O Aspecto nas construções infinitivas e gerundivas ...

O Aspecto nas constru??es infinitivas e gerundivas complementos de verbos de percep??o

L'Aspect dans les constructions infinitives et g?rondives compl?ments des verbes de perception

Patr?cia de Araujo Rodrigues

PUCPR

R?sum?

Dans ce travail, nous examinons la structure temporelle des compl?ments des verbes de perception construits avec l'infinitif (Eu vi a Maria chorar) et avec le g?rondif (Eu vi a Maria chorando), en portugais br?silien. Nous argumentons que la structure de ces compl?ments correspond ? la projection AspP, obtenue comme r?sultat de l'interaction entre l'aspect lexical, li? ? la structure ?v?nementielle du pr?dicat (qui doit tenir compte, entre autres, du type s?mantique du pr?dicat ? individual-level ou stage-level), et l'aspect grammatical. Cette structure permet d'expliquer certaines des propri?t?s s?mantiques des constructions ?tudi?es, telles que l'interpr?tation directe du verbe de perception, la restriction aux pr?dicats individual-level, la d?pendance temporelle de la subordonn?e par rapport ? la matrice et les diff?rences aspectuelles observ?es entre les compl?ments infinitifs et g?rondifs.

Mots-cl?s

verbes de perception, infinitif, g?rondif, aspect.

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Resumo

Este trabalho prop?e-se a examinar a estrutura temporal dos complementos dos verbos de percep??o constru?dos com o infinitivo (Eu vi a Maria chorar) e com o ger?ndio (Eu vi a Maria chorando), em portugu?s brasileiro (PB). Argumenta-se que a estrutura desses complementos corresponde ? proje??o AspP, obtida como resultado da intera??o entre o aspecto lexical, ligado ? estrutura de evento do predicado (que deve levar em conta, entre outros, o tipo sem?ntico do predicado ? individual-level ou stage-level), e o aspecto gramatical. A estrutura proposta permite explicar as propriedades sem?nticas das constru??es estudadas, tais como a interpreta??o direta do verbo de percep??o, a restri??o aos predicados individual-level, a depend?ncia temporal da encaixada com rela??o ? principal e as diferen?as aspectuais existentes entre os complementos infinitivos e gerundivos.

Palavras-chave

verbos de percep??o, infinitivo, ger?ndio, aspecto.

Rev. Est. Ling., Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 77-98, jul./dez. 2006

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1. INTRODU??O

O objetivo deste trabalho ? discutir as propriedades aspectuais e temporais de dois tipos de complementos dos verbos de percep??o n?o-agentivos1, os complementos infinitivos (1a) e os complementos gerundivos (1b), analisados como constituintes ?nicos2.

(1) a Eu vi a Maria chorar. b Eu vi a Maria chorando

De forma geral, os complementos infinitivos e gerundivos possuem propriedades sem?nticas semelhantes: i) eles apresentam uma depend?ncia temporal com rela??o ? ora??o principal (2), o que implica a interpreta??o direta do verbo de percep??o e a simultaneidade entre o evento da percep??o e o evento percebido3; ii) s?o incompat?veis com predicados individual-level (3).

(2) a *Ontem, eu vi o Jo?o beijar a Maria antes de ontem. b *Ontem, eu vi o Jo?o beijando a Maria antes de ontem.

(3) a *N?s vimos o Jo?o saber a li??o. b *N?s vimos o Jo?o sabendo a li??o.

Essas propriedades caracterizam tamb?m os complementos infinitivos e gerundivos dos verbos de percep??o em ingl?s (4).

(4) a *Yesterday, I saw John kiss / kissing Mary the day before. (BOIVIN, 1998, p. 108.)

b *We saw him know / knowing the answer. (FELSER, 1999, p. 74.)

Autores como Declerck (1981) e Felser (1999) afirmam que esses complementos apresentam, contudo, uma diferen?a aspectual, a saber, o

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complemento gerundivo descreve o evento percebido como uma a??o incompleta, enquanto o complemento infinitivo implica normalmente que o evento descrito foi observado em sua totalidade.

Neste trabalho, nos propomo-nos a examinar os complementos infinitivos e gerundivos dos verbos de percep??o em PB, com o objetivo de explicar as propriedades observadas com rela??o ? restri??o aos PILs e ? depend?ncia temporal do complemento e de verificar se a diferen?a aspectual existente entre esses complementos pode ser definida como proposto por Declerck (1981) e por Felser (1999).

