6450576 08012.002116/2016-21 - Minas Gerais
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SEI/MJ - 6450576 - Nota T?cnica
08012.002116/2016-21
MINIST?RIO DA JUSTI?A
Nota T?cnica n.? 92/2018/CSA-SENACON/CGCTSA/GAB-DPDC/DPDC/SENACON/MJ
PROCESSO N? 08012.002116/2016-21 REPRESENTANTE: REPRESENTADA: ASSUNTO: PR?TICA ABUSIVA EMENTA: PROCESSO ADMINISTRATIVO. CONSUMIDOR. OFENSA ? LIBERDADE DE ESCOLHA NAS CONTRATA??ES, PELOS CONSUMIDORES. DIFERENCIA??O DE PRE?O DE ACOMODA??ES E NEGATIVA DE OFERTA DE VAGAS, QUANDO EXISTENTES, DE ACORDO COM A LOCALIZA??O GEOGR?FICA DO CONSUMIDOR. T?CNICAS DE GEO PRICING E GEO BLOCKING. APLICA??O DE SAN??O DE MULTA NO VALOR DE R$ 7.500.000,00 (SETE MILH?ES E QUINHENTOS MIL REAIS).
Senhor Coordenador-Geral de Consultoria T?cnica e San??es Administrativas,
1.
Trata-se de Processo Administrativo instaurado no ?mbito do Departamento de Prote??o e
Defesa do Consumidor (DPDC), da Secretaria Nacional do Consumidor, do Minist?rio da Justi?a (MJ), em
raz?o do recebimento de representa??o proposta pela Brasil Servi?os de Reserva de Hot?is
Ltda. (Booking) - empresa que atua no mercado de hospedagem como intermedi?ria entre
estabelecimentos hoteleiros e consumidores - em face da empresa Ltda. (Decolar), tendo em
vista suposta pr?tica discriminat?ria, por esta ?ltima, favorecendo consumidores estrangeiros, em
detrimento de consumidores brasileiros.
2.
Segundo se extrai da representa??o, a Decolar estaria oferecendo reservas a pre?os
diferentes, a depender da localiza??o do consumidor, identificado por interm?dio do Internet Protocol - IP
(identifica??o ?nica para cada aparelho com acesso a Internet, conectado a uma rede), pr?tica conhecida
como geo pricing. Al?m disso, a Decolar estaria tamb?m ocultando a disponibilidade de acomoda??es a
consumidores brasileiros, em favor de consumidores estrangeiros, conduta
denominada geo blocking. Ambas as pr?ticas discriminam consumidores em raz?o da
localiza??o geogr?fica destes.
3.
Com vistas a comprovar o alegado, a empresa Booking colacionou aos autos pesquisa de
simula??o simult?nea de reserva de hospedagem no site da empresa Decolar, por meio de computadores
localizados nas cidades de S?o Paulo (Brasil) e Buenos Aires (Argentina), na qual foram registrados
valores diferentes para as mesmas reservas (i.e., acomoda??es iguais, na mesma data), os pre?os
alcan?aram a margem de at? 29% a mais para os consumidores brasileiros (n?mero de fls. SEI):
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29% de diferen?a na compara??o entre os pre?os para o hotel Sheraton Barra Rio de Janeiro (fl. 7):
27% de diferen?a na compara??o entre os pre?os para o hotel Windsor Oce?nico - Rio de Janeiro (fl. 8);
15% de diferen?a na compara??o entre os pre?os para o hotel Tryp Berrini (fl. 10);
15% de diferen?a na compara??o entre os pre?os para o hotel Tryp Iguatemi (fls.10 e 11)
10% de diferen?a na compara??o entre os pre?os para o hotel Clinipel Hotel-Emp?rio & Spa (fls. 11-12).
4.
Outrossim, foi constatada a indisponibilidade de algumas acomoda??es para o not?rio de
S?o Paulo, enquanto que, em Buenos Aires, ao mesmo tempo, a mesma acomoda??o era mostrada como
dispon?vel. A pesquisa foi realizada nas datas entre 26 de abril e 4 de maio de 2016:
Hotel Frontenac n?o disponivel para consumidores no Brasil e dispon?vel para consumidores na Argentina (fl. 16);
Royal Rio Palace Hotel n?o dispon?vel para consumidores no Brasil e dispon?vel para consumidores na Argentina (fl.17);
Hotel Vilamar Copacabana n?o dispon?vel para consumidores no Brasil e dispon?vel para consumidores na Argentina (fl. 18)
5.
