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Volatilidade do c?mbio no Brasil

Desde 2020, a volatilidade da taxa de c?mbio BRL-USD est? num patamar maior do que o seu n?vel hist?rico. O Gr?fico 1 mostra a volatilidade impl?cita model-free extra?da de op??es de c?mbio com 1 m?s de prazo.1 Pode-se notar um significativo aumento da volatilidade a partir de mar?o de 2020, come?o da pandemia da Covid-19 no Brasil. A volatilidade permanece bastante elevada at? meados de 2020 e depois cai, mas n?o retorna aos valores pr?-pandemia. Para ilustrar, a m?dia di?ria da volatilidade entre outubro e dezembro de 2019 foi 10,33% a.a., enquanto nos mesmos meses de 2020 foi 19,42% a.a., quase o seu dobro. Aumentos na volatilidade da taxa de c?mbio contribuem para maior incerteza macroecon?mica, prejudicando a forma??o de expectativas dos agentes econ?micos em rela??o ao futuro da economia e a condu??o apropriada de pol?ticas p?blicas. Por exemplo, um c?mbio vol?til desincentiva investimentos externos e prejudica importadores e exportadores ao dificultar o planejamento dos agentes econ?micos. O objetivo deste boxe ? investigar os principais fatores que se relacionam ? volatilidade do c?mbio BRL-USD.

Gr?fico 1 ? Volatilidade impl?cita da taxa de c?mbio

% 35

30

25

20

15

10

5

0

Jan

Nov

Ago

Jul

Mai

Mar

Dez

2016

2017

2018

2019

2020

? importante observar que, diferentemente do n?vel da taxa de c?mbio, n?o h? na literatura um modelo estrutural consagrado para explicar a sua volatilidade. Usualmente, modela-se a volatilidade cambial por meio de modelos econom?tricos da fam?lia GARCH (generalized autoregressive conditional heteroskedasticity), que reproduzem alguns fatos estilizados observados.2 No entanto, uma das caracter?sticas dessa abordagem ? o uso de termos autorregressivos na equa??o do segundo momento do c?mbio. Esses termos geralmente dominam o ajuste do modelo e n?o deixam espa?o para outras vari?veis explicativas. Isso motiva o presente estudo a investigar os determinantes da volatilidade da taxa de c?mbio por meio de uma metodologia puramente emp?rica, do tipo kitchen sink, e que n?o inclui os termos autorregressivos. Ser? portanto testado um grupo de vari?veis potencialmente relevantes e escolhidas ad hoc. Dessa forma, esse boxe deve ser visto apenas como uma primeira etapa da investiga??o das vari?veis relacionadas ? volatilidade do c?mbio BRL-USD.

H? v?rios candidatos a explicar os movimentos da volatilidade, desde fatores sist?micos, como a pr?pria pandemia, que podem ser capturados, por exemplo, por ?ndices de volatilidade de mercados de moedas, juros ou a??es, at? fatores idiossincr?ticos dom?sticos, como a situa??o fiscal brasileira ou a estrutura do mercado cambial brasileiro.

1/ Diferentemente da volatilidade impl?cita extra?da de modelos de apre?amento de op??es, utiliza-se aqui o conceito de volatilidade impl?cita model-free por n?o assumirem uma distribui??o de probabilidade especifica para o pre?o do ativo-objeto, sendo extra?das diretamente do pre?o das op??es. O conceito de volatilidade model-free aqui empregado foi proposto por Bakshi, Kapadia e Madan (2003).

2/ Por exemplo, uma varia??o expressiva da taxa de c?mbio tem forte impacto na sua volatilidade, que demora para ser dissipado, uma vez que a volatilidade ? predominantemente inercial.

Mar?o 2021 \ Banco Central do Brasil \ Relat?rio de Infla??o \ 71

A estrat?gia emp?rica utiliza para vari?veis sist?micas o VIX,3 o D?lar Index de moedas emergentes (DXY_ EME),4 que ? uma cesta de moedas de pa?ses emergentes contra o d?lar norte-americano, o ?ndice de pre?o de commodities CRB e o primeiro componente principal da volatilidade impl?cita model-free extra?do de uma cesta de moedas de pa?ses emergentes (VOL_IMP_CP_EME).5 Para vari?veis locais, utilizam-se o CDS-Brasil de 5 anos (CDS), o diferencial de juros de 1 ano entre t?tulos brasileiros (em reais) e norte-americanos (DIF_ JUROS), e a quantidade de minicontratos de d?lar futuro negociados na bolsa brasileira B3 (MINI_DOLAR).

