Parecer CAOP Saúde Ref. 042



PROTOCOLOS XXXXXXXXX/SESA, XXXXXXXXX/SESA, XXXXXXXX/SESA

Interessado: Ouvidoria da SESA-PR

Assunto: Transporte inadequado de criança de três anos pelo TFD.

1. A usuária do SUS, XXXXXXXX, registrou diversas reclamações na SESA-PR, informando que ela e seu filho XXXXXXXX, de apenas três anos de idade, não estariam recebendo adequado tratamento fora de domicílio (TFD) pelo município de Santa Cruz de Monte Castelo (comarca de Loanda).

Segundo relatório médico do doutor XXXXXXXX, datado de 27 de abril de 2010, o infante foi atendido naquela municipalidade com quadro de diarréia crônica (mais de um ano), apresentando o anticorpo anti transglutaminase humana IgA positivo, com suspeita de doença celíaca, devendo ser submetido a biópsia de intestino delgado seriado para confirmação diagnóstica (fl. 15).

Na primeira denúncia, de 15.12.2010, à Ouvidoria da SESA (nº XXXXXXXXXXXX/SESA), a usuária relatou que teve arcar com o custo do tratamento (R$ 800,00 em doação) e veio à Curitiba para realizar a consulta no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. O tratamento foi agendado pelo SUS, recebendo guia de autorização de consulta (fl. 17), mas afirmou ela que não tinha dinheiro para voltar à sua cidade.

Como a solicitação não era referente a agendamento de consulta especializada para o paciente e, sim, à forma como Santa Cruz do Monte Castelo estava conduzindo o tratamento fora de domicílio, a SESA encaminhou a reclamação à 14ª Regional de Saúde para ciência e providências (fl. 19), não tendo obtido resposta do gestor municipal.

2. Em uma segunda reclamação, de 22.12.2010, à Ouvidoria da SESA (nº XXXXXXXXXXX/SESA), a mãe do paciente declara que a Secretária de Saúde do município havia lhe prometido duas passagens de volta para sua cidade, mas foi surpreendida na metade do caminho de volta com a notícia de que teria que liberar um dos bancos para pessoa que havia recebido alta de um hospital. Diante do fato, trouxe o filho no colo enquanto suportou, mas depois foi obrigada a forrar com um pano no chão do corredor do ônibus para que ele ficasse mais bem acomodado. Na “parada da serra”, o motorista veio lhe dizer que não poderia ficar no chão, mas não havia banco e nem lugar para que ele pudesse ficar, de modo que uma passageira lhe cedeu, gentilmente, de seu assento para que a mãe e filho pudessem voltar de modo mais cômodo.

Em resposta, a Comissão Estadual de Tratamento Fora de Domicílio disse que “o TFD intermunicipal é de responsabilidade única do município” sugerindo que a reclamação fosse encaminhada ao Conselho Municipal de Saúde (fl. 6).

3. Em terceira queixa, de 4.7.2011, à Ouvidoria/SESA, a usuária informou que veio até Curitiba através de TFD “sem conforto nenhum – seu filho veio deitado no chão, somente em cima de um colchonete que ela mesma trouxe” e que segundo a Secretária de Saúde do Município “ela só tem direito à acompanhante (dois bancos para ela e seu filho) se tiver um pedido do médico” (fls. 4-5).

Por este motivo, providenciou uma autorização da médica do Hospital Pequeno Príncipe, doutora XXXXXXXXXXXX (fl. 06).

Mesmo com esta, a Secretaria de Saúde de Santa Cruz de Monte Castelo negou-se a comprar mais de uma passagem sob o argumento de que “segundo informações obtidas nas empresas de transportes de viagens a Curitiba, só vendem passagem para crianças acima de seis anos de idade devido a segurança das mesmas, visto que as crianças abaixo desta idade não são transportadas com segurança quando sentadas sozinhas na poltrona”, sendo este o motivo pelo qual o órgão “fornece a passagem somente para a mãe ou acompanhante da criança quando esta tem menos de seis anos de idade e deve se locomover para outra cidade com fins de tratamento clínico” (fl. 9).

4. Considerando as inúmeras vezes que a cidadã recorreu à Ouvidoria/SESA em busca de solução para seu problema, buscando melhor qualidade de atendimento para seu filho, o procedimento foi encaminhado para manifestação e/ou providências que couber em 15 de agosto de 2011.

5. O Tratamento Fora de Domicílio – TFD, instituído pela Portaria nº 55/1999 da Secretaria de Assistência à Saúde (Ministério da Saúde), e normatizado no Paraná através da Deliberação CIB/PR nº034/99 e do Manual de Regulamentação para Tratamento Fora de Domicílio/ TFD no Sistema Único de Saúde – SUS- PR, de abril de 2007, é um instrumento legal que visa a garantir, através do SUS, tratamento médico a pacientes portadores de doenças não tratáveis no município de origem por falta de condições técnicas.

O TFD consiste em uma ajuda de custo ao paciente, e em alguns casos, também ao acompanhante, encaminhados por ordem médica a unidades de saúde de outro município ou Estado da Federação, quando esgotados todos os meios de tratamento na localidade de residência do mesmo, desde que haja possibilidade de cura total ou parcial, limitado ao número máximo de cinco diárias, prorrogáveis, para pacientes que necessitem de assistência médico-hospitalar cujo procedimento seja considerado de alta e média complexidade eletiva.

O programa oferece consulta, tratamento ambulatorial, hospitalar/cirúrgico previamente agendado; passagens de ida e volta aos pacientes e, se necessário, a acompanhantes, para que possam deslocar-se até o local onde será realizado o tratamento e retornar a sua cidade de origem; ajuda de custo para alimentação e hospedagem do paciente e/ou acompanhante enquanto durar o tratamento.

