalíssimo e indisponível, como se vê do art. 27 do E.C.A e o Ministério Público deverá providenciar legalmente a instauração de procedimento com vistas a ser averiguada a real paternidade do menor, no que deve colaborar a sua mãe fornecendo informações, se possível ... e, assim, poderá, a final ser regularizado totalmente o registro em que por ora apenas será excluído nome do irregularmente nomeado como pai.

 

Assim, merece confirmação a Douta Sentença proferida pela Laboriosa Magistrada Dra. ELISABETE ALVES DE AGUIAR, cujos fundamentos passam a integrar este voto, justamente com os dos Doutos Pareceres do MP em 1ª e 2ª Instâncias: Dra. Madalena Junqueira Ayres e Maria Eugenia Monteiro Cavalcanti, tudo na forma do permissivo regimental.

 

Ante o exposto, conhece-se e nega-se, provimento ao apelo.

 

 

Rio de Janeiro, 20 de março de 2001.

 

Des. Laerson Mauro - Presidente s/voto

 

Des. Wany Couto - Relatora

 

 

Sentença

 

Trata-se de ação rotulada de negatória de paternidade, tendo a petição inicial sido emendada antes da citação da parte ré, fundamentando-se a pretensão nos arts. 344 e 348 do C.C.B., visando o autor desconstituir situação jurídica no que diz respeito ao status familiae, notadamente a condição de pai do réu.

 

Com efeito, dispõe o art. 113 da Lei 6.015 de 31/12/73.

 

“As questões de filiação legítima ou ilegítima serão decididas em processo contencioso para anulação ou reforma do assento.”

 

Consoante lição de WALTER CENEVIVA, tal disposição ao permitir a discussão das questões de filiação, refere-se também a negativa de filiação, como acontece com o pedido de cancelamento de registro em que alguém aparece como genitor, sem o ser. (in Lei dos Registros Públicos Comentada 7ª ed. revista e atualizada. Ed. Saraiva).

 

E explicita o art. 344 do Código Civil:

 

“Art. 344 — Cabe privativamente ao marido o direito de contestar a legitimidade dos filhos nascidos de sua mulher (art. 178 § 3º).”

 

Acrescenta o art. 348 do Código Civil:

 

“Art. 348 — Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro.”

 

Leciona ARNOLDO WALD que:

“Notamos, há algum tempo no Direito Brasileiro uma tendência para relegar num plano secundário o art. 344. interpretando-o como consagrando uma faculdade do marido no caso de dúvida, em que seria temerário acolher as afirmações de um cônjuge sem a audiência do outro” (Ap. 9423 do TJGB., julgada em 16/08/1960 pela 6ª Câmara Cível)

 

 

Continua o mesmo autor:

 

“A Justiça se inclina, assim, no sentido de, abandonando situações hipócritas que não correspondem à verdade, reconhecer amplamente os fatos como ocorrem, admitindo o reconhecimento do filho adulterino a matre e a retificação pelo mesmo do seu assento de nascimento em que tenha constado o pai presumido, mesmo quando este não intentou oportunamente a ação negatória.”

 

Neste sentido a jurisprudência pátria:

“Adulterinidade a matre. Possibilidade da ação de investigação de paternidade, mesmo sem contestação contenciosa do pai presumido. Separação de fato do casal, e concubinato da mãe com o investigado , por este confessada. Registro dos menores, ademais, como filhos de pai ignorado, a excluir o interesse do marido de sua mãe pela negatória. Dissídio jurisprudencial comprovado. Recurso extraordinário provido e conhecido (RE 64.197, RTJ 63/82).

 

“Investigação de paternidade, permissibilidade do filho adulterino a matre” (Ap. Civ. 58.128, em 21.6.1968. Revista de Jurisprudência TJGB 23/314

 

“Investigação de paternidade. Provas convincentes da filiação espúria prevalecem mesmo no caso de adulterinidade a matre, quando sabe que o marido e mulher estavam separados havia vários anos e o primeiro nega a paternidade do investigante” (Ap. Civ. 66201, em 4.11.1969., Revista de Jurisprudência do TJGB 27/288).

“O filho adulterino a matre pode intentar investigatória de paternidade contra o pai verdadeiro, independentemente da negativa de paternidade do marido de sua mãe se o casal estava separado de fato” (Ap. Civ. 80.978, em 7.11.1972, Revista de Jurisprudência do TJGB 31/353).

