Tribunal de Contas da União



GRUPO I – CLASSE IV – Plenário

TC 033.263/2008-1.

Natureza: Tomada de Contas Especial.

Unidade: Banco Central do Brasil - Bacen.

Responsáveis: Cláudio Ness Mauch (CPF 060.895.180-34), Demósthenes Madureira de Pinho Neto (CPF 847.078.877-91), Francisco Lafaiete de Pádua Lopes (CPF 110.015.857-04), Luiz Antônio Andrade Gonçalves (CPF 007.600.486-49), sucessores de Roberto José Steinfeld (CPF 548.384.957-49) e Banco FonteCindam S.A. (CNPJ 33.794.033/0001-00).

Advogados: João Geraldo Piquet Carneiro (OAB/DF 800-A), e outros (peça 36, p. 4 a 7), Ana Tereza Palhares Basilio (OAB/RJ 74.802), e outros (peça 36, p. 9, 17, 20 e 36).

SUMÁRIO: TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. IRREGULARIDADE NA EXECUÇÃO DA POLÍTICA CAMBIAL PELA DIRETORIA DO BANCO CENTRAL. SOCORRO A BANCO E FUNDOS PRIVADOS SOB ALEGAÇAO INFUNDADA DE CRISE SISTÊMICA. FAVORECIMENTO DE ENTIDADE PRIVADA EM DETRIMENTO DO INTERESSE PÚBLICO. ILEGALIDADE. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO E MULTA.

RELATÓRIO

Trata-se de tomada de contas especial originária da conversão de representação da antiga 2ª Secretaria de Controle Externo – Secex-2 acerca de possíveis irregularidades na execução da política monetária do Banco Central do Brasil – Bacen no decorrer da denominada crise cambial de janeiro de 1999.

2. Na sessão de 3 de dezembro de 2008, por meio do acórdão 2.906/2008, o Plenário autorizou a citação dos responsáveis nos seguintes termos (peça 1):

“9.5.1.1 R$ 171.912.000,00 (cento e setenta e um milhões, novecentos e doze mil reais), a contar de 10.2.1999, decorrentes do pagamento de ajustes financeiros na Bolsa de Mercadoria e Futuros em razão da venda, pelo Banco Central do Brasil, ocorrida em 14.1.1999, de 2.600 contratos de futuro de câmbio ao Banco Fonte Cindam e fundo Trade II, sem que restasse demonstrada a existência de risco sistêmico no momento em que foi realizada a operação ou, ao revés, a capacidade de a instituição financeira comprar dólares junto ao Banco Central para fazer hedge dessas posições;

9.5.1.2 R$ 350.436.000,00 (trezentos e cinquenta milhões, quatrocentos e trinta e seis mil reais), a contar de 1°.2.1999, decorrentes do pagamento de ajustes financeiros na Bolsa de Mercadoria e Futuros em razão da venda, pelo Banco Central do Brasil, ocorrida em 14.1.1999, de 5.300 contratos de futuro de câmbio ao Banco Fonte Cindam S/A para cobrir posições dos fundos de investimento Jaguar, Absoluto, Derivativo, Star, FIF 30, C&D, BA FIF e Sun-II, sem que restasse demonstrada a existência de risco sistêmico no momento em que foi realizada a operação ou, ao revés, a capacidade de a instituição financeira comprar dólares junto ao Banco Central para fazer hedge dessas posições.”

3. Examinadas as alegações de defesa apresentadas, a Secex-2 concluiu pela irregularidade das contas, com aplicação de multa, e pelo afastamento da responsabilidade de Luiz Antônio Andrade Gonçalves e dos sucessores de Roberto José Steinfeld, administradores do Banco FonteCindam, uma vez que não foi provada má-fé desses dois ex-gestores que justificasse a desconsideração da pessoa jurídica (peça 31, páginas 16/51).

4. A unidade técnica defendeu, ainda, a redução do débito de R$ 522.548.000,00 para R$ 19.286.270,00, “pois o Bacen vendeu contratos de dólares futuros ao Banco Fonte Cindam e aos seus fundos por 1,322, ao passo que o preço de mercado no mercado de opções, onde estavam posicionados, indicava um preço de 1,346413. Assim, na prática, a Autoridade Monetária vendeu ativo que valia 1,346413 por 1,322” (peça 31, páginas 16/45).

5. O Ministério Público junto ao TCU discordou da Secex-2 apenas com relação à redução do débito. Em síntese, argumentou que “o raciocínio somente se aplicaria a operações ‘normais’ do Banco Central no mercado futuro, em que a atribuição de autoridade monetária referenda a utilização de instrumentos de regulação das atividades financeiras e cambial do mercado em geral, não havendo de se confrontarem ganhos e perdas nas operações para o fim de apurar responsabilidade dos gestores”.

6. Considerando a tramitação de ações penais relativas à matéria, inclusive com notícias de condenação dos administradores do Bacen em primeira e segunda instâncias, e considerando a juntada de laudo pericial conclusivo, restituí os autos à unidade técnica para:

“a) obter o inteiro teor das decisões proferidas pela Justiça Federal de 1º e 2º graus, para determinar seu efetivo alcance e elaborar nova instrução, com as propostas pertinentes, tomadas providências em relação às citações dos responsáveis;

b) tratar da divergência existente nos autos a respeito da metodologia de cálculo do débito;

c) examinar o laudo pericial conclusivo acostado aos autos (fls. 1490/1576) e avaliar eventuais reflexos;

d) apor nota de sigilo aos autos.”

7. Cumpridas as determinações, a Secretaria de Controle Externo da Fazenda Nacional - SecexFazenda, sucessora da Secex-2, manteve a proposta de irregularidade das contas com condenação em débito, desta feita pelo valor total constante da citação, e aplicação de multa aos responsáveis. Manteve, ainda, a sugestão de exclusão da responsabilidade de Luiz Antônio Andrade Gonçalves e dos sucessores de Roberto José Steinfeld.

8. No tocante às sentenças judiciais, a unidade técnica noticiou a condenação dos administradores do Bacen sem que, contudo, tivesse ocorrido o trânsito em julgado. Por tal motivo, amparada no princípio da independência das instâncias, opinou pelo prosseguimento deste feito e pelo julgamento de seu mérito.

9. Para maior clareza, transcrevo a instrução da SecexFazenda, substituta da antiga 2ª Secex:

“INTRODUÇÃO

Trata-se de Tomada de Contas Especial acerca de possíveis operações irregulares de venda de contratos futuros de dólar pelo Banco Central do Brasil – Bacen ao Banco Fonte Cindam S.A. Este processo originou-se de uma representação feita pela então 8ª Secex (atual Secex Fazenda), sendo convertida em TCE pelo Acórdão 2.906/2008 – Plenário. Além disso, esse Acórdão também determinou que o processo original, em que se analisava as operações com os Bancos Fonte Cindam e Marka, fosse apartado em dois, para análise em separado de cada caso.

HISTÓRICO

2. Em 13 de janeiro de 1999, por meio do Comunicado nº 6.560, o Bacen instituiu o regime cambial denominado banda diagonal endógena. Essa mudança acarretou valorização imediata do dólar em 9%. Assim, essa brusca valorização travou o mercado futuro de dólar da Bolsa de Mercadorias e Futuro – BM&F, uma vez que esses contratos futuros de câmbio, à época, somente poderiam oscilar 1% para cima ou para baixo em relação ao último fechamento. Dessa forma, era nesse mercado em que estava posicionado, na ponta vendedora, o Banco Fonte Cindam, conforme alegou esse Banco.

3. Ocorre que, apesar de ser instituição relativamente pequena no âmbito do Sistema Financeiro Nacional, o Banco Fonte Cindam estava excessivamente alavancado nesse mercado, na ordem de 3 vezes o seu patrimônio líquido. Com o mercado travado, essa instituição alegou que não conseguia zerar a sua posição para estancar as suas perdas. Além disso, com a valorização do dólar, em função da mudança do regime cambial, o Fonte Cindam já amargava um grande prejuízo. Assim, após solicitar auxilio à Autoridade Monetária, o Bacen realizou uma operação atípica de venda de 7.900 contratos (valor nominal de R$ 1.044.380.000,00) com esse Banco e com fundos administrados por essa Instituição Financeira.

4. Ademais, a taxa de câmbio negociada nessa operação foi bem vantajosa para o Banco Fonte Cindam. Enquanto a cotação do dólar futuro apontava para R$ 1,34/US$ 1,00 no mercado de opções da BM&F e no mercado futuro de real na Bolsa de Chicago, a negociação se deu a uma taxa de R$ 1,3220/US$ 1,00.

5. Um dos principais motivos, conforme alegou o Bacen, para que fosse feita essa operação irregular foi evitar a ocorrência de uma crise sistêmica.

6. Dessa forma, o Tribunal, por meio do Acórdão 2.906/2008 – Plenário, determinou a citação de diversos responsáveis, pelos seguintes débitos:

• R$ 171.912.000,00 (cento e setenta e um milhões, novecentos e doze mil reais), a contar de 10.2.1999, decorrentes do pagamento de ajustes financeiros na Bolsa de Mercadoria e Futuros em razão da venda, pelo Banco Central do Brasil, ocorrida em 14.1.1999, de 2.600 contratos de futuro de câmbio ao Banco Fonte Cindam e fundo Trade II, sem que restasse demonstrada a existência de risco sistêmico no momento em que foi realizada a operação ou, ao revés, a capacidade de a instituição financeira comprar dólares junto ao Banco Central para fazer hedge dessas posições;

• R$ 350.436.000,00 (trezentos e cinquenta milhões, quatrocentos e trinta e seis mil reais), a contar de 1°.2.1999, decorrentes do pagamento de ajustes financeiros na Bolsa de Mercadoria e Futuros em razão da venda, pelo Banco Central do Brasil, ocorrida em 14.1.1999, de 5.300 contratos de futuro de câmbio ao Banco Fonte Cindam S/A para cobrir posições dos fundos de investimento Jaguar, Absoluto, Derivativo, Star, FIF 30, C&D, BA FIF e Sun-II, sem que restasse demonstrada a existência de risco sistêmico no momento em que foi realizada a operação ou, ao revés, a capacidade de a instituição financeira comprar dólares junto ao Banco Central para fazer hedge dessas posições.

7. A Secex Fazenda (peça 31, pgs. 15-51), ao analisar a matéria, concluiu pelo afastamento da responsabilidade dos gestores do Banco Fonte Cindam, pois não estavam presentes os requisitos da desconsideração da personalidade jurídica. A unidade técnica também entendeu que, no que diz respeito ao risco sistêmico, considerando que o Banco Fonte Cindam não estava na iminência de ser tornar insolvente, pelo contrário, tinha uma relativa folga patrimonial, e que havia liquidez suficiente para liquidar sua posição no próprio mercado de opções, fica fragilizada a alegação de que se o Bacen não agisse, esse Banco poderia quebrar, e consequentemente, originar uma crise sistêmica no país. Assim, sob esse aspecto de risco sistêmico, foi injustificável a atuação do Bacen. Também entendeu que houve ofensa ao Princípio da Impessoalidade, uma vez que essa Instituição Financeira recebeu um tratamento diferenciado na realização dessa operação que não foi concedido para outros bancos.

8. Ademais, a Secex Fazenda, acatando parte das alegações de defesa, fixou o entendimento de que, como houve compensação das perdas dos ajustes diários dos contratos vendidos com a valorização das reservas internacionais, o prejuízo da operação seria o diferencial da taxa da operação com a praticada no mercado. Assim, como houve o entendimento da ausência de má-fé, houve proposta para recolhimento do débito para os gestores do Bacen e para o Banco Fonte Cindam.

9. O Ministério Público junto ao TCU (peça 32, pgs. 17-22), ao analisar a questão, concordou, em parte, com as conclusões da unidade técnica. Entendeu que o débito deveria ser, não o diferencial das taxas, mas a soma dos ajustes diários, que corresponde aos valores da citação. Além disso, detectou má-fé na realização dessa transação. Dessa forma, propôs o julgamento irregular desta tomada de contas especial, desde já, com imputação de débito dos gestores do Bacen, em solidariedade com o Banco Fonte Cindam S.A., e aplicação da multa do art. 57 da Lei 8.443/1992.

10. A Ministra-Relatora Ana Arraes, por meio de despacho (peça 35, pgs. 1-4), informou que todos os responsáveis por essa operação foram condenados na esfera criminal pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Assim se manifestou:

‘15. Nessas circunstâncias, as instâncias penal e administrativa comunicam-se, não cabendo ao - TCU discutir a autoria do ilícito, por força do art. 126 da Lei 8.112/1990, c/c o art. 935 do Código Civil.

16. A propósito, esse é o entendimento do procurador-geral Lucas Rocha Furtado (in Curso de Direito Administrativo. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2007. p. 985):

"Assim, a condenação criminal — desde que os mesmos fatos estejam descritos em lei como infrações administrativas ou que tenham causado prejuízo à Administração Pública — deve importar em condenação nas instâncias administrativa e civil, respectivamente. (...)

Em resumo, tendo sempre a instância criminal como parâmetro, e a premissa de que o fato examinado no processo criminal encontra-se descrito como infração funcional ou que tenha causado prejuízo ao erário ou a terceiro, podemos apresentar o seguinte quadro comparativo:

- se tiver havido condenação na instância criminal, o servidor será condenado nas instâncias administrativa e civil (CC, art. 935);"

17. Diante desses fatos, cabe a realização de diligências para que se obtenha o inteiro teor das decisões proferidas pela justiça criminal, com vistas a determinar seu efetivo alcance e a elaborar nova instrução, com as propostas pertinentes, tomadas as necessárias providências em relação às citações dos responsáveis.

11. Além disso, a Ministra-Relatora determinou que a divergência da metodologia de cálculo de apuração do débito seja tratada novamente pela Secex-Fazenda. A unidade técnica entendeu que o débito deveria ser o diferencial entre a taxa de câmbio do mercado e a taxa praticada na operação. Já a citação ocorreu com base na soma dos ajustes diários pagos pelo Bacen até o vencimento dos contratos.

12 Ademais, também determinou à Secex-Fazenda examinar o laudo pericial conclusivo acostado aos autos (peças 33 e 34) e avaliar eventuais reflexos.

EXAME TÉCNICO

13. Foram feitas as diligências, junto a todos os Tribunais Regionais Federais do País, para obter a íntegra das sentenças dos responsáveis em comento. Por meio do Ofício ADM.0043.000012-3/2012 (peça 41, pg. 125), a Sexta Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio Janeiro, informou que o caso em comento foi tratado por esse juízo no processo nº 99.0046981-0 e que a referida ação penal encontra-se, atualmente, no Superior Tribunal de Justiça – STJ, para julgamento de Recurso Especial. Em pesquisa feita no site do STJ, constatou-se que foi autuado no processo REsp 1385522. Esse Recurso encontra-se concluso ao Ministro-Relator e até o momento não houve nenhuma decisão.

14. Ao analisar a sentença prolatada no processo 99.0046981-0 (peças 41 e 42, respectivamente, pgs. 126 a 340 e 1 a 342), verifica-se que o caso do Banco Marka e Fonte Cindam foram tratados no mesmo processo. Nas páginas 315 a 323 da peça 41, especificamente quanto ao Banco Fonte Cindam, constata-se que a situação fática tratada na justiça penal é, na essência, a mesma tratada nesta TCE. A diferença é que, basicamente, há alguns réus no processo penal que não foram citados neste processo, bem como alguns responsáveis devidamente citados nesta TCE que não foram réus na esfera penal.

15. Cabe ainda ressaltar que, na análise das informações fornecidas pela Justiça Federal, não foi localizada a condenação em 2º Grau dos réus do processo nº 99.0046981-0. De qualquer forma, a comunicação da instância penal na administrativa só ocorre com o trânsito em julgado condenatório da esfera penal, fato que não ocorreu, por estar na fase de recurso especial no STJ. Essa questão do trânsito em julgado será melhor analisada a seguir.

16. Inicialmente cabe trazer o seguinte dispositivo do Código de Processo Penal:

Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros.

Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

17. Para entender melhor a interpretação desse dispositivo do CPP, cabe trazer os ensinamentos de Edilson Maougenot Bonfim, no livro Código de Processo Penal Anotado, Ed. Saraiva, 2ª Ed., pg.168:

De fato, além da menção, no Código Penal e no Código de Processo Penal, aos efeitos da coisa julgada penal no âmbito cível e da fixação do valor mínimo para reparação dos danos em caso de condenação, o próprio Código Civil, em seu art. 935, logo após afirmar que a responsabilidade civil é independente da criminal, veda nova discussão, em sede civil, acerca da existência de fato ou de sua autoria, se essas questões já houverem sido decidas no juízo criminal. Reforça-se, portanto, a imperatividade da coisa julgada decorrente de sentença ou acórdão penal perante o juízo civil, que ficar vinculado, na formação de seu convencimento, ao reconhecimento da existência do fato e sua autoria, desde que as circunstâncias tenham sido reconhecidas pelo juízo penal.

18. Complementando esse aspecto, Guilherme de Sopuza Nucci, Código de Processo Penal Comentado, 8ª e., Editoria Revista dos Tribunais, pg. 179, evidencia que: “(...) uma vez que há sentença condenatória definitiva na esfera criminal, já não se discute culpa no juízo cível, restando, apenas o debate em torno do quantum debeatur, ou seja, da quantia adequada à satisfação do dano sofrido pela vítima”.

19. Diante desses ensinamentos, conclui-se que a afetação da esfera penal na civil ou na administrativa somente ocorre com o transito em julgado da justiça criminal. Assim, voltando ao caso concreto, ainda está em vigor a independência das instâncias, sem a comunicação do juízo criminal para esta TCE. O efeito prático é o prosseguimento normal deste processo.

20. Por meio de despacho da Ministra-Relatora, foi determinada a reavaliação da metodologia de cálculo do débito. Ao analisar essa questão, na instrução feita na peça 31, fls. 16-51, conclui que, como houve compensação das perdas da venda dos contratos com a valorização das reservas internacionais, a citação de R$ 522.348.000,00 (R$ 171.912.000,00 + R$ 350.436.000,00) deveria ser reduzida para R$ 19.286.270,00, pois o Bacen vendeu contratos de dólares futuros ao Banco Fonte Cindam e aos seus fundos por 1,322, ao passo que o preço de mercado no mercado de opções, onde estavam posicionados, indicava um preço de 1,346413. Assim, na prática, a Autoridade Monetária vendeu ativo que valia 1,346413 por 1,322.

21. No entanto, ao reexaminar a matéria, cheguei à conclusão de que essa realmente não é a melhor forma de calcular o débito, pois deve corresponder à soma dos ajustes diários, não ao diferencial das taxas de câmbio. Para contextualizar esse aspecto, cabe trazer, inicialmente, alguns trechos da Parecer do Ministério Público junto ao TCU (peça 32, pgs. 17-22):

11. Quanto à nova sistemática adotada pela 2. ª Secex para reavaliar o valor do débito, verifica-se que decorre do contexto do acolhimento da defesa dos responsáveis, no sentido de que as perdas do Banco Central no mercado futuro, relativamente às operações feitas com o Banco Fonte Cindam, foram compensadas pelo ganho da valorização do dólar à vista nas reservas internacionais (...)

12. Com as devidas escusas à Unidade Técnica, não partilhamos desse entendimento por dois motivos básicos. Primeiramente, o raciocínio somente se aplicaria a operações “normais” do Banco Central no mercado futuro, em que a atribuição de autoridade monetária referenda a utilização de instrumentos de regulação das atividades financeira e cambial do mercado em geral, não havendo de se confrontarem ganhos perdas nas operações para o fim de apurar responsabilidade dos gestores. Por isso, para esse cenário da ação regulatória exercida pelo Bacen, seria válido se falar que os ganhos e as perdas são considerados na composição do balanço contábil no lado passivo e no ativo.

13. Segundo, uma vez que as vendas de contratos no mercado de dólar futuro ao Banco Fonte Cindam, no dia 14.01.1999, se deram com a finalidade específica de socorro à instituição financeira (e não como instrumentos normais de política monetária ou cambial), mas a beneficiária não se enquadrava nos requisitos que autorizam a medida protetora sob a perspectiva de risco sistêmico ou dos ditames do Voto BCB n.º 066/99, é mais apropriado se concluir que, na verdade, se não tivesse realizado as operações (pois eram desnecessárias àquele fim), o Bacen teria preservado o montante total de reais despendido nos ajustes diários das operações (R$ 522.348.000,00), o qual por sua vez, se somaria à valorização (em real) das reservas internacionais. Como se deixou de preservar os valores em reais, houve uma transferência indevida de recursos públicos em favor de terceiros da esfera privada.

22. Nesse contexto, cabe trazer a fundamentação dessa operação feita pelo Banco Central, no expediente Aviso nº 006 /BCB-Presi (peça 19, pg. 34):

(...) o Banco Central permanece firme na posição até então defendida, ou seja, que a situação vivenciada pelo mercado financeiro naqueles dias rumorosos de janeiro de 1999 era de efetivo risco sistêmico. Concorria para isso, não apenas a situação de inadimplência apresentada pelos Bancos Marka e Fonte Cindam, mas toda uma conjuntura econômica, que ao menor sinal de fragilidade demonstrado pelas autoridades então de plantão no Governo Federal e no Banco Central, poderia deflagrar a tão nefasta crise sistêmica, com consequências imprevisíveis naquele momento. Esse sinal bem poderia ser o Banco Central se negar a honrar as posições do Banco Marka ou do Banco Fonte Cindam perante a BM&F, deixando que eles se tornassem inadimplentes e, em consequência, viessem a ser liquidados. Por isso, o momento exigia cautela e bom senso. E, foi com esses cuidados e espírito público que o Banco Central, por ato de sua Diretoria Colegiada, de comum acordo com o Governo Federal, decidiu pela venda de contratos de câmbio futuro aos citados bancos, de modo a zerar seus patrimônios, no pressuposto de que essas operações afastariam o risco de crise (...).

23. Assim, a justificativa do Bacen para a realização da venda de 7.900 contratos ao Banco Fonte Cindam e aos seus fundos era para evitar uma crise sistêmica, com a possível inadimplência desse Banco. No entanto, conforme já analisado profundamente nos itens 3.34 a 3.68 da instrução constante na peça 31, fls. 16-51, no que diz respeito ao risco sistêmico, considerando que o Banco Fonte Cindam não estava na iminência de ser tornar insolvente, pelo contrário, tinha uma relativa folga patrimonial, e que havia liquidez suficiente para liquidar sua posição no próprio mercado de opções, fica fragilizada a alegação de que se o Bacen não agisse, esse Banco poderia quebrar, e consequentemente, originar uma crise sistêmica no país. Assim, sob esse aspecto de risco sistêmico, foi injustificável a atuação do Bacen.

24. Logo, procede a argumentação do Ministério Público junto ao TCU de que não cabia a medida protetora do Voto n.º 066/99 de socorro à essa instituição financeira e de que não era uma operação normal na condução da política cambial do país. Portanto, o entendimento anterior, de que o débito deveria ser o diferencial da taxa da operação com a praticada no mercado, deve ser alterado, para que seja a soma dos ajustes diários pagos pelo Bacen até a data de vencimento dos respectivos contratos vendidos, conforme valor da citação feita pelo ACÓRDÃO N° 2906/2008 TCU — Plenário, dada toda a atipicidade e consequente ilegalidade dessa operação realizada.

26. A Ministra-Relatora, por meio de despacho, determinou a análise do laudo pericial contábil (peças 33 e 34) elaborado no âmbito das ações popular e civil pública cumulada com improbidade administrativa, processadas, respectivamente, sob os números 1999.34.00.009903-7 e 1999.34.00.020289-0, em andamento na 22ª Vara Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal.

27. Esse laudo pericial está estruturado por meio de respostas aos quesitos formulados pelo(a): BB Investimentos, BM&F, Banco Fonte Cindam, Banco Central do Brasil e Ministério Público Federal. Na essência, os quesitos formulados pelas partes ao perito são similares. Assim, nos parágrafos seguintes, serão destacados os trechos mais relevantes desse laudo, com a respectiva análise.

26)‘Ao realizar as operações com BANCO FONTE CINDAM S/A e com os mencionados Fundos de Investimentos no mercado futuro, poupando dólares no mercado pronto, o BANCO CENTRAL, considerando-se a desvalorização do real em face do dólar, causou dano ao patrimônio público?’

Resposta:

Ao longo desta perícia foi demonstrado que a atuação do Banco Central do Brasil na operação sob exame (7.900 contratos de dólar futuro ao Banco Fonte Cindam S/A ao preço de R$ 1,3220) não causou prejuízo, pois o ganho da Autoridade Monetária em Reais (R$) com a manutenção de reservas em moeda norte-americana compensou a perda, também em Reais, com a desvalorização da moeda até data de vencimento da operação(...) (peça 33, pg. 38)

28. Essa afirmação da perícia procede parcialmente. De fato, houve a compensação das perdas. No entanto, conforme já evidenciado acima e na instrução constante na peça 31, fls. 16-51, foi uma operação que não atendeu a justificativa feita pelo Bacen acerca da necessidade de socorro financeiro, vez que o Banco Fonte Cindam não estava na iminência da insolvência. Além disso, foi feita a uma cotação bem vantajosa, pois foi abaixo da cotação no mercado futuro da Bolsa de Chicago e do mercado de opções da BM&F. Também foi uma transação que feriu o princípio da impessoalidade, pois somente o Banco Fonte Cindam teve acesso a esse tipo de operação ofertada pelo Bacen. Ademais, havia liquidez no mercado de opções, onde o Banco Fonte Cindam estava posicionado, permitindo a zeragem da sua posição no próprio mercado, sem a necessidade de atuação do Banco Central.

29. Dessa forma, essa venda de 7.900 feita pela Autoridade Monetária ao Banco Fonte Cindam e aos seus fundos foi atípica e desnecessária. Portanto, embora tenha ocorrido a compensação das perdas do mercado futuro com a valorização das reservas internacionais, como essa operação foi ilegal, o Bacen, na realidade, deixou de obter um ganho correspondente ao que pagou a título de ajustes diários, que correspondeu R$ 522.348.000,00 (R$ 171.912.000,00 + R$ 350.436.000,00, valores da citação feita no ACÓRDÃO N° 2906/2008 TCU — Plenário), uma vez que esse seria ganho do Bacen decorrente da valorização em reais das reservas internacionais, caso não fizesse essa transação.

‘Queira o i. Perito informar se é correto afirmar que o preço do dólar norte-americano praticado pelo Banco Central do Brasil, em 14 de janeiro de 1999, quando da transferência ao Banco Fonte Cindam S/A dos contratos de que trata a presente ação foi de R$ 1,3222?’

Resposta:

A cotação do dólar utilizada pelo Banco Central do Brasil, em 14/01/1999, para a venda dos contratos futuros foi de R$ 1,322/US$ 1,00, conforme estabelecido no Comunicado nº 6.560/99 (fl. 58), que alterou a faixa de flutuação conforme consta no item II, in verbis:

‘II - a faixa de flutuação terá, doravante, como limite inferior, R$ 1,20 (um real e vinte centavos) por um dólar dos Estados Unidos, e, como limite superior, R$ 1,32 (um real e trinta e dois centavos) por um dólar dos Estados Unidos’

Diante deste cenário, o Banco Central do Brasil vendeu em 14/01/1999 ao Banco Fonte Cindam S/A 7.900 (sete mil e novecentos) contratos de dólar futuro ao preço de R$ 1,3220 por dólar. Sendo que este preço foi fechado acima do limite superior da banda e das cotações praticadas no mercado futuro (de R$ 1,32 – Comunicado nº 6.560/99) em R$ 0,0020.’ (peça 33, pg. 46)

30. Essa questão da precificação da operação foi detalhadamente analisada nos itens 3.92 a 3.106 da instrução constante na peça 31, fls. 16-51. Assim, o preço de 1,322 do dólar foi bem abaixo da cotação que deveria ser praticada. Foi utilizada a cotação do dólar à vista para precificar uma operação feita no mercado futuro, acarretando uma operação com uma taxa subavaliada. Esses são mercados bem distintos, com formas de precificação diferentes. Assim, o laudo pericial não considerou que se trata de mercados diversos. Nesse contexto, complementando a análise feita na instrução anterior, deve-se trazer trechos dos normativos que tratavam das bandas cambiais à época.

RESOLUÇÃO Nº 2234/96

Art. 1º As operações de câmbio do Banco Central do Brasil nos mercados interbancários de câmbio dos segmentos de taxas livres e de taxas flutuantes obedecerão a uma sistemática de faixas de flutuação ou bandas.

Parágrafo único. As faixas de flutuação serão definidas periodicamente pelo Banco Central do Brasil.

Art. 2º O Banco Central do Brasil intervirá obrigatoriamente nos mercados interbancários de câmbio sempre que os limites das faixas de flutuação, superior ou inferior, forem atingidos pelas taxas praticadas no mercado.

COMUNICADO N. 006560/99

I – as intervenções de compra e venda de dólares dos Estados Unidos pelo Banco Central do Brasil nos mercados interbancários de cambio - segmentos de taxas livres e de taxas flutuantes continuarão a obedecer a sistemática de "faixas de flutuação" (bandas);

II - a "faixa de flutuação" terá, doravante, como limite inferior, R$ 1,20 (um real e vinte centavos) por um dólar dos Estados Unidos e, como limite superior, R$ 1,32 (um real e trinta e dois centavos) por um dólar dos Estados Unidos;

III - o Banco Central intervirá nos mercados interbancários de cambio através de leiloes eletrônicos sempre que os limites inferior ("piso") ou superior ("teto") forem atingidos pelas taxas praticadas no mercado;

31. O art. 1º da Resolução nº 2234/96 determinava que o Bacen tinha a obrigação de intervir no mercado interbancário de câmbio, somente no segmento de taxas livres e taxas flutuantes, não no segmento do mercado futuro, negociado em bolsa de valores. O Comunicado nº 6.560/99, no item I, expressamente prevê que as intervenções ocorrem com a compra e venda de dólares dos Estados Unidos, ou seja, comprar dólares significa, na essência, entregar reais e receber dólares pela taxa pactuada, e vender dólar é a operação inversa, com a entrega de dólares e o recebimento em reais. Já no mercado futuro, conforme evidenciado ao longo deste processo, não há troca de reais por dólares. As partes, ao negociarem contratos de dólar na BM&F, simplesmente depositam margens em reais, sendo que os ajustes financeiros diários são em reais, não havendo permuta dessas duas moedas.

32. Assim, em outras palavras, a necessidade de intervenção, com base nesses normativos, ocorre quando a cotação do mercado à vista (ou pronto) atingir o pico e o piso, respectivamente, de R$ 1,32 e R$ 1,20, independentemente qualquer que seja a cotação do mercado futuro (estando acima ou a baixo da banda cambial). Por exemplo, se um determinado dia durante esse regime cambial, o dólar à vista estivesse em 1,31 e o futuro em 1,33, o Bacen não seria obrigado a intervir no mercado de câmbio, pois dólar à vista estava abaixo da banda superior de 1,32. Portanto, a obrigação de o Bacen intervir no câmbio, com base nesses normativos, é no mercado à vista, não no futuro.

33. Nesse contexto, data máxima vênia, não procede o entendimento do perito de que a cotação do mercado futuro deveria ser o teto do mercado à vista, correspondente a R$ 1,32, limite da banda diagonal endógena, conforme análise feita na instrução na peça 31, fls. 16-51, por se tratarem de mercados diversos e com formas de precificação diferentes.

17) ‘Considerando-se as condições do mercado em 14.01.1999, era possível ao BANCO FONTE CINDAM S/A e aos aludidos Fundos de Investimento, naquela data, encerrar as suas posições?’

Resposta:

Dada a falta de liquidez no mercado, não era possível ao Bando Fonte Cindam e aos Fundos de Investimento encerrarem suas posições através de operações no mercado.

Fora das operações de mercado, o encerramento das posições só seria possível através da atuação do Banco Central do Brasil, em conformidade com o que estabelecem o Art. 2º da Resolução nº 2.234/96 (fl. 53/54) e os itens I, II, e III do Comunicado nº 6.580/99 (...) (peça 33, pg. 31)

34. Essa questão também já foi tratada no item 3.40 a 3.46 da instrução constante na peça 31, fls. 16-51. Assim, peço vênias à resposta do Perito, uma vez que foi demonstrado que, embora o mercado futuro estivesse travado, sem liquidez, o mercado de opções estava funcionando normalmente e apresentava liquidez suficiente para o Banco Fonte Cindam zerar a sua posição vendida, uma vez que era essencialmente nesse mercado de opções em que estava posicionada essa Instituição, não no mercado futuro.

