ADITIVO CONTRATUAL – CORONAVÍRUS – CUSTEIO DE DESPESAS

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AC?RD?OS

TRANSPORTE COLETIVO

ADITIVO CONTRATUAL ? CORONAV?RUS ? CUSTEIO DE DESPESAS

PROCESSO N? :

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INTERESSADO :

RELATOR

:

595220/20 CONSULTA MUNIC?PIO DE MARING? MUNIC?PIO DE MARING? CONSELHEIRO IVENS ZSCHOERPER LINHARES

AC?RD?O N? 3738/20 - TRIBUNAL PLENO

EMENTA: Consulta. Contrato de Concess?o de Servi?o P?blico de Transporte Coletivo. Questionamento acerca da recomposi??o do reequil?brio econ?mico-financeiro e institui??o de subs?dios e ajuda de custeio no contexto da pandemia do Covid-19. 1. N?o ? poss?vel a aquisi??o antecipada de bilhetes de passagens como forma de aux?lio na solu??o de diss?dio ou de estado de greve de trabalhadores do transporte p?blico, tendo em vista que n?o encontra amparo nas hip?teses excepcionais institu?dos pela Medida Provis?ria n? 961/20, com vig?ncia limitada a 31/12/2020, e nem atende aos requisitos excepcionais elencados pela jurisprud?ncia do TCU e Orienta??o Normativa AGU n? 37/2011 quanto ? intelig?ncia do art. 15, III, o art. 40, XIV, "d", e o art. 65, II, "c", todos da Lei n? 8.666/1993; 2. Nos termos da pac?fica jurisprud?ncia do TCU e STJ, o aumento de sal?rio proveniente de diss?dio coletivo, por si s?, n?o caracteriza fato imprevis?vel, nos termos previsto pelo art. 65, II, d, da Lei n? 8.666/93, e n?o autoriza a revis?o de contrato administrativo para fins de reequil?brio econ?mico-financeiro, de forma que igualmente n?o autoriza a celebra??o de Aditivo Contratual compensat?rio, como meio de aux?lio na solu??o de diss?dio ou de estado de greve de trabalhadores do transporte p?blico; 3. Mediante o devido processo de reequil?brio econ?mico-financeiro em que reste demonstrado, de modo inequ?voco, os eventos supervenientes e extraordin?rios, de consequ?ncias imprevis?veis e inevit?veis, trazidos pela pandemia do Covid-19, que estejam gerando onerosidade excessiva e causando significativo desequil?brio ao contrato de concess?o, ? poss?vel a celebra??o de Aditivo Contratual que estabele?a medidas compensat?rias ao concession?rio para recompor o equil?brio econ?mico-financeiro original do contrato e preservar a continuidade de execu??o do servi?o p?blico de transporte p?blico. 4. Neste caso, s?o admitidas quaisquer medidas compensat?rias legalmente admiss?veis, como (i) a concess?o de reajuste tarif?rio; (ii) o pagamento de indeniza??o; (iii) a amplia??o de prazos e flexibiliza??o de metas para cumprimento de obriga??es de investimento e de regras operacionais; cabendo ao Poder P?blico respons?vel analisar e justificar a aplica??o das medidas mais adequadas a cada caso. 5. A cria??o de subs?dio or?ament?rio ou subven??o fiscal para o custeio de despesas do servi?o de transporte coletivo p?blico municipal deve ser precedida de projeto de lei do Executivo e autoriza??o do Legislativo (nos termos das exig?ncias para cria??o de despesas previstas pelo art. 167 da Constitui??o), deve atender aos preceitos da Lei n? 4.320/64 (Normas Gerais de Direito Financeiro) e da Lei n? 101/200 (Lei de Responsabilidade Fiscal) e estar em conson?ncia com as diretrizes da Pol?tica Nacional de Mobilidade Urbana (Lei n? 12.587/2012), n?o sendo l?cito ao Poder P?blico instituir subs?dios para o custeio de concess?o

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Transporte coletivo Aditivo contratual ? Coronav?rus ? Custeio de despesas

p?blica mediante a simples celebra??o de aditivo contratual (modifica??o unilateral), ? margem do devido processo de reequil?brio econ?micofinanceiro e em desatendimento ?s exig?ncias legais para a cria??o de toda e qualquer despesa p?blica.

