CONCEITO DE TERCEIRO PARA EFEITOS DE REGISTO

[Pages:99]CONCEITO DE TERCEIRO PARA EFEITOS DE REGISTO

SUM?RIOS DE AC?RD?OS 1996 ? FEV 2007

GABINETE DOS JU?ZES ASSESSORES

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Ac?rd?o do Supremo Tribunal de Justi?a Processo: 087159

Relator: TOME DE CARVALHO

Descritores: REGISTO PREDIAL TERCEIROS

Data do Ac?rd?o: 20-05-97 Vota??o: MAIORIA COM 11 VOT VENC Refer?ncia de Publica??o: DR I S-A DE 1997/07/04

Meio Processual: REC TRIB PLENO. Decis?o: TIRADO ASSENTO.

Sum?rio: Terceiros, para efeitos de Registo Predial, s?o todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado pr?dio, veriam esse direito ser arredado por um qualquer facto jur?dico anterior n?o registado ou registado posteriormente.

Decis?o Texto Integral: Ac?rd?o n.? 15/97 Processo 87159 - 1.? Sec??o. - Acordam, em plen?rio, os ju?zes das sec??es c?veis do Supremo Tribunal de Justi?a: A, recorrente na revista n.? 85369 da 1.? Sec??o deste Supremo Tribunal, onde era recorrido o Banco Totta & A?ores, S. A., n?o se conformando com o ac?rd?o a? proferido em 18 de Outubro de 1994, dele interp?s recurso para o tribunal pleno, nos termos dos artigos 763.? e seguintes do C?digo de Processo Civil, invocando estar ele em oposi??o, quanto ? mesma quest?o fundamental de direito, com o decidido no Ac?rd?o deste Supremo Tribunal de Justi?a proferido em 29 de Setembro de 1993, na revista n.? 83804. A referida oposi??o entre os indicados dois ac?rd?os foi reconhecida no ac?rd?o preliminar a fls. 52 e 53. Seguidamente, o recorrente alegou no sentido de terceiros, para efeitos de registo predial, serem apenas os supostos adquirentes de direitos incompat?veis sobre o mesmo objecto de um mesmo autor comum, n?o se enquadrando em tal conceito quem, por meio de execu??o, adquira um direito total ou parcialmente incompat?vel sobre aquele mesmo objecto. O Exmo. Magistrado do Minist?rio P?blico emitiu parecer no sentido de ser proferido ac?rd?o uniformizador da jurisprud?ncia nos seguintes termos: ?1 - Terceiros, para efeitos de registo predial, s?o aqueles que t?m a seu favor um direito e, por isso, n?o podem ser afectados pela produ??o dos efeitos de um acto que esteja fora do registo. 2 - A compra e venda em hasta p?blica de um pr?dio ? v?lida e sobrep?e-se a qualquer venda anterior n?o registada ou com registo posterior ao registo da penhora.? Colhidos os vistos, cumpre decidir. ? de referir, previamente, que este recurso, face ao disposto no artigo 17.?, n.? 3, do Decreto-Lei n.? 329-A/95, de 12 de Dezembro, ? destinado ? resolu??o do concreto

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conflito existente, ficando tamb?m a valer como uniformiza??o de jurisprud?ncia nos termos dos artigos 732.?-A e 732.?-B do C?digo de Processo Civil, na redac??o dada pelo mesmo decreto-lei.

Reexaminando a quest?o da exist?ncia da oposi??o de julgados sobre a mesma quest?o fundamental de direito, ? patente que ela se verifica.

Tal quest?o resume-se a saber o que s?o terceiros, para efeitos do registo predial, tendo em vista a norma contida no artigo 5.? do C?digo do Registo Predial.