35. Portanto, considerando que o Banco Fonte Cindam não estava na iminência de se tornar insolvente, e como era possível travar as suas perdas no próprio mercado de opções, essa operação feita com o Bacen foi desnecessária e injustificável.

36. Ademais, o laudo também indicou que, com a operação em comento, ao vender dólares no mercado futuro, o Bacen deixou de vender a mesma quantidade de dólares no mercado à vista, preservando suas reservas internacionais. Esse aspecto também foi analisado no item 3.58 da instrução constante na peça 31, fls. 16-51. É incontroverso que, na época da realização da operação, o país já tinha perdido uma quantia razoável das reservas e que manutenção do então nível era extremamente relevante. No entanto, isso, por si só, não justifica a transação. Isso não é motivo para que o Bacen faça operações com contratos futuros por um preço abaixo do mercado e também em afronta ao princípio da isonomia.

37. Assim, de uma forma geral, esses foram os principais aspectos desse laudo pericial acostado aos autos. Na essência, as outras informações trazidas nessa peça pericial já constam nesta TCE. Logo, mantém-se o entendimento evidenciado na instrução constante na peça 31, fls. 16-51, com as alterações propostas nesta instrução, não havendo qualquer outro reflexo relevante desse laudo neste processo.

38. Por fim, há mais um aspecto a ser reparado da última instrução. Houve o entendimento de que, como não havia indícios da má-fé nos autos, a proposta de mérito não foi pela irregularidade das contas, mas sim para o recolhimento do débito no prazo improrrogável de 15 dias. No entanto, deve-se concordar com o seguinte posicionamento do parecer do Ministério Público Junto ao TCU (peça 32, pg. 22):

A inexistência de indícios de má-fé na atuação dos gestores do Bacen não permite seja diretamente reconhecida a boa-fé de suas condutas. Os exames nos autos indicam que os gestores se omitiram, previamente ao fechamento as operações, em avaliar a efetiva situação financeira por que passava o Banco Fonte Cindam e os fundos por ele administrado, agindo, em ambiente externo ao funcionamento regular do mercado de futuro (BM&F e outros agentes), em afronta aos princípios da impessoalidade e da razoabilidade no socorro de instituição privada, e expondo em risco inescusável a administração de recursos público confiado a Bacen. Assim, a conduta negligente dos gestores do Banco Central inviabiliza que lhes seja reconhecida a boa-fé pelo Tribunal e, em consequência, exclui o benefício da fixação de novo prazo para recolhimento da dívida, nos termos do art. 12, § 2º, da Lei nº. 8.443/92.

CONCLUSÃO

39. A Ministra-Relatora Ana Arraes determinou, por meio de despacho, que a Secex-Fazenda realizasse diligência para obter a íntegra das decisões judiciais proferidas contra os responsáveis nesta TCE, bem como reavaliasse a metodologia do cálculo de débito feita na análise da defesa dos responsáveis deste processo. Também determinou a análise de um laudo pericial acostado aos auto.

40. Quanto ao primeiro item, constatou-se que a ação penal contra os responsáveis citados neste TCE encontra-se na fase de recurso especial no Superior Tribunal de Justiça. Assim, como não há o transito em julgado da esfera penal, não ocorre a comunicação para a esfera administrativa, permanecendo em vigor a independência das instâncias administrativas e penal (itens 13-19).

41. No que se refere à metodologia de cálculo do débito, houve mudança de entendimento. Como foi uma operação atípica (fora das condições normais de negociação em bolsa de valores), abaixo da cotação de mercado e em ofensa ao Princípio da Isonomia, o débito deve ser o prejuízo total sofrido pelo Banco Central, que corresponde à soma dos ajustes diários pagos pelo Banco Central e não apenas ao diferencial da taxa de câmbio praticada na operação com a do mercado. (itens 20-24)

42. Quanto ao laudo pericial acostado aos autos, não há reflexos relevantes para a apreciação destas contas. (itens 25-36)

43. Portanto, para não tornar esta instrução excessivamente longa, não será repetida a conclusão da instrução feita na peça 31, fls. 15-51. No entanto, quanto à proposta de encaminhamento, será replicada, com algumas alterações com base no que foi analisado nesta instrução. Basicamente, haverá proposta para o valor do débito ser o mesmo valor da citação e para as contas serem julgadas irregulares.

BENEFÍCIOS DAS AÇÕES DE CONTROLE EXTERNO

44. Entre os benefícios do exame desta tomada de contas especial pode-se mencionar a expectativa de controle, o débito de R$ 522.348.000,00 (R$ 1.282.563.249,74, atualizado até 4/12/2013) e a multa a ser aplicada pelo Tribunal.

PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

45. Diante do exposto, submetemos os autos à consideração superior, propondo ao Tribunal:

a) com fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso I, 17 e 23, inciso I, da Lei 8.443/1992 c/c os arts. 1º, inciso I, 207 e 214, inciso I, do Regimento Interno, que sejam julgadas regulares as contas dos Srs. Luiz Antônio Andrade Gonçalves (na condição de Presidente do Banco Fonte Cindam, CPF 007.600.486-49) e dos sucessores de Roberto José Steinfeld (na condição de Diretor Executivo do Banco Fonte Cindam, CPF 548.384.957-49), dando-lhes quitação plena.

b) com fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso III, alínea(s) “b” e “c”, e § 2º da Lei 8.443/1992 c/c os arts. 19 e 23, inciso III, da mesma Lei, e com arts. 1º, inciso I, 209, incisos II e III e § 5º, 210 e 214, inciso III, do Regimento Interno, que sejam julgadas irregulares as contas dos Srs. Cláudio Ness Mauch (ex-Diretor de Fiscalização do Banco Central do Brasil, CPF 060.895.180-34), Demósthenes Madureira Pinho Neto (ex-Diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central do Brasil, CPF 847.078.877-91) e Francisco de Pádua Lopes (ex-Diretor de Política Monetária e ex-Presidente em exercício do Banco Central do Brasil, CPF 110.015.857-04), e condená-los, em solidariedade, com o Banco Fonte Cindam S.A. (CNPJ 33.794.033/0001-00), ao pagamento das quantias a seguir especificadas, com a fixação do prazo de quinze dias, a contar das notificações, para comprovarem, perante o Tribunal (art. 214, inciso III, alínea “a”, do Regimento Interno), o recolhimento das dívidas aos cofres do Tesouro Nacional, atualizadas monetariamente e acrescidas dos juros de mora, calculados a partir das datas discriminadas, até a data dos recolhimentos, na forma prevista na legislação em vigor:

b.1) R$ 171.912.000,00 (cento e setenta e um milhões, novecentos e doze mil reais), a contar de 1º.2.1999, decorrentes do pagamento de ajustes financeiros na Bolsa de Mercadoria e Futuros em razão da venda, pelo Banco Central do Brasil, ocorrida em 14.1.1999, de 2.600 contratos de futuro de câmbio vendidos ao Banco Fonte Cindam e fundo Trade II, com o preço abaixo do praticado no mercado no dia da operação, bem como por não conseguirem demonstrar a existência de risco sistêmico no momento em que foi realizada a transação;

b.2) R$ 350.436.000,00 (trezentos e cinquenta milhões, quatrocentos e trinta e seis mil reais), a contar de 1°.2.1999, decorrentes do pagamento de ajustes financeiros na Bolsa de Mercadoria e Futuros em razão da venda, pelo Banco Central do Brasil, ocorrida em 14.1.1999, de 5.300 contratos de futuro de câmbio ao Banco Fonte Cindam S/A para cobrir posições dos fundos de investimento Jaguar, Absoluto, Derivativo, Star, FIF 30, C&D, BA FIF e Sun-II, com o preço abaixo do praticado no mercado no dia da operação, bem como por não conseguirem demonstrar a existência de risco sistêmico no momento em que foi realizada a transação;

c) aplicar aos Srs. Cláudio Ness Mauch (ex-Diretor de Fiscalização do Banco Central do Brasil, CPF 060.895.180-34), Demósthenes Madureira Pinho Neto (ex-Diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central do Brasil, CPF 847.078.877-91) e Francisco de Pádua Lopes (ex-Diretor de Política Monetária e ex-Presidente em exercício do Banco Central do Brasil, CPF 110.015.857-04), e, em solidariedade, o Banco Fonte Cindam S.A. (CNPJ 33.794.033/0001-00), a multa prevista no art. 57 da Lei 8.443/1992 c/c o art. 267 do Regimento Interno, fixando-lhes o prazo de 15 (quinze) dias, a contar das notificações, para comprovarem, perante o Tribunal (art. 214, inciso III, alínea “a”, do Regimento Interno), o recolhimento das dívidas aos cofres do Tesouro Nacional, atualizadas monetariamente desde a data do acórdão que vier a ser proferido até a dos efetivos recolhimentos, se forem pagas após o vencimento, na forma da legislação em vigor;

d) autorizar, desde logo, nos termos do art. 28, inciso II, da Lei 8.443/1992, a cobrança judicial das, dívidas caso não atendidas as notificações;

e) encaminhar cópia do Relatório e Voto do Acórdão que vier a ser proferido, para o Ministério Público da União, para o Banco Central do Brasil e para todos os responsáveis citados nesta TCE, no caso do Banco Fonte Cindam S.A. (CNPJ 33.794.033/0001-00) na figura da sua advogada, Sra. Ana Teresa Palhares Basílio (OAB/RJ nº 74.802, no seguinte endereço: Av. Presidente Wilson, nº 210, 12º andar, Centro, CEP 20030-021, RJ, RJ);

10. O Ministério Público junto ao TCU – MPTCU reiterou a proposta de irregularidade, débito e multa aos responsáveis nos termos do parecer a seguir transcrito:

“Retornaram os autos a este Gabinete após a Secretaria de Controle Externo da Fazenda Nacional (Secex-Fazenda/TCU) cumprir as providências determinadas pela então Relatora, eminente Ministra Ana Arraes (peça 35), acerca do alcance das decisões proferidas pela justiça criminal quanto aos fatos tratados no presente processo, estendendo-se o exame também ao laudo pericial juntado e à divergência da metodologia de cálculo do débito verificada entre a proposta da Unidade Técnica e o pronunciamento anterior deste Ministério Público (peças 31, p. 15/51, e 32/34).

2. Realizadas as diligências aos Tribunais Regionais Federais e obtida cópia da sentença prolatada na Ação Penal n.º 99.0046981-0, a Unidade Técnica consignou que estava em fase de análise recurso especial no Superior Tribunal de Justiça (REsp 1385522/RJ), não tendo havido decisão a respeito até a data de término da instrução (dezembro de 2013). Ante a inocorrência de trânsito em julgado da matéria, concluiu a Unidade Técnica pelo prosseguimento normal do presente processo, subsistindo a independência das instâncias penal, civil e administrativa.

3. Quanto à metodologia de cálculo do débito, a Secex-Fazenda reavaliou a sistemática anteriormente defendida por ela, passando a compartilhar do entendimento desenvolvido por esta representante do Ministério Público nos autos (peça 32, p. 17/22), no sentido de que a apuração do débito se faz pelo valor integral dos ajustes diários despendidos pelo Banco Central em favor do Banco Fonte Cindam S/A entre o início e o vencimento da operação, e não pelo diferencial das respectivas taxas de câmbio (peças 43/45).

4. A propósito, a linha de raciocínio que se reputa indevida agora em tratamento uniforme pela Unidade Técnica e por este Parquet – ou seja, a de que as perdas do Banco Central no mercado futuro, relativamente às operações feitas com o Banco Fonte Cindam, teriam sido compensadas pelo ganho da valorização do dólar à vista nas reservas internacionais, sem ocorrer prejuízo ao erário público – é defendida no laudo pericial emitido no juízo criminal.

5. Posteriormente, os representantes processuais do Banco Fonte Cindam S/A, dos Senhores Fernando César O. de Carvalho e Luiz Antônio Andrade Gonçalves e do espólio do Senhor Roberto José Steinfeld, acostaram aos autos documento (peça 50) em que refutam a existência de prejuízo ao Banco Central do Brasil nas operações efetuadas com o Banco Fonte Cindam, contraditando o resultado do pronunciamento desta representante do Ministério Público e também do derradeiro exame da Unidade Técnica. O ponto preponderante da defesa consiste em que as operações de aquisição de dólares seriam regulares, pois, em princípio, ocorreriam no mercado a vista, mas que, em virtude da crise instaurada com a alteração do regime de bandas, foi realizada no mercado futuro.

6. Nesse caso, tanto em relação à improcedência do laudo pericial quanto à da novel peça de defesa, reproduzimos a seguir as razões que embasaram nosso parecer anterior a respeito da impropriedade do raciocínio de ausência de prejuízo, no contexto da atuação do Bacen externamente ao ambiente de utilização de instrumentos regulatórios das atividades financeira e cambial do mercado em geral (peça 32, p. 19/20):

“12. (...) não partilhamos desse entendimento [de que as perdas do Banco Central no mercado futuro, relativamente às operações feitas com o Banco Fonte Cindam, teriam sido compensadas pelo ganho da valorização do dólar à vista nas reservas internacionais] por dois motivos básicos. Primeiramente, o raciocínio somente se aplicaria a operações ‘normais’ do Banco Central no mercado futuro, em que a atribuição de autoridade monetária referenda a utilização de instrumentos de regulação das atividades financeira e cambial do mercado em geral, não havendo de se confrontarem ganhos e perdas nas operações para o fim de apurar responsabilidade dos gestores. Por isso, para esse cenário da ação regulatória exercida pelo Bacen, seria válido se falar que os ganhos e as perdas são considerados na composição do balanço contábil no lado passivo e no ativo.

13. Segundo, uma vez que as vendas de contratos no mercado de dólar futuro ao Banco Fonte Cindam, no dia 14.01.1999, se deram com a finalidade específica de socorro à instituição financeira (e não como instrumentos normais de política monetária ou cambial), mas a beneficiária não se enquadrava nos requisitos que autorizavam a medida protetora sob a perspectiva de risco sistêmico ou dos ditames do Voto BCB n.º 006/99, é mais apropriado se concluir que, na verdade, se não tivesse realizado as operações (pois eram desnecessárias àquele fim), o Bacen teria preservado o montante total de reais despendido nos ajustes diários das operações (R$ 522.348.000,00), o qual, por sua vez, se somaria à valorização (em real) das reservas internacionais. Como se deixou de preservar os valores em reais, houve uma transferência indevida de recursos públicos em favor de terceiros da esfera privada.

14. Também sob uma ótica mais técnica, o então dirigente da 2.ª Secex na fase anterior à citação já havia discordado da ideia de comparar gastos em reais com a manutenção de reservas cambiais, nos seguintes termos (fl. 69 do vol. princ.):

‘7.7. O prejuízo, em tese, não é o problema que afeta este processo. O que o afeta é a transferência de recursos de ente público, o BACEN, para privados, Banco Marka, Banco Fonte Cindam e fundos de investimento, sem justificativa técnica e sem vinculação com as atividades legais do ente público, ou seja, as políticas públicas que persegue, quais sejam a execução da política monetária e cambial.

7.8. De tudo apresentado, uma das mais inconsistentes argumentações apresentadas pelos responsáveis foi a de que, na realidade, as operações não trouxeram prejuízo ao BACEN, visto que os ajustes diários enfrentados pela abertura das posições vendidas em contratos futuros foram contrabalançadas pela valorização das reservas cambiais que deixaram de ser vendidas.

7.9. Tal raciocínio busca relacionar dois resultados que não guardam relação entre si. No caso, a desvalorização da moeda (...) promoveu uma valorização estritamente contábil, visto ter propiciado um aumento nominal das reservas em Reais, mas um valor real [ou efetivo] imodificado em termos de moeda forte. O que se verificou, nesse caso, é que em termos contábeis ocorreu ganho, mas não em termos econômicos.

7.10. Quanto às perdas, verificamos que surgiram em razão da criação de posições que não existiam até então e resultaram na transferência de recursos financeiros às contas das contrapartes, consistindo de perdas reais, ou seja, econômicas.