Al?m dessas vari?veis, utiliza-se tamb?m a taxa de juros a termo entre 3 e 5 anos, extra?da de t?tulos p?blicos do Tesouro Nacional negociados no Brasil (TERMO 3_5), que, assim como o CDS, tenta capturar o risco fiscal. Supostamente, em per?odos com maior risco fiscal, haveria um aumento da volatilidade do c?mbio.

A utiliza??o de uma vari?vel de liquidez do mercado futuro de minicontratos de d?lar torna-se potencialmente relevante em fun??o do aumento s?bito de neg?cios nesse mercado a partir de 2020 (Gr?fico 2), devido ? grande entrada de pessoas f?sicas nesse mercado. Esse aumento acaba por atrair fundos de high frequency, e esses fundos podem, em tese, aumentar volatilidade do c?mbio devido ? sua forma de opera??o.6

Gr?fico 2 ? Quantidade de minicontratos de d?lar futuro

negociados na B3

Mil por dia 2 000

1 600

1 200

800

400

0

Jan

Nov

Ago

Jul

Mai

Mar

Dez

2016

2017

2018

2019

2020

A Tabela 1 mostra diversas especifica??es do modelo de volatilidade cambial, estimadas por MQO ? M?nimos Quadrados Ordin?rios, em que a volatilidade impl?cita de 1 m?s ? a vari?vel dependente. Os modelos foram estimados utilizando amostra de 2011 a 2020, com dados em frequ?ncia di?ria.7

3/ ?ndice de volatilidade baseado em op??es, negociadas na bolsa de Chicago (CBOE), sobre a??es pertencentes ao ?ndice S&P500. Para mais detalhes, vide o s?tio: .

4/ Dispon?vel no s?tio do Federal Reserve Bank of St. Louis: . 5/ As moedas s?o as dos seguintes pa?ses: ?ndia, M?xico, R?ssia, Chile, Singapura, ?frica do Sul, Col?mbia, Mal?sia, Israel, Filipinas e

Tail?ndia. O componente principal ? padronizado para ter m?dia 0 e desvio-padr?o 1. 6/ Apesar do grande aumento de pessoas f?sicas no mercado futuro de minicontratos de d?lar, cerca de 80% do volume desse mercado

? formado por investidores institucionais, como fundos de investimentos e bancos. Al?m disso, mais de 95% dos neg?cios s?o opera??es de day trade (dados de junho de 2020), o que evidencia o grande n?mero de opera??es de alta frequ?ncia. 7/ Nossa amostra come?a em 2011, uma vez que nesse ano os minicontratos de d?lar futuro come?aram a ser negociados.

72 \ Relat?rio de Infla??o \ Banco Central do Brasil \ Mar?o 2021

Tabela 1 ? Resultados da estima??o de modelos da volatilidade do c?mbio no Brasil

Vari?vel Dependente: Volatilidade BRL-USD

(1)

(2)

(3)

C

9,511 ** 3,020 *** 0,515

(4,751)

(0,801)

(1,596)

VIX

0,285 *** 0,230 *** 0,203 ***

(0,034)

(0,032)

(0,034)

DXY_EME

-0,012

(0,024)

VOL_DXY_EME

4,260 * 14,836 ***

(2,432)

(2,143)

CRB

-0,010

(0,007)

VOL_CRB

0,395

-1,296 ***

(0,437)

(0,372)

VOL_IMP_CP_EME

CDS TERMO_3_5 DIF_JUROS MINI_DOLAR

0,030 *** (0,005)

-0,307 *** (0,103)

0,029 *** (0,004)

-0,313 *** (0,074)

0,644 *** (0,208) -0,215 * (0,111)

R2 Ajustado

0,61

Crit?rio SIC

4,98

Observa??es

2578

Erros-padr?o entre par?nteses.