Ademais, ? den?ncia foram anexadas c?pias de correspond?ncias eletr?nicas trocadas entre
a Booking e alguns estabelecimentos hoteleiros, nas quais esses estabelecimentos indagavam sobre a
possibilidade de a empresa trabalhar com "diferen?a tarif?ria em mercados espec?ficos" (fl. 21), a fim de
adotar "tarifas mais agressivas no Brasil", pr?tica comum no setor hoteleiro e utilizada pela Decolar. Toda
a troca de e-mails est? entre as fls. 21-26.
6.
Ap?s a an?lise da den?ncia, a Decolar foi notificada (Notifica??o n? 97/2016/CCT-
SENACON/CGCTSA/DPDC/SENACON) para que prestasse esclarecimentos quanto ao seguinte: a) se
tinha conhecimento sobre se o mercado hoteleiro brasileiro adota a pr?tica de geopricing e se tal pr?tica ?
adotada pela ; b) se a adota a pr?tica de geo pricing; c) como
a explica a diferen?a de pre?os em pesquisas de hot?is acostadas aos autos; d) como
a se posiciona quanto aos e-mails anexados ? den?ncia em que h? relatos de conversas
citando que a empresa pratica geo pricing; e) de que modo hot?is parceiros da podem intervir
no estabelecimento do valor da di?ria apresentada aos consumidores no site; f) se a facilita
que hot?is possam praticar geo pricing; h) se a j? deixou de oferecer acomoda??es a
consumidores em raz?o da nacionalidade do consumidor.
7.
Em resposta, a empresa Decolar negou que praticasse geo pricing e afirmou que s? tomou
conhecimento da pr?tica por meio das representa??es que a Booking prop?s contra a Representada em
v?rios ?rg?os de fiscaliza??o. Aduziu ainda que n?o existe ferramenta disponibilizada pela Decolar aos
hot?is parceiros, por meio da qual seja poss?vel dar tratamento diferenciado aos consumidores a partir da
localiza??o geogr?fica destes; que os pre?os diferentes encontrados pela pesquisa da Booking s?o
explicados pelo fato de a Decolar ser empresa diferente da Despegar (".ar"), apesar de
ambas pertencerem ao mesmo grupo; que a Decolar tem contratos diretos com hot?is no Brasil e
a Despegar tem contratos com hot?is argentinos; que para mostrar os pre?os dos hot?is localizados fora do
pa?s de atua??o, a Decolar usa plataforma oferecida por fornecedores internacionais, como a Travel
Now, do grupo Expedia; que os pre?os e a disponibilidade s?o colocados na plataforma Decolar e na
plataforma do grupo pelo pr?prio hotel, sendo a Decolar mera intermedi?ria entre o
consumidor e o hotel; que, como s?o empresas distintas, a Decolar e a Despegar usam plataformas
informatizadas diferentes e independentes; que as informa??es presentes nos e-mails trocados entre
a Booking e os hot?is n?o s?o corretas; que n?o estabelece a tarifa dos servi?os de hot?is ? os pr?prios
hot?is o fazem, exclusivamente; que os hot?is podem alterar seus pre?os e disponibilidade livremente,
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bastando que alterem informa??es lan?adas na plataforma informatizada da ; que sua pol?tica de melhor pre?o pode provar o fato de a Decolar n?o ter influ?ncia na precifica??o das tarifas hoteleiras, considerando que, segundo essa pol?tica, se o consumidor encontrar pre?o mais baixo que o exibido pela Decolar, a empresa indeniza o consumidor pela diferen?a, n?o alterando a tarifa do hotel, mas apenas pagando a diferen?a; que a remunera??o da Decolar limita-se ? comiss?o que recebe pela intermedia??o da rela??o entre o hotel e o consumidor, com base no pre?o da tarifa; que a Decolar n?o tem influ?ncia na disponibilidade de quartos dos hot?is parceiros; que a disponibilidade ? oferecida pelos pr?prios hot?is, exclusivamente; que os hot?is podem alterar a disponibilidade de seus quartos livremente, bastando, para tanto, que alterem as informa??es lan?adas na plataforma informatizada da Decolar.
8.
Com vistas a instruir o presente procedimento administrativo, na data de 21 de julho de
2016, foi expedido o Of?cio n? 264/2016/CCT-SENACON/CGCTSA/DPDC/SENACON-MJ, para o
Minist?rio P?blico do Estado do Rio de Janeiro, a fim de que informasse quanto a poss?veis conclus?es
acerca do Inqu?rito Civil 347/2016-0004691124, em tr?mite em desfavor da , contemplando
iguais fatos. At? a presente data, o Parquet ainda n?o apresentou resposta ?quele Of?cio.
9.