7.11. Por essa razão, conclui-se que, caso não tivessem sido abertas as posições, somente o ganho contábil teria ocorrido, o que não pode ser considerado um ganho em termos de resultado para a política monetária, não havendo perda econômica, visto que não houve transferência de recursos financeiros para terceiros.

7.12. A argumentação de valorização das reservas preservadas é, portanto, inadequada, em termos econômicos, para contrabalançar as perdas econômicas oriundas dos ajustes diários das posições abertas em mercados futuros’.”

7. Complementando o arrazoado acima, acrescemos agora que o laudo pericial, ao referir-se à suposta ausência de prejuízo ao Bacen nas operações, deixa também de considerar o benefício financeiro que o Banco Fonte Cindam auferiu indevidamente na transação, ao adquirir dólares em condições favorecidas. Noutras palavras, mesmo que não houvesse prejuízo ao erário público, a atuação do Bacen seria irregular por favorecer instituição financeira privada e seus fundos com tratamento privilegiado. Assim, é também inviável reputar regulares as operações com base na hipótese de que as aquisições de dólares poderiam ocorrer no mercado a vista, pois estas se diferenciam, entre outros aspectos, pelo ambiente de oferta e demanda da moeda entre as instituições interessadas durante o funcionamento normal do mercado (no qual a atuação do Bacen ocorre de forma indireta e impessoal nos leilões eletrônicos de câmbio, por intermédio das instituições previamente autorizadas, chamadas de dealers) e pela necessidade de dispêndio imediato de montante expressivo de dólares pelo Banco Fonte Cindam (em vez de apenas gastos com ajustes diários na moeda real).

8. Quanto aos demais aspectos examinados pela Secex-Fazenda, não há reparos ou comentários adicionais a fazer, exceto sobre o desfecho processual no TCU a respeito da participação dos dirigentes do Banco Fonte Cindam nas operações – Senhores Luiz Antônio Andrade Gonçalves (Presidente) e Roberto José Steinfeld (Diretor Executivo; falecido).

9. Na sentença da Ação Penal n.º 99.0046981-0, a responsabilidade do Senhor Luiz Antônio Andrade Gonçalves foi atribuída pelo juízo da Sexta Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro em sede do crime de peculato (art. 312 do Código Penal), baseando-se as provas dos autos na conduta do agente em obter uma operação ilícita no Banco Central favorável à pretensão do Banco Fonte Cindam (item 12.3 da peça 42, p. 272-280). O agente também foi enquadrado pelo juízo no crime de gestão temerária (art. 4.º, parágrafo único, da Lei n.º 7.492/86), em virtude da exposição cambial excessiva verificada em janeiro de 1999 pelo Banco Fonte Cindam (peça 41, p. 252-253, e peça 42, p. 281-290, 324-325 e 328-330). Os mesmos crimes foram atribuídos ao Senhor Roberto José Steinfeld, cuja punibilidade foi extinta em razão de seu falecimento (peça 42, p. 280-281, 324-325 e 330-332; e peça 51, p. 121).

10. Não obteve êxito a Secex-Fazenda em trazer as peças referentes à apelação impetrada perante o Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (item 15 da peça 43), razão por que se aguardou neste Gabinete o resultado de idêntica determinação da então Relatora, ilustre Ministra Ana Arraes, feita no processo relativo às operações do Banco Marka S/A (TC-033.048/2008-4), atualmente sob a relatoria do eminente Ministro Benjamin Zymler. Desta feita, juntamos aos presentes autos os documentos acostados em 16/01/2015 àqueles autos a respeito da apelação criminal no TRF-2.ª Região (peças 51/54), nos quais as operações do Banco Marka e Banco Fonte Cindam são tratadas no mesmo processo criminal.

11. Na data de 12/11/2008, a decisão do TRF-2.ª Região na fase de apelação foi, especificamente acerca das operações do Banco Fonte Cindam, no sentido de absolver o Senhor Luiz Antônio de Andrade Gonçalves do crime de gestão temerária e reduzir a pena que lhe foi aplicada pelo crime de peculato (peça 51, p. 151/154).

12. Já nos procedimentos desta TCE, a responsabilidade de ressarcimento do débito está atribuída à pessoa jurídica do Banco Fonte Cindam por ser esta instituição financeira a beneficiária dos valores das operações indevidas. Por outro lado, ante a circunstância de que agentes privados que não gerenciam recursos públicos não se submetem ordinariamente ao dever de prestar contas ao TCU, a ausência nos presentes autos de elementos indicativos do cometimento de atos ilícitos em desfavor da pessoa jurídica da instituição financeira ou do Bacen, bem como a inexistência de evidências de conluio ou desvio de valores em proveito pessoal dos dirigentes do Banco Fonte Cindam, conduziram ao entendimento uniforme da Unidade Técnica e deste Ministério Público quanto ao acolhimento das defesas do Senhor Luiz Antônio Andrade Gonçalves e do espólio do Senhor Roberto José Steinfeld. Isso implica, conforme ponderado em nosso parecer anterior, a exclusão da responsabilidade dos dirigentes do Banco Fonte Cindam da relação jurídica processual, pois os agentes privados deixam de estar sob a jurisdição do TCU.

13. Na atualidade, o andamento processual do REsp 1385522/RJ no Superior Tribunal de Justiça indica a redistribuição dos autos a Relator por prevenção, ao qual estão conclusos desde 09/04/2014 (peça 55). Na mesma linha de raciocínio defendida pela Unidade Técnica quanto à inexistência de trânsito em julgado na esfera judicial, prossegue normalmente o presente processo ao abrigo do princípio da independência das instâncias penal, civil e administrativa.

14. Diante do exposto, esta representante do Ministério Público manifesta-se por manter os termos do pronunciamento anterior nos autos, com os quais está em consonância a ulterior instrução e parecer da Unidade Técnica (peças 43/45), para que sejam adotadas as seguintes medidas:

I – acolher as alegações de defesa apresentadas pelo Senhor Luiz Antônio Andrade Gonçalves (Presidente do Banco Fonte Cindam S/A) e pelos sucessores do Senhor Roberto José Steinfeld (Diretor Executivo do Banco Fonte Cindam S/A, falecido), excluindo da relação jurídica processual as correspondentes responsabilidades;

II – com fundamento no art. 16, inciso III, alíneas “b” e “c”, da Lei n.º 8.443/92, julgar irregulares as contas dos seguintes gestores do Banco Central do Brasil no exercício de 1999 – Senhores Cláudio Ness Mauch (Diretor de Fiscalização), Demósthenes Madureira de Pinho Neto (Diretor de Assuntos Internacionais do Bacen) e Francisco de Pádua Lopes (Diretor de Política Monetária e Presidente em exercício), condenando-os ao pagamento aos cofres do Banco Central do Brasil do débito abaixo indicado, em solidariedade com a pessoa jurídica do Banco Fonte Cindam S/A (CNPJ 33.794.033/0001-00):

a) R$ 171.912.000,00 (cento e setenta e um milhões, novecentos e doze mil reais), acrescidos de atualização monetária e juros de mora a contar de 01/02/1999, na forma da legislação em vigor, correspondentes ao pagamento de ajustes financeiros na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) pela venda, em 14/01/1999, de 2.600 contratos de futuro de câmbio ao Banco Fonte Cindam S/A e ao fundo Trade II; e

b) R$ 350.436.000,00 (trezentos e cinquenta milhões, quatrocentos e trinta e seis mil reais), acrescidos de atualização monetária e juros de mora a contar de 01/02/1999, na forma da legislação em vigor, correspondentes ao pagamento de ajustes financeiros na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) pela venda, em 14/01/1999, de 5.300 contratos de futuro de câmbio ao Banco Fonte Cindam S/A para cobrir posições dos fundos de investimento Jaguar, Absoluto, Derivativo, Star, FIF 30, C&D, BA FIF e Sun-II; e

III – aplicar aos responsáveis – gestores públicos e instituição financeira privada indicados no inciso II – a multa prevista nos arts. 19, caput, e 57 da Lei n.º 8.443/92.”

É o relatório.

VOTO

Por meio do acórdão 2.906/2008-Plenário (sigiloso), foi convertida nesta tomada de contas especial representação da antiga 2ª Secretaria de Controle Externo – Secex-2 acerca de irregularidades na execução, pelo Banco Central do Brasil – Bacen, da política cambial adotada durante a denominada crise cambial de janeiro de 1999, com possíveis favorecimento indevido a empresas privadas e prejuízos vultosos à Administração Pública Federal.

2. Naquela oportunidade, por intermédio do Comunicado 6.560, de 13/1/1999, o Bacen adotou nova sistemática de política cambial, denominada “banda larga”, em substituição à então existente de “minibandas”. Essa mudança provocou desvalorização imediata do Real em aproximadamente 9% e, até o final de janeiro, em mais de 64% (1,982/1,207).

3. Esse fato impactou os mercados de dólar futuro e de opções da Bolsa Mercantil de Futuros – BM&F, em especial os investidores que se encontravam na posição “vendida”, que possuíam diversos contratos indexados ao dólar que teriam que ser honrados com base na variação da taxa de câmbio daquela moeda.

4. Considerando que, até então, esses contratos só poderiam oscilar 1% para cima ou para baixo, a brusca valorização de 9% travou o mercado de dólar futuro e levou a BM&F a interromper essas operações.

5. Em razão das dificuldades, os Bancos Marka e FonteCindam e seus respectivos fundos de investimento, que se encontravam em posição “vendida” - isto é, necessitavam de dólares à vista ou negociados no próprio mercado de derivativos dessa moeda - foram ao Bacen e informaram que não possuíam condições de honrar seus contratos junto à BM&F.

6. Sob a alegação da possibilidade de risco sistêmico com uma possível falência dessas instituições, a diretoria do Bacen autorizou operação de venda ao Banco FonteCindam de 7.900 contratos, no valor nominal de R$ 1.044.380.000,00, ao câmbio de R$ 1,322/US$ 1.00, quando o mercado já negociava a R$ 1,346413/US$ 1.00. Tais contratos teriam que ser honrados até 1º de fevereiro de 1999 e, deles, 2.600 tinham interferência direta no patrimônio da instituição bancária, enquanto 5.300 pertenciam a fundos independentes, o que significa que os reflexos da crise cambial incidiriam sobre o patrimônio dos mesmos, e não do banco.

7. Até 1º de fevereiro de 1999, data de vencimento daqueles contratos, o Bacen estaria obrigado a honrar junto à BM&F o equivalente à variação diária do câmbio. Por esse motivo, entre os dias 14 de janeiro e 1º de fevereiro de 1999, o Bacen desembolsou o equivalente a R$ 522.348.000,00, que deveriam ter sido honrados pelo Banco FonteCindam.

8. É relevante destacar que o Bacen injetou no mercado de derivativos, no bimestre janeiro/fevereiro de 1999, cerca de R$ 14 bilhões, o que ocasionou perdas totais da ordem de R$ 7,6 bilhões (peça 1, página 9), nos termos das normas em vigor. Questiona-se, contudo, nesta TCE, apenas o socorro feito ao Banco FonteCindam, uma vez que foi realizado em desacordo com o ordenamento jurídico e sem qualquer embasamento técnico, como será demonstrado.

9. A decisão do Bacen para socorrer diretamente o Banco FonteCindam foi adotada no dia 14 de janeiro de 1999, nos termos do voto 006/1999, abaixo transcrito, e teve como fundamento a possibilidade de uma crise sistêmica que poderia atingir o mercado como um todo:

"Senhores Diretores,

Como é do conhecimento de V.Sas., este Banco Central, por meio do Comunicado n° 6.560, de 13 de janeiro de 1999, alterou a faixa de flutuação' (bandas) nos mercados interbancários de câmbio — segmento de taxas livres e taxas flutuantes.

2. Em consequência dessa modificação recebemos da Bolsa de Mercadorias e Futuros - BM&F, nesta data, correspondência informando a respeito de sua preocupação em relação a uma crise sistêmica que pode vir a atingir o mercado como um todo, caso não haja a adoção de mecanismos que possibilitem às instituições financeiras a reversão de suas posições, o que sinaliza a dificuldade que estas podem vir a ter em honrar seus compromissos perante terceiros, tendo em vista o nível alcançado nas cotações do dólar norte-americano em relação ao Real, bem como a rigidez que esse mercado passou a apresentar. (grifei)

3. Presente esse quadro e ante a necessidade da manutenção da política cambial e da estabilidade do sistema financeiro nacional, propomos a esse colegiado, como medida preventiva, a realização, pelo Departamento de Operação das Reservas Internacionais - DEPIN, de operações de venda de dólar futuro junto à BM&F, com o propósito de viabilizar a liquidação de posições vendidas nesses mercados futuros de dólar norte-americano de instituições que evidenciem tais dificuldades, permitindo, com isso, seja assegurada a normalidade da economia pública e resguardados os interesses de depositantes, investidores e demais credores.

4. Em caso de aprovação da presente proposta, fica, desde já, autorizado o DEPIN a realizar as operações de que se trata;

É o que levamos ao conhecimento e à consideração de V. Sas., com o nosso voto favorável"

10. Foi argumentado, ainda, que “as operações com mercado futuro de dólar promoviam um alívio de pressão sobre as reservas do país. Atuando no mercado futuro, o Banco Central atendia à demanda por hedge cambial dos entes econômicos, evitando excessiva pressão compradora no mercado à vista e, dessa forma, preservando e economizando as divisas necessárias para estabilidade cambial e monetária”.

11. Posteriormente, o fundamento de crise sistêmica foi confirmado por carta da BM&F recebida em 15 de janeiro de 1999 - um dia após o aporte financeiro feito ao Banco FonteCindam. Esse documento teve sua data alterada para forjar o entendimento de que o Banco Central teria adotado os procedimentos ora questionados com base em suposta informação do mercado, conforme mencionado no acima transcrito voto 006/1999 (peça 1, p. 6).

12. Há que se registrar, também, que a carta foi encaminhada a pedido da diretoria do Bacen, e não por iniciativa da própria BM&F. A operação, inclusive, teve participação direta daquela empresa, pois o mercado de dólar futuro estava travado e o negócio não poderia ter sido realizado sem sua atuação. Em síntese, a BM&F abriu exclusivamente para realizar a operação em favor do Banco FonteCindam.

13. A BM&F informou, posteriormente, que apenas indicava a possibilidade de risco sistêmico, mas que existiam “garantias e mecanismos suficientes para amortecer a inadimplência de qualquer dos comitentes” (peça 1, p. 6). Negou, inclusive, qualquer tipo de problema no mercado em que atuava, apesar da forte crise cambial por que passava o país (peça 1, p. 10).

14. Em razão das possíveis irregularidades, além do TCU, o Bacen, o Congresso Nacional e a Polícia Federal adotaram procedimentos para apurar os fatos ocorridos.

15. A comissão designada pelo Bacen, por meio da Portaria 9.090/99, concentrou-se na “apuração do possível vazamento de informações” e tratou, secundariamente, da regularidade das operações. Concluiu, assim, “que o movimento de tensão no mercado ocorreu em razão da saída do então presidente daquela instituição, Gustavo Franco, e propôs o arquivamento do processo” (peça 1, p. 7). Portanto, a comissão não examinou a legalidade dos procedimentos adotados pela diretoria do Bacen responsável pelo aporte de recursos ao Banco FonteCindam com fundamento no voto 006/1999 e muito menos seus aspectos técnicos que, de alguma forma, pudesse justificar a operação ora questionada.

16. A CPI instalada pelo Congresso Nacional concluiu que houve (peça 1, p. 7):

“a) entrega de patrimônio público a agentes econômicos privados, sem expressa autorização legal;

b) erro do Banco Central em não haver providenciado a liquidação do Marka e em ter realizado transferência de renda sem lei que respaldasse a ausência das garantias adequadas;

c) exacerbação do risco de crise sistêmica pela diretoria do Banco Central;

d) atuação temerária do Banco Marka, expondo-se em excesso ao risco cambial, e saída de divisas contra os interesses nacionais;

e) transferência de renda no socorro ao Banco FonteCindam, com locupletamento dos cotistas;

f) erro da BM&F em fornecer documento cujo conteúdo extrapola as suas competências”.

