RECURSO CRIME EM SENTIDO ESTRITO .br



RECURSO CRIME EM SENTIDO ESTRITO. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO FORMULADO  PELO PROMOTOR E RECONSIDERADO POR  SEU SUCESSOR QUE OFERECEU DENÚNCIA,  ANTES DE DEFERIDO. ADMISSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE PRECLUSÃO LÓGICA. -  DECISÃO REFORMADA - RECURSO  PROVIDO. A) No presente caso não há que se falar em preclusão  lógica, pois não houve incompatibilidade do primeiro  parecer do Ministério Público (que pedia o  Promotor de Justiça (o qual ofereceu a denúncia),  tendo em vista a autonomia que Parquet possui para  mudar de opinião. B)-PROCESSUAL PENAL. Denúncia. Não  acarreta nulidade o procedimento do representante  do Ministério Público, que, reconsiderando anterior  pedido de arquivamento do inquérito, oferece  denúncia." (RHC 59607, STF 2.ª Turma, Rel. Min. FIRMINO PAZ, Relator p/ Acórdão Min. DÉCIO MIRANDA, DJ de 25/02/1983.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de  Recurso em Sentido Estrito n.º 949401-3.

Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto  pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra decisão que revogou o recebimento da  denúncia contra (...). (fls.135/136)

Em suas razões o MINISTÉRIO PÚBLICO  manifestou seu inconformismo com a decisão de primeiro grau, (...). Alegou que não existe impedimento de haver posições diferentes entre membros do MINISTÉRIO PÚBLICO em um mesmo processo, especialmente se o feito sequer foi submetido à análise do Poder Judiciário. (fls. 195/204).

Nas contrarrazões, pugnou o réu para que seja negado  provimento ao recurso, pugnando pela manutenção da decisão que revogou o  recebimento da exordial acusatória e determinou o arquivamento da presente  ação, com fundamento na preclusão lógica. (fls.167/173)

A douta Procuradoria Geral de Justiça, em seu  judicioso parecer da lavra do Dr. (...) opinou pelo conhecimento  e provimento do recurso, para que a decisão seja reformada a fim de que a  denúncia seja recebida e dado prosseguimento à ação penal. (fls.202/207)

 

É o relatório.

Passo a DECIDIR.

 

II- Presentes os requisitos legais, conheço o recurso.

Assiste razão ao recorrente, concernente à  possibilidade da reforma da decisão que revogou o recebimento da denúncia a  fim de que seja recebida e dado prosseguimento à ação penal .

No presente caso, houve o primeiro parecer com o fito  de arquivar o caderno investigatório visto a ausência de indícios que configuram o crime (fls. 50/51) Após referido parecer, o magistrado intimou a vítima para que se manifestasse sobre interesse na continuidade no processo. Em sequência  os autos foram encaminhados para 6ª Vara Criminal da Comarca de Londrina, a  qual competia conhecer a matéria, onde foi aberto vistas ao Ministério Público,  o qual, em sua nova manifestação achou devido oferecer a denúncia, já que o  crime é grave, pelas circunstâncias do fato e pelas condições pessoais do  denunciado, e assim o fez. Posteriormente, ignorando-se o pedido anterior de  arquivamento, a denúncia foi recebida (fls. 75 e 76).

Contudo, após a resposta à acusação do denunciado, o  magistrado revogou o recebimento da denúncia e deferiu o pedido de  arquivamento adotando as razões expostas pelo Promotor de Justiça (fls. 50/51),  asseverando que ocorreu preclusão para o Ministério Público, por ter se  manifestado inicialmente pelo arquivamento do feito e depois, por outro  representante ter oferecido denúncia. Irresignado o Ministério Público interpôs  Recurso em Sentido Estrito afim da reforma da decisão, pleiteando o  recebimento da denúncia e prosseguimento ao processo.

Primeiramente, enfatizo que existem indícios de  materialidade e autoria, tendo como base o depoimento da vítima e sua  representante. Outrossim, (...). Portanto não há que se  falar em atipicidade da conduta.

No presente caso também não se pode admitir  aventada preclusão lógica, pois não houve incompatibilidade do primeiro parecer do MP (que pedia o arquivamento) em relação ao segundo parecer do MP (o qual ofereceu a denúncia), tendo em vista a autonomia que o Parquet  possuí para mudar de opinião.

Diante do pedido de arquivamento do inquérito  pelo Promotor de Justiça, o Juiz singular, em vez de cumprir o disposto no art. 28 do Código de Processo Penal, isto é, remeter os autos à Procuradoria-Geral  de Justiça para que ela confirmasse a manifestação ou designasse novo  Promotor para promover a ação penal, remeteu os autos novamente ao Órgão  Ministerial, que, por fim, decidiu por oferecer a denúncia.

Ora, quando o Ministério Público requer o  arquivamento, ele manifesta uma opinião sem força definitiva, cabendo ao  Juiz exercer a função de fiscal do princípio da indisponibilidade. Caso não  concorde com o arquivamento, deve o magistrado remeter os autos ao  Procurador-Geral da Justiça, que é quem tem, em última instância, a  disponibilidade da ação penal.