Em seguida, de forma complementar, nova peti??o foi apresentada pela empresa Booking,
no dia 1? de agosto de 2016, na qual restou registrado que, em tese, a pr?tica de geo pricing e geo
blocking tendem a ser adotadas pela com a finalidade de: (i) por interm?dio da majora??o de
pre?os aos brasileiros, privilegiar os consumidores que pagar?o a hospedagem em moeda estrangeira, que,
em raz?o da crise econ?mica que afeta o pa?s, est? muito mais valorizada do que o real; (ii) por meio da
recusa de oferta para brasileiros, fugir ? fiscaliza??o dos ?rg?os brasileiros, que, principalmente em ?pocas
de grandes eventos (tais como a Copa do Mundo e Jogos Ol?mpicos), atuam de forma mais rigorosa na
avalia??o de eventual aumento abusivo de pre?os de servi?os.
10.
Ademais, com base ainda na representa??o acostada pela a Booking, foi refutada a alega??o
de que a e a n?o seriam, ao menos, empresas de um mesmo grupo econ?mico.
Aos autos foi anexada ata notarial do dia 14 de julho de 2016, em que s?o detalhadas in?meras
semelhan?as entre os sites das empresas, cite-se: (i) quando o consumidor brasileiro busca o
site na Internet, a p?gina ? automaticamente direcionada para o
endere?o ; (ii) a formata??o dos sites, as cores utilizadas e os logotipos apresentados
nos sites da "" e "" s?o exatamente os mesmos;(iii) as fotos das
acomoda??es anunciadas nos sites "" e "" tamb?m s?o id?nticas, de modo
a demonstrar que o contrato entre a propriedade anunciante ? o mesmo para os dois sites; (iv) a base
de dados/n?mero de hot?is oferecidos pela e pela tamb?m ? exatamente a
mesma; (v) possui campo espec?fico com os contatos dos escrit?rios da empresa Decolar, e
o site tamb?m possui campo espec?fico com os escrit?rios da Despegar em diversos pa?ses,
sendo que os telefones dos escrit?rios da e da s?o exatamente os
mesmos; (vi) o indiv?duo que estiver procurando emprego na , ao acessar o campo
"carreiras", dispon?vel no site, ser? "coincidentemente" direcionado, de forma autom?tica, para uma
p?gina da ; (vii) A pol?tica de privacidade de ambos os sites tamb?m ? id?ntica. A ?nica
diferen?a ? que a apresenta o documento em portugu?s e a apresenta o
mesmo documento em espanhol; (ix) caso alguma propriedade, ademais, decida anunciar suas
acomoda??es no site ou no , ser?o aplicados os mesmos procedimentos e as
mesmas regras; (x) que o Presidente (CEO) da e da ? a mesma pessoa, o Sr.
Roberto Souviron, de nacionalidade argentina.
11.
A Booking adicionou outra ata notarial, elaborada em 30 de junho de 2016, a qual teve por
escopo demonstrar reiterada conduta de descumprimento da legisla??o consumerista por parte da
. De acordo com o referido documento, o not?rio teria realizado acesso simult?neo aos
sites .br e .ar, a fim de comparar as tarifas pelos hoteleiros, bem
como verificar a disponibilidade de vagas para acomoda??o de consumidores brasileiros e ap?s a coleta da
informa??o constatou: "diferen?as de pre?os de mais de 80% para consumidores brasileiros e
estrangeiros" e falta de vagas de hospedagem para brasileiros, com recusas frequentes e
injustificadas. [AS1] Citem-se alguns registros a t?tulo de ilustra??o:
" (...) O pre?o do Copa Sul Hotel, localizado na cidade do Rio de Janeiro/RJ, atrav?s do site .br, ?s 12:19 (hor?rio oficial de Bras?lia), para reserva entre os dias 30.09.2016 e 07.10.2016, sendo um quarto para dois adultos, verifica-se que ao
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consumidor brasileiro ? oferecida a di?ria por R$ 298,01. No entanto, aos consumidores argentinos, atrav?s do site .ar, esta mesma acomoda??o e na mesma data (de 30.09.2016 a 07.10.2016), ? oferecido o valor de ARS 256,43 (equivalente a R$ 54,85). H? uma diferen?a, portanto, de MAIS DE 540% para a mesma acomoda??o e pelo mesmo per?odo quando os contratantes buscam as tarifas no site destinado aos consumidores brasileiros".
"(...) no Belmond Copacabana Palace, na cidade do Rio de Janeiro/RJ, para os dias 25.08.2016 a 28.08.2016, atrav?s do site.br, foi informado que "n?o havia quartos dispon?veis", em pesquisa feita ?s 15:07 (hor?rio de Bras?lia). No entanto, pesquisando o mesmo hotel para esta mesma data (de 25.08.2016 a 28.08.2016) atrav?s do site.ar, verificou-se que h? disponibilidade de acomoda??es pelo valor da di?ria de ARS 6.884,00 (aproximadamente R$ 1.472,49)".