17. Na Polícia Federal, para apurar os fatos, foi instaurado inquérito, que deu ensejo à denúncia contra os responsáveis por essas operações, oferecida pelo Ministério Público Federal à Justiça Federal. Registre-se que já houve condenação em primeira e segunda instâncias e que as ações instauradas ainda se encontram em tramitação no poder Judiciário, em fase de recurso no Superior Tribunal de Justiça - STJ.

18. Como já mencionado, no âmbito desta Corte de Contas a matéria foi objeto de representação da antiga Secex-2, apreciada pelo acórdão 2.906/2008-Plenário que autorizou a instauração desta tomada de contas especial - TCE.

19. Ao apreciar a representação, o Tribunal questionou, em essência, os seguintes pontos:

a) legalidade da participação do Bacen no mercado de derivativos, ante o que dispõe o art. 11da Lei 4.595/1964;

b) legalidade dos procedimentos adotados pelo Bacen para socorrer os Bancos FonteCindam e Marka, ainda que se admitisse como legítima sua participação no mercado de derivativos;

c) possibilidade de ocorrência de risco sistêmico caso o Bacen não tivesse socorrido diretamente as duas instituições bancárias mencionadas;

d) possibilidade de o próprio mercado se ajustar à nova política cambial adotada pelo Bacen.

20. Citados, os responsáveis, amparados em pareceres de consultores e perícia, alegaram em sua defesa que:

a) o Tribunal de Contas da União não era competente para examinar a atuação do Bacen em assuntos de política monetária e cambial, por se tratar de atos discricionários;

b) o socorro à instituição financeira foi realizado em razão da possibilidade de uma crise sistêmica que poderia ocorrer com a falência do Banco FonteCindam;

c) não houve prejuízo ao erário federal, pois as perdas advindas da venda de contratos no mercado futuro foram compensadas com os ganhos auferidos com os dólares que permaneceram no caixa do Bacen.

21. Após examinar as alegações de defesa, a unidade técnica propôs, inicialmente (peça 31, p. 16), o julgamento pela irregularidade das contas, a condenação em débito e a aplicação de multa aos responsáveis.

22. Contudo, a instrução defendeu a redução do débito de R$ 522.348.000,00 para R$ 19.286.270,00, por aceitar a tese de que houve compensação entre as perdas sofridas com os contratos do Banco FonteCindam e os dólares que permaneceram no caixa do Bacen. O novo valor estimado do prejuízo corresponderia à diferença entre a taxa câmbio negociada pelo Bacen (1,322/US$ 1.00) e aquela já então praticada pelo mercado (R$ 1,346413/US$ 1.00).

23. Além disso, a unidade técnica entendeu que não caberia desconsideração da pessoa jurídica do Banco FonteCindam para responsabilizar seus dirigentes, eis que não teria havido “desvio de finalidade ou confusão patrimonial no caso concreto das transações de compra e venda realizadas”.

24. O Ministério Público junto ao TCU – MPTCU, entretanto, discordou da redução do débito.

25. Para tanto, argumentou que a existência de risco sistêmico não ficou comprovada no caso específico do Banco FonteCidam, pois aquela empresa e os fundos por ela administrados possuíam patrimônio suficiente para honrar seus compromissos no mercado de opções, que funcionava regularmente.

26. Não endossou, da mesma forma, a tese da unidade técnica de que as perdas advindas da venda de contratos no mercado de futuro foram compensadas com os ganhos auferidos com os dólares que permaneceram nas reservas administradas pelo Bacen, pelos motivos abaixo transcritos (peça 32):

“Primeiramente, o raciocínio somente se aplicaria a operações ‘normais’ do Banco Central no mercado futuro, em que a atribuição de autoridade monetária referenda a utilização de instrumentos de regulação das atividades financeiras e cambial do mercado em geral, não havendo de se contarem ganhos e perdas nas operações para o fim de apurar responsabilidade dos gestores. Por isso, para esse cenário da ação regulatória exercida pelo Bacen, seria válido se falar que os ganhos e as perdas são considerados na composição do balanço contábil no lado passivo e no ativo.

Segundo, uma vez que as vendas de contratos no mercado de dólar futuro ao Banco FonteCindam, no dia 14.01.1999, se deram com a finalidade específica de socorro à instituição financeira (e não com os instrumentos normais de política monetária ou cambial), mas a beneficiária não se enquadrava nos requisitos que autorizavam a medida protetora sob a perspectiva de risco sistêmico ou dos ditames do Voto BCB nº 006/99, é mais apropriado se concluir que, na verdade, se não tivesse realizado as operações (pois eram desnecessárias àquele fim), o Bacen teria preservado o montante total de reais despendido nos ajustes diários das operações (R$ 522.348.000,00), o qual, por sua vez, se somaria à valorização em real das reservas internacionais. Como se deixou de preservar os valores em reais, houve uma transferência indevida de recursos públicos em favor de terceiros da esfera privada”.

27. Afirmou também que se, por hipótese, a operação tivesse resultado em ganhos para o Bacen, o Banco FonteCidam, ao sentir-se prejudicado, iria buscar ressarcimento desses valores, uma vez que as operações foram realizadas “externamente ao regime das políticas monetária e cambial e eivadas de afronta aos princípios da impessoalidade e da razoabilidade”.

28. Deixou, ainda, de acolher argumento dos responsáveis, apresentado em memorial, de inexistência de débito, e foi contrário à proposta da unidade técnica de redução do valor incialmente fixado pelo acórdão 2.906/2008-Plenário de R$ 522.348.000,00 para. R$ 19.286.270,00. Argumentou que não seria razoável considerar como parâmetro “a taxa acumulada de juros de Certificados de Depósitos Interbancários (CDI) efetivamente ocorrida no período de 14.01 (data da operação) a 29.01.1999 (data do vencimento), por tratar-se de índice desconhecido do Bacen no dia da venda. Mais razoável seria tomar a taxa de câmbio do mercado à vista em 14.01.99 – R$ 1,32/US$ 1.00- e acrescentar-lhe a taxa acumulada de CDI com base na cotação desse dia (0,1031885; fl. 1466 do vol.7) e para o período até 29.01.1999 (12 dias úteis), abstendo-se de computar o prêmio de incerteza e outros encargos ante a indisponibilidade nos autos de elementos mais consistentes para aferi-los”.

29. Ao avaliar a questão, restituí os autos à unidade técnica (peça 34, p. 1-4) com o objetivo de:

“a) obter o inteiro teor das decisões proferidas pela Justiça Federal de 1° e 2° graus, para determinar seu efetivo alcance e elaborar nova instrução, com as propostas pertinentes, tomadas as necessárias providências em relação às citações dos responsáveis;

b) tratar da divergência existente nos autos a respeito da metodologia de cálculo do débito;

c) examinar o laudo pericial conclusivo acostado aos autos (fls. 1490/1576) e avaliar eventuais reflexos;

d) apor nota de sigilo aos autos”.

30. Ao reexaminar a matéria, o órgão instrutivo (peça 43) concluiu que o débito deveria corresponder à soma dos ajustes diários, e não ao diferencial das taxas de câmbio, conforme descrito nos itens 21 e 22 deste voto. Manifestou-se, desse modo, de acordo com a proposta do Ministério Público de que o valor do débito correspondia a R$ 522.348.000,00, e não a R$ 19.286.270,00.

31. Com relação às ações judiciais, noticiou que, apesar das condenações penais em primeira e segunda instâncias, ainda tramita no STJ recurso especial pendente de julgamento. Assim, com fundamento no princípio da independência das instâncias, defendeu o julgamento do mérito deste processo pela irregularidade das contas, com imputação solidária aos responsáveis do débito há pouco mencionado e aplicação da multa do art. 57 da Lei 8.443/1992.

32. O Ministério Público apenas reforçou seu entendimento anterior, acrescentando que “o laudo pericial, ao referir-se à suposta ausência de prejuízo ao Bacen nas operações, deixa também de considerar o benefício financeiro que o Banco FonteCindam auferiu indevidamente na transação, ao adquirir dólares em condições favorecidas. Noutras palavras, mesmo que não houvesse prejuízo ao erário público, a atuação do Bacen seria irregular por favorecer instituição financeira privada e seus fundos com tratamento privilegiado. Assim, é também inviável reputar regulares as operações com base na hipótese de que as aquisições de dólares poderiam ocorrer no mercado a vista, pois estas se diferenciam, entre outros aspectos, pelo ambiente de oferta e demanda da moeda entre as instituições interessadas durante o funcionamento normal do mercado (no qual a atuação do Bacen ocorre de forma indireta e impessoal nos leilões eletrônicos de câmbio, por intermédio das instituições previamente autorizadas, chamadas de dealers) e pela necessidade de dispêndio imediato de montante expressivo de dólares pelo Banco FonteCindam(em vez de apenas gastos com ajustes diários na moeda real)”.

33. Feito este resumido relato, registro, de pronto, que a tese de que o Bacen não possuía competência para atuar no mercado de derivativos foi superada quando da instauração desta TCE pelo acórdão 2.906/2008-Plenário. Naquela oportunidade, foi fixado entendimento de que o Banco, de fato, é competente para atuar no mercado de derivativos, o que torna desnecessária qualquer consideração a esse respeito. Antecipo, entretanto, que tal fato, por si só, não afasta as irregularidades na operação com o banco FonteCindam.

Poder discricionário

34. Têm razão a unidade técnica e o Ministério Público ao afirmarem que não cabe ao TCU rever atos discricionários praticados por agentes políticos ou administrativos, seja dos administradores do Bacen, quando da execução das políticas monetária e cambial, seja de quaisquer outros administradores públicos.

35. Contudo, como qualquer ato administrativo, o ato discricionário deve ser praticado nos limites definidos em lei. O poder discricionário não é salvo conduto para agir como convém ao gestor; não pode ser sinônimo de arbítrio. É uma liberdade restrita, para agir em observância ao interesse público, deferida ao administrador nos limites da lei. Deve, pois, observar os princípios gerais de direito e as normas vinculantes.

36. A avaliação de conveniência e a oportunidade conferida pelo poder discricionário não pode ser utilizada como instrumento de arbítrio; não pode ser empregada para beneficiar terceiro em detrimento das finanças públicas; não pode servir de instrumento para enriquecer o particular em detrimento do interesse público.

37. Aliás, o Supremo Tribunal Federal – STF considera possível o controle dos atos discricionários, conforme se observa nos excertos dos acórdãos abaixo transcritos:

ARE 793334/BA – BAHIA.

“o controle jurisdicional dos atos administrativos discricionários não viola o princípio constitucional da separação dos poderes”

....

“a apreciação pelo Poder Judiciário do ato administrativo discricionário tido por ilegal e abusivo não ofende o Princípio da separação dos poderes.”

RE 654170AgR/MA – MARANHÃO

“Possibilidade de controle judicial dos atos administrativos discricionários abusivos e ilegais”.

38. No caso concreto, por exemplo, o Bacen, nos meses de janeiro/fevereiro de 1999, movimentou na BM&F cerca de R$ 14 bilhões e teve perdas da ordem de R$ 7,6 bilhões (peça 1, p. 9). Não obstante a magnitude das perdas, apenas as operações realizadas com os Bancos FonteCindam e Marka estão sendo questionadas, visto que não foram observados os princípios constitucionais da publicidade, da impessoalidade e da finalidade nem foram apresentados critérios técnicos que justificassem a atuação da Autarquia em favor das instituições bancárias privadas.

39. Examina esta Corte, portanto, se os atos discricionários praticados pelos administradores do Bacen observaram o ordenamento jurídico então existente ou se foram praticados ao arrepio da lei e dos princípios gerais de direito, sem qualquer critério técnico. Em síntese, se foram abusivos e ilegais, como definido pelo STF.

40. Não devem ser acolhidas, desse modo, as alegações de defesa dos responsáveis de que esta Corte de Contas não tem competência para examinar a política cambial adotada pelos administradores do Bacen, por se tratar de ato discricionário.

Crise Sistêmica

41. Com relação à possibilidade de crise sistêmica em razão de eventual falência do Banco FonteCindam, não se questiona a necessidade de o Bacen praticar política cambial com o objetivo de regular o mercado e em defesa das reservas cambiais do país. Por isso mesmo, concordo com os pareceres das autoridades da área econômica apresentados pelos responsáveis ao defenderem a atuação do Bacen no mercado, especialmente naquele momento em que as reservas do país caiam vertiginosamente.

42. Como já dito, em janeiro e fevereiro de 1999, no auge da crise cambial, o Bacen atuou fortemente na BM&F e teve perdas da ordem de R$ 7,6 bilhões. Esse fato, contudo, não motivou questionamentos por parte desta Corte de Contas. Diante do cenário descrito nos autos, a atuação do Bacen foi importante para estancar uma possível crise sistêmica. Sem dúvida a autoridade monetária deve atuar de forma preventiva, e não esperar a crise ocorrer para adotar providências corretivas.

43. Ainda que possam ser feitas críticas por possíveis erros na dosagem aplicada, não vislumbro como poderia o TCU fazer questionamentos a respeito do tema.

44. Todavia, o poder discricionário não autorizava os administradores do Bacen a protegerem esse ou aquele investidor em caráter personalíssimo, como no caso do Banco FonteCindam, em detrimento do mercado como um todo, mormente quando ficou comprovado que a BM&F possuía garantias suficientes para honrar os compromissos assumidos.

45. Como demonstrou a unidade técnica, as garantias oferecidas pelo próprio FonteCidam eram suficientes para honrar seus compromissos junto à BM&F, em especial pelo fato de que “a maioria de suas posições estava no mercado de opções de taxa de câmbio (sem ajustes diários), não no mercado de dólar futuro (com ajustes diários), o que significava que não havia problema de liquidez imediata das suas posições”. (peça 1, p. 11)

46. Não havia fato que justificasse a intervenção do Bacen para favorecer diretamente o ente privado. Tivesse o FonteCindam procurado o mercado de opções, que continuava com liquidez suficiente, teria estancado suas perdas sem necessidade do socorro personalíssimo dado pela autoridade monetária.

47. Como destacou a unidade técnica, as defesas apresentadas pelos responsáveis, ainda que amparadas em pareceres de autoridades renomadas do mercado, foram genéricas: não houve análise da situação específica do FonteCindam; não foi apresentado nenhum estudo a respeito da legalidade do socorro àquela empresa; não foi apresentada justificativa acerca da possibilidade de a própria BM&F e o FonteCindam solucionarem o problema, não obstante esta Corte ter sempre questionado tais fatos.

48. Além do mais, os responsáveis não fizeram qualquer consideração a respeito da atuação regular do Bacen junto à BM&F, no período de 14 de janeiro a 1º de fevereiro de 1999, com o objetivo de atender ao mercado como um todo, e não apenas ao FonteCindam.

49. Como foi demonstrado ao longo da tramitação deste processo no TCU, o FonteCindam, na data da operação autorizada pelo Bacen, possuía patrimônio capaz de suportar uma elevação da taxa cambial até R$ 1,58/US$ 1.00, isso considerando as posições do próprio Fundo FonteCindam Trade II, que totalizavam 2.600 contratos, que resistiriam a uma variação da taxa de câmbio da ordem de 20% em relação ao dólar negociado no dia 14.01, que foi de US$ 1.00/R$1,322. (peça 31, p. 21).

50. Como assinalou a unidade técnica, aquela instituição bancária “não estava na iminência de se tornar insolvente em função de suas operações com derivativos cambiais, uma vez que o patrimônio líquido do Banco FonteCindam suportava uma cotação do dólar de até 1,5800. Assim, considerando que a PTAX do dia 14/01/1999, data de fechamento da operação com o Bacen, foi de 1,3194, em tese, essa instituição suportava uma desvalorização cambial de quase 20%, antes do seu patrimônio líquido ficar negativo. Portanto, havia uma relativa folga patrimonial. Além disso, por estar posicionado no mercado de opções, não no mercado futuro, não estava sujeito ao mecanismo do ajuste diário. Assim, o pagamento da variação cambial se daria apenas no vencimento do contrato ou quando ocorresse a liquidação da operação”.