No ac?rd?o recorrido, usando-se um conceito amplo, considerou-se terceiro aquele que tem a seu favor um direito que n?o pode ser afectado pela produ??o dos efeitos de um acto que n?o no registo e com ele seja incompat?vel. Assim, a compra em hasta p?blica de um im?vel prevalece sobre qualquer venda anterior n?o registada do mesmo bem ou com registo posterior ao registo da respectiva penhora.

No ac?rd?o fundamento, por seu lado, usando-se um conceito mais restrito, decidiu-se que terceiros s?o somente os supostos adquirentes de direitos incompat?veis sobre a mesma coisa de um mesmo autor comum. Vendo assim a quest?o, n?o ? terceiro o exequente que nomeou o bem ? penhora, sendo-lhe opon?vel uma aquisi??o anterior do mesmo bem, ainda que n?o registada.

Verificam-se, assim, todos os pressupostos formais e substanciais da admissibilidade do recurso. O que implica que se conhe?a do seu objecto.

Para a defini??o do direito aplic?vel, importa relembrar os factos apurados no ac?rd?o recorrido. S?o os seguintes:

Nos autos de execu??o ordin?ria em que ? exequente o Banco Totta & A?ores, SA., e executados B, Lda., e C foi penhorada, em 10 de Janeiro de 1992, a frac??o AF, correspondente ? habita??o n.? 17 do pr?dio em regime de propriedade horizontal sito na Rua do Prof. Bento de Jesus Cara?a, 15, no Porto, inscrito na matriz sob o artigo 10822, AF, Bonfim, e descrito na Conservat?ria do Registo Predial sob o n.? 133/070406, Bonfim;

Esta execu??o foi instaurada em 17 de Outubro de 1991 com base em t?tulos vencidos em Novembro e Dezembro de 1990, tendo essa frac??o sido nomeada ? penhora pelo exequente, embarcado no dia 3 de Janeiro de 1992, e, ap?s a penhora, foi o executado notificado em 16 de Janeiro de 1992;

Essa frac??o predial n?o se encontrava registada em nome do embargante (o terceiro A) e a penhora foi registada definitivamente;

Esta frac??o predial foi objecto de escritura p?blica de compra e venda (de fl. 5 a fl. 7 daquele processo), em que figura como comprador da mesma pelo pre?o de 11000000$00, j? recebido pelo vendedor, o embargante A e como vendedor o executado C.

No ac?rd?o recorrido, os embargos de terceiro foram julgados totalmente improcedentes, por se considerar que a penhora registada prevalece sobre a compra do mesmo bem n?o levada ao registo.

Para um caso igual, o ac?rd?o fundamento julgou os embargos procedentes, dando sem efeito a penhora.

Havendo que apreciar o ac?rd?o recorrido, dir-se-? que ele deve ser confirmado, por espelhar a boa doutrina.

Transferindo-se a propriedade da frac??o predial em causa para o embargante por mero efeito do contrato de compra e venda, nos termos dos artigos 408.?, n.? 1, e 879.?, al?nea a), do C?digo Civil, dir-se-ia que a posterior penhora de tal frac??o em execu??o instaurada contra o vendedor ? ineficaz em rela??o ao comprador, de todo estranho ao processo executivo. As coisas n?o podem, por?m, ser vistas com esta simplicidade. H? que considerar, no caso, as regras do registo predial.

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A transmiss?o da titularidade do direito de propriedade ? apenas um efeito essencial do contrato de compra e venda. Simplesmente, a efic?cia n?o pode ser vista somente num plano interno (entre vendedor e comprador, ou seus herdeiros), mas tamb?m num plano exterior (em rela??o a terceiros). E neste plano h? que tomar em conta os princ?pios do registo predial.

A aquisi??o do direito de propriedade sobre im?veis est? sujeita a registo - artigo 2.?, n.? 1, al?nea a), do C?digo do Registo Predial.