12.
Em 15 de agosto de 2016, o Diretor do Departamento de Prote??o e Defesa do Consumidor
determinou a instaura??o de processo administrativo para apura??o dos fatos narrados pela Booking e
documentos acostados aos autos da Averigua??o Preliminar. No Despacho de instaura??o (documento do
SEI n? 2780234), o Diretor acata a fundamenta??o da Nota T?cnica n? 141/2016/CCT ?
SENACON/CGCTSA/DPDC/SENACON, por meio da qual a Coordena??o-Geral de Consultoria T?cnica
e San??es Administrativas expressa as raz?es por que sugere a instaura??o do presente processo. Essas
raz?es foram, em s?ntese: a suposta viola??o aos arts. 4 ?, caput, I e III; 6?, II, III, IV e VI e 39, II, V, IX e
X, do CDC, o aparente cometimento do crime definido no art. 7?, I, da Lei 8.137 de 27 de dezembro de
1990, a configura??o da infra??o disposta no art. 9?, inc. VII, e, por fim, a desobedi?ncia ao art. 2?, inc. do
Decreto n. 7.962/2013.
13.
Instada a se manifestar sobre a decis?o de instaura??o do processo administrativo, a
empresa alegou, preliminarmente, que a Booking atua irregularmente no Brasil e que n?o teria
legitimidade para a defesa de direitos difusos, coletivos ou individuais coletivos. Alegou, ainda, que a
legisla??o a ser considerada para a resolu??o da presente demanda seria aquela relativa ? atividade de
turismo e que a compet?ncia para analisar a representa??o da Decolar seria do Minist?rio do Turismo. No
m?rito, a Decolar respondeu que n?o controla os pre?os de acomoda??es ofertados em sua plataforma,
sendo apenas intermedi?ria entre os hot?is os consumidores. Refor?ou, ainda, que a Despegar e a Decolar
s?o empresas diferentes, apesar de pertenceram ao mesmo grupo econ?mico. Aduziu, ainda, que usu?rios
em diferentes pa?ses n?o estariam na situa??o de igualdade prevista pela CF/88, porque o estrangeiro
estaria sujeito a regime jur?dico diferente do brasileiro, al?m disso, dever-se-ia levar em conta a taxa de
c?mbio diferente. Por fim, a Decolar afirma que a Booking alterou os e-mails trazidos aos autos, que
comprovariam a negocia??o de tarifa de hotel mais onerosa ao consumidor brasileiro; afirma, para
justificar o alegado, que a Representante usou tarjas pretas nos textos apresentados, e esse expediente
impediu a identifica??o da origem do e-mail e a identifica??o do hotel que negociaria a tarifa irregular.
14.
Em alega??es finais, protocoladas neste Minist?rio em 10 de julho de 2017, a Decolar
afirmou que os pre?os e disponibilidade de quartos de hotel s?o equivalentes para consumidores no Brasil
e na Argentina. Para comprovar o alegado, juntou prints de tela e atas notariais produzidas no Brasil e na
Argentina, ao mesmo tempo, referentes a pesquisa de acomoda??es realizada no site e
no site .ar, sendo que a pesquisa em cada um dos sites foi feita nos dois pa?ses
simultaneamente (o site foi acessado nos dois pa?ses e o site .ar foi
acessado tamb?m nos dois pa?ses). A empresa acrescentou que n?o existe ferramenta em seu site que
permita ao hotel anunciar pre?os diferentes de acordo com a localiza??o do IP do usu?rio e que a gest?o de
pre?os e disponibilidade na plataforma da ? realizada por meio de uma "extranet" (interface
por meio da qual os hot?is administram seus an?ncios). A Decolar argumentou tamb?m que h? pequena
diferen?a de pre?os quando a pesquisa ? feita simultaneamente no site da e no site da
.ar, porque tratam-se de empresas diferentes, uma estabelecida no Brasil e outra na
Argentina, regidas por legisla??es diferentes ? inclusive tribut?rias ? o que justificaria essa diferen?a. Por
fim, a Representada traz demonstrativos do capital societ?rio de cada uma das empresas, com o intuito de
provar serem elas sociedades empres?rias. diferentes.
15.
A Booking ainda refutou as alega??es da Decolar, em peti??o protocolada em 27 de julho.