51. Poder-se-ia questionar se à época existia ou não liquidez no mercado de derivativos para que o FonteCindam conseguisse reverter sua posição “vendida” no mercado de dólar futuro e no mercado de opções. A esse respeito, transcrevo pertinente excerto da instrução:

“....

|Quadro 02 |

|Dia - Jan./99 |Cotação de fechamento|Cotação opção dólar |Quantidade de opões dólar |Quantidade de contrato futuro de |

| | |FE01 |FE01 negociadas na BM&F |dólar negociada na BM&F (Fev.99) |

|4 |1,2078 |1,244582 |11.100 |34.185 |

|5 |1,2085 |1,244496 |13.150 |46.000 |

|6 |1,2096 |1,243812 |6.842 |30.200 |

|7 |1,2101 |1,245098 |6.700 |64.945 |

|8 |1,2104 |1,244668 |3.455 |46.501 |

|11 |1,2109 |1,245902 |1.435 |42.665 |

|12 |1,2114 |1,246205 |4.470 |57.216 |

|13 |1,3193 |1,258734 |2.785 |4.923 |

|14 |1,3194 |1,346413 |7.610 | 23.221** |

|15 |1,4659 |1,450648 |90.326 |7.060 |

|18 |1,5384 |1,457624 |34.885 |8.835 |

|19 |1,5580 |1,507794 |13.260 |7.100 |

|20 |1,5735 |1,568111 |945 |20535** |

|21 |1,6602 |1,644654 |1.925 |11.912 |

|22 |1,7049 |1,680952 |105 |17.110 |

|25 |1,7606 |- |12.169 |1.280 |

|Fonte: dados retirados de tabelas do Acórdão 2906/2008 - Plenário, fls. 40 e 41 do presente TC, com adaptações |

|* Preço médio + prêmio |

|** inclui 20.550 contratos negociados ente o Bacen, os Bancos Marka e FonteCindam e os fundos administrados por este |

|***inclui 3.700 contratos negociados entre o Bacen e o Fundo Marka Nikko. |

|3.40 Nesse contexto de relativa margem patrimonial do Banco FonteCindam, deve-se considerar |

3.40 Nesse contexto de relativa margem patrimonial do Banco FonteCindam, deve-se considerar a possibilidade de o Banco Fonte Cindam zerar sua posição vendida no mercado de opções. Para liquidar essa posição, seria necessário comprar a mesma quantidade de contratos do mesmo exercício e da mesma série. Assim, como esse Banco estava vendido em 2600 opções FEO 1, para liquidar tal posição, seria necessária a compra de 2600 opções FEO 1. No entanto, para realizar essa operação, era preciso que houvesse liquidez no mercado. A liquidez se traduz no número de transações feitas com determinado título. Destarte, esse aspecto da liquidez é o que será analisado nos próximos parágrafos.

3.41 Com base no Quadro 02, é possível analisar a liquidez do contrato de opção de dólar FEO1, contrato em que estava posicionado o Banco FonteCindam. Constata-se que, entre os dias 4 a 13 de janeiro de 1999, houve uma média de negociação diária de 6.242 contratos de opções FE01. No dia 14/01/1999, segundo elementos constantes dos autos, foi a data em que o Presidente do Banco Fonte Cindam entrou em contato com o Bacen para solicitar a reversão das posições. Somente nesse dia 14, foram negociados 7.610 contratos de opções. Assim, com essa liquidez, como o Banco Fonte Cindam estava vendido em 2.600 opções, ficou demonstrado que era perfeitamente possível essa Instituição Financeira comprar 2.600 contratos FE01, zerar a sua posição, e, por consequência, travar as suas perdas por meio do próprio mercado, sem a necessidade de atuação do Banco Central. Essas informações acerca da liquidez eram facilmente aferíveis pelo Bacen, conforme será melhor explicado mais adiante.

3.42 Voltando à análise do Quadro 02, mesmo com o mercado futuro travado, praticamente todos agentes de mercado que desejassem se proteger da variação cambial, especular, ou zerar posições vendidas com opções de dólar, tiveram essa oportunidade no mercado de opções de dólar. Nos dias 15, 18 e 19 de janeiro de 1999 foram negociados, respectivamente, 90.326, 34.885 e 13.260 contratos de opção FEO1. Para se ter ideia da magnitude do volume negociado nesses dias, estima-se que esses contratos negociados perfizeram, respectivamente, os seguintes montantes:

• R$ 13.103.123.124,80 (1,450648* 1000* 100*90.326);

• R$ 5.084.921.324,00 (1,457624* 1000* 100*34.885) e

• R$ 1.999.334.844,00 (1,507794* 1000* 100* 13.260)

3.43 Além disso, conforme se relatou no Acórdão 2.906/2008 — Plenário, o Bacen efetuou vendas pesadas no mercado futuro de dólar nos dias 11 e 12 de janeiro, conforme tabela às fl. 38. No dia seguinte, 13 de janeiro, foi introduzida a banda diagonal endógena. Em consequência, o mercado futuro de câmbio da BM&F travou em função do limite de oscilação diário. Assim, no dia 14 de janeiro, com o mercado futuro travado, o Bacen vendeu 20.550 contratos ao Banco Marka e ao Fonte Cindam e seus fundos. Após todas essas vendas, a posição do Bacen no mercado futuro, que no dia 11/01/1999 era de 13.790 contratos vendidos, passou a ser de 101.750 contratos vendidos junto à BM&F, fl. 38, no dia 14/01/1999. Assim, para demonstrar, novamente, a liquidez do mercado de opções, somente no dia 15 de janeiro, conforme se verifica acima, foram negociados 90.326 contratos de opções. Dessa forma, isso representa quase 90% de toda posição vendida do Bacen no mercado futuro, após as vendas maciças realizadas no período. Desse modo, mais uma vez, se evidencia que o mercado teria como absorver toda a posição do Banco Fonte Cindam, sem a necessidade de atuação do Bacen. Cabe mencionar que o contrato futuro de dólar tem o mesmo tamanho do contrato de opção de dólar, assim, nesse caso específico, do ponto de vista da variação cambial, tanto faz operar contratos futuros ou contratos de opções.

3.44 Nesse cenário de liquidez do mercado de opções, não se pode deixar de considerar a questão do ponto de zerada do patrimônio líquido do Banco FonteCindam. Conforme evidenciou-se anteriormente, considerando a PTAX do dia da realização da operação com o Bacen e o ponto de quebra patrimonial desse Banco, havia uma capacidade de absorção de desvalorização cambial na ordem de 20%. Fazendo uma análise a posteriori, com um break-even point de 1,5800, com base no Quadro 02, supra, constata-se que, em tese, o Fonte Cindam somente quebraria no dia 21/01/1999, quando o dólar fechou em 1,660200. Essa situação serve para demonstrar como o Banco FonteCindam, na data da operação com o Bacen, tinha uma relativa margem patrimonial.

3.45 Dessa forma, considerando que o Banco Fonte Cindam não estava na iminência de se tornar insolvente, pelo contrário, tinha uma relativa folga patrimonial, e que havia liquidez suficiente para liquidar sua posição no próprio mercado de opções de dólar, fica fragilizada a alegação de que, se o Bacen não atuasse, esse Banco poderia quebrar, e consequentemente, originar uma crise sistêmica no país. Assim, sob esse aspecto de risco sistêmico, foi injustificável a atuação do Bacen.

3.46 Nesse caso, ainda há um outro fator a ser considerado. Caso o mercado de opções de dólar da BM&F estivesse travado ou sem liquidez suficiente para zerar a sua posição, o Banco Fonte Cindam poderia estancar as suas perdas cambiais no mercado de contratos futuros de reais na Bolsa de Futuros de Chicago, que não estava travada e apresentava liquidez, conforme se verifica nas fls.763-768, vol. 3. Embora se trate de mercados diferentes, mercado futuro e de opções, é possível operar nesses dois mercados e obter um efeito semelhante ao de uma liquidação realizada somente em um desses mercados. Para exemplificar, utilizando o caso concreto, o Fonte Cindam estava vendido em opções que apresentava o valor nominal de US$ 260 milhões. Caso ele abrisse uma posição inversa no mercado futuro de Chicago também com um valor nominal US$ 260 milhões, de preferência com um contrato com a mesma data de vencimento da opção, o efeito no seu patrimônio líquido, ao final de cada dia e no vencimento de ambos os contratos, seria, em tese, semelhante à compra de opções de valor nominal de US$ 260 milhões, uma vez que, ocorrendo a apreciação do dólar, o valor perdido na ponta vendedora seria compensado com um ganho semelhante obtido na ponta compradora. Na teoria, o que garante essa ligação de preços no mercado à vista, de opções e futuros da BM&F e da Bolsa de Chicago são os players denominados arbitradores. Além disso, o que também garante essa ligação, no caso das opções, é que se trata de opções dentro do dinheiro. Essas questões da arbitragem e das opções dentro do dinheiro serão melhor explicadas mais adiante.

3.47 Até o momento, já se demonstrou que o Banco Fonte Cindam possuía margem patrimonial para suportar uma relativa apreciação do dólar. Além disso, havia possibilidade de liquidar suas posições no próprio mercado de opções de dólar da BM&F. Em último caso, ainda poderia operar no mercado futuro de Chicago. Dessa forma, além desses fatores, ainda há um outro elemento que fragiliza a tese do risco sistêmico, os mecanismos de salvaguarda BM&F. Esses instrumentos já foram exaustivamente detalhados ao longo desta TCE (fis. 57-59; 89-92 e 141-145). Assim, haverá apenas uma breve explanação desse aspecto.

3.48 A bolsa, no mercado de opções, determina que o lançador (quem vende opções) deposite uma margem de garantia. Essa margem, normalmente, cobre dois ou três dias de oscilação do ativo e é calculada por meio de um modelo estatístico. Quando a volatilidade desse ativo aumenta, a bolsa pode exigir que o agente aumente o valor da margem. Se o investidor não atender essa chamada de margem, é declarado inadimplente, promovendo-se a liquidação compulsória de suas operações.

3.49 A partir desse momento, define-se a seguinte sequência de execução das garantias:

1. garantias depositadas pelo investidor na bolsa;

2. garantias e títulos patrimoniais da corretora de mercadorias;

3. garantias do membro de compensação; e

4. recursos dos fundos especiais da bolsa.

3.50 Assim, considerando o relatório da equipe de fiscalização, fis. 141-145, a BM&F tinha como salvaguarda, pelo menos, R$ 551.161.766,76, referente à soma de R$ 61.161.766,76 (do membro de compensação) mais R$ 490 milhões (dos fundos especiais da bolsa), isso sem considerar as margens depositadas pelo Banco FonteCindam. Considerando essas margens, tem-se mais R$ 25.663.815,86. Segundo cálculos da BM&F, essa margem do Banco FonteCidam seria suficiente para suportar uma cotação de máxima de 1,41, bem acima da PTAX de 1,3194 do dia 14/01/1999, data operação com o Bacen.

3.51 Dessa forma, com esses mecanismos de salvaguarda da bolsa, fica bem fragilizada a hipótese de risco sistêmico, pois esse instrumental da BM&F estava preparado para absorver eventuais prejuízos dos comitentes.

3.52 Até agora, a análise teve como enfoque as operações do Banco FonteCindam e do seu Fundo exclusivo Fonte CindamTrade II que totalizaram 2.600 contratos de opções. No entanto, o Bacen, também, vendeu 5.300 contratos futuros para os demais fundos ligados a essa instituição financeira, em que os cotistas eram terceiras pessoas (Fonte CindamJaguar FIF, Fonte CindamDerivativos FIF, Fonte CindamStar Fdo Rda. Fixa — Cap. Estrangeiro, Fonte Cindam30 FIF, Fonte CindamAbsoluto FIF, C&D Fonte CindamDerivativos FIF, Fonte CindamB. A FIF e Fonte CindamSun-II Fdo. Rda). Ao total foram vendidos 7.900 contratos futuros pelo Banco Central.

3.53 Assim, tudo que foi dito até agora, também se aplica para os fundos ligados ao Banco FonteCindam. Havia liquidez suficiente no mercado de opções da BM&F e no mercado futuro da Bolsa de Chicago para que esses fundos zerassem suas posições. Além disso, ao analisar o Quadro 01, constata-se que os pontos de zerada dos patrimônios desses fundos, de uma forma geral, eram bem confortáveis, à exceção de dois fundos que tinham uma margem patrimonial mais apertada. Apesar dessa ressalva, esses dois fundos (Fonte CindamJaguar FIF e C&D Fonte CindamDerivativos FIF) com margens menos folgadas, em tese, somente quebrariam no dia 19/01/1999, quando o dólar fechou em 1,558000, uma vez que as pontas de zerada correspondiam a, respectivamente, 1,5482 e 1,5400. Vale relembrar que, com essa margem patrimonial, esses dois fundos, pela liquidez do mercado, tinham plenas condições para zerar as suas posições, antes dos respectivos patrimônios líquidos se tornarem negativos, sem a necessidade de intervenção do Bacen. Além disso, não se pode esquecer dos mecanismos de salvaguarda da BM&F. Dessa forma, todos esses fatores enfraquecem a tese do risco sistêmico.

3.54 Ademais, ainda com relação a esses fundos, há mais um fator que dificulta a caracterização do risco sistêmico. A quebra de um fundo de investimentos tem consequências limitadas, comparando com a quebra de uma instituição financeira, uma vez que atinge somente os cotistas, enquanto que a insolvência de um banco pode abalar a estabilidade do sistema financeiro. Assim, com a quebra desses fundos, seria improvável a possibilidade de alastramento de falta de confiança para o resto do mercado, uma vez que, caso essa insolvência tivesse ocorrido, os cotistas seriam chamados para cobrir o patrimônio negativo do fundo. Além disso, caso não se obtivesse êxito nesse chamamento dos cotistas, os instrumentos de salvaguarda da Bolsa seriam acionados, e, conforme foi evidenciado, teria capacidade de absorver os prováveis prejuízos desses fundos.

3.55 Portanto, a justificativa apresentada pela defesa acerca do risco sistêmico até que poderia se aplicar ao Banco Marka, que já estava virtualmente insolvente, sendo necessário o resgate pelo Bacen, tanto que foi esse o entendimento do Tribunal. No entanto, não se aplica ao Banco Fonte Cindam e aos fundos ligados a essa instituição. Esses agentes não estavam à beira da insolvência, pelo contrário, possuíam patrimônio para suportar uma razoável depreciação cambial com as suas posições vendidas. Concomitantemente, essas instituições dispunham de um mercado de opções destravado e com liquidez suficiente para liquidar as suas posições perdedoras, tanto na BM&F, quanto na Bolsa de Chicago. Assim, não havia razão para que o Banco Central tivesse realizado essas operações de venda de contratos futuros de dólar.

3.56 Encerrada a discussão do risco sistêmico, deve-se abrir um parêntese para evidenciação de um aspecto. A venda de 5.300 contratos futuros pelo Bacen para os fundos ligados ao Banco Fonte Cindam é altamente questionável. O art. 12 da Lei 4.595/64 assim dispõe: "O Banco Central da República do Brasil operará exclusivamente com instituições financeiras públicas e privadas (..). "O Parecer DEJUR-160/97, fl. 1033, vol. 5, ao analisar a legalidade das operações do Bacen com derivativos cambiais, quanto a esse aspecto, também foi nesse sentido e concluiu que: "a operação com parceiros que não instituições financeiras esbarra na redação do art. 12 da Lei 4.595/64 e, portanto, a alternativa é restringir o universo de parceiros às instituições financeiras autorizadas a operar em câmbio. ".

3.57 Desse modo, essa venda de 5.300 contratos no mercado futuro para esses fundos foi ilegal, uma vez que fundo de investimento não é equiparado à instituição financeira. Esse entendimento é do próprio Banco Central. No expediente Cota DENOR/CODIS-99/114 — Pt. 9900950326, fls. 751-752, vol. 3, afirmou-se o seguinte: "A propósito, em conformidade com o Parecer DEJUR-126, de 21 de maio de 1996, os fundos de investimento não possuem personalidade jurídica e, consequentemente, não são titulares de direitos e obrigações, atributos da referida personalidade. O parecer segue dizendo: 'em realidade, na gestão dos recursos desses fundos, quem se encontra nos polos ativo e passivo das relações jurídicas decorrentes dessa atividade, é a instituição administradora, a quem é atribuída não só amplos poderes de administração, como também a responsabilidade civil e criminal (esta, na pessoa dos administradores) por tais atos.' As afirmativas acima mencionadas são baseadas, principalmente, no inciso II, do art. 49, da Lei n° 4.728, de 14 de julho de 1965, e no art. 1" do Regulamento anexo à Circular n° 2.616, de 18 de setembro de 1995 (..). Assim, entendemos correto responder que os fundos de investimento não são equiparados a instituições financeiras, (...) ". Dessa forma, não resta dúvida acerca da ilegalidade dessa operação.