*** p < 0,01, ** p < 0,05, * p < 0,10.

0,62 5,01 2578

0,54 5,18 2502

(4) 6,486 *** (1,374) 0,165 *** (0,034)

(5) 2,947 ** (1,460) 0,142 *** (0,036)

(6) 3,082 ** (1,323) 0,148 *** (0,036)

(7) -3,060 (2,032) 0,134 *** (0,034)

(8) -3,047 (2,022) 0,137 *** (0,032)

1,720 (2,263)

1,173 (1,708)

0,695

1,387 ** 1,525 ** 1,730 *** 1,715 ***

(0,447)

(0,592)

(0,595)

(0,584)

(0,583)

16,145 *** 12,438 *** 13,071 *** 15,297 *** 14,715 ***

(4,897)

(4,420)

(4,008)

(4,398)

(3,714)

0,024 *** 0,014 *** 0,015 ***

(0,004)

(0,004)

(0,003)

0,794 *** 0,753 ***

(0,165)

(0,129)

-0,422 *** 0,038

-0,045

(0,079)

(0,1)

(0,106)

6,3E-06 *** 6,2E-06 *** 8,9E-06 *** 9,1E-06 ***

(0)

(0)

(0)

(0)

0,65

0,68

0,68

0,69

0,69

4,91

4,82

4,81

4,78

4,77

2 430

2 231

2 231

2 222

2 222

No modelo 1, utilizam-se as vari?veis sist?micas VIX, DXY_EME e CRB e as vari?veis locais CDS e DIF_JUROS. No modelo 2, as vari?veis DXY_EME e CRB s?o consideradas em volatilidade em vez de em n?vel.8 No modelo 3, troca-se a vari?vel CDS por Termo_3_5, o que gera uma diminui??o no R2 ajustado da regress?o.

Os modelos 4, 5 e 6 incorporam a volatilidade dos pa?ses emergentes (VOL_IMP_CP_EME), que eleva o R2 ajustado e reduz o crit?rio de informa??o de Schwarz (SIC). Os modelos 5 e 6, por sua vez, acrescentam o MINI_DOLAR no conjunto de vari?veis explicativas, sendo que a diferen?a entre eles ? que o modelo 6 exclui o diferencial de juros interno e externo (DIF_JUROS), uma vez que, no modelo 5, a vari?vel MINI_DOLAR substitui a signific?ncia estat?stica dessa vari?vel.9 Por fim, os modelos 7 e 8 s?o similares aos modelos 5 e 6, respectivamente, com a diferen?a da troca do CDS por Termo_3_5.10

Dentre essas especifica??es, destaca-se a especifica??o (8), que possui maior R2 ajustado (empatada com a especifica??o 7) e menor crit?rio de informa??o de Schwarz (SIC), a fim de investigar a contribui??o de cada vari?vel nas mudan?as da volatilidade impl?cita de 1 m?s da taxa de c?mbio. O Gr?fico 3 mostra a adequa??o do modelo (8) ? volatilidade impl?cita. Pode-se observar que o modelo se ajusta bem aos movimentos da volatilidade do c?mbio.

8/ Ambas estimadas por meio de modelos econom?tricos da fam?lia GARCH. 9/ Todas as vari?veis nas regress?es s?o contempor?neas ? vari?vel dependente. Por quest?es de potencial endogeneidade, foram

testados tamb?m os modelos com as vari?veis independentes defasadas de um dia e n?o h? mudan?as significativas nos resultados. 10/ Outros modelos tamb?m foram testados (como, por exemplo, modelos com threshold e modelos com intera??es de vari?veis), mas

n?o obtiveram bons resultados.

Mar?o 2021 \ Banco Central do Brasil \ Relat?rio de Infla??o \ 73

Gr?fico 3 ? Volatilidade impl?cita observada e prevista

pelo modelo (8)

%

35

60

30

50

25

40

20

30

15

20

10

10

5

0

0

Jan 2016

Nov

Ago

2017

Volatilidade impl?cita (escala ? esquerda)

Res?duo do modelo (8) (escala ? direita)

Jul 2018

Mai 2019

Mar 2020

-10 Dez

Volatilidade prevista pelo modelo (8) (escala ? esquerda)

As vari?veis com maior relev?ncia para a volatilidade de c?mbio s?o as vari?veis locais, MINI_DOLAR e Termo_3_5: um desvio-padr?o a mais no n?mero de neg?cios de minicontratos de c?mbio (303 neg?cios) e na taxa de juros a termo (1,99 p.p.) gera, respectivamente, 2,76 p.p. e 1,50 p.p. a mais na volatilidade. Um desvio-padr?o a mais nas vari?veis sist?micas ? volatilidade impl?cita de outros emergentes, VIX, volatilidade do ?ndice de commodities ? gera, respectivamente, mudan?as positivas de 1,30 p.p., 1 p.p. e 0,59 p.p. na volatilidade do c?mbio.