Ele é autorizado apenas para pacientes atendidos na rede pública, ambulatorial e hospitalar, conveniada ou contratada do SUS; quando esgotados todos os meios de tratamento dentro do município; somente para municípios referência com distância superior a 50 km do município de destino em deslocamento por transporte terrestre ou fluvial, e 200 milhas por transporte aéreo; apenas quando estiver garantido o atendimento no município de destino, através do aprazamento pela Central de marcação de Consultas e Exames especializados e pela Central de Disponibilidade de Leitos; com exames completos, no caso de cirurgias eletivas; e com a referência dos pacientes de TFD explicitada na Programação Pactuada Integrada – PPI de cada município e na programação Anual do Município/Estado.

Para que seja concedido, o pedido deve ser formalizado em processo próprio e constituído com os seguintes documentos: pedido de tratamento fora de domicílio – PTFD, contendo laudo médico; fotocópia de exames, se houver; fotocópia de certidão de nascimento (paciente menor de idade) ou carteira de identidade (paciente maior de idade); fotocópia da carteira de identidade do acompanhante, se houver; comprovante de agendamento do procedimento a ser realizado e laudo de emissão de APAC, conforme pactuação no caso de TFD intermunicipal.

Para viabilizar o TFD intermunicipal, é competência do gestor municipal certificar-se da não existência do serviço no município, providenciar junto ao usuário e interessado os documentos citados, emitir laudo em formulário próprio do TFD e encaminhar a documentação para a Secretaria Municipal de Saúde, enquanto à Secretaria Municipal de Saúde incumbe analisar a solicitação de TFD, autorizando ou não; providenciar o agendamento do tratamento para a referência mais próxima; avaliar a necessidade de providenciar transporte ou ambulância nos casos em que o paciente esteja impossibilitado de utilizar outro tipo de transporte ou dependa de equipamentos essenciais à manutenção da vida; providenciar aquisição de passagens e ajuda de custo (item 2.3 do Manual supramencionado), com responsabilidade pelas despesas decorrentes da concessão de auxílio para tratamento fora do domicílio custeadas pela Secretaria Municipal de Saúde quando intermunicipal (item 4.1 do Manual); orientar o paciente a providenciar tudo o que for necessário para seu deslocamento, como: fraldas, sondas, cadeiras de rodas, oxigênio ou qualquer outro material.

Somente será admitido o custeio das despesas com acompanhante de menores de 18 anos quando o médico justificar a necessidade em formulário próprio (itens 3.2 e 3.3 do Manual).

6. Ao que tudo indica houve, de fato, falha na prestação do tratamento fora de domicílio. Em que pese à usuária tenha recebido indicação médica deste atendimento em outra localidade e autorização de necessidade de acompanhante, o Município se negou a custear a passagem dela e de seu filho, sob a justificativa de que o transporte de menor de seis anos de idade não poderia ser feita em assento separado da mãe, sem juntar qualquer regulamentação ou justificativa técnica para tanto.

É sabido que há um Regulamento do Transporte Coletivo Rodoviário Intermunicipal de Passageiros do Estado do Paraná. Para ele, em seu art. 52 estabelece que sem prejuízo do cumprimento dos demais dispositivos previstos na legislação brasileira de Trânsito e neste Regulamento, é de responsabilidade da transportadora, através de seu motorista e auxiliares, a condução do veículo de modo a não prejudicar a segurança e conforto dos passageiros. No art. 61 estabelece que são direitos do usuário do transporte coletivo rodoviário intermunicipal de passageiros ser transportado em condições de segurança, higiene e conforto durante a viagem e ter garantido seu lugar no ônibus nas condições expressa no bilhete de passagem, bem como transportar, sem pagamento de passagem, crianças até 6 (seis) anos de idade, desde que não ocupem assentos. O art. 88 ainda estabelece que o transporte de menores de idade será de responsabilidade da transportadora, a qual deverá observar as legislações vigentes sobre a matéria.

Dos dispositivos acima se infere que a transportadora não poderá fazer transporte de menor de seis anos em assentos separados sem pagamento de passagem. Contrario senso, havendo o pagamento de passagem e respeitada a legislação no que se refere ao transporte de crianças para fora da Comarca, será possível o deslocamento, sem que se vislumbre, a princípio, qualquer vedação legal, sobretudo quando a médica que atende XXXXXXXXXXX afirma que o ele necessita de retornos freqüentes acompanhado da mãe, solicitando auxílio-transporte para o paciente e sua mãe em assentos separados no ônibus (fl. 06 do protocolo 11.077.341-2/SESA).

É fato que a transportadora, como prestadora de um serviço, deverá garantir a segurança e conforto dos usuários, bem como o lugar no ônibus conforme condições expressas nos bilhetes de passagem. Em caso de criança transportada via TFD-intermunicipal incumbe à Secretaria Municipal de Saúde providenciar esses bilhetes de passagens separados e as condições de segurança que garantam o transporte (com aparatos físicos que sejam necessários, conforme a idade do usuário) ou, se entender melhor, providenciar transporte próprio ou ambulância nos casos em que o paciente esteja impossibilitado de utilizar o ônibus comum ou dependa de equipamentos essenciais à manutenção da vida.

7. Deste modo, a manifestação é no sentido de que a Secretaria Municipal de Saúde de Santa Cruz de Monte Castelo providencie assentos separados à usuária e ao menor, conforme indicação médica, com os aparatos de segurança necessários à sua proteção ou garanta transporte próprio, caso entenda que ele esteja impossibilitado de utilizar o ônibus comum, resguardando, assim, minimamente condições de adequabilidade no transporte e a própria dignidade da mãe e filho.

Curitiba, 22 de agosto de 2011.

MARCO ANTONIO TEIXEIRA

Procurador de Justiça

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