3.58 Outro fator alegado pela defesa foi que, com a operação de venda de contratos futuros pelo Bacen, houve preservação das reservas internacionais, pois os ajustes diários desses contratos ocorrem na moeda brasileira. É incontroverso que, na época da realização da operação, o país já tinha perdido uma quantia razoável das reservas e que a manutenção do então nível era extremamente relevante. No entanto, isso, por si só, não justifica a transação. Isso não é motivo para que o Bacen faça operações com contratos futuros por um preço abaixo do mercado, acarretando danos ao erário. Tal situação foi a que ocorreu. Conforme será melhor detalhado adiante, a operação foi fechada com um preço de 1,3220, sendo que o dólar futuro, no mercado de opções da BM&F e no mercado futuro de real na Bolsa de Chicago, apontava para 1,34. Assim, a taxa de câmbio negociada mostrou-se bastante vantajosa para o Banco FonteCindam, gerando um ganho indevido para essa Instituição.

3.59 Há ainda que se demonstrar uma outra questão com relação à manutenção das reservas. Se o Banco Fonte Cindam e os seus fundos ligados tivessem liquidado suas posições no próprio mercado de opções da BM&F, como deveria ter acontecido, também não haveria demanda por dólares, uma vez que o pagamento dos prêmios das opções, para zerar as posições vendidas, seriam feitos em Real, não em dólar. Assim, o Bacen não seria obrigado a vender dólares no topo da banda cambial vigente à época.

3.60 Cabe ressaltar, ainda, que essas informações acerca da liquidez do mercado de opções de dólar estavam disponíveis para análise do Banco Central, bem como para todo o mercado. Esses dados eram disponibilizados no site da BM&F. Além disso, o Bacen poderia consultar tais informações nos difusores de informações Reuters e Blomberg, que eram utilizados pelo Departamento de Operações das Reservas Internacionais — DEPIN/Bacen. Além dessas fontes, ainda era possível obter esses dados diretamente com os representantes da BM&F, uma vez que, à época da realização das operações com o Banco FonteCindam, os diretores do Bacen estavam em constante contato com os membros dessa Bolsa de Mercadorias e Futuros. Dessa forma, não há como alegar, como fez a defesa, que a instrução da presente TCE foi feita a partir de dados só disponíveis muito tempo depois dos fatos. Conforme se evidenciou, o Bacen conhecia, ou tinha plenas condições para tomar conhecimento dessas informações acerca da liquidez do mercado de opções de dólar, podendo considerar essa situação na sua tomada de decisão.

3.61 Quanto à questão do ponto de zerada de patrimônio do Banco Fonte Cindam com o dólar atingindo 1,5800, o Bacen tinha plenas condições de obter facilmente tal informação. Esses dados poderiam ser obtidos de uma forma rápida e simples. Bastaria levantar a posição do patrimônio líquido da instituição e dos seus fundos, bem como a posição deles no mercado de derivativos junto à BM&F. Após isso, seria necessário fazer um cálculo simples para saber a partir de que cotação do dólar o patrimônio líquido da instituição seria zerado. Isso foi feito pelo Bacen no caso Marka. Veja o expediente do Bacen acostado às fls. 1022-1023, vol. 5: `A fiscalização do Banco Central foi acionada ainda no final daquele dia — 13/01 — com o objetivo de apurar a real situação econômico-financeira da instituição, bem como o nível de risco existente nas operações nos mercados futuros. No dia seguinte — 14/01 — os trabalhos preliminares da fiscalização confirmaram que a instituição não teria condições financeiras e econômicas de arcar com os encargos decorrentes das suas posições vendidas em dólar na BM&F, ficando evidenciado que o banco já teria dificuldades naquele dia para liquidar as exigências de margens de garantia e os ajustes diários decorrentes das suas operações. " Portanto, o Banco Central foi diligente ao apurar, preliminarmente, a situação econômico-financeira da situação do Banco Marka.

3.62 No entanto, quanto ao Banco FonteCindam, foi dado um tratamento diverso pela Autoridade Monetária. Conforme expediente do Bacen, fl. 1021, vol. 5: "Cabe registrar que não era possível adiar a decisão até a confirmação, pela fiscalização, da real situação econômico-financeira do banco e dos impactos das posições a descoberto nos mercados futuros. Nada obstante, foi confirmado junto à BM&F que o volume total de contratos em que o Banco Fonte Cindam era responsável direta ou indiretamente pelas margens e ajustes diários correspondia a 7.900, como informado pela instituição financeira. ". Dessa forma, constata-se uma contradição nos procedimentos adotados pelo Bacen. No caso do Banco Marka, foi possível calcular, preliminarmente, a situação econômico-financeira. Já com relação ao Banco FonteCindam, não foi possível. Isso demonstra que a Autoridade Monetária, ao prestar auxílio ao FonteCindam, foi, no mínimo, negligente ou imprudente em não apurar a situação patrimonial da instituição financeira, uma vez que essa informação poderia ser facilmente e rapidamente calculada, a exemplo do que foi feito com o Banco Marka.

3.63 Portanto, o Bacen tinha conhecimento ou plena possibilidade de conhecer a liquidez do mercado de opções de dólar da BM&F. Além disso, poderia, de uma forma rápida e fácil, saber qual o ponto de zerada do patrimônio líquido do Banco FonteCindam. Assim, na época do fato, poderia considerar essas informações na sua tomada de decisão.

3.64 Um outro aspecto a ser tratado é que a defesa não conseguiu descaracterizar a ofensa ao princípio da impessoalidade. De acordo com o Acórdão 2906/2008 — Plenário, fl. 116 desta TCE, caso fosse possível, se o Banco Fonte Cindam tivesse feito um empréstimo para comprar dólar e travar as suas perdas, com o custo do CDI, tal operação equivaleria a uma cotação de 1,3351. Se esse empréstimo fosse feito na linha de redesconto do Bacen, equivaleria a uma cotação de 1,33813. Assim, considerando que a operação com o Banco Central foi com a cotação de 1,3222 e que cotação no mercado futuro da Bolsa de Chicago e no mercado de opções da BM&F, outras alternativas para se fazer o hegde cambial, apontavam para, respectivamente, 1,40 e 1,34, foi concedido ao Banco Fonte Cindam e aos seus fundos um tratamento diferenciado, uma vez que concedeu apenas a essas instituições o privilégio de poder fazer um hegde simples e barato.

3.65 Desse modo, fica evidente a violação ao Princípio da Impessoalidade, pois essa transação feita pelo Bacen gerou benefícios indevidos ao Banco Fonte Cindam e aos seus fundos. Além disso, a opção oferecida pelo Bacen foi mais vantajosa que as condições ofertadas no mercado de opções da BM&F e no de futuros da Bolsa de Chicago, bem como por meio de empréstimos.

3.66 Nesse cenário, vale destacar que as outras instituições financeiras que necessitavam do hedge cambial não contaram com essa solução oferecida pelo Bacen ao Banco FonteCindam, uma vez que, devido à chancela de sigilo do Voto BCB n°. 006/1999, não haveria como os outros agentes de mercado tomarem conhecimento dessa possibilidade.

3.67 Ademais, também, contribuiu para violação do Princípio da Impessoalidade o tratamento diferenciado conferido pelo Bacen aos fundos do Banco FonteCindam. Veja excerto extraído do Acórdão 2606/2008 — Plenário: "(..)se a situação dos fundos inspirava cuidados, por que os fundos do Banco Marka não foram auxiliados num primeiro momento? Se o Banco Central preferiu aguardar a evolução do mercado para auxiliar os fundos Marka-Nikko, deveria ter feito o mesmo em relação aos fundos do FonteCindam."

3.68 Por conseguinte, diante de tudo foi que analisado, a questão do risco sistêmico ou da crise sistêmica não se aplicou ao caso do Banco Fonte Cindam e dos seus fundos de investimentos, pelo fato da ampla possibilidade de liquidação de suas posições no próprio mercado de opções, por não estarem na beira da insolvência, bem como, segundo os Diretores do Bacen à época, por não se saber, na data de fechamento dessa operação, que a taxa de câmbio iria flutuar. Além disso, embora tenha ocorrido a preservação das Reservas Internacionais em momento bem crítico pelo qual estava passando a economia, a operação de venda de contratos futuros acabou se mostrando bem vantajosa somente para esse Banco e seus fundos. Assim, a defesa não obteve êxito na desqualificação do Princípio da Impessoalidade, uma vez que esse tratamento diferenciado foi dado apenas para essas instituições.”

52. Em conclusão, o FonteCindam possuía patrimônio suficiente para solucionar os problemas por ele enfrentados naquele momento; a BM&F assegurou que tinha “garantias e mecanismos suficientes para amortecer a inadimplência de qualquer dos comitentes”; e o próprio Bacen atuava com o objetivo de evitar maiores problemas no mercado de câmbio.

53. Portando, naquela oportunidade, o FonteCindam só se tornaria insolvente se agisse de má-fé, pois possuía meios para solucionar os problemas enfrentados, inclusive por meio do próprio Bacen atuando diretamente no mercado, e não de forma personalíssima. E ainda que aquela instituição se tornasse insolvente, a BM&F poderia solucionar o problema. É inverossímil, portanto, a hipótese de uma crise sistêmica em razão de possível insolvência do FonteCindam.

54. Por oportuno, lembro que não se questiona, neste momento, a grave crise cambial por que passou o Brasil em 1999. Não se questiona, ademais, se essa crise poderia afetar severamente a economia brasileira e atingir fortemente todo o sistema bancário. Todavia, diante do caos que poderia atingir todo o mercado, não existe justificativa para o socorro exclusivamente ao FonteCindam. Acrescente-se que as demais empresas e bancos brasileiros não faliram, visto que o próprio mercado terminou por ajustar suas posições, com a participação do Bacen ao atuar como autoridade monetária, e não como patrocinador de interesses privados de apenas uma instituição bancária.

Cotação do dólar no dia 14/01/1999

55. Antes de examinar a questão da cotação do dólar negociada com o FonteCindam, reitero que não se discutem as políticas cambial e monetária adotadas pelo Bacen quando realizadas de forma regular, com observância dos princípios da publicidade, da impessoalidade e da finalidade. Não se questiona, do mesmo modo, a existência de perdas ou ganhos com a adoção dessas políticas, e muito menos a figura do lucro mencionado pelos responsáveis.

56. O que se questiona nestes autos é a legalidade dos procedimentos adotados pelos gestores do Bacen e se existiam alternativas que não trouxessem prejuízo ao erário para solucionar os problemas do Banco FonteCindam.

57. Reitero o entendimento de que os pareceres e opiniões dos renomados economistas sobre essa questão não devem ser acolhidos para afastar as irregularidades praticadas pelos diretores do Bacen, uma vez que não trataram do caso concreto: socorro financeiro direto ao FonteCindam, eis que ficou demonstrado que aquela empresa bancária e a BM&F tinham condições de solucionar o problema diretamente no mercado.

58. Ademais, a atuação do Bacen no mercado de derivativos do dólar constitui ferramenta essencial para preservar as reservas cambiais do país, como já foi mencionado mais de uma vez neste voto.

59. Feitos esses esclarecimentos, não merecem prosperar as alegações dos responsáveis de que o valor do dólar negociado com o FonteCindam (R$ 1,322/US$ 1.00) ficou acima daquele praticado pela Bolsa no dia 14/01/1999 (R$ 1,25/US$ 1.00). Como já esclarecido, a Bolsa, naquela oportunidade, estava travada e, dessa forma, o preço mencionado não estava sendo de fato praticado. Do mesmo modo, a afirmação de que o Bacen comprou dólar a R$ 1,20 e vendeu àquele Banco a R$ 1,322 não socorre aos responsáveis, pois, na data da operação questionada, o mercado de opções estava em pleno funcionamento e o dólar era negociado a R$ 1,3456413.

60. Como destacou a unidade técnica (peça 31, p. 35), para o cenário da época “os preços do mercado futuro e do mercado de opções seriam muito semelhantes. Assim, mais uma vez se comprova que, como o mercado futuro não refletia uma cotação real, pelo travamento desse mercado, o Bacen deveria ter utilizado a cotação do mercado de opções, até por que era nesse mercado, não no de futuros, que estavam posicionados o Banco Fonte Cindam e os seus fundos”. Seria desarrazoado esperar que o Bacen negociasse dólar abaixo dos preços praticados pelo mercado de opções, portanto.

61. O raciocínio atinente a uma possível compensação das perdas com a venda dos contratos pelo Bacen na BM&F com os ganhos auferidos com a permanência dos dólares no caixa do Bacen, está correto apenas para operações regulares, desde que o valor das reservas esteja sempre acima dos valores dos contratos negociados na Bolsa. Na oportunidade da transação, como frisou a unidade técnica (peça 31, p. 29), o valor das reservas era superior à posição vendida no mercado futuro de dólar.

62. No caso concreto, contudo, a alegação não merece ser acolhida, uma vez que o Bacen manteria as reservas cambiais nos mesmos níveis, com ou sem a venda dos contratos diretamente ao FonteCindam. Como já esclarecido, o mercado de derivativos apresentava liquidez e não seria esperado que a instituição bancária privada fosse buscar solução no mercado de dólar à vista. Por certo, não tivesse o Bacen socorrido o FonteCindam, este, como possuía patrimônio para tanto, teria solucionado seus problemas de solvência diretamente no mercado, como, aliás, fizeram os demais investidores.

63. Deveria o FonteCindam, a exemplo de outras instituições “vendidas”, negociar seus contratos na BM&F e não simplesmente transferir essa posição ao Bacen, em especial no que se refere aos fundos, que eram possuidores de 5.300 contratos na posição “vendida” e cujas perdas ou mesmo insolvência não impactariam o patrimônio do FonteCindam. A própria BM&F tinha condições de solucionar o problema sem que o mercado fosse afetado, como já demonstrado. Não existe fundamento legal ou econômico para que o Bacen preste socorro a determinados investidores em detrimento de todos os demais atores econômicos brasileiros, que enfrentavam naquele momento os mesmos problemas com a crise cambial que atingia fortemente o País.

Valor do débito

64. De fato, em janeiro de 1999, o Brasil passava por séria crise cambial. Como já exposto, o Bacen atuou fortemente no mercado de derivativos em janeiro e fevereiro daquele ano, ao injetar mais de R$ 14 bilhões e suportar perda da ordem de R$ 7,6 bilhões.

65. Realizada de forma impessoal, com a participação do mercado como um todo, tal atuação da autoridade monetária com o objetivo de reduzir ao máximo os efeitos daquela crise, apesar dos vultosos recursos envolvidos, não foi questionada pelo TCU.

66. Assim, não se discute a possibilidade de a economia brasileira, naquele momento, sofrer sérias consequências em razão da crise cambial instalada. Contudo, não existe justificativa para que a Diretoria do Bacen tenha autorizado socorro, em caráter personalíssimo, a uma instituição bancária específica, plenamente solvente, com base em alegações não comprovadas pelas áreas técnicas de risco sistêmico e de possível falência do beneficiário.

67. De forma simples, da noite do dia 13 para o dia 14 de janeiro de 1999, com base em conjecturas, sem qualquer análise técnica, sem adoção de qualquer outra medida que assegurasse a boa gestão desses recursos, foram entregues ao Banco FonteCindam mais de R$ 1 bilhão, sem custos, sem garantias e sem possibilidade de retorno. Não havia amparo legal para o Bacen, no desempenho de suas competências de autoridade monetária, entregar patrimônio público de forma personalíssima, em afronta aos princípios da impessoalidade, da publicidade e da razoabilidade, para atender a interesses de alguns investidores, em detrimento de uma política monetária e cambial transparente e voltada à estabilidade do mercado e à proteção dos interesses de todos que investem suas economias e estavam, da mesma forma, sujeitos a perdas irreparáveis de seus patrimônios.