Nessa pe?a, a Representante explica o funcionamento da geolocaliza??o: por meio do registro que cada
usu?rio faz, ao adquirir um aparelho que se conectar? ? Internet, e tamb?m por meio do n?mero IP
(Internet Protocol). Alegou tamb?m que, ao digitar o endere?o .br, na barra de
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endere?os, o usu?rio ? direcionado ? p?gina (que ? totalmente voltada ao p?blico brasileiro), da mesma forma que se algu?m na Argentina digita .ar, ser? direcionado a (site voltado ao p?blico argentino) e que isso demonstra como funciona o mecanismo de geolocaliza??o. Que, caso um usu?rio no Brasil queira acessar o site argentino, teria que saber o endere?o eletr?nico deste site (ou seja, .ar). Aduziu ainda que a Decolar tentou confundir o DPDC, nas alega??es finais apresentadas, quando mostrou pre?os dos sites e do site .br e que, em verdade, a compara??o dos pre?os desses sites evidencia a discrep?ncia nos pre?os oferecidos pela Decolar. Reafirma que a Decolar e a Despegar s?o a mesma empresa, alegando que h? v?rias elementos nas p?ginas eletr?nicas de ambos que s?o id?nticos: a base de dados/n?mero de hot?is, os telefones de contato, a pol?tica de privacidade, o e-mail de contato e o presidente de ambas as empresas s?o os mesmos. Traz aos autos imagens de capturas de tela de computador, em que se veem comparados os pre?os de sites da no Brasil e na Argentina, mostrando pre?o id?ntico de acomoda??es. A empresa alega que essa ? a demonstra??o de que, ao contr?rio da Decolar, ela - Booking - n?o pratica o geopricing. A Representante aduziu ainda que os exemplos colacionados aos autos pela Decolar, em alega??es finais, que procuram mostrar que esta empresa n?o faz discrimina??o entre consumidores, s?o pouco relevantes diante de uma centena de evid?ncias trazidas aos autos pela . Al?m disso, alega que a base de compara??o usada pela Decolar ? equivocada, e que o par?metro para compara??o deve ser aquele entre os sites e .ar. A Representante refutou ainda a tese da Representada de que as diferen?as de pre?o seriam tribut?rias, uma vez que, estando no Brasil as acomoda??es, os tributos recolhidos seriam os mesmos.
? o relat?rio.
II ? Fundamenta??o da Decis?o ora sugerida
a. Da Compet?ncia do DPDC ? Departamento de Prote??o e Defesa do Consumidor da Secretaria Nacional das Rela??es de Consumo do Minist?rio da Justi?a
16.
A quest?o em exame ultrapassa contornos individuais para impactar a coletividade, dado
que a oferta de acomoda??es atinge grande n?mero de consumidores. ? necess?rio mencionar tamb?m que
a oferta ? veiculada pela internet, meio de acesso a informa??o que cresce exponencialmente no pa?s.
Al?m disso, a exibi??o de pre?os diferentes de hospedagem ou a negativa de servi?os para usu?rios no
Brasil caracteriza pr?tica de precifica??o discriminat?ria que fere os fundamentos do direito consumerista
e a dignidade humana como um todo.
17.
Nos termos da legisla??o vigente (cf. Decreto n. 9.360/18), ao DPDC - Departamento de
Prote??o e Defesa do Consumidor, subordinado ? Secretaria Nacional do Consumidor do Minist?rio da
Justi?a, compete "fiscalizar demandas de relevante interesse geral e de ?mbito nacional e aplicar as
san??es administrativas previstas nas normas de defesa do consumidor, podendo, para tanto, instaurar
averigua??es preliminares e processos administrativos".
18.
Considerando-se que a empresa efetuou ampla oferta e comercializa??o de servi?os de
hospedagem, em ?mbito nacional e atingindo um n?mero consider?vel de consumidores, torna-se patente a
compet?ncia do Departamento de Prote??o e Defesa do Consumidor (DPDC) para an?lise dos fatos, de
acordo com o Decreto n.? 2.181/97.
b. Vulnerabilidade, transpar?ncia, boa-f? e equil?brio: da viola??o aos princ?pios que orientam a prote??o ao consumidor, no caso em exame
19.
A Constitui??o Federal de 1988 situa o Direito do Consumidor no rol dos direitos e
garantias fundamentais do cidad?o (art. 5?, XXXII) e estabelece ser dever do Estado promover, na forma
da lei, a defesa do consumidor.
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20.
Para tanto, na disciplina conferida ao tema pelo CDC - C?digo de Defesa do Consumidor,
foi estabelecida a vulnerabilidade do consumidor, no mercado de consumo, como o primeiro dos
princ?pios orientadores da Pol?tica Nacional das Rela??es de Consumo, cujo objetivo envolve, de forma
expressa, orientar rela??es mais transparentes e harmoniosas (CDC, art. 4o, caput e I).