Como o est? igualmente a penhora - al?nea m) do n.? 1 do mesmo artigo 2.? Os factos sujeitos a registo s? produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo - artigo 5.?, n.? 1, do citado C?digo do Registo Predial. Assim, pretendendo-se que a efic?cia do contrato de compra e venda de bens im?veis n?o fique confina ao plano interno (artigo 4.?, n.? 1, do C?digo do Registo Predial), h? que o levar ao registo, pois este ? pressuposto da sua efic?cia relativamente a terceiros. Enquanto o acto n?o figurar no registo, o alienante aparece, em rela??o a terceiros, como titular do direito que transferiu por mero efeito do contrato de aliena??o. O que deve, por?m, entender-se por terceiros para efeitos do registo predial? Num conceito mais restrito, terceiros s?o apenas as pessoas que, relativamente a determinado acto de aliena??o, adquirem do mesmo autor ou transmitente direitos total ou parcialmente incompat?veis. Trata-se da defini??o de Manuel de Andrade, Teoria Geral da Rela??o Jur?dica, vol. II, p. 19, considerando-se apenas a hip?tese da dupla aliena??o do mesmo direito real. N?o ?, por?m, exacto que s? possa falar-se de terceiros quando o transmitente ou alienante seja comum. Como ? referido por Oliveira Ascens?o, Efeitos Substantivos do Registo Predial na Ordem Jur?dica Portuguesa, pp. 29 e 30, citado no Ac?rd?o deste Supremo de 18 de Maio de 1994, in Colect?nea de Jurisprud?ncia, ano II, t. 2.?, p. 113, ?parece-nos seguro que semelhante concep??o (a concep??o restrita) ? incompat?vel com os dados actuais da lei sobre registo. Porque existem hoje textos categ?ricos a estabelecer a aquisi??o por meio de registo, em termos que n?o t?m j? nada a ver com as hip?teses de dupla disposi??o de direitos incompat?veis sobre a mesma coisa. Essas hip?teses s?o a da aquisi??o de um direito em consequ?ncia da disposi??o realizada pelo titular aparente, por for?a de registo formalmente inv?lido (hoje o n.? 2 do artigo 17.?), e a da aquisi??o de um direito de invalidade substancial, que vem prevista no C?digo Civil (? feita aqui refer?ncia ao artigo 291.? desse C?digo).? Assim sendo, o conceito de terceiros tem de ser mais amplo, de modo a abranger outras situa??es que n?o somente a dupla transmiss?o do mesmo direito. Terceiros, como referem Antunes Varela e Henrique Mesquita, Revista de Legisla??o e de Jurisprud?ncia, ano 127.?, p. 20, ?s?o n?o s? aqueles que adquiram do mesmo alienante direitos incompat?veis mas tamb?m aqueles cujos direitos, adquiridos ao abrigo da lei, tenham esse alienante como sujeito passivo, ainda que ele n?o haja intervindo nos actos jur?dicos (penhora, arresto, hipoteca, judicial, etc.) de que tais direitos resultam?. Este entendimento ? tamb?m o defendido por Vaz Serra, Revista de Legisla??o e de Jurisprud?ncia, ano 103.?, p. 165, quando escreve: ?Pode dizer-se que, se um pr?dio for comprado a determinado vendedor e for penhorado em execu??o contra este vendedor, o comprador e o penhorante s?o terceiros: o penhorante ? terceiro em rela??o ? aquisi??o feita pelo comprador, e este ? terceiro em rela??o ? penhora, pois os direitos do comprador e do penhorante s?o incompat?veis entre si e derivam do mesmo autor.?

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E, de seguida, acrescenta o mesmo professor: ?A no??o de terceiro em registo predial ? a que resulta da fun??o do registo, do fim tido em vista pela lei ao sujeitar o acto a registo: e, pretendendo a lei assegurar a terceiros que o mesmo autor n?o disp?s da coisa ou n?o a onerou sen?o nos termos que constarem do registo, esta inten??o legal ? aplic?vel tamb?m ao caso da penhora, j? que o credor que fez penhorar a coisa carece de saber se esta se encontra, ou n?o, livre e na propriedade do executado.?

