COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 3 - it

COMPLEMENTOS DO CAP?TULO 3

3B PA RADOXO DE EPR

O chamado paradoxo de EPR (Einstein, Podolsky e Rosen) tem origem num artigo publicado em 19353, o qual levantou um dos problemas mais fundamentais da teoria qu?ntica -- o problema de saber se a mec?nica qu?ntica ? uma teoria completa ou se, pelo contr?rio, cont?m vari?veis escondidas. Muita da literatura sobre este assunto ? obscura, especulativa ou mesmo err?nea, pelo que lhe faremos aqui uma breve refer?ncia, que pretende ser clara e objectiva. A quest?o colocada por EPR foi abordada posteriormente por Bell4, que estabeleceu certas desigualdades que s?o, em geral, violadas em sistemas de part?culas com correla??es qu?nticas. Muitas das experi?ncias sobre este tema consistem em demonstrar a viola??o das Desigualdades de Bell. Uma das mais decisivas foi a experi?ncia de Alain Aspect5 em 1982, que, pela sua simplicidade, vale a pena descrever mesmo que resumidamente. Neste caso, vale mesmo a pena ler o artigo original na "Physical Review Letters" -- ? mais claro e esclarecedor do que toda a restante literatura.

Na experi?ncia de Aspect, um par de fot?es era produzido numa fonte S, por decaimento radiativo de um ?tomo de c?lcio, excitado (Figura 3B.1), e cada fot?o era dirigido para um dos analisadores, A ou B, cuja orienta??o (de polariza??o) era escolhida ao acaso, ap?s a separa??o dos fot?es (recordar Figuras 1.3 e 1.4). A polariza??o dos fot?es era ent?o medida em cada um dos analisadores, colocados a cerca de 12 m um do outro.

Como o estado inicial e final dos estados at?micos t?m J = 0, a teoria qu?ntica prev? (e a experi?ncia confirma) que os fot?es apresentem a mesma polariza??o nos dois analisadores, qualquer que seja a sua orienta??o, desde que fiquem orientados paralelamente um ao outro (Figura 3B.1.a)). Note-se que isso acontece, mesmo que os polarizadores sejam rodados aleatoriamente para novas orienta??es depois da separa??o dos fot?es (desde que fiquem com orienta??es paralelas). Se pensarmos bem, isso ? muito estranho. Implica que os dois fot?es sejam sempre observados em coer?ncia de fase, mesmo que separados por grandes dist?ncias. Como ? que um fot?o sabe a polariza??o que foi medida no outro, que, na nossa perspectiva ing?nua, pode at? ter sido alterada ap?s a separa??o, se n?o comunicar com ele? Numa carta a Einstein, de 9 de Maio de 19486, Max Born dizia, em resposta a objec??es de Einstein a certos aspectos da teoria qu?ntica, que objectos distantes no espa?o, que prov?m de uma origem comum, n?o t?m de ser necessariamente independentes, mas Einstein n?o concebia como tal fosse poss?vel, dizendo que isso seria spooky action at a distance (ac??o fantasma ? dist?ncia).

Mas os resultados da experi?ncia t?m ainda mais surpresas. Se os analisadores forem

3A. Einstein, B. Podolsky, and N. Rosen, "Can quantum-mechanical description of physical reality be considered complete?", Phys. Rev. 47 777 (1935). 4J. S. Bell, Physics (N.Y.) 1, 195 (1965). 5Aspect, A., Grangier, P. & Roger, G., Phys. Rev. Lett. 49, 91 (1982). 6Max-Born, The Born-Einstein Letters 1916-1955, MacMillan, New York, (2005)

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PARADOXO DE EPR

rodados aleatoriamente e independentemente um do outro, mesmo depois da separa??o

dos fot?es, a probabilidade de serem detectados com a mesma polariza??o ? proporcional a cos2 (Figura 3B.1. b)) sendo o ?ngulo entre as orienta??es dos analisadores.

a)

A

x

Fot?o 1 S

y

Fot?o 2

B

x x

y

y

z

b) A x

y

Fot?o 1 S

Fot?o 2

TB x y

Figura 3B.1: Esquema de uma experi?ncia do tipo da de Aspect: um par de part?culas (e.g., fot?es) ? gerado numa fonte S, saindo cada uma para seu lado, em direc??o aos analisadores A e B, (representados pelos vectores A e B, respectivamente) cujas orienta??es finais s?o paralelas, em a); fazem um ?ngulo , em b).

Tais resultados parecem quase intuitivos, se nos recordarmos das experi?ncias com fot?es descritas no primeiro cap?tulo, e atendermos a que | A|B |2 = cos2 . Como ? que ?

poss?vel compreender estes resultados?