68. Não se discute a possibilidade de intervenção direta do Bacen, no desempenho de suas competências de autoridade monetária, em uma determinada instituição bancária. Todavia, não é aceitável que entregue mais de R$ 1 bilhão a uma instituição bancária e a seus respectivos fundos, supostamente na iminência de falirem, e não adote nenhuma outra providência para assegurar a boa gestão desses recursos. Não é razoável, ademais, que o Bacen assuma riscos de alguns poucos investidores privados em detrimento do mercado como um todo, ao arrepio do ordenamento jurídico existente e de forma manifestamente contrária ao interesse público.

69. Como já demonstrado, as reservas cambiais administradas pelo Bacen não seriam atingidas caso não fosse dado o socorro ora questionado, pois o mercado de derivativos estava em pleno funcionamento e com liquidez suficiente para que o FonteCindam solucionasse os problemas enfrentados, já que possuía patrimônio para tanto. Não é razoável imaginar que essa instituição bancária privada, podendo regularizar sua posição “vendida” no próprio mercado de derivativos, fosse buscar solução no mercado de dólar à vista, cujos custos, além de elevados, exigiriam um volume de recursos em reais muito mais expressivo, bem acima daquele que precisaria despender no mercado de derivativos.

70. Ora, se o Banco FonteCindam não possuía patrimônio para cobrir suas perdas no mercado de opções, muito menos teria para comprar dólar à vista; se possuísse crédito no mercado para resolver os problemas pelos quais passava, certamente iria ao mercado de opções e não ao mercado à vista. Além do mais, o Bacen não estava obrigado a vender dólar diretamente a nenhuma instituição financeira. Em verdade, com o objetivo de regular o mercado, o Bacen faz leilões dessa moeda de forma a atender ao mercado e não apenas a um determinado ente privado, a exemplo do que determinou o Comunicado 006560, de 13 de janeiro de 1999, in verbis:

“II – a ‘faixa de flutuação’ terá, doravante, como limite inferior, R$ 1,20 (um real e vinte centavos) por dólar dos Estados Unidos e, como limite superior, R$ 1,32 (um real e trinta e dois centavos) por dólar dos Estados Unidos;

III - O Banco Central intervirá nos mercados interbancários de câmbio através de leilões eletrônicos sempre que os limites inferior (‘piso’) ou superior (‘teto’) forem atingidos pelas taxas praticadas no mercado.

71. Como já explicitado por diversas vezes neste voto, o mercado de opções, que não fechou durante a crise, e o de futuro, que destravou logo em seguida, estavam em pleno funcionamento. Não havia e não houve necessidade, naquele momento, de realização de leilões de dólar à vista para melhorar a liquidez do mercado.

72. No caso concreto, não identifiquei nenhuma proposta do FonteCindam ao Banco Central para comprar dólar à vista, apesar de não encontrar amparo nas normas do Banco Central. Não identifiquei ademais quais fontes de recursos seriam utilizadas por essa instituição bancária para honrar a aquisição de dólar à vista.

73. Pelo exposto, reitero, não verifiquei nos autos nenhuma razão de ordem técnica ou qualquer norma que autorizasse o Banco Central a entregar mais de R$ 1 bilhão ao Banco FonteCindam sem qualquer análise e sem qualquer justificativa. Acolho, assim, as conclusões do Ministério Público e da unidade técnica ao proporem a condenação solidária dos responsáveis pelo valor de R$ 522.348.000,00.

Da responsabilidade dos administradores do Banco FonteCindam

74. Discordo da instrução no que se refere à exclusão do nome dos administradores do FonteCindam sob o argumento de que não estão comprovados confusão patrimonial e desvio de finalidade da instituição bancária, conforme exigência do art. 50 do Código Civil:

“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”

75. A operação em foco, coordenada pelos administradores do FonteCindam, caracterizou desvio de finalidade, eis que realizada de forma manifestamente ilegal, conforme demonstrado. E a responsabilidade daqueles gestores decorreu de sua iniciativa de solicitar recursos públicos para proteger patrimônio particular dos investidores de seus fundos, que jamais poderiam ser considerados instituições financeiras.

76. Houve, além do mais, confusão patrimonial, pois aqueles gestores utilizaram recursos públicos, de forma ilegal, para proteger seus patrimônios pessoais e os dos membros dos fundos de investimento que administravam.

Sigilo dos autos

77. Registro, ainda, que acolhi proposta da unidade técnica de aposição de sigilo a esta tomada de contas especial sob o argumento “de terem sido utilizados dados confidenciais de instituições financeiras” (peça 31, p. 51).

78. Ao reexaminar o processo, não deparei com informação que não possa ser considerada de domínio público. Em verdade, a tomada de contas especial versa sobre prejuízos na concessão de privilégios a ente privado em detrimento do interesse público, tendo como consequência danos vultosos ao Erário. Não se trata de operações bancárias regulares, mas de socorro financeiro dado a uma instituição bancária ao arrepio da lei, com recursos públicos e de forma dissimulada, sob a alegação de atuação no mercado de câmbio.

79. Trata-se de operação que deveria ser realizada no mercado de dólar futuro e de opções, de pleno domínio público. Além do mais, não vejo razão para manutenção do sigilo deste processo quando a mesma questão tramita no Poder Judiciário de forma pública, com informações semelhantes às existentes nestes autos.

80. Em razão do exposto, revejo minha posição e verifico que não existe fundamento para aposição da chancela de sigilo aos autos.

Da boa-fé dos responsáveis

81. Discordo, por último, da proposta da unidade técnica de que, previamente, sejam rejeitadas as alegações de defesa apresentadas. Não se verifica boa-fé nos atos por eles praticados. Ao contrário, estou convencida de que houve má-fé por parte de todos os responsáveis, visto que se tratou de operação realizada na calada da noite, em detrimento do interesse público e em benefício de alguns privilegiados quando o mercado como um todo passava por uma das maiores crises cambiais desse país.

82. Ante a existência de pessoa jurídica no rol de responsáveis, adoto esse entendimento com fundamento em excerto do parecer do procurador Júlio Marcelo de Oliveira, abaixo transcrito, proferido quando de sua manifestação no TC-037.142/2011-9:

“Acrescento que não se afigura adequada a fixação de novo prazo à Projetus Ltda. para que devolva o montante do prejuízo apurado apenas atualizado monetariamente. Considerou a unidade técnica que a jurisprudência do TCU apontaria no sentido de que não se pode aferir a boa-fé de pessoas jurídicas como é o caso da empresa contratada. O Ministério Público de Contas entende, no entanto, que o benefício de que tratam o art. 12, §§ 1º e 2º, da Lei 8.443/1992, e o art. 202, §§ 2º e 3º, do Regimento Interno do TCU, não se aplica à hipótese sob exame.

Isso porque a jurisprudência do Tribunal, no sentido referido na instrução da unidade técnica (impossibilidade de aferir a boa-fé de pessoa jurídica), consolidou-se, ao que tudo indica, a partir do exame de casos em que estavam presentes entidades de direito público. No caso sob exame, porém, trata-se de entidade de direito privado (empresa privada). Há, certamente, entre essas duas categorias de entidades distinções importantes que devem ser levadas em conta e que estão consideradas no ordenamento jurídico.

As consequências para o exame de alegações de defesa por entidade privada foram tratadas com pertinência, em recente voto da lavra do Min. Bruno Dantas, que serviu de fundamento para o Acórdão 5.664/2014 – Primeira Câmara. Naquela ocasião, ao bater-se pela insubsistência de proposta que sugeria a abertura do novo e improrrogável prazo para que determinada associação recolhesse o débito apurado, anotou que “a jurisprudência maciça deste Tribunal em relação a essa questão restringe-se a pessoas jurídicas de direito público”. Valeu-se também de precedente contido no Acórdão 3.375/2006-2ª Câmara, em que o relator, Ministro Ubiratan Aguiar, já havia investigado tal matéria.

A tese extraída do referido Acórdão 5.664/2014 – Primeira Câmara, por meio do qual o Tribunal julgou irregulares contas de determinada associação e de um de seus gestores, foi assim sintetizada pela Secretaria das Sessões do TCU, em seu Boletim de Jurisprudência 57:

‘O exame da boa-fé, para fins de concessão de novo prazo para o recolhimento do débito sem a incidência de juros de mora (art. 202 do Regimento Interno/TCU), quando envolver pessoa jurídica de direito privado, será feito, em regra, em relação à conduta de seus administradores, uma vez que os atos destes obrigam a pessoa jurídica, desde que exercidos nos limites dos poderes definidos no ato constitutivo do ente (art. 47 do Código Civil).’

Ao ter em conta essa orientação, que se mostra adequada para a solução também deste caso, há de se concluir que os atos praticados pela Projetus Engenharia e Construções Ltda. mostraram-se altamente reprováveis e contribuíram decisivamente para o desperdício de montante substancial de recursos repassados por conta do citado convênio. Não se pode, pois, cogitar de boa-fé desse agente. Na verdade, a atuação da citada empresa justifica, além da imputação a ela do débito apurado, em solidariedade com o citado ex-prefeito, sua apenação com multa do art. 57 da Lei 8.443/1992.”

83. Registro, ainda, que valor do débito, atualizado e acrescido de juros de mora, corresponde hoje a cerca de R$ 3,77 bilhões de reais, prejuízo esse causado em apenas 17 dias do mês de janeiro de 1999.

84. Em tempo, esclareço que, em 28/05/2015, o Banco FonteCindam S.A., Fernando Cesar O. de Carvalho, Luiz Antônio Andrade Gonçalves e o espólio de Roberto José Steinfeld apresentaram novas alegações de defesa (peça 50), por meio das quais refutaram o entendimento da unidade técnica, endossado pelo Ministério Público, sob a alegação, em síntese, de que não houve prejuízo ao Bacen, como demonstrariam pareceres e laudo pericial de economistas renomados.

85. Essas alegações foram refutadas ao longo deste voto, eis que os pareceres e o laudo pericial fizeram considerações genéricas sobre a possibilidade de uma crise cambial e não analisaram o caso concreto do socorro ao FonteCindam. Não mereceram, por isso, outras considerações sobre a matéria.

86. Não satisfeitos, em 03/08/2015, solicitaram o adiamento do julgamento da TCE e a restituição do processo à SecexFazenda para emissão de nova instrução, sob a alegação de que os pareceres da unidade técnica e do Ministério Público contrariaram os pareceres de consultores renomados e laudo pericial sobre a inexistência de prejuízos ao Bacen. Alegaram, então, a possibilidade de nulidade do procedimento, “caso esse feito venha a ser julgado na próxima sessão”.

87. Não procedem os argumentos dos responsáveis, pois apenas criam rito processual não previsto na Lei 8.443/1992 e no Regimento Interno desta Corte. Nos termos do art. 1º, § 3º, inciso I, da Lei Orgânica do TCU, o relatório do relator deverá conter as conclusões da instrução da equipe de auditoria ou do técnico responsável pela análise do processo, bem como do parecer das chefias imediatas e do Ministério Público.

88. Não só consignei as conclusões da unidade técnica e do Ministério Público no relatório, como transcrevi na íntegra o pronunciamento de ambos sobre o mérito do processo. Observe-se, ademais, que os responsáveis não apresentaram qualquer fato ou documento novo que justificasse a devolução do processo para novo exame.

Diante de todo o exposto, voto pela adoção da minuta de acórdão que trago ao escrutínio deste colegiado.

TCU, Sala das Sessões, em 5 de agosto de 2015.

ANA ARRAES

Relatora

ACÓRDÃO Nº 1915/2015 – TCU – Plenário

1. Processo TC 033.263/2008-1.

2. Grupo II – Classe IV - Tomada de Contas Especial.

3. Responsáveis: Cláudio Ness Mauch (CPF 060.895.180-34), Demósthenes Madureira de Pinho Neto (CPF 847.078.877-91), Francisco Lafaiete De Pádua Lopes (CPF 110.015.857-04), Luiz Antônio Andrade Gonçalves (CPF 007.600.486-49), sucessores de Roberto José Steinfeld (CPF 548.384.957-49) e Banco FonteCindam S.A. (CNPJ 33.794.033/0001-00).

4. Unidade: Banco Central do Brasil.

5. Relatora: ministra Ana Arraes.

6. Representante do Ministério Público: subprocuradora-geral Cristina Machado da Costa e Silva.

7. Unidade Técnica: Secretaria de Controle Externo da Fazenda Nacional - SecexFazenda.

8. Advogados: João Geraldo Piquet Carneiro, OAB/DF 800-A, e outros (peça 36, pgs. 4 a 7); Ana Tereza Palhares Basílio, OAB/RJ 74.802, e outros (peça 36, pgs. 9, 17, 20 e 36).

9. Acórdão:

VISTA, relatada e discutida esta tomada de contas especial instaurada por determinação do acórdão 2.906/2008-Plenário em razão de irregularidades na execução da política cambial adotada pelo Banco Central do Brasil – Bacen no decorrer da denominada crise cambial iniciada em janeiro de 1999, com favorecimento a empresas privadas e com prejuízos vultosos à Administração Pública Federal.

ACORDAM os ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão da 2ª Câmara, ante as razões expostas pela relatora e com fundamento nos arts. 1º, inciso I; 12, § 3º; 16, inciso III, alíneas “b” e “c”; 19; 23, inciso III; 26; 28, inciso II; 44, § 2º, 57 e 61 da Lei 8.443/1992, c/c os arts. 214, inciso III, alínea “a”, e 217 do Regimento Interno, em:

9.1. julgar irregulares as contas de Cláudio Ness Mauch, Demósthenes Madureira de Pinho Neto, Francisco Lafaiete de Pádua Lopes, Luiz Antônio Andrade Gonçalves, dos sucessores de Roberto José Steinfeld e do Banco FonteCindam;

9.2. condená-los, solidariamente, ao recolhimento ao Banco Central do Brasil da importância de R$ 522.348.000,00 (quinhentos e vinte e dois milhões, trezentos e quarenta e oito mil reais), atualizada monetariamente e acrescida de juros de mora de 1º/02/1999 até a data do pagamento;

9.3. aplicar a Cláudio Ness Mauch, Demósthenes Madureira de Pinho Neto, Francisco Lafaiete de Pádua Lopes e Luiz Antônio Andrade Gonçalves multas individuais de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), a serem recolhidas ao Tesouro Nacional, com atualização monetária, calculada da data deste acórdão até a data do pagamento, se este for efetuado após o vencimento do prazo abaixo estipulado;

9.4. aplicar ao Banco FonteCindam multa de R$ 1.000.000.000,00 (um bilhão de reais), a ser recolhida ao Tesouro Nacional, com atualização monetária, calculada da data deste acórdão até a data do pagamento, se este for efetuado após o vencimento do prazo abaixo estipulado;

9.5. fixar prazo de 15 (quinze) dias, a contar das notificações, para comprovação, perante o Tribunal, do recolhimento das dívidas acima imputadas;

9.6. autorizar a cobrança judicial das dívidas, caso não atendidas as notificações;

9.7. decretar, pelo prazo de um ano, a indisponibilidade dos bens dos responsáveis, pessoas físicas e jurídica indicadas no item 9.1 deste acórdão;

9.8. solicitar à Advocacia-Geral da União e o Banco Central do Brasil a adoção das medidas necessárias ao arresto dos bens dos responsáveis julgados em débito indicados no subitem 9.1 deste acórdão;

9.9. encaminhar cópia deste acórdão, bem como do relatório e do voto que o fundamentaram, ao Procurador-Geral da República, nos termos do § 3º do art. 16 da Lei 8.443/1992.

10. Ata n° 31/2015 – Plenário.

11. Data da Sessão: 5/8/2015 – Ordinária.

12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-1915-31/15-P.

13. Especificação do quorum:

13.1. Ministros presentes: Aroldo Cedraz (Presidente), Walton Alencar Rodrigues, Augusto Nardes, Raimundo Carreiro, José Múcio Monteiro, Ana Arraes (Relatora), Bruno Dantas e Vital do Rêgo.

13.2. Ministro-Substituto convocado: Augusto Sherman Cavalcanti.

13.3. Ministros-Substitutos presentes: Marcos Bemquerer Costa, André Luís de Carvalho e Weder de Oliveira.

|(Assinado Eletronicamente) |(Assinado Eletronicamente) |

|AROLDO CEDRAZ |ANA ARRAES |

|Presidente |Relatora |

Fui presente:

(Assinado Eletronicamente)

PAULO SOARES BUGARIN

Procurador-Geral

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