 

Sendo o erro um defeito do ato jurídico e vício de consentimento que importa em uma discordância entre a vontade interna e a vontade declarada, para que o ato jurídico seja anulável, é necessário que o vício que o inquina seja essencial ou substancial.

 

Como tal, considera a lei o erro que interessa a natureza do ato, o objeto principal da declaração ou alguma das qualidades a ele essenciais.

 

Dispõe o art. 88 do Código Civil que “tem-se igualmente por erro substancial o que disser respeito a qualidades essenciais da pessoa, a quem se refira a declaração de vontade, significando com isso que a pessoa a quem a declaração de vontade é dirigida, deve ser a causa determinante do ato... (In, Anotações ao Código Civil Brasileiro, DARCY ARRUDA MIRANDA, 1º volume, Ed. Saraiva, 4ª Edição revista e atualizada).

 

Conforme leciona ORLANDO GOMES.

 

“Quando trata de falsidade do registro de nascimento, a impugnação à paternidade não é privativa do pai nem se sujeita ao curto prazo de decadência prevista no art. 178, § 3º do Código Civil. Pode promovê-la, também, o próprio filho apoiando-se no art. 348 do Código Civil, alterado pelo Decreto-Lei nº 5.860, de 30.09.1943.

 

A tendência nos tempo atuais é a de quebrar o monopólio do pai quanto ao direito de impugnar a filiação legítima, visto que seu estabelecimento se deveu a uma visão ultrapassada da superioridade do homem, dentro da família (ZENO VELOSO, Direito Brasileiro da Filiação e Paternidade, São Paulo, Malheiros, 1997, nº 35, p.67

 

Segundo o escolhido de CUNHA GONÇALVES, entre as pessoas que podem impugnar a filiação, inclui o próprio autor do reconhecimento contrário à verdade” (Princípios de Direito Civil III /1.276).

 

A jurisprudência do GTJ, todavia, tem se inclinado para impedir ao filho reconhecido durante a menoridade, por ato lançado no registro de nascimento, o direito de usar investigatória contra outro pretenso pai, se ultrapassado o prazo decadencial dos arts. 178, 92 e 362 do Código Civil, mesmo quando a impugnação se funde na inveracidade de declaração do perfilhante (falso ideológico) (STJ, 4ª T., RESP nº 38.356—2/RS, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO. DJU 15.08.1994). Não se trata de reconhecer prescritibilidade para a ação de investigação de paternidade, mas de ver no registro não impugnado em tempo hábil, a falta de uma condição de procedibilidade, de sorte a se tornar juridicamente impossível a pretensão (TJMG, Ap. nº 26.325/1, Rel. Des. CORRÊA DE MARINS, ac. 15.12.1994, Jurisprudência Mineira, v. 132/133, p. 91/94). O caso torna-se, portanto, de “carência de ação por impossibilidade jurídica do pedido” (STJ, 3ª T., RESP nº 1.380/RJ. Rel Min. GUEIROS LEITE, ac. 06.03.1990, RSTJ 12/294; 4ª T., RESP nº 19.244—O/PR, Rel. Min. ATHOS CARNEIRO, ac. 03.03.1993. RSTJ 46/226) (In, Direito de Família, 10ª edição, Forense, 1998). Neste sentido, o seguinte Acórdão:

 

“Não se cuidando no caso de ação negatória de paternidade e sim de ação declaratória de inexistência de filiação legítima, por alegada falsidade ideológica, é ela suscetível de ser intentada não só pelo suposto filho, mas também por outros legítimos interessados (STJ. 4ª T., Resp. 1.690—GO, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, ac. 17.09.1991, Lex-JSTJ, 3470).

 

Consoante entendimento do Excelso Pretório a ação de impugnação da filiação legítima, e imprescritível assim como a ação de Investigação de paternidade (sum — 149, STF) , podendo ser proposta a qualquer tempo, havendo uma tendência para o abrandamento do princípio pater est quem justae nuptiae demonstrant, conforme decisões publicadas na Revista Trimestral de Jurisprudência — 51/826; 53/97; 53/367; 60/566; 62/629; 62/681; 63/82 e 68/429.

 

A jurisprudência a respeito do assunto, vem se posicionando de que não há decadência para se impugnar a filiação legítima, consoante se observa dos seguintes Acórdãos:

 

“O Registro de Nascimento que contiver falsa declaração de vontade emanada de erro substancial pode ser anulada como se anulam os atos jurídico em geral (art.88 de CC) saltando fora da regra decadencial do art. 178, § 3º” RTJ- RS. Ap. 591.018.012. Rel. Des. CLARINDO FAVRETTO, ac. 05.12.1991. RTJ RGS.