Embora sem cumprir a risca o procedimento previsto  na lei processual penal, o magistrado, no caso dos autos, não feriu nenhum  princípio processual ou material que ensejasse o reconhecimento de nulidade  da ação penal, na medida em que agiu dentro dos limites de seu encargo  de fiscal do princípio da indisponibilidade.

O Ministério Público, por sua vez, que é o órgão  legitimado para promover a ação penal, também agiu dentro de suas funções institucionais, sendo-lhe plenamente lícito reconsiderar sua posição anterior.

Assim, o ato de reconsideração foi praticado antes que  saísse da esfera de atuação disponível do Órgão Ministerial, já que não  houve acolhimento pelo Juiz do pedido de arquivamento, tampouco havia  sido encaminhado o processo à deliberação do Procurador-Geral.

Neste sentido, já decidiu o STF:

PROCESSUAL PENAL. Denúncia. Não acarreta  nulidade o procedimento do representante do  Ministério Público, que, reconsiderando anterior  pedido de arquivamento do inquérito, oferece  denúncia." (RHC 59607, 2.ª Turma, Rel. Min. FIRMINO PAZ, Relator p/ Acórdão Min. DÉCIO  MIRANDA, DJ de 25/02/1983, in RT 575/437.) 

De referido voto oportuno citar trecho do voto do  Min. Moreira Alves: "Também não vejo, no caso, a  configuração de nulidade, pois o Promotor  reconsiderou- e, a meu ver, podia fazê-lo- antes que o  ato anterior saísse de sua esfera de atuação disponível,  por não haver o Juiz ainda determinado o  arquivamento, ou por não ter concordado com ele,  encaminhando o processo à deliberação do  Procurador-Geral."

 

Registre-se, ainda, a anotação de DAMÁSIO E. DE JESUS ao art. 28, do Código de Processo Penal, verbis: "Promotor de  Justiça que, após requerer o arquivamento do inquérito policial, atendendo  às ponderações por escrito do juiz, oferece denúncia Admissibilidade, não  havendo violação do disposto no art. 28 deste Código (RT 424/372; STF,  RHC 59.607, DJU 25.2.83, p. 1537; RT 575/437 e RTJ 105/83)." (in  Código de Processo Penal Anotado, 19.ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 36)

Assim sendo, não há que se falar em preclusão lógica,  fundamento usado pelo Magistrado a quo para revogar o recebimento da  denuncia.

Além disso, deve ser preservada a independência de  convicção do Promotor. O Ministério Público é indivisível, e não vinculado à  manifestação de um dos seus representantes ao outro (princípio da  independência funcional).

Certo é que o pedido de arquivamento do inquérito  policial formulado por representante da Justiça Pública não vincula aquele que  lhe segue no seu conhecimento, podendo este, portanto, oferecer a denúncia,  desde que não proferido despacho atendendo ao pedido.[1]

Cito trecho do voto 1.133 TJ-SP, HC 250.502-3, Relator Des. Vito Guglielmi: "Insista-se que o indiciado não tem direito  líquido e certo ao arquivamento, uma vez requerido pelo Ministério Público..."

Portanto é lícito que mesmo após pedido de  arquivamento, o MP reconsidere o parecer e proceda com a denúncia do  acusado.

Oportuno transcrever trecho do parecer da douta  Procuradoria, da lavra do Dr. (...), que bem examinou a questão:  "Inicialmente cumpre salientar que a circunstância de que o Promotor Público, com atuação no processo inicialmente ter formulado pedido de arquivamento do  feito pela atipicidade, tal pedido não foi analisado pelo juízo de modo explicito,  mas o foi de modo tácito. Ora, o recebimento da denúncia pelo juízo a quo, que  entendeu presentes as condições de procedibilidade da exordial afastou ainda  que implicitamente o pedido de arquivamento. Portanto, se ocorreu preclusão no  caso, esta foi em relação ao juízo, que não pode por despacho posterior  reconsiderar a decisão de recebimento da denúncia para rejeitá-la. Incide,  portanto, no caso da preclusão pro judicato, consoante regra exposta pelo artigo  471, do Código de Processo Civil, aplicado analogicamente ao processo Penal  por força do disposto no artigo 3.º, da Lei Processual."(fls.203/204)

À vista do exposto o voto que proponho aos meus  pares é no sentido de dar provimento ao recurso, para que a decisão guerreada  seja reformada a fim de que prevaleça o recebimento da denúncia com o  prosseguimento da ação penal.

 

EX POSITIS

ACORDAM os Desembargadores integrantes da  Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade,  CONHECER do recurso e no mérito DAR PROVIMENTO, nos termos do  voto do Relator.

Presidiu o julgamento o Desembargador Marques  Cury e acompanharam o voto do Relator o Juiz Substituto em Segundo Grau  Rui Bacellar Filho e o Juiz Substituto em Segundo Grau Gilberto Ferreira.

 

Curitiba-PR, 07 de fevereiro de 2013.

Assinado Digitalmente 

JEFFERSON ALBERTO JOHNSSON

Juiz de Direito Substituto em 2.º Grau

 

 

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[1] In RT 556/316

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