Defendendo-se este conceito amplo de terceiros, para efeitos de registo predial, pronunciaram-se Pires de Lima e Antunes Varela, C?digo Civil Anotado, vol. II, 3.? ed., n.? 4 ao artigo 819.?, e Anselmo de Castro, A Ac??o Executiva Singular, Comum e Especial, 3.? ed., p. 161.

S? este conceito amplo de terceiros tem em devida conta os fins do registo e a efic?cia dos actos que devam ser registados.

Na verdade, se o registo predial se destina essencialmente a dar publicidade ? situa??o jur?dica dos pr?dios, tendo em vista a seguran?a do com?rcio jur?dico imobili?rio (cf. artigo 11.? do C?digo do Registo Predial), t?o digno de tutela ? aquele que adquire um direito com a interven??o do titular inscrito (compra e venda, troca, doa??o, etc.) como aquele a quem a lei permite obter um registo sobre o mesmo pr?dio sem essa interven??o (credor que regista uma penhora, hipoteca judicial, etc.).

No caso que nos ocupa, o credor embargado e o embargante s?o terceiros. Por assim ser, e porque a compra efectuada pelo embargante n?o foi levada ao registo antes de a penhora ter sido registada, ? aquela ineficaz em rela??o a esta, devendo a execu??o prosseguir os seus termos. N?o importa apurar se o credor exequente agiu de boa ou m? f? ao nomear ? penhora a frac??o predial em causa. ? que a efic?cia do registo ? independente da boa ou m? f? de quem regista. Como ensinaram Antunes Varela e Henrique Mesquita, Revista de Legisla??o e de Jurisprud?ncia, ano 127.?, p. 23, ?o registo destina-se a facilitar e a conferir seguran?a ao tr?fico imobili?rio, garantindo aos interessados que, sobre os bens a que aquele instituto se aplica, n?o existem outros direitos sen?o os que o registo documento e publicita. Os direitos n?o inscritos no registo devem ser tratados como direitos 'clandestinos', que n?o produzem quaisquer efeitos contra terceiros. Se os efeitos do registo fossem impugn?veis pelo facto de o titular inscrito ter sabido ou ter podido saber, antes de requerer a inscri??o, que havia direitos incompat?veis n?o registados, o instituto do registo deixaria de proporcionar a seguran?a e a comodidade que constituem as suas finalidades principais.? Tal como se escreveu na mesma Revista, ano 54.?, p. 378, ?o registo tem uma dupla fun??o - a fun??o positiva, segundo a qual todos os actos registados se consideram conhecidos, e a fun??o negativa, que consiste em se considerarem n?o conhecidos os actos n?o registados.? N?o merecendo protec??o legal o direito invocado pelo embargante, porque afastado pelas regras do registo predial, h? que confirmar o ac?rd?o recorrido. Nestes termos, acordam em plen?rio as sec??es c?veis do Supremo Tribunal de Justi?a: I - Julgar improcedente o recurso, mantendo-se o ac?rd?o recorrido; II - Condenar o recorrente nas custas; III - Uniformizar a jurisprud?ncia do modo seguinte: Terceiros, para efeitos de registo predial, s?o todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado pr?dio, veriam esse direito ser arredado por qualquer facto jur?dico anterior n?o registado ou registado posteriormente.