 

“Não se aplica o art. 178, § 3ºdo Código Civil, para a prescrição da ação para demandar a nulidade de registro que atribui paternidade a filho havido de concubinato” (Ac. do TJSP, 2ª Câm. Civil, in RT 446/91).

 

“Ação de contestação da filiação não prescreve em tempo algum” (Ac. do TJSP, 1ª Câm. Cível, in RT 429/96).

 

“A falsa declaração sobre filiação legítima, no registro civil, torna o assento nulo e impugnável a qualquer tempo, pelos que tenham interesse legítimo na declaração e nulidade” (Cf. Rev. de Jurisp. do TJSP).

 

No atinente aos meios de prova utilizados em investigatória de paternidade, leciona ARNOLDO MEDEIROS DA FONSECA:

 

“Em certos casos, porém, o exame hematológico se não permite descobrir uma paternidade ignorada, pode conduzir à exclusão peremptória de um pai suposto” e recomenda que, “em conclusão, pois, pode e deve o juiz recorrer a essa prova nos casos duvidosos sempre que seja possível verificar a constituição sanguínea dos próprios pais e do suposto filho” (in Investigação de Paternidade, 3ª ed., nº 314, p. 416 e nº 318, p. 419).

 

 

Na petição inicial o próprio autor asseverou “ser casado com a genitora do menor-réu desde 27/05/1988 e que está separado de fato da mesma desde meados do ano 1992 e que no ano de 1990 passou a trabalhar no Estado de São Paulo e posteriormente na Bahia, ficando meses ausentes, vindo periodicamente para estar junto a família. Declara a seguir, que “agora”, por consenso, o casal optou pela realização do divórcio, ocasião em que a esposa do suplicante revelou que o suplicado não é seu filho legítimo...“. Na emenda a petição inicial a f. 21/22 o autor assevera: “ser casado com a genitora do menor réu desde 27/05/1988 e que está separado de fato da mesma desde meados do ano 1992... e que “devido às condições do seu trabalho, o suplicante mantinha-se ausente do lar por longos períodos, fato este que resultou na separação de fato do casal...“. Assevera adiante que “agora por consenso, o casal optou pela realização do divórcio ocasião em que a esposa do suplicante revelou que o suplicante não é seu filho legítimo...

 

Observa-se do documento de f. 08, certidão de nascimento de menor réu, Diego Bernardo Nazareth, que o mesmo nasceu em 04 de junho de 1991 e foi reconhecido e registrado pelo próprio autor, que foi o declarante do nascimento do menor réu.

 

Do conjunto probatório carreado aos autos, notadamente do exame de tipagem de DNA — (laudo de f. 74/77 e dos depoimentos da genitora do menor réu a f. 90/92 e do autor a f. 88/89, extrai-se que o assento de nascimento do menor Diego Bernardo Nazareth que suplicante pretende ver anulado no que tange à paternidade, padece de vício, notadamente pelo fato de o mesmo ter sido feito pelo requerente que laborou em erro tendo se declarado pai do menor-réu acreditando que o mesmo fosse realmente seu filho, pois concebido na constância do casamento restando entretanto comprovado que a criança é adulterina a matre, não sendo na realidade filho do suplicante.

 

Ante o exposto, na forma da fundamentação julga-se procedente o pedido, para o efeito de desconstituir a paternidade do menor—réu atribuída ao autor, tornando nulo apenas em seu assento de nascimento a filiação paterna para que sejam excluídos do mesmo os nomes do autor, dos avós paternos, o patronímico Nazareth e a palavra “o pai” como declarante, permanecendo no mais o assento como lavrado.

 

Condena-se o réu nas despesas processuais, honorário periciais, e honorários advocatícios que fixa-se em 10 (dez por cento) sobre o valor da condenação, com a ressalva do art. 12 da Lei 1.060/50, se amparado pela gratuidade da Justiça.

 

Transitada em julgado, expeça-se mandado ao Oficial do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais para as devidas anotações, devendo serem excluídos do assento de nascimento do menor Diego Bernardo Nazareth o nome do autor Heloisio Verginio da Silveira Nazareth, que consta como pai, dos avós paternos e patronímico “Nazareth e a palavra o pai” como declarante, procedendo-se após a baixa na distribuição e arquivamento.

 

Duque de Caxias, 21 de setembro de 1999.

Elizabete Alves de Aguiar - Juíza de Direito

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