21.
? justamente com base nessa premissa maior (a vulnerabilidade do consumidor), que
outros princ?pios e regras se entrela?am, formando uma moldura protetiva bastante abrangente e s?lida,
claramente focada no delineamento de rela??es pautadas na boa-f? e equil?brio entre consumidores e
fornecedores.
22.
Vale lembrar, nesse passo, que a vulnerabilidade ? usualmente dividida em tr?s ?mbitos,
pela doutrina brasileira: a t?cnica, a jur?dica e a f?tica. Observa-se, no caso em comento, que ? a
vulnerabilidade f?tica aquela que mais evidentemente se pode observar, na perspectiva dos consumidores.
Isso porque o usu?rio que estiver no Brasil e procurar por servi?os de hospedagem por meio da Decolar
desconhecer? que outros consumidores, em outros pa?ses, podem ser beneficiados com tarifas menos
onerosas. Al?m disso, tamb?m n?o saber? que n?o tem acesso ao cat?logo completo de acomoda??es
dispon?veis, enquanto consumidores estrangeiros podem ver todas as acomoda??es ofertadas pelos hot?is.
23.
Mencione-se, ainda, que a vulnerabilidade t?cnica tamb?m tem destaque neste caso: o
consumidor n?o sabe que, por meio de seu IP, pode fornecer ? Decolar dados que a empresa usa de forma
discriminat?ria. Nesse sentido, a pol?tica de privacidade do site n?o ? clara, nem satisfatoriamente
informativa[1]. Tais condutas, al?m de distanciarem-se dos objetivos da Pol?tica Nacional das Rela??es de
Consumo (art. 4?, caput), infringem, al?m do princ?pio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4?, I), o
princ?pio da boa-f? e do equil?brio (art. 4?, III).
24.
Esses princ?pios, ali?s, se imbricam e permitem a forma??o de uma das mais essenciais
condi??es para a forma??o de rela??es de consumo transparentes, equilibradas e harmoniosas, como
buscadas pelo CDC: a confian?a, elemento essencial ? demonstra??o da real vontade das partes em
estabelecer uma rela??o de consumo. No caso em exame, toda essa rica base principiol?gica,
indispens?vel ? legalidade e legitimidade das pr?ticas verificadas no mercado de consumo, se v? maculada
pelas posturas da empresa.
c. Dos direitos b?sicos do consumidor
25.
O C?digo de Defesa do Consumidor define, em seu artigo 6?, os chamados "direitos
b?sicos" dos consumidores. Dentre eles, destacam-se aqui, de forma especial aqueles insertos em seus
incisos II (igualdade nas contrata??es), III (informa??o) e IV (prote??o contra abusos de toda sorte, nas
diversas fases da rela??o de consumo).
26.
O direito ? igualdade nas contrata??es pressup?e que n?o se discrimine pre?os sem motivo
razo?vel. Se a precifica??o geogr?fica se desse, por exemplo, em raz?o do FRETE, ou seja, do custo do
transporte de produto, n?o haveria que se falar em discrimina??o. N?o ? o caso que se apresenta.
27.
Um consumidor no Brasil ou em outro pa?s procuram, pelo mesmo meio ? o site da Decolar
-, o mesmo servi?o ? acomoda??es em estabelecimentos hoteleiros. O servi?o ? prestado no mesmo lugar,
sem custo adicional para o fornecedor, e sem que qualquer outro custo ou motivo razo?vel possa
influenciar o pre?o. Nota-se, portanto, que a Decolar usa somente uma informa??o ? a localiza??o
geogr?fica ? para discriminar pre?os para o mesmo produto.
28.
O direito ? informa??o pressup?e que ela seja prestada de forma adequada, clara e
inequ?voca (quantidade, caracter?sticas, composi??o, qualidade, pre?o, riscos) sobre os diferentes produtos
e servi?os ofertados ao consumidor.
29.