1 DO RELAT?RIO

Trata-se de Consulta formulada pelo Munic?pio de Maring? (pe?a 3) por meio de seu Procurador-Geral, em que apresentou os seguintes questionamentos:

1) Em raz?o da solicita??o do Minist?rio P?blico do Trabalho, em a??o de dissidio trabalhista, pode haver aditivo contratual para compra de bens e servi?os que ser?o posteriormente utilizados pelo Ente P?blico, quando tal bem ? inerente a uma concess?o, para "fazer algum tipo de concess?o para a solu??o do Diss?dio e da Greve"? 2) Adquirir bens com fonte de custeio de pagamento com verba pr?pria do Munic?pio, para uso posterior de transporte ? considerado pagamento antecipado de bens/servi?o? 3) ? caso de aplica??o do art. 65, II, c, a aquisi??o de bens em raz?o da pandemia do COVID19 como imposi??o de circunst?ncias supervenientes? 4) Pode haver em concess?o aditivo contratual para manuten??o da contrapresta??o das despesas fixas do instrumento? 5) Quais garantias s?o exig?veis para posterior cobran?a da presta??o do servi?o eventualmente j? pago (no caso, para eventuais compras de bilhetes de passagem urbana)?

O parecer jur?dico foi juntado pelo consulente ? pe?a 6.

Recebidos e encaminhados os autos (pe?a 10), a Supervis?o de Jurisprud?ncia e Biblioteca apresentou a Informa??o n? 85/20 (pe?a 14), em que colacionou os julgados da Corte que tangenciam a mat?ria consultada.

A Coordenadoria-Geral de Fiscaliza??o emitiu o Despacho n? 3016/20 (pe?a 16) em que informou n?o vislumbrar "impactos nos sistemas ou fiscaliza??es desta Corte advindos de Decis?o do presente expediente".

Inicialmente, a Coordenadoria de Gest?o Municipal (Instru??o n? 4007/20 ? pe?a 18) opinou pelo n?o preenchimento dos requisitos normativos que autorizam o processamento da consulta, sugerindo a intima??o do Munic?pio de Maring? para a juntada de parecer complementar, a fim de que que fosse melhor evidenciada a opini?o jur?dica quanto aos itens "a" e "b".

A despeito disso, por meio do Despacho n? 1424/20 (pe?a 18) entendi que a omiss?o formal poderia ser excepcionalmente relevada, tendo em vista a relev?ncia do tema (questionamento oriundo de Diss?dio Coletivo de Greve em tr?mite perante a Justi?a do Trabalho) e a urg?ncia informada pelo consulente (acerca do estado greve do servi?o de transporte p?blico do Munic?pio de Maring?), determinando, assim, o retorno dos autos ? unidade t?cnica para manifesta??o.

Remetidos os autos, a Coordenadoria de Gest?o Municipal, por meio da Instru??o n? 4083/20 (pe?a 20), ofereceu as seguintes sugest?es de resposta:

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1) A compra de bens e servi?os pela Administra??o P?blica, com exce??o dos casos de licita??o dispensada, dispensa de licita??o e inexigibilidade, deve ocorrer atrav?s de licita??o, n?o existindo permissivo legal para que bens sejam adquiridos de forma direta como meio de ajudar na resolu??o de greve. 2) Em rela??o aos pagamentos, a regra geral ? de que n?o ? poss?vel a sua antecipa??o, sendo admitida em casos excepcionais, desde que demonstrado interesse p?blico na medida, exista previs?o no instrumento convocat?rio e seja estabelecida garantias que resguardem a Administra??o dos riscos inerentes ? opera??o. 3) Quanto ? altera??o contratual para a antecipa??o de pagamentos, o art. 65, II, "c", da Lei n? 8.666/93, veda expressamente a sua realiza??o antes da correspondente realiza??o do servi?o ou entrega dos bens, sendo permitido apenas em rela??o ao cronograma financeiro fixado. 4) Pode ser firmado aditivo contratual com o objetivo de reestabelecer o equil?brio econ?mico-financeiro, podendo o poder p?blico compensar o concession?rio mediante reajuste tarif?rio ou o pagamento de subs?dio, desde que demonstrado, de forma inequ?voca, que a concession?ria, diante do significativo impacto decorrente da pandemia, n?o consegue cumprir o contrato nos termos inicialmente propostos. 5) Nos restritos casos em que ? admitida a antecipa??o de pagamento, deve ser exigida uma das garantias listadas no art. 56, ?1?, da Lei n? 8.666/93.