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Lisboa, 20 de Maio de 1997. - Tom? de Carvalho - Herculano de Lima - Costa Soares - Silva Paix?o - Arag?o Seia - Fernando Fabi?o (votei a decis?o) - Machado Soares - Lopes Pinto - Torres Paulo (votei a decis?o) - Figueiredo de Sousa - M?rio Cancela - Sampaio da N?voa - Costa Marques - Pereira da Gra?a - Martins da Costa (vencido, nos termos da declara??o de voto que junto) - Roger Lopes (vencido, nos termos da declara??o que junto) - Sousa In?s (vencido, nos termos da declara??o que junto) - S? Couto (vencido, conforme a declara??o de voto do Exmo. Conselheiro Sousa In?s) - Joaquim de Matos (vencido, em conformidade com a declara??o de voto do Exmo. Conselheiro Dr. Sousa In?s) - Pais de Sousa (vencido, nos termos da declara??o de voto do Conselheiro Martins da Costa) - Cardona Ferreira (vencido, nos termos da declara??o junta) - Nascimento Costa (vencido, subscrevo a declara??o de voto do Sr. Conselheiro Sousa In?s) - Fernandes Magalh?es (vencido, em conformidade com a declara??o de voto do Exmo. Conselheiro Martins da Costa) - C?sar Marques (vencido, nos termos do voto do Exmo. Conselheiro Martins da Costa) - Almeida e Silva (vencido, nos termos do voto expresso pelo Exmo. Juiz Conselheiro Martins da Costa) Ribeiro Coelho.

Declara??o de voto Criticando a argumenta??o desenvolvida no ac?rd?o, direi que: 1 - ? verdade que existem hoje textos categ?ricos a estabelecer a aquisi??o por meio do registo - os contidos no n.? 2 do artigo 17.? do C?digo do Registo Predial e no artigo 291.? do C?digo Civil. Trata-se, por?m, a meu ver, de casos excepcionais, como tal previstos e disciplinados. 2 - N?o subscrevo a afirma??o de que ?a efic?cia do registo ? independente da boa ou m? f? de quem regista?. O registo predial confere publicidade ao direito registado, numa perspectiva de protec??o da f? p?blica, que encontra a sua raz?o de ser na boa f? de quem tenha procedido ao registo. Reportando-me agora ? doutrina nele citada, referirei as opini?es expendidas por: 1 - Diogo B?rtolo, Efeitos do Registo Predial, relat?rio apresentado no Semin?rio de Registos e Notariado do Curso de Mestrado em Ci?ncias Jur?dicas de 1985-1986, onde afirma, a p. 19, ?que a express?o ? '[...] s? produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo' n?o deve ser interpretada ? letra porque sen?o estar-se-ia a legitimar, antes do registo, toda e qualquer inger?ncia de terceiros na esfera jur?dica do verdadeiro titular do pr?dio, o que seria deveras estranho, dado a lei j? reconhecer o direito do adquirente ainda antes do registo, como se conclui do disposto no n.? 1 do artigo 4.? do C?digo do Registo Predial?, e, a p. 20: ?Pretende-se, com a publicidade registral, informar os terceiros acerca das titularidades sobre os pr?dios, a fim de evitar que sejam feitas aquisi??es a quem n?o tenha legitimidade para alienar. Sendo assim, parece leg?timo concluir que a lei, no artigo 5.?, n.? 1, apenas pretendeu proteger os terceiros que, iludidos pelo facto de n?o constar do registo a nova titularidade, foram negociar com a pessoa que no registo (ou fora dele) continuava a aparecer como sendo o titular do direito, apesar de j? o n?o ser.? 2 - Orlando de Carvalho, ?Terceiros para efeitos do registo?, in Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, LXX, 1994, que considera que o registo tem como caracter?sticas ser um registo de aquisi??es e n?o de pessoas, facultativo e declarativo (pp. 98 e 99). Diz mais este autor (p. 102): ?Quem adquiriu a domino, ainda que n?o tenha transcrito, ? sempre preferido a quem adquire a non domino, se bem que o seu t?tulo se

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torne p?blico. O que importa, em suma, ? real?ar que terceiros s?o apenas os que est?o em conflito entre si, o que s? se verifica quando o direito de um ? posto em causa pelo outro. Pressup?e isto que o transmitente ou causante ? o mesmo, pois, n?o o sendo, s? um dos adquirentes ? a domino e o direito do outro, mais do que afectado pelo direito daquele, ? afectado pelo n?o direito do seu tradens.?