O Ministro do Superior Tribunal de Justi?a, Antonio Herman V. Benjamin, destaca a
import?ncia do direito ? informa??o, de forma muito precisa, no Recurso Especial n.? 586.316/MG
A informa??o ? irm?-g?mea ? "insepar?vel", diz Jorge Mosset Iturraspe (Defensa Del Consumidor, 2? ed., Santa f?, Rubinzal-Culzoni, 2003, p. 29) - dos Princ?pios da Transpar?ncia, da Confian?a e da Boa-f? Objetiva. Sem ela, esses princ?pios n?o se realizam. Por isso se apregoa que ser informado ? ser livre, inexistindo plena liberdade sem
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informa??o. Percept?vel, ent?o, a contradi??o entre aqueles que pregam o `livre mercado' e, ao mesmo tempo, negam, solapam ou inviabilizam a plena informa??o ao consumidor. Segundo, ? a informa??o que confere ao consumidor "a possibilidade de utilizar os produtos comercializados com plena seguran?a e de modo satisfat?rio aos seus interesses" (Gabriel A. Stilitz, Protecci?n Jur?dica Del Consumidor, Buenos Aires, Depalma, 1986, p. 45). S? o consumidor bem informado consegue de fato usufruir integralmente os benef?cios econ?micos que o produto ou servi?o lhe proporciona, bem como proteger-se de maneira adequada dos riscos que apresentam. Por esse ?ltimo aspecto (prote??o contra riscos), a obriga??o de informar deriva da obriga??o de seguran?a, que modernamente, por for?a de lei ou da raz?o, se p?e como pressuposto para o exerc?cio de qualquer atividade no mercado de consumo.
30.
Como se v?, a teor de t?o precisas pondera??es, o direito ? informa??o pode muito bem ser
considerado `o mais b?sico' de todos os direitos do consumidor, devendo sempre ser observado
minuciosamente, pois, al?m de ser um pressuposto para seu exerc?cio de liberdade de escolha, assegura as
condi??es indispens?veis para o respeito aos demais diretos.
31.
A informa??o a ser prestada ao consumidor deve ser completa, gratuita e ?til[2], de forma
que o consumidor compreenda o que est? adquirindo ou contratando. Ela ? a ess?ncia do contrato e
assegura a transpar?ncia na rela??o de consumo.
32.
Al?m do direito ? informa??o, o artigo 6? assegura, no inciso IV, a prote??o ao consumidor
contra m?todos comerciais desleais. O dispositivo visa a garantir ao consumidor que n?o seja ludibriado
por artif?cios desonestos do fornecedor, condutas que podem ser praticadas por pessoas que se valham da
vulnerabilidade do consumidor.
33.
Violados tais direitos, consolidadas as pr?ticas vedadas pela lei de prote??o e defesa do
consumidor, a ele se deve garantir a efetiva repara??o dos danos que tenha experimentado, nas rela??es de
consumo (art. 6?, VI). Ou seja, mais do que sujeitar o fornecedor ?s san??es que a pr?pria lei estipula, a lei
o obriga tamb?m ? efetiva repara??o dos danos causados por essas viola??es.
c.1. Da abusividade na discrimina??o de pre?os feita pela c.1.1- Do contorno normativo espec?fico: pr?ticas abusivas do art. 39 do CDC
34.
Al?m dos princ?pios e direitos b?sicos do consumidor, o CDC apresenta o rol
exemplificativo de pr?ticas abusivas envolvendo as rela??es de consumo. Entre eles, destacam-se os inc.
II, IX e X.
35.
Com rela??o ao primeiro inciso mencionado, tem-se como n?cleo do mandamento legal a
palavra "recusa" (de atendimento ?s demandas dos consumidores, na medida das disponibilidades do
estoque). Recusar implica nega??o, implica opor-se a algo. A pr?tica do geo blocking ? exatamente a
nega??o de oferecimento de servi?o ? em outras palavras, uma recusa.
36.
O inc. IX disp?e em sentido semelhante. Trata-se, novamente, da recusa da presta??o de
servi?o ou venda de bem. Como j? mencionado, essa ? exatamente a ess?ncia do geo blocking.
37.
Por sua vez, o inc. X fala em elevar sem justa causa o pre?o de produto ou servi?o. A
pr?tica de precificar diferentemente as acomoda??es, com base apenas na localiza??o geogr?fica do
consumidor, ? exatamente caso de eleva??o de pre?o sem justa causa.
38.
A Decolar argumenta, por?m, que a diferen?a cambial e o regime jur?dico seriam
suficientes para dar ? pr?tica de geo pricing conota??o de pr?tica "justa". A argumenta??o n?o se sustenta.
39.
O termo "justo" remete ? imparcialidade, ? retid?o, ? conformidade com a raz?o e ? certo
que a justi?a deva ser alcan?ada pela aplica??o do princ?pio da igualdade material, ou seja, desigualando-
se os desiguais, na medida de sua desigualdade. Contudo, o c?mbio n?o caracteriza a desigualdade que a
Decolar deseja provar. Basta que o consumidor mude, no motor de busca, a moeda na qual deseja ver a
oferta da acomoda??o. Se dois consumidores, um no Brasil e outro no exterior consultarem a oferta em
d?lares, ambos devem ver o mesmo valor.