Com essa mesma especifica??o, realizou-se um pequeno exerc?cio para estimar o peso de cada vari?vel no aumento da volatilidade na pandemia. Calculam-se as m?dias das vari?veis durante o per?odo considerado da pandemia (de 2.3.2020 a 30.12.2020 ? 218 observa??es) e imediatamente antes da pandemia (com o mesmo tamanho de amostra). A Tabela 2 apresenta essas m?dias.

Tabela 2 ? M?dia das vari?veis antes e durante a pandemia

Vari?vel

Antes da Pandemia Durante a Pandemia

Volatilidade do C?mbio BRL-USD (% a.a.) VIX (% a.a.) VOL_CRB (% a.a.) VOL_IMP_CP_EME (d.p. em rel. ? m?dia) TERMO_3_5 (% a.a.) MINI_DOLAR (n? de neg?cios - em mil)

10,53 15,50

1,47 - 0,07

7,50 344,11

21,02 31,57

1,76 0,07 8,16 1 009,51

Com a diferen?a das vari?veis antes e durante a pandemia e com os coeficientes da regress?o (8), calcula-se o valor esperado do aumento da volatilidade do c?mbio por meio da equa??o a seguir:

Como o aumento na m?dia da volatilidade foi 10,54 p.p. o erro da especifica??o (8) neste exerc?cio foi de apenas 0,75 p.p. De fato, o Gr?fico 3 mostra uma menor magnitude do res?duo do modelo (8) no per?odo mais recente, em compara??o com a sua s?rie hist?rica, indicando que o referido modelo econom?trico estimado apresenta um bom ajuste em rela??o aos dados observados recentemente. Por fim, dividindo-se cada termo da equa??o pela varia??o do valor esperado da volatilidade do d?lar, temos a estimativa do peso de cada vari?vel no aumento da volatilidade.

74 \ Relat?rio de Infla??o \ Banco Central do Brasil \ Mar?o 2021

Tabela 3 ? Peso de cada vari?vel no aumento da volatilidade na pandemia

Vari?vel

VIX VOL_CRB VOL_IMP_CP_EME TERMO_3_5 MINI_DOLAR

Peso

19% 4%

18% 5%

54%

Portanto, conclui-se que a maior volatilidade na taxa de c?mbio observada no Brasil desde o final do primeiro bimestre de 2020 deve-se, em grande parte, tanto a fatores dom?sticos (tais como o expressivo aumento de neg?cios de minicontratos de d?lar), como tamb?m a fatores externos (por exemplo, o aumento do VIX e a maior volatilidade cambial observada em pa?ses emergentes).

O diferencial de juros, em algumas especifica??es, ? estatisticamente significativo, mas explica uma parte relativamente pequena do aumento na volatilidade. Quando a vari?vel MINI_DOLAR ? colocada na regress?o, o diferencial de juros n?o ? estatisticamente diferente de zero e muda de sinal, dependendo da especifica??o. Ao analisar o modelo (4), o qual n?o possui a vari?vel MINI_DOLAR, um desvio-padr?o a menos no diferencial de juros (3,81 p.p.) gera um aumento de volatilidade de 1,61 p.p. Ao considerar apenas o per?odo da pandemia, utilizando essa mesma especifica??o, a participa??o do diferencial de juros na alta da volatilidade ? pequena. Da v?spera da pandemia (28.2.2020) ao final da nossa amostra (30.12.2020), per?odo em que a meta da taxa Selic foi de 4,25% a 2,00% a.a., a queda do diferencial de juros de 1 ano foi de 0,32 p.p. (de 3,03% para 2,71%), o que geraria um aumento de apenas 0,13 p.p. na volatilidade. Entretanto, nesse per?odo, a volatilidade do c?mbio aumentou 9,77 p.p., de 10,98% para 20,75%.

Refer?ncias

BAKSHI, G., KAPADIA, N.; MADAN, D. (2003). "Stock return characteristics, skew laws and the differential pricing of individual equity options". The Review of Financial Studies, 16, 101-143.

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