Para acrescentar (p. 105): ?[...] a concorr?ncia entre a posse e o registo, ou presun??es fundadas numa e noutro, ? referida expressamente na lei (C?digo Civil, artigo 1268.?, n.? 1).?

E conclui (na mesma p?gina): ?[...] terceiros para efeitos de registo s?o os que do mesmo autor recebem sobre o mesmo objecto direitos total ou parcialmente conflituantes.?

Passarei agora a comparar a situa??o verificada nos autos, de penhora em bens registados em nome do executado, mas com oposi??o por embargos de quem se considera propriet?rio deles, com a situa??o que se encontra disciplinada pelo C?digo do Registo Predial relativamente ? penhora, de bens registados em nome de quem n?o ? o executado.

Neste ?ltimo caso, a penhora ser? registada provisoriamente, por natureza C?digo do Registo Predial, artigo 92.?, n.? 2, al?nea a).

No primeiro dos casos, o propriet?rio n?o ? admitido, sequer, a ilidir em ju?zo a presun??o derivada do registo, enquanto, no segundo, o juiz deve ouvir o titular do registo, no sentido de ele vir ao processo declarar se o bem lhe pertence ou n?o - artigo 119.?, n.? 1, daquele C?digo.

E ent?o, se o titular inscrito declarar que o bem penhorado lhe pertence, o juiz remeter? os interessados para os meios processuais comuns, conforme disp?e o n.? 4 deste artigo 119.?, e, se nada disser ou se declarar que o bem j? n?o lhe pertence, ser? expedida certid?o ? conservat?ria para convers?o oficiosa do registo em definitivo e prosseguirem os termos da execu??o, por for?a do n.? 3.

Consequ?ncias: no caso dos autos vir? eventualmente a pagar-se o cr?dito do exequente atrav?s da aliena??o de bens que, n?o sendo do devedor, n?o constitu?am garantia comum do cr?dito daquele, e isto sem possibilidade de discuss?o em ju?zo do conflito de direitos existente, mas, na hip?tese que suscitei, tudo decorrer? de harmonia com a regra de que ?o patrim?nio do devedor ? garantia comum dos credores?, j? podendo, agora, os efeitos da presun??o derivada do registo vir a ser discutidos em ju?zo.

Concordando com a argumenta??o constante do ac?rd?o fundamento, penso que, no sistema portugu?s de registo meramente declarativo e que constitui presun??o ilid?vel, a uniformiza??o da jurisprud?ncia deveria ter conduzido ? solu??o conferida pelo ac?rd?o fundamento. - Roger Lopes.

Declara??o de voto Salvo o devido respeito, entendo que o conceito de ?terceiros?, para efeito do registo predial, tem o sentido restrito de adquirentes, do mesmo autor ou transmitente, de direitos incompat?veis sobre certa coisa. ? esse o sentido que, tradicionalmente, tem sido usado na doutrina e na jurisprud?ncia (M. Andrade, Teoria Geral ..., vol. II, p. 19, Vaz Serra, Revista de Legisla??o e de Jurisprud?ncia, ano 97.?, p. 56, A. Varela, na mesma Revista de Legisla??o e de Jurisprud?ncia, ano 118.?, p. 313, e, entre outros, o Ac?rd?o deste Tribunal de 18 de Maio de 1994, na Colect?nea do Supremo Tribunal de Justi?a, vol. II, 2.? ed., p. 111), e, se tivesse pretendido a sua altera??o, o legislador n?o teria, razoavelmente, deixado de a consignar no C?digo Civil de 1996 ou nos sucessivos

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c?digos do registo predial; a falta de interven??o legislativa conduz, pois, a dever ter-se como relevante o sentido tradicional.

Tal sentido ? ainda o mais razo?vel, em fun??o da natureza n?o constitutiva mas simplesmente declarativa ou presuntiva do registo (artigo 7.? do C?digo do Registo Predial) e dos resultados ?injustos? ou onerosos que podem advir para o primeiro adquirente pelo mero descuido em proceder ao registo.