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18/06/2018
SEI/MJ - 6450576 - Nota T?cnica
40.
Observe-se, aqui, que sequer a carga tribut?ria pode justificar pre?o a maior, uma vez que a
Decolar mostra o pre?o do servi?o sem impostos, taxas e encargos, como se v? em seu site.
41.
Tamb?m n?o ? justa causa o regime jur?dico a que o consumidor esteja subordinado, porque
este n?o influi no pre?o contratado, a n?o ser, ? claro, no caso da tributa??o, mas, como foi dito no
par?grafo anterior, esse argumento n?o prospera.
c.1.2 ? Da defini??o doutrin?ria sobre a abusividade, aplicada ao direito do consumidor
42.
Feita a an?lise dos elementos ling??sticos do texto normativo que diz respeito ao caso em
an?lise, ? preciso saber o que a doutrina entende por abusividade. Assim, ? poss?vel determinar se a
conduta da Decolar encaixa-se na hip?tese doutrin?ria.
43.
Para o direito portugu?s, o abuso de direito mostra-se "como uma constela??o de situa??es
t?picas em que o Direito, por exig?ncia do sistema, entende deter uma actua??o que, em princ?pio, se
apresentaria como leg?tima". [3] A doutrina portuguesa aponta para algumas "classifica??es" dessa
"constela??o de situa??es". Uma delas, a do Desequil?brio, ? definida por Ant?nio Menezes de Cordeiro
como sendo o exerc?cio de um direito formal em moldes que atentam conta "vectores fundamentais do
sistema".
44.
Nos Estados Unidos, foram estabelecidos, pelo Dodd-Frank Act - uma lei de prote??o ao
consumidor de servi?os financeiros - os conceitos de pr?ticas desleais, enganosas ou abusivas. Para essa
lei, ? abusiva a pr?tica daquele que tira vantagem da vulnerabilidade do consumidor, em certas condi??es,
ou da confian?a que este deposita em algu?m que aja em seu interesse.[4] Naquele pa?s, a autoridade de
prote??o ao consumidor de servi?os financeiros (o Consumer Financial Protection Bureau ? CFPB) vem
sendo um dos grandes interpretadores do conceito de pr?ticas abusivas, em casos concretos.
45.
Comentando sobre a legisla??o americana, Antonio Herman Benjamin compara a no??o
brasileira de "pr?tica abusiva" ao conceito americano de unfair, e diz que este se relaciona a
irregularidades nas negocia??es em que haja rela??o de consumo, ferindo as bases da ordem jur?dica, "seja
pelo prisma da boa-f?, seja pela ?tica da ordem p?blica e dos bons costumes."[5]
46.
Na doutrina brasileira, Tartuce e Neves asseveram que o abuso de direito ? mat?ria tratada
tanto no C?digo Civil (art. 187), quanto no CDC, sendo importante categoria do Direito Civil
Contempor?neo. Pela leitura do Manual de Direito do Consumidor, de autoria dos doutrinadores
mencionados, entende-se que os autores aproximam o conceito de abuso de direito ao excesso cometido
pelo agente, no exerc?cio de direito.[6]
47.
Humberto Theodoro J?nior tamb?m considera que o abuso de direito est? no desvio da
normalidade das pr?ticas comerciais que envolvem rela??o de consumo, concluindo que a defesa do
consumidor se d? "basicamente, sobre o bin?mio boa-f? e equil?brio econ?mico."[7]
c.1.3 ? Do tratamento jurisprudencial, no Brasil, sobre o abuso de direito
48.
A pesquisa na jurisprud?ncia dos tribunais superiores brasileiros mostra que os julgadores
n?o costumam definir o que seria abuso ou pr?tica abusiva. Contudo, ? poss?vel entender que, assim como
a doutrina, o Judici?rio considera como abusiva a conduta por meio da qual o agente se beneficia de sua
posi??o ou de uma prerrogativa que, a princ?pio, seria leg?tima e n?o lesiva.
49.
Sejam tomados como exemplo os seguintes julgados:
STJ:
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROV?RSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUT?RIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. PAES. PARCELAMENTO ESPECIAL. DESIST?NCIA INTEMPESTIVA DA IMPUGNA??O ADMINISTRATIVA X PAGAMENTO TEMPESTIVO DAS PRESTA??ES MENSAIS ESTABELECIDAS POR MAIS DE QUATRO ANOS SEM OPOSI??O DO FISCO. DEFERIMENTO T?CITO DO PEDIDO DE ADES?O. EXCLUS?O DO CONTRIBUINTE. IMPOSSIBILIDADE. PROIBI??O DO COMPORTAMENTO CONTRADIT?RIO (NEMO POTEST VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM).
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