Para tanto, discutiremos em primeiro lugar a an?lise de Felser (1999) relativa aos complementos n?o finitos do ingl?s. Essa autora prop?e que esses complementos s?o uma proje??o da categoria funcional Aspecto, que carrega o tra?o [+prog] no caso dos complementos gerundivos e [-prog] no caso dos complementos infinitivos. Para Felser, que adota a hip?tese de Kratzer (1995) de que os predicados stage-level (PSL) possuem um argumento Evento ausente dos PIL, somente os PSLs projetam AspP (a realiza??o sint?tica de um evento), enquanto os PILs projetam TP (a realiza??o sint?tica de uma proposi??o). Essa an?lise explicaria a n?oocorr?ncia de PILs como complementos de verbos de percep??o com interpreta??o direta, que selecionam semanticamente um evento.

Da mesma forma que Felser, defendemos a hip?tese de que a estrutura desses complementos em PB corresponde ? proje??o AspP e adotamos a distin??o entre PILs e PSLs em termos da aus?ncia/presen?a do argumento evento. Discordamos de Felser, no entanto, quanto ? realiza??o sint?tica desses predicados. Sustentamos que Asp ? sempre projetado na estrutura dos complementos n?o finitos e que o valor aspectual associado ? ora??o ? resultado da intera??o entre o aspecto lexical, ligado ? estrutura de evento do predicado (que deve levar em conta, entre outros, o tipo sem?ntico do predicado ? individual-level ou stage-level), e o aspecto gramatical. Tamb?m discordamos de Felser com rela??o ? identifica??o do aspecto do complemento infinitivo como "n?o progressivo". Defendemos que o complemento infinitivo, por n?o portar marcas morfol?gicas aspectuais, "herda" o valor aspectual do verbo de percep??o. Com base em Ramchand (2004), propomos que Asp introduz uma vari?vel temporal ? qual cabe representar os diferentes aspectos do predicado e cujo valor pode ser

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modificado por operadores aspectuais, como o operador progressivo, ou pelo valor aspectual da matriz.

Na se??o 2, apresentamos a an?lise de Felser para os complementos infinitivos e gerundivos do ingl?s. Em seguida, na se??o 3, apresentamos a proposi??o de Ramchand (2004) para a estrutura temporal da frase. A se??o 4 discute o papel do argumento evento na estrutura temporal da frase. A se??o 5 discute os dados do PB e nossa proposi??o para a deriva??o da estrutura dos complementos infinitivos e gerundivos. Apresentamos nossas considera??es finais na se??o 6.

2. A AN?LISE DE FELSER (1999)

Felser (1999), em um estudo sobre os verbos de percep??o em ingl?s, argumenta, seguindo Declerck (1981), que os complementos infinitivos e os complementos gerundivos dos verbos de percep??o distinguem-se unicamente com rela??o ao seu valor aspectual, o ger?ndio correspondendo ? contrapartida progressiva do infinitivo. Para a autora, ainda que interpreta??es diferentes possam ser atribu?das ? forma do progressivo, a fun??o geral desta forma verbal ? indicar que um evento est? "em progresso". O progressivo marca uma situa??o cont?nua, em desenvolvimento ou incompleta. Assim, de acordo com Felser, o complemento gerundivo descreve o evento percebido como uma a??o em progresso ou como incompleta, enquanto o complemento infinitivo implica normalmente que o evento descrito foi observado em sua totalidade. Essa diferen?a de interpreta??o, ilustrada pelos exemplos em (5), corresponderia ? distin??o entre o aspecto imperfectivo (progressivo) e o aspecto perfectivo (n?o progressivo).

(5) a I saw her drowning, but I rescued her. (FELSER, 1999, p. 77.) b #I saw her drown, but I rescued her.

Conforme Felser, a constru??o em (5b) ? incoerente, porque o infinitivo implica uma a??o que foi completada, enquanto a constru??o em (5a) ? coerente, porque o ger?ndio sugere que a a??o est? em desenvolvimento. A diferen?a entre essas duas constru??es seria a mesma observada entre as constru??es matrizes progressivas e n?o progressivas, exemplificadas em (6).

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