Do mesmo modo, o Minist?rio P?blico de Contas, mediante o Parecer n? 227/20

(pe?a 21), ratificou os termos de resposta propostos pela unidade t?cnica, tendo, em sua

an?lise, resumido o objeto da presente consulta a duas quest?es essenciais. A saber:

1) Sobre o primeiro questionamento, (...) a antecipa??o da aquisi??o de bilhetes de passagem pelo munic?pio, como forma de auxiliar na solu??o de diss?dio e de estado de greve dos trabalhadores do transporte p?blico n?o se mostra vi?vel por aus?ncia de permissivo legal, na medida em que as situa??es excepcionais que permitem a antecipa??o de pagamento, bem como as circunst?ncias previstas da MP n? 961/20 e na jurisprud?ncia do TCU [e na Orienta??o Normativa n? 37/2011 da Advocacia Geral da Uni?o] n?o se amoldam ao caso retratado na presente consulta. 2) Por fim, (...) visando a manuten??o do servi?o p?blico, pode ser firmado aditivo contratual com o objetivo de reestabelecer o equil?brio econ?micofinanceiro inicialmente fixado na proposta, diante dos efeitos advindos da pandemia do COVID19, podendo o poder p?blico compensar o concession?rio mediante reajuste tarif?rio ou o pagamento de subs?dio, desde que demonstrado, de forma inequ?voca, que a concession?ria, diante do significativo impacto decorrente da pandemia, n?o consegue cumprir o contrato nos termos inicialmente propostos, [em conformidade com os requisitos dispostos do Parecer n? 261/2020/CONJUR-MINFRA/CGU/AGU].

? o relat?rio.

2 DA FUNDAMENTA??O E VOTO

Preliminarmente, a despeito de a presente consulta versar sobre uma situa??o

concreta vivenciada pelo Munic?pio de Maring?, fato ? que os questionamentos

formulados envolvem relevante interesse p?blico, o que possibilita a manifesta??o

desta Corte de Contas, nos termos do ?1? do art. 38 da Lei Org?nica, raz?o pela qual

conhe?o da presente consulta.

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Transporte coletivo Aditivo contratual ? Coronav?rus ? Custeio de despesas

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Assim, passa-se ? an?lise merit?ria, em car?ter gen?rico e objetivo, da tese jur?dica questionada, que, conforme bem enunciado nos pareces instrut?rios, pode ser sintetizada a dois questionamentos centrais.

O primeiro questionamento refere-se ? legalidade da aquisi??o antecipada de bilhetes de passagem urbana pelo Munic?pio, como forma de auxiliar na solu??o de diss?dio e de estado de greve dos trabalhadores do transporte p?blico, e, em caso positivo, a maneira adequada para sua implementa??o.

Frise-se, neste ponto, ratificando o entendimento dado pela unidade t?cnica, que "os bilhetes de passagem n?o podem ser considerados efetivamente um bem, mas sim um direito ? futura presta??o dos servi?os, de modo que a sua aquisi??o ? um pagamento antecipado de servi?os."

Isto posto, verifica-se inicialmente que o art. 15, III, o art. 40, XIV, "d", e o art. 65, II, "c", todos da Lei n? 8.666/1993, c/c o art. 38 do Decreto Federal n? 93.872/1986 estabeleceram a seguinte sistem?tica de pagamento nas licita??es e nos contratos pela Administra??o, tendo vedado, como regra, sua antecipa??o. Verbis:

Art. 15. As compras, sempre que poss?vel, dever?o: III - submeter-se ?s condi??es de aquisi??o e pagamento semelhantes ?s do setor privado; Art. 40. O edital conter? no pre?mbulo o n?mero de ordem em s?rie anual, o nome da reparti??o interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execu??o e o tipo da licita??o, a men??o de que ser? regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documenta??o e proposta, bem como para in?cio da abertura dos envelopes, e indicar?, obrigatoriamente, o seguinte: (...) XIV - condi??es de pagamento, prevendo: (...) d) compensa??es financeiras e penaliza??es, por eventuais atrasos, e descontos, por eventuais antecipa??es de pagamentos; Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poder?o ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: (...) II - por acordo das partes: (...) c) quando necess?ria a modifica??o da forma de pagamento, por imposi??o de circunst?ncias supervenientes, mantido o valor inicial atualizado, vedada a antecipa??o do pagamento, com rela??o ao cronograma financeiro fixado, sem a correspondente contrapresta??o de fornecimento de bens ou execu??o de obra ou servi?o; Art. 38. N?o ser? permitido o pagamento antecipado de fornecimento de materiais, execu??o de obra, ou presta??o de servi?o, inclusive de utilidade p?blica, admitindo-se, todavia, mediante as indispens?veis cautelas ou garantias, o pagamento de parcela contratual na vig?ncia do respectivo contrato, conv?nio, acordo ou ajuste, segundo a forma de pagamento nele estabelecida, prevista no edital de licita??o ou nos instrumentos formais de adjudica??o direta.