Em face desse conceito, o exequente que nomeia bens ? penhora e o seu anterior adquirente n?o s?o ?terceiros?: embora sujeita a registo, no caso de im?veis, a penhora n?o se traduz na constitui??o de algum direito real sobre o pr?dio, sendo apenas um dos actos em que se desenvolve o processo executivo ou, mais directamente, um ?nus que passa a incidir sobre a coisa penhorada para satisfa??o dos fins da execu??o; quem efectua a penhora n?o ? o exequente, que se limita a promov?-la, nem o executado, que a sofre, mas o tribunal, no uso dos poderes legais; e do entendimento de que o penhorante obt?m ?um direito contra o executado [...] que pode considerar-se deste, embora sem a sua interven??o? (Vaz Serra, Revista, cit., ano 103.?, p. 165), resulta uma acentuada amplitude do conceito de terceiros, incompat?vel com o apontado sentido restrito.

O mais que se poder? admitir ? que, por n?o dar a lei a no??o de ?terceiros?, esta deva ?ser depreendida da finalidade das disposi??es legais que sujeitam os actos a registos, e que ela pode variar consoante essa finalidade? (Vaz Serra, Revista, cit., ano 97.?, p. 59, nota), pelo que a sua aplica??o dever? atender ao regime de cada situa??o jur?dica, abstraindo-se de qualquer sentido amplo ou restrito.

Ora, tanto pelos efeitos que lhe s?o atribu?dos como pelo respectivo regime processual, n?o ? de aplicar ao caso da penhora o princ?pio estabelecido no artigo 5.?, n.? 1, do citado C?digo do Registo Predial.

Pelo artigo 819.? do C?digo Civil, ?sem preju?zo das regras do registo, s?o ineficazes em rela??o ao exequente os actos de aliena??o ou onera??o dos bens penhorados?, o que ? confirmado pelo artigo 838.?, n.? 3, do C?digo de Processo Civil. Assim, esses actos podem ser praticados e s?o v?lidos, s? n?o afectando os fins da execu??o, a qual prossegue como se os bens continuassem a pertencer ao executado, a n?o ser que o registo da penhora seja posterior ao desses actos.

Aquela inefic?cia, por?m, apenas se reporta aos actos posteriores ao registo da penhora, pelo que ?os actos de disposi??o ou onera??o dos bens, com data anterior ao registo da penhora, prevalecem sobre esta? (P. Lima e A. Varela, C?digo Civil Anotado, vol. II, 1.? ed., p. 67, e, no dom?nio da lei anterior, A. Reis, Proc. Exec., vol. II, p. 115).

No mesmo sentido concorre a circunst?ncia de, no anteprojecto do direito das obriga??es, se haver proposto a extens?o daquela inefic?cia aos actos anteriores n?o registados, o que n?o veio a ser acolhido no C?digo Civil (cf. Revista, cit., ano 103.?, p. 161), e os argumentos invocados por A. Castro para a interpreta??o extensiva do citado artigo 819.? (Ac??o Executiva ..., p. 156) s?o irrelevantes, pois a obrigatoriedade do registo da penhora, ao lado de outros actos, ? quest?o diversa da dos seus efeitos, e se o c?digo italiano cont?m disposi??o expressa destinada a ?p?r termo a d?vidas [...]?, mais razo?vel ? admitir-se que o legislador portugu?s, por n?o ter formulado id?ntica disposi??o, quis antes adoptar outra solu??o.

Por outro lado, s? podem ser penhorados, em regra, bens do executado (artigos 601.? e 817.? do C?digo Civil) e os bens por ele j? alienados, apesar da falta de oportuno registo, s?o bens de terceiro, que n?o est?o sujeitos ? execu??o nem devem, por isso, ser penhorados.

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