? f?cil chegar a estes resultados se considerarmos que os dois fot?es formam um sistema m?ltiplo, representado pelo estado entrela?ado

= 1 (|x x + |y y ) 2

(3B.1)

Tal como vimos em 3.6.5, quando o fot?o 1 (representado pelo primeiro ?ndice de cada

ket ) tem polariza??o x, o fot?o 2 (representado pelo segundo ?ndice) ter? necessariamente

polariza??o x; quando, o fot?o 1 tem polariza??o y, o fot?o 2 ter? polariza??o y. Isto

explica

a

situa??o

em

que

os

dois

polarizadores

t?m

orienta??es

paralelas.

O

factor

1 2

em (3B.1) implica que a probabilidade de ambos os fot?es terem polariza??o x ? 1/2, e

a de ambos terem polariza??o y ? tamb?m 1/2. Mas t?m ambos sempre a mesma.

De um modo geral, quando os analisadores t?m orienta??es que fazem um ?ngulo entre si, podemos prever os seguintes resultados

Probxx

=

Probyy

=

1 2

cos2

Probxy

=

Probyx

=

1 2

sen 2

(3B.2)

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COMPLEMENTOS DO CAP?TULO 3

em que Probxx significa a probabilidade de observar polariza??o x para o fot?o 1 e tamb?m x para o fot?o 2, nos respectivos analisadores. Probxy significa a probabilidade de observar polariza??o x para o fot?o 1 e polariza??o y para o fot?o 2. Se = 0 ser? Probxx = Probyy = 1/2. O factor de correla??o ? definido como fcorr = Probxx + Probyy - Probxy - Probyx.

Em termos das hist?rias consistentes de Griffiths podemos considerar, para o caso de analisadores paralelos, o sistema m?ltiplo (fot?es + analisador A). Supomos que a base de A ? {A0, Ax, Ay} (correspondente ao estado inicial e aos estados correspondentes aos resultados das observa??es, x e y).

No instante inicial, o estado entrela?ado dos dois fot?es ?

0

=

1 2

(|x x

+ |y y )

sendo o estado do sistema fot?es + analisador A, dado por

(3B.3)

|0 = |0 |A0

(3B.4)

ou seja o produto tensorial7 do vector do estado inicial dos fot?es com o vector do estado inicial do analisador A (?ndice 0) (ver 3.6.5.2).

Uma das fam?lias de hist?rias do sistema m?ltiplo ser? dada por

[0]

x1x2 y1y2

Ax1 B2x Ay1 B2y

(3B.5)

que significa que o sistema global, de matriz densidade [0], pode evoluir de dois modos diferentes: um dos ramos d? como resultado final Ax1 (foi observado o fot?o 1 com polariza??o x no analisador A); o outro ramo d? como resultado Ay1 (foi observado o fot?o 1 com polariza??o y no analisador A). Os resultados das medi??es em B est?o correlacionados como os observados em A. O factor de correla??o ? proporcional a cos2. ? curioso notar que, se a experi?ncia for feita com electr?es, o factor cos2 deve ser substitu?do por cos2(/2). Isso deve-se ao facto de que para part?culas de spin 1/2,

como os electr?es, ? preciso uma rota??o de 4 para obter o mesmo vector de estado,

contrariamente ?s part?culas de spin inteiro, como os fot?es, em que uma rota??o de 2

reproduz o estado inicial (ver Complemento 5A, mais ? frente).

Muitas experi?ncias deste g?nero t?m sido feitas, as quais confirmam a validade da teoria.

"Temos de concluir que um par de fot?es entrela?ados ? um objecto n?o separ?vel; ou seja, ? imposs?vel atribuir propriedades locais (realidade f?sica local) a cada fot?o. Em

7O produto tensorial ? aqui representado pelo s?mbolo , por representar produtos em que cada factor corresponde a tempos diferentes, mas em sucess?o.

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PARADOXO DE EPR

certo sentido, ambos os fot?es permanecem em contacto atrav?s do espa?o e do tempo. Conv?m que se diga, no entanto, que a n?o separabilidade, que ? a base da teleporta??o qu?ntica, n?o implica a possibilidade pr?tica de comunica??o, a velocidade superior ? da luz". Dizia ainda Aspect em 19998. Existem j? aplica??es tecnol?gicas potenciais e algumas j? realizadas, que utilizam o entrela?amento de fot?es, como a criptografia qu?ntica, a computa??o qu?ntica e a teleporta??o qu?ntica (a teleporta??o de Star Trek !). Existe extensa literatura na Internet, sobre estes temas, pelo que nos dispensamos de dar refer?ncias. Para terminar, talvez seja oportuno citar Richard Feynman em 19829: "... ainda n?o ? ?bvio, para mim, que n?o h? um problema real (com a mec?nica qu?ntica). N?o posso definir o problema, portanto suspeito que n?o h? problema, mas n?o estou seguro de que n?o h? problema. Por isso, gosto de investigar as coisas."

8A. Aspect, Nature, vol. 398 (1999) 189. 9R. Feynman; Inter. Journ, of Theoret. Phys. 21, 467 (1982).

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