Por sua vez, superando o debate doutrin?rio sobre o assunto, o Tribunal de Contas da Uni?o passou a admitir a realiza??o de pagamento antecipado pela Administra??o em situa??es excepcionais, tendo estabelecido alguns requisitos, consoante entendimentos extra?dos da "Jurisprud?ncia Selecionada". Assim veja-se:

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S?o requisitos para a realiza??o de pagamentos antecipados: i) previs?o no ato convocat?rio; ii) exist?ncia, no processo licitat?rio, de estudo fundamentado comprovando a real necessidade e economicidade da medida; e iii) estabelecimento de garantias espec?ficas e suficientes que resguardem a Administra??o dos riscos inerentes ? opera??o." (TCU, Ac?rd?o 2856/2019-Primeira C?mara, Relator Min. Walton Alencar Rodrigues) "O pagamento antecipado em contrato administrativo ? procedimento excepcional que somente deve ser admitido quando presentes as devidas justificativas e observadas certas condi??es, como a presta??o de garantia e a concess?o de desconto pelo contratado." (TCU, Ac?rd?o 817/2018-Plen?rio, Relator Min. Aroldo Cedraz)

"Entendo que ? poss?vel a contrata??o de bens de inform?tica, com a presta??o de garantia, realizando-se o pagamento integral do valor contratado quando do recebimento dos bens. E a raz?o principal ? que se trata de uma pr?tica usual no mercado. Em aquisi??es dessa natureza, o valor correspondente ? garantia integra o pre?o do objeto do contrato. N?o ? pr?tica comum a segrega??o do objeto da contrata??o em dois itens: a aquisi??o do bem e a presta??o do servi?o. E o art. 15, inciso III, da Lei 8.666/93, estabelece que as compras p?blicas, sempre que poss?vel, devem pautar-se pelas condi??es de aquisi??o e pagamento do setor privado. (TCU, Ac?rd?o 1.177/2014, Plen?rio, Relator Min. Aroldo Cedraz).

Neste contexto, a Advocacia Geral da Uni?o igualmente analisou a quest?o e emitiu a Orienta??o Normativa AGU n? 37/2011,1 na qual consolidou a possibilidade de antecipa??o de pagamentos desde que fossem atendidos os seguintes requisitos: (i) represente condi??o sem a qual n?o seja poss?vel obter o bem ou assegurar a presta??o do servi?o, ou propicie sens?vel economia de recursos; (ii) exist?ncia de previs?o no edital de licita??o ou nos instrumentos formais de contrata??o direta; e (iii) ado??o de indispens?veis garantias, como as do art. 56 da Lei Federal n? 8.666/93, ou cautelas, como por exemplo, a previs?o de devolu??o do valor antecipado caso n?o executado o objeto, a comprova??o de execu??o de parte ou etapa do objeto e a emiss?o de t?tulo de cr?dito pelo contratado, entre outras.

Em s?ntese, com base na sistem?tica do art. 15, III, o art. 40, XIV, "d", e o art. 65, II, "c", todos da Lei n? 8.666/1993, c/c o art. 38 do Decreto Federal n? 93.872/1986 e na jurisprud?ncia do TCU e orienta??es normativas da AGU, conclui-se que, em situa??es excepcionais, ? poss?vel realizar o pagamento antecipado em contrata??es p?blicas, desde que atendidos alguns requisitos m?nimos (n?o exaustivos): (i) haja previs?o no ato convocat?rio ou nos instrumentos contratuais; (ii) seja fundamentada e comprovada a real necessidade e economicidade da medida, preferencialmente mediante a elabora??o de estudo; (iii) sejam estabelecidas garantias espec?ficas e suficientes que resguardem a Administra??o dos riscos inerentes ? opera??o e/ou a concess?o de descontos por parte da futura contratada, em rela??o ao valor pactuado; e, finalmente, (iv) no ?mbito de contratos vigentes, seja prevista a correspondente contrapresta??o de fornecimento de bens ou execu??o de obra ou servi?o em rela??o ao cronograma financeiro fixado.

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